Language of document : ECLI:EU:T:1999:83

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

22 de Abril de 1999 (1)

«Regulamento (CEE) n.° 2377/90 — Pedido de inclusão de uma somatotropina bovina recombinante (BST) na lista das substâncias não sujeitas a um limite máximo de resíduos — Indeferimento pela Comissão — Recurso de anulação — Admissibilidade»

No processo T-112/97,

Monsanto Company, sociedade de direito do Estado de Delaware, com sede em Saint-Louis, Missouri (Estados-Unidos da América), representada por Clive Stanbrook QC, barrister, e Robert MacLean, solicitor, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do advogado Arsène Kronshagen, 22, Rue Marie-Adélaïde,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada inicialmente por Richard Wainwright, consultor jurídico principal, e Fernando Castillo de la Torre, membro do Serviço Jurídico e, em seguida, apenas por R. Wainwright, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Carlos Gómez de la Cruz, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

recorrida,

apoiada por

República Francesa, representada por Kareen Rispal-Bellanger, subdirectora na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Frédéric Pascal, assessor da Administração central e Régine Loosli-Surrans, encarregada de missão, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo, na Embaixada de França, 8, boulevard Joseph II,

interveniente,

que tem por objecto um pedido de anulação da decisão C (97) 148 final, da Comissão, de 14 de Janeiro de 1997, que indeferiu o pedido apresentado por Monsanto Europe SA/NV de inclusão da sometribove, uma somatotropina bovina recombinante (BST), no Anexo II do Regulamento (CEE) n.° 2377/90 do Conselho, de 26 de Junho de 1990, que prevê um processo comunitário para o estabelecimento de limites máximos de resíduos de medicamentos veterinários nos alimentos de origem animal (JO L 224, p. 1),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Segunda Secção),

composto por: A. Potocki, presidente, C. W. Bellamy e A. W. H. Meij, juízes,

secretário: A. Mair, administrador

vistos os autos e após a audiência de 16 de Dezembro de 1998,

profere o presente

Acórdão

1.
    Em 26 de Junho de 1990, o Conselho adoptou o Regulamento (CEE) n.° 2377/90 do Conselho, que prevê um processo comunitário para o estabelecimento de limites máximos de resíduos de medicamentos veterinários nos alimentos de origem animal (JO L 224, p. 1, a seguir «Regulamento n.° 2377/90»).

2.
    Nos termos deste regulamento, a Comissão fixa os limites máximos de resíduos (a seguir «LMR»). O artigo 1.°, n.° 1, alínea b), define LMR como a concentração máxima de resíduos resultante da utilização de um medicamento veterinário que a Comunidade pode aceitar como legalmente autorizada ou que é reconhecida como aceitável «à superfície ou no interior de um alimento».

3.
    O Regulamento n.° 2377/90 prevê a elaboração de quatro anexos nos quais uma substância farmacologicamente activa, destinada a ser utilizada em medicamentos veterinários a administrar a «animais para produção de alimentos», pode ser incluída:

—    o Anexo I reservado às substâncias para as quais pode ser fixado um LMR após avaliação dos riscos que essa substância apresenta para a saúde humana;

—    o Anexo II, reservado às substâncias não sujeitas a um LMR;

—    o Anexo III, reservado às substâncias relativamente às quais não é possível fixar definitivamente um LMR, mas para as quais, sem pôr em risco a saúde humana, pode ser fixado um LMR provisório por um período determinado calculado em função do tempo necessário para completar estudos científicos adequados, período este que só pode ser prolongado uma única vez;

—    o Anexo IV, reservado às substâncias, relativamente às quais não pode ser fixado nenhum LMR, por constituirem, independentemente de qualquer consideração de ordem quantitativa, um risco para a saúde do consumidor.

4.
    O artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2377/90 estabelece:

«Para obter a inclusão nos anexos I, II ou III de uma nova substância farmacologicamente activa que seja;

-    destinada à utilização em medicamentos veterinários para administrar a animais para produção de alimentos

    e

-    destinada a ser comercializada em um ou mais Estados-Membros que ainda não tenham autorizado a utilização da substância em causa nos animais para produção de alimentos,

o responsável pela comercialização deverá apresentar à Comissão um pedido...»

5.
    Nos termos do n.° 2 do artigo 6.°, depois de verificar, num prazo de 30 dias, que o pedido foi correctamente apresentado, a Comissão remetê-lo-á [«imediatamente»], para análise, ao Comité dos Medicamentos Veterinários (a seguir «CMV»).

6.
    Nos termos do n.° 3 do mesmo artigo 6.°, a Comissão elaborará um projecto das medidas a tomar, no prazo de 120 dias a contar da data de apresentação do pedido ao CMV, tendo em conta as observações formuladas pelos membros deste.

7.
    Nos termos do n.° 5 do mesmo artigo, a Comissão apresentará o projecto das medidas ao Comité para a Adaptação ao Progresso Técnico das directivas relativas aos medicamentos veterinários (a seguir «comité regulador»), para efeitos do procedimento previsto no artigo 8.°.

8.
    Nos termos do artigo 8.°, n.° 2, este comité emite o seu parecer sobre o projecto de medidas num prazo fixado pelo seu presidente, em função da urgência da questão em causa.

9.
    O artigo 8.°, n.° 3, descreve o processo através do qual a Comissão ou, se for caso disso, o Conselho, adopta as medidas previstas, tendo em conta o parecer expresso pelo comité regulador.

10.
    O Regulamento (CEE) n.° 2309/93 do Conselho, de 22 de Julho de 1993, que estabelece procedimentos comunitários de autorização e fiscalização de medicamentos de uso humano e veterinário e institui uma Agência Europeia de Avaliação dos Medicamentos (JO L 214, p. 1, a seguir «Regulamento n.° 2303/93») regula o procedimento de emissão da autorização comunitária de introdução no mercado (a seguir «AIM») de um medicamento veterinário.

11.
    Resulta do artigo 31.°, n.° 3, alínea b), deste regulamento que, no caso dos medicamentos veterinários para administração a animais destinados ao consumo humano, a indicação do LMR para a sua substância farmacologicamente activa em conformidade com o disposto no Regulamento (CEE) n.° 2377/90, é uma das condições para obtenção da AIM.

12.
    Segundo o artigo 34.°, n.° 2, do mesmo regulamento, a recusa de uma AIM para a Comunidade constitui proibição em toda a Comunidade da introdução no mercado do medicamento veterinário em questão.

13.
    A Directiva 87/22/CEE do Conselho, de 22 de Dezembro de 1986, relativa à aproximação das medidas nacionais respeitantes à colocação no mercado dos medicamentos de alta tecnologia, nomeadamente dos resultantes da biotecnologia (JO 1987 L 15, p. 38, a seguir «Directiva 87/22») prevê no seu artigo 2.°, n.° 1, que, logo que recebam um pedido de autorização de colocação no mercado relativo a um medicamento de alta tecnologia, as autoridades competentes devem, a pedido do responsável pela colocação do produto no mercado, pedir o parecer do Comité das Especialidades Farmacêuticas ou do CMV, em função das competências respectivas.

        

14.
    Pela Decisão 90/218/CEE do Conselho, de 25 de Abril de 1990, relativa à administração de somatotrofina bovina (BST) (JO L 116, p. 27), alterada, pela última vez, pela Decisão 94/936/CE do Conselho, de 20 de Dezembro de 1994 (JO L L 366, p. 19), foi instituída uma moratória para a introdução no mercado da somatotropina bovina recombinante (a seguir «BST»), uma hormona de crescimento.

15.
    Segundo o primeiro parágrafo do artigo 1.° da Decisão 90/218, de 25 de Abri de 1990, acima referida, na redacção que lhe foi dada pela Decisão 94/936, de 20 de Dezembro de 1994, igualmente já referida, os Estados-Membros não devem autorizar, até 31 de Dezembro de 1999, a colocação no mercado da BST com vista à sua comercialização nem a sua administração a vacas leiteiras, seja por que meio for, no respectivo território.

Matéria de facto subjacente ao litígio

16.
    A Monsanto Company inventou e desenvolveu um medicamento veterinário designado «somatech». A substância farmacologicamente activa deste produto é a «sometribove», uma BST destinada a ser administrada a vacas leiteiras para aumentar a produção de leite.

17.
    A Monsanto Europe SA/NV, uma sociedade de direito belga (a seguir «Monsanto Europe») é uma filial a 100% da Monsanto Company. Ocupa-se de determinados aspectos da gestão comercial da sometribove na Comunidade, sob a égide da Monsanto Company, o coordenador mundial dessa gestão.

18.
    Em 1987, a pedido da Monsanto Europe, e em cumprimento do disposto no artigo 2.°, n.° 1, da Directiva 87/22, as autoridades competentes da República Francesa submeteram ao CMV um pedido de parecer sobre a sometribove.

19.
    Na sequência da entrada em vigor do Regulamento n.° 2377/90, a Comissão informou a Monsanto Europe que não era necessária a apresentação de um novo pedido de inclusão da sometribove no Anexo II do Regulamento n.° 2377/90 (a seguir «Anexo II»), dado que já tinha sido submetido um processo ao CMV, nos termos da Directiva 87/22.

20.
    Em 27 de Janeiro de 1993, o CMV emitiu o seu parecer.

21.
    Neste parecer, afirma-se nomeadamente:

«[...] O Comité considera que a protecção da saúde pública não exige a fixação de limites máximos de resíduos para a sometribove, o princípio activo do produto, e recomenda, portanto, que a sometribove seja incluída na lista das substâncias não sujeitas a LMR constantes do Anexo II [...]»

22.
    Por carta de 20 de Abril de 1995, O Veterinary Medicines Directorate do Reino Unido informou a Monsanto Europe de que a Comissão tinha preparado um projecto de regulamento que incluía a sometribove no Anexo II. Este projecto devia então ser submetido ao comité regulador, nos termos dos artigos 6.°, n.° 5, e 8.° do Regulamento n.° 2377/90.

23.
    Porém, em 17 de Outubro de 1995, numa reunião com funcionários da Comissão, a recorrente foi informada de que a Comissão tinha «retirado esse projecto da agenda» devido à existência da moratória sobre a BST.

24.
    Nestas circunstâncias, um dos advogados da recorrente, interpelou oficialmente a Comissão, por carta de 6 de Novembro de 1996, nos termos do artigo 175.° do Tratado CE, convidando-a «a tomar as medidas necessárias a fim de remeter o processo sem mais demoras ao comité regulador, em cumprimento do disposto no Regulamento n.° 2377/90.»

25.
    Na sequência desta interpelação, a Comissão adoptou, em 14 de Janeiro de 1997,a decisão C (97) 148, final (a seguir «decisão impugnada»).

26.
    Os quarto, quinto, sexto e sétimo considerandos e o dispositivo desta decisão têm o seguinte teor:

«Considerando que nos termos do artigo 6.° do Regulamento n.° 2377/90, para que uma nova substância farmacologicamente activa possa ser incluída numa das listas do regulamento, essa substância deve destinar-se a ser utilizada em medicamentos veterinários e a ser colocada no mercado de um ou mais Estados-Membros;

Considerando que em 20 de Dezembro de 1994 o Conselho adoptou a Decisão 94/936, que altera a Decisão 90/218, de 25 de Abril de 1990, relativa à colocação no mercado e à administração da somatotrofina bovina (BST);

Considerando que o artigo 1.° desta decisão estabelece: 'Os Estados-Membros não devem autorizar, até 31 de Dezembro de 1999, a colocação no mercado de somatotrofina bovina com vista à comercialização nem a sua administração a vacas leiteiras, seja por que meio for, no respectivo território‘, e que, por conseguinte, a somatotrofina bovina nñao pode ser comercializada nem administrada na Comunidade, visto que esta substância só é administrada a vacas leiteiras;

Considerando que uma das condições a que está sujeito o pedido de inclusão nos anexos do Regulamento n.° 2377/90 do Conselho não está satisfeita e que não há interesse nessa inclusão, a Comissão considera que não deve deferir o pedido apresentado em 6 de Novembro de 1996, sem prejuízo de vir a reavaliar a situação, se se verificar uma alteração das circunstâncias;

decide:

Artigo 1.°

O pedido de inclusão da sometribove (somatotrofina bovina) no Anexo II do Regulamento n.° 2377/90... é indeferido.

Artigo 2.°

A presente decisão tem por destinatário a Companhia Monsanto, avenue de Tervuren, 270-272, 1040 Bruxelles, Bélgica.»

27.
    Em 23 de Janeiro de 1997, a decisão impugnada foi notificada à Monsanto Europe em Bruxelas.

Tramitação processual e pedidos das partes

28.
    Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 14 de Abril de 1997, a Monsanto Company interpôs o presente recurso.

29.
    Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 12 de Agosto de 1997, a República Francesa pediu para se constituir como interveniente em apoio da recorrida. A intervenção foi admitida por despacho do Presidente da Terceira Secção do Tribunal de Primeira Instância em 29 de Setembro de 1997.

30.
    A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

—    anular a decisão impugnada;

—    condenar a Comissão nas despesas.

31.
    A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

—    a título principal, declarar o recurso inadmissível;

—    a título subsidiário, negar-lhe provimento;

—    condenar a recorrente nas despesas.

32.
    A República Francesa apoia os pedidos da Comissão.

Factos supervenientes à abertura do processo e continuação do processo

33.
    Em 25 de Junho de 1998, o Tribunal de Primeira Instância (Terceira Secção) proferiu o acórdão Lilly Industries/Comissão (T-120/96, Colect., p. II-2571, a seguir «acórdão Lilly»).

34.
    O n.° 1 do dispositivo deste acórdão determina:

«A decisão da Comissão, de 22 de Maio de 1996, que indefere o pedido de inclusão do somidobove (somatotrofina bovina) no Anexo II ao Regulamento [...] n.° 2377/90 [...] é anulada.»

35.
    Não tendo a Comissão recorrido do acórdão Lilly no prazo legal, o acórdão transitou em julgado.

36.
    O Tribunal de Primeira Instância (Terceira Secção), verificando a semelhança do contexto factual e jurídico dos dois processos, convidou as partes a apresentarem eventuais alegações sobre as consequências desse acórdão para o presente processo.

37.
    A Comissão e a recorrente responderam a esse convite por cartas datadas respectivamente de 3 e 6 de Julho de 1998. O Governo francês não apresentou observações no prazo fixado.

38.
    Tendo a composição das secções do Tribunal de Primeira Instância sido modificada com o início do novo ano judicial, o juiz-relator foi colocado na Segunda Secção, para a qual transitou, em consequência, o presente processo.

39.
    Com base no relatório preliminar do juiz-relator, o Tribunal de Primeira Instância (Segunda Secção) decidiu iniciar a fase oral do processo sem instrução. A audiência pública, na qual foram ouvidas as alegações das partes e as respostas destas às questões colocadas pelo Tribunal, teve lugar em 16 de Dezembro de 1998.

Quanto à admissibilidade

40.
    Na audiência, a recorrente confirmou, em resposta a uma questão do Tribunal, que tinha interposto o presente recurso à sua própria conta e não por conta da Monsanto Europe.

Argumentos das partes

41.
    A Comissão, apoiada pela República Francesa, observa que, se em certas circunstâncias, designadamente no domínio do direito da concorrência, pode parecer inútil efectuar uma distinção entre uma sociedade-mãe e uma sua filial, já não se pode dizer o mesmo num caso como o presente, do sector dos medicamentos veterinários, em que a Monsanto Company e a Monsanto Europe ocupam posições muito diferentes em termos de direitos e obrigações.

42.
    Designadamente, os direitos processuais decorrentes da Directiva 87/22 e dos Regulamentos n.os 2377/90 e 2309/93 só beneficiariam a Monsanto Europe, visto que foi esta última que apresentou os pedidos nos procedimentos administrativos previstos para esses actos. O facto de a Monsanto Europe ser uma filial da Monsanto Company em nada alteraria a situação, visto que esse facto não garante à Monsanto Company qualquer direito nem lhe impõe qualquer obrigação.

43.
    Nestas circunstâncias, só a Monsanto Europe, destinatária da decisão impugnada, seria afectada por esta. Só esta sociedade poderia eventualmente interpor um recurso de anulação da decisão.

44.
    Em contrapartida, não sendo a Monsanto Company destinatária da decisão impugnada nem afectada directa e individualmente por esta, não poderia ser admitido o recurso de anulação por ela interposto.

45.
    No que se refere mais especificamente à susceptibilidade de ser directamente afectada, a Comissão sublinha que, ao contrário da Monsanto Europe, a Monsanto Company não pode ser titular do direito de inclusão da sometribove no Anexo II e, portanto, a fortiori, não pode ser titular potencial de uma autorização de colocação dessa substância no mercado.

46.
    Por todas estas razões, a Comissão entende que o recurso deve ser julgado inadmissível.

47.
    A recorrente contesta a argumentação da Comissão.

Apreciação do Tribunal

48.
    Deve observar-se liminarmente que a Monsanto Company inventou e desenvolveu o somatech. É a sociedade-mãe da Monsanto Europe e o coordenador mundial da exploração comercial do somatech. Nesta qualidade, tem um interesse económico evidente em que seja satisfeita uma das condições necessárias à comercialização do somatech pela Monsanto Europe na Comunidade.

49.
    Note-se a seguir que, se é verdade que a decisão impugnada indica como destinatária «a companhia Monsanto», foi, no entanto, endereçada à sede social da Monsanto Europe em Bruxelas. Além disso, através desta decisão, a Comissão pronunciou-se sobre o pedido apresentado pela Monsanto Europe de inclusão da sometribove no Anexo II. Nestas circunstâncias, a Monsanto Europe deve ser considerada destinatária da decisão impugnada.

50.
    Para efeitos de análise da admissibilidade do presente recurso, tem, assim, que se verificar se a recorrente, não sendo destinatária da decisão impugnada, é directa e individualmente afectada por esta, na acepção do artigo 173.°, quarto parágrafo do Tratado.

51.
    Em primeiro lugar, quanto à questão de saber se a recorrente é directamente afectada pela decisão impugnada, há que notar desde logo que a decisão não deixa qualquer poder de apreciação a uma qualquer autoridade quanto à sua aplicação.

52.
    Registe-se, a seguir, que a decisão impugnada, ao indeferir o pedido apresentado pela Monsanto Europe de inclusão da sometribove no Anexo II, teve como consequência directa a não fixação para a sometribove de um LMR.

53.
    Recorde-se, a este propósito, que a fixação de um LMR para a sometribove, nos termos do Regulamento n.° 2377/90, constitui uma condição sine qua non da

emissão de uma AIM para o somatech, segundo o disposto no artigo 31.°, n.° 3, alínea b), do Regulamento n.° 2309/93.

54.
    Sendo certo que a fixação de um LMR para a sometribove não tem automaticamente como consequência que o somatech possa ser legalmente lançado no mercado (v. a este propósito o acórdão Lilly, n.os 88 a 90), a recusa de fixação desse LMR implica, por si só, a recusa de uma AIM para a Comunidade do somatech, recusa esta que constitui, por sua vez, uma proibição de lançamento no mercado do somatech em toda a Comunidade, em aplicação do artigo 34.°, n.° 2, do mesmo regulamento.

55.
    Nestas circunstâncias, a decisão impugnada tem directamente como efeito, caso as outras condições de comercialização o permitam, designadamente, caso seja levantada a moratória sobre a BST (v. a este respeito os n.os 65 a 67 do acórdão Lilly), que o somatech não poderá ser comercializado na Comunidade.

56.
    Nestas condições, a recorrente deve ser considerada directamente afectada pela decisão impugnada.

        

57.
    Relativamente à questão de saber se a recorrente é individualmente afectada pela decisão impugnada, deve observar-se que, segundo a jurisprudência, uma pessoa singular ou colectiva só é considerada individualmente afectada por um acto comunitário se for atingida por esse acto devido a determinadas qualidades que lhe são próprias ou de uma situação de facto que a caracterize relativamente a qualquer outra pessoa, individualizando-a, por isso, de forma idêntica à do destinatário (v., a título de exemplo, o despacho do Tribunal de Primeira Instância de 9 de Agosto de 1995, Greenpeace e o./Comissão, T-585/93, Colect., p. II-2205, n.° 48, confirmado pelo acórdão, proferido sobre recurso para o Tribunal de Justiça, de 2 de Abril de 1998, Greenpeace Council e o./Comissão, C-321/95 P, Colect., p. I-1651).

58.
    No presente caso, basta constatar que a recorrente detem todas as acções da Monsanto Europe e que, por conseguinte, é proprietária a 100% desta empresa. Esta qualidade individualiza a recorrente, em relação à decisão impugnada, relativamente a qualquer outra pessoa e, designadamente, em relação a qualquer outro operador económico no mercado em causa.

59.
    Nestas condições, a recorrente deve ser considerada individualmente afectada pela decisão impugnada.

60.
    Sendo a recorrente directa e individualmente afectada pela decisão impugnada, o recurso é admissível.

Quanto ao mérito

Argumentos das partes

61.
    Na sua carta de 6 de Julho de 1998 (v. supra, n.° 37), a recorrente observou que, pela sua similitude com o processo que deu origem ao acórdão Lilly, o presente processo devia chegar a idêntico resultado, isto é, que a decisão impugnada deveria ser anulada.

62.
    Na sua carta de 3 de Julho de 1998 (v. supra, n.° 37), a Comissão reconhece que o contexto factual e jurídico dos dois processos é muito similar («very similar»). Na hipótese de o Tribunal declarar o presente recurso admissível, a Comissão admite que a decisão impugnada deverá ser anulada pelos mesmos motivos que levaram o Tribunal a anular a decisão impugnada no acórdão Lilly.

Apreciação do Tribunal

63.
    É assim questão pacífica entre as partes que a decisão impugnada deve ser anulada pelos mesmos motivos que levaram o Tribunal a anular a decisão contestada no processo Lilly.

64.
    Não tendo o Tribunal verificado a existência de nenhum elemento de facto ou de direito que imponha uma conclusão diferente, remete-se para os fundamentos do acórdão Lilly e anula-se em consequência a decisão ora impugnada.

Quanto às despesas

65.
    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas, se tal tiver sido pedido. Porém, nos termos do n.° 4 do mesmo artigo, os Estados-Membros intervenientes no processo no Tribunal devem suportar as suas próprias despesas.

66.
    Em consequência, tendo a Comissão sido vencida e tendo em conta o pedido da recorrente, há que condená-la nas suas próprias despesas, bem como nas despesas da recorrente.

67.
    A República Francesa, interveniente, deverá suportar as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção),

decide:

1)    A decisão C (97) 148, final, da Comissão, de 14 de Janeiro de 1997, que indeferiu o pedido da Monsanto Europe SA/NV de inclusão da sometribove

no Anexo II do Regulamento n.° 2377/90 do Conselho, de 26 de Junho de 1990, que prevê um processo comunitário para o estabelecimento de limites máximos de resíduos de medicamentos veterinários nos alimentos de origem animal, é anulada.

2)    A Comissão é condenada a suportar as suas próprias despesas, bem como as despesas da recorrente.

3)    A República Francesa suportará as suas próprias despesas.

Potocki
Bellamy
Meij

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 22 de Abril de 1999.

O secretário

O presidente

H. Jung

A. Potocki


1: Língua do processo: inglês.