Language of document : ECLI:EU:C:2013:764

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

NIILO JÄÄSKINEN

apresentadas em 21 de novembro de 2013 (1)

Processo C‑360/12

Coty Germany GmbH, anteriormente Coty Prestige Lancaster Group GmbH,

contra

First Note Perfumes NV

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesgerichtshof (Alemanha)]

«Competência internacional em matéria civil — Regulamento (CE) n.° 40/94 — Artigo 93.°, n.° 5 — Competência em matéria de contrafação de marca comunitária — Regulamento (CE) n.° 44/2001 — Artigo 5.°, ponto 3 — Competência especial em matéria extracontratual — Ato praticado pelo réu noutro Estado‑Membro, que constitui um auxílio ao ato da contrafação ou ao ato ilícito praticado no território do Estado‑Membro do órgão jurisdicional chamado a decidir o litígio»





I –    Introdução

1.        No pedido de decisão prejudicial, o Bundesgerichtshof (Alemanha) pede ao Tribunal de Justiça que se pronuncie sobre a possibilidade de a competência internacional de um órgão jurisdicional de um Estado‑Membro apenas se fundamentar na imputação de atos alegadamente ilícitos cometidos por um terceiro, a uma demandada, que participou neles indiretamente noutro Estado‑Membro, como se esta demandada também tivesse atuado na área de jurisdição do órgão jurisdicional chamado a decidir.

2.        Em primeiro lugar, esta problemática é suscitada de forma completamente inédita, no âmbito da interpretação da regra de competência prevista no artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (2), a título de uma alegada contribuição indireta da demandada para atos de contrafação cometidos por um terceiro.

3.        Em segundo lugar, no que se refere ao artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento (CE) n.° 44/2001 do Conselho, de 22 de dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (3), o presente reenvio prejudicial insere‑se numa série de processos recentes relativos à eventual admissibilidade de uma conexão com os atos ilícitos de um terceiro, para efeitos do estabelecimento da existência de um critério de competência previsto na referida disposição (4). A análise desse aspeto do processo revela uma tensão entre duas orientações jurisprudenciais que o Tribunal de Justiça deverá ter em conta, sendo que uma dessas orientações favorece uma interpretação menos extensiva desta disposição.

4.        Além disso, as duas questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio interagem, dado que, a primeira se destina, nomeadamente, a determinar em que medida esta interpretação pode ser transposta para o artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária, desde que uma extensão de competência, como a que ponderada, seja admitida no âmbito do artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I, As possíveis ligações entre estes dois regulamentos deverão, por conseguinte, ser analisadas.

5.        Concretamente, o presente reenvio prejudicial surge no seguimento da ação intentada num tribunal alemão, por uma sociedade alemã, contra uma sociedade belga, com fundamento no facto de esta última ter violado a marca comunitária detida pela primeira e de ter contribuído para atos de concorrência desleal contrários à mesma. Neste contexto, pergunta‑se ao Tribunal de Justiça se a competência dos órgãos jurisdicionais alemães se pode fundar no facto de a demandada, que atuou na Bélgica, ter alegadamente prestado auxílio à prática dos atos ilícitos na Alemanha por parte de um empresário alemão que não foi judicialmente demandado.

II – Litígio no processo principal, questões prejudiciais e tramitação processual no Tribunal de Justiça

6.        A Coty Germany GmbH (5) (a seguir «Coty Germany») produz e distribui perfumes e produtos cosméticos na Alemanha. Comercializa, nomeadamente, um perfume para senhoras num frasco que reproduz uma marca comunitária tridimensional, cujos direitos detém após ter sido registada.

7.        A First Note Perfumes N. V. (a seguir «First Note Perfumes») exerce, na Bélgica, uma atividade de grossista de perfumaria. Em janeiro de 2007, vendeu um dos produtos do seu catálogo a Stefan P. Warenhandel (a seguir «Stefan P.»), com estabelecimento comercial situado na Alemanha. O órgão jurisdicional de reenvio precisa que a entrega dos frascos de perfume para senhoras encomendados teve lugar na Bélgica. Posteriormente, a saber, em agosto de 2007, segundo a Coty Germany, Stefan P. revendeu esses produtos no território alemão.

8.        A Coty Germany, considerando que a distribuição de um perfume num frasco semelhante à marca comunitária de que é titular constituía uma contrafação, uma publicidade comparativa ilícita e uma imitação desleal, intentou uma ação num tribunal alemão, exclusivamente dirigida contra a First Note Perfumes (6), e destinada a que esta fosse condenada, por um lado, a comunicar as informações relativas ao seu fornecedor, por outro, a indemnizar a totalidade do dano que a demandada sofreu e viria a sofrer devido à distribuição desse produto na Alemanha, bem como a reembolsar as despesas efetuadas antes da fase pré‑contenciosa.

9.        Na medida em que a improcedência desses pedidos em primeira instância foi confirmada em sede de recurso, devido à falta de competência internacional dos órgãos jurisdicionais alemães, a Coty Germany interpôs um recurso de «Revision» no Bundesgerichtshof. Invocou um prejuízo causado à marca comunitária em causa e um uso de práticas constitutivas de uma concorrência desleal.

10.      No que se refere à marca comunitária, o Bundesgerichtshof indica que a competência internacional dos órgãos jurisdicionais alemães depende, em conformidade com o artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária (7), da questão de saber se a Coty Germany arguiu validamente que só a demandada tinha cometido um ato de contrafação na Alemanha.

11.      Ora, a First Note Perfumes só pôde participar nesse ato no território alemão devido à venda, efetuada na Bélgica, dos frascos de perfume controvertidos a Stefan P., que teria depois cometido, na Alemanha, uma contrafação da marca na aceção do artigo 9.°, n.° 1, segundo período, alínea b), do referido regulamento (8). A este respeito, a Coty Germany alegou que a First Note Perfumes tinha contribuído para a alegada violação dos seus direitos na Alemanha, dado que sabia que o seu cliente alemão tencionava revender na Alemanha os produtos comprados na Bélgica, tendo‑o assim ajudado, e que, por conseguinte, também era responsável pelo elemento constitutivo da contrafação.

12.      Além disso, no que se refere às pretensões da Coty Germany baseadas numa violação do direito alemão da concorrência desleal (9), o artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I (10) pode fundamentar a competência dos órgãos jurisdicionais alemães na ação intentada contra a First Note Perfumes, com base no lugar onde o ato danoso ocorreu. Por conseguinte, as dúvidas do órgão jurisdicional de reenvio a respeito do Regulamento sobre a marca comunitária também se colocam, mutatis mutandis, neste contexto.

13.      Por decisão apresentada em 31 de julho de 2012, o Bundesgerichtshof decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Deve o artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento [sobre a marca comunitária] ser interpretado no sentido de que uma contrafação foi cometida num Estado‑Membro (Estado‑Membro A), na aceção do artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento (CE) n.° 40/94, quando, através de uma ação cometida noutro Estado‑Membro (Estado‑Membro B), se verifica uma participação num ato ilícito cometido no primeiro Estado‑Membro (Estado‑Membro A)?

2)      Deve o artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento [Bruxelas I] ser interpretado no sentido de que o facto danoso ocorreu num Estado‑Membro (Estado‑Membro A) quando o ato ilícito que é objeto do processo ou com base no qual são formuladas as pretensões se verificou noutro Estado‑Membro (Estado‑Membro B) e consiste na participação no ato ilícito (facto principal) ocorrido no primeiro Estado‑Membro (Estado‑Membro A)?»

14.      Foram apresentadas observações escritas no Tribunal de Justiça pela Coty Germany, pela First Note Perfumes, pelos Governos do Reino Unido e suíço, bem como pela Comissão Europeia. Na audiência de 19 de setembro de 2013 estavam representados, as partes no processo principal, o Governo alemão, e a Comissão.

III – Análise

A –    Observações preliminares

15.      Antes de mais, preciso que, tendo em conta que a data dos factos que estão na origem do litígio no processo principal remonta a 2007, só são aplicáveis ratione temporis as disposições do Regulamento sobre a marca comunitária e as do Regulamento Bruxelas I, como referidas nas questões prejudiciais, à exceção das disposições equivalentes do Regulamento (CE) n.° 207/2009 (11) e do Regulamento (UE) n.° 1215/2012 (12) que alteraram respetivamente os dois primeiros regulamentos. De resto, as disposições pertinentes no presente processo não foram objeto de alterações que afetassem o seu teor.

16.      Acrescento que a pedra angular das duas questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio é a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que resulta do acórdão Bier, dito «Mines de Potasse d’Alsace» (13). Daqui resulta que, ao abrigo da competência em matéria extracontratual, a expressão «lugar onde ocorreu», referida no artigo 5.°, ponto 3, da Convenção de Bruxelas (14), abrange simultaneamente o lugar do facto causal que está na origem do dano e o lugar onde o dano se materializou, de modo a que o réu possa ser demandado, segundo a opção do autor, perante o tribunal de um desses dois lugares.

17.      Embora seja certo que esta opção também é válida para o artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I, que substituiu a referida convenção (15), subsistem dúvidas, refletidas na segunda questão, quanto à possibilidade de alargar essa opção de modo a que a mesma inclua uma conexão relativa aos atos praticados por uma pessoa não demandada, em especial na perspetiva do lugar da materialização do dano. Antes de mais, a primeira questão convida o Tribunal de Justiça a pronunciar‑se sobre a questão de saber se a referida jurisprudência pode ser aplicada por analogia, ao abrigo do artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária, ou se esta disposição deve ser autonomamente interpretada e, em qualquer caso, se numa situação como a do processo principal daí pode resultar a competência de qualquer órgão jurisdicional junto do qual seja intentada uma ação de contrafação.

B –    Quanto à interpretação do artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária

–       Considerações preliminares

18.      Com a primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio interroga, no essencial, o Tribunal de Justiça sobre a questão de saber se o artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária deve ser interpretado no sentido de que permite estabelecer, com base no lugar da contrafação de uma marca comunitária imputada a um dos seus presumidos autores, que não é parte no litígio, uma competência jurisdicional relativa a outro presumido autor da referida contrafação que, quanto a ele, não atuou na área de jurisdição do órgão jurisdicional chamado a decidir.

19.      Mais concretamente, o Bundesgerichtshof, tem dúvidas quanto à questão de saber se, no caso em apreço, foi cometida uma contrafação, na aceção do referido artigo, na Alemanha, na medida em que a venda dos frascos de perfume controvertidos pela First Note Perfumes a Stefan P., apesar ter ocorrido na Bélgica, contribuiu para a violação da marca comunitária detida pela Coty Germany, praticada por Stefan P., na Alemanha, sendo os tribunais alemães eventualmente competentes no que diz respeito à First Note Perfumes.

20.      O órgão jurisdicional de reenvio e a Coty Germany pronunciaram‑se no sentido de uma resposta afirmativa, contrariamente à First Note Perfumes e à Comissão. O Governo alemão alegou que o artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária não prevê a competência dos tribunais baseada no lugar do resultado da contrafação, permitindo no entanto uma atribuição de competência quando várias pessoas participaram conscientemente numa infração transfronteiriça contra uma marca comunitária. Os Governos do Reino Unido e suíço não apresentaram observações a este respeito.

21.      Em apoio da sua análise, o órgão jurisdicional de reenvio parte do princípio de que, para efeitos da determinação da competência de um órgão jurisdicional de um Estado‑Membro, a identificação do lugar onde a contrafação foi cometida, na aceção do artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária, deve obedecer aos mesmos critérios que os utilizados para a identificação do lugar onde ocorreu o facto danoso na aceção do artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I.

22.      No entanto, pelas razões a seguir desenvolvidas, considero que essa analogia não pode ser levada a cabo. Por conseguinte, a primeira dessas disposições deve, a meu ver, ser interpretada enquanto norma distinta da segunda.

–       Exclusão de uma transposição da jurisprudência relativa à interpretação do artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I

23.      O órgão jurisdicional de reenvio considera que a resposta à questão de saber em que Estado‑Membro foi cometida a alegada contrafação, na aceção do artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária, depende simultaneamente do lugar do facto causal que está na origem do dano (16) e do lugar onde este ocorreu (17), em conformidade com a jurisprudência do acórdão Mines de Potasse d’Alsace, já referido. Alega que esta interpretação por analogia da alternativa admitida para o artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I é maioritariamente acolhida na doutrina (18) e que também está em conformidade com o sentido e com a finalidade dessas duas disposições.

24.      Admitindo que, para o Tribunal de Justiça, esses dois elementos de conexão são efetivamente pertinentes, importa analisar em seguida, para efeitos da aplicação do referido artigo, se no caso em apreço algum deles se verifica no que diz respeito à First Note Perfumes, o que implica que os atos de contrafação cometidos na Alemanha pelo presumido autor principal, concretamente Stefan P., podem ser imputados a esta por ter participado indiretamente. Daqui resulta que os órgãos jurisdicionais alemães podem ser competentes para decidir relativamente à First Note Perfumes mesmo que Stefan P. não tenha sido demandado.

25.      No entanto, a meu ver, vários argumentos militam contra a possibilidade de interpretar o artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária à luz da jurisprudência relativa ao artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I.

26.      Em primeiro lugar, recordo que a articulação entre esses dois instrumentos é expressamente tratada pelo Regulamento sobre a marca comunitária, na medida em que o artigo 90.°, n.° 1, cujo teor é expresso em termos mais lapidares no décimo quinto considerando, estabelece o princípio da aplicação da Convenção de Bruxelas em caso de ação judicial relativa a uma marca comunitária, o que é igualmente válido para o Regulamento Bruxelas I (19).

27.      No entanto, existem exceções a este princípio. O artigo 90.°, n.° 2, alínea a), do Regulamento sobre a marca comunitária exclui, em especial, a aplicação do artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I nos processos resultantes das ações e dos pedidos referidos no artigo 92.° desse primeiro regulamento (20), a saber, nomeadamente, «todas as ações de contrafação» (21). Tendo em conta esta exclusão, o artigo 93.° do Regulamento sobre a marca comunitária prevê vários critérios de competência, aplicados «em cascata», próprios da matéria referida nessa disposição, e que se afastam, por vezes consideravelmente, dos previstos no Regulamento Bruxelas I (22), em especial, no seu n.° 5 (23). Dito isto, sublinho que, na minha opinião, o facto de estar expressamente prevista a inaplicabilidade (24) do artigo 5.°, ponto 3, da Convenção de Bruxelas às ações de contrafação, e de este artigo ser substituído pelo artigo 93.°, n,.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária, que fixa uma regra de competência específica nesta matéria, impede uma interpretação conjunta dessas duas disposições.

28.      Contrariamente ao ponto de vista do órgão jurisdicional de reenvio, considero, em segundo lugar, que a especificidade desta última disposição não pode ser negada, principalmente, à luz da origem dessa disposição. A este respeito, os trabalhos preparatórios indicam que, mesmo antes de ter sido iniciada a fase legislativa propriamente dita, o processo de elaboração do projeto de regulamento sobre a marca comunitária incluía a tomada em consideração das regras de competência contidas na Convenção de Bruxelas e na jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à sua interpretação (25). Na Comissão, o grupo de trabalho sobre a marca comunitária salientou que essas regras pareciam ser insuficientes para solucionar os especiais problemas colocados pela violação dos direitos deste título único que ocorria em vários Estados‑Membros. Em especial, o referido grupo considerou que, tendo em conta a especificidade da marca comunitária, era necessário alterar a regra do artigo 5.°, ponto 3, desta convenção (26). Acrescento que o teor da particularidade do critério de competência especial previsto no artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária (27) nunca foi posto em causa, apesar da série de alterações de que este regulamento foi objeto (28).

29.      Em terceiro lugar, os elementos contextuais corroboram a tese segundo a qual os redatores do Regulamento sobre a marca comunitária pretenderam marcar a diferença entre essa disposição e a que existia na Convenção de Bruxelas. Com efeito, a comparação com instrumentos adotados em matérias semelhantes demonstra que o legislador comunitário optou conscientemente por um afastamento do critério de competência referido no artigo 5.°, ponto 3, dessa convenção, tendo escolhido seguir essa via noutros textos relativos à propriedade intelectual (29) e da qual, pelo contrário, se afastou no Regulamento (CE) n.° 2100/94 relativo às variedades vegetais (30). Este contraste não pode ser resumido a um erro de escrita que parece ser sugerido pelo órgão jurisdicional de reenvio. Na minha opinião, tal circunstância é tão mais reveladora quanto a redação e a adoção desse último instrumento são contemporâneas das do Regulamento sobre a marca comunitária.

30.      Em quarto lugar, considero que a série de fundamentos que conduziram o Tribunal de Justiça a adotar a distinção entre o lugar do facto gerador e o lugar da materialização do dano, que é válida para o artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I, não é transponível para o artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária, atendendo às numerosas disparidades existentes quanto ao teor de cada uma das disposições.

31.      Com efeito, por um lado, o conceito de lugar onde a contrafação foi cometida é mais restrito que o de lugar onde o dano ocorreu (31). Por outro lado, o vocabulário utilizado no referido artigo 93.°, n.° 5, parece sugerir um comportamento ativo, que é mais significativo quando aplicado ao lugar do facto gerador do que ao lugar da materialização do dano, enquanto que a interpretação extensiva do artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I parece ter‑se tornado possível através da terminologia mais neutra que é empregue neste último artigo (32). Por fim, sublinho que o alcance da competência conferida por estas disposições difere em vários aspetos (33), o que reduz ainda mais a pertinência de uma conexão entre elas.

32.      Considero que, das especificidades da redação do referido artigo 93.°, n.° 5 (34), e atendendo ao contexto no qual foi redigido, é possível deduzir que este artigo não cria uma competência com base no lugar da materialização do dano. A aplicação por analogia da jurisprudência Mines de Potasse d’Alsace, já referido, a esta disposição deve, por conseguinte, ser excluída.

33.      No entanto, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, o artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária que, em derrogação dos n.os 1 a 4 do referido artigo 93.°, introduz uma competência com base no lugar onde a contrafação foi cometida, tem origem nas mesmas considerações que o artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I. A este respeito, o referido órgão jurisdicional refere‑se à existência de um elemento de conexão especialmente estreito entre o litígio e os órgãos jurisdicionais do lugar onde ocorreu o dano, elemento este que justifica que a competência lhes seja atribuída por razões de boa administração da justiça e de organização útil do processo.

34.      Tendo em conta este argumento, pode subsistir uma última interrogação. Resta pois saber se, apesar de uma interpretação por analogia não ser possível, os princípios orientadores que presidem à interpretação do Regulamento Bruxelas I devem, no entanto, ser aplicados para efeitos da interpretação do artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária, mesmo que esse último instrumento não os mencione. Entre esses princípios, figuram exigências relativas a uma conexão estreita entre o litígio e o órgão jurisdicional chamado a decidir, a uma boa administração da justiça e a uma organização útil do processo, mas também à previsibilidade das regras de competência e à segurança jurídica.

35.      A este respeito, saliento que essas diversas exigências provêm, antes de mais, dos princípios de interpretação formulados pelo Tribunal de Justiça na sua jurisprudência relativa à Convenção de Bruxelas e, em seguida, do Regulamento Bruxelas I, o qual menciona expressamente algumas dessas exigências (35). As mesmas resultam tanto das condições que decorrem implicitamente das disposições analisadas pelo Tribunal de Justiça como de considerações gerais e de bom senso. Estes princípios universais podem, por conseguinte, ser aplicados a um outro instrumento, desde que nem o teor nem a finalidade da regra de competência em causa o proíbam.

36.      Preciso que não pode ser invocado como argumento o facto de uma interpretação não uniforme das disposições desses dois instrumentos poder conduzir a uma falta de previsibilidade ou de segurança jurídica, dado que, fazer uma amálgama entre eles equivale a negar que as regras de competência previstas pelo Regulamento sobre a marca comunitária constituem, de certo modo, uma lex specialis relativamente às regras previstas pelo Regulamento Bruxelas I. As opções feitas pelo legislador comunitário neste outro contexto jurídico devem ser respeitadas.

37.      Por conseguinte, proponho ao Tribunal de Justiça que, para responder à primeira questão prejudicial, proceda a uma interpretação autónoma do artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária, tendo em conta as exigências acima referidas, e na medida em que o regulamento o permita.

–       Apreciação relativa à eventual extensão da competência com base no lugar da materialização do dano também causado por um terceiro que não é réu no processo

38.      O Tribunal de Justiça é chamado a pronunciar‑se a respeito da eventual possibilidade de consagrar uma competência por conexão, segundo a qual o artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária permitiria demandar um réu pelo simples facto de ter participado indiretamente num Estado‑Membro numa alegada contrafação que tenha sido cometida, a título principal, noutro Estado‑Membro, por um terceiro que, por sua vez, não é réu na ação intentada nos órgãos jurisdicionais deste segundo Estado‑Membro.

39.      Ora, a meu ver, resulta do artigo 94.°, n.° 2, do Regulamento sobre a marca comunitária que a regra de competência enunciada no artigo 93.°, n.° 5, desse regulamento é baseada no princípio da territorialidade, que é aqui concebido de forma estrita (36). Com efeito, prevê‑se que um órgão jurisdicional competente com base nesse critério pode «decidir sobre os atos cometidos ou em vias de serem cometidos no território do Estado‑Membro em que esse tribunal estiver situado», enquanto os órgãos jurisdicionais cuja competência é baseada num dos outros quatro números do referido artigo 93.° também podem decidir sobre a contrafação cometida fora do território nacional.

40.      Além disso, os trabalhos preparatórios do Regulamento sobre a marca comunitária incitam a considerar que o critério de competência especial que resulta do artigo 93.°, n.° 5, deste, deve ser restritivamente interpretado. Esta abordagem impõe‑se por razões próprias a este instrumento, relativas à dificuldade em conciliar a natureza unitária da proteção conferida à marca comunitária (37) e o risco de violações plurilocalizadas no território da União (38). A First Note Perfumes, o Governo alemão e a Comissão insistem, justamente, no facto de, em caso de contrafação de uma marca comunitária, cada Estado‑Membro poder ser considerado, na prática, o lugar da materialização da contrafação, tendo em conta que o direito protegido produz os seus efeitos em todo território da União.

41.      Acrescento que a ideia de um órgão jurisdicional unificado foi inicialmente ponderada pelo legislador (39) sendo a atribuição da competência aos órgãos jurisdicionais nacionais, que acabou por ser acolhida, um compromisso. Tal milita a favor de uma interpretação que limita a dispersão do contencioso relativa este título de propriedade intelectual uniforme. O objetivo de evitar que sejam proferidas decisões contraditórias, é, aliás, expressamente referido no preâmbulo do Regulamento sobre a marca comunitária (40).

42.      Outro dos objetivos deste regulamento, que resulta dos trabalhos preparatórios (41), consiste na luta contra o «forum shopping». Tal milita também contra uma interpretação extensiva segundo a qual é possível demandar uma pessoa suspeita de ter participado na prática de um ato de contrafação com base em qualquer elemento de conexão que possa ter uma ligação com a atividade ilícita de outra pessoa, que não foi demandada judicialmente.

43.      Por fim, importa saber se os princípios orientadores definidos pelo Tribunal de Justiça na interpretação do Regulamento Bruxelas I (42) justificam uma interpretação contrária do artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária. Em minha opinião, tendo em conta as especificidades desse critério de competência acima descritas tal não pode acontecer no caso em apreço. Parece‑me que, no contexto próprio da proteção do título de propriedade intelectual unificado que constitui a marca comunitária, o legislador identificou prioridades, principalmente ligadas à concentração do litígio perante os órgãos jurisdicionais de um só Estado‑Membro, a saber, aquele em que a contrafação foi cometida ou poderá vir a ser cometida.

44.      Por conseguinte, a meu ver, importa responder à primeira questão prejudicial no sentido de que, para que se considere que uma alegada contrafação ocorreu num Estado‑Membro, na aceção do artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária, e permitir assim fundar a competência dos tribunais deste Estado‑Membro, não basta que o réu tenha participado indiretamente, através de um ato praticado noutro Estado‑Membro, na violação dos direitos relativos à marca comunitária cometida no primeiro Estado‑Membro por um terceiro, que não é réu na ação judicial.

C –    Quanto à interpretação do artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I

–       Considerações preliminares

45.      A segunda questão refere‑se à questão de saber se o artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I deve ser interpretado no sentido de que permite determinar uma competência jurisdicional no que diz respeito a um dos presumidos autores do alegado dano, embora esse réu não tenha atuado na área de jurisdição do órgão jurisdicional chamado a decidir, quando o ato ilícito que lhe é imputado foi cometido noutro Estado‑Membro e consiste na participação num «facto principal» (43) cometido no Estado‑Membro do referido órgão jurisdicional por outro presumido autor.

46.      A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio, a Coty Germany, assim como os Governos alemão e suíço pronunciaram‑se a favor da adoção de tal critério de competência baseado na conexão com a atuação de um terceiro. O Governo do Reino Unido adotou uma posição mais moderada, dado que propôs submeter esta possibilidade a exigências mais detalhadas, a saber, que a competência só seja admitida se existir uma ligação suficientemente clara e direta entre o alegado ato ilícito cometido no Estado‑Membro do órgão jurisdicional chamado a decidir e as atividades do réu noutro Estado‑Membro. Em contrapartida, a First Note Perfumes e a Comissão pronunciaram‑se contra esta opção.

–       Ensinamentos da jurisprudência

47.      Antes de mais, há que recordar que as disposições do Regulamento Bruxelas I devem ser interpretadas de forma autónoma, por referência ao sistema e aos objetivos deste (44).

48.      Nos termos do considerando 11, «as regras de competência [previstas no referido regulamento] devem apresentar um elevado grau de certeza jurídica e devem articular‑se em torno do princípio de que em geral a competência tem por base o domicílio do requerido e que tal competência deve estar sempre disponível, exceto em alguns casos bem determinados em que a matéria em litígio ou a autonomia das partes justificam outro critério de conexão».

49.      Assim, só em derrogação do princípio fundamental enunciado no artigo 2.°, n.° 1, do Regulamento Bruxelas I, que atribui uma competência geral aos órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro no território do qual o réu tem domicílio, é que o capítulo II, secção 2, desse regulamento prevê um determinado número de atribuições de competências especiais, de entre as quais a prevista no artigo 5.°, ponto 3, do referido regulamento (45).

50.      No que se refere, em especial, à regra de competência prevista no referido artigo 5.°, ponto 3, o Tribunal de Justiça já declarou que a mesma se baseia na existência de um elemento de conexão especialmente estreito entre a contestação e os órgãos jurisdicionais do lugar onde o dano ocorreu ou poderá vir a ocorrer, que justifique uma atribuição de competência a estes últimos por razões de boa administração da justiça e de organização útil do processo (46), em conformidade com a orientação dada pelo considerando 12 do Regulamento Bruxelas I. Com efeito, a identificação do lugar do facto causal deve permitir determinar a competência do órgão jurisdicional que está objetivamente em melhor posição para apreciar se estão reunidos os elementos constitutivos da responsabilidade da pessoa demandada (47).

51.      Enquanto regra de competência especial, de carácter derrogatório, esta disposição deve ser objeto de uma interpretação estrita e, por conseguinte, não permite uma interpretação que não abranja as hipóteses consideradas de expressamente consagradas (48), dado que não pode admitir‑se a inversão da regra geral relativa à competência dos órgãos jurisdicionais do domicílio do réu.

52.      No entanto, em conformidade com a jurisprudência constante do acórdão Mines de Potasse d’Alsace, já referido, a expressão «lugar onde ocorreu ou poderá ocorrer o facto danoso» referida no artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I abrange simultaneamente o lugar da materialização do dano e o lugar do facto causal que está na origem desse dano (49).

53.      Ora, o Tribunal de Justiça já deu uma resposta parcialmente negativa à segunda questão submetida no presente processo no que diz respeito a um desses elementos de conexão, a saber, o lugar do facto causal, a respeito do qual foi excluída uma competência apenas baseada numa imputação por cumplicidade. Com efeito, resulta do acórdão Melzer, já referido, que «o artigo 5.°, n.° 3, do Regulamento [Bruxelas I] deve ser interpretado no sentido de que não permite determinar, com base no lugar do facto gerador imputado a um dos presumidos autores de um dano, que não é parte no litígio, a competência jurisdicional contra um outro presumido autor do referido dano que não agiu na área de jurisdição do tribunal chamado a decidir».

54.      É certo que ao referir‑se ao conceito de «lugar onde ocorreu o dano», o órgão jurisdicional de reenvio parece visar, na segunda questão, tanto o lugar do facto causal como o lugar da materialização do dano. Com efeito, considerando a matéria de facto do litígio no processo principal, a competência dos órgãos jurisdicionais alemães pode basear‑se quer num quer noutro desses critérios, sob reserva da possibilidade de serem tidos em conta, no que diz respeito à First Note Perfumes, os atos cometidos na Alemanha por Stefan P.

55.      Todavia, há que observar que este órgão jurisdicional não pôde tomar em consideração as contribuições do acórdão Melzer, já referido, uma vez que o mesmo foi proferido em data posterior à apresentação do pedido de decisão prejudicial. Assim, não obstante a formulação genérica da questão submetida, as minhas observações infra limitar‑se‑ão ao critério de competência relativo ao lugar onde o dano ocorreu (50), na medida em que o outro aspeto do problema suscitado, no presente processo já foi tratado pelo Tribunal de Justiça no processo Melzer.

56.      O Tribunal de Justiça pronunciou‑se igualmente a respeito da conexão resultante do lugar da materialização do dano, num acórdão ainda mais recente, numa matéria específica, a saber, uma ilicitude que consiste na violação dos direitos de autor. Com efeito, nos termos do acórdão Pinckney, já referido, «o artigo 5.°, n.° 3, do regulamento [Bruxelas I] deve ser interpretado no sentido de que, em caso de alegada violação dos direitos patrimoniais de autor garantidos pelo Estado‑Membro do órgão jurisdicional chamado a decidir, este é competente para conhecer de uma ação de responsabilidade intentada pelo autor de uma obra contra uma sociedade estabelecida noutro Estado‑Membro e que reproduziu, nesse Estado‑Membro, a referida obra num suporte material que é vendido em seguida, por sociedades estabelecidas num Estado‑Membro terceiro, através de um sítio Internet acessível também no território do órgão jurisdicional chamado a decidir. Esse órgão jurisdicional só é competente para conhecer do dano causado no território do Estado‑Membro em que se encontra». Importa também retirar daqui consequências, desde que a transposição dessa solução seja possível no presente processo.

–       Apreciação da eventual extensão da competência com base no lugar da materialização do dano causado também por um terceiro independente

57.      A segunda questão prejudicial, conforme reformulada à luz dos acervos jurisprudenciais acima expostos, convida, no essencial, o Tribunal de Justiça, a decidir a respeito da questão de saber se o artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I deve ser interpretado no sentido de que, com base no lugar da materialização do dano cujo facto gerador é imputado a um dos seus presumidos autores, pode determinar‑se a competência jurisdicional relativamente a outro presumido autor do referido dano, que, quanto a ele, não atuou na área de jurisdição do órgão jurisdicional chamado a decidir.

58.      Há que salientar que, no que diz respeito ao princípio da interpretação autónoma de que as disposições do Regulamento Bruxelas I devem ser objeto, importa distinguir claramente, por um lado, as condições de aplicação da responsabilidade extracontratual relativas à apreciação do mérito do processo segundo a lei aplicável ao litígio e, por outro, os elementos de conexão espaciais pertinentes na fase da determinação da competência jurisdicional de acordo com os conceitos que constam do referido regulamento. Em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça (51), não existe adequação sistemática entre esses dois grupos de normas, de modo que não basta, a meu ver, para que um órgão jurisdicional possa declarar‑se competente com fundamento no artigo 5.°, ponto 3, desse regulamento, nomeadamente com base no lugar da materialização do dano, não basta que o direito aplicável ou a lei do foro admita a indemnização de um certo tipo de dano ou segundo modalidades específicas, tais como a imputação ao réu de atos cometidos por um terceiro, que aquele réu terá ajudado, como é ponderado pelo órgão jurisdicional de reenvio.

59.      Se esta abordagem fosse admitida relativamente ao conceito de lugar da materialização do dano na aceção do artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I, o Tribunal de Justiça estaria confrontado com a necessidade de criar um «limiar» quantitativo e/ou qualitativo de imputação a partir do qual, em caso de pluralidade de intervenientes no ato ilícito, um deles poderia ou não ser demandado judicialmente com base no lugar da materialização do dano resultante, entre outros, da sua ação. Este problema específico não se colocava no processo Melzer, já referido, dado que, tratando‑se do lugar gerador do dano, o ato de cada autor que atuou em Estados‑Membros diferentes podia mais facilmente ser espacialmente isolado do que se fosse relativo ao lugar da materialização do dano. A este respeito, embora a matéria de facto do presente litígio no processo principal permita distinguir manifestamente entre a responsabilidade principal e a responsabilidade acessória (52), importa não esquecer que outras configurações podem revelar‑se mais complexas, tanto no plano quantitativo (53) como no plano qualitativo (54).

60.      Quanto a este último ponto, recordo que o Governo do Reino Unido propõe subordinar a adoção do critério de competência em causa a um critério relativo à existência de uma «ligação suficientemente clara e direta» entre as atividades do réu num primeiro Estado‑Membro e o alegado ato ilícito cometido por um terceiro no Estado‑Membro do órgão jurisdicional que foi chamado a decidir, sugerindo em seguida uma aplicação concreta à luz das circunstâncias do litígio no processo principal (55). No entanto, a abordagem do problema nessa perspetiva pressupõe a definição de critérios materiais difíceis de delimitar (56) existindo aqui um risco de que, em cada caso, se deva proceder em cada caso a uma apreciação factual, complexa e extensa, semelhante a uma análise do mérito do litígio. Em minha opinião, tal é contrário ao objetivo do Regulamento Bruxelas I que é definir regras de competências que sejam simultaneamente comuns a todos os Estados‑Membros e previsíveis para as partes num litígio (57), e, por conseguinte, de uso tanto certo como rápido.

61.      Além disso, parece‑me legítimo recear que uma interpretação tão extensiva do artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I como a invocada pela Coty Germany dê origem à generalização do forum actoris e favoreça assim o forum shopping. Ora, como o Tribunal de Justiça salientou (58), ao ter em conta a competência geral dos órgãos jurisdicionais do domicílio do réu, o legislador da União optou por um princípio que deve ter o mínimo de exceções possíveis. Além disso, uma multiplicação dos foros competentes tem o inconveniente de acentuar o risco de decisões inconciliáveis que o Regulamento Bruxelas I tem precisamente o objetivo de evitar (59), recorde‑se que um reconhecimento mútuo das decisões é impossível neste caso (60).

62.      No presente caso, em minha opinião, não se justifica uma derrogação baseada na existência de um elemento de conexão especialmente estreito entre o litígio e os órgãos jurisdicionais do lugar onde ocorreu o dano. Com efeito, caso a competência dos órgãos jurisdicionais alemães fosse admitida apenas com base no fundamento de uma conexão com os atos cometidos na Alemanha por um terceiro, presumido autor do alegado ato ilícito principal, tal conduziria a um resultado contrário à referida justificação. Concretamente, esses órgãos jurisdicionais seriam levados a apreciar a responsabilidade de um demandado que alegadamente participara neste ato ilícito por atos unicamente cometidos noutro Estado‑Membro.

63.      Pode temer‑se que esta interpretação extensiva incentive estratégias contenciosas que, no caso das alegadas vítimas, consistam em apenas demandar a parte contrária mais solvente perante um tribunal da área de jurisdição em que se situa um dos elementos de conexão ligados à atividade de outra pessoa que participou na produção do alegado dano. Ora, por este intermédio, um demandante pode facilmente contornar o dispositivo especificamente previsto no artigo 6.°, ponto 1, do Regulamento Bruxelas I (61), destinado a consolidar um contencioso multipartes e evitar a prolação de decisões inconciliáveis nesse caso (62). O risco geral dessas atuações não pode ser esquecido, apesar de, no caso em apreço, a razão pela qual a demandada não demandou o terceiro, alegado autor do ato ilícito principal, se prenda com a celebração de um acordo extrajudicial com aquele (63).

64.      Assim, parece‑me que o lugar da materialização do dano causado através de atos voluntários cometidos por pessoas que não o réu, numa alegada cadeia de causalidades, não pode constituir, por si só, um critério de competência relativamente a esse réu, tanto mais que o alcance dessa cadeia não está claramente delimitado podendo a mesma, por conseguinte, ser infinita. Por outras palavras, o artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I, não deve, a meu ver, permitir demandar o presumido responsável por um alegado ato ilícito perante um órgão jurisdicional de um Estado‑Membro onde não tem domicílio apenas pelo facto de outro ato ilícito, cometido por um terceiro que não foi demandado, ter produzido o seu efeito danoso neste Estado‑Membro e de o ato do réu ter tornado possíveis os atos que esse terceiro decidiu cometer subsequentemente.

65.      Parece‑me que esta posição se insere perfeitamente na linha de interpretação traçada pelo Tribunal de Justiça no acórdão Melzer, já referido, cujo teor pode, a meu ver, ser generalizado, de modo que uma extensão da competência jurisdicional contra um dos presumidos autores de um dano que não cometeu atos ilícitos na área de jurisdição do órgão jurisdicional chamado a decidir não possa ser admitida, nem com base no lugar do facto gerador imputado a um outro presumido autor, que não foi demandado judicialmente, nem com base no lugar da materialização do dano resultante do referido facto gerador. Com efeito, em minha opinião, para que um órgão jurisdicional possa declarar‑se competente, é preferível considerar que deve existir um nexo de causalidade suficiente, relativamente ao único réu demandado.

66.      Não obstante estas considerações, não posso deixar de constatar que, exceto se se considerar que a posição recentemente adotada pelo Tribunal de Justiça no acórdão Pinckney, já referido (64), é própria do caso especial em causa (65), a fundamentação desta decisão pode conduzir, no presente processo, a uma solução contrária à que parece poder decorrer do acórdão Melzer, já referido.

67.      Com efeito, no acórdão Pinckney, o Tribunal de Justiça declarou que «no que respeita à alegada violação de um direito patrimonial de autor, a competência para conhecer de uma ação em matéria extracontratual está já estabelecida, a favor do órgão jurisdicional chamado a decidir, uma vez que o Estado‑Membro em cujo território se encontra esse órgão jurisdicional protege os direitos patrimoniais invocados pelo requerente e o dano alegado corre o risco de se materializar no território do órgão jurisdicional chamado a decidir» (66).

68.      Se a extrapolação para outros tipos de ilícitos fosse admitida (67), esta lógica poderia, a meu ver, conduzir a que um órgão jurisdicional fosse competente com base no lugar da materialização do dano, uma vez que, como no presente litígio no processo principal, esse dano resulta do facto de a mercadoria presumida «pode[r]» ser disponibilizada aos consumidores no Estado‑Membro desse órgão jurisdicional e de este ato ser sancionado ao abrigo da responsabilidade civil por força da lex fori. À luz do acórdão Pinckney, já referido, não é relevante a circunstância de o ato alegadamente ilícito ter produzido efeitos, na área de jurisdição do órgão jurisdicional chamado a decidir, mas por causa da atuação de um terceiro independente, que atuou fora do Estado‑Membro, do foro e do demandante, e que não foi demandado judicialmente.

69.      Ora, tendo em conta que os factos na origem do presente processo apresentam semelhanças com os do processo Pinckney (68), e que não me parece que as diferenças existentes entre esses processos sejam determinantes (69), creio ser difícil encontrar argumentos que permitam um afastamento da via aí traçada no que diz respeito à identificação do lugar da materialização do dano na aceção do artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I.

70.      Por conseguinte, considero que caso, neste processo, o Tribunal de Justiça pretenda seguir a abordagem extensiva escolhida no acórdão Pinckney, já referido, deve responder pela afirmativa à segunda questão prejudicial, nos termos abaixo indicados. No entanto, para ser exaustivo, formulo igualmente, a título subsidiário, uma proposta de resposta negativa, caso o Tribunal de Justiça considere, pelo contrário, que a posição adotada no referido acórdão era específica à situação no processo que lhe deu origem.

IV – Conclusão

71.      Atendendo às considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça responda à questão prejudicial submetida pelo Bundesgerichtshof do seguinte modo:

«1)      O artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de dezembro de 1993, sobre a marca comunitária deve ser interpretado no sentido de que não permite estabelecer, com base no lugar da contrafação de uma marca comunitária imputada a um dos seus presumidos autores, uma competência jurisdicional relativamente a um outro presumido autor da referida contrafação que não atuou na área de jurisdição do órgão jurisdicional chamado a decidir.

2)       O artigo 5.°, n.° 3, do Regulamento (CE) n.° 44/2001 do Conselho, de 22 de dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, deve ser interpretado no sentido de que permite estabelecer uma competência jurisdicional, com base no lugar da materialização do dano cuja origem é imputada a um dos presumidos autores desse dano, relativamente a outro presumido autor do referido dano que não atuou na área de jurisdição do órgão jurisdicional chamado a decidir.

A título subsidiário:

O artigo 5.°, n.° 3, do Regulamento (CE) n.° 44/2001 do Conselho, de 22 de dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, deve ser interpretado no sentido de que não permite estabelecer, nem com base no lugar do facto gerador do dano imputado a um dos seus presumidos autores, nem com base no lugar da materialização desse dano, uma competência jurisdicional relativamente a outro presumido autor do referido dano que não atuou na área de jurisdição do órgão jurisdicional chamado a decidir.»


1 —      Língua original: francês.


2 —      JO L 11, p. 1 (a seguir «Regulamento sobre a marca comunitária»).


3 —      JO 2001, L 12, p. 1 (a seguir «Regulamento Bruxelas I»).


4 —      V. acórdãos de 16 de maio de 2013, Melzer (C‑228/11) e de 3 de outubro de 2013, Pinckney (C‑170/12), bem como processo Hi Hotel HFC (C‑387/12) pendente no Tribunal de Justiça.


5 —      Anteriormente Coty Prestige Lancaster Group GmbH.


6 —      Resulta dos autos que a Coty Germany afirma ter concluído um acordo extrajudiciário com Stefan P. que consiste numa renúncia à propositura de ações judiciais contra ele na condição de ele pôr termo às práticas censuradas, sob pena de sanções penais, precisando‑se que o tribunal alemão ouviu este último como testemunha no processo instaurado contra a First Note Perfumes.


7 —      O artigo 93.° do referido regulamento é intitulado «Competência internacional». O seu n.° 5 prevê, nomeadamente, «[o]s processos resultantes das ações e pedidos referidos no artigo 92.° [, inclusive as ações de contrafação,] […] podem ser igualmente intentados nos tribunais dos Estados‑Membros em cujo território a contrafação tenha sido cometida, ou esteja em vias de ser cometida».


8 —      Esta disposição define os contornos do «direito exclusivo» de que beneficia o titular da marca.


9 —      A saber, uma publicidade comparativa desleal na aceção do artigo 6.°, n.os 1 e 2, ponto 6, da lei alemã contra a concorrência desleal (Gesetz gegen den unlauteren Wettbewerb, UWG), bem como uma imitação desleal na aceção do artigo 4.°, ponto 9, alínea a) e b), desta mesma lei.


10 —      A referida disposição prevê uma regra de competência especial segundo a qual «em matéria extracontratual», «[u]ma pessoa com domicílio no território de um Estado‑Membro pode ser demandada noutro Estado‑Membro […] perante o tribunal do lugar onde ocorreu ou poderá ocorrer o facto danoso».


11 —      Regulamento do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009, sobre a marca comunitária, JO L 78, p. 1, entrado em vigor em 13 de abril de 2009.


12 —      Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2012, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, JO L 351, p. 1. Em conformidade com o seu artigo 81.°, este regulamento é aplicável a partir de 10 de janeiro de 2015, exceto no que diz respeito aos artigos 75.° e 76.°


13 —      Acórdão de 30 de novembro de 1976 (21/76, Colet., p. 677, Recueil p. 1735).


14 —      Convenção relativa à competência jurisdicional e à execução de decisões em matéria civil e comercial, assinada em 27 de setembro de 1968 (JO 1972, L 299, p. 32), conforme alterada pelas sucessivas convenções relativas à adesão de novos Estados‑Membros a esta convenção (a seguir «Convenção de Bruxelas»).


15 —      A transposição da jurisprudência Mines de Potasse d’Alsace é justificada devido ao carácter semelhante das disposições em causa (v., nomeadamente, acórdão de 25 de outubro de 2012, Folien Fischer e Fofitec, C‑133/11, n.os 31 e 32).


16 —      «Handlungsort», em língua alemã, ou lugar do facto gerador do dano.


17 —      «Erfolgsort», em língua alemã, ou lugar da produção do dano.


18 —      V., nomeadamente, a jurisprudência e a doutrina alemãs referidas por Magnus, U., e Mankowski, P., European Commentaries on Private International Law, Brussels I Regulation, 2a ed., Sellier, Munique, 2012, p. 247, nota 1380.


19 —      Em conformidade com o artigo 68.°, n.° 2, do Regulamento Bruxelas I.


20 —      Ações relativamente às quais os tribunais de marcas comunitárias têm competência material exclusiva nos termos desse artigo 92.°


21 —      Pode constatar‑se um certo paradoxo no facto de o artigo 90.°, do Regulamento sobre a marca comunitária se referir essencialmente às regras de competência judiciária «de direito comum» previstas no Regulamento Bruxelas I antes de, na extensa lista referida no artigo 92.°, excluir do âmbito de aplicação deste último a maior parte das ações que na prática podem surgir relativamente a marcas comunitárias (Gastinel, E., La marque communautaire, LGDJ, Paris, 1998, p. 203, n.° 395).


22 —      O n.° 1 desse artigo prevê a competência de princípio dos tribunais do Estado‑Membro em que o réu tem o seu domicílio ou estabelecimento, como no artigo 2.° do Regulamento Bruxelas I. O n.° 2 inova, pelo contrário, profundamente, no que diz respeito ao referido regulamento ao prever que os órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro onde o demandante tem o domicílio são competentes quando o réu não tem domicílio nem estabelecimento na União. O n.° 3 prevê a competência subsidiária dos tribunais do Estado‑Membro da sede do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), em Alicante (Espanha). O n.° 4 permite derrogar essas regras de competência expressas ou tácitas, como no Regulamento Bruxelas I.


23 —      O teor desta disposição é recordado na nota 7 das presentes conclusões.


24 —       Que figura no artigo 90.°, n.° 2, alínea a), do Regulamento sobre a marca comunitária.


25 —      V., nomeadamente, o «Memorandum on the creation of an EEC trade mark» adotado em 6 de julho de 1976 pela Comissão [SEC(76)2462, p. 36, n.os 155 e 156].


26 —      V. o documento de trabalho da Comissão de outubro de 1979 e intitulado «The need for a European trade mark System. Competence of the European Community to create one» (III/D/1294/79‑EN).


27 —      Desde a primeira proposta de regulamento, apresentada em 25 de novembro de 1980 [COM(80)635 final], foi tida em conta a conexão com o lugar onde a contrafação foi cometida, precisando‑se que esta foi posteriormente alargada aos casos em que a contrafação pode vir a ser cometida. O mesmo se verifica no que diz respeito à limitação do alcance da competência daí resultante, aos factos alegadamente cometidos no território do Estado‑Membro, cujos órgãos jurisdicionais são, assim, designados.


28 —      As alterações sucessivas deste texto recenseadas através do site do IHMI (http://oami.europa.eu/ows/rw/pages/CTM/legalReferences/originalRegulations.fr.do), não afetaram esta disposição, exceto, simplesmente, no que respeita a uma nova numeração.


29 —      V., por exemplo, o artigo 82.°, n.° 5, do Regulamento (CE) n.° 6/2002 do Conselho, de 12 de dezembro de 2001, relativo aos desenhos ou modelos comunitários (JO L 3, p. 1), que reproduz o critério de competência referido no artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária.


30 —      O artigo 101.°, n.° 3, do Regulamento, do Conselho, de 27 de julho de 1994, relativo ao regime comunitário de proteção das variedades vegetais (JO L 227, p. 1) dispõe que «[o]s processos relativos a ações de infração podem igualmente ser intentados nos tribunais do local em que foi cometido o ato impugnado», tal como o artigo 5.°, ponto 3, da Convenção de Bruxelas.


31 —      O Tribunal de Justiça pôs em evidência que «com a sua formulação genérica, se compreende que o n.° 3 do artigo 5.° da convenção [de Bruxelas] abrange os mais variados tipos de responsabilidade» (n.° 18 do acórdão Mines de Potasse d’Alsace, já referido).


32 —      V., neste sentido, Tritton, G., Intellectual Property in Europe, Sweet & Maxwell, Londres, 2002, p. 1025, n.os 13—101.


33 —      O artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I confere uma competência de um alcance mais amplo do que a do artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento sobre a marca comunitária, que a limita aos factos ocorridos no território do Estado‑Membro do órgão jurisdicional chamado a decidir (v. igualmente, artigo 94.°, n.° 2, deste último regulamento). O primeiro desses textos prevê uma competência especial ao designar um tribunal em particular, quando o segundo se destina de forma geral «[a]os tribunais do Estado‑Membro» pertinente. Além disso, o primeiro não inclui a competência no que diz respeito a um réu que tem o domicílio fora da União, contrariamente ao segundo.


34 —      V., nomeadamente, Fawcett, J., e Torremans, P., Intellectual Property and Private International Law, Clarendon Press, Oxford, 1998, p. 330; Huet, A., «La marque communautaire: la compétence des juridictions des États membres pour connaître de sa validité et de sa contrefaçon (Règlement CE n.° 40/94 du Conseil du 20 décembre 1993)», J. D. I., 1994, 3, p. 635.


35 —      Os objetivos quanto à «certeza» das regras de competência e à necessidade de «facilitar uma boa administração da justiça», que não constavam da Convenção de Bruxelas, são referidos nos considerandos 11 e 12 do referido regulamento.


36 —      A este respeito, M. Desantes Real salienta que o referido artigo 93.°, n.° 5, consagra grande importância ao princípio da territorialidade na medida em que, normalmente, o facto ilícito ocorre apenas num Estado e que se for cometido em vários, há que dividir as ações («La marca comunitaria y el Derecho internacional privado», Marca y Diseño Comunitarios, Arazandi, Pampelune, 1996, p. 225).


37 —      O segundo considerando do referido regulamento salienta que uma marca comunitária goza de uma proteção uniforme e produz os seus efeitos em todo território da União.


38 —      Neste sentido, na página 31 do seu documento de trabalho relativo ao projeto de regulamento sobre a marca comunitária (referido na nota de rodapé n.° 26 das presentes conclusões), a Comissão indicou que «[t]he system instituted by the Judgments Convention fails, however, to solve the special problems which arise where one Community trade mark can be infringed in several Member States» (palavra sublinhada no texto).


39 —      V. p. 36, ponto 156, do memorando referido na nota 25 das presentes conclusões.


40 —      Segundo o décimo quinto considerando, «é indispensável que as decisões sobre […] a contrafação das marcas comunitárias produzam efeitos em toda a Comunidade e a ela sejam extensivas, única maneira de evitar decisões contraditórias dos tribunais e do instituto e de respeitar o carácter unitário das marcas comunitárias». V. também o décimo sexto considerando.


41 —      V. p. 76 da proposta de regulamento referida na nota 27 das presentes conclusões.


42 —      Referidas no n.° 34 das presentes conclusões.


43 —      Em conformidade com a qualificação adotada pelo órgão jurisdicional de reenvio.


44 —      V., nomeadamente, acórdãos já referidos Melzer (n.° 22 e jurisprudência citada) e Pinckney (n.° 23).


45 —      Acórdãos já referidos Melzer (n.° 23) e Pinckney (n.° 24).


46 —      Acórdãos já referidos Melzer (n.° 26 e jurisprudência citada) e Pinckney (n.° 27).


47 —      Acórdãos já referidos Melzer (n.° 28 e jurisprudência citada) e Pinckney (n.° 28).


48 —      Acórdãos já referidos Melzer (n.° 24 e jurisprudência citada) e Pinckney (n.° 25).


49 —      Acórdãos já referidos Melzer (n.° 25 e jurisprudência citada) e Pinckney (n.° 26).


50 —      No processo Pinckney, a questão era também de saber se um órgão jurisdicional podia declarar‑se competente com base na materialização do dano (v. acórdão Pinckney, já referido, n.° 29), mas em circunstâncias diferentes das do presente litígio no processo principal uma vez que se tratava de uma violação dos direitos patrimoniais do autor, através de um sítio Internet acessível na área de jurisdição do órgão jurisdicional chamado a decidir, na qual os direitos do autor eram protegidos.


51 —      Assim, o Tribunal de Justiça considerou de forma constante que só eram competentes os órgãos jurisdicionais do lugar do prejuízo direto, embora o dano indireto seja indemnizável por força da lei do foro ou da lei aplicável no mérito do processo. V. no que se refere à indemnização de um dano sofrido por ricochete, acórdão de 11 de janeiro de 1990, Dumez France e Tracoba (C‑220/88, Colet., p. I‑49) e no que se refere ao dano consecutivo a um dano inicial sofrido pela vítima noutro Estado‑Membro, acórdão de 19 de setembro de 1995, Marinari (C‑364/93, Colet., p. I‑2719, n.os 16 a 19).


52 —      Ao qualificá‑la de «participação no facto ilícito […] principal», o órgão jurisdicional de reenvio explicita que a situação considerada é a de um dano que resulta indiretamente dos atos da demandada mas diretamente dos atos do terceiro que é considerado como o autor principal.


53 —      Assim, importa colocar a questão de saber se a posição do Tribunal de Justiça deve ser a mesma em caso de coautoria perfeita, isto é, em caso de igual nexo de causalidade, ou na hipótese de dois indivíduos participarem diretamente mas em diferentes proporções.


54 —      Admitindo que o artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I permite, em alguns casos, demandar uma das pessoas que presumidamente participou na prática do alegado ato ilícito, no Estado‑Membro do lugar da materialização do dano, o Tribunal de Justiça deveria dar uma definição precisa da natureza da imputação que autoriza essa competência por conexão.


55 —      Este governo precisa que, tendo em conta a matéria de facto no presente processo, este critério pressupõe que o demandante esteja em condições de determinar que, quando o réu vendeu os produtos ao terceiro em causa num Estado‑Membro, sabia efetivamente, ou podia ter razoavelmente previsto, que esta venda teria como consequência direta o ato ilícito alegado cometido por esse terceiro noutro Estado‑Membro.


56 —      Além do critério proposto pelo Governo do Reino Unido, outros critérios podem ser tidos em conta, como o da previsibilidade do dano e do lugar onde se materializou, ou da existência de uma intenção voluntária do réu quando contribuiu para a realização do ato ilícito alegado.


57 —      O objetivo da segurança jurídica, que inclui a previsibilidade do órgão jurisdicional competente, foi tido em conta no acórdão Melzer, já referido (n.° 35) e salientado no considerando 16 da nova versão do Regulamento Bruxelas I do Regulamento n.° 1215/2012.


58 —      Tratando‑se já da Convenção de Bruxelas, v. acórdãos, já referidos, Dumez France e Tracoba (n.° 19) e Marinari (n.° 13).


59 —      Em conformidade com o considerando 15 desse regulamento, «[o] funcionamento harmonioso da justiça a nível comunitário obriga a minimizar a possibilidade de instaurar processos concorrentes e a evitar que sejam proferidas decisões inconciliáveis em dois Estados‑Membros competentes».


60 —      O artigo 34.°, ponto 3, desse regulamento prevê que o carácter inconciliável de uma decisão judiciária com outra é motivo de recusa do reconhecimento fora do Estado‑Membro no qual esta foi adotada.


61 —      De acordo com o artigo 6.°, ponto 1, uma pessoa pode também ser demandada «se houver vários requeridos, perante o tribunal do domicílio de qualquer um deles, desde que os pedidos estejam ligados entre si por um nexo tão estreito que haja interesse em que sejam instruídos e julgados simultaneamente para evitar soluções que poderiam ser inconciliáveis se as causas fossem julgadas separadamente»


62 —      Tanto a First Note Perfumes como a Comissão salientam que os órgãos jurisdicionais alemães podiam facilmente fundamentar a sua competência no artigo 6.°, ponto 1, do Regulamento Bruxelas I se Stefan P. tivesse sido co‑demandado judicialmente.


63 —      V. nota 6 das presentes conclusões.


64 —      V. o dispositivo deste acórdão, citado no n.° 56.


65 —      O n.° 30 deste acórdão precisa que o Tribunal de justiça devia «determinar as condições em que, para efeitos do artigo 5.°, n.° 3, do Regulamento [Bruxelas I], o dano resultante de uma alegada violação dos direitos patrimoniais de um autor se materializa ou se pode materializar num Estado‑Membro diferente daquele em que o requerido reproduziu a obra do autor num suporte material que é vendido em seguida através de um sítio Internet acessível também no território do órgão jurisdicional chamado a decidir» (sublinhado por mim)


66 —      V. n.° 43 do referido acórdão (sublinhado meu).


67 —      Recorde‑se que o lugar da materialização do dano na aceção do artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I é todavia suscetível de variar em função da natureza do direito alegadamente violado (acórdão Pinckney, já referido, n.° 32).


68 —      A saber, que está em causa um ato alegadamente ilícito que foi cometido pelo réu noutro Estado‑Membro mas cujos efeitos se produziram no Estado‑Membro do órgão jurisdicional chamado a decidir na sequência das atuações autónomas de uma outra pessoa.


69 —      No acórdão Pinckney, já referido, foi salientado que o terceiro tinha comercializado discos compactos através de um sítio Internet acessível no Estado‑Membro do órgão jurisdicional chamado a decidir, mas parece‑me que esse órgão jurisdicional é igualmente, ou até a fortiori, competente se a venda dessas mercadorias tivesse sido realizada, como no caso em apreço, numa loja situada neste Estado‑Membro. No referido processo, o presumido ato ilícito dizia respeito a direitos de autor, protegidos pela legislação nacional aplicável, ao passo que, no caso em apreço, as alegações são relativas à marca comunitária, protegida em todo território da União, e à concorrência desleal, mas parece‑me que essas diferenças não têm relevância, dado que, o artigo 5.°, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I é aplicável a qualquer espécie de atos ilícitos.