Language of document : ECLI:EU:T:2019:434

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção alargada)

19 de junho de 2019 (*)

«Auxílios de Estado — Auxílios individuais a favor do complexo do Nürburgring para a construção de um parque de diversões, hotéis e restaurantes, bem como para a organização de corridas de automóveis — Decisão que declara os auxílios incompatíveis com o mercado interno — Decisão que declara que o reembolso dos auxílios declarados incompatíveis não afeta o novo proprietário do complexo do Nürburgring — Recurso de anulação — Inexistência de afetação substancial da posição concorrencial — Inadmissibilidade — Decisão que declara a inexistência de auxílio de Estado no termo da fase de análise preliminar — Recurso de anulação — Parte interessada — Interesse em agir — Admissibilidade — Violação dos direitos processuais — Inexistência de dificuldades que exijam a abertura de um procedimento formal de investigação — Denúncia — Venda dos ativos dos beneficiários dos auxílios de Estado declarados incompatíveis — Processo de concurso aberto, transparente, não discriminatório e incondicional — Exame diligente e imparcial — Dever de fundamentação»

No processo T‑353/15,

NeXovation, Inc., com sede em Hendersonville (Estados-Unidos), representada inicialmente por A. von Bergwelt, F. Henkel e M. Nordmann e, em seguida, por A. von Bergwelt e M. Nordmann, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por L. Flynn, T. Maxian Rusche e B. Stromsky, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto um pedido, nos termos do artigo 263.o TFUE, de anulação parcial da Decisão (UE) 2016/151 da Comissão, de 1 de outubro de 2014, relativa ao auxílio estatal SA.31550 (2012/C) (ex 2012/NN) concedido pela Alemanha ao Nürburgring (JO 2016, L 34, p. 1),

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção alargada),

composto por: I. Pelikánová, presidente, V. Valančius, P. Nihoul, J. Svenningsen e U. Öberg (relator), juízes,

secretário: N. Schall, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 30 de janeiro de 2018,

profere o presente

Acórdão

I.      Antecedentes do litígio

1        O complexo do Nürburgring (a seguir «Nürburgring»), situado no Land alemão da Renânia‑Palatinado, inclui um autódromo, um parque de diversões, hotéis e restaurantes.

2        Entre 2002 e 2012, os proprietários do Nürburgring (a seguir «vendedores»), a saber, as empresas públicas Nürburgring GmbH, Motorsport Resort Nürburgring GmbH e Congress‑ und Motorsport Hotel Nürburgring GmbH, beneficiaram, principalmente por parte do Land da Renânia‑Palatinado, de medidas de apoio para a construção de um parque de diversões, hotéis e restaurantes, bem como para a organização de corridas de Fórmula 1.

A.      Procedimento administrativo e venda dos ativos do Nürburgring

3        Por carta de 21 de março de 2012, a Comissão Europeia notificou a República Federal da Alemanha da sua decisão de dar início ao procedimento formal de investigação, nos termos do artigo 108.o, n.o 2, TFUE, relativamente às diferentes medidas de apoio implementadas entre 2002 e 2012 a favor do Nürburgring. Mediante esta decisão, cujo resumo foi publicado no Jornal Oficial da União Europeia (JO 2012, C 216, p. 14), a Comissão convidou as partes interessadas a apresentarem as suas observações sobre as medidas em causa.

4        Devido à concessão de medidas de apoio adicionais, notificadas pela República Federal da Alemanha à Comissão, esta última decidiu estender o procedimento formal de investigação a essas novas medidas. A decisão foi notificada à República Federal da Alemanha por carta de 7 de agosto de 2012. Mediante esta decisão, cujo resumo foi publicado no Jornal Oficial da União Europeia (JO 2012, C 333, p. 1), a Comissão convidou as partes interessadas a apresentarem as suas observações sobre as novas medidas.

5        Em 24 de julho de 2012, o Amtsgericht Bad Neuenahr‑Ahrweiler (Tribunal de Primeira Instância de Bad Neuenahr‑Ahrweiler, Alemanha) decretou a insolvência dos vendedores. Iniciou um processo de insolvência sem inibição a 1 de novembro de 2012. Foi decidido proceder à venda dos ativos dos vendedores (a seguir «venda dos ativos do Nürburgring»). Os vendedores designaram o auditor KPMG AG como consultor jurídico e financeiro.

6        Em 1 de novembro de 2012, a gestão do Nürburgring foi confiada à Nürburgring Betriebsgesellschaft mbH, uma filial detida a 100 % por um dos vendedores, a Nürburgring GmbH, constituída pelos administradores designados pelo Amtsgericht Bad Neuenahr‑Ahrweiler (Tribunal de Primeira Instância de Bad Neuenahr‑Ahrweiler).

7        Em 15 de maio de 2013, foi lançado um concurso para a venda dos ativos do Nürburgring (a seguir «processo de concurso»).

8        Em 23 de maio de 2013, a Comissão comunicou à República Federal da Alemanha e aos administradores de insolvência os critérios pelos quais se devia reger o processo de concurso a fim de excluir os elementos de auxílios de Estado e informou‑os da obrigação do adquirente selecionado de proceder ao reembolso das vantagens que eventualmente lhe teriam sido conferidas. Desde outubro de 2012, tem havido discussões a este respeito entre a Comissão, a República Federal da Alemanha e os administradores.

9        O processo de concurso desenrolou‑se do seguinte modo:

–        em 14 de maio de 2013, foi anunciado o lançamento do processo de concurso através de um comunicado de imprensa emitido por um dos administradores;

–        Em 15 de maio de 2013, a KPMG publicou no Financial Times, no Handelsblatt e no sítio Internet do Nürburgring um convite à manifestação de interesse;

–        70 empresas manifestaram interesse;

–        por carta de 19 de julho de 2013, os investidores interessados receberam documentos relativos ao Nürburgring e foram convidados a apresentar uma proposta indicativa, para a totalidade dos ativos, para certos grupos de ativos ou para ativos individuais;

–        o prazo para apresentação de uma proposta indicativa foi sucessivamente fixado em 12 de setembro de 2013, por carta de 19 de julho de 2013, e em 26 de setembro de 2013, por carta de 12 de setembro de 2013; cada uma dessas cartas precisava que as também se teriam em conta as propostas apresentadas depois de expirado o prazo;

–        no início do mês de fevereiro de 2014, 24 adquirentes potenciais tinham entregue uma proposta indicativa, entre eles a recorrente, a NeXovation, Inc., uma empresa privada americana que opera nos setores das tecnologias da informação, produtos de grande consumo, energia e automóvel;

–        para os adquirentes potenciais convidados para a fase seguinte do processo de concurso, entre os quais a recorrente, o prazo para apresentação de propostas de confirmação, que deviam ser integralmente financiadas e incluir um acordo pré‑negociado para a aquisição dos ativos, foi sucessivamente fixado em 11 de dezembro de 2013, por carta de 17 de outubro de 2013, e em 17 de fevereiro de 2014, por carta de 17 de dezembro de 2013; esta última carta indicava que também seriam tidas em conta as propostas apresentadas depois de expirado o prazo, mas precisava, no entanto, que os vendedores poderiam decidir pouco depois do termo do prazo para a apresentação das propostas a identidade do adquirente selecionado;

–        treze adquirentes potenciais apresentaram uma proposta de confirmação, quatro dos quais apresentaram uma proposta relativa a todos os ativos, a saber, a Capricorn Nürburgring Besitzgesellschaft GmbH (a seguir «Capricorn» ou «adquirente»), um segundo proponente (a seguir «proponente 2»), a recorrente e um quarto adquirente potencial;

–        nos termos das cartas enviadas aos investidores em causa em 19 de julho e 17 de outubro de 2013, os investidores deviam ser selecionados tendo em conta princípios de maximização do valor de todos os ativos, por um lado, e de segurança da transação, por outro; em aplicação destes critérios, foram tomadas em consideração, na última fase do processo de concurso, as propostas do proponente 2 e da Capricorn, que, por um lado, propunham a aquisição de todos os ativos do Nürburgring e, por outro, tinham feito prova da solidez financeira das suas propostas respetivas em 7 e 11 de março de 2014. Foram negociados em paralelo projetos de contrato de cessão com esses dois proponentes;

–        em 11 de março de 2014, no âmbito do processo de insolvência dos vendedores, a comissão de credores dos vendedores aprovou a venda dos ativos do Nürburgring à Capricorn, cuja proposta ascendia a 77 milhões de euros, ao passo que a proposta do proponente 2 se situava entre 47 e 52 milhões de euros.

10      Em 10 de abril de 2014, a recorrente apresentou uma denúncia à Comissão, pelo facto de o processo de concurso não ter sido aberto, transparente, não discriminatório e incondicional e não ter conduzido à venda dos ativos do Nürburgring a um preço de mercado, na medida em que esses ativos tinham sido cedidos a um proponente local cuja proposta era inferior à sua e tinha sido favorecido no processo de concurso. Assim, segundo a recorrente, a Capricorn tinha recebido um auxílio, correspondente à diferença entre o preço que devia pagar para adquirir os ativos do Nürburgring e o preço de mercado desses mesmos ativos, e assegurado a continuidade das atividades económicas dos vendedores, pelo que a ordem de recuperação dos auxílios recebidos pelos vendedores devia estender‑se à Capricorn.

B.      Decisões impugnadas

11      Em 1 de outubro de 2014, a Comissão adotou a Decisão (UE) 2016/151, relativa ao auxílio estatal SA.31550 (2012/C) (ex 2012/NN) concedido pela Alemanha ao Nürburgring (JO 2016, L 34, p. 1), e, em 13 de abril de 2015, foi publicada uma retificação à referida decisão no seu sítio Internet (a seguir, em conjunto, «decisão final»).

12      No artigo 2.o da decisão final, a Comissão declarou ilegais e incompatíveis com o mercado interno certas medidas de apoio a favor dos vendedores (a seguir «auxílios aos vendedores»).

13      A Comissão decidiu, no artigo 3.o, n.o 2, da decisão final, que uma eventual recuperação dos auxílios aos vendedores não afetaria a Capricorn nem as suas filiais (a seguir «primeira decisão impugnada»).

14      No artigo 1.o, último travessão, da decisão final, a Comissão declarou que a venda dos ativos do Nürburgring à Capricorn não constituía um auxílio de Estado (a seguir «segunda decisão impugnada»).

15      Com efeito, a Comissão considerou que o processo de concurso tinha sido levado a cabo de modo aberto, transparente e não discriminatório, que esse processo tinha atingido um preço de venda conforme com o mercado, e que não havia continuidade económica entre os vendedores e o adquirente.

II.    Tramitação processual e pedidos das partes

16      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral de 26 de junho de 2015, a recorrente interpôs o presente recurso.

17      Por carta de 15 de outubro de 2015, a Comissão apresentou um pedido de tradução na língua de processo de alguns anexos da petição.

18      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 3 de novembro de 2015, os vendedores requereram a sua intervenção no presente processo em apoio dos pedidos da Comissão. Por Despacho de 18 de abril de 2016, o presidente da Oitava Secção do Tribunal Geral admitiu essa intervenção.

19      Por carta apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 3 de maio de 2016, os vendedores informaram o Tribunal Geral de que desistiam do seu pedido de intervenção.

20      Por Despacho de 6 de julho de 2016 do presidente da Oitava Secção do Tribunal Geral, os vendedores foram cancelados do registo do Tribunal Geral como intervenientes e condenados a suportar as suas próprias despesas e as das outras partes no que dizia respeito à sua intervenção.

21      Por decisão do presidente do Tribunal Geral de 3 de outubro de 2016, foi designado um novo juiz‑relator e o processo atribuído à Primeira Secção do Tribunal Geral.

22      Em 31 de julho de 2017, o Tribunal Geral, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, formulou uma questão escrita à Comissão, convidando‑a a responder‑lhe por escrito. A Comissão apresentou as suas observações em resposta a esta questão em 6 de setembro de 2017.

23      Sob proposta da Primeira Secção, o Tribunal Geral decidiu, nos termos do artigo 28.o do Regulamento de Processo, remeter o processo a uma formação de julgamento alargada.

24      Em 29 de novembro de 2017, o Tribunal Geral (Primeira Secção alargada) decidiu dar início à fase oral do processo e, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o do Regulamento de Processo, convidou as partes a apresentarem determinados documentos e formulou‑lhes questões escritas convidando‑as a responder‑lhes por escrito. As partes apresentaram as suas observações em resposta em 14 de dezembro de 2017 e 8 de janeiro de 2018, no que se refere à recorrente, e em 13 e 21 de dezembro de 2017, no que se refere à Comissão.

25      Por requerimento separado apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 24 de janeiro de 2018, a Comissão pediu ao Tribunal Geral, ao abrigo do artigo 130.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, que declarasse que o presente recurso deixou de ter objeto e que já não havia que decidir sobre o mesmo.

26      As partes apresentaram as suas alegações e responderam às questões formuladas pelo Tribunal Geral na audiência de 30 de janeiro de 2018. No mesmo dia, a Comissão apresentou observações sobre o relatório para audiência.

27      Em 6 de março de 2018, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o do Regulamento de Processo, o Tribunal Geral convidou as partes a apresentar determinados documentos e formulou‑lhes questões escritas, convidando‑as a responder‑lhes por escrito. Nos termos do artigo 24.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, o Tribunal Geral convidou igualmente a República Federal da Alemanha a apresentar determinados documentos e formulou‑lhe questões escritas, convidando‑a a responder‑lhes por escrito. As partes e a República Federal da Alemanha apresentaram as suas observações em resposta em 27 de março de 2018 e em 4 e 9 de abril de 2018.

28      Em 18 de maio de 2018, a recorrente apresentou as suas observações sobre o pedido de não conhecimento do mérito apresentado pela Comissão.

29      Em 12 de junho de 2018, a fase oral do processo foi encerrada.

30      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 20 de julho de 2018, a Comissão apresentou, ao abrigo do artigo 113.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, um pedido de reabertura da fase oral do processo. Por decisão do presidente da Primeira Secção alargada do Tribunal Geral de 16 de agosto de 2018, este pedido foi indeferido.

31      No âmbito do processo principal, a recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a primeira e segunda decisões impugnadas;

–        condenar a Comissão nas despesas,

32      No âmbito deste mesmo processo, a Comissão pede que o Tribunal Geral se digne:

–        julgar o recurso, em parte, inadmissível e, em parte, improcedente e, a título subsidiário, negar‑lhe provimento;

–        condenar a recorrente nas despesas.

33      No âmbito do processo incidental, a Comissão pede que o Tribunal Geral se digne declarar que não há que decidir sobre o recurso, sem se pronunciar expressamente quanto às despesas.

34      No âmbito deste mesmo processo, a recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne indeferir o pedido de não conhecimento do mérito apresentado pela Comissão, sem se pronunciar expressamente quanto às despesas.

III. Questão de direito

35      Nas circunstâncias do caso em apreço, há que juntar à análise do mérito o pedido de não conhecimento do mérito apresentado pela Comissão e examiná‑lo conjuntamente com os pedidos de anulação da primeira e segunda decisões impugnadas apresentados pela recorrente no processo principal.

A.      Quanto à admissibilidade do pedido de anulação da primeira decisão impugnada

36      A recorrente visa, antes de mais, obter a anulação da primeira decisão impugnada, pela qual a Comissão, ao determinar que não havia continuidade económica entre os vendedores e o adquirente, decidiu que este não era afetado por uma eventual recuperação dos auxílios aos vendedores.

37      Com efeito, com o seu segundo fundamento, relativo a uma interpretação errada do princípio da continuidade económica, a recorrente alega, nomeadamente, que, uma vez que a venda de ativos do Nürburgring não se realizou ao preço de mercado, por não ter havido um concurso aberto, transparente, não discriminatório e incondicional e não se ter cedido os ativos do Nürburgring ao melhor proponente, existe uma continuidade económica entre vendedores e o adquirente, o que exige que a decisão de recuperação dos auxílios aos vendedores se estenda à Capricorn.

38      A recorrente alega que a primeira decisão impugnada foi adotada na sequência de um procedimento de análise preliminar, e não de um procedimento formal de investigação, dado que as decisões de dar início ao procedimento formal de 21 de março e de 7 de agosto de 2012 não incidiam sobre a questão de saber se tinha sido transferido um auxílio para a Capricorn.

39      Na contestação, a Comissão alegou que o recurso era inadmissível, na medida em que visava contestar a primeira decisão impugnada. Sustentou, nomeadamente, que, tratando‑se de uma decisão conexa e complementar de uma decisão adotada no termo de um procedimento formal de investigação que estabelece a existência de auxílios incompatíveis que devem ser recuperados, a recorrente não podia ser considerada individualmente afetada simplesmente demonstrando que era uma parte interessada, mas devia demonstrar que a sua posição no mercado tinha sido substancialmente afetada pelos auxílios aos vendedores, de modo que se encontrava numa situação de facto que a individualizava de maneira análoga à do destinatário dessa decisão. Ora, a posição da recorrente no mercado não foi afetada de maneira diferente à de outro proponente.

40      Posteriormente, a Comissão concluiu, contudo, que o Tribunal Geral já não tinha de decidir sobre o recurso, incluindo sobre o pedido de anulação da primeira decisão impugnada, com o fundamento de que a recorrente tinha perdido todo o interesse em agir.

41      No caso em apreço, há que começar pela análise da questão prévia de inadmissibilidade especificamente suscitada pela Comissão na contestação no que se refere ao pedido de anulação da primeira decisão impugnada.

42      Em resposta à referida exceção de inadmissibilidade, a recorrente alega principalmente que a sua posição no mercado foi substancialmente afetada pela concessão do auxílio ligado à cessão dos ativos do Nürburgring à Capricorn, dado que foi eliminada, devido à adjudicação desses ativos, tanto do mercado da aquisição como da exploração do Nürburgring.

43      Em primeiro lugar, importa recordar que, no Acórdão de 17 de setembro de 2015, Mory e o./Comissão (C‑33/14 P, EU:C:2015:609, n.o 104), o Tribunal de Justiça declarou que uma decisão relativa à continuidade económica deve ser considerada uma decisão «conexa e complementar» à decisão final relativa aos auxílios em causa que a precede, na medida em que especifica o alcance desta quanto à qualidade de beneficiário dos auxílios em causa e, por conseguinte, quanto à de devedor da obrigação de restituição destes, na sequência de um evento posterior à adoção dessa decisão, como a aquisição por um terceiro dos ativos do beneficiário inicial dos referidos auxílios.

44      No caso em apreço, com a primeira decisão impugnada, a Comissão, ao determinar que não havia continuidade económica entre os vendedores e o adquirente, decidiu que este não era afetado por uma eventual recuperação dos auxílios aos vendedores.

45      Por conseguinte, há que concluir que a primeira decisão impugnada é uma decisão «conexa e complementar» da decisão tomada no termo do procedimento formal de investigação relativo aos auxílios aos vendedores.

46      Em segundo lugar, há que recordar que, nos termos do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE, «[q]ualquer pessoa singular ou coletiva pode interpor, nas condições previstas nos primeiro e segundo parágrafos, recursos contra os atos de que seja destinatária ou que lhe digam direta e individualmente respeito, bem como contra os atos regulamentares que lhe digam diretamente respeito e não necessitem de medidas de execução».

47      Na medida em que a primeira decisão impugnada tem por objeto os auxílios aos vendedores, que foram concedidos sob a forma de auxílios individuais e não ao abrigo de um regime de auxílios, esta não pode ser equiparada a um ato regulamentar, na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE.

48      Ora, segundo jurisprudência constante, os sujeitos que não sejam os destinatários de uma decisão só podem alegar que esta lhes diz individualmente respeito se os afetar devido a determinadas qualidades que lhes são próprias ou a uma situação de facto que os caracteriza em relação a qualquer outra pessoa e, com isso, os individualiza de maneira análoga à do destinatário de uma tal decisão (v. Acórdãos de 15 de julho de 1963, Plaumann/Comissão, 25/62, EU:C:1963:17, p. 223, e de 19 de maio de 1993, Cook/Comissão, C‑198/91, EU:C:1993:197, n.o 20).

49      Em matéria de auxílios de Estado, foram designadamente reconhecidas como individualmente abrangidas por uma decisão da Comissão de encerramento do procedimento formal de investigação, além da empresa beneficiária, as empresas concorrentes desta última que tenham desempenhado um papel ativo no âmbito desse procedimento, desde que a sua posição no mercado seja substancialmente afetada pela medida de auxílio em causa (v. Acórdão de 17 de setembro de 2015, Mory e o./Comissão, C‑33/14 P, EU:C:2015:609, n.o 98 e jurisprudência referida; v., também, neste sentido, Acórdão de 5 de novembro de 2014, Vtesse Networks/Comissão, T‑362/10, EU:T:2014:928, n.o 53 e jurisprudência referida).

50      O critério da afetação substancial permite identificar os concorrentes que um auxílio individualiza de modo a preencherem as condições de admissibilidade tal como enunciadas no Acórdão de 15 de julho de 1963, Plaumann/Comissão (25/62, EU:C:1963:17). Os concorrentes com legitimidade para recorrer são todos aqueles que a decisão faz sobressair de modo especial relativamente a qualquer outra pessoa, individualizando‑os de maneira análoga à do destinatário da decisão impugnada. Assim, a existência de uma afetação substancial da posição de uma parte recorrente no mercado não depende diretamente do montante do auxílio em causa, mas da importância do prejuízo que este auxílio pode causar à referida posição. Tal prejuízo pode variar para os auxílios de um montante similar em função de critérios tais como a dimensão do mercado em causa, a natureza específica do auxílio, a duração do período para o qual foi concedido, o caráter principal ou secundário da atividade afetada para a parte recorrente e as possibilidades de esta contornar os efeitos negativos do auxílio (v. Acórdão de 5 de novembro de 2014, Vtesse Networks/Comissão, T‑362/10, EU:T:2014:928, n.o 41 e jurisprudência referida).

51      Por conseguinte, a mera qualidade de concorrente potencial não basta para conferir a um particular um direito de recurso perante o juiz da União Europeia para contestar uma decisão adotada pela Comissão no termo de um procedimento formal de investigação.

52      No caso em apreço, há que constatar que a recorrente desempenhou um papel ativo no procedimento que antecedeu a adoção da primeira decisão impugnada, na medida em que apresentou uma denúncia em 10 de abril de 2014, por considerar que o processo de concurso era ilegal e a que decisão de recuperação dos auxílios aos vendedores devia estender‑se ao adquirente.

53      Contudo, resulta da jurisprudência referida no n.o 49, supra, que não se pode inferir da simples participação da recorrente no procedimento administrativo que a mesma tem legitimidade para agir. Em todo o caso, a recorrente deve demonstrar que os auxílios aos vendedores eram suscetíveis de afetar substancialmente a sua posição no mercado.

54      No considerando 20 da decisão final, a Comissão indicou que as medidas de apoio aos vendedores diziam respeito ao financiamento da construção e exploração das instalações do Nürburgring. Além disso, nos considerandos 173 a 176 e 178 dessa mesma decisão, observou que os mercados em que a concorrência podia ser distorcida por essas medidas eram os da exploração de autódromos, parques todo‑o‑terreno, parques de diversões, instalações de alojamento, restaurantes, centros de condução segura, escolas de condução, salas multifuncionais, sistemas de pagamento sem numerário, promoção do turismo, desenvolvimento de projetos, construção de imóveis, gestão de empresas e comércio de veículos automóveis ou motociclos (a seguir «mercados relevantes»). Por último, no considerando 180 da referida decisão, a Comissão precisou que os mercados relevantes podiam ser considerados de dimensão europeia.

55      Em resposta a uma das questões formuladas pelo Tribunal Geral no âmbito das medidas de organização do processo adotadas em 29 de novembro de 2017 (v. n.o 24, supra), a recorrente reconheceu que, no momento da apresentação da petição inicial e antes dessa data, não estava presente nos mercados relevantes. Por conseguinte, não dispunha de nenhuma posição nos mercados relevantes suscetível de ser afetada, a fortiori, substancialmente, pelos auxílios aos vendedores.

56      Na medida em que a recorrente defende, em substância, que estaria em condições de adquirir os ativos do Nürburgring e, por conseguinte, de entrar nos mercados relevantes se não tivesse sido discriminada no processo de concurso (v. n.o 10, supra) e que lhe era difícil adquirir ou explorar outros autódromos, tendo em conta a perda de reputação e a publicidade negativa causadas pelo do revés sofrido no processo de concurso, há que salientar que os seus argumentos não podem ser suficientes, perante o juiz da União e à luz da jurisprudência referida nos n.os 49 a 51, supra, para a individualizar relativamente aos vendedores e à primeira decisão impugnada, de tal forma que cumpra os requisitos de admissibilidade tal como enunciados no Acórdão de 15 de julho de 1963, Plaumann/Comissão (25/62, EU:C:1963:17).

57      Daqui decorre que a recorrente não demonstrou que a primeira decisão impugnada lhe dizia individualmente respeito.

58      Ora, importa recordar que os requisitos de admissibilidade de um recurso são cumulativos (Acórdão de 28 de março de 2012, Ryanair/Comissão, T‑123/09, EU:T:2012:164, n.o 199). Assim, sem ter de examinar o interesse da recorrente em pedir a anulação da primeira decisão impugnada nem, a fortiori, o pedido de não conhecimento do mérito formulado pela Comissão baseado na perda, pela recorrente, do seu interesse em requerer a anulação dessa mesma decisão, há que julgar o recurso inadmissível, na parte em que visa a anulação da referida decisão, por falta de afetação individual.

B.      Quanto ao pedido de anulação da segunda decisão impugnada

59      A recorrente visa igualmente obter a anulação da segunda decisão impugnada, pela qual a Comissão declarou que a venda dos ativos do Nürburgring à Capricorn não constituía um auxílio de Estado.

1.      Quanto à admissibilidade e ao pedido de não conhecimento do mérito

60      Na contestação, a Comissão não questionou a admissibilidade do recurso na parte em que diz respeito à segunda decisão impugnada. Não obstante, concluiu posteriormente que o Tribunal Geral já não tinha de se pronunciar sobre o recurso, incluindo sobre o pedido de anulação da segunda decisão impugnada, com o fundamento de que a recorrente tinha perdido todo o interesse em agir. Neste contexto, contestou igualmente a legitimidade para agir da recorrente em relação à segunda decisão impugnada.

61      No caso em apreço, há que começar por examinar se a recorrente tem legitimidade para pedir a anulação da segunda decisão impugnada, antes de analisar em que medida tem e conserva um interesse em obter essa anulação.

62      Quanto à sua legitimidade para agir, a recorrente sustenta que a segunda decisão impugnada lhe diz direta e individualmente respeito. A este propósito e em conformidade com a jurisprudência, a sua qualidade particular de «parte interessada», na aceção do artigo 1.o, alínea h), do Regulamento (CE) n.o 659/1999 do Conselho, de 22 de março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo 108.o [TFUE] (JO 1999, L 83, p. 1), relacionada com o objeto específico do recurso, é suficiente para a individualizar, na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE. Por último, a sua posição no mercado foi substancialmente afetada pelo auxílio concedido ao adquirente no âmbito do processo de concurso.

63      No seu pedido de não conhecimento do mérito, a Comissão alega que a recorrente não pode basear a sua qualidade de parte interessada na sua condição de adquirente potencial dos ativos do Nürburgring, uma vez que, numa carta de 26 de abril de 2016 dirigida à Comissão, a República Federal da Alemanha indicou que a Capricorn tinha pago a totalidade do preço de compra desses ativos e renunciado ao seu direito de resolver o contrato de venda no caso de a Comissão tomar uma decisão de recuperação dos auxílios aos vendedores. A Comissão alega igualmente que a recorrente também não pode basear a sua qualidade de parte interessada na sua condição de concorrente da Capricorn, uma vez que das suas respostas às questões formuladas pelo Tribunal Geral no âmbito das medidas de organização do processo adotadas em 29 de novembro de 2017 (v. n.o 24, supra) se pode deduzir que a recorrente não exercia atividade nos mercados relevantes.

64      No âmbito do processo de fiscalização dos auxílios de Estado deve‑se distinguir, por um lado, a fase de análise preliminar dos auxílios instituída pelo artigo 108.o, n.o 3, TFUE, que tem apenas por objeto permitir à Comissão formar uma primeira opinião sobre a compatibilidade parcial ou total do auxílio em causa, e, por outro, a fase do exame a que se refere o artigo 108.o, n.o 2, TFUE, que se destina a permitir à Comissão obter uma informação completa sobre todos os dados do processo. É apenas no âmbito do procedimento previsto por esta última disposição que o Tratado FUE prevê a garantia processual que consiste na obrigação de a Comissão dar aos interessados a oportunidade de apresentarem as suas observações (Acórdãos de 19 de maio de 1993, Cook/Comissão, C‑198/91, EU:C:1993:197, n.o 22; de 15 de junho de 1993, Matra/Comissão, C‑225/91, EU:C:1993:239, n.o 16; e de 17 de julho de 2008, Athinaïki Techniki/Comissão, C‑521/06 P, EU:C:2008:422, n.o 35).

65      Sempre que, sem iniciar o procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE, a Comissão concluir, através de uma decisão adotada com base no n.o 3 do mesmo artigo, que uma medida estatal não constitui um auxílio incompatível com o mercado interno, os beneficiários dessa garantia processual só podem conseguir que esta seja respeitada se tiverem a possibilidade de impugnar essa decisão perante o juiz da União. Por essas razões, o juiz da União julga admissível um recurso de anulação dessa decisão, interposto por um interessado na aceção do artigo 108.o, n.o 2, TFUE, quando o recorrente pretenda, com a sua interposição, salvaguardar os direitos processuais que lhe confere esta última disposição (Acórdão de 17 de julho de 2008, Athinaïki Techniki/Comissão, C‑521/06 P, EU:C:2008:422, n.o 36).

66      Assim, há que concluir que qualquer parte interessada deve ser considerada direta e individualmente afetada por uma decisão que declare a inexistência de um auxílio no termo da fase de análise preliminar (Acórdão de 28 de março de 2012, Ryanair/Comissão, T‑123/09, EU:T:2012:164, n.o 68), recordando‑se que, quando essa parte apresente uma denúncia, a recusa da Comissão de deferir essa denúncia deve, em qualquer caso, ser considerada como uma recusa de dar início ao procedimento previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE (Acórdão de 18 de novembro de 2010, NDSHT/Comissão, C‑322/09 P, EU:C:2010:701, n.os 51 a 54).

67      No caso em apreço, as partes estão de acordo quanto ao facto de que a segunda decisão impugnada é uma decisão adotada no termo da fase de análise preliminar dos auxílios, instituída pelo artigo 108.o, n.o 3, TFUE, e não de um procedimento formal de investigação. Uma vez que, pelas razões já referidas nos n.os 55 a 57, supra, não se pode considerar que a recorrente preenche os requisitos de admissibilidade tal como foram enunciados no Acórdão de 15 de julho de 1963, Plaumann/Comissão (25/62, EU:C:1963:17), há que verificar, para determinar se dispõe de legitimidade para interpor recurso de anulação da segunda decisão impugnada, se demonstrou de forma juridicamente bastante ser uma parte interessada.

68      Nos termos do artigo 1.o, alínea h), do Regulamento n.o 659/1999, são consideradas «partes interessadas todo o Estado‑Membro ou toda a pessoa, empresa ou associação de empresas cujos interesses possam ser afetados pela concessão de um auxílio. Trata‑se, por outras palavras, de um conjunto indeterminado de destinatários. Esta disposição não exclui que uma empresa que não seja concorrente direta do beneficiário do auxílio seja qualificada de «parte interessada», desde que alegue que os seus interesses podem ser afetados pela concessão do auxílio. Basta que esta empresa demonstre, de forma juridicamente bastante, que o auxílio pode ter uma incidência concreta sobre a sua situação (v. Acórdão de 24 de maio de 2011, Comissão/Kronoply e Kronotex, C‑83/09 P, EU:C:2011:341, n.os 63 a 65 e jurisprudência referida).

69      Daqui decorre que, em princípio, se pode reconhecer a qualidade de «parte interessada» na aceção do artigo 108.o, n.o 2, TFUE, a qualquer empresa que invoque uma relação de concorrência, atual ou potencial.

70      No caso em apreço, há que considerar que a recorrente demonstrou, mediante a sua participação ativa no processo de concurso, até à fase final, e pela denúncia que apresentou nesse contexto à Comissão, a sua vontade séria de entrar nos mercados relevantes e, portanto, a sua qualidade de concorrente potencial da Capricorn, que, alegadamente, segundo a referida denúncia e tendo em conta as circunstâncias concretas da venda dos ativos do Nürburgring, beneficiou de um auxílio de Estado que a Comissão declarou inexistente na segunda decisão impugnada.

71      Por conseguinte, à luz das considerações expostas nos n.os 68 e 69, supra, e das apreciações precedentes, há que reconhecer à recorrente a qualidade de parte interessada no que respeita à segunda decisão impugnada.

72      No que se refere ao interesse em agir da recorrente, a Comissão alega, no seu pedido de não conhecimento do mérito, que esta perdeu esse interesse devido, nomeadamente, ao facto de a Capricorn ter pagado a totalidade do preço de compra dos ativos da Nürburgring e renunciado ao seu direito de resolver o contrato de venda no caso de a Comissão tomar uma decisão contra ela para a recuperação dos auxílios aos vendedores (v. n.o 63, supra).

73      No entanto, importa recordar que os «interessados», na aceção do artigo 108.o, n.o 2, TFUE, têm interesse em obter a anulação de uma decisão tomada no termo da fase de análise preliminar, uma vez que, em aplicação das disposições do artigo 108.o TFUE, essa anulação impõe à Comissão iniciar o procedimento formal de exame e permite‑lhes apresentar as suas observações, influenciando deste modo a nova decisão da Comissão (Acórdão de 10 de fevereiro de 2009, Deutsche Post e DHL International/Comissão, T‑388/03, EU:T:2009:30, n.os 62 e 64). No caso em apreço, a recorrente tem interesse na anulação da segunda decisão impugnada na medida em que, com a primeira parte do seu quarto fundamento, põe em causa o facto de essa decisão, que declara a inexistência de auxílio concedido à Capricorn no âmbito do processo de concurso, ter sido adotada sem que a Comissão tenha dado início ao procedimento formal de investigação, em violação dos seus direitos processuais enquanto parte interessada.

74      Se o Tribunal Geral anulasse a segunda decisão impugnada por violação dos direitos processuais da recorrente, a Comissão deveria, em princípio, dar início ao procedimento formal de investigação relativo à venda de ativos do Nürburgring e instaria a recorrente, enquanto parte interessada, a apresentar as suas observações. Por conseguinte, a anulação da segunda decisão impugnada é suscetível, por si só, de ter consequências jurídicas para a recorrente, enquanto parte interessada.

75      Por conseguinte, há que concluir que, no que diz respeito à segunda decisão impugnada, a recorrente tem legitimidade para agir, enquanto parte interessada, e tem e conserva um interesse em agir para salvaguarda dos direitos processuais que lhe são conferidos, nessa mesma qualidade, pelo artigo 108.o, n.o 2, TFUE.

76      Daqui resulta que o pedido de não conhecimento do mérito apresentado pela Comissão deve ser julgado improcedente e o presente recurso declarado admissível, na parte em que diz respeito à segunda decisão impugnada e se destina à salvaguarda dos direitos processuais conferidos à recorrente pelo artigo 108.o, n.o 2, TFUE.

2.      Quanto ao mérito

a)      Considerações preliminares sobre o alcance da fiscalização jurisdicional relativa a uma decisão de inexistência de auxílio adotada no termo da fase de análise preliminar

77      Importa começar por recordar que o artigo 108.o, n.o 3, TFUE e o artigo 4.o do Regulamento n.o 659/1999 instauram uma fase de análise preliminar das medidas de auxílio notificadas que tem por objeto permitir à Comissão formar uma primeira opinião sobre a compatibilidade do auxílio em causa com o mercado interno. No final dessa fase, a Comissão constata que tal medida não constitui um auxílio ou que entra no âmbito de aplicação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. Nesta última hipótese, a referida medida pode não suscitar dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado interno ou, pelo contrário, pode suscitá‑las (Acórdão de 24 de maio de 2011, Comissão/Kronoply e Kronotex, C‑83/09 P, EU:C:2011:341, n.o 43).

78      Quando, no termo da fase de análise preliminar, a Comissão adota uma decisão mediante a qual declara que uma medida estatal não constitui um auxílio incompatível com o mercado interno, recusa igualmente, implicitamente, iniciar o procedimento formal de investigação. Este princípio também se aplica quer quando a decisão é tomada com o fundamento de que a Comissão considera que o auxílio é compatível com o mercado interno, nos termos do artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 659/1999, denominada «decisão de não levantar objeções», quer quando considera que a medida não está compreendida no âmbito de aplicação do artigo 107, n.o 1, TFUE e, por conseguinte não constitui um auxílio, nos termos do artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento n.o 659/1999 (v., neste sentido, Acórdãos de 17 de julho de 2008, Athinaïki Techniki/Comissão, C‑521/06 P, EU:C:2008:422, n.o 52, e de 28 de março de 2012, Ryanair/Comissão, T‑123/09, EU:T:2012:164, n.o 68).

79      Segundo a jurisprudência, quando um recorrente pede a anulação de uma decisão que declara que a medida em causa não é um auxílio de Estado ou de uma decisão de não levantar objeções, põe em causa essencialmente o facto de a decisão da Comissão sobre o auxílio em causa ter sido tomada sem que essa instituição tenha iniciado o procedimento formal de investigação, violando assim os seus direitos processuais. Para que o seu pedido de anulação seja julgado procedente, a recorrente pode invocar, para efeitos da preservação dos direitos processuais de que beneficia no âmbito do procedimento formal de investigação, qualquer fundamento suscetível de demonstrar que a apreciação das informações e dos elementos de que a Comissão dispunha ou podia dispor, na fase de análise preliminar da medida em causa, deveria ter suscitado dúvidas quanto à sua qualificação de auxílio de Estado ou à sua compatibilidade com o mercado interno (Acórdãos de 13 de junho de 2013, Ryanair/Comissão, C‑287/12 P, não publicado, EU:C:2013:395, n.o 60, e de 25 de novembro de 2014, Ryanair/Comissão, T‑512/11, não publicado, EU:T:2014:989, n.o 31).

80      Essa prova da existência de dúvidas pode ser feita a partir de um conjunto de indícios concordantes, devendo a existência de dúvidas ser investigada, no que se refere a uma decisão que declara que a medida em causa não constitui um auxílio de Estado, atendendo quer às circunstâncias em que essa decisão foi adotada, nomeadamente a duração da análise preliminar, quer ao conteúdo desta, relacionando as apreciações nas quais a Comissão se baseou na referida decisão com os elementos de que dispunha quando se pronunciou sobre a qualificação da medida em causa como auxílio de Estado (v., neste sentido, Acórdão de 24 de janeiro de 2013, 3F/Comissão, C‑646/11 P, não publicado, EU:C:2013:36, n.o 31).

81      Assim, Comissão deve dar início ao procedimento formal de investigação se, à luz das informações obtidas ou de que podia dispor no decurso da fase de análise preliminar, continuar confrontada com dificuldades sérias de apreciação da medida considerada. Esta obrigação resulta diretamente do artigo 108.o, n.o 3, TFUE, conforme interpretado pela jurisprudência, e é confirmada pelo artigo 4.o, n.o 4, do Regulamento n.o 659/1999, quando a Comissão constata, após a análise preliminar, que a medida em causa suscita dúvidas quanto à sua qualificação de auxílio ou à sua compatibilidade com o mercado interno (v., neste sentido, Acórdãos de 21 de dezembro de 2016, Club Hotel Loutraki e o./Comissão, C‑131/15 P, EU:C:2016:989, n.os 30 a 33, e de 12 de fevereiro de 2008, BUPA e o./Comissão, T‑289/03, EU:T:2008:29, n.o 328). Nesse caso, a Comissão não se pode recusar a dar início ao procedimento formal de exame invocando outras circunstâncias, como o interesse de terceiros, considerações de economia processual ou qualquer outra razão de conveniência administrativa ou política (Acórdão de 10 de fevereiro de 2009, Deutsche Post e DHL International/Comissão, T‑388/03, EU:T:2009:30, n.o 90 e jurisprudência referida).

82      Na fase contenciosa, a fiscalização do juiz da União deve concentrar‑se sobre a questão de saber se, à luz dos argumentos invocados e dos elementos de prova apresentados pela recorrente no caso em apreço, as apreciações em que a Comissão se baseou na decisão de inexistência de auxílio apresentavam dificuldades suscetíveis de suscitar dúvidas e, consequentemente, justificar a abertura do procedimento formal de investigação (v., neste sentido, Acórdãos de 19 de maio de 1993, Cook/Comissão, C‑198/91, EU:C:1993:197, n.o 31, e de 15 de junho de 1993, Matra/Comissão, C‑225/91, EU:C:1993:239, n.o 34).

b)      Observações preliminares sobre o objeto do recurso

83      A primeira parte do quarto fundamento é relativa à violação dos direitos processuais da recorrente, por considerar que a Comissão não deu início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE, não obstante a existência de dificuldades sérias de apreciação da medida em causa.

84      No âmbito desta parte, para demonstrar a existência de tais dificuldades sérias de apreciação da medida em causa, a recorrente alega, nomeadamente, erros de direito, erros de apreciação e um vício de fundamentação da segunda decisão impugnada. Esses erros e esse vício são invocados, por outro lado, no seu primeiro, terceiro e quinto fundamentos, relativos, respetivamente, à interpretação incorreta do conceito de auxílio de Estado, à não tomada em consideração da continuação do processo de venda com a cessão a um subadquirente da participação detida pela Capricorn no veículo de aquisição dos ativos do Nürburgring e à falta de fundamentação.

85      Por conseguinte, num primeiro momento, há que examinar a primeira parte do quarto fundamento, depois, à luz dessa parte, relativa à violação dos direitos processuais da recorrente, o primeiro, terceiro e quinto fundamentos, para apreciar se os argumentos invocados em seu apoio permitem identificar dificuldades sérias de apreciação da medida em causa na presença das quais a Comissão deveria ter dado início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE, como a jurisprudência autoriza o Tribunal Geral a fazer (v., neste sentido, Acórdão de 24 de maio de 2011, Comissão/Kronoply e Kronotex, C‑83/09 P, EU:C:2011:341, n.os 56 e 58).

86      Num segundo momento, haverá que examinar a segunda, terceira e quarta partes do quarto fundamento, relativas a outras violações de direitos processuais da recorrente, que podem igualmente ter tido incidência na declaração, pela Comissão, na segunda decisão impugnada, da inexistência de dificuldades sérias de apreciação da medida em causa que justificassem iniciar o procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE. A segunda parte do quarto fundamento é relativa à violação do artigo 20.o, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 659/1999, e a terceira e quarta partes do quarto fundamento são relativas à falta de um exame diligente e imparcial, pela Comissão, do processo de concurso. Há que recordar que o segundo fundamento do recurso, relativo à existência de uma continuidade económica, era apenas dirigido contra a primeira decisão impugnada, relativamente à qual se considerou que a recorrente não tinha legitimidade para agir.

c)      Quanto à primeira parte do quarto fundamento, relativa à existência de dificuldades sérias de apreciação da venda dos ativos do Nürburgring

87      A recorrente invoca, em primeiro lugar, a duração da fase de análise preliminar e, em segundo lugar, o conteúdo da segunda decisão impugnada.

1)      Quanto à duração da fase de análise preliminar

88      A recorrente alega que a Comissão adiou a sua decisão por várias vezes, nomeadamente entre 23 de junho e 1 de outubro de 2014, data em que a decisão final acabou por ser adotada. Além disso, a retificação da decisão final foi adotada em 13 de abril de 2015, ou seja, mais de um ano depois da apresentação da denúncia à Comissão.

89      A Comissão sustenta que não teve dificuldades sérias durante a análise preliminar.

90      Cabe recordar que, no caso de as medidas estatais controvertidas não terem sido notificadas pelo Estado‑Membro em causa, a Comissão não é obrigada a proceder à sua análise preliminar num prazo determinado. Todavia, a Comissão está obrigada a proceder a uma análise diligente de uma denúncia que revela a existência de um auxílio incompatível com o mercado interno, o caráter razoável da duração de uma fase de análise preliminar deve ser apreciado em função das circunstâncias próprias de cada processo, nomeadamente, do contexto deste, das diferentes etapas processuais que a Comissão deve seguir e da complexidade do processo (v., neste sentido, Acórdão de 27 de setembro de 2011, 3F/Comissão, T‑30/03 RENV, EU:T:2011:534, n.os 57 e 58 e jurisprudência referida).

91      No caso em apreço, a Comissão recebeu a denúncia da recorrente a 10 de abril de 2014. Esta denúncia visava a venda de ativos do Nürburgring à Capricorn a um preço inferior ao preço de mercado e a existência de continuidade económica entre os vendedores e a Capricorn o que justificava que a decisão de recuperação dos auxílios aos vendedores se estendesse a esta última. Por outro lado, foram apresentadas outras três denúncias relativamente à venda dos ativos do Nürburgring. A adoção da decisão final teve lugar em 1 de outubro de 2014, ou seja, menos de seis meses depois da receção da denúncia da recorrente. Esse prazo não excede o que implicava uma primeira análise das questões relacionadas com a venda dos ativos do Nürburgring a um preço inferior ao seu preço de mercado, e não comprova, portanto, a existência de dificuldades sérias de apreciação da medida em causa de molde a justificar a abertura do procedimento formal de investigação.

92      Consequentemente, esta alegação deve ser julgada improcedente.

2)      Quanto ao conteúdo da segunda decisão impugnada

93      A recorrente sustenta, em substância, que a segunda decisão impugnada demonstra, por si só, a existência de dificuldades sérias, e invoca, a este respeito, o caráter lacunar da análise efetuada pela Comissão. As lacunas dizem respeito, em especial, ao exame do caráter aberto, transparente, não discriminatório e incondicional do processo de concurso, de certos factos que são pertinentes a este respeito, como a transferência dos ativos do Nürburgring a um subadquirente, a questão de saber se esse processo tinha levado à venda dos referidos ativos ao proponente que apresentou a melhor proposta, bem como ao exame da circunstância de que a Capricorn não estava em condições de satisfazer o imperativo relativo à segurança do pagamento do preço de venda.

94      Além disso, os erros de direito cometidos pela Comissão, decorrentes da aplicação errada do artigo 107.o, n.o 1, TFUE e do artigo 14.o do Regulamento n.o 659/1999 e da falta de fundamentação, confirmam a existência de dificuldades sérias de apreciação da medida em causa que justificam a abertura do procedimento formal de investigação.

95      A Comissão contesta esta argumentação.

96      Importa, antes de mais, salientar que a Comissão declarou no considerando 285 da decisão final, no termo de uma análise das circunstâncias do caso em apreço, que «a venda dos ativos [do Nürburgring] não constitu[ía] um auxílio de Estado».

97      No considerando 281 da decisão final, a Comissão referiu que não tinha encontrado «elementos de prova de uma violação dos princípios de um processo de concurso aberto, transparente, não discriminatório e incondicional, no que diz respeito à venda dos ativos [do Nürburgring], ou de uma eventual oferta com uma proposta de preço mais elevado com financiamento garantido em comparação com a proposta de preço realizada pela Capricorn».

98      Nos considerandos 240, 261, 266, 271, 276 e 280 da decisão final, a Comissão considerou, nomeadamente, que a Capricorn era o proponente que apresentou a proposta mais elevada juntamente com uma prova do seu financiamento. Quanto a esta garantia, a Comissão declarou que dispunha, desde o mês de abril de 2014, da carta do Deutsche Bank AG de 10 de março de 2014 que apoiava a proposta da Capricorn (a seguir «carta da Deutsche Bank de 10 de março de 2014»). Não há, portanto, razões para questionar a afirmação da Comissão segundo a qual procedeu à sua própria análise da referida carta e considerou que esta constituía uma garantia de financiamento, cuja natureza vinculativa tinha sido confirmada pelas autoridades alemãs.

99      Por conseguinte, o argumento relativo à garantia de financiamento da proposta apresentada pela Capricorn e à questão de saber se o processo de concurso tinha levado à venda dos referidos ativos ao proponente que apresentou a melhor proposta não tem fundamento.

100    A recorrente alega igualmente que a Comissão não procedeu a um exame exaustivo do processo de concurso. Em especial, a decisão final não faz referência à continuação do processo de venda.

101    A este respeito, resulta da jurisprudência que o caráter insuficiente ou incompleto da análise efetuada pela Comissão na fase de análise preliminar constitui um indício da existência de dificuldades suscetíveis de justificar a abertura do procedimento formal de investigação (v. Acórdão de 11 de outubro de 2016, Søndagsavisen/Comissão, T‑167/14, não publicado, EU:T:2016:603, n.o 24 e jurisprudência referida).

102    A jurisprudência concluiu igualmente que, de um modo geral, a legalidade de uma decisão em matéria de auxílios de Estado deve ser apreciada em função dos elementos de informação de que a Comissão dispunha ou podia dispor no momento em que a tomou (v., neste sentido, Acórdão de 22 de dezembro de 2008, Régie Networks, C‑333/07, EU:C:2008:764, n.o 81), tendo presente que os elementos de informação de que a Comissão «podia dispor» incluem os que se apresentassem como relevantes para efeitos da apreciação a efetuar e cuja apresentação ela pudesse obter, a seu pedido, no procedimento administrativo (v., neste sentido, Acórdão de 20 de setembro de 2017, Comissão/Frucona Košice, C‑300/16 P, EU:C:2017:706, n.o 71).

103    O facto de a Comissão, no entender da recorrente, não ter respondido a certas alegações que esta tinha formulado não implica que não pudesse pronunciar‑se sobre a medida em causa com base nas informações de que dispunha e que devesse, por conseguinte, dar início ao procedimento formal de investigação para completar o seu inquérito (Acórdão de 28 de março de 2012, Ryanair/Comissão, T‑123/09, EU:T:2012:164, n.o 130).

104    No caso em apreço, a Comissão não pode ser acusada de não se ter pronunciado, na decisão final, sobre a continuação do processo de venda pela cessão a um subadquirente da participação detida pela Capricorn no veículo de aquisição dos ativos do Nürburgring, a qual, segundo a recorrente, teve lugar em 28 de outubro de 2014, com base num contrato fiduciário de 5 de outubro de 2014, e, portanto, depois da adoção da referida decisão.

105    Por último, a recorrente afirma que os erros de direito cometidos pela Comissão, decorrentes da aplicação incorreta do artigo 107.o, n.o 1, TFUE e do artigo 14.o do Regulamento n.o 659/1999 assim como da falta de fundamentação, confirmam a existência de dificuldades sérias. A análise deste argumento confunde‑se com a análise do primeiro e quinto fundamentos, relativos a esses erros de direito e à referida falta de fundamentação, a que se vai proceder em seguida.

106    Assim, sob reserva das alegações que serão examinadas no âmbito do primeiro e do quinto fundamento, os argumentos invocados em apoio da primeira parte do quarto fundamento não permitem, portanto, demonstrar que, no termo da fase de análise preliminar, a Comissão se confrontava com dificuldades de apreciação da venda dos ativos do Nürburgring que exigiam a abertura de um procedimento formal de investigação. A primeira parte do quarto fundamento deve, assim, ser julgada improcedente.

d)      Quanto ao primeiro fundamento, relativo a uma interpretação errada do conceito de auxílio de Estado, no que respeita à concessão de um auxílio de Estado ao adquirente no âmbito do processo de concurso

107    Com o seu primeiro fundamento, que compreende três partes, a recorrente alega que a Comissão interpretou de forma incorreta o conceito de auxílio de Estado, na aceção do artigo 107.o TFUE, ao concluir que não tinha sido concedido nenhum auxílio de Estado ao adquirente no âmbito do processo de concurso.

1)      Quanto à primeira parte do primeiro fundamento, relativa à vantagem conferida ao adquirente no âmbito do processo de concurso

108    Com a primeira parte do primeiro fundamento, a recorrente sustenta que o adquirente obteve uma vantagem no âmbito do processo de concurso. O referido processo não foi transparente. Em especial, os vendedores e a KPMG não informaram com clareza os proponentes dos prazos aplicáveis, de modo que foi induzida em erro quanto à data‑limite para a apresentação da proposta final. O adquirente só apresentou a sua proposta final em 10 de março de 2014, na véspera da sua designação como adjudicatário dos ativos do Nürburgring, pelo que o prazo foi prorrogado de facto até essa data.

109    Além disso, a recorrente sustenta que o processo de concurso foi discriminatório. Em particular, houve negociações entre os representantes dos vendedores e do adquirente durante o outono de 2013, mas não com os seus próprios representantes, apesar de adquirente não ter apresentado garantias de financiamento. Este último foi, nomeadamente, autorizado a participar nas reuniões de gestão dos vendedores. Além disso, o argumento da Comissão segundo o qual nenhum dos proponentes forneceu garantias de financiamento para a totalidade do preço de aquisição e de que, por conseguinte, os vendedores não violaram o princípio da igualdade de tratamento ao flexibilizar o imperativo de um financiamento garantido durante o processo de concurso é errado, na medida em que essa alteração das condições de adjudicação não foi comunicada a todos os proponentes.

110    Além disso, a recorrente alega que o adquirente não justificou um financiamento garantido, na medida em que, nomeadamente, tinha apresentado apenas um compromisso sob a forma da carta do Deutsche Bank de 10 de março de 2014, a saber, uma carta de intenções, não vinculativa, que constituía apenas um projeto preliminar cujo efeito vinculativo tinha sido subordinado ao cumprimento de requisitos adicionais e a uma decisão final do Deutsche Bank.

111    Por último, a recorrente alega que propunha o preço de aquisição mais elevado e um financiamento garantido.

112    A Comissão contesta esta argumentação.

113    À luz das alegações formuladas na primeira parte do primeiro fundamento, há que determinar se a análise efetuada pela Comissão no que respeita à regularidade do processo de concurso podia excluir a existência de dificuldades sérias de apreciação da venda de ativos do Nürburgring, suscetíveis de justificar a abertura de um procedimento formal de investigação.

114    Segundo jurisprudência constante, quando uma empresa que beneficiou de um auxílio de incompatível com o mercado interno é comprada ao preço de mercado, isto é, ao preço mais alto que um investidor privado, atuando em condições concorrenciais normais, estivesse disposto a pagar por essa sociedade na situação em que se encontrava, designadamente após ter beneficiado de auxílios de Estado, o elemento de auxílio é avaliado ao preço de mercado e incluído no preço de compra. Nestas condições, não se pode considerar que o adquirente foi beneficiado relativamente aos outros operadores presentes no mercado (v., neste sentido, Acórdão de 29 de abril de 2004, Alemanha/Comissão C‑277/00, EU:C:2004:238, n.o 80 e jurisprudência referida).

115    Se, pelo contrário, a venda dos ativos dos beneficiários de auxílios de Estado é efetuada a um preço inferior ao preço de mercado, pode ser transferida para o adquirente uma vantagem indevida (v., neste sentido, Acórdão de 28 de março de 2012, Ryanair/Comissão, T‑123/09, EU:T:2012:164, n.o 161).

116    Para efeitos da verificação do preço de mercado, pode ser tida em conta, nomeadamente, a forma utilizada para a cessão de uma sociedade, por exemplo a adjudicação pública, que supostamente garante uma venda nas condições do mercado. Daqui decorre que, quando se procede à venda de uma empresa através de um processo de concurso público aberto, transparente e incondicional, pode presumir‑se que o preço de mercado corresponde à proposta mais elevada, entendendo‑se que se deve demonstrar, primeiro, que essa proposta é vinculativa e credível e, segundo, que a tomada em consideração de outros fatores económicos diferentes do preço não se justifica (v., neste sentido, Acórdãos de 24 de outubro de 2013, Land Burgenland e o./Comissão, C‑214/12 P, C‑215/12 P e C‑223/12 P, EU:C:2013:682, n.os 93 e 94, e de 16 de julho de 2015, BVVG, C‑39/14, EU:C:2015:470, n.o 32).

117    Segundo a jurisprudência, o caráter aberto de um processo de concurso aprecia‑se em função de um conjunto de indícios próprios às circunstâncias de cada caso (v., neste sentido, Acórdão de 29 de abril de 2004, Alemanha/Comissão, C‑277/00, EU:C:2004:238, n.o 95).

118    É à luz da jurisprudência recordada nos n.os 114 a 117, supra, que se deve examinar, no caso em apreço, a procedência das diferentes alegações suscitadas no âmbito da primeira parte do primeiro fundamento, tendo em conta que, nesse âmbito, o Tribunal Geral não se pode pronunciar diretamente sobre a legalidade do processo de concurso.

i)      Quanto à alegação relativa à falta de transparência do processo de concurso

119    Uma vez que a recorrente denuncia a falta de transparência do processo de concurso, há que recordar (v. n.o 9, sétimo travessão, supra) que o prazo para apresentação de propostas de confirmação foi sucessivamente fixado em 11 de dezembro de 2013, como resulta da carta da KPMG de 17 de outubro de 2013, e, posteriormente, em 17 de fevereiro de 2014, como resulta da carta da KPMG de 17 de dezembro de 2013. Esta última carta precisava que também seriam tidas em conta as propostas apresentadas depois de expirado o prazo. No entanto, precisava que uma vez decorrido o prazo de entrega das propostas, os vendedores poderiam tomar rapidamente a decisão de seleção.

120    Como a Comissão afirma com razão, a possibilidade de apresentar uma proposta depois de 17 de fevereiro de 2014 era, portanto, conhecida de todos os proponentes. Do mesmo modo, o facto de o adquirente ter podido apresentar a sua proposta final em 10 de março de 2014, após o termo do prazo, e ser designado como adjudicatário desde 11 de março de 2014 é perfeitamente conforme com as disposições da carta da KPMG de 17 de dezembro de 2013.

121    Daqui resulta que esta alegação não permite demonstrar que a Comissão devia ter tido dúvidas quanto à existência de uma vantagem conferida ao adquirente no âmbito do processo de concurso devido à falta de transparência do mesmo atendendo ao prazo fixado para a apresentação de uma proposta de confirmação.

ii)    Quanto à alegação relativa ao caráter discriminatório do processo de concurso

122    No âmbito da presente alegação, a recorrente sustenta que o processo de concurso foi discriminatório. Em especial, o adquirente não justificou um financiamento garantido, na medida em que a carta do Deutsche Bank de 10 de março de 2014, que devia apoiar a sua proposta aprovada em 11 de março de 2014, não tinha efeito vinculativo.

123    A carta da KPMG enviada aos investidores interessados de 17 de outubro de 2013 precisava que qualquer financiamento proveniente de terceiros devia assentar num compromisso de financiamento vinculativo (v. n.o 9, nono travessão, supra). Há, portanto, que verificar se o exame efetuado pela Comissão, que confirma a análise das autoridades alemãs, era suscetível de excluir a existência de dúvidas quanto ao caráter vinculativo da carta do Deutsche Bank de 10 de março de 2014.

124    Em primeiro lugar, a carta do Deutsche Bank de 10 de março de 2014 refere que este está disposto a conceder ao adquirente um empréstimo de 45 milhões de euros. As condições desse financiamento são descritas pormenorizadamente, o que, como alega acertadamente a Comissão, parece indicar que o Deutsche Bank efetuou um exame aprofundado e trocou informações com o adquirente.

125    Em seguida, a carta do Deutsche Bank de 10 de março de 2014 faz referência, por diversas vezes, ao compromisso assumido pelo Deutsche Bank em relação à Capricorn em virtude da referida carta. Por conseguinte, o Deutsche Bank considerava estar vinculado pela referida carta.

126    A este respeito, como alega acertadamente a Comissão, a comparação da carta do Deutsche Bank de 10 de março de 2014 com duas cartas de intenções e não vinculativas do Deutsche Bank, de 17 e de 25 de fevereiro de 2014, confirma o caráter vinculativo da sua carta de 10 de março de 2014. Assim, na carta de 17 de fevereiro de 2014 precisa‑se que a mesma não constitui um compromisso da parte do Deutsche Bank, ao contrário da carta do Deutsche Bank de 10 de março de 2014, que faz referência ao compromisso assumido pelo Deutsche Bank em relação à Capricorn, em virtude dessa mesma carta.

127    Por último, a carta do Deutsche Bank de 10 de março de 2014 precisa que o compromisso assumido por si está sujeito a três condições. Ora, essas condições (execução da transação, ausência de alteração significativa no que respeita aos ativos adquiridos, inexistência de ilegalidade) só permitiam ao Deutsche Bank subtrair‑se ao seu compromisso se a aquisição não se desenrolasse nas condições previstas.

128    Tendo em conta as considerações precedentes, não se afigura que a Comissão deveria ter tido dúvidas quanto ao caráter vinculativo da carta do Deutsche Bank de 10 de março de 2014.

129    Pelo contrário, como a Comissão observou com razão no considerando 272 da decisão final, a recorrente nunca apresentou provas de financiamento da sua proposta.

130    Em 30 de setembro de 2013, a recorrente apresentou uma proposta indicativa para a totalidade dos ativos do Nürburgring, no montante de 150 milhões de euros. Esta proposta não incluía nenhuma prova da sua capacidade de financiamento, facto para o qual a KPMG chamou a atenção nas cartas de 11 e 17 de dezembro de 2013, bem como numa carta de 18 de dezembro seguinte. A recorrente recebeu igualmente a carta da KPMG de 17 de outubro de 2013, que precisava que qualquer financiamento proveniente de um terceiro devia assentar num compromisso de financiamento vinculativo.

131    Em 17 de fevereiro de 2014, a recorrente apresentou uma proposta final no montante de 110 milhões de euros para a totalidade dos ativos. Afirmava, então, ter obtido um compromisso de financiamento vinculativo de 30 milhões de euros da DRC Capital LLP. No entanto, nenhum documento de DRC Capital LLP foi apresentado com a proposta, facto para o qual a KPMG chamou a atenção da recorrente numa mensagem de correio eletrónico de 18 de fevereiro de 2014.

132    Em 21 de fevereiro de 2014, a recorrente indicou que acreditava obter todos os compromissos de financiamento vinculativos no prazo de duas a cinco semanas. Em 11 de março de 2014, forneceu uma versão atualizada da proposta final, num montante total de 150 milhões de euros, e confirmou que apresentaria todos os compromissos de financiamento vinculativos o mais tardar em 31 de março de 2014. Por último, afirma ter recebido um compromisso de financiamento da Jupiter Financial em 26 de março de 2014, embora reconheça que nunca o enviou à KPMG. Numa mensagem de correio eletrónico de 9 de abril de 2014, a KPMG indicou à recorrente que ainda não tinha recebido confirmação escrita por parte dos terceiros que financiariam a sua proposta.

133    Resulta do que precede que o adquirente, cuja proposta foi selecionada, dispunha, em primeiro lugar, de duas cartas de intenções do Deutsche Bank, de 17 e de 25 de fevereiro de 2014, e, depois, da carta do Deutsche Bank de 10 de março de 2014, sobre cujo caráter vinculativo não se afigura que a Comissão devesse ter tido dúvidas, ao passo que a recorrente, cuja proposta não foi selecionada, não forneceu, em nenhum momento, qualquer prova de financiamento. Além do mais, o imperativo de um compromisso de financiamento vinculativo foi recordado à recorrente por diversas vezes.

134    À luz das considerações precedentes, não há que considerar que a Comissão, tendo em conta os elementos de facto e de direito invocados pela recorrente, deveria ter tido dúvidas quanto à existência de uma vantagem conferida ao adquirente no âmbito do processo de concurso, devido ao caráter discriminatório deste no que respeita ao imperativo de um compromisso de financiamento vinculativo.

iii) Quanto à alegação relativa ao montante e ao financiamento das propostas da Capricorn e da recorrente

135    No âmbito da presente alegação, a recorrente sustenta que propôs o preço de aquisição mais elevado, bem como um financiamento garantido, ao passo que a proposta da Capricorn, que acabou por ser selecionada, era inferior à sua e não dispunha de um financiamento garantido.

136    Uma vez que o montante da proposta final de compra apresentada pela recorrente era de 110 milhões de euros, ao passo que o da Capricorn era de 77 milhões de euros, é com razão que a recorrente afirma que propunha um preço de aquisição superior ao da Capricorn.

137    No entanto, em conformidade com a jurisprudência recordada no n.o 116, supra, só se pode presumir que o preço de mercado corresponde à proposta mais elevada apresentada no âmbito de um processo de concurso aberto, transparente e incondicional se se demonstrar que essa proposta tem valor de compromisso e é credível.

138    No caso em apreço, nos termos das cartas que lhe foram enviadas em 19 de julho e em 17 de outubro de 2013 pela KPMG, os investidores interessados deviam ser selecionados tendo em conta o imperativo de segurança da transação (v. n.o 9, nono travessão, supra).

139    Ora, é sem razão que a recorrente afirma que propunha um financiamento garantido, dado que em nenhum momento forneceu qualquer prova de financiamento. Resulta do considerando 272 da decisão final que as autoridades alemãs podiam, na falta de provas da sua capacidade e da sua solvabilidade financeiras, duvidar da sua capacidade para reunir os fundos necessários para honrar o preço de compra que oferecia e, portanto, a credibilidade da sua proposta e a conformidade desta com o imperativo de segurança do pagamento do preço de venda.

140    Pelo contrário, a Capricorn dispunha, antes de mais, de duas cartas de intenções do Deutsche Bank de 17 e de 25 de fevereiro de 2014 e, depois, da carta do Deutsche Bank de 10 de março de 2014, relativamente à qual já se observou que o caráter vinculativo não devia suscitar dúvidas na Comissão (v. n.os 128 e 133, supra).

141    Além disso, como mencionado no considerando 273 da decisão final, só participaram na fase final das negociações levadas a cabo no âmbito do processo de concurso o proponente 2 e a Capricorn, cujas propostas eram ambas inferiores à da recorrente, mas incluíam promessas de financiamento. Portanto, os vendedores compararam a proposta do proponente 2 com a de Capricorn. Isto é confirmado pelo facto de que, segundo os advogados dos vendedores, em 26 de fevereiro de 2014, a proposta de confirmação do proponente 2 era a melhor proposta, ainda que de montante inferior à da Capricorn, e que foi precisamente tendo em conta o montante superior da proposta desta última que os vendedores tentaram concluir a venda dos ativos do Nürburgring com a Capricorn. Ora, resulta do considerando 273 da decisão final que tanto a proposta como a promessa de financiamento apresentadas pela Capricorn eram mais elevadas do que a proposta e a promessa de financiamento apresentadas pelo proponente 2.

142    Por conseguinte, não está demonstrado que a Comissão deveria ter tido dúvidas quanto ao facto de que a Capricorn era o proponente que tinha apresentado a melhor proposta vinculativa e credível, tendo em conta não apenas o preço proposto, mas igualmente as garantias de segurança da transação oferecidas. Por outras palavras, não está demonstrado que deveria ter duvidado de que «os ativos em causa [tinham sido] vendidos ao proponente que [tinha apresentado] a proposta mais elevada, incluindo uma prova do seu financiamento», como realçado no considerando 276 da decisão final, e de que não existia «uma proposta de preço mais elevado com financiamento garantido em comparação com a proposta de preço realizada pela Capricorn», como é salientado no considerando 281 dessa mesma decisão.

143    Daqui resulta que esta alegação deve igualmente ser julgada improcedente.

144    De acordo com a jurisprudência referida nos n.os 114 a 117, supra, a análise efetuada pela Comissão era, portanto, suscetível de dissipar qualquer dúvida quanto à existência de uma vantagem indevida a favor do adquirente no âmbito do processo de concurso e, por conseguinte, quanto à concessão de um auxílio de Estado a este último. Por conseguinte, não há que considerar que a primeira parte do primeiro fundamento é reveladora de dificuldades sérias de apreciação da venda de ativos do Nürburgring, que deviam impor à Comissão dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE.

145    Por conseguinte, há que julgar improcedente a primeira parte do primeiro fundamento.

2)      Quanto à segunda parte do primeiro fundamento, relativa à vantagem conferida ao adquirente no âmbito do contrato de locação dos ativos do Nürburgring

146    Com a segunda parte do primeiro fundamento, a recorrente sustenta que foi igualmente concedida uma vantagem ao adquirente no âmbito do contrato de locação dos ativos do Nürburgring. Resulta do considerando 56 da decisão final que esse contrato de locação foi celebrado entre uma sociedade independente dos vendedores, em concreto, na qualidade de depositário dos referidos ativos, e uma empresa de exploração criada pela Capricorn, para gerir a partir de 1 de janeiro de 2015, uma situação transitória correspondente à eventual realização da condição subjacente à venda dos ativos do Nürburgring à Capricorn, a saber, a adoção, pela Comissão, de uma decisão que excluísse qualquer risco de o adquirente dos referidos ativos poder ser obrigado a reembolsar os auxílios aos vendedores. O montante da renda anual não ultrapassava 5 milhões de euros, ao passo que, segundo a recorrente, devia ascender, no mínimo, a 7,7 milhões de euros.

147    A Comissão contesta esta argumentação e alega, nomeadamente, que a renda representava unicamente o pagamento antecipado de frações do preço de venda dos ativos do Nürburgring, que era, ele próprio, conforme com as condições de mercado.

148    Pelas razões expostas nos n.os 119 a 133, supra, não há que considerar que a Comissão deveria ter tido dúvidas quanto ao caráter transparente e não discriminatório do processo de concurso.

149    Por estas mesmas razões, a Comissão tinha fundamento para não ter dúvidas quanto à existência de uma vantagem conferida ao adquirente no âmbito do processo de concurso, incluindo quanto ao contrato de locação dos ativos do Nürburgring que tinha sido negociado para o caso de não se verificarem as condições impostas para que a venda fosse perfeita.

150    Há, pois, que julgar improcedente a segunda parte do primeiro fundamento.

3)      Quanto à terceira parte do primeiro fundamento, relativa à utilização de recursos públicos no âmbito da venda dos ativos do Nürburgring ao adquirente

151    Com a terceira parte do primeiro fundamento, a recorrente alega que a Comissão não examinou a questão de saber se no âmbito da venda dos ativos da Nürburgring à Capricorn tinham estado implicados recursos públicos. Ora, a Comissão devia ter constatado que era esse o caso.

152    A Comissão contesta esta argumentação.

153    Cabe recordar que a Comissão pode arquivar uma denúncia quando está em posição de excluir à partida a qualificação de auxílio de Estado em causa depois de ter verificado que um dos requisitos essenciais à aplicação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE não está preenchido (v., neste sentido, Acórdão de 5 de abril de 2006, Deutsche Bahn/Comissão, T‑351/02, EU:T:2006:104, n.o 104).

154    No caso em apreço, ao examinar, nos considerandos 266 a 281 da decisão final, se o processo de concurso tinha sido aberto, transparente, não discriminatório e incondicional e se a Capricorn era o proponente que apresentou a proposta mais elevada que incluía uma prova do seu financiamento, a Comissão tinha, em substância, por objetivo controlar que os ativos do Nürburgring tinham sido vendidos ao seu preço de mercado, em conformidade com a jurisprudência referida no n.o 116, supra.

155    Se a venda dos ativos do Nürburgring tivesse sido realizada a um preço inferior ao de mercado, como foi recordado no n.o 115, supra, poderia ter sido concedida uma vantagem indevida ao adquirente (Acórdão de 28 de março de 2012, Ryanair/Comissão, T‑123/09, EU:T:2012:164, n.o 161). A análise da Comissão incidia, portanto, sobre a questão de saber se, no caso em apreço, essa vantagem tinha sido concedida à Capricorn no âmbito do processo de concurso.

156    A Comissão concluiu que, na falta dessa vantagem, não tinha sido concedido à Capricorn nenhum auxílio de Estado no âmbito da venda de ativos do Nürburgring. Por outras palavras, a Comissão constatou que um dos requisitos essenciais para a aplicação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, relativo à existência de uma vantagem, não estava preenchido.

157    Por conseguinte, a Comissão não pode ser validamente acusada de não ter também examinado se o requisito relativo a uma intervenção do Estado ou mediante recursos estatais estava preenchido.

158    Por conseguinte, há que declarar que o exame da terceira parte do primeiro fundamento e, portanto, do primeiro fundamento no seu conjunto não revelou qualquer indício da existência de dúvidas quanto à qualificação como auxílio de Estado da venda dos ativos do Nürburgring, que teriam exigido a abertura do procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE.

159    Por conseguinte, o primeiro fundamento, lido à luz da primeira parte do quarto fundamento, deve ser julgado improcedente.

e)      Quanto ao terceiro fundamento, relativo à não tomada em consideração da continuação do processo de venda resultante da cessão a um subadquirente da participação detida pela Capricorn no veículo de aquisição dos ativos do Nürburgring

160    Com o seu terceiro fundamento, a recorrente sustenta que a Comissão indicou, erradamente, na decisão final, que o processo de venda dos ativos do Nürburgring tinha terminado em 11 de março de 2014, com a sua adjudicação à Capricorn.

161    Com efeito, os vendedores continuaram o processo de venda a partir de julho de 2014, depois de a Capricorn ter revelado a sua incapacidade para efetuar o segundo pagamento parcial do preço de compra. A partir de setembro de 2014, tiveram lugar negociações informais durante as quais os próprios vendedores propuseram a transferência dos ativos do Nürburgring, que culminaram, em 28 de outubro de 2014, com a cessão a um subadquirente da participação detida pela Capricorn no veículo de aquisição desses ativos. A continuação do processo de venda também não estava em conformidade com as exigências de abertura, transparência, não discriminação e incondicionalidade.

162    Segundo a recorrente, a cessão a um subadquirente da participação detida pela Capricorn no veículo de aquisição de ativos do Nürburgring constitui o culminar do processo de venda dos referidos ativos e foi efetuada no interesse dos vendedores e não da Capricorn. Com efeito, esta última não obteve nenhuma vantagem desta cessão, com exceção da que podia decorrer da extinção das suas obrigações contratuais. O facto de o preço da cessão dessa participação ter sido idêntico ao da venda dos ativos do Nürburgring à Capricorn não justificava a ausência, no caso vertente, de um novo concurso público.

163    A Comissão contesta esta argumentação.

164    Pelas razões já expostas nos n.os 103 e 104, supra, não se pode acusar a Comissão de não se ter pronunciado, na decisão final, sobre a continuação do processo de venda pela cessão a um subadquirente da participação detida pela Capricorn no veículo de aquisição dos ativos do Nürburgring, na medida em que essa cessão teve lugar, como a própria recorrente reconhece, depois da adoção da referida decisão.

165    Além disso, embora resulte de um artigo de imprensa de 30 de setembro de 2014 que o Deutsche Bank retirou o seu financiamento à Capricorn e que os administradores procuraram novos adquirentes para os ativos do Nürburgring, a recorrente não demonstrou que a Comissão dispunha ou podia dispor desses elementos de informação no momento em que adotou a decisão final.

166    Em todo o caso, em aplicação da jurisprudência referida nos n.os 114 a 117, supra, e como alegou a Comissão nas suas observações de 13 de dezembro de 2017 em resposta às questões escritas do Tribunal Geral, o seu exame tinha por objetivo apurar se o processo de concurso tinha sido aberto, transparente, não discriminatório e incondicional, para verificar se os ativos do Nürburgring tinham sido cedidos ao seu preço de mercado. Caso contrário, a referida venda poderia ter sido realizada a um preço inferior ao preço de mercado, e ter‑se transferido para o adquirente uma vantagem indevida.

167    Por conseguinte, há que considerar que o auxílio que, segundo a recorrente (v. n.o 10, supra), devia ter sido declarado pela Comissão na decisão na segunda decisão impugnada e devia corresponder à diferença entre o preço pago pela Capricorn para adquirir os ativos do Nürburgring e o preço de mercado desses mesmos ativos, tinha sido concedido à Capricorn em 11 de março de 2014, data da adjudicação dos ativos do Nürburgring a esta última e da assinatura do contrato que fixou o preço de aquisição dos ativos do Nürburgring devido pela Capricorn. Daqui resulta que os factos posteriores a essa data, como as dificuldades com que se deparou a Capricorn no momento da execução do contrato de compra e venda e a cessão por esta da participação que detinha no veículo de aquisição dos ativos do Nürburgring a um subadquirente, não eram pertinentes para a análise da questão de saber se tinha sido eventualmente concedido um auxílio à Capricorn no âmbito do processo de concurso.

168    Por último, como alegou corretamente a Comissão nas suas observações de 13 de dezembro de 2017 em resposta às questões escritas do Tribunal Geral, se a recorrente pretendia que a Comissão analisasse igualmente a existência de um novo auxílio resultante da alegada continuação do processo de venda, depois da adoção da segunda decisão impugnada, deveria ter apresentado uma nova denúncia a este respeito.

169    Daqui resulta que os argumentos apresentados em apoio do terceiro fundamento, relativo à não tomada em conta da continuação do processo de venda depois da adoção da segunda decisão impugnada, não permitem concluir que, no termo da fase de análise preliminar, a Comissão se confrontava com dificuldades de apreciação da venda de ativos do Nürburgring que exigiam a abertura de um procedimento formal de investigação.

170    Por conseguinte, o terceiro fundamento, lido à luz da primeira parte do quarto fundamento, deve ser julgado improcedente.

f)      Quanto ao quinto fundamento, relativo a falta de fundamentação

171    Com o quinto fundamento, a recorrente sustenta que a Comissão não respondeu às suas alegações relativas, em primeiro lugar, ao exame do imperativo de segurança da transação, em segundo lugar, à continuação do processo de venda e à cessão de ativos do Nürburgring, em terceiro lugar, à utilização de recursos públicos e à participação do Estado na conclusão da venda e da locação dos ativos do Nürburgring, em quarto lugar, à concessão adicional de um auxílio de Estado de seis milhões de euros a favor do adquirente correspondente ao pagamento parcial do preço de aquisição deduzido o beneficio do exercício de 2014 do gestor do Nürburgring (v. n.o 6, supra), em quinto lugar, ao papel do escritório de advogados que representa o adquirente e os vendedores, em sexto lugar, ao caráter discriminatório do processo de concurso no que respeita aos acordos relacionados com a exploração do Nürburgring, em sétimo lugar, ao contrato de locação celebrado entre o adquirente e os vendedores e a questão de saber se este equivalia a um auxílio de Estado e, em oitavo lugar, à verificação do preço de aquisição dos ativos do Nürburgring com base em opiniões dos peritos.

172    A recorrente alega igualmente que a Comissão não forneceu uma fundamentação clara e inequívoca no que respeita, por um lado, à organização, evocada no considerando 56 da decisão final, adotada depois do encerramento da venda dos ativos do Nürburgring para assegurar a sua exploração provisória enquanto se aguardava por uma decisão executória da Comissão que clarificasse a situação jurídica da Capricorn relativamente aos auxílios aos vendedores, e, por outro, o imperativo de segurança desta transação.

173    Por último, a recorrente alega que a Comissão não apresentou uma fundamentação mais pormenorizada, no que respeita às alterações que introduziu na sua prática decisória, no âmbito da análise do imperativo de segurança da transação e das relações existentes entre os administradores e o Estado.

174    A Comissão contesta esta argumentação.

175    A fundamentação exigida no artigo 296.o, segundo parágrafo, TFUE deve permitir aos interessados conhecer as razões da medida adotada e ao juiz da União exercer a sua fiscalização (v., no que respeita a auxílios de Estado, Acórdãos de 6 de setembro de 2006, Portugal/Comissão, C‑88/03, EU:C:2006:511, n.os 88 e 89; de 22 de abril de 2008, Comissão/Salzgitter, C‑408/04 P, EU:C:2008:236, n.o 56; e de 30 de abril de 2009, Comissão/Itália e Wam, C‑494/06 P, EU:C:2009:272, n.os 48 e 49). A Comissão é obrigada a expor de forma suficiente ao denunciante as razões pelas quais os elementos de facto e de direito invocados na denúncia não bastaram para demonstrar a existência de um auxílio de Estado (Acórdãos de 2 de abril de 1998, Comissão/Sytraval e Brink’s France, C‑367/95 P, EU:C:1998:154, n.o 64, e de 1 de julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o., C‑341/06 P e C‑342/06 P, EU:C:2008:375, n.o 89).

176    No caso em apreço, os considerandos 266 a 281 da decisão final, sob o título «Denúncias sobre a venda de ativos [do Nürburgring]», contêm uma exposição detalhada das razões que levaram a Comissão a decidir que a venda dos ativos do Nürburgring à Capricorn não constituía um auxílio de Estado. Esta exposição é suficiente para permitir aos interessados conhecer as justificações da medida adotada e ao juiz da União exercer a sua fiscalização e para que a recorrente possa compreender as razões pelas quais os elementos de facto e de direito invocados na sua denúncia não bastaram para demonstrar a existência de um auxílio de Estado.

177    Em especial, e contrariamente ao que sustenta a recorrente, a Comissão não se absteve de responder às suas alegações relativas ao imperativo de segurança da transação, que são analisadas nos considerandos 272 e 273 da decisão final sobre a prova do financiamento das propostas da recorrente e da Capricorn, a negociação de acordos ligados à exploração do Nürburgring pela Capricorn, evocada no considerando 275, alínea e), dessa mesma decisão, ou o papel do escritório de advogados que representa o adquirente e os vendedores, evocado no considerando 275, alínea j), da referida decisão.

178    Por conseguinte, ainda que a Comissão não tenha respondido a outras alegações feitas pela recorrente na sua denúncia, esta omissão não pode constituir uma violação do dever de fundamentação, uma vez que este não lhe impõe expor outros elementos para além dos factos e das considerações jurídicas que considera de importância essencial na sistemática da decisão. Com efeito, a correlação necessária entre os fundamentos invocados pelo denunciante e a fundamentação da decisão da Comissão não pode exigir que esta seja obrigada a rebater cada um dos argumentos aduzidos em apoio desses fundamentos (v. Acórdãos de 1 de julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o., C‑341/06 P e C‑342/06 P, EU:C:2008:375, n.o 96 e jurisprudência referida, e de 3 de março de 2010, Freistaat Sachsen/Comissão, T‑102/07 e T‑120/07, EU:T:2010:62, n.o 180 e jurisprudência referida).

179    É por maioria de razão o caso de uma decisão adotada no termo da fase de análise preliminar dos auxílios que, sendo tomada em prazos curtos, deve apenas conter as razões pelas quais a Comissão considera não estar perante dificuldades sérias de apreciação da medida em causa suscetíveis de justificar a abertura do procedimento formal de investigação (Acórdãos de 15 de junho de 1993, Matra/Comissão, C‑225/91, EU:C:1993:239, n.o 48, e de 22 de dezembro de 2008, Régie Networks, C‑333/07, EU:C:2008:764, n.o 65).

180    Daqui resulta que o quinto fundamento, relativo à falta de fundamentação, não permite concluir que, no termo da fase de análise preliminar, a Comissão se confrontava com dificuldades de apreciação da venda dos ativos do Nürburgring que exigiam a abertura de um procedimento formal de investigação.

181    Tendo em conta as considerações precedentes, o quinto fundamento deve ser julgado improcedente.

182    Daqui resulta que nem a primeira parte do quarto fundamento, nem o primeiro, terceiro e quinto fundamentos permitem concluir que, no termo da fase de análise preliminar, a Comissão se confrontava com dificuldades de apreciação da venda dos ativos do Nürburgring que exigiam a abertura de um procedimento formal de investigação.

g)      Quanto à segunda parte do quarto fundamento, relativa à violação do artigo 20.o, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 659/1999

183    Com a segunda parte do quarto fundamento, a recorrente sustenta que a Comissão violou o artigo 20.o, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 659/1999 na medida em que não a informou da sua intenção de rejeitar a sua denúncia e também não a convidou a apresentar novas observações.

184    A Comissão contesta esta argumentação.

185    Conforme alterado pelo Regulamento (UE) n.o 734/2013 do Conselho, de 22 de julho de 2013, que altera o Regulamento n.o 659/1999 (JO 2013, L 204, p. 15), o artigo 20.o, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 659/1999 dispõe que «[q]uando a Comissão considerar que a parte interessada não respeita a obrigação de recorrer ao formulário de denúncia ou que os elementos de facto e de direito invocados pela parte interessada não são suficientes para demonstrar, com base num exame à primeira vista, a existência de um auxílio de Estado ilegal ou a utilização abusiva de um auxílio, informará desse facto a parte interessada e convida‑a a apresentar as suas observações num prazo fixado que normalmente não ultrapassa um mês». Além disso, «[s]e a parte interessada não apresentar as suas observações no prazo fixado, deve considerar‑se que a denúncia foi retirada».

186    Conforme alterado pelo Regulamento n.o 734/2013, o artigo 20.o, n.o 2, terceiro parágrafo, do Regulamento n.o 659/1999 dispõe que «A Comissão enviará ao queixoso uma cópia da decisão tomada num processo relativo ao assunto da sua denúncia».

187    O artigo 20.o, n.o 2, do Regulamento n.o 659/1999 deve ser lido à luz da regra que figura no ponto 48 do Código de Boas Práticas para a condução dos procedimentos de controlo dos auxílios estatais (JO 2009, C 136, p. 13), que prevê que, em princípio, num prazo de doze meses, a Comissão esforçar‑se‑á por adotar uma decisão relativa aos casos prioritários nos termos do artigo 4.o do Regulamento (CE) n.o 659/1999, com cópia dirigida ao autor da denúncia, ou enviar uma carta inicial ao autor da denúncia onde expõe a sua apreciação preliminar, relativamente a casos não prioritários.

188    Nos termos do segundo e terceiro parágrafos do artigo 20.o, n.o 2, do Regulamento n.o 659/1999, que rege os direitos da parte interessada, a Comissão, depois de ter obtido dessa parte interessada informações relativas a alegados auxílios ilegais ou a uma qualquer utilização abusiva de um auxílio, ou considera que não há motivos suficientes para analisar o caso e informa a parte interessada desse facto ou toma uma decisão sobre o caso que diga respeito às informações fornecidas (Acórdão de 18 de novembro de 2010, NDSHT/Comissão, C‑322/09 P, EU:C:2010:701, n.o 55).

189    Ora, no caso em apreço, a Comissão tomou uma decisão ao examinar as informações fornecidas pela recorrente e ao tomar posição sobre as mesmas.

190    Deve, portanto, concluir‑se que a Comissão não violou o artigo 20.o, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 659/1999.

191    Por conseguinte, a segunda parte do quarto fundamento deve ser julgada improcedente.

192    Há que analisar agora a quarta parte do quarto fundamento e, depois, a terceira parte do quarto fundamento.

h)      Quanto à quarta parte do quarto fundamento, relativa à falta de um exame diligente da denúncia da recorrente

193    Com a quarta parte do quarto fundamento, a recorrente sustenta que a Comissão não efetuou um exame diligente do processo de concurso. Em especial, não pediu informações suplementares aos vendedores e às autoridades alemãs e baseou‑se unicamente nas informações fornecidas pelos administradores às referidas autoridades, cuja fiabilidade deveria ter verificado. Além disso, a Comissão não acolheu o pedido da recorrente de 6 de julho de 2014 convidando‑a a dirigir questões adicionais à República Federal da Alemanha e aos terceiros em causa.

194    A Comissão contesta esta argumentação.

195    Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a Comissão é obrigada a examinar de forma diligente e imparcial as denúncias que recebe em matéria de auxílios de Estado, o que a pode obrigar a instruir uma denúncia, indo além do exame exclusivo dos elementos de facto e de direito levados ao seu conhecimento pelo denunciante e proceder ao exame dos elementos que não foram expressamente evocados pelo denunciante (Acórdãos de 2 de abril de 1998, Comissão/Sytraval e Brink’s France, C‑367/95 P, EU:C:1998:154, n.o 62, e de 2 de setembro de 2010, Comissão/Scott, C‑290/07 P, EU:C:2010:480, n.o 90).

196    No âmbito do controlo dos auxílios de Estado, embora os Estados‑Membros devam, por força do dever de cooperação leal previsto no artigo 4.o, n.o 3, TUE, cooperar com a Comissão, fornecendo‑lhe elementos que lhe permitam pronunciar‑se sobre a natureza de auxílio de Estado da medida em causa, não deixa de ser verdade que a Comissão, por sua vez, está sujeita, no interesse da boa administração das regras fundamentais do Tratado relativas aos auxílios de Estado, a uma obrigação de apreciação diligente e imparcial e que essa obrigação lhe impõe, nomeadamente, que examine cuidadosamente os elementos que lhe são fornecidos pelos Estados‑Membros (v. Acórdão de 22 de outubro de 2008, TV2/Danmark e o./Comissão, T‑309/04, T‑317/04, T‑329/04 e T‑336/04, EU:T:2008:457, n.o 183 e jurisprudência referida).

197    Deste modo, embora a Comissão goze de uma margem de apreciação, não pode, no entanto, atendendo ao seu dever de exame diligente e imparcial, deixar de pedir que lhe sejam comunicados elementos de informação dos quais resulte que são suscetíveis de confirmar, ou infirmar, outros elementos de informação pertinentes para o exame da medida em causa, mas em relação aos quais não se pode considerar que a fiabilidade esteja suficientemente provada (Acórdão de 26 de junho de 2008, SIC/Comissão, T‑442/03, EU:T:2008:228, n.o 225).

198    Por último, é à luz quer das informações notificadas pelo Estado em questão quer das informações fornecidas por eventuais denunciantes que a instituição deve fazer a sua apreciação no quadro da análise preliminar instituída pelo artigo 108.o, n.o 3, TFUE (Acórdão de 3 de maio de 2001, Portugal/Comissão, C‑204/97, EU:C:2001:233, n.o 35).

199    A recorrente critica, com uma primeira alegação, a falta de um exame diligente da sua denúncia, resultante do facto de a Comissão não ter acolhido o seu pedido de 6 de julho de 2014, convidando‑a a dirigir questões adicionais à República Federal da Alemanha e aos terceiros em causa.

200    A este respeito, há que recordar que, como foi exposto no n.o 178, supra, a Comissão não é obrigada tomar posição sobre todos os argumentos perante ela invocados pelos interessados. Basta expor os factos e as considerações jurídicas que se revestem de importância essencial na sistemática da decisão (v. Acórdãos de 1 de julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o., C‑341/06 P e C‑342/06 P, EU:C:2008:375, n.o 96 e jurisprudência referida, e de 3 de março de 2010, Freistaat Sachsen/Comissão, T‑102/07 e T‑120/07, EU:T:2010:62, n.o 180 e jurisprudência referida).

201    Por conseguinte, uma vez que a recorrente não demonstrou que a Comissão não investigou ou verificou os elementos de informação necessários para a adoção da segunda decisão impugnada, esta alegação deve ser julgada improcedente.

202    Com uma segunda alegação, a recorrente critica a falta de um exame diligente da sua denúncia, resultante do facto de a Comissão não ter pedido informações suplementares aos vendedores nem às autoridades alemãs e se ter apoiado unicamente nas informações fornecidas pelos administradores às referidas autoridades.

203    A este respeito, resulta dos documentos dos autos que, na sequência da apresentação da denúncia da recorrente, a Comissão pediu às autoridades alemãs informações em 23 de maio e em 4 e 7 de julho de 2014, que foram fornecidas em 23 de abril, 26 de maio e 10 de julho de 2014. Em 22 de julho e 5 de setembro de 2014, os serviços da Comissão tiveram reuniões com representantes das autoridades alemãs, os administradores e a KPMG.

204    Nos considerandos 272 a 276 da decisão final, a Comissão examinou e comparou com as observações da recorrente, expostas nos considerandos 115 a 120 da referida decisão, as dos administradores comunicadas pelas autoridades alemãs, expostas nos considerandos 121 a 135 dessa mesma decisão. Na referida decisão, a Comissão apresentou as suas próprias constatações e observações relativas aos elementos relevantes, em particular sobre a prova da capacidade de financiamento para a aquisição dos ativos do Nürburgring da recorrente, por um lado, e da Capricorn, por outro.

205    Assim, no caso em apreço, a Comissão procedeu efetivamente ao exame e à apreciação das informações comunicadas tanto pela recorrente como pelas autoridades alemãs. Neste contexto, nada permite concluir que a instrução levada a cabo pela Comissão foi insuficiente ou que esta não cumpriu a sua obrigação de efetuar um exame diligente da denúncia.

206    Assim, há que julgar improcedente esta segunda alegação e, por conseguinte, a quarta parte do quarto fundamento.

i)      Quanto à terceira parte do quarto fundamento, relativa à falta de um exame imparcial da denúncia da recorrente

207    Com a terceira parte do quarto fundamento, a recorrente sustenta que, devido a uma declaração do porta‑voz do membro da Comissão responsável pela concorrência, dada a conhecer pela imprensa em 15 de maio de 2014 (a seguir «declaração controvertida), tornou‑se impossível para a Comissão realizar um exame imparcial da sua denúncia. Resulta dessa declaração, conforme referida no artigo de imprensa apresentado pela recorrente, que, segundo as informações de que a Comissão dispunha, as autoridades alemãs seguiram as orientações dadas pelo membro da Comissão responsável pela concorrência numa carta no início do processo de venda dos ativos do Nürburgring e que estes foram vendidos ao proponente que apresentou a melhor proposta na sequência de um processo de seleção aberto, transparente e não discriminatório, a saber, depois de um concurso legal e ao preço de mercado.

208    A Comissão contesta esta argumentação.

209    Segundo jurisprudência constante em matéria de acordos, decisões, práticas concertadas ou de abuso de posição dominante, uma irregularidade, como divulgações à imprensa, que não se limitam a exprimir o ponto de vista pessoal do membro da Comissão encarregado da concorrência sobre a compatibilidade das medidas examinadas com o direito da União, pode determinar a anulação da decisão sobre essas medidas se se provar que, na falta dessa irregularidade, a referida decisão teria tido um conteúdo diferente (Acórdãos de 16 de dezembro de 1975, Suiker Unie e o./Comissão, 40/73 a 48/73, 50/73, 54/73 a 56/73, 111/73, 113/73 e 114/73, EU:C:1975:174, n.o 91, e de 6 de julho de 2000, Volkswagen/Comissão, T‑62/98, EU:T:2000:180, n.o 283).

210    Em conformidade com esta mesma jurisprudência, incumbe à recorrente apresentar pelo menos indícios que venham sustentar tal conclusão (Acórdão de 15 de março de 2006, BASF/Comissão, T‑15/02, EU:T:2006:74, n.o 606).

211    Esta jurisprudência, que diz respeito à aplicação dos artigos 101.o e 102.o TFUE, pode aplicar‑se, por analogia, a processos em matéria de auxílios de Estado, relativos à aplicação dos artigos 107.o e 108.o TFUE, e, nomeadamente, ao caso em apreço.

212    Ora, em aplicação desta jurisprudência, há que salientar que a recorrente não apresentou qualquer prova ou indício de que, se a declaração controvertida não tivesse sido feita, a decisão final poderia ter tido um conteúdo diferente. Com efeito, o Tribunal Geral constatou que a análise do primeiro, terceiro e quinto fundamentos e da primeira parte do quarto fundamento não permitia concluir que, no termo da fase de análise preliminar, a Comissão se confrontava com dificuldades de apreciação da venda dos ativos do Nürburgring, que exigiam a abertura de um procedimento formal de investigação. O Tribunal Geral constatou igualmente que a quarta parte do quarto fundamento não permitia concluir que a instrução levada a cabo pela Comissão foi insuficiente ou que esta não cumpriu a obrigação de efetuar um exame diligente da denúncia.

213    Sem que seja necessário que o Tribunal Geral se pronuncie sobre a natureza ou o alcance da declaração controvertida, há que julgar improcedente a terceira parte do quarto fundamento e, portanto, o quarto fundamento na sua totalidade.

214    Uma vez que os fundamentos relativos à anulação da segunda decisão impugnada por violação dos direitos processuais que a recorrente retira do artigo 108.o, n.o 2, TFUE, foram julgados improcedentes, há que julgar improcedente o pedido de anulação da referida decisão.

215    A recorrente apresentou diversas propostas de produção de prova testemunhal. Dado que estas não se afiguram indispensáveis para a resolução do litígio e, nomeadamente, para verificar se os factos ou indícios apresentados pela recorrente deveriam ter levado a Comissão a ter dúvidas, não devem ser admitidas.

216    Tendo em conta as considerações precedentes, há que concluir que deve ser negado provimento ao recurso por ser, em parte, inadmissível e, em parte, improcedente.

IV.    Quanto às despesas

217    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que a condenar nas despesas em conformidade com os pedidos da Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção alargada)

decide:

1)      Juntar o pedido de não conhecimento do mérito à análise do mérito.

2)      Julgar improcedente o pedido de não conhecimento do mérito.

3)      Negar provimento ao recurso.

4)      A NeXovation, Inc. suportará as suas próprias despesas e as da Comissão Europeia.

Pelikánová

Valančius

Nihoul

Svenningsen

 

      Öberg

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 19 de junho de 2019.

Assinaturas


Índice


I. Antecedentes do litígio

A. Procedimento administrativo e venda dos ativos do Nürburgring

B. Decisões impugnadas

II. Tramitação processual e pedidos das partes

III. Questão de direito

A. Quanto à admissibilidade do pedido de anulação da primeira decisão impugnada

B. Quanto ao pedido de anulação da segunda decisão impugnada

1. Quanto à admissibilidade e ao pedido de não conhecimento do mérito

2. Quanto ao mérito

a) Considerações preliminares sobre o alcance da fiscalização jurisdicional relativa a uma decisão de inexistência de auxílio adotada no termo da fase de análise preliminar

b) Observações preliminares sobre o objeto do recurso

c) Quanto à primeira parte do quarto fundamento, relativa à existência de dificuldades sérias de apreciação da venda dos ativos do Nürburgring

1) Quanto à duração da fase de análise preliminar

2) Quanto ao conteúdo da segunda decisão impugnada

d) Quanto ao primeiro fundamento, relativo a uma interpretação errada do conceito de auxílio de Estado, no que respeita à concessão de um auxílio de Estado ao adquirente no âmbito do processo de concurso

1) Quanto à primeira parte do primeiro fundamento, relativa à vantagem conferida ao adquirente no âmbito do processo de concurso

i) Quanto à alegação relativa à falta de transparência do processo de concurso

ii) Quanto à alegação relativa ao caráter discriminatório do processo de concurso

iii) Quanto à alegação relativa ao montante e ao financiamento das propostas da Capricorn e da recorrente

2) Quanto à segunda parte do primeiro fundamento, relativa à vantagem conferida ao adquirente no âmbito do contrato de locação dos ativos do Nürburgring

3) Quanto à terceira parte do primeiro fundamento, relativa à utilização de recursos públicos no âmbito da venda dos ativos do Nürburgring ao adquirente

e) Quanto ao terceiro fundamento, relativo à não tomada em consideração da continuação do processo de venda resultante da cessão a um subadquirente da participação detida pela Capricorn no veículo de aquisição dos ativos do Nürburgring

f) Quanto ao quinto fundamento, relativo a falta de fundamentação

g) Quanto à segunda parte do quarto fundamento, relativa à violação do artigo 20.o, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 659/1999

h) Quanto à quarta parte do quarto fundamento, relativa à falta de um exame diligente da denúncia da recorrente

i) Quanto à terceira parte do quarto fundamento, relativa à falta de um exame imparcial da denúncia da recorrente

IV. Quanto às despesas


*      Língua do processo: inglês.