Language of document : ECLI:EU:T:2015:687

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção)

24 de setembro de 2015 (*)

«Auxílios de Estado — Serviço público de radiodifusão — Decisão que declara o auxílio compatível com o mercado interno — Auxílio executado pelas autoridades dinamarquesas a favor do radiodifusor dinamarquês de serviço público TV2/Danmark — Financiamento público concedido para compensar os custos inerentes à execução das obrigações de serviço público — Compatibilidade de um auxílio — Acórdão Altmark»

No processo T‑125/12,

Viasat Broadcasting UK Ltd, com sede em West Drayton (Reino Unido), representada por S. Kalsmose‑Hjelmborg e M. Honoré, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por L. Flynn e B. Stromsky, na qualidade de agentes,

recorrida,

apoiada por:

Reino da Dinamarca, representado inicialmente por C. Vang e V. Pasternak Jørgensen, na qualidade de agentes, em seguida por V. Pasternak Jørgensen, assistida por K. Lundgaard Hansen, advogado, e por último por C. Thorning, na qualidade de agente, assistido por K. Lundgaard Hansen e R. Holgaard, advogado,

e

TV2/Danmark A/S, com sede em Odense (Dinamarca), representada por O. Koktvedgaard, advogado,

intervenientes,

que tem por objeto um pedido de anulação parcial da Decisão 2011/839/UE da Comissão, de 20 de abril de 2011, relativa às medidas adotadas pela Dinamarca (C 2/03) a favor da TV2/Danmark (JO L 340, p. 1),

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção),

composto por: D. Gratsias (relator), presidente, N. J. Forwood e C. Wetter, juízes,

secretário: L. Grzegorczyk, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 15 de janeiro de 2015,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes e contexto factual do litígio

1        O presente recurso tem por objeto um pedido de anulação parcial da Decisão 2011/839/UE da Comissão, de 20 de abril de 2011, relativa às medidas adotadas pela Dinamarca (C 2/03) a favor da TV2/Danmark (JO L 340, p. 1, a seguir «decisão impugnada»), na parte em que declara que as referidas medidas, apesar de constituírem auxílios de Estado, são compatíveis com o mercado interno, na aceção do artigo 106.°, n.° 2, TFUE. Foi interposto pela Viasat Broadcasting UK Ltd (a seguir «recorrente» ou «Viasat»), uma sociedade de radiodifusão comercial que exerce a sua atividade no mercado dinamarquês e concorrente direta da sociedade de radiodifusão dinamarquesa TV2/Danmark A/S (a seguir «TV2 A/S»).

2        A TV2 A/S foi criada com vista a substituir, com efeitos contabilísticos e fiscais a partir de 1 de janeiro de 2003, a empresa estatal autónoma TV2/Danmark (a seguir «TV2»), criada em 1986 pela Lov n.° 335 om ændring af lov om radio‑og fjernsynsvirksomhed (Lei n.° 335 que altera a lei da radiodifusão), de 4 de junho de 1986. A TV2 A/S é, tal como a sua antecessora TV2, a segunda estação de televisão pública da Dinamarca, sendo a primeira a Danmarks Radio (a seguir «DR»).

3        A TV2 A/S, como, anteriormente, a TV2, está encarregada de uma missão de serviço público que consiste em produzir e emitir programas de televisão nacionais e regionais. Esta emissão pode efetuar‑se através de equipamento de rádio, satélite ou cabo. As regras relativas às obrigações de serviço público da TV2 A/S e da TV2 são elaboradas pelo Ministro da Cultura dinamarquês.

4        Além dos organismos públicos de radiodifusão, no mercado dinamarquês de televisão operam organismos de radiodifusão comercial. Trata‑se, designadamente, por um lado, da recorrente, e, por outro, do conjunto formado pelas sociedades SBS TV A/S e SBS Danish Television Ltd (a seguir «SBS»).

5        A TV2 foi constituída com o auxílio de um empréstimo estatal sujeito a juros e a sua atividade deveria, tal como a da DR, ser financiada com a ajuda do produto da taxa paga por todos os telespectadores dinamarqueses. Todavia, o legislador dinamarquês decidiu que, contrariamente à DR, a TV2 também teria a possibilidade de beneficiar, designadamente, do produto da atividade publicitária.

6        Na sequência de uma denúncia apresentada, em 5 de abril de 2000, pela sociedade SBS Broadcasting AS/Tv Danmark, outra radiodifusora comercial com atividade no mercado dinamarquês, o sistema de financiamento da TV2 foi objeto de apreciação pela Comissão das Comunidades Europeias na sua Decisão 2006/217/CE, de 19 de maio de 2004, relativa aos auxílios estatais concedidos pela Dinamarca à [TV2] (JO 2006, L 85, p. 1, retificação no JO 2006, L 368, p. 1, a seguir «decisão TV2 I»). Esta decisão abrangia o período entre 1995 e 2002 e referia‑se às seguintes medidas: receitas provenientes da taxa, transferências de fundos destinados ao financiamento da TV2 (Fundo TV2 e Radiofonden), quantias concedidas ad hoc, isenção do imposto sobre as sociedades, isenção do pagamento de juros e reembolso dos empréstimos de instalação concedidos à TV2 quando da sua constituição, garantia estatal para empréstimos ao funcionamento e condições favoráveis de pagamento da taxa pela utilização da frequência de transmissão nacional (a seguir, consideradas no seu todo, «medidas em causa»). Por último, a investigação da Comissão abrangeu ainda a autorização concedida à TV2 para emitir em frequências locais em rede e a obrigação de os proprietários de instalações com antena coletiva sintonizarem os programas de serviço público da TV2 nas suas instalações.

7        Finda a apreciação das medidas em causa, a Comissão concluiu que estas constituíam auxílios de Estado na aceção do artigo 87.°, n.° 1, CE (atual artigo 107.°, n.° 1, TFUE). Esta conclusão baseou‑se no entendimento de que o regime de financiamento da TV2, destinado a compensar os custos das suas prestações de serviço público, não preenchia a segunda e quarta condições definidas pelo Tribunal de Justiça no seu acórdão de 24 de julho de 2003, Altmark Trans e Regierungspräsidium Magdeburg (C‑280/00, Colet., a seguir «acórdão Altmark» e, relativamente às condições acima referidas, «condições Altmark», EU:C:2003:415).

8        A Comissão decidiu ainda que os auxílios concedidos entre 1995 e 2002 pelo Reino da Dinamarca à TV2, sob a forma de taxas e de outras medidas descritas na decisão TV2 I, eram compatíveis com o mercado interno, em conformidade com o artigo 86.°, n.° 2, CE (atual artigo 106.°, n.° 2, TFUE), com exceção de um montante de 628,2 milhões de coroas dinamarquesas (DKK) que qualificou de sobrecompensação (considerando 163 e artigo 1.° da decisão TV2 I). Ordenou assim ao Reino da Dinamarca que recuperasse esse montante, acrescido de juros, junto da TV2 A/S (artigo 2.° da decisão TV2 I), que entretanto havia sido substituída pela TV2 (v. n.° 2 supra).

9        Dado que a recuperação do auxílio prevista no artigo 2.° da Decisão TV2 I tornou a TV2 A/S insolvente, o Reino da Dinamarca notificou a Comissão, por carta de 23 de julho de 2004, de um projeto de recapitalização dessa sociedade. Esse projeto previa, em matéria de medidas financiadas pelo Estado, por um lado, uma entrada de capital de 440 milhões de DKK e, por outro, a conversão em capital de um empréstimo estatal de 394 milhões de DKK. Com a sua Decisão C (2004) 3632 final, de 6 de outubro de 2004, no processo em matéria de auxílios de Estado N 313/2004, relativo à recapitalização da [TV2 A/S] (JO 2005, C 172, p. 3, a seguir «decisão sobre a recapitalização»), a Comissão concluiu que as duas medidas de apoio à TV2 A/S adotadas eram «necessárias para reconstituir o capital de que a TV 2 [A/S], depois da sua transformação em sociedade anónima, precisa[va] para poder cumprir a sua função de serviço público» (considerando 53 da decisão sobre a recapitalização). Por conseguinte, a Comissão decidiu que quaisquer elementos de auxílio de Estado que poderiam estar ligados à recapitalização prevista da TV2 A/S eram compatíveis com o mercado comum em conformidade com o artigo 86.°, n.° 2, CE (considerando 55 da decisão sobre a recapitalização).

10      A decisão TV2 I foi objeto de quatro recursos de anulação, interpostos, por um lado, pela TV2 A/S (processo T‑309/04) e pelo Reino da Dinamarca (processo T‑317/04) e, por outro, pelas concorrentes da TV2 A/S, a saber, a recorrente (processo T‑329/04) e a SBS (processo T‑336/04).

11      Através do acórdão de 22 de outubro de 2008, TV2/Danmark e o./Comissão (T‑309/04, T‑317/04, T‑329/04 e T‑336/04, Colet., a seguir «acórdão TV2 I», EU:T:2008:457), o Tribunal Geral anulou a decisão TV2 I. No seu acórdão, o Tribunal considerou que a Comissão concluíra corretamente que a missão de serviço público confiada à TV2 correspondia à definição de serviços de interesse económico geral da radiodifusão (acórdão TV2 I, já referido, EU:T:2008:457, n.° 124). Todavia, considerou também que a decisão TV2 I padecia de várias ilegalidades, que ditaram, por fim, a anulação da mesma.

12      Assim, em primeiro lugar, ao apreciar a questão de saber se as medidas em análise na decisão TV2 I utilizaram recursos estatais, o Tribunal entendeu que a Comissão não cumpriu o seu dever de fundamentação em relação à questão de as receitas publicitárias de 1995 e 1996 terem sido consideradas, de facto, recursos estatais (acórdão TV2 I, n.° 11 supra, EU:T:2008:457, n.os 160 a 167). Em segundo lugar, o Tribunal declarou que a apreciação, por parte da Comissão, da questão de saber se a segunda e quarta condições Altmark se encontravam preenchidas não se baseou numa análise séria das condições jurídicas e económicas concretas com base nas quais foi determinado o montante da taxa atribuído à TV2. Consequentemente, a decisão TV2 I estava ferida de falta de fundamentação quanto a essa questão (acórdão TV2 I, n.° 11 supra, EU:T:2008:457, n.os 224 a 233). Em terceiro lugar, o Tribunal entendeu que as conclusões da Comissão relativas à apreciação da compatibilidade do auxílio nos termos do artigo 86.°, n.° 2, CE, em especial à existência de uma sobrecompensação, padeciam, também, de falta de fundamentação. Segundo o Tribunal, esta falta de fundamentação explica‑se pela inexistência de apreciação precisa e circunstanciada das condições concretas, jurídicas e económicas, que presidiram à determinação do montante da taxa atribuída à TV2 durante o período de inquérito (acórdão TV2 I, n.° 11 supra, EU:T:2008:457, n.os 192 e 197 a 203).

13      A decisão sobre a recapitalização foi objeto de dois recursos de anulação, interpostos pela SBS e pela recorrente. Através de dois despachos proferidos em 24 de setembro de 2009, o Tribunal declarou que, tendo em conta a anulação da decisão TV2 I e a estreita ligação entre a obrigação de recuperação do auxílio que decorre daquela decisão e as medidas objeto da decisão sobre a recapitalização, não havia que conhecer dos processos acima referidos (despachos de 24 de setembro de 2009, SBS TV e SBS Danish Television/Comissão, T‑12/05, EU:T:2009:357, e Viasat Broadcasting UK/Comissão, T‑16/05, EU:T:2009:358).

14      Na sequência da anulação da decisão TV2 I, a Comissão reapreciou as medidas em causa. Consultou então o Reino da Dinamarca e a TV2 A/S e, por outro lado, recebeu observações de terceiros.

15      A Comissão apresentou o resultado da sua nova apreciação das medidas em causa na decisão impugnada, que é objeto do presente recurso, bem como de outro recurso interposto pela TV2 A/S (processo T‑674/11, TV2/Danmark/Comissão), sobre o qual o Tribunal se pronunciou em acórdão proferido na presente data.

16      A decisão impugnada tem por objeto as medidas adotadas relativamente à TV2 entre 1995 e 2002. Contudo, na sua apreciação, a Comissão também teve em conta medidas de recapitalização adotadas em 2004 no seguimento da decisão TV2 I.

17      Na decisão impugnada, a Comissão manteve a sua posição quanto à qualificação das medidas em causa de auxílios de Estado na aceção do artigo 107.°, n.° 1, TFUE em benefício da TV2 (considerando 153 da decisão impugnada). Num primeiro momento, considerou que as receitas publicitárias referentes a 1995 e 1996 constituíam recursos estatais (considerando 90 da decisão impugnada) e, num segundo momento, ao verificar a existência de uma vantagem seletiva, concluiu que as medidas em causa não preenchiam a segunda e quarta condições Altmark (considerando 153 da decisão impugnada). Em contrapartida, ao passo que, na decisão TV2 I, concluíra que a quantia de 628,2 milhões de DKK constituía uma sobrecompensação incompatível com o artigo 86.°, n.° 2, CE, a Comissão entendeu, na decisão impugnada, que essa quantia era uma reserva de capitais próprios adequada para a TV2 A/S (considerando 233 da decisão impugnada). No dispositivo da decisão impugnada, declarou então o seguinte:

«Artigo 1.°

O auxílio estatal concedido entre 1995 e 2002 pela Dinamarca à [TV2], sob a forma de recursos provenientes das taxas de televisão e de outras medidas descritas na presente decisão, é compatível com o mercado interno na aceção do artigo 106.°, n.° 2, [TFUE]».

18      Por último, saliente‑se que o Reino da Dinamarca adotou medidas de emergência e restruturação da TV2 A/S. Assim, por um lado, em 16 de junho de 2008, notificou um projeto de auxílio de emergência sob a forma de linha de crédito, a favor da TV2 A/S. Este auxílio foi aprovado pela Comissão na sua Decisão C (2008) 4224 final, de 4 de agosto de 2008, no processo n.° 287/2008, relativa ao auxílio de emergência concedido à TV2 A/S (JO 2009, C 9, p. 1). A decisão da Comissão foi objeto de um recurso da Viasat. Por despacho de 22 de março de 2012, o Tribunal, tendo verificado que o auxílio aprovado pela decisão em causa tinha sido integralmente reembolsado, decidiu que o recurso ficara sem objeto e que não havia que conhecer de mérito (despacho de 22 de março de 2012, Viasat Broadcasting UK/Comissão, T 114/09, EU:T:2012:144).

19      Por outro lado, em 4 de fevereiro de 2009, o Reino da Dinamarca notificou a Comissão do plano de reestruturação da TV 2 A/S. Na sua Decisão 2012/109/UE, de 20 de abril de 2011, relativa ao auxílio estatal C 19/09 (ex N 64/09) que a Dinamarca tenciona conceder com vista à reestruturação da [TV2 A/S] (JO 2012, L 50, p. 21), a Comissão considerou que esse plano de reestruturação era compatível com o mercado interno na aceção do artigo 107.°, n.° 3, alínea c), TFUE uma vez preenchidos determinados requisitos, entre os quais a proibição de pagamento de medidas de auxílio previstas pelo referido plano, uma vez que a situação da sociedade beneficiária melhorou. Esta decisão foi objeto de um recurso de anulação interposto pela Viasat. Tendo a Viasat desistido do seu recurso, o processo foi cancelado do registo do Tribunal Geral por despacho de 10 de dezembro de 2012, Viasat Broadcasting UK/Comissão (T‑210/12, EU:T:2012:660).

 Tramitação do processo e pedidos das partes

20      Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 14 de março de 2012, a recorrente interpôs o presente recurso.

21      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 12 de junho de 2012, o Reino da Dinamarca pediu para intervir no presente processo, em apoio dos pedidos da Comissão.

22      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 29 de junho de 2012, a TV2 A/S pediu para intervir no presente processo, em apoio dos pedidos da Comissão.

23      Por despachos de 12 de setembro de 2012, o presidente da Terceira Secção do Tribunal Geral deferiu esses pedidos.

24      A TV2 A/S apresentou as suas alegações de intervenção em 30 de novembro de 2012. No mesmo dia, o Reino da Dinamarca fez entrega das suas alegações de intervenção.

25      A recorrente apresentou as suas observações escritas sobre as alegações de intervenção em 19 de março de 2013. A Comissão não apresentou observações escritas sobre as alegações de intervenção.

26      Tendo sido modificada a composição das Secções do Tribunal Geral, o juiz‑relator foi afetado, na qualidade de presidente, à Oitava Secção, à qual, por conseguinte, o presente processo foi distribuído.

27      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Oitava Secção) decidiu iniciar a fase oral do processo.

28      Estando um membro da Secção impedido de participar na formação de julgamento, o presidente do Tribunal Geral designou outro juiz para completar a Secção, nos termos do artigo 32.°, n.° 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral de 2 de maio de 1991.

29      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal Geral na audiência que teve lugar em 15 de janeiro de 2015. Na audiência, respondendo a uma questão do Tribunal, as partes pronunciaram‑se relativamente à questão de um eventual desaparecimento do objeto do litígio no presente processo, na hipótese de a decisão impugnada ser anulada na sequência do recurso no processo T‑674/11, TV2/Danmark/Comissão.

30      A recorrente conclui pedindo ao Tribunal que se digne:

–        anular a decisão impugnada;

–        condenar a Comissão nas despesas.

31      A Comissão conclui pedindo ao Tribunal que se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

32      O Reino da Dinamarca e a TV2 A/S concluem pedindo ao Tribunal que se digne negar provimento ao recurso.

 Questão de direito

 Quanto à admissibilidade

33      Uma vez que a recorrente não é destinatária da decisão impugnada, importa verificar se tem legitimidade ativa no âmbito do presente recurso.

34      Segundo jurisprudência constante, os sujeitos que não sejam os destinatários de uma decisão só podem alegar que ela lhes diz individualmente respeito se esta os prejudicar por determinadas qualidades que lhes são específicas ou por uma situação de facto que os caracterize relativamente a qualquer outra pessoa, individualizando‑os, por isso, de forma idêntica à do destinatário dessa decisão (acórdãos de 15 de julho de 1963, Plaumann/Comissão, 25/62, Colet., EU:C:1963:17, e de 22 de dezembro de 2008, British Aggregates/Comissão, C‑487/06 P, Colet., EU:C:2008:757, n.° 26). No âmbito dos auxílios de Estado, a jurisprudência reconhece um estatuto especial na aceção do acórdão Plaumann/Comissão, já referido (EU:C:1963:17), designadamente, ao recorrente cuja posição no mercado for substancialmente afetada pelo auxílio objeto da decisão em causa (acórdão British Aggregates/Comissão, já referido, EU:C:2008:757, n.° 30).

35      No caso vertente, a decisão impugnada incide sobre as medidas que, entre 1995 e 2002, constituíam praticamente a totalidade do financiamento da TV2. Ora, resulta dos autos que a TV2 era o maior agente e a principal concorrente direta da recorrente no mercado dinamarquês da publicidade televisiva e no mercado grossista dinamarquês em que as radiodifusoras propõem os seus canais aos distribuidores. Há que considerar, pois, que, no caso vertente, a posição da recorrente no mercado é substancialmente afetada pelo auxílio objeto da decisão em causa, na aceção da jurisprudência acima referida no n.° 34.

36      Em face destas considerações e do facto de a decisão impugnada dizer respeito a auxílios de Estado já pagos e considerados compatíveis com o mercado interno, há que considerar o recurso admissível.

 Quanto ao mérito

37      Através do presente recurso, a recorrente contesta a conclusão da decisão impugnada segundo a qual os auxílios de Estado concedidos à TV2 eram compatíveis com o mercado interno.

38      A este respeito, há salientar que, nos considerandos 155 a 159 da decisão impugnada, a Comissão fez referência, como parâmetro de apreciação da compatibilidade das medidas em causa com o mercado interno, ao artigo 106.°, n.° 2, TFUE e à sua Comunicação de 15 de novembro de 2001 relativa à aplicação das regras em matéria de auxílios estatais ao serviço público de radiodifusão (JO C 320, p. 5, a seguir «comunicação relativa à radiodifusão de 2001»), que fixava os princípios e métodos que pretendia aplicar para assegurar o respeito dos requisitos previstos no artigo 106.°, n.° 2, TFUE.

39      Há que referir que, em 2 de julho de 2009, a Comissão adotou uma nova comunicação relativa à aplicação das regras em matéria de auxílios estatais ao serviço público de radiodifusão (JO C 257, p. 1, a seguir «comunicação relativa à radiodifusão de 2009»). Contudo, este último ato precisa, no seu n.° 100, que a Comissão aplicará aos auxílios não notificados e concedidos antes da sua publicação no Jornal Oficial da União Europeia, como os auxílios controvertidos, a comunicação relativa à radiodifusão de 2001.

40      Na parte da decisão impugnada consagrada à compatibilidade das medidas em causa com o mercado interno, a Comissão considerou, em primeiro lugar, que a definição dos serviços de interesse económico geral que deviam ser executados pela TV2 era ampla, mas respeitava as exigências do artigo 106.°, n.° 2, TFUE, lido à luz das disposições interpretativas desse artigo inseridas no protocolo sobre o sistema de radiodifusão pública nos Estados‑Membros anexo ao Tratado FUE, conhecido como Protocolo de Amesterdão (considerandos 171 e 172 da decisão impugnada). Em seguida, a Comissão entendeu que a Lei da radiodifusão (Lov om radio‑og fjernsynsvirksomhed) apenas confia oficialmente à TV2 a missão de televisão de serviço público. Em contrapartida, segundo a Comissão, o lançamento de qualquer outra atividade suplementar por parte da TV2 necessitava de um novo mandato para ser conforme ao artigo 106.°, n.° 2, TFUE (considerandos 174 e 175 da decisão impugnada). Por último, a Comissão apreciou a proporcionalidade do auxílio de Estado concedido à TV2 concentrando a sua apreciação em dois aspetos: por um lado, calculou os custos líquidos da missão de serviço público confiada à TV2 e verificou se esse custo tinha sido objeto de uma sobrecompensação, por outro, apreciou o comportamento da TV2 no mercado da publicidade, a fim de verificar se a TV2 não praticava preços artificialmente baixos para as suas publicidades em detrimento das suas concorrentes. Concluiu que as medidas em causa eram compatíveis com o mercado interno.

41      A recorrente critica esta apreciação da compatibilidade das medidas em causa com o mercado interno nos termos do artigo 106.°, n.° 2, TFUE, sob um ângulo metodológico precisamente definido. Alega, com efeito, que, uma vez que a Comissão aplicou o artigo 106.°, n.° 2, TFUE, os termos dessa disposição exigiam que a instituição tomasse também em consideração a segunda e quarta condições Altmark para verificar se as regras de concorrência previstas pelo Tratado limitavam o cumprimento da missão de serviço público da TV2 e se o auxílio afetou as trocas numa medida contrária ao interesse da União Europeia.

42      A recorrente não refere outros erros cometidos pela Comissão na sua apreciação. Não alega, designadamente, que a análise da compatibilidade das medidas em causa com o mercado interno efetuada pela Comissão nos termos da comunicação relativa à radiodifusão de 2001 está viciada de um erro de apreciação.

43      O recurso articula‑se em torno de dois fundamentos, através dos quais a recorrente alega, por um lado, que a Comissão cometeu um erro de direito ao apreciar a compatibilidade das medidas em causa com o mercado interno nos termos do artigo 106.°, n.° 2, TFUE, sem ter em conta a segunda e quarta condições Altmark e, por outro, que a Comissão não fundamentou as razões pelas quais o artigo 106.°, n.° 2, TFUE era aplicável no caso vertente, uma vez que a segunda e quarta condições Altmark não se encontravam preenchidas, o que representava uma violação do artigo 296.° TFUE.

44      Importa referir em primeiro lugar a relação direta e estreita entre o presente recurso e o recurso interposto pela TV2 A/S, sucessora da beneficiária das medidas em causa, no processo T‑674/11, TV2/Danmark/Comissão, em que a recorrente intervém em apoio dos pedidos da Comissão. O recurso da TV2 A/S tem por objeto a anulação da decisão impugnada na parte em que a Comissão, tendo declarado que as medidas em causa não preenchiam a segunda e quarta condições Altmark, considerou que essas medidas constituíam auxílios de Estado e que se tratavam de novos auxílios.

45      No acórdão hoje proferido no processo T‑674/11, TV2/Danmark/Comissão, o Tribunal Geral deu parcialmente provimento ao recurso da TV2/Danmark e anulou a decisão impugnada, na parte em que a Comissão considerou que as receitas publicitárias de 1995 e de 1996 pagas à TV2/Danmark através do Fundo TV2 constituíam auxílios de Estado. Na sequência desta anulação, o presente recurso ficou sem objeto, na medida em que é pedida a anulação da decisão impugnada na parte que qualificou as receitas publicitárias de 1995 e de 1996 recebidas através do Fundo TV2 de auxílios de Estado compatíveis com o mercado interno. Com efeito, conforme declarou o Tribunal no seu acórdão acima referido, a transferência dessas receitas não constituía um auxílio de Estado, pelo que a questão da compatibilidade de tal auxílio com o mercado interno não se coloca. Todavia, uma vez que a recorrente aduz os mesmos fundamentos e argumentos relativamente a todas as medidas qualificadas de auxílios compatíveis com o mercado interno na decisão impugnada, estes fundamentos e argumentos devem, em todo o caso, ser apreciados relativamente às restantes conclusões da decisão impugnada.

46      Por outro lado, há ainda que referir que, no seu acórdão hoje proferido no processo T‑674/11, TV2/Danmark/Comissão (n.os 88 e seguintes), o Tribunal declarou que foi na sequência de um erro de direito que a Comissão concluiu, na decisão impugnada, que a segunda condição Altmark não se encontrava preenchida no caso vertente. Não declarou, todavia, que essa conclusão justificava a anulação da decisão impugnada, na medida em que considerou que a conclusão da Comissão de que a quarta condição Altmark não se encontrava preenchida no caso vertente não padecia de erro. Com efeito, esta última conclusão era, por si só, suficiente para justificar a conclusão de que as medidas em causa (com exceção da referida no n.° 45 supra) constituíam auxílios de Estado.

47      Visto que, na sua argumentação, a recorrente não distingue entre a segunda e quarta condições Altmark, alegando contudo, relativamente a essas duas condições, que o facto de não se encontrarem preenchidas deveria ter sido tido em consideração pela Comissão na apreciação da compatibilidade com o mercado interno dos auxílios de Estado controvertidos, a conclusão do Tribunal acima referida no n.° 46 não tem por efeito tornar inútil a apreciação de um ou outro dos fundamentos de recurso invocados pela recorrente.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 106.°, n.° 2, TFUE

48      Através do seu primeiro fundamento, a recorrente alega, em substância, que o acórdão Altmark, n.° 7 supra (EU:C:2003:415), afeta necessariamente a forma como a Comissão deve apreciar a compatibilidade de um auxílio de Estado com o mercado interno nos termos do artigo 106.°, n.° 2, TFUE.

49      Alega, em especial, que o artigo 106.°, n.° 2, TFUE deve ser interpretado de forma restritiva e ser aplicado apenas quando as regras do Tratado, designadamente o artigo 107.° TFUE, «constitu[em] obstáculos» ao cumprimento da missão de serviço público em causa. Além disso, de acordo com a sua letra, o artigo 106.°, n.° 2, TFUE só pode ser aplicado se essa aplicação não contrariar os interesses da União. Por último, segundo a recorrente, a segunda e quarta condições Altmark fazem parte do artigo 107.°, n.° 1, TFUE na medida em que este define o conceito de auxílio de Estado. Assim, a recorrente imputa à Comissão o facto de não ter apreciado, na decisão impugnada, se a aplicação da segunda e quarta condições Altmark «constitu[iu] obstáculo ao cumprimento» da missão de serviço público ou «o desenvolvimento das trocas comerciais [foi] afetado de forma que contraria os interesses da União».

50      Segundo o artigo 106.°, n.° 2, TFUE, as empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral ou que tenham a natureza de monopólio fiscal ficam submetidas ao disposto nos Tratados, designadamente às regras de concorrência, na medida em que a aplicação destas regras não constitua obstáculo ao cumprimento, de direito ou de facto, da missão particular que lhes foi confiada. O desenvolvimento das trocas comerciais não deve ser afetado de maneira que contrarie os interesses da União.

51      As regras de concorrência visadas no artigo 106.°, n.° 2, TFUE devem ser entendidas no sentido de que se referem, em especial, à proibição de conceder às empresas auxílios de Estado, que decorre do artigo 107.°, n.° 1, TFUE, que dispõe que, salvo disposição em contrário dos Tratados, são incompatíveis com o mercado interno, na medida em que afetem as trocas comerciais entre os Estados‑Membros, os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções.

52      Os argumentos aduzidos pela recorrente colocam, em substância, a questão da relação entre, por um lado, as condições Altmark e, por outro, as condições em que um auxílio de Estado concedido a uma empresa encarregada da gestão de serviços de interesse económico geral pode ser considerado compatível com o mercado interno, nos termos do artigo 106.°, n.° 2, TFUE.

53      A este respeito, importa recordar que a apreciação do caráter compatível de um auxílio de Estado com o mercado interno pressupõe que a medida sob apreciação tenha caráter de um auxílio. Ora, não decorre do artigo 106.°, n.° 2, TFUE nem de outra disposição que, em todos os casos em que o Estado emprega os seus meios financeiros para garantir a prestação de um serviço de interesse económico geral, concede um auxílio de Estado à empresa que presta esse serviço.

54      Com efeito, segundo jurisprudência constante, a qualificação de auxílio de Estado exige que todas as condições estabelecidas no artigo 107.°, n.° 1, TFUE estejam preenchidas. Importa recordar que este artigo enuncia as seguintes condições: em primeiro lugar, deve tratar‑se de uma intervenção do Estado ou com recursos estatais; em segundo lugar, essa intervenção deve ser suscetível de afetar as trocas comerciais entre os Estados‑Membros; em terceiro lugar, deve conceder uma vantagem ao seu beneficiário; em quarto lugar, deve falsear ou ameaçar falsear a concorrência (v. acórdão Altmark, n.° 7 supra, EU:C:2003:415, n.os 74, 75 e jurisprudência aí referida).

55      No que se refere, especialmente, à terceira dessas condições, relativa ao facto de a intervenção em causa conceder uma vantagem ao seu beneficiário, importa referir que, conforme recordou o Tribunal de Justiça no acórdão Altmark, n.° 7 supra (EU:C:2003:415, n.° 84 e jurisprudência aí referida), são considerados auxílios as intervenções que, independentemente da forma que assumam, sejam suscetíveis de favorecer direta ou indiretamente empresas ou que devam ser considerados uma vantagem económica que a empresa beneficiária não teria obtido em condições normais de mercado.

56      Daqui decorre que, quando o Estado, para garantir a prestação de um serviço de interesse económico geral, paga à empresa que assegura esse serviço uma contrapartida financeira que corresponde ao preço desse serviço em condições normais de mercado, não se trata de uma vantagem que a empresa em questão não teria obtido em condições normais de mercado. Por conseguinte, nesse caso, não está sequer em causa um auxílio de Estado, dado que não se encontra preenchido um dos pressupostos essenciais para que a medida em causa possa ser qualificada como tal.

57      É precisamente à questão de saber se um serviço de interesse económico geral é prestado em condições normais de mercado que as condições Altmark pretendem responder.

58      Essas condições são: em primeiro lugar, a empresa beneficiária da compensação deve ser efetivamente incumbida do cumprimento de obrigações de serviço público e essas obrigações devem estar claramente definidas. Em segundo lugar, os parâmetros com base nos quais será calculada a compensação devem ser previamente estabelecidos de forma objetiva e transparente. Em terceiro lugar, a compensação não pode ultrapassar o que é necessário para cobrir total ou parcialmente os custos ocasionados pelo cumprimento das obrigações de serviço público, tendo em conta as receitas obtidas assim como um lucro razoável relativo à execução destas obrigações. Em quarto lugar, quando a escolha da empresa a encarregar do cumprimento de obrigações de serviço público, num caso concreto, não seja efetuada através de um processo de concurso público que permita selecionar o candidato capaz de fornecer esses serviços ao menor custo para a coletividade, o nível da compensação necessária deve ser determinado com base numa análise dos custos que uma empresa média, bem gerida e adequadamente equipada para poder satisfazer as exigências de serviço público requeridas teria suportado para cumprir estas obrigações, tendo em conta as respetivas receitas assim como um lucro razoável (acórdão Altmark, n.° 7 supra, EU:C:2003:415, n.os 89 a 93).

59      Conforme resulta do n.° 94 do acórdão Altmark, n.° 7 supra (EU:C:2003:415), na medida em que todas as condições se encontrem preenchidas, não está sequer em causa um auxílio de Estado, uma vez que a empresa em causa não obtém uma vantagem que não teria obtido em circunstâncias normais de mercado.

60      Em contrapartida, conforme já foi referido, a qualificação de uma medida de auxílio compatível com o mercado interno, nos termos do artigo 106.°, n.° 2, TFUE, baseia‑se na premissa de que a medida em questão constitui um auxílio. Por outras palavras, no caso de uma empresa que assegura um serviço de interesse económico geral, essa qualificação pressupõe necessariamente que a empresa em questão obtém, em contrapartida da prestação desse serviço, uma vantagem que não teria obtido em circunstâncias normais de mercado.

61      Relativamente à aplicação do artigo 106.°, n.° 2, TFUE, há que recordar que a jurisprudência constante (v. acórdão de 26 de junho de 2008, SIC/Comissão, T‑442/03, Colet., EU:T:2008:228, n.° 144 e jurisprudência aí referida) definiu três requisitos que devem estar preenchidos para que um auxílio de Estado concedido como compensação pela execução de obrigações de serviço público possa ser considerado compatível com o mercado interno. O primeiro requisito, relativo à definição de serviço público, exige que o serviço em causa seja efetivamente um serviço de interesse económico geral e que tenha sido claramente definido enquanto tal pelo Estado‑Membro. O segundo requisito, relativo ao mandato de serviço público, exige que a empresa beneficiária tenha sido expressamente encarregada pelo Estado‑Membro da prestação do serviço público em causa. Por último, o terceiro requisito baseia‑se no conceito de proporcionalidade. Segundo este requisito, o financiamento de uma empresa encarregada de obrigações de serviço público deve ser considerado compatível com o mercado interno na medida em que a aplicação das regras de concorrência do TFUE — no presente caso, a proibição dos auxílios de Estado — constituiria um obstáculo ao cumprimento da missão específica que foi confiada à empresa, sendo que a derrogação das regras de concorrência não deve afetar o desenvolvimento das trocas comerciais numa medida contrária ao interesse da União.

62      Em vários processos apreciados pelo Tribunal, as partes referiram uma certa semelhança entre os pressupostos de aplicação do artigo 106.°, n.° 2, TFUE e algumas das condições enunciadas pelo Tribunal de Justiça no acórdão Altmark, n.° 7 supra (EU:C:2003:415). Trata‑se, designadamente, dos processos que deram origem aos acórdãos de 12 de fevereiro de 2008, BUPA e o./Comissão (T‑289/03, Colet., EU:T:2008:29, n.os 160, 162 e 224); SIC/Comissão, n.° 61 supra (EU:T:2008:228, n.os 134 a 136); de 11 de março de 2009, TF1/Comissão (T‑354/05, Colet., EU:T:2009:66, n.os 116 a 118); de 1 de julho de 2010, M6/Comissão (T‑568/08 e T‑573/08, Colet., EU:T:2010:272, n.° 128); de 7 de novembro de 2012, CBI/Comissão (T‑137/10, Colet., EU:T:2012:584); e de 16 de outubro de 2013, TF1/Comissão (T‑275/11, EU:T:2013:535, n.° 122).

63      Todavia, não se pode esquecer que, apesar de os requisitos de qualificação de uma medida de auxílio compatível com o mercado interno apresentarem uma certa semelhança com os condições Altmark, n.° 7 supra (EU:C:2003:415), deve ter‑se em conta o facto de que, no caso da aplicação do artigo 106.°, n.° 2, TFUE, trata‑se de responder a uma questão fundamentalmente diferente, que pressupõe desde logo uma resposta afirmativa à questão abordada pelo acórdão Altmark, n.° 7 supra (EU:C:2003:415), que é diferente e se situa a montante da questão da compatibilidade com o mercado interno do auxílio em causa.

64      É atendendo a estas considerações gerais que importa apreciar os diferentes argumentos aduzidos pela recorrente.

65      A recorrente aduz vários motivos pelos quais, na sua opinião, a segunda e quarta condições Altmark devem ser necessariamente tidas em conta pela Comissão na apreciação da compatibilidade com o mercado interno, nos termos do artigo 106.°, n.° 2, TFUE, de uma medida que foi qualificada de auxílio de Estado devido ao não cumprimento dessas duas condições.

66      Por um lado, no que se refere à segunda condição Altmark, a recorrente começa por afirmar que, para cumprir o artigo 106.°, n.° 2, TFUE, a Comissão exige o respeito de vários requisitos puramente formais, como uma definição precisa do mandato de serviço público. Ora, se essas exigências formais são necessárias para o cumprimento dessa disposição, parece lógico, segundo a recorrente, que essa disposição inclua também a exigência de que os Estados‑Membros definam previamente, de forma objetiva e transparente, os parâmetros do cálculo da compensação do serviço público.

67      Em segundo lugar, a recorrente refere que a segunda condição Altmark já figura nas comunicações e decisões da Comissão relativas à aplicação do artigo 106.°, n.° 2, TFUE. A este respeito, refere‑se ao documento da Comissão intitulado «Enquadramento comunitário dos auxílios estatais sob a forma de compensação de serviço público» de 2005 (JO C 297, p. 4, a seguir «comunicação SIEG 2005») e à Decisão 2005/842/CE da Comissão, de 28 de novembro de 2005, relativa à aplicação do n.° 2 do artigo [106.° TFUE] aos auxílios estatais sob a forma de compensação de serviço público concedidos a certas empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral (JO L 312, p. 67, a seguir «decisão SIEG 2005»), e a dois atos que revogaram e substituíram os dois atos acima referidos, a saber, a Comunicação da Comissão relativa ao enquadramento da União Europeia aplicável aos auxílios estatais sob a forma de compensação de serviço público (2011) (JO 2012, C 8, p. 15, a seguir «comunicação SIEG 2011») e a Decisão 2012/21/UE da Comissão, de 20 de dezembro de 2011, relativa à aplicação do artigo 106.°, n.° 2, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia aos auxílios estatais sob a forma de compensação de serviço público concedidos a certas empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral (JO L 7, p. 3, a seguir «decisão SIEG 2011»). A recorrente alega que esses documentos preveem que, para que o artigo 106.°, n.° 2, TFUE seja aplicável, o ato que confere o mandato de serviço público deve indicar os parâmetros de cálculo, de controlo e de revisão da compensação, bem como as modalidades de reembolso das eventuais sobrecompensações e os meios de evitar essas sobrecompensações.

68      Em terceiro lugar, a recorrente indica que a comunicação relativa à radiodifusão de 2009 contém, no seu n.° 51, uma exigência análoga à segunda condição Altmark. Alega que esse número enuncia, com efeito, que, para ser compatível com o artigo 106.°, n.° 2, TFUE, o ato de mandato deve descrever as condições aplicadas à compensação e as modalidades previstas para evitar o pagamento de uma compensação num montante superior ao que seria estritamente necessário para a execução da missão de serviço público.

69      Por último, em quarto lugar, segundo a recorrente, apesar de a decisão impugnada ter sido adotada com base na comunicação relativa à radiodifusão de 2001, não existe nenhuma razão convincente que impeça a Comissão de aplicar no caso vertente a interpretação do artigo 106.°, n.° 2, TFUE que adotou nas comunicações SIEG 2005 e 2011, nas decisões SIEG 2005 e 2011 e na comunicação relativa à radiodifusão de 2009.

70      Por outro lado, no que respeita ao impacto da quarta condição Altmark na apreciação da compatibilidade do auxílio com o mercado interno nos termos do artigo 106.°, n.° 2, TFUE, a recorrente refere, em primeiro lugar, que a definição ampla do serviço público comporta o risco de que a compensação do serviço público seja de facto utilizada como um auxílio de emergência e um auxílio ao funcionamento. Para evitar este risco e garantir um justo equilíbrio entre o amplo poder de apreciação de que dispõem os Estados‑Membros em matéria de definição e atribuição das missões de serviço público, por um lado, e a proteção da concorrência no mercado, por outro, a Comissão poderia utilizar, na aplicação do artigo 106.°, n.° 2, TFUE, a exigência de eficácia que decorre da quarta condição Altmark. Em seguida, a recorrente afirma que a jurisprudência do Tribunal Geral segundo a qual o critério de eficácia não é pertinente para a apreciação da compatibilidade do auxílio com o mercado interno foi proferida com base na jurisprudência anterior ao acórdão Altmark, n.° 7 supra (EU:C:2003:415), e, em todo o caso, é criticável. Alega, além disso, que a própria Comissão reconhece a importância do critério da eficácia na comunicação SIEG 2011 e numa comunicação de 2011 ao Parlamento, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões sobre a reforma das regras da UE em matéria de auxílios estatais aplicáveis aos serviços de interesse económico geral [documento COM (2011) 146 final]. Por último, a recorrente alega que decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa aos artigos 49.° TFUE e 56.° TFUE que os princípios da igualdade de tratamento e da transparência se opõem a que uma autoridade pública adjudique, sem realização de concurso, uma concessão de serviços públicos a uma sociedade.

71      A recorrente deduz daí que a segunda e quarta condições Altmark fazem parte do teste da compatibilidade de um auxílio de Estado com o mercado interno definido no artigo 106.°, n.° 2, TFUE. Como tal, estas duas condições devem afetar necessariamente o modo como a Comissão aplica o critério da compatibilidade relativamente ao artigo 106.°, n.° 2, TFUE.

72      Em conclusão, a recorrente entende que a decisão impugnada padece de um erro de direito na medida em que a Comissão não retirou as consequências que se impunham da consideração de que a compensação do serviço público paga à TV2 não preenchia a segunda e quarta condições Altmark.

73      Há, pois, que observar que, embora a recorrente invoque vários motivos pelos quais a segunda e quarta condições Altmark deveriam necessariamente influenciar a apreciação da compatibilidade com o mercado interno, nos termos do artigo 106.°, n.° 2, TFUE, de uma medida que foi qualificada de auxílio de Estado devido ao desrespeito dessas duas condições, não precisa a natureza e o alcance da alegada influência.

74      Contudo, atendendo ao conjunto das considerações apresentadas pela recorrente nos seus articulados, há que considerar que, com o seu primeiro fundamento, alega, em substância, que a decisão impugnada padece de um erro de direito, na medida em que a Comissão considerou que as medidas em causa eram compatíveis com o mercado interno para efeitos do artigo 106.°, n.° 2, TFUE, apesar de essas medidas não respeitarem a segunda e quarta condições Altmark.

75      Tal fundamento não pode ser acolhido.

76      A este respeito, em primeiro lugar, resulta da jurisprudência que o facto de as medidas em causa não respeitarem a segunda e quarta condições Altmark não impede que essas medidas, qualificadas de auxílios de Estado, sejam consideradas compatíveis com o mercado interno, nos termos do artigo 106.°, n.° 2, TFUE.

77      No acórdão TF1/Comissão, n.° 62 supra (EU:T:2009:66, n.os 130 e 140), o Tribunal referiu designadamente que resulta dos termos inequívocos do acórdão Altmark, n.° 7 supra (EU:C:2003:415), que as quatro condições enunciadas nesse acórdão têm por único objetivo a qualificação da medida em causa de auxílio de Estado, e, mais precisamente, a determinação da existência de uma vantagem e que era necessário não confundir essas condições com os pressupostos de aplicação do artigo 106.°, n.° 2, TFUE, cujo objeto é verificar a compatibilidade de uma medida constitutiva de um auxílio de Estado com o mercado interno.

78      No mesmo acórdão TF1/Comissão, n.° 62 supra (EU:T:2009:66, n.os 132 a 139), o Tribunal considerou que decorria do acórdão Altmark, n.° 7 supra (EU:C:2003:415, n.° 105), que o artigo 106.°, n.° 2, TFUE continuava a aplicar‑se nos casos em que uma compensação devia ser qualificada de auxílio de Estado, por não preencher as condições Altmark. O Tribunal referiu também que a jurisprudência posterior ao acórdão Altmark, n.° 7 supra (EU:C:2003:415), não excluiu de forma alguma a aplicação do artigo 106.°, n.° 2, TFUE, às compensações pagas às empresas incumbidas de obrigações de serviço público, que foram qualificadas de auxílio de Estado por não preencherem as condições Altmark.

79      A recorrente não pede que o Tribunal reveja a sua posição adotada no acórdão TF1/Comissão, n.° 62 supra (EU:T:2009:66). Afirma, em contrapartida, que, nesse acórdão, o Tribunal não respondeu à questão de saber se o acórdão Altmark, n.° 7 supra (EU:C:2003:415), afetava de alguma forma a apreciação que deve ser efetuada nos termos artigo 106.°, n.° 2, TFUE, em caso de compensação do serviço público. Esse acórdão não impede, portanto, que se considere que o acórdão Altmark, n.° 7 supra (EU:C:2003:415), deve necessariamente afetar o modo como a Comissão aplica o critério da compatibilidade nos termos do artigo 106.°, n.° 2, TFUE.

80      A este respeito, há que observar que, embora o acórdão Altmark, n.° 7 supra (EU:C:2003:415), identifique quatro condições diferentes, estas não são totalmente independentes entre si. Quanto às três últimas, existe uma coerência interna e, nesse sentido, uma certa interdependência.

81      Com efeito, a definição de parâmetros objetivos e transparentes para o cálculo da compensação, como exige a segunda condição Altmark, constitui uma necessidade prévia para responder à questão de saber se essa compensação ultrapassa, ou não, o que é necessário para cobrir total ou parcialmente os custos ocasionados pelo cumprimento das obrigações de serviço público, conforme exige a terceira condição Altmark. Para responder à questão de saber se a compensação ultrapassa o que é necessário, há que determinar, em primeiro lugar, o que é necessário. Ora, para controlar o respeito da terceira condição Altmark, há que ter como base parâmetros objetivos e transparentes, como exige a segunda condição Altmark.

82      Quanto à quarta condição Altmark, vem completar a segunda condição Altmark. Não basta que os parâmetros definidos para o cálculo da compensação a pagar a uma empresa incumbida do cumprimento de obrigações de serviço público sejam objetivos e transparentes, como exige a segunda condição Altmark. Salvo no caso de a escolha da empresa em questão ser efetuada através de um processo de concurso público que permita selecionar o candidato capaz de fornecer esses serviços ao menor custo para a coletividade, a quarta condição Altmark exige que esses parâmetros se baseiem no exemplo de uma empresa média, bem gerida e adequadamente equipada para poder satisfazer as exigências de serviço público requeridas.

83      Também não se pode ignorar o objetivo do teste em que se insere a análise do respeito das quatro condições Altmark, que é evitar que a compensação implique uma vantagem económica suscetível de favorecer a empresa beneficiária em relação às empresas concorrentes (acórdão Altmark, n.° 7 supra, EU:C:2003:415, n.° 90). Assim, conforme já se referiu (n.° 57 supra), trata‑se de determinar se um serviço de interesse económico geral é prestado em condições normais de mercado, caso em que a contrapartida financeira paga à empresa que presta esse serviço não constitui uma vantagem que não teria obtido nessas circunstâncias, nem, por conseguinte, um auxílio de Estado (n.° 59 supra).

84      No que se refere à aplicação do artigo 106.°, n.° 2, TFUE, é certo que, no seu acórdão BUPA e o./Comissão, n.° 62 supra (EU:T:2008:29, n.° 224), o Tribunal referiu que a terceira condição Altmark coincide amplamente com o critério da proporcionalidade, conforme estabelecido pela jurisprudência no âmbito da aplicação dessa disposição.

85      Deve, todavia, precisar‑se que, embora, em ambos os casos, seja, em substância, aplicado o mesmo critério, o contexto e o objetivo da sua aplicação são, em cada caso, diferentes.

86      No caso da aplicação do artigo 106.°, n.° 2, TFUE, não está em causa determinar se um serviço de interesse económico geral é prestado em condições normais de mercado. A aplicação dessa disposição pressupõe a existência de um auxílio de Estado o que significa, por definição (v. n.° 83 supra), que o serviço em causa não é prestado nessas condições.

87      Conforme foi referido pelo Tribunal Geral no n.° 140 do seu acórdão M6/Comissão, n.° 62 supra (EU:T:2010:272), o que o artigo 106.°, n.° 2, TFUE visa evitar, com a apreciação da proporcionalidade do auxílio, é que o operador encarregado do serviço de interesse económico geral beneficie de um financiamento que ultrapasse os custos líquidos do serviço público. Daqui resulta que a questão de saber se uma empresa encarregada do serviço de interesse económico geral de radiodifusão pode cumprir as suas obrigações de serviço público a menores custos não é pertinente para a apreciação da compatibilidade do financiamento estatal desse serviço à luz das regras do direito da União em matéria de auxílios de Estado.

88      Por outras palavras, os custos de um serviço de interesse económico geral que devem ser tidos em conta na aplicação do artigo 106.°, n.° 2, TFUE são os custos reais desse serviço conforme são, e não como podiam ou deviam ter sido, com base em critérios de cálculo objetivos e transparentes, baseados num exemplo de uma empresa média, bem gerida e adequadamente equipada.

89      Neste contexto, o critério da proporcionalidade é tido em consideração para estimar os custos reais do serviço de interesse económico geral caso, na falta de elementos de prova à disposição da Comissão que permitam um cálculo exato desses custos, esta deva proceder a uma estimativa. De forma mais geral, é por aplicação do princípio da proporcionalidade que há que concluir que um auxílio destinado a cobrir os custos de um serviço de interesse económico geral não é compatível com o mercado interno, na medida em que o seu montante ultrapasse os custos reais do serviço.

90      É por isso que o eventual incumprimento da segunda e quarta condições Altmark, apesar de pertinente para a apreciação da questão de saber se esse serviço é prestado em condições normais de mercado, não é pertinente para a apreciação da proporcionalidade do auxílio no âmbito da aplicação do artigo 106.°, n.° 2, TFUE. Com efeito, a tese da recorrente leva, em última instância, a exigir que os serviços económicos de interesse geral sejam sempre prestados em condições normais de mercado. Ora, caso essa exigência seja aceite, haveria o risco de a aplicação das regras de concorrência obstar ao cumprimento, de direito ou de facto, da missão particular que foi confiada às empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral, que é o que o artigo 106.°, n.° 2, TFUE visa, precisamente, prevenir (v., neste sentido, acórdão M6/Comissão, n.° 62 supra, EU:T:2010:272, n.° 136).

91      Por outro lado, essa tese leva a um impasse lógico, na medida em que implica que, para que um auxílio possa ser declarado compatível com o mercado interno nos termos do artigo 106.°, n.° 2, TFUE, devem ser respeitadas todas as condições Altmark, caso esse em que a medida em questão não constituiria um auxílio (acórdão TF1/Comissão, n.° 62 supra, EU:T:2013:535, n.° 144).

92      De resto, à luz das considerações acima apresentadas nos n.os 76 a 91, há que rejeitar por irrelevantes os argumentos da recorrente baseados nos textos das comunicações SIEG 2005 e 2011 e das decisões SIEG 2005 e 2011. Com efeito, como decorre dos preâmbulos e dos artigos 1.° das decisões SIEG 2005 e 2011, bem como do n.° 2, último período, da comunicação SIEG 2005 e do n.° 7 da comunicação SIEG 2011, todos estes textos dizem respeito à apreciação da compatibilidade das compensações que, uma vez que não preenchem as condições Altmark, devem ser qualificadas de auxílios de Estado. Como tal, a menção, nesses textos, de conceitos que podem parecer próximos dos utilizados na formulação da segunda ou quarta condições Altmark não pode ser interpretada no sentido de que indica que, quando aprecia a compatibilidade das compensações que, uma vez que não preenchem os condições Altmark, foram qualificados de auxílios de Estado, a Comissão deve ter em conta o não cumprimento dessas duas condições.

93      Por outro lado, importa referir, como fez a Comissão, que, de qualquer forma, nenhum desses textos é aplicável às compensações pagas à TV2. Com efeito, por um lado, no que respeita às comunicações SIEG 2005 e 2011, estas excluem expressamente — a primeira no seu n.° 3 e a segunda no seu n.° 8 — o setor da radiodifusão de serviço público dos respetivos âmbitos de aplicação. Por outro lado, quanto às decisões SIEG 2005 e 2011, o montante dos auxílios concedidos à TV2 ultrapassa os limites abaixo dos quais essas decisões são aplicáveis.

94      De igual modo, a comunicação relativa à radiodifusão de 2009 não é aplicável no caso vertente (v. n.° 39 supra).

95      O texto aplicável à apreciação da compatibilidade das medidas em causa com o mercado interno nos termos do artigo 106.°, n.° 2, TFUE no caso vertente é a comunicação relativa à radiodifusão de 2001. Ora, este texto não contém nenhuma exigência de compatibilidade análoga à segunda e quarta condições Altmark. A este respeito, importa referir, conforme fizeram a Comissão, o Reino da Dinamarca e a TV2 A/S, que a recorrente não contestou a validade da comunicação de 2001 relativamente às normas superiores.

96      Importa recordar, por último, que, contrariamente ao que alega a recorrente, a Comissão não só não tinha de se inspirar nas disposições das comunicações e decisões adotadas após 2005 que cita na petição inicial como não podia fazê‑lo.

97      Com efeito, quando a Comissão dispõe, como sucede no que respeita à apreciação da compatibilidade dos auxílios de Estado com o mercado interno, de uma ampla margem de apreciação, pode adotar linhas diretrizes sobre o modo como aplicará a disposição em causa a um setor ou a um tipo de auxílio concretos.

98      Importa, no entanto, referir que, ao adotar regras de conduta e ao anunciar, através da sua publicação, que as aplicará no futuro aos casos a que essas regras dizem respeito, a Comissão se autolimita no exercício do seu poder de apreciação e não pode desrespeitar essas regras sob pena de poder ser sancionada, eventualmente, por violação de princípios gerais do direito, tais como os da igualdade de tratamento ou da proteção da confiança legítima (acórdão de 11 de setembro de 2008, Alemanha e o./Kronofrance, C‑75/05 P e C‑80/05 P, Colet., EU:C:2008:482, n.° 60).

99      Por último, quanto ao argumento de que os artigos 49.° TFUE e 56.° TFUE, bem como os princípios da igualdade de tratamento e da transparência, se opõem a que uma autoridade pública adjudique, sem realização de concurso, uma concessão de serviços públicos a uma sociedade, há que observar que o próprio acórdão Altmark, n.° 7 supra (EU:C:2003:415), não exclui que uma missão de serviço público possa ser confiada a uma empresa sem realização de concurso. Com efeito, o referido acórdão define um método de verificação do nível da compensação aplicável quando a escolha da empresa incumbida da execução de obrigações de serviço público, num caso concreto, não foi efetuada no âmbito de um concurso público. Em todo o caso, segundo a jurisprudência, o artigo 106.°, n.° 2, TFUE não comporta, entre os seus pressupostos de aplicação, uma exigência de o Estado‑Membro ter seguido procedimentos de concurso para a atribuição de serviços de interesse económico geral (v., neste sentido, acórdão SIC/Comissão, n.° 61 supra, EU:T:2008:228, n.os 145 e 146).

100    Resulta destas considerações que a Comissão não cometeu qualquer erro de direito ao concluir, na decisão impugnada, que as medidas em causa eram compatíveis com o mercado interno nos termos do artigo 106.°, n.° 2, TFUE, apesar de essas medidas não respeitarem a segunda e quarta condições Altmark.

101    Há, portanto, que julgar improcedente o primeiro fundamento.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo à falta de fundamentação na aceção do artigo 296.° TFUE

102    Através do segundo fundamento, a recorrente alega que a decisão impugnada padece de falta de fundamentação na medida em que a Comissão não indicou os fundamentos que justificam a aprovação do auxílio concedido à TV2 para efeitos do artigo 106.°, n.° 2, TFUE, apesar de as medidas em causa não preencherem a segunda e quarta condições Altmark. Decorre dos considerandos 159 e seguintes da decisão impugnada que, no caso vertente, a Comissão realizou apenas uma apreciação «standard» da compatibilidade, baseada na comunicação relativa à radiodifusão de 2001, composta por três etapas. Em contrapartida, não apreciou se a derrogação à terceira e quarta condições Altmark era conforme com o artigo 106.°, n.° 2, TFUE, e, designadamente, se a aplicação dessas condições constituía necessariamente um obstáculo à realização do serviço público.

103    A este respeito, basta observar que o silêncio da decisão relativamente ao papel da segunda e quarta condições Altmark na apreciação da compatibilidade das medidas em causa com o mercado interno não se deve a um erro de raciocínio da Comissão ou a uma falta de fundamentação da decisão impugnada, mas sim ao facto de essa decisão aplicar um parâmetro de apreciação diferente daquele que a recorrente privilegia.

104    Por outro lado, impõe‑se observar que, nos considerandos 157 a 270 da decisão impugnada, a Comissão apresentou uma fundamentação detalhada para justificar a compatibilidade das medidas em causa com o mercado interno à luz da comunicação relativa à radiodifusão de 2001 e que a recorrente nada invoca contra essa fundamentação.

105    Nestas circunstâncias, não se pode considerar que a decisão impugnada padece de falta de fundamentação.

106    Há, portanto, que julgar improcedente o segundo fundamento.

 Quanto à qualificação de auxílio de Estado dos fundos atribuídos ao financiamento dos canais regionais da TV2

107    Na réplica, a recorrente invoca argumentos através dos quais pretende responder às declarações feitas pela Comissão na contestação apresentada no processo T‑674/11, TV2/Danmark/Comissão, em que a recorrente intervém em apoio dos pedidos da Comissão.

108    As declarações da Comissão acima referidas no n.° 107 visam responder ao terceiro fundamento do recurso interposto pela TV2 A/S no processo T‑674/11, TV2/Danmark/Comissão. Através desse fundamento, a TV2 A/S alegou que resultava do considerando 194 da decisão impugnada que, segundo a Comissão, as receitas decorrentes da taxa que a TV2 recebeu, entre 1997 e 2002, do Fundo TV2 e que, em seguida, distribuiu às suas estações regionais constituíam auxílios de Estado a seu favor. A TV2 A/S alegou que, contrariamente ao que decorre do referido considerando, a TV2 não era beneficiária das receitas decorrentes da taxa que redistribuiu às suas estações regionais. Com efeito, a TV2 agiu como um «canal de pagamento», transferindo quantias de dinheiro do Fundo TV2 para as estações regionais.

109    Na sua contestação apresentada no processo em questão, a Comissão alegou que a TV2 A/S interpretou erradamente o considerando 194 da decisão impugnada. A este respeito, a Comissão alegou que a TV2 não era beneficiária dos fundos transferidos para as suas estações regionais e, assim, aquiesceu ao fundamento aduzido no processo já referido pela TV2 A/S. Segundo a Comissão, tal encerrou o litígio quanto a essa questão.

110    A Viasat distanciou‑se das observações da Comissão no seu articulado de intervenção apresentado no processo T‑674/11, TV2/Danmark/Comissão. Referiu, contudo, que, intervindo em apoio dos pedidos da Comissão, não podia contestar o ponto de vista desta última. Também não podia pedir ao Tribunal que apreciasse a legalidade da decisão impugnada relativamente à qualificação dos fundos transferidos pela TV2 para as suas estações regionais, uma vez que, na sequência das declarações da Comissão, a TV2 A/S pediu ao Tribunal que julgasse o seu terceiro fundamento improcedente por ser desprovido de objeto. Por este motivo, a recorrente optou por apresentar os seus argumentos no âmbito do presente processo.

111    Quanto ao mérito, a recorrente alega que a Comissão cometeu um erro de direito ao declarar, no considerando 194 da decisão impugnada, que os fundos transferidos pela TV2 para as suas estações regionais não constituíam auxílios de Estado. Afirma que a TV2 não era uma simples intermediária através da qual os recursos do Estado eram encaminhados para os canais regionais, mas uma efetiva beneficiária desses recursos.

112    A este respeito, deve recordar‑se que resulta das disposições conjugadas do artigo 44.°, n.° 1, alínea c), e do artigo 48.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral de 2 de maio de 1991 que a petição deve indicar o objeto do litígio e conter uma exposição sumária dos fundamentos invocados e que é proibido deduzir novos fundamentos no decurso da instância, a menos que tenham origem em elementos de direito e de facto que se tenham revelado durante o processo.

113    Resulta também da jurisprudência que não pode ser considerado um fundamento com origem em elementos de direito e de facto que se revelaram durante o processo um fundamento baseado numa alegada ilegalidade que podia ser conhecida e arguida logo na interposição do recurso (v., neste sentido, acórdãos de 30 de setembro de 1982, Amylum/Conselho, 108/81, Recueil, EU:C:1982:322, n.° 25, e de 2 de março de 2010, Evropaïki Dynamiki/EMSA, T‑70/05, Colet., EU:T:2010:55, n.° 120).

114    No caso vertente, deve observar‑se, em primeiro lugar, que, na petição inicial, a recorrente não aduziu nenhum fundamento relativo à qualificação, ou falta de qualificação, de auxílio de Estado dos fundos concedidos à TV2 e transferidos por esta para as estações regionais. Portanto, o presente fundamento não pode ser considerado a ampliação de um fundamento invocado na petição inicial, constituindo um fundamento novo, invocado no decurso da instância. A sua admissibilidade depende, como tal, da existência de eventuais elementos de direito ou de facto revelados durante o processo.

115    A recorrente alega, em substância, que são as declarações relativas ao auxílio em questão, contidas na contestação da Comissão no processo T‑674/11, TV2/Danmark/Comissão, que constituem um elemento revelado no decurso da instância.

116    Ora, com essas declarações, a Comissão limitou‑se a apresentar o seu próprio ponto de vista quanto à interpretação do considerando 194 da decisão impugnada. Esse considerando, bem como a totalidade da decisão impugnada, eram conhecidos da recorrente à data da interposição do recurso e de nenhuma forma constituem elementos revelados durante o processo. Portanto, o presente fundamento, apresentado durante o processo sem que os requisitos que podem justificar essa apresentação, conforme previstos no artigo 48.°, n.° 2, do Regulamento de Processo de 2 de maio de 1991, se encontrem preenchidos, deve ser julgado inadmissível.

117    Visto que todos os fundamentos do recurso foram julgados improcedentes, há que concluir que, na medida em que o presente recurso conserva o seu objeto (v. n.° 45 supra), lhe deve ser negado provimento.

 Quanto às despesas

118    Nos termos do artigo 134.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, em conformidade com o pedido da Comissão.

119    Nos termos do artigo 138.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, os Estados‑Membros que intervenham no processo suportam as respetivas despesas. Como tal, o Reino da Dinamarca suportará as suas próprias despesas.

120    Atendendo ao facto de que a TV2 A/S não pediu formalmente a condenação da recorrente a suportar as despesas da intervenção, suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção)

decide:

1)      Não há que conhecer do mérito do recurso, na medida em que tem por objeto a anulação da Decisão 2011/839/UE da Comissão, de 20 de abril de 2011, relativa às medidas adotadas pela Dinamarca (C 2/03) a favor da TV2/Danmark, na parte em que a Comissão considerou que as receitas publicitárias de 1995 e 1996 pagas à TV2/Danmark A/S através do Fundo TV2 constituíam auxílios de Estado.

2)      É negado provimento ao recurso quanto ao restante.

3)      A Viasat Broadcasting UK Ltd suportará as suas próprias despesas, bem como as despesas efetuadas pela Comissão Europeia.

4)      O Reino da Dinamarca suportará as suas próprias despesas.

5)      A TV2/Danmark suportará as suas próprias despesas.

Gratsias

Forwood

Wetter

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 24 de setembro de 2015.

Assinaturas


* Língua do processo: inglês.