Language of document : ECLI:EU:T:2001:105

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

28 de Março de 2001 (1)

«Concorrência - Artigo 85.° do Tratado CE (actual artigo 81.° CE) - Código de conduta profissional - Proibição de publicidade comparativa - Oferta de serviços»

No processo T-144/99,

Instituto dos mandatários reconhecidos junto do Instituto Europeu de Patentes, com sede em Munique (Alemanha), representado por R. Collin e M.-C. Mitchell, advogados, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por E. Gippini Fournier, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida,

que tem por objecto a anulação da Decisão 1999/267/CE da Comissão, de 7 de Abril de 1999, relativa a um processo de aplicação do artigo 85.° do Tratado CE [IV/36.147 - Código de conduta do IMR (IEP)] (JO L 106, p. 14),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Segunda Secção),

composto por: A. W. H. Meij, presidente, A. Potocki e J. Pirrung, juízes,

secretário: G. Herzig, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 9 de Novembro de 2000,

profere o presente

Acórdão

Enquadramento jurídico

1.
    A convenção sobre a concessão de patentes europeias (a seguir «convenção»), assinada em Munique em 5 de Outubro de 1973, institui um direito comum aos Estados contratantes em matéria de concessão de patentes de invenção.

2.
    Esta Convenção criou a Organização Europeia de Patentes, que tem como missão conceder as patentes europeias.

3.
    Os órgãos desta organização são o Instituto Europeu de Patentes (a seguir «Instituto») e o Conselho de Administração. O Instituto concede as patentes sob controlo deste conselho.

4.
    Nos termos do artigo 134.° da convenção, a representação de pessoas singulares ou colectivas nos processos instituídos pela convenção só pode ser assegurada por mandatários reconhecidos inscritos numa lista que o Instituto mantém para esse efeito.

5.
    Em 21 de Outubro de 1977, o Conselho de Administração da Organização Europeia de Patentes adoptou dois regulamentos:

-    o primeiro, adoptado ao abrigo do artigo 134.°, n.° 8, alínea b), da convenção, diz respeito à criação de um Instituto dos mandatários reconhecidos junto do Instituto (a seguir «IMR»);

-    o segundo, adoptado ao abrigo do artigo 134.°, n.° 8, alínea c), da convenção, diz respeito ao poder disciplinar do IMR sobre os mandatários reconhecidos.

6.
    O IMR é um organismo sem fins lucrativos, cujas despesas são cobertas pelas receitas provenientes, em especial, das quotas dos seus membros. Tem como objecto, entre outros fins, colaborar com a Organização Europeia de Patentes nas questões relacionadas com a profissão de mandatário reconhecido, designadamente em matéria de questões disciplinares e de exame europeu de habilitação, bem como velar pelo cumprimento por parte dos seus membros das regras de conduta profissional, formulando, nomeadamente, recomendações.

7.
    Todos as pessoas inscritas na lista dos mandatários reconhecidos são membros do IMR.

8.
    Os membros do IMR elegem entre eles um Conselho. Este tem a faculdade, nos limites fixados pelo regulamento em matéria disciplinar dos mandatários reconhecidos, de formular recomendações relativas à deontologia (n.° 3 do artigo 9.° do regulamento relativo à criação do IMR).

9.
    Foi assim que o Conselho do IMR aprovou um código de conduta profissional (a seguir «código de conduta»).

10.
    A Directiva 84/450/CEE do Conselho, de 10 de Setembro de 1984, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros em matéria de publicidade enganosa (JO L 250, p. 17, EE 15 F5 p. 55), na redacção que lhe foi dada pela Directiva 97/55/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Outubro de 1997, para nela incluir a publicidade comparativa (JO L 290, p. 18) (a seguir «directiva»), dispõe, no seu artigo 3.°-A, que a publicidade comparativa é autorizada, desde que, nomeadamente, não seja enganosa.

11.
    O artigo 7.°, n.° 5, da directiva estabelece:

«Nenhuma disposição da presente directiva obsta a que os Estados-Membros mantenham ou introduzam, no respeito pelas disposições do Tratado, proibições ou limitações à utilização de comparações na publicidade de serviços [de profissões liberais], quer impostas directamente quer através de um organismo ou organização responsável, nos termos das legislações dos Estados-Membros, pela regulamentação do exercício de uma actividade [liberal].»

12.
    O prazo concedido aos Estados-Membros na directiva para darem cumprimento ao nela disposto expirava em 23 de Abril de 2000.

Matéria de facto e tramitação processual

13.
    Em 17 de Julho de 1996, o IMR notificou à Comissão o código de conduta, na versão modificada, pela última vez, em 7 de Maio de 1996, no intuito de obter um certificado negativo ou, se não, uma isenção, nos termos do disposto nos artigos 2.° e 4.° do Regulamento n.° 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962, primeiro regulamento de execução dos artigos 85.° e 86.° do Tratado (JO 1962, 13, p. 204, EE 08 F1 p. 22).

14.
    Esta notificação seguiu-se à comunicação das acusações enviada pela Comissão, em 18 de Novembro de 1995, ao IMR, após uma denúncia apresentada, em 8 de Junho de 1992, por um mandatário em patentes europeias estabelecido no Reino Unido.

15.
    Em 18 de Dezembro de 1996, a Comissão enviou uma carta de advertência ao IMR, indicando-lhe nomeadamente que as disposições do código de conduta relativas, por um lado, à proibição de publicidade, uma vez que se baseavam em noções vagas e imprecisas, e, por outro, à obrigação dos membros de praticarem honorários razoáveis, não poderiam ser isentas.

16.
    Em 3 de Abril de 1997, o IMR comunicou à Comissão uma nova versão do código de conduta que não foi considerada satisfatória. Na sequência de discussões com a Comissão, o IMR enviou, em 14 de Outubro de 1997, uma versão do código de conduta alterada, pela última vez, em 30 de Setembro e 3 de Outubro de 1997.

17.
    Esta última versão do código de conduta inclui designadamente as seguintes disposições:

«Artigo 2.° - Publicidade

a)    A publicidade é autorizada como regra geral, desde que seja verídica, objectiva e conforme aos princípios essenciais nomeadamente da lealdade e do respeito do segredo profissional.

b)    Constituem excepções à publicidade autorizada:

    1.    A comparação dos serviços profissionais de um membro com os de um outro membro;

    [...]

    3.    A menção do nome de uma outra entidade profissional a menos que exista um acordo de colaboração escrito entre o membro e esta entidade;

    [...]

Artigo 5.° - Relações com os outros membros

[...]

c)    Um membro deve evitar qualquer troca de pontos de vista sobre um caso específico com o cliente desse caso, se tiver conhecimento ou desconfiar que este é ou foi tratado por um outro membro, a menos que o cliente manifeste o desejo de obter um parecer independente ou de mudar de mandatário. O membro só poderá informar o outro membro com o acordo do cliente.

[...]»

18.
    Em 7 de Abril de 1999, a Comissão adoptou a Decisão 1999/267/CE, relativa a um processo de aplicação do artigo 85.° do Tratado CE [IV/36.147 - Código de conduta do IMR (IEP)] (JO L 106, p. 14, a seguir «decisão»).

19.
    O artigo 1.° desta decisão tem a seguinte redacção:

«O disposto no n.° 1 do artigo 85.° do Tratado CE e no n.° 1 do artigo 53.° do Acordo EEE é declarado inaplicável, respectivamente, ao abrigo do n.° 3 do artigo 85.° do mesmo Tratado e do n.° 3 do artigo 53.° do Acordo EEE, às disposições do código de conduta [...], na versão adoptada em 30 de Setembro e 3 de Outubro de 1997, que proíbem aos membros a publicidade comparativa - pontos 1 e 3 da alínea b) do artigo 2.° - assim como à alínea c) do artigo 5.° na medida em que esta disposição é susceptível de proibir ou de tornar mais difícil a oferta de serviços aos utentes que já foram clientes de um outro mandatário para um caso específico.

A presente isenção é concedida com efeitos a partir de 14 de Outubro de 1997 até 23 de Abril de 2000.»

20.
    Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal em 14 de Junho de 1999, o recorrente interpôs o presente recurso de anulação.

21.
    Por fax recebido na Secretaria do Tribunal em 7 de Outubro de 1999, o recorrente requereu a apresentação de um documento, isto é, do parecer de 17 de Novembro de 1998 do Comité Consultivo em matéria de Acordos, Decisões e Práticas Concertadas e de Posições Dominantes, a que era feita referência na contestação.

22.
    Por carta de 25 de Outubro de 1999, a Comissão, baseando-se no artigo 10.°, n.° 6, do Regulamento n.° 17, informou que não tinha poderes para comunicar esse parecer ao recorrente.

23.
    Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal em 27 de Dezembro de 1999, a Ordem francesa dos Advogados do Foro de Bruxelas pediu para ser admitida como interveniente no presente processo. Este pedido foi indeferido pordespacho do presidente da Segunda Secção do Tribunal em 22 de Fevereiro de 2000 (ainda não publicado na Colectânea).

24.
    Por requerimento separado que deu entrada na Secretaria do Tribunal em 6 de Março de 2000, o recorrente apresentou um pedido de medidas provisórias, destinado a obter a suspensão da execução do artigo 1.° da decisão a partir de 23 de Abril de 2000. Por despacho de 14 de Abril de 2000, Instituto dos Mandatários Reconhecidos/Comissão (T-144/99 R, ainda não publicado na Colectânea), o presidente do Tribunal indeferiu esse pedido e reservou para final a decisão quanto às despesas.

25.
    Com base no relatório preliminar do juiz-relator, o Tribunal (Segunda Secção) decidiu iniciar a fase oral. No quadro das medidas de organização do processo, convidou as partes a responderem a uma pergunta na audiência.

26.
    Foram ouvidas as alegações das partes e as respostas que deram às perguntas que lhes foram feitas pelo Tribunal na audiência de 9 de Novembro de 2000.

Pedidos das partes

27.
    A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    anular a decisão, na parte em que diz respeito ao artigo 2.°, alínea b), pontos 1 e 3, e ao artigo 5.°, alínea c), do código de conduta;

-    retirar dos debates a referência ao parecer do Comité Consultivo em matéria de Acordos, Decisões e Práticas Concertadas e de Posições Dominantes de 17 de Novembro de 1998, bem como a argumentação daí decorrente sobre a justificação do prazo-limite de isenção e, implicitamente, sobre a aplicação do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 81.°, n.° 1, CE);

-    a título subsidiário, anular a decisão na medida em que só concede a isenção do artigo 2.°, alínea b), pontos 1 e 3, e do artigo 5.°, alínea c), do código de conduta a título provisório;

-    condenar a recorrida nas despesas.

28.
    A recorrida conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    rejeitar o recurso;

-    condenar o recorrente nas despesas.

Quanto à admissibilidade

29.
    Na fase oral do processo, a recorrida emitiu dúvidas quanto à admissibilidade do recurso, observando que a decisão dá satisfação ao recorrente, uma vez que acolhe o seu pedido de isenção.

30.
    Nos termos do artigo 113.° do Regulamento de Processo, o Tribunal pode, a todo o tempo, mesmo oficiosamente, verificar se estão preenchidos os pressupostos processuais, entre os quais se contam, segundo jurisprudência constante, as condições de admissibilidade de um pedido fixadas pelo artigo 230.°, quarto parágrafo, CE (acórdão do Tribunal de Justiça de 24 de Março de 1993, CIRFS e o./Commissão, C-313/90, Colect., p. I-1125, n.° 23).

31.
    O Tribunal constata, em primeiro lugar, que foi só depois de uma denúncia e do envio pela Comissão de uma comunicação de acusações ao recorrente que foi feita a notificação do código de conduta à Comissão, no intuito de obter, a título principal, um certificado negativo e, só a título subsidiário, uma isenção.

32.
    Acresce que a concessão da isenção pressupõe o reconhecimento prévio de que as disposições em causa estão abrangidas pela proibição do artigo 81.°, n.° 1, CE (acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de Julho de 1966, Itália/Conselho e Comissão, 32/65, Colect. 1965-1968, pp. 483, 487). Por conseguinte, ao declarar, no artigo 1.° da decisão, que o artigo 85.°, n.° 1, do Tratado não é aplicável às disposições em causa do código de conduta, ao abrigo do n.° 3 do artigo 85.° do mesmo Tratado, a Comissão rejeitou tacitamente, mas necessariamente, o pedido de certificado negativo do recorrente.

33.
    É, pois, indiferente que a constatação da infracção só figure explicitamente nos fundamentos da decisão, dado que essa constatação constitui a base da obrigação do IMR de pôr termo à infracção e que os seus efeitos na situação jurídica do recorrente não dependem da sua localização na decisão (v., neste sentido, o acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de Julho de 1966, Consten e Grundig/Comissão, 56/64 e 58/64, Colect. 1965-1968, pp. 423, 430).

34.
    Quanto a este aspecto, a decisão produz incontestavelmente efeitos jurídicos vinculativos susceptíveis de afectar os interesses do recorrente, alterando de forma caracterizada a situação jurídica deste (acórdão do Tribunal de Justiça de 31 de Março de 1998, França e o./Comissão, C-68/94 e C-30/95, Colect., p. I-1375, n.° 62).

35.
    O interesse em agir do recorrente pode ser tanto menos contestado quanto a anulação da decisão o recolocaria na situação anterior à verificação da infracção (v., neste sentido, o acórdão do Tribunal de Justiça de 31 de Março de 1971, Comissão/Conselho, 22/70, Colect., p. 69, n.° 60).

Quanto ao pedido de anulação do artigo 1.°, primeiro parágrafo, da decisão na parte em que se refere ao artigo 2.° do código de conduta

36.
    O recorrente invoca três fundamentos baseados em violação, respectivamente, do dever de fundamentação, do artigo 7.°, n.° 5, da directiva, e do artigo 81.° CE.

Quanto ao primeiro fundamento assente em violação do dever de fundamentação

Argumentos das partes

37.
    O recorrente começa por recordar liminarmente a derrogação constante do artigo 7.°, n.° 5, da directiva, sustentando que a Comissão, na decisão, se limitou a recusar esta derrogação pelo facto de esta só poder ser aplicada «no respeito pelas regras do Tratado». Deste modo, a Comissão estaria a pôr directamente em causa a legalidade do artigo 7.°, n.° 5, da directiva, à luz do artigo 81.° CE. Ora, a Comissão não teria competência para se pronunciar sobre a legalidade de um acto adoptado pelo Parlamento e pelo Conselho.

38.
    Como a directiva cria, a favor das profissões liberais, uma derrogação que lhes permite proibir ou restringir a publicidade comparativa, incumbiria à Comissão explicar onde é que o artigo 2.°, alínea b), pontos 1 e 3, do código de conduta contém disposições acessórias à proibição propriamente dita de publicidade comparativa que sejam proibidas pelo artigo 81.°, n.° 1, CE.

39.
    A falta dessas explicações constituiria uma violação do artigo 253.° CE.

40.
    A Comissão sustenta que este fundamento não procede.

Apreciação do Tribunal

41.
    Segundo jurisprudência constante, a fundamentação exigida pelo artigo 253.° CE deve deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, a argumentação da instituição, autora do acto, por forma a permitir aos interessados conhecer as razões da medida adoptada e ao Tribunal exercer o seu controlo (acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de Fevereiro de 1996, Bélgica/Comissão, C-56/93, Colect., p. I-723, n.° 86).

42.
    No presente caso, verifica-se que o considerando 42 da decisão é exclusivamente consagrado à questão da interpretação e do efeito do artigo 7.°, n.° 5, da directiva. A Comissão expõe essencialmente, nesse considerando, em primeiro lugar, que esta disposição não prevê uma derrogação automática para as regras que emanam de organizações profissionais, em segundo lugar, que não está provado que o IMR seja uma organização visada por este artigo da directiva e, em terceiro lugar, que o artigo 85.° do Tratado continua a ser aplicável, em qualquer dos casos.

43.
    Assim, o raciocínio da Comissão está expresso de modo claro e inequívoco. As objecções do recorrente não se referem, na realidade, à fundamentação da decisão mas antes à análise da questão de fundo do processo (v., neste sentido, o acórdãodo Tribunal de Primeira Instância de 7 de Novembro de 1997, Cipeke/Comissão, T-84/96, Colect., p. II-2081, n.° 47).

44.
    O primeiro fundamento deve, em consequência, ser rejeitado.

Quanto ao segundo fundamento assente em violação do artigo 7.°, n.° 5, da directiva

Argumentos das partes

45.
    O recorrente alega, em primeiro lugar, que, contrariamente às dúvidas formuladas pela Comissão na decisão, o Instituto e, consequentemente o IMR, devem ser equiparados a um organismo ou a uma organização encarregados, pelas legislações dos Estados-Membros, de regulamentar o exercício de uma actividade liberal, na acepção do artigo 7.°, n.° 5, da directiva.

46.
    O recorrente sustenta, a seguir, que a interpretação dada pela Comissão ao n.° 5 do artigo 7.° da directiva priva esta disposição de qualquer efeito e a esvazia de conteúdo. Ao basear-se no artigo 81.° CE, a Comissão poria em causa a possibilidade de proibir a publicidade comparativa para as profissões liberais, possibilidade essa querida, no entanto, pelo legislador.

47.
    Na verdade, a directiva não levantaria qualquer problema de hierarquia das normas em relação ao Tratado. Ao prever a possibilidade de proibição da publicidade comparativa no caso das profissões liberais, o legislador teria tido em consideração o artigo 81.° CE e entendido que essa proibição não era, por si só, contrária a este artigo. Só quando a proibição de publicidade comparativa é utilizada para fins diferentes do interesse geral, por exemplo, em termos discriminatórios, é que haveria lugar à aplicação do artigo 81.° CE.

48.
    A Comissão sustenta que o fundamento invocado pelo recorrente não procede.

Apreciação do Tribunal

49.
    Como a Comissão indicou no considerando 42, segundo parágrafo, da decisão, não há que decidir se o IMR pode ser classificado como um organismo ou organização encarregados, pelas legislações dos Estados-Membros, de regulamentar o exercício de uma actividade liberal, na acepção do artigo 7.°, n.° 5, da directiva.

50.
    Com efeito, ainda que assim fosse, essa disposição de um acto de direito derivado não poderia, segundo o princípio da hierarquia das normas, autorizar a derrogação de uma disposição do Tratado.

51.
    Além disso, o artigo 7.°, n.° 5, da directiva recorda expressamente este princípio. Com efeito, este artigo precisa que os Estados-Membros poderão manter ouintroduzir disposições que proíbam a publicidade comparativa para as profissões liberais, «no respeito pelas disposições do Tratado».

52.
    Ao contrário do que sustenta o recorrente, este raciocínio não leva a privar o artigo 7.°, n.° 5, da directiva de qualquer efeito útil nem a considerá-lo ilegal.

53.
    Com efeito, a aplicação do artigo 81.° CE só pode decorrer de uma análise caso a caso, para apurar se os diferentes pressupostos que a condicionam estão satisfeitos, designadamente tendo em conta as particularidades de aplicação concreta do artigo 7.°, n.° 5, da directiva e as consequências daí decorrentes em cada caso. Ora, não pode excluir-se que resulte dessa análise que o disposto no artigo 81.°, n.° 1, CE não é aplicável.

54.
    Acresce que, mesmo que se admita que o artigo 81.° CE impede os Estados-Membros de utilizar a possibilidade aberta pela directiva, não se pode admitir que esta os autorize a derrogar uma regra do Tratado.

55.
    O segundo fundamento deve, pois, ser rejeitado.

Quanto ao terceiro fundamento assente em violação do artigo 81.° CE

Argumentos das partes

56.
    O recorrente sustenta que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça (acórdãos de 3 de Dezembro de 1974, Van Binsbergen, 33/74, Colect., p. 543; de 28 de Abril de 1977, Thieffry, 71/76, Colect., p. 277; e de 30 de Novembro de 1995, Gebhard, C-55/94, Colect., p. I-4165), as regras deontológicas prosseguem um fim de interesse geral. Dever-se-ia, pois, admitir, por aplicação da regra da razoabilidade, que são indispensáveis e não podem, por isso mesmo, ser abrangidas pelo artigo 81.°, n.° 1, CE.

57.
    Assim, a proibição de publicidade comparativa seria necessária no quadro de uma actividade regulamentada ligada à ordem pública e não afectaria a concorrência. No presente caso, essa proibição decorreria da delicadeza, da dignidade e da necessária cortesia que devem reinar no interior de uma profissão liberal. A proibição permitiria garantir o respeito da ética que se impõe nas profissões regulamentadas, cujos membros exercem uma actividade ligada à ordem pública.

58.
    Numa profissão como a que ora está em causa, o sucesso deveria ser função do mérito muito mais do que da atracção publicitária, que favoreceria os mandatários que têm maior poder financeiro.

59.
    Estes princípios estariam aliás na origem da proibição de publicidade comparativa para as profissões liberais constante do artigo 7.°, n.° 5, da directiva. Na verdade, as prestações correspondentes a estas profissões, que se inserem num conjunto complexo, não seriam, na maioria dos casos, objectivamente comparáveis.

60.
    O recorrente observa, por último, que a proibição de publicidade comparativa entre mandatários só teria um alcance marginal. Constituiria, com efeito, uma excepção, limitada, ao princípio da liberdade de publicidade, tendo unicamente em vista evitar que esta última se torne desleal e enganosa.

61.
    A Comissão sustenta que o artigo 2.°, alínea b), do código de conduta proíbe a publicidade comparativa, tanto no ponto 1 como no ponto 3, constituindo desse modo uma restrição da concorrência.

Apreciação do Tribunal

62.
    Importa salientar, liminarmente, que o recorrente não contesta a determinação do mercado em causa nem o facto de o comércio entre Estados-Membros ser afectado, nem a sua classificação como uma associação de empresas na acepção do artigo 81.°, n.° 1, CE, nem a do código de conduta como uma decisão de uma associação de empresas, para efeitos deste artigo.

63.
    No quadro do presente recurso, só está, portanto, em discussão a questão de saber se as disposições controvertidas do artigo 2.° do código de conduta, ao proibirem a publicidade comparativa entre mandatários reconhecidos, constituem restrições da concorrência na acepção do artigo 81.°, n.° 1, CE.

64.
    Deste ponto de vista, não se pode admitir que regras que organizam o exercício de uma profissão, pelo simples facto de serem classificadas como «deontológicas» pelos organismos competentes, fiquem, por princípio, fora do âmbito de aplicação do artigo 81.°, n.° 1, CE.

65.
    Só a análise caso a caso permite apreciar a validade dessa regra à luz desta disposição do Tratado, tendo designadamente em atenção o seu impacto sobre a liberdade de acção dos membros da profissão e sobre a organização desta, bem como sobre os beneficiários dos serviços em causa.

66.
    Além disso, a jurisprudência citada pelo recorrente em apoio da sua tese não é pertinente. Com efeito, os acórdãos em causa dizem respeito ao princípio da liberdade de estabelecimento e de livre prestação de serviços. Deles se extrai que as regras deontológicas em vigor num Estado-Membro que prosseguem um fim de interesse geral se aplicam aos profissionais que vêm exercer a sua actividade no território desse Estado, sem infringir esses princípios. Em contrapartida, daí nada se pode deduzir relativamente à aplicabilidade do artigo 81.° CE ao presente caso.

    

67.
    Aliás, quando os autores do Tratado CE quiseram excluir determinadas actividades da aplicação das regras da concorrência ou aplicar-lhes um regime específico, fizeram-no de modo expresso. É o caso da produção e do comércio dos produtos agrícolas (artigo 36.° CE) (acórdão do Tribunal de Justiça de 30 de Abril de 1986,Asjes e o., 209/84 a 213/84, Colect., p. 1425, n.° 40) ou da produção e do comércio de armas e de material de guerra (artigo 296.° CE).

68.
    Nestas condições, há que examinar se a Comissão teve razão ao entender que as disposições do artigo 2.° do código de conduta condenadas na decisão constituem restrições à concorrência na acepção do artigo 81.°, n.° 1, CE.

69.
    Como resulta nomeadamente dos considerandos 43 e 46 da decisão e do artigo 1.° do seu dispositivo, o artigo 2.°, alínea b), do código de conduta proíbe a publicidade comparativa entre mandatários tanto no ponto 1 como no ponto 3.

70.
    Ora, este ponto 3 não se refere nem à publicidade comparativa nem às relações entre membros do IMR mas unicamente à «menção do nome de uma outra entidade profissional a menos que exista um acordo de colaboração escrito entre o membro e esta entidade». Esta disposição tende, portanto, a evitar que um mandatário invoque indevidamente relações profissionais.

71.
    A Comissão errou, pois, ao considerar que este ponto constituía uma restrição da concorrência e que era, consequentemente, incompatível com o artigo 85.° do Tratado, por proibir a publicidade comparativa entre mandatários. O artigo 1.° da decisão deve, por conseguinte, nesta parte, ser anulado.

72.
    No que respeita à proibição de publicidade comparativa propriamente dita, prevista no artigo 2.°, alínea b), ponto 1, do código de conduta, há que realçar, em primeiro lugar, que a publicidade é um elemento importante da situação concorrencial num determinado mercado, porque permite apreender melhor os méritos de cada um dos operadores, a qualidade das suas prestações e os seus custos.

73.
    Depois, a publicidade comparativa, efectuada em termos leais e segundo modalidades adaptadas, permite, designadamente, aumentar a informação dos utentes e contribuir assim para a escolha, no conjunto da Comunidade, do mandatário reconhecido a que se podem dirigir.

74.
    Portanto, a proibição pura e simples de publicidade comparativa limita as possibilidades dos mandatários mais eficazes de desenvolverem os seus serviços. Tal tem como efeito, nomeadamente, uma cristalização da clientela de cada mandatário reconhecido no interior do mercado nacional.

75.
    A Comissão teve, pois, razão, ao considerar, na decisão, os efeitos favoráveis para a concorrência de uma publicidade comparativa leal e adaptada (considerando 41) e os entraves à concorrência que, inversamente, implica a proibição de qualquer forma de publicidade deste tipo (considerando 43).

76.
    O argumento do recorrente, segundo o qual «o sucesso deve ser função do mérito muito mais do que da atracção publicitária, que favorece os mandatários que têmmaior poder financeiro» não merece acolhimento. Com efeito, basta realçar que este argumento levaria a excluir qualquer forma de publicidade, dado que esta favoreceria os mandatários que têm uma base financeira importante. Ora, resulta do próprio código de conduta, no seu artigo 2.°, alínea a), que os mandatários estão, de modo geral, autorizados a fazer publicidade.

77.
    Além disso, o recorrente sustentou que a proibição de publicidade comparativa assenta na «delicadeza», na «dignidade» e na «necessária cortesia» que devem prevalecer no interior de uma profissão como a que está em causa.

78.
    Porém, sem uma demonstração comprovativa de que a proibição absoluta de publicidade comparativa é objectivamente necessária para preservar a dignidade e a deontologia da profissão em causa, a argumentação do recorrente não é susceptível de abalar a legalidade da decisão.

79.
    Portanto, não se prova que a Comissão tenha cometido um erro ao concluir que uma proibição pura e simples de publicidade comparativa entre mandatários reconhecidos estava sujeita ao disposto no artigo 85.°, n.° 1, do Tratado.

80.
    O pedido de anulação do artigo 1.° da decisão, na parte em que diz respeito ao artigo 2.°, alínea b), ponto 1, do código de conduta deve, portanto, ser julgado improcedente.

Quanto ao pedido de anulação do artigo 1.°, primeiro parágrafo, da decisão, na parte em que se refere ao artigo 5.°, alínea c), do código de conduta

Argumentos das partes

81.
    O recorrente alega violação do Tratado CE e da directiva.

82.
    O recorrente alega que o artigo 5.°, alínea c), do código de conduta corresponde a uma regra de deontologia clássica, que se aplica ao conjunto das profissões liberais.

83.
    Referindo-se à especificidade destas profissões e, em especial, das suas regras deontológicas, reconhecida pela jurisprudência (v. supra, n.° 56), o recorrente sustenta que a disposição em causa não restringe a concorrência.

84.
    Aliás, só seria proibida a «abordagem activa» de um mandatário junto dos clientes de outros mandatários num mesmo processo, o que constituiria uma obrigação deontológica essencial necessária a qualquer profissão liberal, justificada por princípios de delicadeza e lealdade. Esta proibição não afectaria a concorrência, visto que, a pedido do cliente, um novo mandatário poderia intervir por sua conta ou ser colocado em competição com vários mandatários num mesmo processo. Do mesmo modo, qualquer cliente de um mandatário poderia ser destinatário de umaoferta publicitária de outro mandatário, dado que a publicidade é geralmente autorizada.

85.
    A proibição da procura de angariação do cliente de outro mandatário justificar-se-ia tanto no caso de um processo em curso - o que a Comissão admite - como no caso de o processo estar findo. Destinar-se-ia tão só a evitar o desenvolvimento de práticas desleais entre os mandatários reconhecidos, dado que a procura de angariação do cliente de outro mandatário a propósito de um processo em curso ou já findo só é concebível num espírito crítico contrário aos princípios elementares de lealdade e de confraternidade.

86.
    A Comissão contrapõe, no essencial, que a disposição controvertida constitui, pelo menos, um obstáculo a que um mandatário possa oferecer os seus serviços em relação com um caso que já tenha sido tratado e demonstrar as suas competências - o que tornaria mais difícil a aproximação de antigos clientes de outro mandatário.

87.
    A possibilidade, para o cliente, de mudar de mandatário ou de pedir um parecer independente não supriria esta dificuldade, dado que essa possibilidade implica uma iniciativa do cliente, com base apenas no seu próprio parecer, sem o benefício do conselho espontaneamente oferecido por profissionais.

88.
    Aliás, tendo em conta o carácter impreciso da respectiva letra, o artigo 5.°, alínea c), do código de conduta poder-se-ia tornar num obstáculo sério ao estabelecimento de contactos profissionais com os antigos clientes de outros mandatários. Não se trataria apenas, como dá a entender o recorrente, de limitar o direito de um mandatário de disputar um cliente de outro mandatário no mesmo processo.

Apreciação do Tribunal

89.
    Não foi contestado que a Comissão não emitiu reservas em relação ao artigo 5.°, alínea c), do código de conduta, na parte em que este implica uma «proibição de oferecer serviços não solicitados relativamente a casos que estão a ser tratados por outro mandatário» (considerando 37 da decisão).

90.
    Em contrapartida, levantou objecções em relação aos casos cujo tratamento esteja findo.

91.
    Saliente-se desde já que, ao contrário do que se afirma no considerando 37, primeiro período, da decisão, o artigo 5.°, alínea c), do código de conduta não contém uma «proibição de um mandatário se dirigir a um cliente de um outro mandatário [...] quando o tratamento de um processo desse cliente pelo outro mandatário terminou».

92.
    Na verdade, como se pode ver pela própria letra do artigo 5.°, alínea c), do código de conduta, esta disposição só proíbe um mandatário, quando propõe serviços aum cliente de outro mandatário, de trocar impressões com esse cliente sobre um processo findo e, a fortiori, que utilize esse processo para entrar em contacto com esse cliente.

93.
    A Comissão precisou melhor, no entanto, a natureza das suas acusações no segundo parágrafo do considerando 37 da decisão. Refere que «no caso de um mandatário não poder trocar impressões com um cliente potencial sobre um caso específico que já foi tratado por um outro mandatário, dificilmente pode oferecer a esse cliente tratar de novos processos que estejam relacionados com o caso específico e ter mesmo dificuldades para estabelecer qualquer contacto profissional com esse cliente». É em relação a este aspecto que, no artigo 1.° da decisão, a Comissão declara a incompatibilidade do artigo 5.°, alínea c), do código de conduta com o artigo 85.° do Tratado.

94.
    Esta apreciação não merece acolhimento, já que o artigo 5.°, alínea c), do código de conduta não tem o alcance que a Comissão lhe presta.

95.
    Com efeito, como foi dito, este artigo não proíbe a oferta de serviços. Também não proíbe um mandatário de invocar, quando contacta o cliente de um outro mandatário, qualquer elemento respeitante, designadamente, à sua experiência, às suas qualidades, à sua formação ou aos seus preços. Também não impede as trocas de impressões, mesmo sobre um caso específico, se o cliente manifestar o desejo de obter um parecer independente ou revelar a intenção de mudar de mandatário.

96.
    O artigo 5.°, alínea c), do código de conduta só proíbe a troca de pontos de vista com um cliente por iniciativa de um mandatário a propósito de um caso específico findo que tenha sido tratado por outro mandatário, podendo esta proibição ser levantada por esse cliente.

97.
    Nestas condições, a Comissão errou ao afirmar que, devido designadamente a esta disposição, os mandatários «vêem as possibilidades de oferecer os seus serviços a clientes potenciais (nacionais ou estrangeiros) que já foram clientes de um outro mandatário para um caso específico [consideravelmente reduzidas]» (considerando 43 da decisão).

98.
    Na verdade, o objectivo prosseguido pelo artigo 5.°, alínea c), do código de conduta, como resulta do artigo no seu todo, é evitar que, através de uma oferta de serviços a um cliente, um mandatário denigra um colega, contestando a intervenção deste num processo findo.

99.
    Perante o conjunto destes elementos, deve concluir-se que foi com base numa análise errada do artigo 5.°, alínea c), do código de conduta que a Comissão considerou que este texto constituía uma restrição da concorrência na acepção do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado.

100.
    Nestas condições, o artigo 1.° da decisão deve ser anulado na parte em que diz respeito ao artigo 5.°, alínea c), do código de conduta.

Quanto ao pedido subsidiário de anulação do artigo 1.°, segundo parágrafo, da decisão, por só conceder uma isenção temporária

101.
    Tendo em conta quanto precede, o presente pedido subsidiário só tem que ser examinado na parte em que se refere ao artigo 2.°, alínea b), ponto 1, do código de conduta.

102.
    O recorrente invoca três fundamentos baseados, respectivamente, em falta de fundamentação, em violação do artigo 81.°, n.° 3, CE, e em violação do artigo 8.° do Regulamento n.° 17.

Quanto ao primeiro fundamento baseado em falta de fundamentação

103.
    O recorrente alega que a Comissão não explica na sua decisão por que razão deixam de estar satisfeitas as condições da isenção no termo do prazo transitório fixado no artigo 1.°, segundo parágrafo, isto é, em 23 de Abril de 2000.

104.
    Este fundamento não pode ser acolhido.

105.
    Com efeito, no considerando 48 da decisão, a Comissão explicou que a data de 23 de Abril de 2000 tinha sido escolhida pelo facto designadamente de corresponder à data-limite para a transposição da directiva nos direitos nacionais.

106.
    Assim, e em conformidade com o disposto no artigo 253.° CE, a decisão contém uma exposição clara e inequívoca do raciocínio da Comissão.

Quanto ao segundo fundamento baseado em violação do artigo 81.°, n.° 3, CE

Argumentos das partes

107.
    O recorrente observa a título preliminar que, na sua contestação, a Comissão se referiu à posição expressa por vários Estados-Membros na reunião do Comité Consultivo em matéria de Acordos, Decisões e Práticas Concertadas e de Posições Dominantes de 17 de Novembro de 1998. No entanto, e apesar do pedido do recorrente, a Comissão ter-se-ia recusado a apresentar o parecer desse comité, pelo facto de este não ser público. Ora, o Tribunal de Justiça, no seu acórdão de 7 de Junho de 1983, Musique diffusion française e o./Comissão (100/80 a 103/80, Recueil, p. 1825), teria julgado que um parecer como o que está em causa não podia ser lançado na discussão com base no artigo 10.°, n.° 6, do Regulamento n.° 17. Por outras palavras, a Comissão, violando o princípio do contraditório e os direitos da defesa, teria utilizado, nos seus articulados, extractos de um documento que sabia não poder apresentar no Tribunal.

108.
    Todas as referências ao parecer em causa, bem como a afirmação em apoio da qual a Comissão o invocou deveriam, portanto, ser afastadas do debate.

109.
    Quanto ao fundo, o recorrente defende que todas as condições de aplicação do artigo 81.°, n.° 3, CE estão reunidas para a concessão de uma isenção duradoura. Ao recusar essa isenção, a Comissão teria infringido este artigo do Tratado.

110.
    Em primeiro lugar, o artigo 2.°, alínea b), ponto 1, do código de conduta contribuiria para melhorar a distribuição dos serviços em causa e/ou para promover o progresso económico, ao mesmo tempo que reservaria aos utentes uma parte equitativa do lucro daí resultante, na acepção do artigo 81.°, n.° 3, CE.

111.
    A disposição em causa constituiria com efeito uma obrigação deontológica destinada a fazer respeitar a ética e os princípios essenciais que regem uma profissão liberal. O seu objectivo fundamental seria, assim, o de garantir uma melhoria permanente dos serviços prestados pelos mandatários em benefício directo dos clientes.

112.
    A proibição de publicidade comparativa melhoraria a actividade de prestação de serviços dos profissionais que devem consagrar-se, em proveito dos seus clientes, à elaboração dos documentos do pedido de patente europeia e à defesa dos seus clientes nas instâncias do Instituto.

113.
    Na realidade, seria difícil comparar objectivamente prestações fornecidas pelos mandatários devido à sua complexidade. Mesmo em matéria de preços, a comparação seria impossível, dado que estaria em causa uma multiplicidade de factores, para além do simples custo/hora, como por exemplo, a competência, a experiência, etc. Qualquer comparação poderia, por esta razão, ser enganosa e infringir o artigo 3.°-A da directiva.

114.
    Acresce que a perda de energia e de tempo, resultante da vã tentativa de comparação das actividades dos membros do IMR, afectaria a qualidade dos seus serviços e seria susceptível de deformar, no espírito do público, a imagem que estes profissionais dão das instituições que participam no trabalho da Justiça. A publicidade comparativa, a existir, só beneficiaria, finalmente, os mandatários com uma forte posição no mercado e com recursos financeiros importantes, em detrimento dos outros mandatários condenados, nesse caso, a desaparecer.

115.
    A proibição de publicidade comparativa evitaria que os consumidores sofressem o custo dessa publicidade e do tempo passado à procura de elementos de comparação, na prática impossíveis de encontrar.

116.
    Em segundo lugar, a disposição controvertida seria indispensável, na acepção do artigo 81.°, n.° 3, CE, tendo em conta a especificidade da profissão dosmandatários, que «participam num trabalho que se integra no conceito de ordem pública ».

117.
    Em terceiro lugar, a concorrência não seria eliminada em relação a uma parte substancial dos serviços em causa. Com efeito, com excepção da exclusão de certos métodos de publicidade e de oferta de serviços, seria deixada aos membros do IMR liberdade para competirem através de uma série de outros meios.

118.
    Em conclusão, o recorrente observa que a solução adoptada na decisão introduziria, a partir de 23 de Abril de 2000, uma diferenciação entre os mandatários reconhecidos, relativamente aos quais a publicidade comparativa teria que ser admitida, e os profissionais liberais, como os advogados e os consultores em propriedade industrial, relativamente aos quais esse tipo de publicidade continuaria proibido em numerosos Estados-Membros.

119.
    A Comissão sustenta que, na fixação do prazo de uma isenção, dispõe de uma margem de apreciação, relativamente à qual só haveria um controlo jurisdicional limitado (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Julho de 1994, Matra Hachette/Comissão, T-17/93, Colect., p. II-595).

120.
    Respondendo ao argumento do recorrente relativo à referência ao parecer emitido pelo Comité Consultivo em matéria de Acordos, Decisões e Práticas Concertadas e de Posições Dominantes, a Comissão recorda que a não comunicação desse parecer não contraria o princípio do respeito dos direitos da defesa (acórdão Musique diffusion française e o./Comissão, já referido, n.° 36). Além disso, a determinação do prazo de isenção basear-se-ia exclusivamente nas considerações constantes do considerando 48 da decisão.

121.
    No presente caso, a Comissão teria considerado que a isenção até 23 de Abril de 2000, embora limitada no tempo, era suficiente para permitir a adaptação gradual dos mandatários e dos utentes à nova situação.

122.
    A Comissão faz notar que a quase totalidade dos argumentos avançados pelo recorrente para demonstrar que a proibição de publicidade comparativa seria susceptível de satisfazer duravelmente as condições previstas no artigo 81.°, n.° 3, CE diz respeito à primeira condição, ligada a uma melhoria da produção ou da distribuição dos produtos ou à promoção do progresso técnico e económico. Estes argumentos não seriam, no entanto, convincentes. Alguns deles tenderiam a negar o facto de que os mandatários são empresas na acepção do artigo 81.° CE. Outros constituiriam vagos julgamentos de valor que condenariam a própria noção de publicidade comparativa, em relação a todas as profissões, quando o legislador comunitário se pronunciou em sentido oposto; além disso, essas críticas não teriam objecto, tendo em conta as condições rigorosas de legalidade da publicidade comparativa previstas na directiva. Finalmente, outros argumentos seriam dirigidoscontra a publicidade em geral, quando o próprio código de conduta já autoriza certas formas de publicidade.

123.
    No que respeita aos argumentos que contestam mais especificamente o carácter praticável da publicidade comparativa aplicada à profissão dos mandatários reconhecidos - como a dificuldade de comparar os preços de maneira objectiva ou os riscos da publicidade enganosa - a Comissão sustenta que eles encontram resposta nas condições cumulativas estritas que devem estar reunidas para que uma publicidade comparativa seja lícita à luz da directiva.

124.
    Finalmente, a Comissão rejeita a objecção do recorrente a respeito da diferenciação que passaria a existir a partir de 23 de Abril de 2000 entre a situação dos mandatários reconhecidos e a dos outros profissionais liberais. Com efeito, esta diferenciação seria apenas fruto da harmonização incompleta dos direitos nacionais, e não da decisão.

Apreciação do Tribunal

125.
    Resulta do artigo 1.° da decisão que o artigo 85.°, n.° 1, do Tratado foi declarado inaplicável, nos termos do disposto no n.° 3 do mesmo artigo 85.° do Tratado ao artigo 2.°, alínea b), ponto 1, do código de conduta.

126.
    Esta isenção foi concedida até 23 de Abril de 2000.

127.
    A argumentação do recorrente visa demonstrar que a disposição em causa do código de conduta preenche as condições para beneficiar de uma isenção.

128.
    Porém, tendo em conta que a decisão da Comissão se pronuncia nesse sentido, essa argumentação é ineficaz. A contestação do recorrente só pode ser dirigida ao prazo dessa isenção.

129.
    Relativamente a este aspecto, importa recordar que o prazo por que é concedida uma isenção deve ser suficiente para permitir aos beneficiários realizar os benefícios que a justificam (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Setembro de 1998, European Night Services e o./Comissão, T-374/94, T-375/94, T-384/94 e T-388/94, Colect., p. II-3141, n.° 230).

130.
    No caso vertente, o benefício principal identificado na decisão consiste em garantir uma fase de transição em condições razoáveis. Para este efeito, foi fixada a data de 23 de Abril de 2000, que corresponde ao termo do prazo para transposição da directiva.

131.
    Ora, o recorrente não avançou nenhum argumento específico para demonstrar que, ao escolher esta data, posterior em mais de um ano à adopção da decisão, a Comissão teria cometido um erro manifesto de apreciação.

132.
    Este fundamento não merece, pois, acolhimento.

133.
    Há que realçar, por outro lado, que a Comissão, na contestação, se serviu como argumento de um documento que sabia não poder ser comunicado ao recorrente. Ora, se é verdade que a não comunicação do parecer emitido pelo Comité Consultivo em matéria de Acordos, Decisões e Práticas Concertadas e de Posições Dominantes não contraria o princípio do respeito dos direitos da defesa na fase administrativa de um procedimento de aplicação do artigo 81.° CE (acórdão Musique diffusion française e o./Comissão, já referido, n.° 36), já não pode ser admitida sem ofensa do princípio do contraditório, salvo circunstâncias excepcionais, a invocação por uma parte, em apoio das suas pretensões, num processo judicial, de um documento que não pode juntar aos autos.

134.
    Decorre, porém, das considerações precedentes que, não sendo esse documento necessário ao julgamento do presente fundamento, não há que retirar qualquer conclusão desta asserção.

Quanto ao terceiro fundamento baseado em violação do artigo 8.° do Regulamento n.° 17

135.
    O recorrente sustenta que a Comissão violou o artigo 8.° do Regulamento n.° 17. Com efeito, apesar de ter declarado expressamente que estavam reunidas as condições de aplicação do artigo 85.°, n.° 3, do Tratado, só teria concedido a isenção provisoriamente, sem possibilidade de renovação.

136.
    Nos termos do disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 8.° do Regulamento n.° 17, uma decisão de isenção «[só] será concedida por um período determinado» e «pode ser renovada a pedido, caso as condições de aplicação do n.° 3 do artigo 85.° do Tratado continuem a ser preenchidas».

137.
    No caso ora em apreço, a isenção foi concedida até 23 de Abril de 2000 e nada impedia o recorrente de solicitar à Comissão a sua renovação.

138.
    Este fundamento deve, pois, ser julgado improcedente.

Quanto às despesas

139.
    Nos termos do artigo 87.°, n.° 3, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, o Tribunal pode determinar que as despesas sejam repartidas entre as partes, se cada parte obtiver vencimento parcial.

140.
    No presente caso, o Tribunal considera que há que condenar cada uma das partes a suportar as suas próprias despesas, incluindo as do processo de medidas provisórias.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

decide:

1)    O artigo 1.° da Decisão 1999/267/CE da Comissão, de 7 de Abril de 1999, relativa a um processo de aplicação do artigo 85.° do Tratado CE [IV/36.147 - Código de conduta do IMR (IEP)] é anulado na parte respeitante ao artigo 2.°, alínea b), ponto 3, e ao artigo 5.°, alínea c), do código de conduta do Instituto dos mandatários reconhecidos junto da Organização Europeia de Patentes.

2)    O recurso é rejeitado quanto ao mais.

3)    Cada uma das partes suportará as suas próprias despesas, incluindo as do processo de medidas provisórias.

Meij
Potocki
Pirrung

Proferido em audiência pública no Luxemburgo em 28 de Março de 2001.

O secretário

O presidente

H. Jung

A. W. H. Meij


1: Língua do processo: francês.