Language of document : ECLI:EU:C:2019:982

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

19 de novembro de 2019 (*)

Índice


Quadro jurídico

Direito da União

Tratado UE

Carta

Diretiva 2000/78

Direito polaco

Constituição

Nova Lei sobre o Supremo Tribunal

— Disposições relativas à redução da idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)

— Disposições relativas à nomeação dos juízes no Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)

— Disposições relativas à Secção Disciplinar

Lei relativa à organização dos tribunais administrativos

Lei sobre o KRS

Litígios nos processos principais e questões prejudiciais

Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira questão nos processos C 624/18 e C625/18

Quanto às questões no processo C 585/18 e à segunda e terceira questões nos processos C624/18 e C625/18

Quanto à competência do Tribunal de Justiça

Quanto ao eventual não conhecimento do mérito

Quanto à admissibilidade da segunda e terceiras questões nos processos C 624/18 e C625/18

Quanto ao exame do mérito da segunda e terceira questões nos processos C 624/18 e C625/18

Quanto às despesas


«Reenvio prejudicial — Diretiva 2000/78/CE — Igualdade de tratamento em matéria de emprego e de trabalho — Não discriminação em razão da idade — Redução da idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal, Polónia) — Artigo 9.o, n.o 1 — Direito de recurso — Artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Tutela jurisdicional efetiva — Princípio da independência dos juízes — Criação de uma nova secção no Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal), competente nomeadamente no que respeita aos processos relativos à aposentação dos juízes desse órgão jurisdicional — Secção composta por juízes recentemente nomeados pelo presidente da República da Polónia sob proposta do Conselho Nacional da Magistratura — Independência do referido conselho — Poder de não aplicar a legislação nacional não conforme ao direito da União — Primado do direito da União»

Nos processos apensos C‑585/18, C‑624/18 e C‑625/18,

que têm por objeto três pedidos de decisão prejudicial apresentados, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Sąd Najwyższy (Izba Pracy i Ubezpieczeń Społecznych) [Supremo Tribunal (Secção do Trabalho e da Segurança Social), Polónia], por Decisões de 30 de agosto de 2018 (C‑585/18) e de 19 de setembro de 2018 (C‑624/18 e C‑625/18), que deram entrada no Tribunal de Justiça em 20 de setembro de 2018 (C‑585/18) e 3 de outubro de 2018 (C‑624/18 e C‑625/18), nos processos

A. K.

contra

Krajowa Rada Sądownictwa (C‑585/18),

e

CP (C‑624/18),

DO (C‑625/18)

contra

Sąd Najwyższy,

na presença de:

Prokurator Generalny, representado pela Prokuratura Krajowa,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente, R. Silva de Lapuerta, vice‑presidente, J.‑C. Bonichot, A. Prechal (relatora), E. Regan, P. G. Xuereb e L. S. Rossi, presidentes de secção, E. Juhász, M. Ilešič, J. Malenovský e N. Piçarra, juízes,

advogado‑geral: E. Tanchev,

secretário: M. Aleksejev, chefe de unidade, e R. Schiano, administrador,

vistos os autos e após as audiências de 19 de março e de 14 de maio de 2019,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação de A. K., CP e DO, por S. Gregorczyk‑Abram e M. Wawrykiewicz, adwokaci,

–        em representação do Krajowa Rada Sądownictwa, por D. Drajewicz, J. Dudzicz e D. Pawełczyk‑Woicka,

–        em representação do Sąd Najwyższy, por M. Wrzołek‑Romańczuk, radca prawny,

–        em representação do Prokurator Generalny, representado pela Prokuratura Krajowa, por S. Bańko, R. Hernand, A. Reczka, T. Szafrański e M. Szumacher,

–        em representação do Governo polaco, por B. Majczyna e S. Żyrek, na qualidade de agentes, assistidos por W. Gontarski, adwokat,

–        em representação do Governo letão, por I. Kucina e V. Soņeca, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão Europeia, por H. Krämer e por K. Herrmann, na qualidade de agentes,

–        em representação do Órgão de Fiscalização da EFTA, por J. S. Watson, C. Zatschler, I. O. Vilhjálmsdóttir e C. Howdle, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 27 de junho de 2019,

profere o presente

Acórdão

1        Os pedidos de decisão prejudicial têm por objeto a interpretação dos artigos 2.o e 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, do artigo 267.o, terceiro parágrafo, TFUE, do artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»), e do artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2000/78/CE do Conselho, de 27 de novembro de 2000, que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na atividade profissional (JO 2000, L 303, p. 16).

2        Estes pedidos foram apresentados no âmbito de litígios que opõem, por um lado, A. K., juiz no Naczelny Sąd Administracyjny (Supremo Tribunal Administrativo, Polónia) ao Krajowa Rada Sądownictwa (Conselho Nacional da Magistratura, Polónia) (a seguir «KRS») (processo C‑585/18) e, por outro, CP e DO, juízes no Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal, Polónia), a este último órgão jurisdicional (processos C‑624/18 e C‑625/18), a respeito da sua aposentação antecipada em consequência da entrada em vigor de uma nova legislação nacional.

 Quadro jurídico

 Direito da União

 Tratado UE

3        O artigo 2.o TUE tem a seguinte redação:

«A União funda‑se nos valores do respeito pela dignidade humana, da liberdade, da democracia, da igualdade, do Estado de direito e do respeito pelos direitos do Homem, incluindo os direitos das pessoas pertencentes a minorias. Estes valores são comuns aos Estados‑Membros, numa sociedade caracterizada pelo pluralismo, a não discriminação, a tolerância, a justiça, a solidariedade e a igualdade entre homens e mulheres.»

4        O artigo 19.o, n.o 1, TUE dispõe:

«O Tribunal de Justiça da União Europeia inclui o Tribunal de Justiça, o Tribunal Geral e tribunais especializados. O Tribunal de Justiça da União Europeia garante o respeito do direito na interpretação e aplicação dos Tratados.

Os Estados‑Membros estabelecem as vias de recurso necessárias para assegurar uma tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União.»

 Carta

5        O título VI da Carta, com a epígrafe «Justiça», inclui o artigo 47.o, com a epígrafe «Direito à ação e a um tribunal imparcial», que dispõe:

«Toda a pessoa cujos direitos e liberdades garantidos pelo direito da União tenham sido violados tem direito a uma ação perante um tribunal nos termos previstos no presente artigo.

Toda a pessoa tem direito a que a sua causa seja julgada de forma equitativa, publicamente e num prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial, previamente estabelecido por lei. […]

[…]»

6        Nos termos do artigo 51.o da Carta, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação»:

«1.      As disposições da presente Carta têm por destinatários as instituições, órgãos e organismos da União, na observância do princípio da subsidiariedade, bem como os Estados‑Membros, apenas quando apliquem o direito da União. Assim sendo, devem respeitar os direitos, observar os princípios e promover a sua aplicação, de acordo com as respetivas competências e observando os limites das competências conferidas à União pelos Tratados.

2.      A presente Carta não torna o âmbito de aplicação do direito da União extensivo a competências que não sejam as da União, não cria quaisquer novas atribuições ou competências para a União, nem modifica as atribuições e competências definidas pelos Tratados.»

7        O artigo 52.o, n.o 3, da Carta enuncia:

«Na medida em que a presente Carta contenha direitos correspondentes aos direitos garantidos pela Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais[, assinada em Roma em 4 de novembro de 1950], o sentido e o âmbito desses direitos são iguais aos conferidos por essa Convenção. Esta disposição não obsta a que o direito da União confira uma proteção mais ampla.»

8        As Anotações relativas à Carta dos Direitos Fundamentais (JO 2007, C 303, p. 17) precisam, no que respeita ao artigo 47.o, segundo parágrafo, da Carta, que esta disposição corresponde ao artigo 6.o, n.o 1, da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (a seguir «CEDH»).

 Diretiva 2000/78

9        O artigo 1.o da Diretiva 2000/78 dispõe:

«A presente diretiva tem por objeto estabelecer um quadro geral para lutar contra a discriminação em razão […] da idade […], no que se refere ao emprego e à atividade profissional, com vista a pôr em prática nos Estados‑Membros o princípio da igualdade de tratamento.»

10      O artigo 2.o, n.o 1, da referida diretiva prevê:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por “princípio da igualdade de tratamento” a ausência de qualquer discriminação, direta ou indireta, por qualquer dos motivos referidos no artigo 1.o»

11      O artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2000/78 enuncia:

«Os Estados‑Membros tomam as medidas necessárias para assegurar que todas as pessoas que se considerem lesadas pela não aplicação, no que lhes diz respeito, do princípio da igualdade de tratamento, possam recorrer a processos judiciais e/ou administrativos […] para exigir o cumprimento das obrigações impostas pela presente diretiva, mesmo depois de extintas as relações no âmbito das quais a discriminação tenha alegadamente ocorrido.»

 Direito polaco

 Constituição

12      Nos termos do artigo 179.o da Constituição, o presidente da República da Polónia (a seguir «presidente da República») nomeia os juízes, sob proposta do KRS, por um período indeterminado.

13      Nos termos do artigo 186.o, n.o 1, da Constituição:

«O [KRS] garante a autonomia dos tribunais e a independência dos juízes.»

14      O artigo 187.o da Constituição dispõe:

«1.      O [KRS] é composto:

1)      pelo primeiro presidente do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)], pelo ministro da Justiça, pelo presidente do [Naczelny Sąd Administracyjny (Supremo Tribunal Administrativo)] e por uma pessoa nomeada pelo presidente da República;

2)      por 15 membros selecionados de entre os juízes do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)], dos tribunais comuns, dos tribunais administrativos e dos tribunais militares;

3)      por 4 membros selecionados pelo [Sejm (Parlamento, Polónia)] de entre os seus deputados e 2 membros selecionados pelo Senado de entre os seus senadores.

[…]

3.      Os mandatos dos membros eleitos [da KRS] têm a duração de 4 anos.

4.      A estrutura organizacional, o âmbito da atividade e os mecanismos de trabalho do [KRS], bem como o modo de seleção dos seus membros, devem ser especificados pelo estatuto.»

 Nova Lei sobre o Supremo Tribunal

–       Disposições relativas à redução da idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)

15      O artigo 30.o da ustawa o Sądzie Najwyższym (Lei sobre o Supremo Tribunal), de 23 de novembro de 2002 (Dz. U. de 2002, posição 240), fixava a idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) nos 70 anos.

16      Em 20 de dezembro de 2017, o presidente da República promulgou a ustawa o Sądzie Najwyższym (Lei sobre o Supremo Tribunal), de 8 de dezembro de 2017 (Dz. U. de 2018, posição 5, a seguir «nova Lei sobre o Supremo Tribunal»), que entrou em vigor em 3 de abril de 2018. Esta lei foi alterada posteriormente várias vezes.

17      Nos termos do artigo 37.o da nova Lei sobre o Supremo Tribunal:

«§ 1.      Os juízes do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] são aposentados no dia do seu 65.o aniversário, salvo se, com uma antecedência máxima de doze meses e mínima de seis meses antes de completarem [65 anos] de idade, declararem que pretendem continuar a exercer as suas funções e apresentarem um atestado, que obedeça aos mesmos requisitos que os aplicáveis aos candidatos à magistratura judicial, que certifique que o seu estado de saúde lhes permite continuar a exercer as funções, e desde que o [presidente da República] conceda autorização para a prorrogação das suas funções no [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)].

§ 1a.      Antes de conceder essa autorização, o [presidente da República] solicita ao [KRS] que emita um parecer. O [KRS] transmite o seu parecer ao [presidente da República] no prazo de 30 dias a contar do dia em que este o convidou a fazê‑lo. Se o [KRS] não comunicar o seu parecer no prazo previsto na segunda frase, presume‑se que foi favorável.

§ 1b.      Para emitir o parecer referido no § 1a, o [KRS] toma em consideração o interesse do sistema judiciário ou um interesse social importante, em especial a afetação racional dos membros do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] ou as necessidades resultantes da carga de trabalho de certas secções do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)].

[…]

§ 4.      A autorização referida no § 1 é concedida por um período de três anos, renovável uma vez. […]»

18      O artigo 39.o da mesma lei dispõe:

«O [presidente da República] declara a data em que o juiz do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] se aposenta voluntária ou compulsivamente.»

19      Nos termos do artigo 111.o, § 1, da referida lei:

«Os juízes do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] que tenham completado 65 anos de idade na data de entrada em vigor da presente lei ou que completem essa idade no prazo de três meses a contar dessa data de entrada em vigor serão aposentados a partir do dia seguinte ao termo desse período de três meses, salvo se apresentarem, no prazo de um mês a contar da entrada em vigor da presente lei, a declaração e o atestado referidos no artigo 37.o, § 1, e se o [presidente da República] os autorizar a continuar a exercer as suas funções de juiz no [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)]. […]»

–       Disposições relativas à nomeação dos juízes no Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)

20      Nos termos do artigo 29.o da nova Lei sobre o Supremo Tribunal, os juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) são nomeados pelop da República, sob proposta do KRS. O artigo 30.o dessa lei enumera as condições que uma pessoa deve satisfazer para poder ser nomeado para o lugar de juiz no Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal).

–       Disposições relativas à Secção Disciplinar

21      A nova Lei sobre o Supremo Tribunal instituiu, no Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal), uma nova secção denominada «Izba Dyscyplinarna» (a seguir «Secção Disciplinar»).

22      O artigo 20.o da nova Lei sobre o Supremo Tribunal prevê:

«No que respeita à Secção Disciplinar e aos juízes que a compõem, as prerrogativas do primeiro presidente do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)], tal como definidas:

–        nos artigos 14.o, § 1, pontos 1, 4 e 7, 31.o, § 1, 35.o, § 2, 36.o, § 6, 40.o, §§ 1 e 4, e 51.o, §§ 7 e 14, devem ser exercidas pelo presidente do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)], que conduz os trabalhos da Secção Disciplinar;

–        no artigo 14.o, § 1, ponto 2 e no artigo 55.o, § 3, segundo período, devem ser exercidas pelo primeiro presidente do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] de comum acordo com o presidente do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)], que conduz os trabalhos da Secção Disciplinar.»

23      O artigo 27.o, § 1, da nova Lei sobre o Supremo Tribunal dispõe:

«São da competência da Secção Disciplinar os seguintes processos:

1)      processos disciplinares;

—      relativos a juízes do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)];

[…]

2)      processos no domínio do direito do trabalho e da segurança social relativos a juízes do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)];

3)      processos relativos à reforma compulsiva de um juiz do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)].»

24      O artigo 79.o da nova Lei sobre o Supremo Tribunal determina:

«Os processos no domínio do direito do trabalho e da segurança social relativos a juízes do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] e os processos relativos à aposentação de um juiz do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] devem ser julgados:

1)      em primeira instância — pelo [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] na composição de um juiz da Secção Disciplinar;

2)      em segunda instância — pelo [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] na composição de três juízes da Secção Disciplinar.»

25      Nos termos do artigo 25.o da nova Lei sobre o Supremo Tribunal:

«A Izba Pracy i Ubezpieczeń Społecznych (Secção do Trabalho e da Segurança Social) é competente para conhecer dos processos em matéria de direito do trabalho, da segurança social […]»

26      As disposições transitórias da nova Lei sobre o Supremo Tribunal incluem nomeadamente as seguintes disposições:

«Artigo 131.o

Enquanto não estiverem nomeados todos os juízes da Secção Disciplinar do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)], os outros juízes desse tribunal não podem ser transferidos para um lugar nessa secção.

[…]

Artigo 134.o

Na data de entrada em vigor da presente lei, os juízes do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] em funções na Secção do Trabalho, da Segurança Social e dos Assuntos Públicos tornam‑se juízes em funções na Secção do Trabalho e da Segurança Social.»

27      O artigo 131.o da nova Lei sobre o Supremo Tribunal foi alterado da seguinte forma pelo artigo 1.o, ponto 14, da ustawa o zmianie o ustawy o Sądzie Najwyższym (Lei que altera a Lei sobre o Supremo Tribunal), de 12 de abril de 2018 (Dz. U. de 2018, posição 847), que entrou em vigor em 9 de maio de 2018:

«Os juízes que, à data da entrada em vigor desta lei, exerçam funções noutras secções do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] podem ser transferidos para a Secção Disciplinar. Até ao dia em que todos os juízes do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] na Secção Disciplinar tenham sido nomeados pela primeira vez, o juiz que exercer funções noutra secção do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] deve apresentar ao [KRS] um pedido de transferência para um lugar na Secção Disciplinar, após ter obtido o acordo do primeiro presidente do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] e do presidente do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)], que deve conduzir os trabalhos da Secção Disciplinar e da secção em que o juiz que requer a transferência exerce funções. Até ao dia em que todos os lugares vagos na Secção Disciplinar estejam preenchidos pela primeira vez, o [presidente da República] nomeará um juiz do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] para essa secção, sob proposta do [KRS].»

 Lei relativa à organização dos tribunais administrativos

28      O artigo 49.o da ustawa — Prawo o ustroju sądów administracyjnych (Lei relativa à organização dos tribunais administrativos), de 25 de julho de 2002 (Dz. U. de 2017, posição 2188), prevê que, tratando‑se dos aspetos que não são regidos por essa mesma lei, são aplicáveis as disposições da nova Lei sobre o Supremo Tribunal.

 Lei sobre o KRS

29      O KRS é regulado pela ustawa o Krajowej Radzie Sądownictwa (Lei sobre o Conselho Nacional da Magistratura), de 12 de maio de 2011 (Dz. U. n.o 126 de 2011, posição 714), conforme alterada pela ustawa o zmianie ustawy o Krajowej Radzie Sądownictwa oraz niektórych innych ustaw (Lei que altera a Lei sobre o Conselho Nacional de Magistratura e Algumas Outras Leis) de 8 de dezembro de 2017 (Dz. U. de 2018, posição 3) (a seguir «Lei sobre o KRS»).

30      Nos termos do artigo 9a da Lei sobre o KRS:

«1.      O Parlamento elege, de entre os juízes do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)], dos tribunais comuns, dos tribunais administrativos e dos tribunais militares, 15 membros [do KRS] para um mandato conjunto de quatro anos.

2.      Ao proceder à eleição referida no n.o 1, o Parlamento tem em conta, tanto quanto possível, a necessidade de estarem representados no [KRS] juízes de tribunais de diferentes tipos e níveis.

3.      O mandato conjunto dos novos membros [do KRS], eleitos de entre os juízes, tem início no dia seguinte ao dia da sua eleição. Os membros cessantes [do KRS] desempenharão as suas funções até ao dia em que tem início o mandato conjunto dos novos membros [do KRS].»

31      Segundo o artigo 11a, n.o 2, da Lei sobre o KRS, os candidatos aos lugares de membros do KRS, escolhidos de entre os juízes, podem ser apresentados por um grupo de pelo menos 2 000 polacos ou por um grupo de pelo menos 25 juízes no ativo. O processo de designação dos membros do KRS pelo Parlamento é estabelecido no artigo 11d da Lei sobre o KRS.

32      Em conformidade com o artigo 34.o da Lei sobre o KRS, um grupo composto por três dos seus membros adota uma posição sobre a avaliação dos candidatos às funções de juiz.

33      O artigo 35.o da Lei sobre o KRS dispõe:

«1.      Havendo mais do que um candidato ao cargo de juiz ou de juiz estagiário, os responsáveis pela seleção devem elaborar uma lista de candidatos recomendados.

2.      Ao definir a ordem dos candidatos na lista, os responsáveis pela seleção devem ter em conta, em primeiro lugar, a avaliação das qualificações dos candidatos, e adicionalmente:

1)      a experiência profissional, incluindo a experiência na aplicação de disposições legais, a produção académica, os pareceres dos superiores, as recomendações, as publicações e outros documentos anexos ao formulário de candidatura;

2)      o parecer do kolegium (pleno) do tribunal competente e a avaliação da assembleia geral competente de juízes.

3.      A ausência dos documentos referidos no n.o 2 não deve obstar à elaboração de uma lista de candidatos recomendados.»

34      Nos termos do artigo 37.o, n.o 1, da Lei sobre o KRS:

«Se houver vários candidatos ao lugar de juiz, [o KRS] analisa e avalia conjuntamente todas as candidaturas apresentadas. Nessa situação, [o KRS] adota uma deliberação contendo as suas decisões quanto à apresentação de uma proposta de nomeação ao lugar de juiz, em relação a todos os candidatos.»

35      O artigo 44.o da Lei sobre o KRS dispõe:

«1.      Qualquer participante no processo pode interpor recurso para o [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] com base no facto de a deliberação [do KRS] ser ilegal, salvo disposições específicas em contrário. […]

1a.      Nos casos específicos relativos a uma nomeação para as funções de juiz do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)], é possível interpor recurso para o [Naczelny Sąd Administracyjny (Supremo Tribunal Administrativo)]. Nestes casos, não é possível recorrer para o [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)]. O recurso para o [Naczelny Sąd Administracyjny (Supremo Tribunal Administrativo)] não pode ter fundamento numa alegação relativa à avaliação incorreta do cumprimento pelos candidatos dos critérios tidos em consideração aquando da adoção de uma decisão quanto à apresentação da proposta de nomeação para as funções de juiz do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)].

1b.      Caso nem todos os participantes no processo tenham contestado a deliberação referida no artigo 37.o, n.o 1, em casos específicos relativos à nomeação para as funções de juiz do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)], a deliberação tornar‑se‑á definitiva na parte que compreende a decisão de apresentar a proposta de nomeação para as funções de juiz do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)], e na parte que compreende a decisão de não apresentar uma proposta de nomeação para as funções de juiz do mesmo tribunal, no caso de participantes no processo que não interpuseram recurso.

2.      O recurso é interposto por intermédio do Przewodniczący [Presidente do KRS], no prazo de duas semanas a contar da notificação da deliberação e respetiva fundamentação. […]»

36      Nos termos do artigo 6.o da Lei de 8 de dezembro de 2017 que altera a Lei sobre o KRS:

«O mandato dos membros [do KRS] referidos no artigo 187.o, n.o 1, ponto 2, da [Constituição], eleitos com base nas atuais disposições, deve durar até ao dia anterior ao início do mandato dos novos membros [do KRS], mas não deverá exceder os 90 dias a contar da data de entrada em vigor desta lei, salvo se tiver terminado previamente devido ao seu termo.»

 Litígios nos processos principais e questões prejudiciais

37      No processo C‑585/18, A. K, juiz do Naczelny Sąd Administracyjny (Supremo Tribunal Administrativo), tendo atingido a idade de 65 anos antes da data da entrada em vigor da nova Lei sobre o Supremo Tribunal apresentou, nos termos dos artigos 37.o, § 1, e 111.o, § 1, dessa lei, uma declaração informando da sua vontade de continuar a exercer as suas funções. Em 27 de julho de 2018, o KRS, ao abrigo do artigo 37.o, § 1a, da referida lei, emitiu um parecer negativo sobre esse pedido. Em 10 de agosto de 2018, A. K. interpôs no Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) um recurso desse parecer. Em apoio desse recurso A. K. alegou, nomeadamente, que a sua aposentação antecipada aos 65 anos violava o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE e o artigo 47.o da Carta, bem como a Diretiva 2000/78, designadamente o seu artigo 9.o, n.o 1.

38      Os processos C‑624/18 e C‑625/18 dizem respeito a dois juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal), CP e DO, que também atingiram a idade de 65 anos antes da data da entrada em vigor da nova Lei sobre o Supremo Tribunal, mas não apresentaram a declaração nos termos dos artigos 37.o, § 1, e 111.o, § 1, dessa lei. Tendo sido informados de que o presidente da República tinha, em aplicação do artigo 39.o da referida lei, declarado a sua aposentação a partir de 4 de julho de 2018, os interessados intentaram ações no Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal), pedindo que este declarasse que as suas relações de trabalho como juízes no ativo no referido órgão jurisdicional não se tinham transformado, a partir dessa data, em relações de trabalho de juízes desse tribunal aposentados. Em apoio dos seus pedidos invocam, designadamente, uma violação do artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 2000/78 que proíbe as discriminações em razão da idade.

39      A Izba Pracy i Ubezpieczeń Społecznych (Secção do Direito do Trabalho e da Segurança Social) do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) (a seguir «Secção do Trabalho e da Segurança Social»), na qual estão pendentes estes recursos, salienta, nas suas decisões de reenvio nos processos C‑624/18 e C‑625/18, que estes lhe tinham sido submetidos quando a Secção Disciplinar ainda não tinha sido constituída. Nestas condições, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta‑se se o artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2000/78 e o artigo 47.o da Carta lhe impõem que se afaste das disposições nacionais que reservam a competência para conhecer desses recursos a uma secção ainda não constituída. O referido órgão jurisdicional salienta, todavia, que esta questão pode deixar de ser pertinente em caso de atribuição efetiva dos lugares de juiz na Secção Disciplinar.

40      Além disso, nas suas decisões de reenvio nos processos C‑585/18, C‑624/18 e C‑625/18, o órgão jurisdicional considera que, tendo em conta, nomeadamente, as circunstâncias em que deve ocorrer a nomeação dos juízes da Secção Disciplinar, existem sérias dúvidas quanto à questão de saber se essa secção e os seus membros oferecem garantias suficientes de independência e de imparcialidade.

41      A este respeito, o referido órgão jurisdicional, que recorda que esses juízes são nomeados pelo presidente da República sob proposta do KRS, salienta, antes de mais, que, devido à reforma resultante da Lei de 8 de dezembro de 2017 que altera a Lei sobre o Conselho Nacional de Magistratura e algumas outras leis, os quinze membros do KRS que, dos vinte e cinco que o compõem, devem ser eleitos de entre os juízes, o são agora pelo Parlamento, e não já, como antes, pelas assembleias gerais dos juízes de todos os escalões. Segundo o tribunal de reenvio, esta situação desrespeita o princípio da separação de poderes enquanto fundamento do Estado de direito democrático e não é conforme com as normas internacionais e europeias que prevalecem na matéria, como resulta, em particular, da Recomendação CM/Rec(2010)12 do Comité de Ministros do Conselho da Europa relativa aos juízes: independência, eficiência e responsabilidade, de 17 de novembro de 2010, do Parecer n.o 904/2017 (CDL‑AD(2017)031) da Comissão Europeia para a Democracia pelo Direito (Comissão de Veneza), de 11 de dezembro de 2017, e do Parecer n.o 10 (2007) do Conselho Consultivo dos juízes europeus à atenção do Comité de Ministros do Conselho da Europa sobre o Conselho da Magistratura ao serviço da sociedade, de 23 de novembro de 2007.

42      Em seguida, tanto as condições, nomeadamente processuais, em que os membros da KRS foram selecionados e nomeados ao longo de 2018, como uma análise da forma como este órgão assim formado agiu até ao momento, revelam uma submissão do KRS ao poder político e uma inaptidão para exercer a sua missão constitucional que consiste em zelar pela independência dos órgãos jurisdicionais e dos juízes.

43      Por um lado, as recentes eleições dos novos membros do KRS não decorreram de forma transparente e existem dúvidas importantes quanto ao respeito efetivo, aquando da sua realização, das exigências estabelecidas pela legislação aplicável. A exigência de representatividade dos diferentes tipos e níveis de tribunais resultante do artigo 187.o, n.o 1, ponto 2, da Constituição não foi respeitada. Com efeito, o KRS não tem entre os seus membros nenhum juiz eleito proveniente do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal), dos tribunais de recurso ou dos órgãos jurisdicionais militares, contando com um representante de um tribunal administrativo de província, dois representantes dos tribunais regionais e doze representantes dos tribunais de primeira instância.

44      Por outro lado, uma análise das atividades do KRS agora formado revela uma ausência total de posições adotadas por este órgão a fim de defender a independência do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) no contexto da crise gerada pelas recentes reformas legislativas que afetaram este órgão jurisdicional. Em contrapartida, o KRS ou membros do mesmo criticaram publicamente os membros do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) por este ter enviado questões prejudiciais ao Tribunal de Justiça ou por ter cooperado com as instituições da União, em especial com a Comissão Europeia. Além disso, a prática seguida pelo KRS quando é chamado a dar um parecer sobre a eventual continuação do exercício das funções de juiz no Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) para além da idade da aposentação agora fixada em 65 anos consiste, como demonstra nomeadamente o parecer do KRS impugnado no órgão jurisdicional de reenvio no processo C‑585/18, em emitir pareceres negativos não fundamentados ou em limitar‑se a reproduzir a redação do artigo 37.o, § 1b, da nova Lei sobre o Supremo Tribunal.

45      Acresce que a seleção efetuada pelo KRS para prover os dezasseis lugares de juiz na Secção Disciplinar declarados vagos em 24 de maio de 2018 pelo presidente da República revela que os doze candidatos escolhidos pelo KRS, ou seja, seis procuradores, dois juízes, dois consultores jurídicos e dois universitários, eram pessoas que estiveram até esse momento submetidas ao poder executivo, ou pessoas que, durante a crise do Estado de direito na Polónia, agiram por ordem do poder político ou de maneira conforme às expectativas deste último, ou, por fim, pessoas que não correspondem aos critérios legais ou, ainda, pessoas que foram objeto de sanções disciplinares no passado.

46      Por fim, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que o processo segundo o qual o KRS seleciona os candidatos aos lugares de juiz da Secção Disciplinar, que não podem ser escolhidos de entre os membros do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) já em funções, foi concebida e, em seguida, alterada, por forma a que o KRS possa agir de maneira discricionária, sem que exista uma possibilidade de verdadeiro controlo a este respeito.

47      Em primeiro lugar, o Supremo Tribunal já não é chamado a intervir nesse processo de nomeação e, assim, a apreciação efetiva e concreta dos méritos dos candidatos já não é garantida. Em segundo lugar, a falta de apresentação, pelos candidatos, dos documentos referidos no artigo 35.o, n.o 2, da Lei sobre o KRS, que são, no entanto, essenciais para efeitos de diferenciação dos interessados, já não constitui, como resulta do artigo 35.o, n.o 3, dessa lei, um entrave para a constituição da lista dos candidatos recomendados pelo KRS. Em terceiro lugar, nos termos do artigo 44.o da referida lei, as decisões do KRS tornam‑se definitivas se não tiverem sido impugnadas por todos os candidatos, o que equivale a excluir qualquer possibilidade efetiva de controlo jurisdicional das mesmas.

48      Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se quanto à importância que há que atribuir, no atinente ao respeito da exigência, decorrente do direito da União, de independência dos órgãos jurisdicionais e dos juízes dos Estados‑Membros, a fatores como, por um lado, a independência, em relação ao poder político, do órgão responsável pela seleção dos juízes e, por outro, as circunstâncias que envolvem a seleção dos membros de uma secção jurisdicional criada ex nihilo num determinado Estado‑Membro, uma vez que a referida secção é competente para decidir em processos abrangidos pelo direito da União.

49      No caso de essa secção jurisdicional não satisfazer a referida exigência de independência, o tribunal de reenvio pretende saber se o direito da União deve ser interpretado no sentido de que lhe impõe que afaste a aplicação das disposições da lei nacional que, ao reservar essa competência a essa secção jurisdicional, obsta à sua própria competência para conhecer, sendo caso disso, dos processos principais. Nas suas decisões de reenvio nos processos C‑624/18 e C‑625/18, o órgão jurisdicional de reenvio salienta, a este propósito, que dispõe de uma competência geral em matéria de direito do trabalho e da segurança social, o que o habilita muito particularmente a conhecer litígios como os principais, que são relativos a uma alegada violação da proibição de discriminação em razão da idade em matéria de emprego.

50      Foi nestas condições que o Sąd Najwyższy (Izba Pracy i Ubezpieczeń Społecznych) [Supremo Tribunal (Secção do Trabalho e da Segurança Social), Polónia], decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça os presentes pedidos de decisão prejudicial.

51      No processo C‑585/18, as questões prejudiciais têm a seguinte redação:

«1.      Deve o artigo 267.o, terceiro parágrafo, do TFUE, em conjugação com os artigos 19.o, [n.o 1, e 2.o] TUE e com o artigo 47.o da [Carta], ser interpretado no sentido de que uma secção recém‑criada num tribunal de última instância de um Estado‑Membro, competente para conhecer de um litígio relativo a um juiz de um tribunal nacional, que é composta exclusivamente por juízes selecionados por uma entidade nacional que deve garantir a independência dos tribunais [(KRS)], e que, em virtude da forma como está organizada e do seu modo de funcionamento, não oferece garantias quanto à sua independência face aos poderes legislativo e executivo, constitui um órgão jurisdicional autónomo e independente na aceção do direito da União?

2.      Em caso de resposta negativa à primeira questão, deve o artigo 267.o, terceiro parágrafo, TFUE, em conjugação com os artigos 19.o, [n.o 1, e 2.o,] TUE e com o artigo 47.o da Carta, ser interpretado no sentido de que uma secção incompetente de um tribunal de última instância de um Estado‑Membro, que cumpre os requisitos para ser considerado um órgão jurisdicional na aceção do direito da União, e na qual é instaurado um processo que versa sobre uma matéria de direito da União, deve deixar de aplicar as disposições nacionais de uma lei que exclua a sua competência para conhecer desse processo?»

52      Nos processos C‑624/18 e C‑625/18, as questões prejudiciais são formuladas nos seguintes termos:

«1.      Deve o artigo 47.o da [Carta], conjugado com o artigo 9.o, n.o 1, da [Diretiva 2000/78], ser interpretado no sentido de que, no caso de, no tribunal de última instância de um Estado‑Membro, ser instaurado um processo judicial (uma ação) com fundamento na violação da proibição de discriminação em razão da idade relativamente a um juiz desse tribunal, e simultaneamente serem requeridas medidas de garantia da pretensão invocada, esse tribunal é obrigado — a fim de garantir, decretando medidas cautelares previstas no direito nacional, a tutela dos direitos decorrentes do direito da União — a não aplicar normas nacionais que atribuem a competência para conhecer dessa ação a uma formação desse tribunal que não está a funcionar, por não terem sido nomeados os juízes que a compõem?

2.      Caso venham a ser nomeados os juízes para a formação competente, à luz do direito nacional, para conhecer do processo instaurado, deve o artigo 267.o, terceiro parágrafo, TFUE, em conjugação com os artigos 19.o, [n.o 1, e 2.o], TUE e com o artigo 47.o da [Carta], ser interpretado no sentido de que uma secção recém‑criada num tribunal de última instância de um Estado‑Membro, competente para conhecer de um litígio relativo a um juiz de um tribunal nacional em primeira ou segunda instância, que é composta exclusivamente por juízes selecionados por uma entidade nacional que deve garantir a independência dos tribunais [(KRS)], e que, em virtude da forma como está organizada e do seu modo de funcionamento, não oferece garantias quanto à sua independência face aos poderes legislativo e executivo, constitui um órgão jurisdicional autónomo e independente na aceção do direito da União?

3.      Em caso de resposta negativa à segunda questão, deve o artigo 267.o, terceiro parágrafo, TFUE, em conjugação com os artigos 19.o, [n.o 1, e 2.o], TUE e com o artigo 47.o da [Carta], ser interpretado no sentido de que uma secção incompetente de um tribunal de última instância de um Estado‑Membro, que cumpre os requisitos para ser considerado um órgão jurisdicional na aceção do direito da União, e na qual é instaurado um processo que versa sobre uma matéria de direito da União, deve deixar de aplicar as disposições nacionais de uma lei que exclua a sua competência para conhecer desse processo?»

 Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

53      Por Decisão do presidente do Tribunal de Justiça de 5 de novembro de 2018, os processos C‑585/18, C‑624/18 e C‑625/18 foram apensados.

54      Por Despacho de 26 de novembro de 2018, A. K. e o. (C‑585/18, C‑624/18 e C‑625/18, não publicado, EU:C:2018:977),o presidente do Tribunal de Justiça deferiu os pedidos do órgão jurisdicional de reenvio destinado a que os presentes processos sejam submetidos à tramitação acelerada. Como previsto pelo artigo 105.o, n.os 2 e 3, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, a data da audiência foi marcada de imediato, no caso para 19 de março de 2019, e comunicada às partes com a notificação dos pedidos de decisão prejudicial. Foi fixado um prazo para as referidas partes apresentarem eventuais observações escritas.

55      Em 19 de março de 2019 realizou‑se no Tribunal de Justiça uma primeira audiência. Em 14 de maio de 2019 foi organizada uma segunda audiência pelo Tribunal de Justiça na sequência, nomeadamente, de um pedido do KRS, que não tinha apresentado observações escritas, não tinha estado representado na primeira audiência e desejava poder ser ouvido oralmente, e para permitir às partes pronunciarem‑se sobre as eventuais implicações, no âmbito dos presentes processos, de um Acórdão proferido em 25 de março de 2019, no qual o Trybunał Konstytucyjny (Tribunal Constitucional, Polónia) declarou o artigo 9a da Lei sobre o KRS compatível com o artigo 187.o, n.o 1, ponto 2, e n.o 4, da Constituição.

56      Nesta segunda audiência, o KRS apresentou, ainda, a Deliberação n.o 6 adotada pela Assembleia dos Juízes da Secção Disciplinar em 13 de maio de 2019, expondo a posição dessa secção sobre o procedimento observado nos presentes processos apensos. Esta deliberação foi distribuída pelas partes presentes e junta aos autos.

57      Por requerimentos apresentados na Secretaria do Tribunal de Justiça em 3 e 29 de julho de 2019, em 16 de setembro de 2019 e 7 de novembro de 2019 pelo Governo polaco, em 4 de julho de 2019 pelo KRS e em 29 de outubro de 2019 pelo Prokurator Generalny (Procurador‑Geral, Polónia) foi solicitada a reabertura da fase oral do processo.

58      Em apoio do seu pedido, o KRS indica, em substância, estar em desacordo com as conclusões do advogado‑geral, que assentam em apreciações erradas e não têm suficientemente em conta a argumentação que desenvolveu na audiência de 14 de maio de 2019. Por isso importa, acrescenta, que o Tribunal de Justiça reexamine a possibilidade de tomar em consideração as observações escritas anteriormente transmitidas pelo KRS e que lhe foram devolvidas devido à sua extemporaneidade.

59      No seu pedido de 3 de julho de 2019 e nas explicações complementares que dirigiu ao Tribunal de Justiça em 29 de julho e 16 de setembro de 2019, o Governo polaco salienta também estar em desacordo com as conclusões do advogado‑geral, que contêm certas contradições e assentam, como resulta de alguns dos seus números e de números análogos contidos nas Conclusões do advogado‑geral proferidas em 11 de abril de 2019 no processo Comissão/Polónia (Independência do Supremo Tribunal) (C‑619/18, EU:C:2019:325), numa leitura alegadamente errada da jurisprudência anterior do Tribunal de Justiça, em particular, do Acórdão de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses (C‑64/16, EU:C:2018:117). O referido Governo defende, além disso, que as conclusões do advogado‑geral continham um certo número de argumentos e de posições novas, que não tinham sido suficientemente debatidos. Ora, tendo em conta a sua importância intrínseca ou as suas consequências fundamentais para os diversos modelos jurídicos em vigor nos Estados‑Membros no que respeita à composição dos conselhos nacionais da magistratura e os processos de nomeação dos juízes, os referidos elementos justificam uma reabertura da fase oral do processo a fim de permitir a todos os Estados‑Membros exprimirem‑se a esse propósito. No seu pedido de 7 de novembro de 2019, em apoio do qual apresentou uma ata de audiência do Sąd Okręgowy w Krakowie (Tribunal Regional de Cracóvia, Polónia), de 6 de setembro de 2019, o Governo polaco defende que esse documento demonstra o receio que a decisão a proferir pelo Tribunal de Justiça nos presentes processos possa constituir uma fonte de insegurança jurídica na Polónia e que o referido documento é assim revelador de um facto novo suscetível de exercer uma influência determinante nessa decisão do Tribunal de Justiça.

60      Por fim, o Procurador‑Geral, que remete, no essencial, para os elementos já destacados e a argumentação desenvolvida, respetivamente, pelo KRS e pelo Governo polaco, nos seus pedidos supramencionados de reabertura da fase oral do processo de 3, 4 e 29 de julho de 2019 e de 16 de setembro de 2019, é de opinião, em primeiro lugar, que as circunstâncias nos processos principais não foram suficientemente clarificadas, como resulta das conclusões do advogado‑geral, em segundo lugar, que essas conclusões tomaram posição sobre elementos importantes que não foram debatidos entre as partes e, em terceiro lugar, que as referidas conclusões assentam numa leitura errada da jurisprudência anterior do Tribunal de Justiça, leitura essa que alegadamente revelou um facto novo suscetível de exercer uma influência determinante na decisão do Tribunal de Justiça.

61      A este respeito, cumpre recordar, por um lado, que o Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e o Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça não preveem a possibilidade de os interessados visados no artigo 23.o deste Estatuto apresentarem observações em resposta às conclusões apresentadas pelo advogado‑geral (Acórdão de 6 de março de 2018, Achmea, C‑284/16, EU:C:2018:158, n.o 26 e jurisprudência referida).

62      Por outro lado, de acordo com o artigo 252.o, segundo parágrafo, TFUE, o advogado‑geral apresenta publicamente, com toda a imparcialidade e independência, conclusões fundamentadas sobre as causas que, nos termos do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, requeiram a sua intervenção. O Tribunal de Justiça não está vinculado pelas conclusões do advogado‑geral nem pela fundamentação em que este baseia essas conclusões. Por conseguinte, o desacordo de uma parte com as conclusões do advogado‑geral, sejam quais forem as questões nelas examinadas, não constitui, em si mesmo, um fundamento justificativo da reabertura da fase oral do processo (Acórdão de 6 de março de 2018, Achmea, C‑284/16, EU:C:2018:158, n.o 27 e jurisprudência referida).

63      No entanto, o Tribunal de Justiça pode, em qualquer momento, ouvido o advogado‑geral, ordenar a reabertura da fase oral do processo, em conformidade com o disposto no artigo 83.o do seu Regulamento de Processo, designadamente se considerar que não está suficientemente esclarecido, ou quando, após o encerramento dessa fase, uma parte invocar um facto novo que possa ter influência determinante na decisão do Tribunal, ou ainda quando o processo deva ser resolvido com base num argumento que não foi debatido entre os interessados.

64      No caso vertente, o Tribunal de Justiça considera, todavia, ouvido o advogado‑geral, que dispõe, após a fase escrita e duas audiências sucessivas que decorreram perante si, de todos os elementos necessários para apreciar o processo. Salienta, ainda, que os presentes processos apensos não devem ser decididos com base num argumento que não tenha sido debatido entre os interessados. Considera, por fim, que os diversos pedidos de reabertura da fase oral do processo que lhe apresentados não revelam qualquer facto novo suscetível de poder influenciar a decisão que tem de tomar nos presentes processos. Nestas condições, não há que ordenar a reabertura da fase oral do processo.

65      Por fim, e no que respeita ao pedido pelo qual o KRS solicita novamente a tomada em conta pelo Tribunal de Justiça das suas observações escritas datadas de 4 de abril de 2019, importa lembrar que esta parte no processo principal que, assim como os outros interessados referidos no artigo 23.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, foi convidada a apresentar essas observações no prazo fixado para o fazer, se absteve deliberadamente de proceder a essa apresentação no referido prazo, como resulta dos próprios termos da carta de 28 de março de 2019, que dirigiu ao Tribunal de Justiça. Nestas condições, as observações escritas supramencionadas, que foram apresentadas tardiamente pelo KRS e lhe foram, por isso, devolvidas, não podem ser tidas em consideração pelo Tribunal nesta fase do processo.

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira questão nos processos C624/18 e C625/18

66      Com a sua primeira questão nos processos C‑624/18 e C‑625/18, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se as disposições conjugadas do artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2000/78 e do artigo 47.o da Carta devem ser interpretadas no sentido de que, quando num órgão jurisdicional de um Estado‑Membro que decide em última instância é intentada uma ação com fundamento na violação da proibição de discriminação em razão da idade decorrente dessa diretiva, esse tribunal tem de recusar aplicar disposições nacionais que reservam a competência para conhecer dessa ação a uma instância que, como a Secção Disciplinar, ainda não está constituída, por não terem sido nomeadas todas as pessoas que a compõem.

67      No caso em apreço importa, todavia, ter em conta a circunstância de, pouco depois da adoção das decisões de reenvio nos processos C‑624/18 e C‑625/18, o presidente da República ter procedido à nomeação dos juízes da Secção Disciplinar, que foi, pois, constituída.

68      Tendo em conta esta circunstância, há que constatar que uma resposta à primeira questão nos processos C‑624/18 e C‑625/18 já não é pertinente para efeitos das decisões que o órgão jurisdicional de reenvio tem de tomar nos dois processos. De facto, só a falta de constituição efetiva da Secção Disciplinar justificava a necessidade dessa resposta.

69      Ora, segundo jurisprudência constante, o processo instituído pelo artigo 267.o TFUE é um instrumento de cooperação entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais, graças ao qual o primeiro fornece aos segundos os elementos de interpretação do direito da União que lhes são necessários para a resolução dos litígios que lhes cabe decidir (Acórdão de 19 de dezembro de 2013, Fish Legal e Shirley, C‑279/12, EU:C:2013:853, n.o 29 e jurisprudência referida).

70      A este propósito, há que recordar que a justificação do reenvio prejudicial não é emitir opiniões consultivas sobre questões gerais ou hipotéticas, mas a necessidade inerente à efetiva solução de um litígio (Acórdão de 10 de dezembro de 2018, Wightman e o., C‑621/18, EU:C:2018:999, n.o 28 e jurisprudência referida). Se se afigura que a questão submetida não é já manifestamente pertinente para a resolução do litígio, o Tribunal de Justiça não tem de conhecer do mérito (v., neste sentido, Acórdão de 24 de outubro de 2013, Stoilov i Ko, C‑180/12, EU:C:2013:693, n.o 38 e jurisprudência referida).

71      Assim sendo, como afirmou o KRS, o Governo polaco e a Comissão, e como tinha, de resto, sugerido o próprio órgão jurisdicional de reenvio, e resulta do n.o 39 do presente acórdão, o Tribunal de Justiça já não tem de conhecer do mérito da primeira questão submetida nos processos C‑624/18 e C‑625/18.

 Quanto às questões no processo C585/18 e à segunda e terceira questões nos processos C624/18 e C625/18

72      Com as suas questões no processo C‑585/18 e a sua segunda e terceira questões nos processos C‑624/18 e C‑625/18, que há que analisar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os artigos 2.o e 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, o artigo 267.o TFUE e o artigo 47.o da Carta devem ser interpretados no sentido de que uma secção de um tribunal supremo de um Estado‑Membro, como a Secção Disciplinar, que é chamada a decidir em processos abrangidos pelo direito da União, satisfaz, tendo em conta as condições que presidiram à sua criação e à nomeação dos seus membros, as exigências de independência e imparcialidade estabelecidas por força dessas disposições do direito da União. Se não for esse o caso, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o princípio do primado do direito da União deve ser interpretado no sentido de que lhe impõe que afaste as disposições nacionais que reservam a competência para conhecer desses processos à referida secção jurisdicional.

 Quanto à competência do Tribunal de Justiça

73      O Prokurator Generalny (Procurador‑Geral) afirmou, em primeiro lugar, que o Tribunal de Justiça não é competente para se pronunciar sobre a segunda e terceira questões submetidas nos processos C‑624/18 e C‑625/18, uma vez que as disposições do direito da União referidas nessas questões não definem o conceito de «órgão jurisdicional independente» e não contêm normas relativas à competência dos tribunais nacionais e aos conselhos nacionais da magistratura, sendo essas questões, pois, da competência exclusiva dos Estados‑Membros e escapando a qualquer controlo da União.

74      Todavia, há que reconhecer que os argumentos assim expostos pelo Procurador‑Geral são na realidade relativos ao próprio alcance e, logo, à interpretação das referidas disposições do direito da União. Ora, essa interpretação é manifestamente da competência do Tribunal de Justiça nos termos do artigo 267.o TFUE.

75      A este respeito, o Tribunal de Justiça já declarou que, embora a organização judicial nos Estados‑Membros seja da competência destes últimos, a verdade é que, no exercício desta competência, os Estados‑Membros estão obrigados a respeitar as obrigações que para eles decorrem do direito da União [Acórdão de 24 de junho de 2019, Comissão/Polónia (Independência do Supremo Tribunal), C‑619/18, EU:C:2019:531, n.o 52 e jurisprudência referida].

76      Em segundo lugar, o Procurador‑Geral afirmou que, no que concerne ao artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE e ao artigo 47.o da Carta, a incompetência do Tribunal de Justiça para conhecer dessas duas questões prejudiciais advém também do facto de as disposições nacionais em causa no processo principal não aplicarem o direito da União nem serem abrangidas pelo seu âmbito de aplicação, e não poderem, assim, ser apreciadas à luz desse direito.

77      No que se refere, antes de mais, às disposições da Carta, cabe recordar que, no âmbito de um reenvio prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, o Tribunal de Justiça só pode interpretar o direito da União nos limites das competências que lhe são atribuídas (Acórdão de 30 de junho de 2016, Toma e Biroul Executorului Judecătoresc Horațiu‑Vasile Cruduleci, C‑205/15, EU:C:2016:499, n.o 22 e jurisprudência referida).

78      O âmbito de aplicação da Carta, no que respeita à ação dos Estados‑Membros, está definido no seu artigo 51.o, n.o 1, nos termos do qual as disposições da Carta têm por destinatários os Estados‑Membros, quando apliquem o direito da União, confirmando esta disposição a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça segundo a qual os direitos fundamentais garantidos pela ordem jurídica da União são aplicáveis em todas as situações reguladas pelo direito da União, mas não fora delas (Acórdão de 30 de junho de 2016, Toma e Biroul Executorului Judecătoresc Horațiu‑Vasile Cruduleci, C‑205/15, EU:C:2016:499, n.o 23 e jurisprudência referida).

79      Ora, no caso em apreço, no que respeita, mais precisamente, ao artigo 47.o da Carta, há que salientar que, nos litígios nos processos principais, os recorrentes alegam, nomeadamente, violações, em seu detrimento, da proibição da discriminação em razão da idade em matéria de emprego, prevista pela Diretiva 2000/78.

80      Além disso, importa destacar que o direito a uma ação perante um tribunal é reafirmado pela própria Diretiva 2000/78, cujo artigo 9.o dispõe que os Estados‑Membros tomam as medidas necessárias para assegurar que todas as pessoas que se considerem lesadas pela não aplicação, no que lhes diz respeito, do princípio da igualdade de tratamento visado por essa diretiva, possam fazer valer os seus direitos (Acórdão de 8 de maio de 2019, Leitner, C‑396/17, EU:C:2019:375, n.o 61 e jurisprudência referida).

81      Decorre do exposto que os presentes processos correspondem a situações regidas pelo direito da União, de modo que os recorrentes nos processos principais têm razão ao invocar o direito a uma tutela jurisdicional efetiva, que lhes é garantido pelo artigo 47.o da Carta.

82      Quanto, em seguida, ao âmbito de aplicação do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, importa recordar, por outro lado, que esta disposição visa garantir uma tutela jurisdicional efetiva nos «domínios abrangidos pelo direito da União», independentemente da situação em que os Estados‑Membros apliquem esse direito, na aceção do artigo 51.o, n.o 1, da Carta [Acórdão de 24 de junho de 2019, Comissão/Polónia (Independência do Supremo Tribunal), C‑619/18, EU:C:2019:531, n.o 50 e jurisprudência referida].

83      Contrariamente ao que sustentou o Procurador‑Geral a este respeito, a circunstância de as medidas nacionais de redução salarial em causa no processo em que foi proferido o Acórdão de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses (C‑64/16, EU:C:2018:117), terem sido adotadas em razão de imperativos de eliminação do défice orçamental excessivo do Estado‑Membro em causa e no contexto de um programa de assistência financeira da União a esse Estado‑Membro não desempenhou, como resulta dos n.os 29 a 40 desse acórdão, nenhum papel na interpretação que levou o Tribunal de Justiça a concluir pela aplicabilidade do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE no processo em causa. Com efeito, esta conclusão assenta na circunstância de que a instância nacional em causa nesse processo, a saber, o Tribunal de Contas (Portugal), podia, sob reserva de verificação confiada ao órgão jurisdicional de reenvio no referido processo, pronunciar‑se, na qualidade de órgão jurisdicional, sobre questões relativas à aplicação ou à interpretação do direito da União e, assim, relacionadas com os domínios abrangidos por este direito [Acórdão de 24 de junho de 2019, Comissão/Polónia (Independência do Supremo Tribunal), C‑619/18, EU:C:2019:531, n.o 51 e jurisprudência referida].

84      Uma vez que os litígios nos processos principais respeitam a alegadas violações de regras do direito da União, basta constatar que, no caso em apreço, a instância chamada a decidir os referidos litígios será levada a pronunciar‑se sobre questões relativas à aplicação ou interpretação do direito da União e que cabem, pois, nos domínios abrangidos por esse direito, na aceção do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE.

85      Por último, e no que respeita ao Protocolo n.o 30 relativo à aplicação da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia à República da Polónia e ao Reino Unido (JO 2010, C 83, p. 313), também invocado pelo Procurador‑Geral, importa salientar que este não diz respeito ao artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE e recordar que, de resto, tal protocolo também não põe em causa a aplicabilidade da Carta na Polónia e não visa isentar a República da Polónia da obrigação de respeitar as disposições da Carta [Acórdão de 24 de junho de 2019, Comissão/Polónia (Independência do Supremo Tribunal), C‑619/18, EU:C:2019:531, n.o 53 e jurisprudência referida].

86      Resulta de todo o exposto que o Tribunal de Justiça é competente para interpretar o artigo 47.o da Carta e o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE nos presentes processos.

 Quanto ao eventual não conhecimento do mérito

87      O KRS, o Procurador‑Geral e o Governo polaco afirmaram que, em 17 de dezembro de 2018, o presidente da República promulgou a ustawa o zmianie ustawy o Sądzie Nawyższym (Lei que altera a [nova Lei sobre o Supremo Tribunal]) de 21 de novembro de 2018 (Dz. U. de 2018, posição 2507, a seguir «Lei de 21 de novembro de 2018») que entrou em vigor em 1 de janeiro de 2019.

88      Resulta do artigo 1.o da referida lei que o artigo 37.o, §§ 1a a 4, e o artigo 111.o, § 1, da nova Lei sobre o Supremo Tribunal são revogados, e que o seu artigo 37.o, § 1, é alterado no sentido de que «[o]s juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) são aposentados aos 65 anos». Precisa‑se, no entanto, que esta última disposição se aplica apenas aos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) que entraram em funções nessa qualidade após 1 de janeiro de 2019. Aos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) que entraram em funções antes dessa data são aplicadas as disposições anteriores do artigo 30.o da Lei sobre o Supremo Tribunal, de 23 de novembro de 2002, que previa a aposentação aos 70 anos.

89      O artigo 2.o, n.o 1, da Lei de 21 de novembro de 2018 dispõe que «[a] partir da entrada em vigor desta lei, qualquer juiz do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) ou do Naczelny Sąd Administracyjny (Supremo Tribunal Administrativo) que se tenha aposentado ao abrigo do artigo 37.o, §§ 1 a 4 ou do artigo 111.o, § 1 ou § 1a da [nova Lei sobre o Supremo Tribunal] é reintegrado nas funções que exercia à data da entrada em vigor da [referida lei]. O exercício das funções de juiz do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) ou de juiz do Naczelny Sąd Administracyjny (Supremo Tribunal Administrativo) deve considerar‑se como tendo continuado sem interrupção».

90      O artigo 4.o da Lei de 21 de novembro de 2018 estabelece, no seu n.o 1, que «[o]s processos iniciados nos termos dos artigos 37.o, §§ 1 e 111.o, §§ 1 a 1b da [nova Lei sobre o Supremo Tribunal] e os processos de recurso pendentes nestes casos à data da entrada em vigor desta lei devem ser arquivados» e, no seu n.o 2, que «[o]s processos para determinação da existência de uma relação de trabalho como juiz do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) ou do Naczelny Sąd Administracyjny (Supremo Tribunal Administrativo) em serviço ativo, relativos aos juízes referidos no artigo 2.o, n.o 1, iniciados e pendentes à data da entrada em vigor da presente lei devem ser arquivados».

91      Segundo o KRS, o Procurador‑Geral e o Governo polaco, decorre dos artigos 1.o e 2.o, n.o 1, da Lei de 21 de novembro de 2018, que os juízes recorrentes nos processos principais que tinham sido aposentados nos termos das disposições da nova Lei sobre o Supremo Tribunal agora revogadas foram reintegrados de pleno direito nos seus respetivos tribunais, até que atinjam, em conformidade com as disposições nacionais anteriormente em vigor, os 70 anos, tendo qualquer possibilidade de prorrogação, pelo presidente da República, do exercício das suas funções além da idade normal de aposentação sido também suprimida.

92      Nestas condições, e de acordo com o previsto no artigo 4.o da mesma lei que ordena o arquivamento de processos como os principais, estes ficaram desprovidos de objeto, pelo que o Tribunal de Justiça não tem de se pronunciar sobre o mérito dos presentes pedidos de decisão prejudicial.

93      Tendo em conta o exposto, o Tribunal de Justiça, em 23 de janeiro de 2019, dirigiu‑se ao órgão jurisdicional de reenvio para saber se, na sequência da entrada em vigor da Lei de 21 de novembro de 2018, esse tribunal considerava que continuava a ser necessária uma resposta às suas questões prejudiciais para lhe permitir tomar as suas decisões nos processos que lhe foram submetidos.

94      Na sua resposta de 25 de janeiro de 2019, o órgão jurisdicional de reenvio respondeu na afirmativa a esse pedido, precisando que tinha, por despachos de 23 de janeiro de 2019, suspendido a instância nos processos relativos aos pedidos de não conhecimento do mérito apresentados pelo Procurador‑Geral, com base no artigo 4.o, n.os 1 e 2, da Lei de 21 de novembro de 2018, até que o Tribunal de Justiça se pronuncie nos presentes processos.

95      Na sua resposta, o órgão jurisdicional de reenvio explica que continua a precisar de uma resposta às questões submetidas nos referidos processos para lhe permitir resolver os problemas liminares de natureza processual que se lhe colocam antes de poder proferir os seus acórdãos nesses processos.

96      Além disso, e quanto ao mérito dos litígios nos processos principais, a Lei de 21 de novembro de 2018 não tinha tido por objetivo compatibilizar o direito nacional com o direito da União, mas aplicar as medidas provisórias ordenadas pela vice‑presidente do Tribunal de Justiça no seu Despacho de 19 de outubro de 2018, Comissão/Polónia (C‑619/18 R, não publicado, EU:C:2018:852), confirmado pelo Despacho do Tribunal de Justiça de 17 de dezembro de 2018, Comissão/Polónia (C‑619/18 R, EU:C:2018:1021). Assim, esta lei não revogou ex tunc as disposições nacionais controvertidas nem os seus efeitos jurídicos. Enquanto a referida lei pretendia reintegrar os juízes recorrentes nos processos principais nas suas funções, após a sua aposentação, e introduzir uma ficção jurídica quanto à prossecução ininterrupta do seu mandato através dessa reintegração, os recursos nos processos principais destinam‑se à declaração de que os juízes em causa nunca se aposentaram e permaneceram plenamente em funções durante todo esse período, o que só poderia resultar do não cumprimento das regras nacionais impugnadas, ao abrigo do primado do direito da União. Ora, esta distinção é essencial para determinar o estatuto dos juízes em causa do ponto de vista da sua capacidade para adotar medidas jurisdicionais, organizacionais e administrativas, assim como do ponto de vista de eventuais reivindicações recíprocas, com o Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal), a título da relação de trabalho, ou mesmo da responsabilidade disciplinar. Quanto a este último aspeto, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que, segundo declarações de representantes do poder político, os referidos juízes exerceram ilegalmente funções jurisdicionais até 1 de janeiro de 2019, data da entrada em vigor da Lei de 21 de novembro de 2018.

97      Importa recordar que, como resulta de jurisprudência constante, o juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão judicial a tomar, tem competência exclusiva para apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que submete ao Tribunal de Justiça. Consequentemente, desde que as questões submetidas sejam relativas à interpretação ou à validade de uma regra de direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar‑se (Acórdão de 10 de dezembro de 2018, Wightman e o., C‑621/18, EU:C:2018:999, n.o 26 e jurisprudência referida).

98      Daqui se conclui que as questões relativas ao direito da União gozam de uma presunção de pertinência. O Tribunal de Justiça só pode recusar pronunciar‑se sobre uma questão prejudicial submetida por um órgão jurisdicional nacional se for manifesto que a interpretação de uma regra da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal de Justiça não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas (Acórdão de 10 de dezembro de 2018, Wightman e o., C‑621/18, EU:C:2018:999, n.o 27 e jurisprudência referida).

99      No caso em apreço, importa salientar, antes de mais, que, com as questões prejudiciais que dirigiu ao Tribunal de Justiça e com a interpretação do direito da União que solicita, o órgãos jurisdicional de reenvio visa ser esclarecido não quanto ao mérito dos litígios que lhe foram submetidos e que dizem, eles próprios, respeito a outras questões do direito da União, mas quanto a um problema de natureza processual que tem de decidir in limine litis, uma vez que respeita à própria competência desse tribunal para conhecer dos referidos litígios.

100    A este propósito, há que lembrar que, nos termos de jurisprudência constante, o Tribunal de Justiça é competente para indicar ao juiz nacional os elementos do direito da União que podem concorrer para a solução de um problema de competência que se lhe coloca (Acórdãos de 22 de outubro de 1998, IN. CO. GE.’90 e o., C‑10/97 a C‑22/97, EU:C:1998:498, n.o 15 e jurisprudência referida, e de 12 de dezembro de 2002, Universale‑Bau e o., C‑470/99, EU:C:2002:746, n.o 43). É o que acontece, em particular, quando, como no caso em apreço, e como resulta dos n.os 79 a 81 do presente acórdão, as questões suscitadas pretendem saber se a instância nacional normalmente competente para conhecer de um litígio em que o particular invoca um direito que retira do direito da União satisfaz as exigências decorrentes do direito a um recurso jurisdicional efetivo como garantido pelo artigo 47.o da Carta e pelo artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2000/78.

101    Quanto à Lei de 21 de novembro de 2018, não concerne aos aspetos relativos à competência jurisdicional para conhecer dos processos principais sobre os quais o órgão jurisdicional de reenvio tem de se pronunciar e em relação as quais foi pedida, no caso vertente, uma interpretação do direito da União.

102    Em seguida, há que precisar que a circunstância de disposições nacionais como o artigo 4.o, n.os 1 e 2, da Lei de 21 de novembro de 2018, ordenarem o arquivamento de litígios como os principais não pode, em princípio e na falta de uma decisão do órgão jurisdicional de reenvio a ordenar esse arquivamento ou o não conhecimento do mérito nos processos principais, conduzir o Tribunal de Justiça à conclusão de que não tem de decidir sobre as questões que lhe foram submetidas a título prejudicial.

103    Com efeito, importa recordar que os órgãos jurisdicionais nacionais dispõem da mais ampla faculdade de submeter ao Tribunal de Justiça uma questão de interpretação das disposições pertinentes do direito da União, transformando‑se esta faculdade em obrigação para os órgãos jurisdicionais que se pronunciam em última instância, sob reserva das exceções reconhecidas pela jurisprudência do Tribunal de Justiça. Uma regra de direito nacional não pode impedir um órgão jurisdicional nacional, consoante o caso, de fazer uso da referida faculdade ou de dar cumprimento a essa obrigação. Tanto esta faculdade como esta obrigação são, com efeito, inerentes ao sistema de cooperação entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o Tribunal de Justiça, instituído pelo artigo 267.o TFUE, e às funções de juiz encarregado da aplicação do direito da União confiadas por esta disposição aos órgãos jurisdicionais nacionais (Acórdão de 5 de abril de 2016, PFE, C‑689/13, EU:C:2016:199, n.os 32 e 33 e jurisprudência referida).

104    Disposições nacionais como as referidas no n.o 102 do presente acórdão não podem, pois, impedir uma secção de um tribunal que decide em última instância, confrontada com uma questão de interpretação do direito da União, de manter as questões que dirigiu a título prejudicial ao Tribunal de Justiça.

105    Por fim, importa salientar que, quanto aos processos C‑624/18 e C‑625/18, que respeitam à manutenção ou não de uma relação de trabalho enquanto juiz em serviço ativo entre os recorrentes nos processos principais e o seu empregador, o Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal), resulta das explicações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, expostas no n.o 96 do presente acórdão, que, tendo em conta, nomeadamente, todas as consequências decorrentes da existência dessa relação de trabalho, um eventual não conhecimento do mérito nos litígios submetidos ao referido órgão jurisdicional não se impõe de forma manifesta pela simples entrada em vigor do artigo 2.o, n.o 1, da Lei de 21 de novembro de 2018.

106    Resulta de todo o exposto que a adoção e a entrada em vigor da Lei de 21 de novembro de 2018 não são suscetíveis de justificar que o Tribunal de Justiça não se pronuncie sobre a segunda e terceira questões nos processos C‑624/18 e C‑625/18.

107    Em contrapartida, quanto ao processo C‑585/18, importa lembrar que o recurso submetido ao órgão jurisdicional de reenvio se dirige contra um parecer do KRS emitido no âmbito de um processo que pode eventualmente conduzir a uma decisão de prorrogação do exercício das funções de juiz do recorrente no processo principal para além da idade de aposentação agora fixada nos 65 anos.

108    Ora, há que reconhecer que não resulta das explicações referidas supra, fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, que esse recurso poderia conservar um objeto, em particular, que esse parecer pudesse não caducar, quando, por força de disposições nacionais adotadas entretanto, quer as disposições nacionais que instituem essa nova idade de aposentação, quer as que instituem o processo de prorrogação do exercício de funções jurisdicionais em que se inscrevia a necessidade desse parecer foram revogadas, tendo por consequência permitir ao recorrente no processo principal continuar em funções como juiz até aos 70 anos, de acordo com as disposições nacionais em vigor antes da adoção das disposições assim revogadas.

109    Nestas condições, tendo em conta os princípios recordados nos n.os 69 e 70 do presente acórdão, o Tribunal de Justiça não tem já de se pronunciar sobre as questões submetidas no processo C‑585/18.

 Quanto à admissibilidade da segunda e terceiras questões nos processos C624/18 e C625/18

110    O Governo da Polónia afirma que a segunda e terceira questões nos processos C‑624/18 e C‑625/18 são inadmissíveis. Em primeiro lugar, estas questões são desprovidas de objeto, não sendo as suas respostas necessárias já que os processos pendentes na Secção do Trabalho e da Segurança Social que procedeu aos reenvios prejudiciais estão feridos de nulidade, em conformidade com o artigo 379.o, ponto 4, do Código de Processo Civil, por violação das regras relativas à composição e à competência dos órgãos jurisdicionais. Com efeito, a formação de julgamento da referida secção no caso em apreço é composta por três juízes, sendo que o artigo 79.o da nova Lei sobre o Supremo Tribunal prevê que processos como os principais devem, em primeira instância, ser julgados por um só juiz. Em segundo lugar, as respostas às referidas questões não podem, de qualquer modo, autorizar o órgão jurisdicional de reenvio a conhecer de processos que são da competência de outra secção do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal), sem violar a competência exclusiva dos Estados‑Membros em matéria de organização judiciária e exceder a competência da União, nem revelar‑se pertinentes para a solução dos litígios nos processos principais.

111    No entanto, os elementos assim avançados, que respeitam a aspetos de fundo, de modo nenhum são suscetíveis de afetar a admissibilidade das questões submetidas.

112    Com efeito, as referidas questões tratam, em substância, precisamente de saber se, apesar das regras nacionais de repartição das competências jurisdicionais em vigor no Estado‑Membro em causa, um órgão jurisdicional como o tribunal de reenvio tem a obrigação, por força das disposições do direito da União visadas nessas questões, de afastar as referidas regras nacionais e de assumir, sendo caso disso, uma competência jurisdicional no que concerne aos litígios nos processos principais. Ora, um acórdão pelo qual o Tribunal de Justiça confirmasse a existência dessa obrigação impor‑se‑ia ao órgão jurisdicional de reenvio e a todos os outros órgãos da República da Polónia sem que as disposições internas relativas à nulidade dos processos ou à repartição das competências jurisdicionais, às quais se refere o Governo polaco, a tal pudessem obstar.

113    De onde resulta que as objeções formuladas pelo Governo polaco quanto à admissibilidade das referidas questões não podem ser acolhidas.

 Quanto ao exame do mérito da segunda e terceira questões nos processos C624/18 e C625/18

114    Há que recordar que, como resulta dos n.os 77 a 81 do presente acórdão, em situações como as que estão em causa nos processos principais, nas quais os demandantes alegam violações, em seu detrimento, da proibição de discriminação em razão da idade em matéria de emprego prevista pela Diretiva 2000/78, tanto o artigo 47.o da Carta que garante o direito a uma tutela jurisdicional efetiva, como o artigo 9.o, n.o 1, da referida diretiva que reafirma esse direito a um recurso efetivo são aplicáveis.

115    A este propósito, e em conformidade com jurisprudência constante, na falta de regulamentação da União na matéria, embora caiba à ordem jurídica interna de cada Estado‑Membro designar os órgãos jurisdicionais competentes e definir as modalidades processuais das ações destinadas a garantir a salvaguarda dos direitos individuais derivados da ordem jurídica da União, os Estados‑Membros têm, todavia, a responsabilidade de assegurar, em cada caso, o respeito pelo direito a uma tutela jurisdicional efetiva dos referidos direitos tal como garantido pelo artigo 47.o da Carta (v., neste sentido, Acórdãos de 22 de outubro de 1998, IN. CO. GE.’90 e o., C‑10/97 a C‑22/97, EU:C:1998:498, n.o 14 e jurisprudência referida; de 15 de abril de 2008, Impact, C‑268/06, EU:C:2008:223, n.os 44 e 45; e de 19 de março de 2015, E.ON Földgáz Trade, C‑510/13, EU:C:2015:189, n.os 49 e 50 e jurisprudência referida).

116    Além disso, importa recordar que o artigo 52.o, n.o 3, da Carta precisa que, na medida em que esta última contém direitos que correspondem aos garantidos pela CEDH, o seu sentido e o seu âmbito são os mesmos que essa Convenção lhes confere.

117    Ora, como resulta das anotações ao artigo 47.o da Carta, que, nos termos do artigo 6.o, n.o 1, terceiro parágrafo, TUE e do artigo 52.o, n.o 7, da Carta, devem ser tomadas em consideração para efeitos da sua interpretação, o primeiro e segundo parágrafos desse artigo 47.o correspondem ao artigo 6.o, n.o 1, e ao artigo 13.o da CEDH (Acórdão de 30 de junho de 2016, Toma e Biroul Executorului Judecătoresc Horațiu‑Vasile Cruduleci, C‑205/15, EU:C:2016:499, n.o 40 e jurisprudência referida).

118    O Tribunal de Justiça deve, assim, assegurar que a sua interpretação do artigo 47.o, segundo parágrafo, da Carta garanta um nível de proteção que não viola o garantido no artigo 6.o da CEDH, conforme interpretado pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (Acórdão de 29 de julho de 2019, Gambino e Hyka, C‑38/18, EU:C:2019:628, n.o 39).

119    No que respeita ao conteúdo desse artigo 47.o, segundo parágrafo, resulta da própria redação dessa disposição que o direito fundamental a um recurso efetivo que esta prevê implica nomeadamente o direito de toda a pessoa a que a sua causa seja julgada de forma equitativa, por um tribunal independente e imparcial.

120    Esta exigência de independência dos órgãos jurisdicionais, que é inerente à missão de julgar, faz parte do conteúdo essencial do direito a uma tutela jurisdicional efetiva e do direito fundamental a um processo equitativo, que reveste importância essencial enquanto garante da proteção do conjunto dos direitos que o direito da União confere aos particulares e da preservação dos valores comuns aos Estados‑Membros, enunciados no artigo 2.o TUE, designadamente o valor do Estado de direito [Acórdão de 24 de junho de 2019, Comissão/Polónia (Independência do Supremo Tribunal), C‑619/18, EU:C:2019:531, n.o 58 e jurisprudência referida].

121    Segundo jurisprudência constante, o referido conceito de independência comporta dois aspetos. O primeiro aspeto, de ordem externa, requer que a instância em causa exerça as suas funções com total autonomia, sem estar submetida a nenhum vínculo hierárquico ou de subordinação em relação a nenhuma entidade e sem receber ordens ou instruções de nenhuma proveniência, estando assim protegida contra intervenções ou pressões externas suscetíveis de afetar a independência de julgamento dos seus membros e influenciar as suas decisões [Acórdãos de 25 de julho de 2018, Minister for Justice and Equality (Falhas do sistema judiciário), C‑216/18 PPU, EU:C:2018:586, n.o 63 e jurisprudência referida, e de 24 de junho de 2019, Comissão/Polónia (Independência do Supremo Tribunal), C‑619/18, EU:C:2019:531, n.o 72].

122    O segundo aspeto, de ordem interna, está ligado ao conceito de imparcialidade e visa o igual distanciamento em relação às partes no litígio e aos respetivos interesses, tendo em conta o objeto deste. Este aspeto exige o respeito pela objetividade e a inexistência de qualquer interesse na resolução do litígio que não seja a estrita aplicação da regra de direito [Acórdãos de 25 de julho de 2018, Minister for Justice and Equality (Falhas do sistema judiciário), C‑216/18 PPU, EU:C:2018:586, n.o 65 e jurisprudência referida, e de 24 de junho de 2019, Comissão/Polónia (Independência do Supremo Tribunal), C‑619/18, EU:C:2019:531, n.o 73].

123    Estas garantias de independência e de imparcialidade postulam a existência de regras, designadamente no que respeita à composição da instância, à nomeação, à duração das funções, bem como às causas de abstenção, de impugnação da nomeação e de destituição dos seus membros, que permitam afastar qualquer dúvida legítima, no espírito dos particulares, quanto à impermeabilidade da referida instância em relação a elementos externos e à sua neutralidade relativamente aos interesses em confronto [Acórdãos de 25 de julho de 2018, Minister for Justice and Equality (Falhas do sistema judiciário), C‑216/18 PPU, EU:C:2018:586, n.o 66 e jurisprudência referida, e de 24 de junho de 2019, Comissão/Polónia (Independência do Supremo Tribunal), C‑619/18, EU:C:2019:531, n.o 74].

124    De resto, em conformidade com o princípio da separação de poderes que caracteriza o funcionamento de um Estado de direito, a independência dos órgãos jurisdicionais deve ser garantida em relação aos poderes legislativo e executivo (v., neste sentido, Acórdão de 10 de novembro de 2016, Poltorak, C‑452/16 PPU, EU:C:2016:858, n.o 35).

125    A este respeito, importa que os juízes se encontrem ao abrigo de intervenções ou de pressões externas que possam pôr em perigo a sua independência. As regras mencionadas no n.o 123 do presente acórdão devem, em especial, permitir excluir não só qualquer influência direta, sob a forma de instruções, mas também as formas de influência mais indireta suscetíveis de orientar as decisões dos juízes em causa [v., neste sentido, Acórdão de 24 de junho de 2019, Comissão/Polónia (Independência do Supremo Tribunal), C‑619/18, EU:C:2019:531, n.o 112 e jurisprudência referida].

126    Esta interpretação do artigo 47.o da Carta é confortada pela jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem relativa ao artigo 6.o, n.o 1, da CEDH segundo a qual esta disposição exige que os tribunais sejam independentes quer das partes quer do executivo e do legislador (TEDH, 18 de maio de 1999, Ninn‑Hansen c. Danemark, CE:ECHR:1999:0518DEC002897295, p. 19 e jurisprudência referida).

127    Nos termos de jurisprudência constante desse mesmo Tribunal, para determinar se um tribunal é «independente», na aceção do referido artigo 6.o, n.o 1, há que ter em conta, designadamente, o método de nomeação e a duração do mandato dos seus membros, a existência de proteção contra pressões externas e se o órgão em causa tem uma aparência de independência (TEDH, 6 de novembro de 2018, Ramos Nunes de Carvalho e Sá c. Portugal, CE:ECHR:2018:1106JUD005539113, § 144 e jurisprudência referida), sendo precisado, a este respeito, que está em causa a própria confiança que qualquer tribunal deve inspirar aos particulares numa sociedade democrática (v., neste sentido, TEDH, 21 de junho de 2011, Fruni c. Eslováquia, CE:ECHR:2011:0621JUD000801407, § 141).

128    Quanto à condição de «imparcialidade», na aceção do mesmo artigo 6.o, n.o 1, pode ser, nos termos de jurisprudência também constante do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, apreciada de diversas maneiras, a saber: segundo uma diligência subjetiva, tendo em conta a convicção pessoal e o comportamento do juiz, ou seja, averiguando se este fez prova de parcialidade ou de preconceito pessoal no caso em apreço, assim como segundo uma diligência objetiva que consiste em determinar se o tribunal oferecia, através, nomeadamente da sua composição, garantias suficientes para excluir qualquer dúvida legítima quanto à sua imparcialidade. No que respeita à apreciação objetiva, consiste em perguntar se, independentemente da conduta pessoal do juiz, determinados factos verificáveis permitem suspeitar da sua imparcialidade Nesta matéria, até as aparências podem ser importantes. Está em causa, novamente, a confiança que os tribunais de uma sociedade democrática devem inspirar aos particulares, a começar pelas partes no processo (v., nomeadamente, TEDH, 6 de maio de 2003, Kleyn e o. c. Países Baixos, CE:ECHR:2003:0506JUD003934398, § 191 e jurisprudência referida, e 6 de novembro de 2018, Ramos Nunes de Carvalho e Sá c. Portugal, CE:ECHR:2018:1106JUD005539113, §§ 145, 147 e 149 e jurisprudência referida).

129    Como o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem reiteradamente salientou, os conceitos de independência e de imparcialidade objetiva estão estreitamente ligados, o que leva, geralmente, a analisá‑los em conjunto (v., nomeadamente, TEDH, 6 de maio de 2003, Kleyn e outros c. Países Baixos, CE:ECHR:2003:0506JUD003934398, § 192 e jurisprudência referida, e 6 de novembro de 2018, Ramos Nunes de Carvalho e Sá c. Portugal, CE:ECHR:2018:1106JUD005539113, § 150 e jurisprudência referida). Nos termos da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, para se pronunciar sobre a existência de razões de receio de que essas exigências de independência ou de imparcialidade objetiva não sejam cumpridas num determinado processo, o ponto de vista duma parte entra em linha de conta mas não tem um papel decisivo. O elemento determinante consiste em saber se os receios em causa podem ser considerados objetivamente justificados (v., nomeadamente, TEDH, 6 de maio de 2003, Kleyn e o. c. Países Baixos, CE:ECHR:2003:0506JUD003934398, §§ 193 e 194 e jurisprudência referida, e 6 de novembro de 2018, Ramos Nunes de Carvalho e Sá c. Portugal, CE:ECHR:2018:1106JUD005539113, §§ 147 e 152 e jurisprudência referida).

130    Nesta matéria, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem salienta reiteradamente que, se o princípio da separação entre o poder executivo e a autoridade judicial tende a adquirir uma importância crescente na jurisprudência, nem o artigo 6.o nem nenhuma outra disposição da CEDH impõe aos Estados um determinado modelo constitucional que regule desta ou daquela maneira as relações e a interação entre os diferentes poderes estatais, nem obriga esses Estados a conformar‑se com este ou aquele conceito constitucional teórico no que respeita aos limites admissíveis a essa interação. A questão é sempre a de saber se, num determinado processo, as exigências da CEDH foram respeitadas (v., nomeadamente, TEDH, 6 de maio de 2003, Kleyn e o. c. Países Baixos, CE:ECHR:2003:0506JUD003934398, § 193 e jurisprudência referida; 9 de novembro de 2006, Sacilor Lormines c. França, CE:ECHR:2006:1109JUD006541101, § 59; e 18 de outubro de 2018, Thiam c. França, CE:ECHR:2018:1018JUD008001812, § 62 e jurisprudência referida).

131    No caso em apreço, as dúvidas expressas pelo órgão jurisdicional nacional dizem respeito, em substância, à questão de saber se, tendo em conta as regras nacionais relativas à criação de um órgão específico, como a Secção Disciplinar, e relativas, nomeadamente, às competências que lhe foram atribuídas, à sua composição e às condições e modalidades que presidiram à nomeação dos juízes que a compõem, bem como ao contexto em que as referidas criação e nomeações tiveram lugar, essa instância e os seus membros cumprem as exigências de independência e imparcialidade que um tribunal deve satisfazer nos termos do artigo 47.o da Carta quando chamado a pronunciar‑se sobre um litígio em que um particular invoca, como no caso vertente, uma violação do direito da União em seu detrimento.

132    É ao órgão jurisdicional de reenvio que incumbirá, em última análise, pronunciar‑se a este propósito, após ter procedido às apreciações exigidas para esse fim. Importa, com efeito, recordar que o artigo 267.o TFUE não habilita o Tribunal de Justiça a aplicar as regras do direito da União a uma situação determinada, mas apenas a pronunciar‑se sobre a interpretação dos Tratados e dos atos adotados pelas instituições da União. Em conformidade com jurisprudência constante, o Tribunal de Justiça pode, no âmbito da cooperação judiciária estabelecida por esse artigo, a partir dos elementos dos autos, fornecer ao órgão jurisdicional nacional os elementos de interpretação do direito da União que lhe possam ser úteis na apreciação dos efeitos de uma determinada disposição deste (Acórdão de 16 de julho de 2015, CHEZ Razpredelenie Bulgaria, C‑83/14, EU:C:2015:480, n.o 71 e jurisprudência referida).

133    A este respeito, no atinente às próprias condições em que tiveram lugar as nomeações dos membros da Secção Disciplinar, importa precisar desde logo que o simples facto de terem sido nomeados pelo presidente da República não é suscetível de criar uma dependência daqueles para com este, nem de gerar dúvidas quanto à sua imparcialidade, se, uma vez nomeados, os interessados não estiverem sujeitos a nenhuma pressão e não receberem instruções no exercício das suas funções (v., neste sentido, Acórdão de 31 de janeiro de 2013, D. e A., C‑175/11, EU:C:2013:45, n.o 99, e TEDH, 28 de junho de 1984, Campbell e Fell c. Reino Unido, CE:ECHR:1984:0628JUD000781977, § 79; 2 de junho de 2005, Zolotas c. Grécia, CE:ECHR:2005:0602JUD003824002, §§ 24 e 25; 9 de novembro de 2006, Sacilor Lormines c. França, CE:ECHR:2006:1109JUD006541101, § 67; e 18 de outubro de 2018, Thiam c. França, CE:ECHR:2018:1018JUD008001812, § 80 e jurisprudência referida).

134    Todavia, continua a ser necessário garantir que as condições materiais e as modalidades processuais que presidem à adoção dessas decisões de nomeação sejam tais que não possam criar, no espírito dos particulares, dúvidas legítimas quanto à impermeabilidade dos juízes em causa em relação a elementos externos e à sua neutralidade relativamente aos interesses em confronto, uma vez nomeados os interessados [v., por analogia, Acórdão de 24 de junho de 2019, Comissão/Polónia (Independência do Supremo Tribunal), C‑619/18, EU:C:2019:531, n.o 111].

135    Para este fim, importa, nomeadamente, que as referidas condições e modalidades sejam concebidas de forma a satisfazer as exigências recordadas no n.o 125 do presente acórdão.

136    No caso em apreço, importa salientar que o artigo 30.o da nova Lei sobre o Supremo Tribunal enuncia o conjunto das condições que devem ser satisfeitas por uma pessoa para que possa ser nomeada membro desse órgão jurisdicional. Além disso, nos termos do artigo 179.o da Constituição e do artigo 29.o da nova Lei sobre o Supremo Tribunal, os juízes da Secção Disciplinar, como os juízes que constituem as outras secções do referido tribunal, são nomeados pelo presidente da República sob proposta do KRS, isto é, o órgão investido pelo artigo 186.o da Constituição da missão de garante da independência dos órgãos jurisdicionais e dos juízes.

137    Ora, a intervenção desse órgão, no contexto de um processo de nomeação dos juízes, pode, em princípio, seguramente ser suscetível de contribuir para conferir objetividade a esse processo [v., por analogia, Acórdão de 24 de junho de 2019, Comissão/Polónia (Independência do Supremo Tribunal), C‑619/18, EU:C:2019:531, n.o 115; v. também, neste sentido, TEDH, 18 de outubro de 2018, Thiam c. França, CE:ECHR:2018:1018JUD008001812, §§ 81 e 82]. Em particular, o facto de submeter a própria possibilidade de o presidente da República proceder à nomeação de um juiz no Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) à existência de uma proposta nesse sentido por parte do KRS pode enquadrar objetivamente a margem de manobra de que o presidente dispõe no exercício da competência que lhe é assim conferida.

138    Todavia, tal só se verifica na condição, nomeadamente, de o referido órgão ser, ele próprio, suficientemente independente dos poderes legislativo e executivo e da autoridade à qual deve submeter essa proposta de nomeação [v., por analogia, Acórdão de 24 de junho de 2019, Comissão/Polónia (Independência do Supremo Tribunal), C‑619/18, EU:C:2019:531, n.o 116].

139    Com efeito, o grau de independência de que goza o KRS relativamente aos poderes legislativo e executivo no exercício das tarefas que lhe são atribuídas pela legislação nacional, na qualidade de órgão investido, pelo artigo 186.o da Constituição, da missão de garante da independência dos órgãos jurisdicionais e dos juízes, pode ser relevante quando se trata de apreciar se os juízes que seleciona estarão em condições de satisfazer as exigências de independência e de imparcialidade decorrentes do artigo 47.o da Carta.

140    É ao órgão jurisdicional de reenvio que caberá verificar se o KRS oferece ou não garantias suficientes de independência em relação aos poderes legislativo e executivo, tendo em conta todos os elementos relevantes quer factuais quer jurídicos, relativos simultaneamente às condições em que os membros do referido órgão foram designados e à maneira como o mesmo desempenha concretamente o seu papel.

141    O órgão jurisdicional de reenvio menciona uma série de elementos que, em sua opinião, são suscetíveis de suscitar dúvidas quanto à independência do KRS.

142    A este propósito, embora um ou outro dos elementos assim destacados pelo referido órgão jurisdicional possa não ser criticável em si, sendo abrangido, neste caso, pela competência dos Estados‑Membros e pelas escolhas efetuadas por estes, a sua combinação, aliada às circunstâncias em que essas escolhas foram efetuadas, pode, em contrapartida, levar a que se duvide da independência de um órgão chamado a participar no processo de nomeação de juízes, apesar de, quando os referidos elementos são considerados separadamente, tal conclusão não se impor.

143    Com esta ressalva, entre os elementos mencionados pelo órgão jurisdicional de reenvio, podem revelar‑se pertinentes para efeitos dessa apreciação de conjunto as seguintes circunstâncias: em primeiro lugar, a circunstância de o KRS recentemente constituído ter sido criado através da redução do atual mandato de quatro anos dos membros que até agora compunham esta instância, em segundo lugar, a circunstância de, enquanto os quinze membros do KRS eleitos entre os juízes o eram, anteriormente, pelos seus pares magistrados, o serem agora por um ramo do poder legislativo entre candidatos que podem ser apresentados, nomeadamente, por grupos de dois mil cidadãos ou vinte e cinco juízes, conduzindo essa reforma a nomeações em que o número de membros do KRS diretamente procedentes do poder político ou por ele eleitos passou para vinte e três dos vinte e cinco membros desse órgão, bem como, em terceiro lugar, a eventual existência de irregularidades que poderiam ter afetado o processo de nomeação de certos membros do KRS na sua nova composição, referidas pelo órgão jurisdicional de reenvio e que este terá, sendo caso disso, de verificar.

144    Para efeitos da referida apreciação de conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio tem também razão ao ter em conta a maneira como o referido órgão cumpre a sua missão constitucional de garante da independência dos tribunais e dos juízes, e como exerce as suas diversas competências, em especial, se o faz de uma maneira que pode lançar a dúvida sobre a sua independência em relação aos poderes legislativo e executivo.

145    Além disso, e tendo em conta o facto de, como resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça, as decisões do presidente da República que nomeiam juízes no Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) não poderem ser objeto de fiscalização jurisdicional, cabe ao tribunal nacional verificar se a forma como é definido, no artigo 44.o, n.os 1 e 1a, da Lei sobre o KRS, o alcance do recurso que pode ser interposto contra uma deliberação do KRS, incluindo as suas decisões sobre a apresentação de uma proposta de nomeação para o lugar de juiz desse tribunal, permite assegurar uma fiscalização jurisdicional efetiva dessas deliberações, abrangendo, pelo menos, a verificação da ausência de excesso ou desvio de poder, erro de direito ou erro manifesto de apreciação (v., neste sentido, TEDH, 18 de outubro de 2018, Thiam c. França, CE:ECHR:2018:1018JUD008001812, §§ 25 e 81).

146    Independentemente deste exame relativo às condições em que foram nomeados os novos juízes da Secção Disciplinar e ao papel desempenhado pelo KRS a este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio poderá, a fim de verificar se esta instância jurisdicional e os membros que a compõem satisfazem as exigências de independência e de imparcialidade decorrente do artigo 47.o da Carta, também ser levado a ter em conta diversos outros elementos que caracterizam mais diretamente a referida instância.

147    É o caso, em primeiro lugar, da circunstância destacada pelo tribunal de reenvio, segundo o qual a tal instância foi confiada especificamente, ao abrigo do artigo 27.o, n.o 1, da nova Lei sobre o Supremo Tribunal, uma competência exclusiva para conhecer dos processos em matéria de direito do trabalho e da segurança social, e de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal), que eram até agora da competência dos tribunais comuns.

148    Embora tal circunstância não seja decisiva enquanto tal, importa, no entanto, recordar, nomeadamente no que respeita aos litígios relativos à aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal), como os dos processos principais, que a sua atribuição à Secção Disciplinar ocorreu paralelamente à adoção, fortemente contestada, de disposições da nova Lei sobre o Supremo Tribunal que previram uma redução da idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) e a aplicação desta medida aos juízes em exercício desse tribunal, tendo conferido ao presidente da República o poder discricionário de prorrogar o exercício de funções judiciais ativas pelos juízes do referido tribunal além da idade de aposentação recentemente fixada.

149    Ora, há que lembrar, a este propósito, que, no seu Acórdão de 24 de junho de 2019, Comissão/Polónia (Independência do Supremo Tribunal) (C‑619/18, EU:C:2019:531), o Tribunal de Justiça declarou que, devido à adoção das referidas medidas, a República da Polónia tinha desrespeitado a inamovibilidade e a independência dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) e incumprido as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 19.o, n.o 1, segundo paragrafo, TUE.

150    Em segundo lugar, deve ser também salientada, nesse contexto, a circunstância, também destacada pelo órgão jurisdicional de reenvio, segundo a qual, nos termos do artigo 131.o da nova Lei sobre o Supremo Tribunal, a Secção Disciplinar deve ser composta apenas por juízes recentemente nomeados, com exclusão, por conseguinte, dos juízes que estavam já em exercício no Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal).

151    Em terceiro lugar, importa observar que, ainda que instituída como secção do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal), a Secção Disciplinar parece, diferentemente das outras secções que compõem esse tribunal, e como resulta nomeadamente do artigo 20.o da nova Lei sobre o Supremo Tribunal, gozar de um grau de autonomia particularmente elevado no referido órgão jurisdicional.

152    Embora cada uma das diversas circunstâncias destacadas nos n.os 147 a 151 do presente acórdão não sejam, certamente, suscetíveis de por si só e quando consideradas isoladamente, conduzir ao questionamento da independência de uma instância como a Secção Disciplinar, pode, em contrapartida, assim não ser devido à sua combinação, e sobretudo se a análise suprarreferida no que respeita ao KRS revelar uma falta de independência deste último em relação aos poderes legislativo e executivo.

153    Assim, o tribunal nacional será chamado a apreciar, tendo em conta, se for caso disso, os motivos ou objetivos específicos perante ele alegados numa tentativa de justificar algumas das medidas em causa, se a combinação dos elementos mencionados nos n.os 143 a 151 do presente acórdão e de quaisquer outras circunstâncias relevantes devidamente demonstradas de que venha a ter conhecimento pode suscitar dúvidas legítimas, no espírito dos particulares, quanto à impermeabilidade da Secção Disciplinar em relação a elementos externos e, em especial, às influências diretas ou indiretas dos poderes legislativo e executivo, e quanto à sua neutralidade em relação a interesses concorrentes e, por conseguinte, se pode ter como consequência que a referida instância não tenha a aparência de independência ou imparcialidade, situação que pode afetar a confiança que a justiça deve inspirar nos referidos particulares numa sociedade democrática.

154    Se esse órgão jurisdicional chegasse à conclusão de que assim é, concluir‑se‑ia que essa instância não cumpre as exigências decorrentes do artigo 47.o da Carta e do artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2000/78, por não constituir um tribunal independente e imparcial, na aceção da primeira dessas disposições.

155    Nessa situação, o órgão jurisdicional de reenvio pretende também saber se o princípio do primado do direito da União o obriga a afastar as disposições nacionais que reservam a competência jurisdicional para conhecer dos litígios nos processos principais à referida instância.

156    Para responder a esta questão, importa recordar que o direito da União se caracteriza pelo facto de emanar de uma fonte autónoma, constituída pelos Tratados, pelo seu primado sobre os direitos dos Estados‑Membros, bem como pelo efeito direto de uma série de disposições aplicáveis aos seus nacionais e aos próprios Estados‑Membros. Estas características essenciais do direito da União deram origem a uma rede estruturada de princípios, de regras e de relações jurídicas mutuamente interdependentes que vinculam, reciprocamente, a própria União e os seus Estados‑Membros, e estes entre si [Parecer 1/17 (Acordo ECG UE Canadá), de 30 de abril de 2019, EU:C:2019:341, n.o 109 e jurisprudência referida].

157    O princípio do primado do direito da União consagra a prevalência do direito da União sobre o direito dos Estados‑Membros (Acórdão de 24 de junho de 2019, Popławski, C‑573/17, EU:C:2019:530, n.o 53 e jurisprudência referida).

158    Este princípio impõe, assim, a todas as instâncias dos Estados‑Membros que confiram pleno efeito às diferentes normas da União, não podendo o direito dos Estados‑Membros afetar o efeito reconhecido a essas diferentes normas no território dos referidos Estados (Acórdão de 24 de junho de 2019, Popławski, C‑573/17, EU:C:2019:530, n.o 54 e jurisprudência referida).

159    A este respeito, importa lembrar, nomeadamente, que o princípio de interpretação conforme do direito interno, nos termos do qual o órgão jurisdicional nacional deve dar ao direito interno, na medida do possível, uma interpretação conforme com as exigências do direito da União, é inerente ao sistema dos Tratados, na medida em que permite ao órgão jurisdicional nacional assegurar, no âmbito das suas competências, a plena eficácia do direito da União quando decide do litígio que lhe é submetido (Acórdão de 24 de junho de 2019, Popławski, C‑573/17, EU:C:2019:530, n.o 55 e jurisprudência referida).

160    É igualmente por força do princípio do primado que, na impossibilidade de proceder a uma interpretação da regulamentação nacional conforme com as exigências do direito da União, o juiz nacional encarregado de aplicar, no âmbito da sua competência, as disposições do direito da União tem a obrigação de garantir o pleno efeito das mesmas, não aplicando, se necessário e por sua própria iniciativa, qualquer disposição contrária da legislação nacional, mesmo que posterior, sem ter de pedir ou de esperar pela sua revogação prévia por via legislativa ou por qualquer outro procedimento constitucional (Acórdão de 24 de junho de 2019, Popławski, C‑573/17, EU:C:2019:530, n.o 58 e jurisprudência referida).

161    A este respeito, qualquer juiz nacional, chamado a pronunciar‑se no âmbito da sua competência, tem, enquanto órgão de um Estado‑Membro, mais precisamente a obrigação de não aplicar qualquer disposição nacional contrária a uma disposição de direito da União que tenha efeito direto no litígio que é chamado a decidir (Acórdão de 24 de junho de 2019, Popławski, C‑573/17, EU:C:2019:530, n.o 61 e jurisprudência referida).

162    Quanto ao artigo 47.o da Carta, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a referida disposição basta, por si só, e não deve ser precisada por disposições do direito da União ou do direito nacional para conferir aos particulares um direito que pode ser invocado enquanto tal (Acórdãos de 17 de abril de 2018, Egenberger, C‑414/16, EU:C:2018:257, n.o 78, e de 29 de julho de 2019, Torubarov, C‑556/17, EU:C:2019:626, n.o 56).

163    O mesmo acontece com o artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2000/78, uma vez que, como lembrado no n.o 80 do presente acórdão, ao dispor que os Estados‑Membros tomam as medidas necessárias para assegurar que todas as pessoas que se considerem lesadas pela não aplicação, no que lhes diz respeito, do princípio da igualdade de tratamento visado por essa diretiva, possam fazer valer os seus direitos, a referida disposição reafirma expressamente o direito à ação no domínio em causa. Com efeito, ao aplicarem a Diretiva 2000/78, os Estados‑Membros são obrigados a respeitar o artigo 47.o da Carta, e as características do recurso previsto no artigo 9.o, n.o 1, daquela devem ser determinadas em conformidade com esse artigo 47.o (v., por analogia, Acórdão de 29 de julho de 2019, Torubarov, C‑556/17, EU:C:2019:626, n.os 55 e 56).

164    Por conseguinte, na hipótese referida no n.o 160 do presente acórdão, o órgão jurisdicional nacional é obrigado a assegurar, no quadro das suas competências, a proteção jurídica que decorre, para os particulares, do artigo 47.o da Carta e do artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2000/78, e a garantir o pleno efeito desses artigos, afastando, se necessário, a aplicação de qualquer disposição nacional contrária (v., neste sentido, Acórdão de 17 de abril de 2018, Egenberger, C‑414/16, EU:C:2018:257, n.o 79).

165    Ora, uma disposição nacional que atribui competência exclusiva para conhecer de um litígio em que um particular alega, como no caso em apreço, a violação de direitos decorrentes de regras do direito da União a uma determinada instância que não cumpre as exigências de independência e de imparcialidade decorrente do artigo 47.o da Carta priva o interessado de um recurso efetivo, na aceção do artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2000/78, e viola o conteúdo essencial do direito à ação consagrado no artigo 47.o da Carta (v., por analogia, Acórdão de 29 de julho de 2019, Torubarov, C‑556/17, EU:C:2019:626, n.o 72).

166    De onde resulta que, quando se afigura que uma disposição nacional reserva a competência exclusiva para conhecer de um litígio como os dos processos principais a uma instância que não cumpre as exigências de independência ou imparcialidade estabelecidas pelo direito da União, em particular, pelo artigo 47.o da Carta, uma outra instância a quem tenha sido submetido esse litígio tem a obrigação, para garantir uma tutela jurisdicional efetiva, na aceção do referido artigo 47.o, e em conformidade com o princípio da cooperação leal consagrado no artigo 4.o, n.o 3, TUE, de não aplicar essa disposição nacional, de maneira a que o litígio possa ser decidido por um órgão jurisdicional que cumpra as referidas exigências e que seria competente no domínio em causa se a referida disposição não obstasse a tal, ou seja, regra geral, o tribunal que era competente, em conformidade com a legislação em vigor, antes da alteração legislativa que atribuiu a competência à instância que não cumpre as referidas exigências (v., por analogia, Acórdãos de 22 de maio de 2003, Connect Austria, C‑462/99, EU:C:2003:297, n.o 42, e de 2 de junho de 2005, Koppensteiner, C‑15/04, EU:C:2005:345, n.os 32 a 39).

167    Quanto, por outro lado, aos artigos 2.o e 19.o TUE, disposições sobre as quais incidem também as questões dirigidas ao Tribunal de Justiça pelo órgãos jurisdicional de reenvio, importa recordar que o artigo 19.o TUE, que concretiza o valor do Estado de direito afirmado no artigo 2.o TUE, confia aos órgãos jurisdicionais nacionais e ao Tribunal de Justiça a missão de garantir a plena aplicação do direito da União em todos os Estados‑Membros, bem como a tutela jurisdicional que esse direito confere aos particulares [Acórdão de 24 de junho de 2019, Comissão/Polónia (Independência do Supremo Tribunal), C‑619/18, EU:C:2019:531, n.o 47 e jurisprudência referida].

168    Ora, o princípio da tutela jurisdicional efetiva dos direitos conferidos aos particulares pelo direito da União, a que se refere o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, constitui um princípio geral do direito da União que é atualmente afirmado no artigo 47.o da Carta, de modo que a primeira dessas disposições obriga todos os Estados‑Membros a estabelecerem as vias de recurso necessárias para assegurar uma tutela jurisdicional efetiva, na aceção designadamente da segunda dessas disposições, nos domínios abrangidos pelo direito da União [v., neste sentido, Acórdão de 24 de junho de 2019, Comissão/Polónia (Independência do Supremo Tribunal), C‑619/18, EU:C:2019:531, n.os 49 e 54, e jurisprudência referida].

169    Nestas condições, uma análise separada dos artigos 2.o e 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, que não poderia deixar de corroborar a conclusão já enunciada nos n.os 153 e 154 do presente acórdão, não se afigura necessária para efeitos da resposta às interrogações do órgão jurisdicional de reenvio e da solução dos litígios que lhe foram submetidos.

170    Por fim, não há também, no caso em apreço, que interpretar o artigo 267.o TFUE igualmente referido pelo órgão jurisdicional de reenvio nas suas questões. Na decisão de reenvio, este órgão jurisdicional não forneceu, com efeito, qualquer explicação quanto às razões pelas quais uma interpretação desse artigo poderia revelar‑se pertinente para efeitos da solução das questões que é chamada a decidir nos litígios nos processos principais. Além disso, de qualquer modo, afigura‑se que a interpretação do artigo 47.o da Carta e do artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2000/78 a que se procedeu nos n.os 114 a 154 do presente acórdão basta para dar uma resposta adequada para esclarecer o referido tribunal na perspetiva das decisões que é chamado a tomar nos referidos litígios.

171    Tendo em conta as considerações expostas, há que responder à segunda e terceira questões submetidas nos processos C‑624/18 e C‑625/18 da seguinte maneira:

–        O artigo 47.o da Carta e o artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2000/78 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que litígios relativos à aplicação do direito da União possam ser abrangidos pela competência exclusiva de uma instância que não constitui um tribunal independente e imparcial, na aceção da primeira dessas disposições. É o que acontece quando as condições objetivas em que foi criada a instância em causa e as suas características, assim como a maneira como os seus membros foram nomeados são suscetíveis de suscitar dúvidas legítimas, no espírito dos particulares, quanto à impermeabilidade dessa instância em relação a elementos externos, em especial, influências diretas ou indiretas dos poderes legislativo e executivo, e quanto à sua neutralidade em relação aos interesses concorrentes e, por conseguinte, são suscetíveis de ter como consequência que a referida instância não tenha a aparência de independência ou imparcialidade, situação que pode afetar a confiança que a justiça deve inspirar nos referidos particulares numa sociedade democrática. Incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio determinar, tendo em conta todos os elementos relevantes de que dispõe, se é o caso no que respeita a uma instância como a Secção Disciplinar do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal).

–        Em tal hipótese, o princípio do primado do direito da União deve ser interpretado no sentido de que impõe ao órgão jurisdicional de reenvio que não aplique a disposição do direito nacional que reserva a competência para conhecer dos litígios nos processos principais à referida instância, de forma a que estes possam ser examinados por um órgão jurisdicional que corresponda às exigências de independência e de imparcialidade suprarreferidas e que seria competente no domínio em causa se a referida disposição não obstasse a tal.

 Quanto às despesas

172    Revestindo o processo, quanto às partes na causas principais, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

1)      Já não há que responder às questões submetidas pela Izba Pracy i Ubezpieczeń Społecznych (Secção do Trabalho e da Segurança Social) do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal, Polónia) no processo C 585/18, nem à primeira questão submetida por esse mesmo tribunal nos processos C 624/18 e C 625/18.

2)      Há que responder à segunda e terceira questões submetidas pelo referido órgão jurisdicional nos processos C 624/18 e C 625/18 da seguinte forma:

O artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e o artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2000/78/CE do Conselho, de 27 de novembro de 2000, que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na atividade profissional, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que litígios relativos à aplicação do direito da União possam ser abrangidos pela competência exclusiva de uma instância que não constitui um tribunal independente e imparcial, na aceção da primeira dessas disposições. É o que acontece quando as condições objetivas em que foi criada a instância em causa e as suas características, assim como a maneira como os seus membros foram nomeados são suscetíveis de suscitar dúvidas legítimas, no espírito dos particulares, quanto à impermeabilidade dessa instância em relação a elementos externos, em especial, influências diretas ou indiretas dos poderes legislativo e executivo, e quanto à sua neutralidade em relação aos interesses concorrentes e, por conseguinte, são suscetíveis de ter como consequência que a referida instância não tenha a aparência de independência ou imparcialidade, situação que pode afetar a confiança que a justiça deve inspirar nos referidos particulares numa sociedade democrática. Incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio determinar, tendo em conta todos os elementos relevantes de que dispõe, se é o caso no que respeita a uma instância como a Secção Disciplinar do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal).

Em tal hipótese, o princípio do primado do direito da União deve ser interpretado no sentido de que impõe ao órgão jurisdicional de reenvio que não aplique a disposição do direito nacional que reserva a competência para conhecer dos litígios nos processos principais à referida instância, de forma a que estes possam ser examinados por um órgão jurisdicional que corresponda às exigências de independência e de imparcialidade suprarreferidas e que seria competente no domínio em causa se a referida disposição não obstasse a tal.

Assinaturas


*      Língua do processo: polaco.