ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)
14 de Outubro de 1999 (1)
«Política agrícola comum Ajuda alimentar Processo de concurso
Pagamento aos adjudicatários em frutas diferentes das especificadas no aviso de
concurso»
Nos processos apensos T-191/96 e T-106/97,
CAS Succhi di Frutta Spa, sociedade de direito italiano, com sede em Castagnaro
(Itália), representada por Alberto Miele, advogado no foro de Pádua, Antonio
Tizzano e Gian Michele Roberti, advogados no foro de Nápoles, e Carlo Scarpa,
advogado no foro de Veneza,
contra
Comissão das Comunidades Europeias , representada por Paolo Ziotti, membro do
Serviço Jurídico, na qualidade de agente, assistido por Alberto Dal Ferro, advogado
no foro de Vicenza, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Carlos
Gómez de la Cruz, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,
que tem por objecto um pedido de anulação das Decisões da Comissão C(96) 2208,
de 6 de Setembro de 1996, (processo T-191/96), que altera a decisão de 14 de
Junho de 1996, e C(96) 1916, de 22 de Julho de 1996 (processo T-106/97), relativas
ao fornecimento de sumos de frutas e doces de frutas destinados às populações da
Arménia e do Azerbaijão, previsto no Regulamento (CE) n.° 228/96,
O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Segunda Secção),
composto por: A. Potocki, presidente, C. W. Bellamy e A. W. H. Meij, juízes,
secretário: H. Jung,
vistos os autos e após a audiência de 10 de Fevereiro de 1999,
profere o presente
Acórdão
Enquadramento jurídico, matéria de facto e tramitação processual
- 1.
- Em 4 de Agosto de 1995, o Conselho adoptou o Regulamento (CE) n.° 1975/95,
relativo a acções de fornecimento gratuito de produtos agrícolas às populações da
Geórgia, Arménia, Azerbaijão, Quirguizistão e Tajiquistão (JO L 191, p. 2, a seguir
«Regulamento n.° 1975/95»). Os dois primeiros considerandos deste regulamento
referem «que é conveniente fornecer produtos agrícolas à Geórgia, à Arménia, ao
Azerbaijão, ao Quirguizistão e ao Tajiquistão, para melhorar as condições de
abastecimento tendo em conta a diversidade das situações locais sem comprometer
a evolução no sentido do respeito das regras de mercado», e que «a Comunidade
dispõe de produtos agrícolas armazenados na sequência de medidas de intervenção
e que, a título excepcional, é conveniente escoar prioritariamente esses produtos
para a realização da acção prevista».
- 2.
- Nos termos do artigo 1.° do Regulamento n.° 1975/95:
«Serão efectuadas, nas condições fixadas pelo presente regulamento, acções de
fornecimento gratuito a favor da Geórgia, Arménia, Azerbaijão, Quirguizistão e
Tajiquistão de produtos agrícolas a determinar, disponíveis na sequência de
medidas de intervenção; em caso de indisponibilidade temporária dos produtos de
intervenção, estes podem ser mobilizados no mercado comunitário a fim de
respeitar os compromissos da Comunidade.»
- 3.
- O artigo 2.° do Regulamento n.° 1975/95 dispõe:
«1. Os produtos serão fornecidos no estado em que se encontrem ou após
transformação.
2. As acções podem igualmente dizer respeito a géneros alimentícios
disponíveis ou que possam ser obtidos no mercado mediante o
fornecimento, a título de contraprestação, de produtos provenientes das
reservas de intervenção pertencentes ao mesmo grupo de produtos.
3. Os custos de fornecimento, incluindo os custos de transporte e, se for caso
disso, de transformação, serão determinados por concurso ou, em caso de
urgência ou de dificuldades de transporte por ajuste directo.
...»
- 4.
- Seguidamente, a Comissão adoptou o Regulamento (CE) n.° 2009/95 da Comissão,
de 18 de Agosto de 1995, que estabelece as normas de execução aplicáveis ao
fornecimento gratuito de produtos agrícolas provenientes das existências de
intervenção destinados à Geórgia, à Arménia, ao Azerbaijão, ao Quirguizistão e ao
Tajiquistão previsto no Regulamento (CE) n.° 1975/95 do Conselho (JO L 196,
p. 4; a seguir «Regulamento n.° 2009/95»).
- 5.
- O segundo considerando do Regulamento n.° 2009/95 refere:
«... os fornecimentos gratuitos serão constituídos por produtos agrícolas no seu
estado inalterado provenientes das existências de intervenção e por produtos não
disponíveis em intervenção pertencentes ao mesmo grupo de produtos;... é, pois,
conveniente prever as normas específicas aplicáveis ao fornecimento de produtos
transformados;... é conveniente prever, nomeadamente, que estes fornecimentos
possam ser pagos em matérias-primas provenientes das existências de intervenção.»
- 6.
- O artigo 2.°, n.° 2, do Regulamento n.° 2009/95 dispõe:
«2. O concurso pode incidir na quantidade de produtos a retirar fisicamente das
existências de intervenção a título de pagamento do fornecimento de
produtos transformados pertencentes ao mesmo grupo de produtos no
estádio de entrega a indicar no anúncio de concurso.»
- 7.
- Nos termos do artigo 6.°, n.° 1, alínea e), ponto 1, do Regulamento n.° 2009/95,
para serem válidas, as propostas devem conter, no caso de aplicação do artigo 2.°,
n.° 2, «a quantidade de produtos proposta, expressa em toneladas (peso líquido)
em troca de uma tonelada líquida de produto acabado nas condições e no estádio
de entrega previstos no anúncio de concurso.»
- 8.
- Nos termos do artigo 6.°, n.° 2, do Regulamento n.° 2009/95:
«Podem ser recusadas as propostas que não sejam apresentadas em conformidade
com o presente artigo, que só satisfaçam parcialmente as condições do regulamento
do concurso ou que contenham condições diferentes das previstas no presente
regulamento.»
- 9.
- Nos termos do artigo 15.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2009/95, dos anúncios de
concurso constarão, designadamente:
« as cláusulas e condições complementares,
a definição dos lotes,
...
as principais características físicas e tecnológicas dos diferentes lotes,
...»
- 10.
- Nos termos do artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 2009/95, no caso dos
concursos previstos no artigo 2.°, n.° 2, do do anúncio deve ainda constar:
« o lote ou o grupo de lotes a tomar a cargo a título de pagamento do
fornecimento,
as características do produto transformado a fornecer: natureza, quantidade,
qualidade, acondicionamento, etc.».
- 11.
- A Comissão adoptou seguidamente o Regulamento (CE) n.° 228/96, de 7 de
Fevereiro de 1996, relativo ao fornecimento de sumos de frutas e doces de frutas
destinados às populações da Arménia e do Azerbaijão (JO L 30, p. 18, a seguir
«Regulamento n.° 228/96»).
- 12.
- O primeiro e segundo considerandos do Regulamento n.° 228/96 referem:
«... o Regulamento n.° 1975/95 prevê que as acções de fornecimento de produtos
agrícolas podem dizer respeito a géneros alimentícios disponíveis ou que possam
ser obtidos no mercado mediante o fornecimento, a título de contraprestação, de
produtos disponíveis na sequência de medidas de intervenção;
... de forma a dar resposta a pedidos dos países beneficiários de sumos de frutas
e de doces de frutas, é conveniente abrir concurso para a determinação das
condições mais vantajosas para o fornecimento destes produtos e prever o
pagamento ao adjudicatário em frutas retiradas do mercado na sequência de
operações de retirada, nos termos do disposto no artigo 15.° e 15.°-A do
Regulamento (CEE) n.° 1035/72 do Conselho, de 18 de Maio de 1972, que
estabelece a organização comum de mercado no sector das frutas e produtos
hortícolas (JO L 118, p. 1; EE 3 F5 p. 258), com a última redacção que lhe foi
dada pelo Regulamento (CE) n.° 1363/95 da Comissão (JO L 132, p. 8).»
- 13.
- Dispõe o artigo 1.° do Regulamento n.° 228/96:
«Nos termos do Regulamento (CE) n.° 2009/95 e, nomeadamente, do n.° 2 do seu
artigo 2.°, e em conformidade com as disposições específicas do presente
regulamento, é realizado um concurso relativo ao fornecimento de, no máximo,
1 000 toneladas de sumos de frutas, 1 000 toneladas de sumos de frutas
concentrados e 1 000 toneladas de doces de frutas, como indicado no anexo I.»
- 14.
- O anexo I do Regulamento n.° 228/96 contém os seguintes esclarecimentos:
Lote n.° 1 Produto a fornecer: 500 toneladas de sumo de maçã
Produto a retirar: maçãs
Lote n.° 2 Produto a fornecer: 500 toneladas líquidas de sumo concentrado
de maçã a 50%
Produto a retirar: maçãs
Lote n.° 3 Produto a fornecer: 500 toneladas líquidas de sumo de laranja
Produto a retirar: laranjas
Lote n.° 4 Produto a fornecer: 500 toneladas líquidas de sumo concentrado
de laranja a 50%
Produto a retirar: laranjas
Lote n.° 5 Produto a fornecer: 500 toneladas líquidas de doces de frutas
diversas
Produto a retirar: maçãs
Lote n.° 6 Produto a fornecer: 500 toneladas líquidas de doces de frutas
diversas
Produto a retirar: laranjas.
Para todos os lotes a data de entrega foi fixada em 20 de Março de 1996.
- 15.
- Por carta de 15 de Fevereiro de 1996, a recorrente apresentou uma proposta
relativamente aos lotes n.os 1 e 2, propondo-se retirar em pagamento do
fornecimento dos seus produtos, pelos referidos lotes, 12 500 toneladas e 25 000
toneladas de maçãs.
- 16.
- As sociedades Trento Frutta SpA (a seguir «Trento Frutta») e Loma GmbH (a
seguir «Loma») propuseram-se, respectivamente, retirar 8 000 toneladas de maçãs
pelo lote n.° 1 e 13 500 toneladas de maçãs pelo lote n.° 2. Além disso, a Trento
Frutta referiu que, no caso de não haver maçãs suficientes, estava disposta a
receber pêssegos.
- 17.
- Em 6 de Março de 1996, a Comissão enviou à Azienda di Stato per gli Interventi
nel Mercado Agricolo (organismo de intervenção italiano, a seguir «AIMA»), com
cópia à Trento Frutta, a nota n.° 10663 referindo que tinha adjudicado a esta os
lotes n.os 1, 3, 4, 5 e 6. Nos termos da mesma nota, a Trento Frutta receberia como
pagamento, a título prioritário, as seguintes quantidades de fruta retirada do
mercado:
Lote n.° 1 8 000 toneladas de maçãs ou, em alternativa, 8 000 toneladas de
pêssegos;
Lote n.° 3 20 000 toneladas de laranjas ou, em alternativa, 8 500 toneladas
de maçãs ou 8 500 toneladas de pêssegos;
Lote n.° 4 32 000 toneladas de laranjas ou, em alternativa, 13 000
toneladas de maçãs ou 13 000 toneladas de pêssegos;
Lote n.° 5 18 000 toneladas de maçãs ou, em alternativa, 18 000 toneladas
de pêssegos;
Lote n.° 6 45 000 toneladas de laranjas ou, em alternativa, 18 000toneladas de maçãs ou 18 000 toneladas de pêssegos.
- 18.
- Em 13 de Março de 1996, a Comissão enviou à AIMA a nota n.° 11832
informando-a de que tinha adjudicado o lote n.° 2 à Loma mediante a retirada de
13 500 toneladas de maçãs.
- 19.
- A AIMA, em conformidade com o Regulamento n.° 226/96, adoptou as medidas
necessárias para dar cumprimento às notas n.os 10663 e 11832 da Comissão, já
referidas, através da circular n.° 93/96, de 21 de Março de 1996, que reproduzia o
conteúdo daquelas.
- 20.
- Em 14 de Junho de 1996, a Comissão adoptou a Decisão C(96) 1453, relativa ao
fornecimento de sumos de frutas e doces de frutas destinados às populações da
Arménia e do Azerbaijão, prevista no Regulamento (CE) n.° 228/96 (a seguir
«decisão de 14 de Junho de 1996»). Nos termos do segundo considerando da
referida decisão, após a adjudicação, as quantidades dos produtos em causa
retiradas do mercado eram irrisórias relativamente às quantidades necessárias,
apesar de a campanha de retirada estar praticamente concluída. Era assim
necessário, para levar a bom termo a operação, permitir que as empresas
adjudicatárias que o pretendessem recebessem em pagamento, em lugar de maçãs
e laranjas, outros produtos retirados do mercado em proporções pré-estabelecidas,
as quais reflectem a equivalência da transformação dos produtos em questão.
- 21.
- O artigo 1.° da decisão de 14 de Junho de 1996 dispõe que os produtos retirados
do mercado serão postos à disposição dos adjudicatários (ou seja, a Trento Frutta
e a Loma) a seu pedido, de acordo com os coeficientes de equivalência seguintes:
a) 1 tonelada de pêssegos por 1 tonelada de maçãs,
b) 0,667 toneladas de damascos por 1 tonelada de maçãs,
c) 0,407 toneladas de pêssegos por 1 tonelada de laranjas,
d) 0,270 toneladas de damascos por 1 tonelada de laranjas.
- 22.
- Esta decisão foi dirigida à República Italiana, à República Francesa, à República
Helénica e ao Reino de Espanha.
- 23.
- Em 22 de Julho de 1996, a Comissão adoptou a decisão C(96) 1916, relativa ao
fornecimento de sumos e frutas e doces de frutas destinados às populações da
Arménia e do Azerbaijão, prevista no Regulamento (CE) n.° 228/96 (a seguir
«decisão de 22 de Julho de 1996»). Nos termos do terceiro considerando da
referida decisão, a quantidade disponível de pêssegos e damascos não era suficiente
para terminar a operação, sendo oportuno permitir, além disso, substituir por
nectarinas as maçãs que deviam ser retiradas pelas adjudicatárias.
- 24.
- O artigo 1.° da decisão de 22 de Julho de 1996 dispõe que os produtos retirados
do mercado serão colocados à disposição da Trento Frutta e da Loma a seu
pedido, segundo o coeficiente de equivalência de 1,4 toneladas de nectarinas por
1 tonelada de maçãs.
- 25.
- Esta decisão foi dirigida à República Italiana.
- 26.
- Por recurso interposto para o Tribunale amministrativo regionale del Lazio,
notificado à AIMA em 24 de Julho de 1996, a recorrente pediu a anulação da
circular n.° 93/96 da AIMA, já referida.
- 27.
- Em 26 de Julho de 1996, durante a reunião organizada a seu pedido com os
serviços da Direcção Geral Agricultura da Comissão (DG VI), a recorrente
formulou as suas objecções relativamente à substituição das maçãs e laranjas por
outras frutas autorizada pela Comissão, e obteve cópia da decisão de 14 de Junho
de 1996.
- 28.
- Em 2 de Agosto de 1996, a recorrente enviou à Comissão o relatório técnico n.° 94,
realizado pelo Dipartimento Territorio e Sistemi Agro-Forestali da Universidade
de Pádua, relativo aos coeficientes de equivalência económica de determinadas
frutas para efeitos de transformação em sumo.
- 29.
- Em 6 de Setembro de 1996, a Comissão adoptou a Decisão C(96) 2208, que altera
a decisão da Comissão de 14 de Junho de 1996, relativa ao fornecimento de sumo
de frutas e doces de frutas destinados às populações da Arménia e do Azerbaijão,
prevista no Regulamento (CE) n.° 228/96 (a seguir «decisão de 6 de Setembro de
1996»).Nos termos do segundo considerando desta decisão, a fim de realizar uma
substituição mais equilibrada dos produtos, na totalidade do período de retirada
dos pêssegos, entre as maçãs e laranjas utilizadas para fornecimento de sumos de
frutas às populações do Cáucaso, por um lado, e os pêssegos retirados do mercado
para pagamento dos referidos fornecimentos, por outro, era necessário alterar os
coeficientes fixados na decisão de 14 de Junho de 1996. Os novos coeficientes
seriam aplicáveis unicamente aos produtos que não tivessem ainda sido retirados
pelas adjudicatárias em pagamento dos fornecimentos.
- 30.
- Nos termos do artigo 1.° da decisão de 6 de Setembro de 1996, o artigo 1.°, alíneas
a) e c), da decisão de 14 de Junho de 1996 foi alterado da seguinte forma:
«a) 0,914 toneladas de pêssegos por 1 tonelada de maçãs,
...
c) 0,372 toneladas de pêssegos por 1 tonelada de laranjas.»
- 31.
- Esta decisão foi dirigida à República Italiana, à República Francesa, à República
Helénica e ao Reino de Espanha.
- 32.
- Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 25 de
Novembro de 1996, a recorrente interpôs recurso de anulação da decisão de 6 de
Setembro de 1996. Este processo foi registado sob o n.° T-191/96.
- 33.
- Por despacho de 26 de Fevereiro de 1997, CAS Succhi di Frutta/Comissão
(T-191/96 R, Colect., p. II-211), o presidente do Tribunal de Primeira Instância
indeferiu o pedido de suspensão da execução da decisão de 6 de Setembro de
1996, apresentado pela recorrente em 16 de Janeiro de 1997.
- 34.
- Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 9 de Abril
de 1997, a recorrente interpôs recurso de anulação da decisão de 22 de Julho de
1996, alegando que só recebeu cópia da referida decisão em 30 de Janeiro de 1997,
no âmbito do processo de medidas provisórias. Este processo foi registado sob o
n.° T-106/97.
- 35.
- Por despacho de 20 de Março de 1998, o presidente da Segunda Secção do
Tribunal de Primeira Instância indeferiu o pedido apresentado pela Allione
Industria Alimentare SpA no sentido de ser autorizada a intervir em apoio dos
pedidos da recorrente no processo T-191/96 (Colect., p. II-575).
- 36.
- Por despacho de 14 de Outubro de 1998, o presidente da Segunda Secção do
Tribunal de Primeira Instância ordenou a apensação dos processos T-191/96 e
T-106/97 para efeitos da audiência e do acórdão.
- 37.
- Com base no relatório do juiz relator, o Tribunal de Primeira Instância (Segunda
Secção) decidiu iniciar a fase oral do processo sem instrução. Contudo, convidou
a Comissão a indicar por escrito até à audiência qual era o estado dos stocks
disponíveis nos organismos de intervenção no momento dos factos. A Comissão deu
cumprimento ao solicitado no prazo fixado. A audiência teve lugar em 10 de
Fevereiro de 1999.
Pedidos
- 38.
- No processo T-191/96, a recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:
anular a decisão de 6 de Setembro de 1996, que altera a decisão de 14 de
Junho de 1996;
condenar a Comissão nas despesas.
- 39.
- No processo T-106/97, a recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:
anular a decisão de 22 de Julho de 1996;
condenar a Comissão nas despesas.
- 40.
- Em ambos os processos, a Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:
julgar o recurso inadmissível ou, a título subsidiário, negar provimento ao
mesmo;
condenar a recorrente nas despesas.
Processo T-191/96
Quanto à admissibilidade
Argumentos das partes
- 41.
- A Comissão afirma que o recurso é inadmissível, quer por a decisão de 6 de
Setembro de 1996 não dizer directamente e individualmente respeito à recorrente,
quer por esta não ter qualquer interesse em obter a sua anulação.
- 42.
- A Comissão salienta desde logo que a recorrente não contesta a adjudicação dos
lotes relativamente aos quais apresentou uma proposta. Afirma que o acto
impugnado no processo não previu a substituição de maçãs e laranjas por pêssegos,
mas limitou-se a alterar os coeficientes de equivalência entre as referidas frutas,
dado que esta alteração foi autorizada pela decisão de 14 de Junho de 1996.
- 43.
- Ora, o facto de estes coeficientes de equivalência serem mais ou menos favoráveis
aos adjudicatários só pode dizer individualmente respeito aos mesmos. A situação
da recorrente face à decisão de 6 de Setembro de 1996 em nada difere da de
qualquer outro operador do sector em questão diferente das adjudicatárias da
empreitada (v., designadamente, despacho do Tribunal de Primeira Instância de 29
de Junho de 1995, Cantina cooperativa fra produttori vitivinicoli di Torre di
Mosto/Comissão, T-183/94, Colect., p. II-1941, n.° 49).
- 44.
- A jurisprudência relativa à impugnação de um processo de concurso e,
designadamente, o acórdão do Tribunal de Justiça de 6 de Março de 1979,
Simmenthal/Comissão (92/78, Colect., p. 407), não é relevante. A decisão de 6 de
Setembro de 1996 é um acto independente do anúncio de concurso, adoptado
posteriormente à adjudicação da empreitada, ao qual não traz qualquer alteração.
Efectivamente, foram as próprias concorrentes que propuseram receber em
pagamento uma menor quantidade de maçãs. Nestas circunstâncias, a participação
da recorrente no concurso em questão, não lhe confere qualquer qualidade
particular, em relação a qualquer outra terceira pessoa, face à decisão de 6 de
Setembro de 1996.
- 45.
- Por outro lado, a simples circunstância de um acto ser susceptível de exercer
influência sobre as relações de concorrência existentes no mercado em causa não
basta para se poder considerar que diz directa e individualmente respeito a
qualquer operador económico que se encontre numa relação de concorrência com
o destinatário do mesmo acto (acórdão do Tribunal de Justiça de 10 de Dezembro
de 1969, Eridania/Comissão, 10/68 e 18/68, Colect. 1969-1970, p. 171; Recueil,
p. 459, n.° 7).
- 46.
- Além disso, dado que a decisão impugnada alterou os coeficientes de equivalência
fixados na decisão de 14 de Junho de 1996 no sentido pretendido pela recorrente,
esta não tem qualquer interesse em pedir a sua anulação, uma vez que a anulação
teria por efeito repor os coeficientes anteriores (v. despachos do Tribunal de
Primeira Instância de 15 de Março de 1995, Cantine dei colli Berici/Comissão,
T-6/95 R, Colect., p. II-647, n.° 29, e de 29 de Junho de 1995, Cantine dei colli
Berici/Comissão, T-6/95, ainda não publicado na Colectânea, n.° 46).
- 47.
- Por último, a Comissão salienta que os fundamentos invocados pela recorrente
podiam ter sido dirigidos contra a decisão de 14 de Junho de 1996, que lhe era
mais desfavorável, mas a recorrente não a impugnou nos prazos previstos.
- 48.
- A recorrente afirma que a decisão impugnada lhe diz directamente respeito. A
decisão impugnada diz-lhe também directamente respeito, em primeiro lugar, pelo
facto de ter apresentado uma proposta (acórdão Simmenthal/Comissão, já referido,n.os 25 e 26) e, em segundo lugar, devido ao prejuízo económico extremamente
grave que sofreu pela atribuição aos concorrentes, em pagamento dos
fornecimentos, de frutas alternativas e em quantidade excessiva. Salienta que a
decisão controvertida foi adoptada na sequência de uma reanálise total da situação
efectuada pela Comissão a seu pedido.
- 49.
- A recorrente afirma também que mantém interesse em obter a anulação da decisão
impugnada, mesmo que a adjudicação da empreitada ao seus concorrentes haja
sido executada na íntegra (acórdão Simmenthal/Comissão, já referido, n.° 32).
Apreciação do Tribunal de Primeira Instância
- 50.
- O artigo 173.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 230.° CE)
concede, no quarto parágrafo, às pessoas singulares ou colectivas a possibilidade
de interporem recurso de anulação das decisões de que sejam destinatárias e das
que, embora tomadas sob a forma de regulamento ou de decisão dirigida a outra
pessoa, lhe digam directa e individualmente respeito.
- 51.
- Segundo jurisprudência constante, os sujeitos que não sejam destinatários de uma
decisão só podem afirmar que esta lhes diz individualmente respeito, na acepção
daquela disposição, se a decisão em causa os afectar devido a certas qualidades que
lhes são próprias ou a uma situação de facto que os caracterize em relação a
qualquer outra pessoa e assim os individualize de maneira análoga à do
destinatário (acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Julho de 1963,
Plaumann/Comissão, 25/62, Colect. 1962-1964, p. 279; v., por exemplo, acórdão do
Tribunal de Primeira Instância de 11 de Fevereiro de 1999, Arbeitsgemeinschaft
Deutscher Luftfahrt-Unternehmen e Hapag Lloyd Fluggesellschaft/Comissão,
T-86/96, Colect., p. I-0000, n.° 42, e jurisprudência citada).
- 52.
- No caso presente, é pacífico que a recorrente participou no concurso relativo aos
lotes n.os 1 e 2, e que o lote n.° 1 foi adjudicado à Trento Frutta.
- 53.
- Por outro lado, a Comissão não contesta que a sua nota n.° 10663 de 6 de Março
de 1996, já referida, contém elementos que não correspondem às condições
impostas no anúncio de concurso previsto no Regulamento n.° 228/96, na medida
em que prevê, designadamente, a substituição de maçãs e laranjas por pêssegos
como modo de pagamento dos fornecimentos da Trento Frutta. A referida nota
introduz, por isso, uma alteração às modalidades de pagamento previstas para os
diferentes lotes.
- 54.
- A alteração das modalidades de pagamento previstas para os diferentes lotes foi
confirmada pela decisão de 14 de Junho de 1996 para todos os adjudicatários.
Posteriormente, a recorrente solicitou à Comissão que reanalisasse a referida
decisão. Para esse efeito, teve lugar em 26 de Julho de 1996 uma reunião entre os
serviços da DG VI e a recorrente, na sequência da qual esta enviou à Comissão o
relatório técnico n.° 94 (n.os 27 e 28 supra).
- 55.
- À luz dos novos elementos desta forma levados ao seu conhecimento e da reanálise
de toda a situação, designadamente do nível do preço dos pêssegos no mercado
comunitário verificado pelos seus serviços em meados de Agosto de 1996 (v.
documento de trabalho da DG VI, anexo 11 à contestação), a Comissão adoptou
a decisão controvertida de 6 de Setembro de 1996, que previa novos coeficientes
de equivalência entre, por um lado, pêssegos, e, por outro, maçãs ou laranjas.
- 56.
- Consequentemente, a decisão controvertida deve ser considerada como uma
decisão autónoma, adoptada após solicitação da recorrente, com base em novos
elementos, e que altera as condições do concurso na medida em que prevê, com
coeficientes de equivalência diferentes, a substituição de maçãs e laranjas por
pêssegos como modo de pagamento às adjudicatárias, e isto apesar dos contactos
que tiveram lugar entretanto entre as partes.
- 57.
- Nestas condições, deve considerar-se que a decisão controvertida diz
individualmente respeito à recorrente. Em primeiro lugar, diz-lhe respeito enquanto
concorrente excluída, na medida em que uma das condições importantes do
concurso a relativa ao modo de pagamento dos fornecimentos em questão foi
posteriormente alterada pela Comissão. Efectivamente, um concorrente nesta
situação não é individualmente afectado apenas pela decisão da Comissão que
determina o destino favorável ou desfavorável de cada uma das propostas
apresentadas na sequência do anúncio de concurso (acórdão Simmenthal/Comissão,
já referido, n.° 25). Mantém igualmente um interesse individual em zelar para que
as condições do anúncio de concurso sejam respeitadas na própria fase de execução
do concurso. Efectivamente, a falta de indicação pela Comissão, no anúncio de
concurso, da possibilidade de os adjudicatários receberem frutas diferentes das
previstas em pagamento dos seus fornecimentos, privou a recorrente da
possibilidade de apresentar uma proposta diferente da que tinha apresentado, e de
dispor, assim, das mesmas oportunidades que a Trento Frutta.
- 58.
- Em segundo lugar, nas condições específicas do presente processo, a decisão
controvertida diz individualmente respeito à recorrente pelo facto de ter sido
adoptada na sequência da reanálise de toda a situação, feita a seu pedido e à luz,
designadamente, de dados adicionais que apresentou à Comissão.
- 59.
- A decisão controvertida, diz também directamente respeito à recorrente, uma vez
que a Comissão não deixou qualquer margem de apreciação às autoridades
nacionais no que respeita às modalidades de execução da mesma (v., por exemplo,
acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de Maio de 1971, International Fruit
Company/Comissão, 41/70, 42/70, 43/70 e 44/70, Colect., p. 131, n.os 25 a 28).
- 60.
- Por outro lado, é de rejeitar o argumento assente no facto de a recorrente não ter
impugnado dentro do prazo previsto a decisão de 14 de Junho de 1996, uma vez
que a decisão controvertida não pode ser considerada como acto meramente
confirmativo daquela. Efectivamente, como acima foi declarado, a Comissão, a
pedido da recorrente, aceitou reanalisar a sua decisão de 14 de Junho de 1996, e
a decisão controvertida foi adoptada na sequência da referida reanálise. Além
disso, a decisão controvertida fixa coeficientes de equivalência diferentes e
baseia-se em novos elementos. Nestas condições, o recurso da recorrente não pode
ser julgado inadmissível por esse motivo (v. acórdãos do Tribunal de Primeira
Instância de 3 de Março de 1994, Cortes Jimenez e o./Comissão, T-82/92, ColectFP,
p. II-237, n.° 14, de 15 de Outubro de 1997, IPK/Comissão, T-331/94, Colect.,
p. II-1665, n.° 24, de 8 de Julho de 1998, Aquilino/Conselho, T-130/96,
ColectFP. p. II-1017, n.° 34, e de 21 de Outubro de 1998, Vicente-Nuñes/Comissão,
T-100/96, ColectFP. p. II-1779, n.os 37 a 42).
- 61.
- Improcede igualmente o argumento segundo o qual a recorrente não tem qualquer
interesse em agir uma vez que a anulação da decisão controvertida tem por único
objectivo restabelecer os coeficientes, para ela menos favoráveis, previstos na
decisão de 14 de Junho de 1996.
- 62.
- Efectivamente, para efeitos de apreciação da admissibilidade do presente recurso,
não há que presumir que um acórdão de anulação da decisão de 6 de Setembro
de 1996 terá como único efeito fazer renascer os coeficientes de equivalência
previstos na decisão de 14 de Junho de 1996, tendo em conta, designadamente, a
obrigação da Comissão de adoptar as medidas necessárias à execução do acórdão,
nos termos do artigo 176.° do Tratado CE (actual artigo 233.° CE) (v. acórdãos do
Tribunal de Justiça de 26 de Abril de 1988, Asteris/Comissão, 97/86, 99/86, 193/86
e 215/86, Colect., p. 2181, n.os 27 a 32).
- 63.
- Em qualquer caso, resulta do n.° 32 do acórdão Simmenthal/Comissão, já referido,
que, mesmo na hipótese de ter já sido plenamente executada uma decisão de
adjudicação a favor de outros concorrentes, o proponente mantém interesse em
obter a anulação dessa decisão, quer para obter, da parte da Comissão, uma
reposição da sua situação de forma adequada, quer para levar a Comissão a
introduzir, para o futuro, as modificações adequadas ao regime dos concursos, no
caso de este se verificar contrário a determinadas exigências jurídicas. Esta
jurisprudência pode ser transposta para o presente caso, tanto mais que é pacífico
que as operações referidas no anúncio de concurso em questão não tinham ainda
sido plenamente executadas quando foi adoptada a decisão controvertida.
- 64.
- Daqui resulta que o recurso é admissível.
Quanto ao mérito
- 65.
- Em apoio do pedido de anulação da decisão de 6 de Setembro de 1996, a
recorrente invoca sete fundamentos assentes, respectivamente, em: 1) violação do
Regulamento n.° 228/96 e dos princípios da transparência e da igualdade de
tratamento; 2) violação dos Regulamentos n.os 1975/95 e 2009/95; 3) desvio de
poder; 4) erros manifestos de apreciação; 5) violação do artigo 39.° do Tratado CE
(actual artigo 33.° CE) e do artigo 40.°, n.° 3, do Tratado CE (que passou, após
alteração, a artigo 34.° CE), bem como do Regulamento n.° 1035/72, de 18 de Maio
de 1972, já referido; 6) falta de fundamentação; e 7) inadequação manifesta do
mecanismo de substituição.
- 66.
- Há que analisar o primeiro fundamento, assente em violação do Regulamento
n.° 228/96, bem como dos princípios da transparência e da igualdade de tratamento.
Argumentos das partes
- 67.
- A recorrente afirma que, ao autorizar a adjudicatária a retirar, em pagamento de
fornecimentos, um produto diferente do previsto no Regulamento n.° 228/96, a
Comissão violou o referido regulamento, bem como os princípios da transparência
e da igualdade de tratamento.
- 68.
- A Comissão salienta, desde logo, que o objectivo da regulamentação em causa é
fornecer ajuda humanitária às populações da Arménia e do Azerbaijão utilizando
produtos retirados do mercado pelos organismos de intervenção para apoiar o
preço dos produtos agrícolas. Neste quadro, a possibilidade de substituir as frutas
indicadas no anexo I do Regulamento n.° 228/96 por outras frutas retiradas do
mercado resulta dos primeiro e segundo considerandos do mesmo regulamento,
bem como dos Regulamentos n.os 1975/95 e 2009/95.
- 69.
- Efectivamente, os primeiro e segundo considerandos do Regulamento n.° 228/96,
bem como o segundo considerando do Regulamento n.° 1675/95, prevêem apenas
que as frutas entregues em pagamento aos adjudicatários serão provenientes dos
stocks de frutas retiradas do mercado na sequência de medidas de intervenção, sem
esclarecer que as frutas dadas em pagamento aos adjudicatários devem ser
expressamente referidas no anúncio de concurso. Em especial, o artigo 2.°, n.° 2,
do Regulamento n.° 1975/95, bem como o artigo 2.°, n.° 2, do Regulamento
n.° 2009/95 não impõem que as frutas retiradas dos stocks de intervenção sejam
idênticas às que devem ser fornecidas pelos adjudicatários, mas apenas que devem
pertencer «ao mesmo grupo de produtos».
- 70.
- Aliás, essa obrigação não seria conciliável com as necessidades reais dos Estados
que beneficiam da ajuda em questão. Assim, se um deles tiver necessidade de sumo
de laranja e se não existirem laranjas suficientes retiradas do mercado, é evidente
que os adjudicatários serão pagos com outras frutas. Da mesma forma, em
pagamento de fornecimento dos doces de frutas diversos que são objecto dos lotes
n.os 5 e 6 do Regulamento n.° 228/96, o produto a retirar será laranjas ou maçãs.
- 71.
- A substituição, após o concurso, das frutas a receber em pagamento de modo
algum constitui violação dos princípios da igualdade de tratamento e datransparência, na medida em que não teve qualquer influência sobre o
desenvolvimento do processo de concurso. Efectivamente, os proponentes
concorreram todos em condições idênticas, ou seja, as previstas no Regulamento
n.° 228/96 e no seu anexo I. Dado que a substituição das frutas teve lugar após a
adjudicação, esta não teve a mínima influência no desenvolvimento da operação.
Apreciação do Tribunal
- 72.
- No âmbito da Directiva 71/305/CEE do Conselho, de 26 de Julho de 1971, relativa
à coordenação dos processos de adjudicação de empreitadas de obras públicas (JO
L 185, p. 5; EE 17 F1 p. 9), o Tribunal de Justiça decidiu que, quando uma
entidade adjudicante fixa prescrições no caderno de encargos, o respeito do
princípio da igualdade de tratamento dos concorrentes exige que todas as propostas
sejam conformes com as prescrições, a fim de garantir uma comparação objectiva
entre as propostas (acórdãos do Tribunal de Justiça de 22 de Junho de 1993,
Comissão/Dinamarca, C-243/89, Colect., p. I-3353, n.° 37, e de 25 de Abril de 1996,
Comissão/Bélgica, C-87/94, Colect., p. I-2043, n.° 70). Acresce que o Tribunal de
Justiça decidiu que o procedimento de comparação das propostas deve respeitar,
em todas as suas fases, tanto o princípio da igualdade de tratamento dos
concorrentes como o da transparência, a fim de que todos os concorrentes
disponham das mesmas possibilidades na formulação dos termos das suas propostas
(acórdão Comissão/Bélgica, já referido, n.° 54).
- 73.
- Esta jurisprudência pode ser transposta para o presente caso. Daqui resulta que
a Comissão era obrigada a precisar com clareza no anúncio de concurso o objecto
e as condições do concurso, e a obedecer rigorosamente às condições enunciadas,
a fim de que todos os concorrentes dispusessem das mesmas possibilidades na
formulação das suas propostas. Em especial, a Comissão não podia posteriormente
alterar as condições do concurso e, designadamente, as relativas à proposta a
apresentar, de um modo não previsto no próprio anúncio de concurso, sem violar
o princípio da transparência.
- 74.
- Como se verificou acima, a decisão controvertida permite às adjudicatárias, ou seja,
à Trento Frutta e à Loma, receber em pagamento dos seus fornecimentos produtos
diferentes dos referidos no anúncio de concurso, e, designadamente, pêssegos em
substituição de maçãs e laranjas.
- 75.
- Esta alteração não está prevista no anúncio de concurso tal como resulta do
Regulamento n.° 228/96. Efectivamente, resulta do anexo I do referido
regulamento, interpretado nos termos do artigo 15.°, n.os 1 e 2, do Regulamento
n.° 2009/95 (v. n.os 9 a 13 supra), que apenas os produtos citados, ou seja, no que
respeita aos lotes n.os 1, 2 e 5, maçãs, e, no que respeita aos lotes n.os 3, 4 e 6,
laranjas, podiam ser retirados pelas adjudicatárias em pagamento dos
fornecimentos.
- 76.
- Por outro lado, resulta do artigo 6.°, n.° 1, alínea e), 1), do Regulamento
n.° 2009/95 (v. n.° 7 supra) que, para uma proposta ser válida, deve referir a
quantidade de produtos solicitada pelo concorrente em pagamento do fornecimento
de produtos transformados nas condições previstas no anúncio de concurso.
- 77.
- A substituição de maçãs ou laranjas por pêssegos em pagamento dos fornecimentos
em causa, bem como a fixação de coeficientes de equivalência entre as referidas
frutas, constituem, assim, uma alteração significativa de uma condição essencial do
anúncio do concurso, ou seja, as modalidades de pagamento dos produtos a
fornecer.
- 78.
- Ora, ao contrário do que a Comissão afirma, nenhum dos textos por ela citados,
designadamente, os primeiro e segundo considerandos do Regulamento n.° 228/96,
e o artigo 2.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1975/95 (n.os 3 e 12 supra), autoriza,
mesmo implicitamente, essa substituição. Também não está prevista a substituição
na hipótese adiantada pela Comissão, de as quantidades de frutas nos stocks de
intervenção serem insuficientes e de as frutas de substituição dadas em pagamento
aos adjudicatários pertencerem ao «mesmo grupo de produtos» do dos seus
fornecimentos.
- 79.
- Aliás, a decisão controvertida não apenas prevê a substituição de maçãs e laranjas
por pêssegos, mas fixa também coeficientes de equivalência com referência a
acontecimentos ocorridos posteriormente ao concurso, ou seja, o nível dos preços
das frutas em questão no mercado em meados de Agosto de 1996, apesar de a
tomada em consideração destes elementos, posteriores ao concurso, para
determinar as modalidades de pagamento aplicáveis aos fornecimentos em causa
de modo algum estar prevista no anúncio de concurso.
- 80.
- Por outro lado, os dados fornecidos pela Comissão durante o processo (v. anexo 3
à contestação e a resposta da Comissão às perguntas do Tribunal) não justificam
que, no momento da adopção da decisão controvertida, existisse uma
indisponibilidade de maçãs nos stocks de intervenção susceptível de impedir a
execução das operações visadas pelo anúncio de concurso.
- 81.
- Mesmo pressupondo que tenha existido a nível comunitário uma indisponibilidade
desse tipo de maçãs que pudessem ser retiradas, não é menos verdade que cabia
à Comissão prever, no anúncio de concurso, as condições exactas de substituição
das frutas previstas em pagamento dos fornecimentos em causa, a fim de respeitar
os princípios da transparência e da igualdade de tratamento. Não o tendo feito,
competia à Comissão abrir novo processo de concurso.
- 82.
- Resulta do que antecede que a decisão controvertida viola o anúncio de concurso
previsto no Regulamento n.° 228/96, bem como os princípios da transparência e da
igualdade de tratamento, e que, consequentemente, deve ser anulada sem que haja
necessidade de decidir quanto aos restantes fundamentos invocados pela
recorrente.
Processo T-106/97
- 83.
- Há que analisar a admissibilidade do recurso.
Argumentos das partes
- 84.
- A Comissão afirma que o recurso foi interposto em 9 de Abril de 1997, e, por isso,
após o termo do prazo previsto no artigo 173.°, quinto parágrafo, do Tratado, o
qual começou a correr em 31 de Outubro de 1996.
- 85.
- Efectivamente, a recorrente teve certamente conhecimento do conteúdo da decisão
de 22 de Julho de 1996 na audiência de 31 de Outubro de 1996 no Tribunale
amministrativo regionale del Lazio. Nessa data (e mesmo dez dias antes, ou seja,
em 21 de Outubro de 1996, segundo o requerimento da AIMA), a AIMA juntou
ao processo pendente no referido órgão jurisdicional a nota n.° 29903 da Comissão,
de 23 de Julho de 1996 (anexo 11 à contestação no processo T-106/97). Esta nota
reproduz o conteúdo da decisão de 22 de Julho de 1996 e, em especial, o
coeficiente de equivalência entre maçãs e nectarinas. O texto da referida decisão
foi anexado à mesma.
- 86.
- Aliás, na petição inicial que apresentou no processo T-191/96 (n.° 12), entrada na
Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 25 de Novembro de 1996, a
recorrente afirmou saber que em 22 de Julho de 1996 tinha sido adoptada uma
decisão da Comissão que, relativamente à decisão de 14 de Junho de 1996,
considerava a «possibilidade de substituição» das frutas. A recorrente demonstrou
também que conhecia o conteúdo da decisão de 22 de Julho de 1996, ao referir-se
expressamente, no n.° 23 da petição inicial no processo T-191/96, às «frutas em
questão (maçãs e laranjas, por um lado, pêssegos, damascos e nectarinas, por
outro)».
- 87.
- O facto de a recorrente não ter solicitado uma cópia da nota n.° 29903, de 23 de
Julho de 1996, já referida, no âmbito do processo no Tribunale amministrativo
regionale del Lazio, e de se não ter preocupado em obter comunicação deste
documento, apesar de ter proposto contra a AIMA uma acção relativa ao concurso
em causa, constitui uma negligência grave e não pode ser invocado para justificar
o desrespeito do prazo de recurso no presente processo.
- 88.
- Mesmo supondo que a recorrente não tenha efectivamente tido conhecimento do
texto integral da decisão de 22 de Julho de 1996, deveria, de qualquer forma, tê-lo
solicitado formalmente à Comissão (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de
29 de Maio de 1991, Bayer/Comissão, T-12/90, Colect., p. II-219; Despachos do
Tribunal de Justiça de 5 de Março de 1993, Ferriere Acciaierie Sarde/Comissão,
C-102/92, Colect., p. I-801, n.os 17 e segs., e do Tribunal de Primeira Instância de
10 de Fevereiro de 1994, Frinil/Comissão, T-468/93, Colect., p. II-33, n.os 31 e
segs.).
- 89.
- A recorrente afirma que só teve conhecimento do texto da decisão de 22 de Julho
de 1996 quando a Comissão apresentou a contestação no processo T-191/96, em
30 de Janeiro de 1997.
- 90.
- Na reunião de 26 de Julho de 1996 com os serviços da DG VI, a recorrente
solicitou expressamente informações sobre uma eventual decisão que teria alargado
a possibilidade de substituição das frutas previstas no anúncio de concurso.
Contudo, não recebeu qualquer esclarecimento da parte dos funcionários presentes.
- 91.
- Embora o requerimento da AIMA apresentado no processo que correu no tribunal
administrativo italiano mencionasse, em anexo, a nota n.° 29903, de 23 de Julho de
1996, já referida, a recorrente não recebeu cópia deste documento e não o
solicitou, considerando que se tratava de uma nota análoga às restantes, relativas
à substituição de maçãs e laranjas por pêssegos e damascos. Por outro lado, as
observações da AIMA não continham qualquer referência à decisão de 22 de Julho
de 1996, e a mesma também não foi referida na audiência de 31 de Outubro de
1996.
- 92.
- Por carta de 5 de Setembro de 1997 em resposta a um pedido da recorrente, a
AIMA indicou, aliás, que não encontrava nos seus processos sinais da «decisão que
a Comissão adoptou em 22 de Julho de 1996» (anexo 3 à réplica no processo
T-106/97).
Apreciação do Tribunal
- 93.
- No n.° 12 da petição inicial que apresentou no processo T-191/96, a recorrente
afirmou que, na reunião de 26 de Julho de 1996 (v. n.° 27 supra), tomou
conhecimento de que a Comissão autorizou as adjudicatárias a retirar, em
pagamento dos fornecimentos em causa, frutas diferentes das previstas no anúncio
de concurso, através de duas decisões distintas, datadas, respectivamente, de 14 de
Junho e 22 de Julho de 1996, das quais a segunda, que lhe não foi comunicada,
teria «ainda alargado a possibilidade de substituição».
- 94.
- Daqui resulta que, em 26 de Julho de 1996, a recorrente teve conhecimento da
adopção pela Comissão, em 22 de Julho de 1996, de uma decisão que alargava a
possibilidade de substituição de maçãs e laranjas por outras frutas prevista na
decisão de 14 de Junho de 1996.
- 95.
- Posteriormente, no requerimento que apresentou no Tribunale amministrativo
regionale del Lazio em 21 de Outubro de 1996 (anexo 4 à réplica no processo
T-191/96, a AIMA esclareceu:
«É um facto que os parâmetros de conversão controvertidos entre as frutas (maçãs,
laranjas, pêssegos, damascos e nectarinas) utilizadas em pagamento do preço dos
fornecimentos devido à Trento Frutta e à Loma derivam de decisões comunitárias
(v. notas n.° 24700, de 20.6.96, e n.° 29903, de 23.7.96) que a AIMA devia
necessariamente aplicar, disso informando os interessados.»
- 96.
- Este requerimento refere que a nota da Comissão n.° 29903, de 23 de Julho de
1996, se achava em anexo ao mesmo. É pacífico que a referida nota reproduz o
conteúdo da decisão da Comissão de 22 de Julho de 1996.
- 97.
- A audiência no Tribunale amministrativo regionale del Lazio teve lugar em 31 de
Outubro de 1996.
- 98.
- Daqui resulta que em 31 de Outubro de 1996, o mais tardar, a recorrente tinha
conhecimento, pelo menos, de que a Comissão tinha adoptado uma decisão que
permitia a substituição por nectarinas das frutas previstas em pagamento dos
fornecimentos efectuados pela Trento Frutta e pela Loma, e que o conteúdo desta
decisão estava reproduzido na nota da Comissão n.° 29903, de 23 de Julho de 1996.
- 99.
- Esta conclusão é confirmada pelo facto de, no n.° 23 da petição inicial que
apresentou no processo T-191/96, entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira
Instância em 25 de Novembro de 1996, a recorrente fazer referência à possibilidade
de substituição por nectarinas das frutas referidas no anúncio de concurso.
- 100.
- Mesmo que, conforme afirma, a recorrente não tivesse tido conhecimento do texto
integral da decisão de 22 de Julho de 1996 antes de 30 de Janeiro de 1997, data
da apresentação da contestação no processo T-191/96, à qual se achava anexa uma
cópia da referida decisão, deve recordar-se que, segundo jurisprudência constante
do Tribunal de Justiça, compete àquele que tem conhecimento da existência de um
acto que lhe diz respeito solicitar o respectivo texto integral num prazo razoável
(Despacho Ferriere Acciaierie Sarde/Comissão, já referido, n.° 18).
- 101.
- Ora, no presente processo, não está demonstrado que a recorrente solicitou à
Comissão que lhe fornecesse o texto integral da decisão de 22 de Julho de 1996,
quer após a reunião de 26 de Julho de 1996, quer após a apresentação do
requerimento da AIMA no Tribunale amministrativo regionale del Lazio em 21 de
Outubro de 1996, quer ainda após a audiência no referido órgão jurisdicional em
31 de Outubro de 1996.
- 102.
- Nestas circunstâncias, a recorrente não pode afirmar que o início do prazo de
recurso deve ser fixado em 30 de Janeiro de 1997. Efectivamente, resulta do que
antecede que foi ultrapassado muito antes desta data o prazo razoável para
solicitar o texto integral da decisão de 22 de Julho de 1996.
- 103.
- Daqui resulta que o recurso, que foi interposto em 9 de Abril de 1997, deve ser
considerado extemporâneo e, consequentemente, julgado inadmissível.
Quanto às despesas
- 104.
- Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo,
a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.
Nos termos do artigo 87.°, n.° 3 do Regulamento de Processo, o Tribunal pode
determinar que as despesas sejam repartidas ou que cada uma das partes suporte
as suas próprias despesas se cada parte obtiver vencimento parcial, ou perante
circunstâncias excepcionais.
- 105.
- Tendo a Comissão sido vencida no processo T-191/96 e a recorrente requerido a
sua condenação, há que condená-la nas despesas do referido processo. No que
respeita ao pedido de medidas provisórias no processo T-191/96 R, o Tribunal, à
luz do despacho do presidente do Tribunal de 26 de Fevereiro de 1997, considera
que há que ordenar que cada parte suporte as suas próprias despesas.
- 106.
- Em contrapartida, tendo a recorrente sido vencida no processo T-106/97, e tendo
a Comissão requerido a sua condenação, há que condená-la nas despesas
correspondentes.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)
decide:
1) É anulada a Decisão C (96) 2208 da Comissão, de 6 de Setembro de 1996.
2) É julgado inadmissível o recurso no processo T-106/97.
3) A Comissão suportará as despesas no processo T-191/96. Cada uma das
partes suportará as suas próprias despesas no processo T-191/96 R. A
recorrente suportará as despesas relativas ao processo T-106/97.
Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 14 de Outubro de 1999.
O secretário
O presidente
H. Jung
A. Potocki