Language of document : ECLI:EU:C:2018:480

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)

21 de junho de 2018 (*)

«Reenvio prejudicial — Livre circulação de capitais e liberdade de pagamentos — Restrições — Tributação dos dividendos pagos aos organismos de investimento coletivo em valores mobiliários (OICVM) — Dividendos pagos por sociedades residentes de um Estado‑Membro a OICVM não residentes — Isenção dos dividendos pagos por sociedades residentes de um Estado‑Membro a OICVM residentes — Justificações — Repartição equilibrada do poder de tributação entre os Estados‑Membros — Coerência do regime fiscal — Proporcionalidade»

No processo C‑480/16,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Østre Landsret (Tribunal Regional de Este, Dinamarca), por decisão de 31 de agosto de 2016, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 5 de setembro de 2016, no processo

Fidelity Funds,

Fidelity Investment Funds,

Fidelity Institutional Funds

contra

Skatteministeriet,

sendo intervenientes:

NN (L) SICAV,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

composto por: J. L. da Cruz Vilaça, presidente de secção, E. Levits (relator), A. Borg Barthet, M. Berger e F. Biltgen, juízes,

advogado‑geral: P. Mengozzi,

secretário: L. Carrasco Marco, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 5 de outubro de 2017,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da Fidelity Funds, da Fidelity Investment Funds e da Fidelity Institutional Funds, por P. Farmer, barrister, e J. Skaadstrup Andersen, advokat,

–        em representação da NN (L) SICAV, por E. Vistisen, advokat,

–        em representação do Governo dinamarquês, por C. Thorning e J. Nymann‑Lindegren, na qualidade de agentes, assistidos por S. Horsbøl Jensen, advokat,

–        em representação do Governo alemão, por T. Henze e R. Kanitz, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo neerlandês, por M. Bulterman, B. Koopman e J. Langer, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão Europeia, por W. Roels e R. Lyal, na qualidade de agentes, assistidos por H. Peytz, avocat,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 20 de dezembro de 2017,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 56.o TFUE e 63.o TFUE.

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de litígios que opõem a Fidelity Funds, a Fidelity Investment Funds e a Fidelity Institutional Funds ao Skatteministeriet (Ministério das Finanças, Dinamarca) relativamente a pedidos de reembolso de retenções na fonte operadas sobre os dividendos que lhes foram pagos por sociedades residentes na Dinamarca entre 2000 e 2009.

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        A Diretiva 85/611/CEE do Conselho, de 20 de dezembro de 1985, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas respeitantes a alguns organismos de investimento coletivo em valores mobiliários (OICVM) (JO 1985, L 375, p. 3; EE 06 F3 p. 38), tinha por objeto, em conformidade com o seu quarto considerando, estabelecer regras mínimas comuns, para os organismos de investimento coletivo em valores mobiliários (OICVM) situados nos Estados‑Membros, no que diz respeito à sua aprovação, controlo, estrutura, atividade e às informações que devem publicar. A Diretiva 85/611 foi várias vezes alterada antes de ser revogada, com efeitos a 1 de julho de 2011, pela Diretiva 2009/65/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas respeitantes a alguns organismos de investimento coletivo em valores mobiliários (OICVM) (JO 2009, L 302, p. 32), a qual procedeu à sua reformulação.

 Direito dinamarquês

4        O § 1, ponto 5 a, da lov om indkomstbeskatning af aktieselskaber m.v. (Lei do imposto sobre as sociedades) prevê que os OICVM fiscalmente residentes na Dinamarca estão aí sujeitos a imposto, enquanto o § 1, ponto 6, desta lei respeita à tributação dos fundos abrangidos pelas disposições do § 16 C da lov om påligningen af indkomstskat til staten (Lei sobre a matéria coletável das contribuições, a seguir «ligningslov») e que são residentes na Dinamarca.

5        O § 2, n.o 1, alínea c), da Lei do imposto sobre as sociedades dispõe que os OICVM e outros fundos de investimento que não têm residência fiscal na Dinamarca são tributados sobre os dividendos que lhes são distribuídos por sociedades residentes na Dinamarca, incidindo esta obrigação fiscal limitada apenas sobre rendimentos que tenham origem na Dinamarca.

6        Nos termos do § 65, n.o 1, da kildeskatteloven (Lei relativa à retenção na fonte), qualquer decisão de distribuição de dividendos por uma sociedade residente na Dinamarca deve prever que se procederá a uma retenção na fonte de uma certa percentagem do total distribuído, salvo disposição em contrário. A taxa de retenção na fonte estava fixada em 25% para 2000 e aumentou para 28% em relação ao período compreendido entre 2001 e 2009.

7        Em conformidade com a regulamentação dinamarquesa, a taxa de retenção na fonte é reduzida para 15% quando as autoridades do Estado de residência do OICVM em causa estiverem obrigadas a trocar informações com as autoridades dinamarquesas em aplicação de uma convenção destinada a evitar a dupla tributação, de outra convenção internacional ou de um acordo administrativo de assistência em matéria fiscal. Para os contribuintes residentes na União Europeia, a tributação final não deve, na prática, exceder 15%, em conformidade com essa disposição. A tributação pode, além disso, ser ainda reduzida em função de convenções fiscais celebradas entre o Reino da Dinamarca e o Estado de residência do OICVM em causa.

8        A Lei relativa à retenção na fonte é aplicável aos OICVM estabelecidos na Dinamarca, que estão, portanto, a priori, sujeitos a esta regulamentação sobre a tributação dos dividendos. Todavia, resulta das disposições do § 65, n.o 8, desta lei que o ministro das Finanças pode adotar regras que estabeleçam que as distribuições de dividendos a fundos abrangidos pelas disposições do § 16 C da ligningslov (a seguir «fundos abrangidos pelo § 16 C») estão isentas de retenção.

9        Quando adotou o regulamento relativo à retenção na fonte, o ministro das Finanças usou desta faculdade para isentar os fundos abrangidos pelo § 16 C de qualquer retenção na fonte. Com efeito, nos termos do § 38 do regulamento relativo à retenção na fonte, qualquer OICVM pode obter um certificado de isenção e beneficiar da isenção da tributação dos dividendos na fonte, na condição, por um lado, de ser um organismo abrangido pelo § 1, ponto 6, da Lei do imposto sobre as sociedades, e portanto residente na Dinamarca, e, por outro, de beneficiar do estatuto de fundos abrangidos pelo § 16 C. Um OICVM residente na Dinamarca que não cumpra os requisitos do § 16 C da ligningslov não está isento de retenção na fonte sobre os dividendos.

10      O § 16 C da ligningslov define o que se deve entender por fundos abrangidos pelo § 16 C.

11      Assim, em conformidade com a regulamentação em vigor até 1 de junho de 2005, para que um OICVM pudesse ser qualificado de fundos abrangidos pelo § 16 C, devia proceder a uma distribuição mínima de dividendos. A distribuição mínima constitui a matéria coletável dos rendimentos do fundo em causa ao nível dos seus participantes.

12      As regras de determinação da distribuição mínima são especificadas no § 16 C, n.os 2 a 6, da ligningslov. Em conformidade com o n.o 2 desta disposição, a distribuição mínima é constituída pela soma das receitas e dos montantes líquidos recebidos durante o exercício, soma da qual são deduzidos os prejuízos e os encargos. O § 16 C, n.o 3, da ligningslov prevê que está incluído nesta determinação todo um conjunto de receitas nele enumeradas, designadamente os juros, os dividendos de ações, os rendimentos de créditos e de contratos financeiros, bem como as mais‑valias da alienação de ações. Em conformidade com o § 16 C, n.os 4 e 5, da ligningslov, os fundos abrangidos pelo § 16 C podem deduzir os prejuízos fiscalmente admissíveis e as despesas de gestão.

13      Na sequência da adoção da Lei n.o 407, de 1 de junho de 2005, e a partir dessa data, deixou de ser exigido que se proceda efetivamente a uma distribuição mínima aos participantes para poder beneficiar do estatuto de fundos abrangidos pelo § 16 C. Todavia, a possibilidade de beneficiar desse estatuto continua a estar sujeita à condição de o OICVM em causa proceder à determinação de uma distribuição mínima, sujeita a imposto, a pagar pelos seus participantes, através de uma retenção na fonte efetuada por esse organismo.

 Litígios nos processos principais e questão prejudicial

14      Os recorrentes nos processos principais são OICVM, na aceção da Diretiva 85/611, com sede, respetivamente, no Reino Unido e no Luxemburgo. Os seus investimentos nas sociedades estabelecidas na Dinamarca são carteiras de investimentos e não ultrapassam 10% do capital. Os produtos propostos pelos recorrentes nos processos principais são acessíveis a clientes residentes na Dinamarca, mas não são comercializados ativamente nesse Estado‑Membro. Do mesmo modo, os recorrentes nos processos principais não pediram às autoridades fiscais dinamarquesas para beneficiar do estatuto fiscal dos fundos abrangidos pelo § 16 C nem adaptaram os seus estatutos à regulamentação aplicável a esses fundos até ao exercício fiscal de 2005.

15      Os recorrentes nos processos principais apresentaram ao juiz nacional pedidos de reembolso de retenções na fonte efetuadas sobre distribuições de dividendos de sociedades estabelecidas na Dinamarca de que beneficiaram entre 2000 e 2009, alegando que os OICVM residentes na Dinamarca podem, diversamente dos OICVM não residentes nesse Estado‑Membro, beneficiar de uma isenção da retenção na fonte. Com efeito, a regulamentação fiscal nacional estabelece dois requisitos para a isenção, concretamente, que o OICVM em causa seja residente da Dinamarca e que estabeleça e declare os seus rendimentos de acordo com a regulamentação fiscal dinamarquesa. Os OICVM não residentes não podem, por natureza, satisfazer o primeiro destes requisitos e é‑lhes impossível, se não particularmente difícil, satisfazer o segundo requisito, tanto mais que não têm nenhum incentivo para o fazer, uma vez que, em razão do primeiro requisito, não podem em caso algum beneficiar da isenção da retenção na fonte.

16      Por conseguinte, os recorrentes nos processos principais consideram que, ainda que não satisfaçam o segundo requisito relativo à obrigação de estabelecer e declarar uma distribuição mínima em conformidade com a regulamentação dinamarquesa, têm direito ao reembolso dos impostos retidos na fonte.

17      É certo que o Ministério das Finanças admite que o regime dinamarquês tem por efeito que, em cetros casos, OICVM estabelecidos na Dinamarca e OICVM estabelecidos noutro Estado‑Membro são objeto de tratamento fiscal diferente relativamente aos dividendos recebidos de sociedades estabelecidas na Dinamarca. Todavia, considera que esta restrição é justificada, por um lado, pela necessidade de preservar a coerência do regime fiscal e, por outro, pela necessidade de assegurar uma repartição equilibrada do poder de tributação entre Estados‑Membros.

18      Nesse contexto, as partes nos litígios nos processos principais estão de acordo em que esta diferença de tratamento fiscal constitui uma restrição à livre circulação, mas os recorrentes nos processos principais sustentam que tal restrição não pode ser justificada pelas razões aduzidas pelo Ministério das Finanças e que, em qualquer caso, a regulamentação dinamarquesa ultrapassa o que é necessário para garantir a tributação na Dinamarca.

19      Foi nestas condições que o Østre Landsret (Tribunal Regional de Este, Dinamarca) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«O artigo 56.o [CE] (atual artigo 63.o TFUE), relativo à livre circulação de capitais, ou o artigo 49.o [CE] (atual artigo 56.o TFUE), relativo à livre prestação de serviços, opõem‑se a um regime fiscal como o que está em causa nos litígios no[s] processo[s] principa[is], que prevê a retenção na fonte do imposto sobre os dividendos recebidos de sociedades dinamarquesas por [OICVM] não dinamarqueses abrangidos pela Diretiva 85/611 […], quando os [OICVM] equivalentes podem beneficiar de uma isenção da retenção na fonte, quer porque realizam efetivamente uma distribuição mínima aos [seus] participantes [sujeita a] retenção do imposto na fonte, quer porque[,] tecnicamente[,] é calculada uma distribuição mínima sobre a qual o imposto aplicável aos participantes nesses organismos é retido na fonte?»

 Quanto ao pedido de reabertura da fase oral do processo

20      Na sequência da apresentação das conclusões do advogado‑geral, os recorrentes nos processos principais pediram, por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal de Justiça em 18 de janeiro de 2018, que fosse ordenada a reabertura da fase oral do processo, em aplicação do artigo 83.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça.

21      Em apoio do seu pedido, os recorrentes nos processos principais alegam, em substância, que as conclusões do advogado‑geral assentam num equívoco quanto à dimensão e à natureza das exigências estabelecidas pelo § 16 C da ligningslov. Além disso, a referência, feita pelo advogado‑geral, à circunstância de certos OICVM que não são residentes no Reino da Dinamarca terem efetuado distribuições mínimas baseava‑se em dados factuais errados e as circunstâncias relativas a esses OICVM não tinham sido objeto de debate perante o Tribunal de Justiça.

22      A este propósito, importa, no entanto, recordar que, ao abrigo do artigo 252.o, segundo parágrafo, TFUE, ao advogado‑geral cabe apresentar publicamente, com toda a imparcialidade e independência, conclusões fundamentadas sobre as causas que, nos termos do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, requeiram a sua intervenção. O Tribunal de Justiça não está vinculado pelas conclusões do advogado‑geral nem pela fundamentação em que este baseia essas conclusões (Acórdão de 22 de junho de 2017, Federatie Nederlandse Vakvereniging e o., C‑126/16, EU:C:2017:489, n.o 31 e jurisprudência referida).

23      Importa igualmente recordar, neste contexto, que o Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e o Regulamento de Processo deste último não preveem a possibilidade de as partes apresentarem observações em resposta às conclusões apresentadas pelo advogado‑geral (Acórdão de 25 de outubro de 2017, Polbud –Wykonawstwo, C‑106/16, EU:C:2017:804, n.o 23 e jurisprudência referida). Por conseguinte, o facto de um interessado não concordar com as conclusões do advogado‑geral, sejam quais forem as questões nelas examinadas, não pode constituir, em si mesmo, um fundamento justificativo da reabertura da fase oral do processo (Acórdãos de 25 de outubro de 2017, Polbud – Wykonawstwo, C‑106/16, EU:C:2017:804, n.o 24, e de 29 de novembro de 2017, King, C‑214/16, EU:C:2017:914, n.o 27 e jurisprudência referida).

24      Com os argumentos relativos à dimensão e à natureza das exigências estabelecidas pelo § 16 C da ligningslov, os recorrentes nos processos principais procuram responder às conclusões do advogado‑geral pondo em causa a descrição da regulamentação em vigor na Dinamarca na sequência da modificação ocorrida em 2005, como decorre do pedido de decisão prejudicial, dos autos à disposição do Tribunal de Justiça e das informações prestadas durante a audiência. Ora, decorre da jurisprudência referida no número anterior que a apresentação de tais observações não está prevista pelos diplomas que regulam a tramitação do processo perante o Tribunal de Justiça.

25      Não obstante, ao abrigo do artigo 83.o do seu Regulamento de Processo, o Tribunal pode, a qualquer momento, ouvido o advogado‑geral, ordenar a reabertura da fase oral do processo, designadamente se considerar que não está suficientemente esclarecido, ou quando, após o encerramento dessa fase, uma parte invocar um facto novo que possa ter influência determinante na decisão do Tribunal, ou ainda quando o processo deva ser resolvido com base num argumento que não foi debatido entre as partes ou os interessados referidos no artigo 23.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia.

26      No caso presente, o Tribunal de Justiça, ouvido o advogado‑geral, considera que dispõe de todos os elementos necessários para responder à questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio e que todos os argumentos necessários para julgar a causa, em especial a possibilidade de um organismo não residente da Dinamarca determinar uma distribuição mínima em conformidade com a regulamentação dinamarquesa e obter a qualificação de fundos abrangidos pelo § 16 C, foram debatidos perante o Tribunal.

27      Atendendo ao que precede, não há que ordenar a reabertura da fase oral do processo.

 Quanto à questão prejudicial

28      Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os artigos 56.o e 63.o TFUE devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma regulamentação de um Estado‑Membro, como a que está em causa nos processos principais, por força da qual os dividendos distribuídos por uma sociedade residente desse Estado‑Membro a um OICVM não residente estão sujeitos a uma retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OICVM residente desse mesmo Estado‑Membro estão isentos dessa retenção, na condição de esse organismo proceder a uma distribuição mínima aos seus participantes, ou calcular tecnicamente uma distribuição mínima, e reter um montante de imposto sobre essa distribuição mínima real ou fictícia, a pagar pelos seus participantes.

29      Como decorre da descrição da regulamentação nacional em causa nos processos principais feita pelo órgão jurisdicional de reenvio, para poder beneficiar de uma isenção da retenção na fonte, um OICVM deve, por um lado, ser residente da Dinamarca e, por outro, beneficiar do estatuto de fundos abrangidos pelo § 16 C.

30      Para obter esse estatuto, um OICVM deve preencher os requisitos previstos no § 16 C da ligningslov e, em especial, em conformidade com a regulamentação em vigor antes de 1 de junho de 2005, comprometer‑se a proceder a uma distribuição mínima e efetuar uma retenção na fonte sobre essa distribuição, a pagar pelos seus participantes. A partir da referida data, deixou de se exigir uma distribuição mínima aos participantes, mas, para beneficiar do referido estatuto, o OICVM em causa deve proceder à determinação de uma distribuição mínima sujeita a imposto, a pagar pelos seus participantes, através de uma retenção na fonte efetuada por esse organismo. Os OICVM residentes na Dinamarca que não obtiveram o estatuto de fundos abrangidos pelo § 16 C estão sujeitos à retenção na fonte sobre os dividendos distribuídos pelas sociedades residentes desse Estado‑Membro.

31      Resulta dos autos e não foi contestado no Tribunal de Justiça que, no período em causa nos processos principais, apenas os OICVM residentes na Dinamarca podiam beneficiar de uma isenção da retenção na fonte. Decorre das explicações do Governo dinamarquês e das partes nos processos principais que, embora um OICVM não residente da Dinamarca possa, em princípio, preencher os requisitos previstos no § 16 C da ligningslov, não pode, em razão da sua qualidade de organismo não residente desse Estado‑Membro, beneficiar da isenção da retenção na fonte sobre os dividendos distribuídos por sociedades residentes.

 Quanto à liberdade em causa

32      Tendo a questão prejudicial sido submetida tanto na ótica do artigo 56.o TFUE como do artigo 63.o TFUE, há que determinar, a título preliminar, se e, sendo caso disso, em que medida uma regulamentação nacional como a que está em causa nos processos principais é suscetível de afetar o exercício da livre prestação de serviços e da livre circulação de capitais.

33      A este respeito, resulta de jurisprudência assente que se deve ter em conta o objeto da legislação em causa (Acórdãos de 13 de novembro de 2012, Test Claimants in the FII Group Litigation, C‑35/11, n.o 90 e jurisprudência referida, e de 5 de fevereiro de 2014, Hervis Sport‑ és Divatkereskedelmi, C‑385/12, EU:C:2014:47, n.o 21 e jurisprudência referida).

34      Os litígios nos processos principais dizem respeito ao pedido de reembolso das retenções na fonte efetuadas sobre os dividendos pagos aos recorrentes nos processos principais por sociedades estabelecidas na Dinamarca entre 2000 e 2009 e à compatibilidade com o direito da União de uma regulamentação nacional que reserva a possibilidade de beneficiar da isenção dessa retenção na fonte aos OICVM residentes na Dinamarca que preencham os requisitos previstos no § 16 C da ligningslov.

35      A regulamentação nacional em causa nos processos principais tem, assim, por objeto o tratamento fiscal de dividendos recebidos pelos OICVM.

36      Por conseguinte, há que considerar que a situação em causa nos processos principais diz respeito à livre circulação de capitais.

37      Além disso, admitindo que a legislação em causa nos processos principais tenha por efeito proibir, entravar ou tornar menos atrativas as atividades de um OICVM estabelecido num Estado‑Membro diferente do Reino da Dinamarca, onde presta legalmente serviços análogos, tais efeitos seriam a consequência inelutável do tratamento fiscal de que são objeto os dividendos pagos a este OICVM não residente da Dinamarca e não justificam uma apreciação autónoma à luz da livre prestação de serviços (v., neste sentido, Acórdão de 17 de setembro de 2009, Glaxo Wellcome, C‑182/08, EU:C:2009:559, n.o 51 e jurisprudência referida). Com efeito, esta liberdade afigura‑se neste caso secundária relativamente à livre circulação de capitais e pode estar‑lhe associada [Acórdão de 26 de maio de 2016, NN (L) International, C‑48/15, EU:C:2016:356, n.o 41].

38      Por outro lado, resulta das indicações do órgão jurisdicional de reenvio que os investimentos dos recorrentes nos processos principais na Dinamarca são carteiras de investimentos e nunca ultrapassaram 10% do capital de uma sociedade estabelecida na Dinamarca, sendo ponto assente que a liberdade de estabelecimento não é objeto da questão prejudicial.

39      Por conseguinte, há que responder à questão prejudicial à luz do artigo 63.o TFUE.

 Quanto à existência de uma restrição à livre circulação de capitais

40      Resulta de jurisprudência constante que as medidas proibidas pelo artigo 63.o, n.o 1, TFUE, enquanto restrições aos movimentos de capitais, incluem as que são suscetíveis de dissuadir os não residentes de investir num Estado‑Membro ou de dissuadir os residentes desse Estado‑Membro de investir noutros Estados (Acórdão de 10 de maio de 2012, Santander Asset Management SGIIC e o., C‑338/11 a C‑347/11, EU:C:2012:286, n.o 15 e jurisprudência referida).

41      Assim, por força da regulamentação em causa nos processos principais, os OICVM residentes na Dinamarca e os residentes noutro Estado‑Membro estão sujeitos, no que se refere aos dividendos que lhes são distribuídos por sociedades residentes na Dinamarca, a um tratamento diferenciado.

42      Com efeito, os dividendos distribuídos pelas sociedades residentes na Dinamarca aos OICVM não residentes estão sujeitos a uma retenção na fonte. Em contrapartida, os OICVM residentes na Dinamarca podem beneficiar da isenção da retenção na fonte para esses dividendos, desde que cumpram os requisitos do § 16 C da ligningslov.

43      Ao fazer uma retenção na fonte sobre os dividendos pagos aos OICVM não residentes e ao reservar aos OICVM residentes a possibilidade de obter a isenção de tal retenção na fonte, a regulamentação nacional em causa nos processos principais procede a um tratamento desfavorável dos dividendos pagos aos OICVM não residentes.

44      Tal tratamento desfavorável é suscetível de dissuadir, por um lado, os OICVM não residentes de investir em sociedades com sede na Dinamarca e, por outro, os investidores que residem na Dinamarca de adquirir participações em OICVM não residentes (Acórdão de 10 de maio de 2012, Santander Asset Management SGIIC e o., C‑338/11 a C‑347/11, EU:C:2012:286, n.o 17).

45      Por conseguinte, a regulamentação em causa nos processos principais constitui uma restrição à livre circulação de capitais, proibida, em princípio, pelo artigo 63.o TFUE.

 Quanto à existência de uma justificação

46      De acordo com o artigo 65.o, n.o 1, alínea a), TFUE, o disposto no artigo 63.o TFUE não prejudica o direito de os Estados‑Membros aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em situação idêntica no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido.

47      Esta disposição, na medida em que constitui uma derrogação ao princípio fundamental da livre circulação de capitais, deve ser objeto de interpretação estrita. Por conseguinte, não pode ser interpretada no sentido de que qualquer legislação fiscal que comporte uma distinção entre os contribuintes em função do lugar onde residam ou do Estado‑Membro onde invistam os seus capitais é automaticamente compatível com Tratado FUE. Com efeito, a derrogação prevista no artigo 65.o, n.o 1, alínea a), TFUE é, por sua vez, limitada pelo artigo 65.o, n.o 3, TFUE, que prevê que as disposições nacionais referidas no n.o 1 deste artigo «não devem constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos, tal como definida no artigo 63.o [TFUE]» (Acórdão de 10 de abril de 2014, Emerging Markets Series of DFA Investment Trust Company, C‑190/12, EU:C:2014:249, n.os 55 e 56 e jurisprudência referida).

48      Assim, há que distinguir as diferenças de tratamento autorizadas pelo artigo 65.o, n.o 1, alínea a), TFUE das discriminações proibidas pelo artigo 65.o, n.o 3, TFUE. Ora, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, para que uma legislação fiscal nacional como a que está em causa nos processos principais possa ser considerada compatível com as disposições do Tratado relativas à livre circulação de capitais, é necessário que a diferença de tratamento diga respeito a situações não comparáveis objetivamente ou que se justifique por uma razão imperiosa de interesse geral (Acórdão de 10 de maio de 2012, Santander Asset Management SGIIC e o., C‑338/11 a C‑347/11, EU:C:2012:286, n.o 23 e jurisprudência referida).

49      Por conseguinte, é necessário examinar se o facto de reservar aos OICVM residentes na Dinamarca a possibilidade de obter uma isenção da retenção na fonte é justificado por uma diferença de situação objetiva entre os OICVM residentes na Dinamarca e os OICVM não residentes.

50      A este respeito, decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça, por um lado, que o caráter comparável ou não de uma situação transfronteiriça com uma situação interna deve ser examinado tendo em conta o objetivo prosseguido pelas disposições nacionais em causa assim como o objeto e o conteúdo destas últimas (Acórdão de 2 de junho de 2016, Pensioenfonds Metaal en Techniek, C‑252/14, EU:C:2016:402, n.o 48 e jurisprudência referida).

51      Por outro lado, apenas os critérios de distinção pertinentes estabelecidos pela legislação em causa devem ser tidos em conta para apreciar se a diferença de tratamento resultante de tal regulamentação reflete uma diferença de situação objetiva (Acórdãos de 10 de maio de 2012, Santander Asset Management SGIIC e o., C‑338/11 a C‑347/11, EU:C:2012:286, n.o 28, e de 2 de junho de 2016, Pensioenfonds Metaal en Technick, C‑252/14, EU:C:2016:402, p. 49).

52      Como resulta das observações do Governo dinamarquês, a regulamentação em causa nos processos principais tem por objetivo, por um lado, assegurar uma igualdade da carga fiscal que recai sobre os particulares que investem em sociedades estabelecidas na Dinamarca através de um OICVM e a que recai sobre os particulares que investem diretamente em sociedades estabelecidas na Dinamarca. Na opinião deste Governo, tal regulamentação evita, assim, uma dupla tributação económica, que se verificaria se os dividendos fossem tributados ao nível do OICVM em causa e ao nível dos seus participantes. Por outro lado, a referida regulamentação visa assegurar que os dividendos distribuídos por sociedades estabelecidas na Dinamarca não escapam ao poder de tributação do Reino da Dinamarca pelo facto de estarem isentos ao nível dos OICVM e são efetivamente submetidos uma vez ao seu poder de tributação.

53      No que se refere ao primeiro objetivo invocado pelo Governo dinamarquês, decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, relativamente às medidas previstas por um Estado‑Membro para evitar ou atenuar a tributação em cadeia ou a dupla tributação económica dos rendimentos distribuídos por uma sociedade residente, as sociedades beneficiárias residentes não estão necessariamente numa situação comparável à das sociedades beneficiárias residentes de outro Estado‑Membro (Acórdão de 25 de outubro de 2012, Comissão/Bélgica, C‑387/11, EU:C:2012:670, n.o 48 e jurisprudência referida).

54      Todavia, a partir do momento em que um Estado‑Membro, de maneira unilateral ou por via convencional, sujeita ao imposto sobre o rendimento não só as sociedades residentes mas também as sociedades não residentes, relativamente aos rendimentos que recebem de uma sociedade residente, a situação das referidas sociedades não residentes assemelha‑se à das sociedades residentes (Acórdão de 25 de outubro de 2012, Comissão/Bélgica, C‑387/11, EU:C:2012:670, n.o 49 e jurisprudência referida).

55      Com efeito, é apenas o exercício, por esse mesmo Estado, da sua competência fiscal que, independentemente de qualquer tributação noutro Estado‑Membro, cria um risco de tributação em cadeia ou de dupla tributação económica. Nesse caso, para que as sociedades beneficiárias não residentes não sejam confrontadas com uma restrição à livre circulação de capitais, proibida, em princípio, pelo artigo 63.o TFUE, o Estado de residência da sociedade distribuidora deve assegurar que, em relação ao mecanismo previsto na sua regulamentação nacional para evitar ou atenuar a tributação em cadeia ou a dupla tributação económica, as sociedades não residentes sejam submetidas a um tratamento equivalente ao tratamento de que beneficiam as sociedades residentes (v., neste sentido Acórdão de 25 de outubro de 2012, Comissão/Bélgica, C‑387/11, EU:C:2012:670, n.o 50 e jurisprudência referida).

56      Tendo o Reino da Dinamarca optado por exercer a sua competência fiscal sobre os rendimentos obtidos pelos OICVM não residentes, estes encontram‑se, por conseguinte, numa situação comparável à dos OICVM residentes na Dinamarca no que respeita ao risco de dupla tributação económica dos dividendos pagos pelas sociedades residentes na Dinamarca (Acórdãos de 20 de outubro de 2011, Comissão/Alemanha, C‑284/09, EU:C:2011:670, n.o 58, e de 10 de maio de 2012, Santander Asset Management SGIIC e o., C‑338/11 a C‑347/11, EU:C:2012:286, n.o 42).

57      O segundo objetivo destacado pelo Governo dinamarquês consiste, em substância, na intenção de não renunciar à tributação dos dividendos distribuídos pelas sociedades residentes na Dinamarca, mas de transferir o nível da sua tributação para os participantes dos OICVM. Este objetivo é implementado prevendo que, para beneficiar do estatuto de fundos abrangidos pelo § 16 C, e, por conseguinte, da isenção da retenção na fonte, um OICVM residente na Dinamarca deve fazer uma retenção na fonte, a pagar pelos seus participantes, sobre a distribuição mínima que lhes foi efetivamente paga ou, após as modificações ocorridas em 2005, sobre a distribuição mínima determinada em conformidade com as disposições do § 16 C da ligningslov.

58      Em contrapartida, o Reino da Dinamarca não pode sujeitar um OICVM não residente a tal obrigação de proceder, sobre os dividendos que o referido OICVM distribui, a uma retenção na fonte em benefício deste Estado‑Membro. Esse OICVM está sujeito ao poder de tributação do Reino da Dinamarca unicamente em razão dos dividendos que recebe e cuja fonte se encontra nesse Estado‑Membro, e não, em princípio, no que diz respeito aos dividendos que ele próprio distribui.

59      Todavia, atendendo ao objetivo, ao objeto e ao conteúdo da regulamentação em causa nos processos principais, esta distinção, que reflete, aliás, a diferença entre um organismo residente na Dinamarca e um organismo não residente, não deveria ser considerada determinante.

60      Com efeito, se o objetivo da regulamentação em causa nos processos principais é deslocar o nível de tributação do veículo de investimento para o acionista desse veículo, são, em princípio, as condições materiais do poder de tributação sobre os rendimentos dos acionistas que devem ser consideradas determinantes, e não a técnica de tributação utilizada.

61      Ora, um OICVM não residente pode ter participantes que têm residência fiscal na Dinamarca e sobre cujos rendimentos esse Estado‑Membro pode exercer o seu poder de tributação. Nesta perspetiva, um OICVM não residente encontra‑se numa situação objetivamente comparável a um OICVM residente na Dinamarca.

62      É certo que o Reino da Dinamarca não pode tributar os participantes não residentes sobre os dividendos distribuídos pelos OICVM não residentes. Contudo, essa impossibilidade é coerente com a lógica da deslocação do nível de tributação do veículo para o acionista.

63      Nestas condições, importa constatar que o facto de reservar aos OICVM residentes a possibilidade de obter uma isenção da retenção na fonte não é justificado por uma diferença de situação objetiva entre esses OICVM e os residentes num Estado‑Membro diferente do Reino da Dinamarca.

64      Ora, tal restrição apenas pode ser admitida se se justificar por razões imperiosas de interesse geral, se for adequada para garantir a realização do objetivo por ela prosseguido e se não for além do que é necessário para o alcançar (Acórdão de 24 de novembro de 2016, SECIL, C‑464/14, EU:C:2016:896, n.o 56).

65      Os Governos que apresentaram observações ao Tribunal de Justiça consideram que a restrição à livre circulação de capitais em causa nos processos principais é justificada pela necessidade de preservar a coerência do regime fiscal dinamarquês. Os Governos dinamarquês e neerlandês consideram, além disso, que esta restrição é justificada pela necessidade de garantir a repartição equilibrada do poder de tributação entre os Estados‑Membros.

66      Há que apreciar, em primeiro lugar, se o facto de um Estado‑Membro reservar a possibilidade de obter uma isenção da retenção na fonte sobre os dividendos distribuídos por sociedades residentes aos OICVM residentes pode ser justificado pela necessidade de garantir a preservação da repartição equilibrada do poder de tributação entre os Estados‑Membros.

67      Os Governos dinamarquês e neerlandês alegam, a este respeito, que obrigar o Reino da Dinamarca a conceder uma isenção da retenção na fonte sobre os dividendos distribuídos aos OICVM não residentes, sem que esse Estado‑Membro possa cobrar um imposto no ato da distribuição dos dividendos aos participantes, equivaleria a obrigar o Estado fonte desses dividendos a renunciar à sua competência fiscal em razão dos rendimentos gerados no seu território.

68      O facto de cobrar o imposto sobre os dividendos e de excluir os OICVM não residentes do benefício da isenção em causa nos processos principais permite, segundo os referidos Governos, garantir uma repartição equilibrada do poder de tributação e não vai além do que é necessário, dado que o Reino da Dinamarca não cobra mais de uma vez o imposto sobre os dividendos distribuídos aos OICVM não residentes e que a transferência de tributação para a distribuição por esses organismos não é possível.

69      A este respeito, há que recordar que, na verdade, a preservação da repartição do poder de tributação entre os Estados‑Membros é suscetível de constituir uma razão imperiosa de interesse geral que permite justificar uma restrição ao exercício de uma liberdade de circulação na União Europeia (Acórdão de 12 de dezembro de 2013, Imfeld e Garcet, C‑303/12, EU:C:2013:822, n.o 68 e jurisprudência referida).

70      Tal justificação pode ser aceite quando, designadamente, o regime em causa tenha por objetivo evitar comportamentos suscetíveis de comprometer o direito de um Estado‑Membro de exercer a sua competência fiscal em relação às atividades exercidas no seu território (Acórdão de 10 de maio de 2012, Santander Asset Management SGIIC e o., C‑338/11 a C‑347/11, EU:C:2012:286, n.o 47 e jurisprudência referida).

71      No entanto, como o Tribunal de Justiça já declarou, quando um Estado‑Membro tenha optado, como na situação em causa nos processos principais, por não tributar os OICVM residentes beneficiários de dividendos de origem nacional, não pode invocar a necessidade de garantir uma repartição equilibrada do poder de tributação entre os Estados‑Membros para justificar a tributação dos OICVM não residentes beneficiários de tais rendimentos (Acórdão de 10 de maio de 2012, Santander Asset Management SGIIC e o., C‑338/11 a C‑347/11, EU:C:2012:286, n.o 48 e jurisprudência referida).

72      Por outro lado, os dividendos distribuídos pelas sociedades residentes na Dinamarca aos OICVM não residentes já foram objeto de tributação no Reino da Dinamarca a título dos lucros da sociedade distribuidora.

73      A circunstância de a tributação dos dividendos ser transferida a nível dos participantes dos OICVM residentes não pode justificar a restrição em causa nos processos principais.

74      Com efeito, por um lado, como foi salientado no n.o 61 do presente acórdão, o Reino da Dinamarca dispõe do poder de tributação sobre os participantes residentes dos OICVM não residentes.

75      Por outro lado, o facto de um Estado‑Membro proceder à retenção na fonte sobre os dividendos distribuídos aos OICVM não residentes, devido à impossibilidade de tributar a totalidade das distribuições efetuadas por esses organismos, equivale não a prevenir comportamentos suscetíveis de comprometer o direito desse Estado‑Membro de exercer a sua competência fiscal relativamente às atividades realizadas no seu território mas, ao invés, a compensar a inexistência do poder de tributação decorrente da repartição equilibrada do poder de tributação entre os Estados‑Membros.

76      A necessidade de preservar tal repartição não pode, por conseguinte, ser invocada para justificar a restrição à livre circulação de capitais em causa nos processos principais.

77      Em segundo lugar, há que verificar se, como alegam os Governos que apresentaram observações ao Tribunal de Justiça, a restrição decorrente da aplicação da regulamentação fiscal em causa nos processos principais pode ser justificada pela necessidade de preservar a coerência do regime fiscal dinamarquês.

78      Com efeito, segundo esses Governos, existe um nexo direto entre a isenção da retenção na fonte no que se refere aos dividendos pagos aos OICVM residentes e a obrigação de esses OICVM efetuarem uma retenção na fonte sobre os dividendos que distribuem aos seus participantes.

79      A este respeito, há que recordar que o Tribunal de Justiça já declarou que a necessidade de preservar a coerência de um regime fiscal pode justificar uma regulamentação suscetível de restringir as liberdades fundamentais (Acórdão de 10 de maio de 2012, Santander Asset Management SGIIC e o., C‑338/11 a C‑347/11, EU:C:2012:286, n.o 50 e jurisprudência referida).

80      No entanto, para que um argumento baseado nessa justificação possa ser acolhido, é necessário, segundo jurisprudência constante, que esteja demonstrada a existência de um nexo direto entre a vantagem fiscal em causa e a compensação dessa vantagem pela liquidação de uma determinada imposição fiscal, devendo o caráter direto deste nexo ser apreciado à luz do objetivo da regulamentação em causa (Acórdão de 10 de maio de 2012, Santander Asset Management SGIIC e o., C‑338/11 a C‑347/11, EU:C:2012:286, n.o 51 e jurisprudência referida).

81      A este respeito, como foi salientado nos n.os 29 a 31 do presente acórdão, um OICVM pode beneficiar de uma isenção da retenção na fonte sobre os dividendos distribuídos por uma sociedade residente na Dinamarca, na condição de, cumulativamente, ele próprio ser residente na Dinamarca e de proceder a uma distribuição mínima ou à determinação de uma distribuição mínima, sobre as quais é efetuada uma retenção na fonte.

82      Como o advogado‑geral salientou no n.o 72 das suas conclusões, a regulamentação nacional em causa nos processos principais subordina a isenção dos OICVM residentes na Dinamarca da retenção na fonte à condição de procederem a uma distribuição mínima, real ou fictícia, em benefício dos seus participantes, que ficam sujeitos a um pagamento por conta, cobrado em seu nome, por esses organismos. A vantagem assim concedida aos OICVM residentes na Dinamarca, sob a forma de uma isenção da retenção na fonte, é, em princípio, compensada pela tributação dos referidos dividendos, redistribuídos por esses organismos, a pagar pelos participantes destes últimos.

83      Há ainda que verificar se o facto de reservar aos OICVM residentes na Dinamarca a possibilidade de beneficiar da isenção da retenção na fonte não vai além do que é necessário para garantir a coerência do regime fiscal em causa nos processos principais.

84      Como o advogado‑geral salientou no n.o 80 das suas conclusões, a coerência interna do regime fiscal em causa nos processos principais poderia ser mantida se os OICVM residentes de um Estado‑Membro diferente do Reino da Dinamarca que cumprem os requisitos do § 16 C da ligningslov pudessem beneficiar da isenção da retenção na fonte, desde que as autoridades fiscais dinamarquesas consigam garantir, com a plena colaboração desses organismos, que estes últimos pagam um imposto equivalente ao que os fundos abrangidos pelo § 16 C residentes na Dinamarca devem reter, como pagamento por conta, sobre a distribuição mínima calculada em conformidade com essa disposição. Permitir a tais OICVM beneficiar dessa isenção, nestas condições, constituiria uma medida menos restritiva do que o regime atual.

85      Além disso, recusar conceder aos OICVM residentes de um Estado‑Membro diferente do Reino da Dinamarca que cumprem os requisitos do § 16 C da ligningslov o benefício da isenção da retenção na fonte conduz a uma tributação em cadeia dos dividendos pagos aos seus participantes residentes na Dinamarca, o que, precisamente, contraria o objetivo visado pela regulamentação nacional.

86      Consequentemente, há que concluir que a restrição decorrente da aplicação da regulamentação fiscal em causa nos processos principais não pode ser justificada pela necessidade de garantir a coerência do regime fiscal.

87      Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à questão submetida que o artigo 63.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação de um Estado‑Membro, como a que está em causa nos processos principais, por força da qual os dividendos distribuídos por uma sociedade residente desse Estado‑Membro a um OICVM não residente estão sujeitos a uma retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OICVM residente desse mesmo Estado‑Membro estão isentos dessa retenção, na condição de esse organismo proceder a uma distribuição mínima aos seus participantes, ou calcular tecnicamente uma distribuição mínima, e reter um montante de imposto sobre essa distribuição mínima real ou fictícia, a pagar pelos seus participantes.

 Quanto às despesas

88      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quinta Secção) declara:

O artigo 63.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação de um EstadoMembro, como a que está em causa nos processos principais, por força da qual os dividendos distribuídos por uma sociedade residente desse EstadoMembro a um organismo de investimento coletivo em valores mobiliários (OICVM) não residente estão sujeitos a uma retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OICVM residente desse mesmo EstadoMembro estão isentos dessa retenção, na condição de esse organismo proceder a uma distribuição mínima aos seus participantes, ou calcular tecnicamente uma distribuição mínima, e reter um montante de imposto sobre essa distribuição mínima real ou fictícia, a pagar pelos seus participantes.

Assinaturas


*      Língua do processo: dinamarquês.