Language of document : ECLI:EU:C:2019:918

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

31 de outubro de 2019 (*)

«Incumprimento de Estado — Recursos próprios — Associação dos países e territórios ultramarinos (PTU) à União Europeia — Decisão 91/482/CEE — Decisão 2001/822/CE — Admissão à importação na União com isenção de direitos aduaneiros dos produtos originários dos PTU — Certificado de circulação de mercadorias EUR. 1 — Emissão irregular de certificados pelas autoridades de um PTU — Direitos aduaneiros não cobrados pelos Estados‑Membros de importação — Artigo 4.o, n.o 3, TUE — Princípio da cooperação leal — Responsabilidade do Estado‑Membro que mantém relações especiais com os PTU em causa — Obrigação de compensar a perda de recursos próprios da União resultante da emissão irregular de certificados EUR. 1 — Importações de leite em pó e de arroz provenientes de Curaçau, bem como de grumos e de sêmolas provenientes de Aruba»

No processo C‑395/17,

que tem por objeto uma ação por incumprimento intentada ao abrigo do artigo 258.o TFUE, apresentada em 30 de junho de 2017,

Comissão Europeia, representada por J.‑F. Brakeland, A. Caeiros, L. Flynn e S. Noë, na qualidade de agentes,

demandante,

contra

Reino dos Países Baixos, representado por M. K. Bulterman, M. H. S. Gijzen, P. Huurnink e J. Langer, na qualidade de agentes,

demandado,

apoiado por:

Reino Unido da GrãBretanha e da Irlanda do Norte, representado, inicialmente, por J. Kraehling, G. Brown, R. Fadoju e S. Brandon, na qualidade de agentes, assistidos por K. Beal, QC, e P. Luckhurst, barristers, em seguida, por S. Brandon e F. Shibli, na qualidade de agentes, assistidos por K. Beal, QC, e P. Luckhurst, barristers,

interveniente,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente, R. Silva de Lapuerta, vice‑presidente, J.‑C. Bonichot, A. Arabadjiev, M. Safjan, S. Rodin, presidentes de secção, J. Malenovský, L. Bay Larsen, T. von Danwitz (relator), C. Toader, C. Vajda, F. Biltgen e K. Jürimäe, juízes,

advogado‑geral: M. Bobek,

secretário: L. Hewlett, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 2 de outubro de 2018,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 6 de fevereiro de 2019,

profere o presente

Acórdão

1        Com a sua petição, a Comissão Europeia pede ao Tribunal de Justiça que declare que, ao não ter compensado a perda dos recursos próprios que deveriam ter sido declarados e colocados à disposição do orçamento da União Europeia em conformidade com o disposto nos artigos 2.o, 6.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento (CEE, Euratom) n.o 1552/89 do Conselho, de 29 de maio de 1989, relativo à aplicação da Decisão 88/376/CEE, Euratom relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades (JO 1989, L 155, p. 1) [que passaram a artigos 2.o, 6.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento (CE, Euratom) n.o 1150/2000 do Conselho, de 22 de maio de 2000, relativo à aplicação da Decisão 94/728/CE, Euratom relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades (JO 2000, L 130, p. 1)], se não tivessem sido emitidos certificados de circulação de mercadorias EUR. 1 em violação, por um lado, do artigo 101.o, n.o 1, da Decisão 91/482/CEE do Conselho, de 25 de julho de 1991, relativa à associação dos países e territórios ultramarinos à Comunidade Económica Europeia (JO 1991, L 263, p. 1; a seguir «Decisão PTU de 1991»), e do artigo 12.o, n.o 6, do anexo II da referida decisão, no que se refere à importação de leite em pó e de arroz provenientes de Curaçau durante o período de 1997/2000, e, por outro, do artigo 35.o, n.o 1, da Decisão 2001/822/CE do Conselho, de 27 de novembro de 2001, relativa à associação dos países e territórios ultramarinos à Comunidade Europeia («Decisão de associação ultramarina») (JO 2001, L 314, p. 1; a seguir «Decisão PTU de 2001»), e do artigo 15.o, n.o 4, do anexo III da referida decisão, no que se refere à importação de grumos e de sêmolas provenientes de Aruba durante o período de 2002/2003, o Reino dos Países Baixos não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 5.o do Tratado CE (que passou a artigo 10.o CE e, em seguida, a artigo 4.o, n.o 3, TUE).

 Quadro jurídico

 Direito internacional

2        A Carta das Nações Unidas foi assinada em São Francisco, em 26 de junho de 1945. O artigo 73.o desta Carta, que consta do capítulo XI desta, com a epígrafe «Declaração relativa a territórios não autónomos», dispõe:

«Os membros das Nações Unidas que assumiram ou assumam responsabilidades pela administração de territórios cujos povos ainda não se governem completamente a si mesmos reconhecem o princípio do primado dos interesses dos habitantes desses territórios e aceitam, como missão sagrada, a obrigação de promover no mais alto grau, dentro do sistema de paz e segurança internacionais estabelecido na presente Carta, o bem‑estar dos habitantes desses territórios, e, para tal fim:

[…]

b.      Promover o seu governo próprio, ter na devida conta as aspirações políticas dos povos e auxiliá‑los no desenvolvimento progressivo das suas instituições políticas livres, de acordo com as circunstâncias peculiares a cada território e seus habitantes, e os diferentes graus do seu adiantamento;

[…]»

 Direito da União

 Tratado CE

3        Os factos que estão na origem do incumprimento imputado são, simultaneamente, anteriores e posteriores à entrada em vigor do Tratado de Amesterdão, que alterou o Tratado CE. Contudo, as disposições relevantes para a presente ação por incumprimento mantiveram‑se, no essencial, idênticas. O artigo 5.o do Tratado CE (que passou a artigo 10.o CE) tinha a seguinte redação:

«Os Estados‑Membros tomarão todas as medidas gerais ou especiais capazes de assegurar o cumprimento das obrigações decorrentes do presente Tratado ou resultantes de atos das instituições da Comunidade. Os Estados‑Membros facilitarão à Comunidade o cumprimento da sua missão.

Os Estados‑Membros abster‑se‑ão de tomar quaisquer medidas suscetíveis de pôr em perigo a realização dos objetivos do presente Tratado.»

4        No essencial, esta disposição foi substituída pelo artigo 4.o, n.o 3, TUE.

5        A parte IV deste Tratado, com a epígrafe «A associação dos países e territórios ultramarinos», agrupava os artigos 131.o a 137.o deste (que passaram, após alteração, a artigos 182.o CE a 188.o CE e, em seguida, a artigos 198.o a 204.o TFUE). Nos termos do referido artigo 131.o (que passou, após alteração, a artigo 182.o CE e, em seguida, a artigo 198.o TFUE):

«Os Estados‑Membros acordam em associar à Comunidade os países e territórios não europeus que mantêm relações especiais com a Bélgica, a Dinamarca, a França, a Itália, os Países Baixos e o Reino Unido. Estes países e territórios, a seguir denominados “países e territórios”, vêm enumerados na lista constante do anexo IV do presente Tratado.

A finalidade da associação é promover o desenvolvimento económico e social dos países e territórios e estabelecer relações económicas estreitas entre eles e a Comunidade no seu conjunto.

Em conformidade com os princípios enunciados no preâmbulo do presente Tratado, a associação deve servir, fundamentalmente, para favorecer os interesses dos habitantes desses países e territórios e para fomentar a sua prosperidade de modo a conduzi‑los ao desenvolvimento económico, social e cultural a que aspiram.»

6        O artigo 133.o, n.o 1, do referido Tratado (que passou, após alteração, a artigo 184.o, n.o 1, CE e, em seguida, a artigo 200.o, n.o 1, TFUE) previa:

«As importações originárias dos países e territórios beneficiarão, ao entrarem nos Estados‑Membros, da eliminação total dos direitos aduaneiros que, nos termos do presente Tratado, se deve progressivamente realizar entre os Estados‑Membros.»

7        De acordo com o artigo 136.o do mesmo Tratado (que passou, após alteração, a artigo 187.o CE e, em seguida, a artigo 203.o TFUE):

«Durante um período inicial de cinco anos a contar da data da entrada em vigor do presente Tratado, uma Convenção de aplicação, anexa a este Tratado, fixará as modalidades e o processo de associação entre os países e territórios e a Comunidade.

Antes do termo d[a] vigência da Convenção prevista no parágrafo anterior, o Conselho, deliberando por unanimidade, aprovará as disposições a prever para um novo período, com base nos resultados conseguidos e nos princípios enunciados no presente Tratado.»

8        O artigo 227.o, n.os 1 e 3, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 299.o, n.os 1 e 3, CE e, em seguida, a artigo 52.o, n.o 1, TUE e a artigo 355.o, n.o 2, TFUE) dispunha:

«1.      O presente Tratado é aplicável ao Reino da Bélgica, ao Reino da Dinamarca, à República Federal da Alemanha, à República Helénica, ao Reino de Espanha, à República Francesa, à Irlanda, à República Italiana, ao Grão‑Ducado do Luxemburgo, ao Reino dos Países Baixos, à República da Áustria, à República Portuguesa, à República da Finlândia, ao Reino da Suécia e ao Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte.

[…]

3.      O regime especial de associação definido na parte IV do presente Tratado é aplicável aos países e territórios ultramarinos, cuja lista consta do anexo IV deste Tratado.

O presente Tratado não é aplicável aos países e territórios ultramarinos que mantenham relações especiais com o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte não mencionados na lista referida no parágrafo anterior.»

9        A lista que figura no anexo IV do Tratado CE (que passou, após alteração, a anexo II do Tratado CE e, em seguida, a anexo II do Tratado FUE), com a epígrafe «Países e Territórios Ultramarinos aos quais se aplicam as disposições da parte IV do Tratado», incluía, nomeadamente, Aruba e as Antilhas Neerlandesas, entre as quais constava Curaçau.

 Regulamentos n.o 1552/89 e n.o 1150/2000

10      Os artigos 2.o, 6.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento n.o 1552/89 (que passaram a artigos 2.o, 6.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento n.o 1150/2000) regularam, sucessivamente, à época dos factos, as condições em que os Estados‑Membros eram obrigados a declarar e a colocar à disposição do orçamento da União os recursos próprios desta, entre os quais figuravam os direitos aduaneiros.

 Decisões PTU de 1991 e de 2001

11      O primeiro considerando da Decisão PTU de 1991 previa:

«Considerando que é necessário estabelecer para um novo período as disposições aplicáveis à associação dos países e territórios ultramarinos, a seguir denominados “PTU”, à Comunidade Económica Europeia; que essas disposições se aplicam aos territórios dependentes da República Francesa, aos países e territórios dependentes do Reino Unido, aos países dependentes do Reino dos Países Baixos e, em parte, à Gronelândia.»

12      Nos termos do artigo 1.o desta decisão, esta tinha por objetivo promover e acelerar o desenvolvimento económico, cultural e social e o reforço das estruturas económicas dos PTU enumerados no anexo I da referida decisão. O n.o 4 deste anexo referia as Antilhas Neerlandesas, de que Curaçau fazia parte, bem como Aruba, como PTU do Reino dos Países Baixos.

13      O artigo 6.o, primeiro parágrafo, da Decisão PTU de 1991 dispunha:

«No âmbito das suas competências respetivas, as autoridades que participam no processo de parceria referido no artigo 10.o da presente decisão examinarão periodicamente os resultados da aplicação da decisão, emitirão os pareceres e tomarão as iniciativas necessárias para a realização dos objetivos da presente decisão.»

14      Nos termos do artigo 10.o desta decisão:

«A fim de permitir às autoridades competentes locais dos PTU, no âmbito das constituições respetivas dos Estados‑Membros de que dependem, serem mais estreitamente associados à aplicação dos princípios da associação dos PTU à CEE, respeitando as competências dos poderes centrais respetivos dos Estados‑Membros em questão, é instituído um processo de consultas baseado no princípio da parceria entre a Comissão, o Estado e o PTU.

Esta parceria, cujas modalidades se encontram fixadas nos artigos 234.o a 236.o da presente decisão, permitirá examinar as realizações no âmbito da associação e debater os problemas que se coloquem eventualmente nas relações entre os PTU e a Comunidade.»

15      O artigo 101.o, n.o 1, da referida decisão tinha a seguinte redação:

«Os produtos originários dos [PTU] podem ser importados na Comunidade com isenção de direitos aduaneiros e de encargos de efeito equivalente.»

16      De acordo com o artigo 108.o, n.o 1, primeiro travessão, da Decisão PTU de 1991, o conceito de produtos originários e os métodos de cooperação administrativa a eles relativos encontravam‑se definidos no anexo II desta.

17      Nos termos do artigo 234.o desta decisão:

«A ação comunitária apoia‑se tanto quanto possível numa concertação estreita entre a Comissão, o Estado‑Membro a que se encontra sujeito um PTU e as autoridades locais competentes dos PTU.

Esta concertação é a seguir denominada “parceria”.»

18      O artigo 235.o, n.os 1 e 2, da referida decisão previa:

«1.      A parceria refere‑se à programação, à preparação, ao financiamento, ao acompanhamento e à avaliação das ações empreendidas pela Comunidade no âmbito da presente decisão, bem como a todos os problemas que se coloquem nas relações entre os PTU e a Comunidade.

2.      Para o efeito, podem ser criados grupos de trabalho de associação dos PTU, de caráter consultivo e compostos pelos três parceiros referidos no artigo 234.o, quer por zona geográfica de PTU quer por grupo de PTU dependentes de um mesmo Estado‑Membro, a pedido, nomeadamente dos PTU em questão. Estes grupos serão constituídos:

–        quer numa base ad hoc, para tratar problemas específicos,

–        quer numa base permanente, para o período abrangido pela decisão de associação; neste caso, deverão reunir‑se no mínimo uma vez por ano para apreciar a execução da presente decisão ou para tratar as outras questões referidas no n.o 1.»

19      De acordo com o artigo 237.o da mesma decisão:

«Sem prejuízo das disposições específicas relativas às relações entre os PTU e os departamentos franceses ultramarinos previstas na presente decisão, esta aplica‑se aos territórios em que o Tratado que institui a Comunidade Económica Europeia é aplicável, nas condições nele previstas, por um lado, e aos territórios dos PTU, por outro.»

20      O artigo 1.o do anexo II da Decisão PTU de 1991, relativo à definição do conceito de «produtos originários» e aos métodos de cooperação administrativa, dispunha:

«Para efeitos da aplicação das disposições da decisão relativas à cooperação comercial, considera‑se um produto como originário dos países e territórios a seguir denominados “PTU”, da Comunidade ou dos Estados ACP quando tenha sido inteiramente obtido ou suficientemente transformado nesses Estados.»

21      O artigo 12.o, n.os 1 e 6, deste anexo previa:

«1.      Para efeitos do presente anexo, a prova do caráter originário dos produtos é fornecida pelo certificado de circulação de mercadorias EUR. 1, cujo modelo consta do anexo 4 do presente anexo.

[…]

6.      A emissão do certificado de circulação de mercadorias EUR. 1 é efetuada pelas autoridades aduaneiras do PTU de exportação, se as mercadorias puderem ser consideradas como produtos originários na aceção do presente protocolo.»

22      O artigo 26.o do referido anexo, com a epígrafe «Controlo dos certificados de circulação EUR. 1 e dos formulários EUR. 2», enunciava:

«1.      O controlo a posteriori dos certificados de circulação de mercadorias EUR. 1 ou dos formulários EUR. 2 é efetuado por amostragem e sempre que as autoridades aduaneiras do Estado de importação tenham dúvidas fundadas quanto à autenticidade do documento ou quanto à exatidão das informações relativas à origem real da mercadoria em causa.

[…]

6.      Quando o processo de controlo ou qualquer outra informação disponível parecer indicar que as disposições do presente anexo não são respeitadas, o PTU por sua própria iniciativa ou a pedido da Comunidade efetuará os inquéritos necessários ou tomará as medidas para que esses inquéritos sejam efetuados com a urgência necessária a fim de detetar e evitar infrações dessa natureza. A Comissão pode participar nesses inquéritos.

[…]

7.      As contestações que não puderem ser resolvidas entre as autoridades aduaneiras do Estado de importação e as do Estado de exportação ou que suscitem um problema de interpretação do presente anexo serão submetidas ao Comité de Origem, instituído pelo [Regulamento (CEE) n.o 802/68 do Conselho, de 27 de junho de 1968, relativo à definição comum da noção de origem das mercadorias (JO 1968, L 148, p. 1; EE 02 F1 p. 5)].»

23      Nos termos do artigo 12.o, n.o 1, deste regulamento, o Comité de Origem é constituído por representantes dos Estados‑Membros e presidido por um representante da Comissão.

24      A Decisão PTU de 1991 manteve‑se em vigor até 1 de dezembro de 2001. Em 2 de dezembro deste mesmo ano, entrou em vigor a Decisão PTU de 2001. O artigo 4.o, n.o 1, desta última decisão dispunha:

«No quadro da parceria prevista no artigo 7.o, as autoridades de cada PTU serão as principais responsáveis pela definição das estratégias de associação e de desenvolvimento e pela sua implementação através da elaboração, juntamente com a Comunidade e o Estado‑Membro a que o PTU em causa esteja ligado, de Documentos Únicos de Programação […] e de programas de cooperação.»

25      O artigo 7.o da Decisão PTU de 2001 previa:

«1.      A fim de dar aos PTU a possibilidade de participarem plenamente na implementação da Associação dos PTU à CE, tendo devidamente em conta a forma como estão organizadas as instituições dos Estados‑Membros em causa, a Associação apoia‑se num procedimento de concertação, assente nas disposições adiante referidas, que contemplará todos os problemas que se coloquem nas relações entre os PTU e a Comunidade.

[…]

3.      Haverá parcerias distintas entre a Comissão, o Estado‑Membro a que o PTU está ligado e cada PTU, representado pelas respetivas autoridades, a fim de permitir pôr em prática os princípios enunciados na presente decisão, em especial os referidos nos artigos [4.o] e 19.o Esta concertação trilateral é em seguida denominada “parceria”.

Para cada PTU, serão criados grupos de trabalho de parceria, que terão caráter consultivo. Os grupos serão compostos pelos três referidos parceiros. Estes grupos poderão ser convocados a pedido da Comissão, de um Estado‑Membro ou de um PTU. A pedido de um dos parceiros, poderão ser realizadas reuniões conjuntas entre vários grupos, a fim de se estudarem assuntos de interesse comum ou aspetos regionais da associação.

4.      Esta concertação será concretizada respeitando plenamente as competências institucionais, jurídicas e financeiras respetivas de cada um dos três parceiros.

[…]»

26      O artigo 35.o desta decisão enunciava:

«1.      Os produtos originários dos PTU são importados para a Comunidade com isenção de direitos de importação.

2.      A noção de produtos originários e os métodos de cooperação administrativa relacionados com a mesma são definidos no anexo III.»

27      O artigo 2.o do anexo III da referida decisão, relativo à definição do conceito de «produtos originários» e aos métodos de cooperação administrativa, determinava, no seu n.o 1, os produtos que eram considerados originários dos PTU.

28      Nos termos do artigo 14.o, n.o 1, alínea a), deste anexo, os produtos originários dos PTU beneficiavam, quando da importação para a Comunidade, das disposições da Decisão PTU de 2001, mediante apresentação de um certificado EUR. 1.

29      O artigo 15.o, n.os 1 e 4, do referido anexo previa:

«1.      O certificado de circulação EUR. 1 é emitido pelas autoridades aduaneiras do PTU de exportação, mediante pedido escrito do exportador ou, sob a sua responsabilidade, do seu representante habilitado.

[…]

4.      As autoridades aduaneiras do PTU de exportação emitem o certificado de circulação EUR. 1 quando os produtos em causa puderem ser considerados originários dos PTU, da Comunidade ou dos Estados ACP e cumprirem os outros requisitos do presente anexo.»

30      O artigo 32.o do anexo III da Decisão PTU de 2001, com a epígrafe «Controlo da prova de origem», tinha a seguinte redação:

«1.      Com vista a assegurar a correta aplicação do presente anexo, os PTU, a Comunidade e os Estados ACP prestarão assistência mútua, por intermédio das administrações aduaneiras competentes, no controlo da autenticidade dos certificados de circulação EUR. 1 ou das declarações na fatura, e da exatidão das menções inscritas nesses documentos.

[…]

2.      Os controlos subsequentes da prova de origem efetuar‑se‑ão por amostragem ou sempre que as autoridades aduaneiras do país de importação tenham dúvidas fundadas quanto à autenticidade do documento, à qualidade de originário dos produtos em causa ou quanto ao cumprimento dos outros requisitos do presente anexo.

[…]

8.      Caso o procedimento de controlo ou qualquer outra informação disponível levem a supor que as disposições do presente anexo estão a ser infringidas, o PTU, por sua própria iniciativa ou a pedido da Comunidade, efetuará os inquéritos necessários, ou tomará medidas para a realização desses inquéritos com a devida urgência, a fim de identificar e prevenir tais infrações. A Comissão pode participar nos inquéritos.»

31      O artigo 34.o deste anexo, com a epígrafe «Resolução de litígios», enunciava, no seu primeiro parágrafo:

«Em caso de litígio relativamente aos procedimentos de controlo previstos nos artigos 32.o e 33.o, que não possa ser resolvido entre as autoridades aduaneiras que requerem o controlo e as autoridades aduaneiras responsáveis pela sua realização, ou em caso de dúvida quanto à interpretação do presente anexo, os mesmos serão submetidos ao Comité do Código Aduaneiro — Secção “Origem”, instituído pelo [Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho, de 12 de outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (JO 1992, L 302, p. 1)].»

32      Nos termos do artigo 247.o, n.o 1, deste regulamento, o Comité do Código Aduaneiro era composto por representantes dos Estados‑Membros e presidido por um representante da Comissão.

 Código Aduaneiro

33      O artigo 220.o, n.o 2, alínea b), e o artigo 239.o do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho, de 12 de outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (JO 1992, L 302, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 2700/2000 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de novembro de 2000 (JO 2000, L 311, p. 17) (a seguir «Código Aduaneiro»), especificavam as condições em que os Estados‑Membros podiam não efetuar um registo de liquidação a posteriori dos direitos aduaneiros ou proceder ao reembolso ou à dispensa do pagamento desses direitos.

 Regulamento (CE, Euratom) n.o 1605/2002

34      O Regulamento (CE, Euratom) n.o 1605/2002 do Conselho, de 25 de junho de 2002, que institui o Regulamento Financeiro aplicável ao orçamento geral das Comunidades Europeias (JO 2002, L 248, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE, Euratom) n.o 1995/2006 do Conselho, de 13 de dezembro de 2006 (JO 2006, L 390, p. 1) (a seguir «Regulamento Financeiro»), dispõe, no seu artigo 73.o‑A:

«Sem prejuízo das disposições da regulamentação específica e da aplicação da Decisão do Conselho relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades, os créditos das Comunidades sobre terceiros, bem como os créditos de terceiros sobre as Comunidades são sujeitos a um prazo de prescrição de cinco anos.

A data a considerar para o cálculo do prazo de prescrição e as condições para a sua interrupção serão fixadas nas normas de execução.»

 Regulamento (CE, Euratom) n.o 2342/2002

35      O artigo 85.o‑B do Regulamento (CE, Euratom) n.o 2342/2002 da Comissão, de 23 de dezembro de 2002, que estabelece as normas de execução do Regulamento n.o 1605/2002 (JO 2002, L 357, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE, Euratom) n.o 478/2007 da Comissão, de 23 de abril de 2007 (JO 2007, L 111, p. 13) (a seguir «Regulamento de Execução»), com a epígrafe «Prazos de prescrição», dispõe, no seu n.o 1, primeiro parágrafo:

«O prazo de prescrição dos créditos das Comunidades sobre terceiros começa a correr na data em que termina o prazo comunicado ao devedor na nota de débito […].»

 Direito neerlandês

36      De acordo com o Statuut voor het Koninkrijk der Nederlanden (Estatuto do Reino dos Países Baixos), na versão aplicável durante o período controvertido, o Reino dos Países Baixos era constituído por três países (landen), ou seja, os Países Baixos (Nederland), as Antilhas Neerlandesas (Nederlandse Antilhan) e Aruba. Durante esse período, Curaçau era parte integrante das Antilhas Neerlandesas.

37      Por força do disposto no artigo 3.o, n.o 1, alínea b), deste Estatuto, as relações externas eram «da competência do Reino».

38      De acordo com o artigo 50.o, n.o 1, do referido Estatuto:

«As medidas legislativas e administrativas nas Antilhas Neerlandesas e em Aruba que sejam contrárias ao presente Estatuto, a um instrumento internacional, a uma lei do Reino ou a um regulamento de administração pública para o Reino, ou a interesses cuja promoção ou proteção seja da competência do Reino, podem ser suspensas e anuladas pelo rei, na qualidade de chefe do Reino, através de decreto fundamentado. […]»

39      O artigo 51.o do mesmo Estatuto tinha a seguinte redação:

«Se um órgão das Antilhas Neerlandesas ou de Aruba não cumprir ou não cumprir adequadamente as suas funções de acordo com o presente Estatuto, com um instrumento internacional, com uma lei do Reino ou com um regulamento de administração pública para o Reino, pode estabelecer‑se através de regulamento de administração pública para o Reino, que deverá indicar a base jurídica e os seus fundamentos, de que forma essas funções devem ser cumpridas.»

40      O artigo 52.o do Estatuto do Reino dos Países Baixos dispunha:

«Com o acordo do rei, a regulamentação do país pode conferir ao rei, na qualidade de chefe do Reino, ou ao governador, na qualidade de órgão do Reino, poderes relativamente aos assuntos desse país.»

 Factos na origem do litígio

41      Entre 1997 e 2000, foram importados leite em pó e arroz provenientes de Curaçau, para a Alemanha, e, entre 2002 e 2003, grumos e sêmolas provenientes de Aruba, para os Países Baixos.

42      As autoridades de Curaçau e de Aruba tinham emitido certificados de circulação de mercadorias EUR. 1 (a seguir «certificados EUR. 1») para essas mercadorias, embora estas não cumprissem os requisitos exigidos para serem consideradas produtos de origem preferencial nos termos do disposto no artigo 101.o, n.o 1, da Decisão PTU de 1991 e do artigo 35.o, n.o 1, da Decisão PTU de 2001.

43      A emissão dos certificados EUR. 1 pelas autoridades de Curaçau e de Aruba foi objeto de inquéritos realizados pelo Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF). Este publicou os seus relatórios de missão relativos a Curaçau e a Aruba, respetivamente, em 24 de outubro de 2000 e 23 de dezembro de 2004.

44      Na sequência desses inquéritos, a Comissão informou as autoridades neerlandesas e alemãs sobre o caráter irregular destes certificados EUR. 1 e convidou‑as a cobrar os direitos aduaneiros relativos às importações correspondentes. As autoridades neerlandesas e alemãs declararam apenas uma parte desses direitos aduaneiros, por terem considerado que a dívida da quantia remanescente havia prescrito.

45      Por cartas, respetivamente, de 27 de janeiro e 31 de maio de 2012, a Comissão considerou o Reino dos Países Baixos responsável pelo erro cometido pelas autoridades de Curaçau e de Aruba. Pediu ao Reino dos Países Baixos que compensasse, respetivamente, até 20 de março e 20 de julho de 2012, o mais tardar, a perda de recursos próprios daí resultante.

 Procedimento précontencioso

46      Não tendo o Reino dos Países Baixos dado seguimento àquele pedido, a Comissão enviou a este Estado‑Membro, em 21 de novembro de 2013, uma notificação para cumprir, à qual as autoridades neerlandesas responderam, em 20 de fevereiro de 2014, rejeitando toda e qualquer responsabilidade pelos atos dos seus PTU.

47      Em 17 de outubro de 2014, a Comissão enviou ao Reino dos Países Baixos um parecer fundamentado, no qual mantinha a posição expressa na sua notificação para cumprir. O prazo para adotar as medidas necessárias para dar cumprimento ao parecer fundamentado terminou em 17 de dezembro de 2014.

48      Por carta de 19 de novembro de 2015, o Reino dos Países Baixos respondeu ao parecer fundamentado, mantendo a sua posição de rejeição de toda e qualquer responsabilidade.

49      A Comissão decidiu então intentar a presente ação.

 Quanto à ação

 Quanto à admissibilidade da ação

 Argumentos das partes

50      O Reino dos Países Baixos contesta a admissibilidade da ação pelo facto de a petição ser ambígua e não apresentar com coerência e precisão o fundamento do incumprimento das obrigações decorrentes do artigo 5.o do Tratado CE (que passou a artigo 10.o CE e, em seguida, a artigo 4.o, n.o 3, TUE) que lhe é imputado. A este respeito, o Reino dos Países Baixos salienta que, em determinados números da petição, a Comissão parece alegar que este Estado‑Membro é responsável pelos atos das autoridades aduaneiras dos seus PTU, como se estas constituíssem autoridades deste Estado‑Membro, enquanto, noutros números, o critica por não ter adotado medidas adequadas para impedir a emissão irregular de certificados EUR. 1 por aquelas autoridades.

51      A Comissão alega que a sua ação é admissível.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

52      Decorre de jurisprudência constante relativa ao artigo 120.o, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça que qualquer petição inicial deve indicar com clareza e precisão o objeto do litígio e conter a exposição sumária dos fundamentos invocados, para permitir ao demandado preparar a sua defesa e ao Tribunal de Justiça exercer a sua fiscalização. Daqui resulta que os elementos essenciais de facto e de direito em que uma ação se baseia devem decorrer, de forma coerente e compreensível, do texto da própria petição e que os pedidos desta última devem ser formulados de forma inequívoca, a fim de evitar que o Tribunal de Justiça decida ultra petita ou não decida quanto a uma acusação (Acórdão de 11 de julho de 2018, Comissão/Bélgica, C‑356/15, EU:C:2018:555, n.o 32 e jurisprudência referida).

53      O Tribunal de Justiça declarou igualmente que, no âmbito de uma ação intentada nos termos do artigo 258.o TFUE, esta deve apresentar as acusações de forma coerente e precisa, para permitir ao Estado‑Membro e ao Tribunal de Justiça apreenderem exatamente o alcance da violação do direito da União imputada, condição necessária para que esse Estado possa apresentar utilmente os seus meios de defesa e para que o Tribunal de Justiça possa verificar a existência do incumprimento alegado (Acórdão de 11 de julho de 2018, Comissão/Bélgica, C‑356/15, EU:C:2018:555, n.o 33 e jurisprudência referida).

54      Em especial, a ação da Comissão deve conter uma exposição coerente e pormenorizada das razões que a conduziram à convicção de que o Estado‑Membro em causa não cumpriu uma das obrigações que lhe incumbem por força dos Tratados (Acórdão de 11 de julho de 2018, Comissão/Bélgica, C‑356/15, EU:C:2018:555, n.o 34 e jurisprudência referida).

55      No presente caso, há que observar que a Comissão indica com precisão a disposição do direito da União alegadamente violada pelo Reino dos Países Baixos, isto é, o artigo 5.o do Tratado CE (que passou a artigo 10.o CE e, em seguida, a artigo 4.o, n.o 3, TUE), bem como os factos criticados a este Estado‑Membro, ou seja, a falta de compensação do montante, acrescido de juros, correspondente à perda de recursos próprios tradicionais resultante da emissão, pelas autoridades de Curaçau e de Aruba, de certificados EUR. 1 em violação das Decisões PTU de 1991 e de 2001.

56      Além disso, embora a petição da Comissão se refira a uma eventual omissão de adoção, pelos Países Baixos, das medidas adequadas para evitar tal emissão irregular, decorre claramente desta petição que a ação da Comissão não tem por objeto essa eventual omissão, mas apenas a falta de compensação, pelo Reino dos Países Baixos, da perda de recursos próprios tradicionais resultante da emissão irregular dos certificados EUR. 1 em causa.

57      Por outro lado, como o advogado‑geral salientou, no essencial, no n.o 43 das suas conclusões, o facto de a referida petição não especificar se, na opinião da Comissão, essa emissão irregular é o resultado de atos das autoridades de Curaçau e de Aruba imputáveis ao Reino dos Países Baixos ou a consequência da omissão de adoção, por este Estado‑Membro, das medidas adequadas para evitar tal emissão não impediu este Estado‑Membro de exercer efetivamente os seus direitos de defesa no que diz respeito ao incumprimento imputado.

58      Por conseguinte, a exceção de inadmissibilidade suscitada pelo Reino dos Países Baixos deve ser julgada improcedente.

 Quanto ao mérito

 Argumentos das partes

59      A Comissão sustenta que o Reino dos Países Baixos está obrigado, por força do princípio da cooperação leal consagrado no artigo 5.o do Tratado CE (que passou a artigo 10.o CE e, em seguida, a artigo 4.o, n.o 3, TUE), a compensar a perda de recursos próprios tradicionais resultante do facto de as autoridades de Curaçau e de Aruba terem emitido certificados EUR. 1 em violação das disposições das Decisões PTU de 1991 e de 2001 e, desse modo, impedido os Estados‑Membros de importação de recuperar determinados direitos aduaneiros relativos às importações em causa.

60      A este respeito, a Comissão considera, em primeiro lugar, que o Reino dos Países Baixos deve, na qualidade de Estado‑Membro, assumir a responsabilidade pelos atos adotados e pelas negligências cometidas pelas autoridades de Curaçau e de Aruba, contrárias às Decisões PTU de 1991 e de 2001, atendendo às relações especiais que mantinha com esses PTU, os quais, de acordo com a Comissão, não eram Estados independentes e faziam ambos parte integrante desse Reino.

61      A Comissão acrescenta que o Reino dos Países Baixos não pode invocar a autonomia administrativa de que beneficiavam Curaçau e Aruba, de acordo com o Estatuto do Reino dos Países Baixos, para justificar a inobservância das suas obrigações decorrentes do princípio da cooperação leal. Além disso, a autonomia desses PTU não é absoluta, na medida em que, ao abrigo dos artigos 50.o a 52.o deste Estatuto, as autoridades do Reino dos Países Baixos dispõem dos poderes que permitem assegurar o respeito, pelas autoridades de Curaçau e de Aruba, do disposto nas Decisões PTU de 1991 e de 2001.

62      Em segundo lugar, a Comissão recorda que o princípio da cooperação leal impõe aos Estados‑Membros a adoção de todas as medidas adequadas para garantir o alcance e a eficácia do direito da União. No caso em apreço, a emissão irregular de certificados EUR. 1 pelas autoridades de Curaçau e de Aruba impediu a cobrança dos direitos aduaneiros e a colocação destes direitos à disposição do orçamento da União como recursos próprios. Ora, ao não ter compensado esta perda de recursos próprios, o Reino dos Países Baixos entravou o bom funcionamento do sistema de recursos próprios da União, na medida em que a referida perda deve ser compensada por todos os Estados‑Membros através de um aumento dos recursos próprios baseado no rendimento nacional bruto. Por conseguinte, a proteção do orçamento da União exige que o Reino dos Países Baixos possa ser responsabilizado a título da violação, pelas autoridades de Curaçau e de Aruba, das Decisões PTU de 1991 e de 2001 e obrigado a compensar a consequente perda de recursos.

63      Em terceiro lugar, a Comissão sustenta que o Reino dos Países Baixos está obrigado a pagar juros de mora sobre o montante correspondente a essa perda de recursos próprios. De acordo com a Comissão, a obrigação de pagar tais juros de mora não se baseia na regulamentação da União em matéria de recursos próprios, mas decorre diretamente da obrigação de cooperação leal, tendo em conta o nexo indissociável existente entre a obrigação de declarar os recursos próprios da União, a de os inscrever na conta da Comissão nos prazos fixados e, por último, a de pagar juros de mora.

64      O Reino dos Países Baixos, apoiado pelo Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, contesta o incumprimento que lhe é imputado. Em primeiro lugar, embora admita que é diretamente responsável pelos atos dos países que o compõem, o Reino dos Países Baixos considera que esta responsabilidade abrange apenas a violação de obrigações que lhe incumbem na qualidade de Estado‑Membro da União.

65      De acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça decorrente do Parecer  1/78 (Acordo internacional sobre a borracha natural), de 4 de outubro de 1979 (EU:C:1979:224, n.o 62), há que determinar em que qualidade pode responsabilizado o Reino dos Países Baixos, ou seja, enquanto Estado‑Membro da União ou enquanto representante dos seus PTU nas relações internacionais. Ora, nos termos do artigo 227.o, n.o 3, do Tratado CE (que passou a artigo 299.o, n.o 3, CE e, em seguida, a artigo 355.o, n.o 2, TFUE), o âmbito de aplicação territorial deste Tratado limita‑se à parte europeia do Reino, isto é, os Países Baixos, ao passo que os PTU se regem exclusivamente pelo regime especial que é objeto da parte IV do referido Tratado. Assim, as disposições gerais deste mesmo Tratado não são aplicáveis aos PTU quando não haja referência expressa nesse sentido. Em especial, os PTU devem ser tratados como países terceiros, no que se refere à importação das mercadorias na União. Por conseguinte, não se pode considerar que os PTU sejam parte integrante do Estado‑Membro ao qual estão associados.

66      Neste contexto, o Reino dos Países Baixos sublinha que, uma vez que só o Reino tem a qualidade de sujeito de direito internacional público e a competência para celebrar tratados, ratificou o Tratado CE apenas no que diz respeito aos Países Baixos, pelo que apenas estes estão vinculados pelos direitos e pelas obrigações resultantes da sua adesão à União.

67      O Reino dos Países Baixos considera que, atendendo à autonomia de que dispunham as Antilhas Neerlandesas e Aruba, a tese segundo a qual os Países Baixos são responsáveis pelos atos das autoridades destes PTU contraria o artigo 4.o, n.o 2, TUE e o artigo 73.o da Carta das Nações Unidas. De acordo com as disposições do Estatuto do Reino dos Países Baixos, não se pode considerar que as Antilhas Neerlandesas e Aruba faziam parte dos Países Baixos durante o período controvertido, pois, embora esses dois territórios tivessem, à semelhança dos Países Baixos, o estatuto de países (landen) do Reino dos Países Baixos, cada um deles dispunha da sua própria Staatsregeling (Lei Fundamental) e gozava de grande autonomia ao nível do Reino. De resto, os artigos 50.o a 52.o do Estatuto do Reino dos Países Baixos não conferem aos Países Baixos nenhum poder relativamente às autoridades de Curaçau e de Aruba, prevendo apenas a possibilidade de adotar decisões em relação a esses territórios no Conselho de Ministros do Reino.

68      Em segundo lugar, o Reino dos Países Baixos alega que a obrigação de compensação e de pagamento de juros de mora invocada não encontra fundamento na regulamentação da União relativa aos recursos próprios nem nas Decisões PTU de 1991 e de 2001. Assim, admitir semelhante obrigação contraria o princípio da segurança jurídica. O Reino dos Países Baixos acrescenta que a Comissão também não se pode basear, a este respeito, no artigo 5.o do Tratado CE (que passou a artigo 10.o CE e, em seguida, a artigo 4.o, n.o 3, TUE), sem demonstrar que os Países Baixos violaram as obrigações que lhe incumbem por força do direito da União. Ora, a Comissão não apresentou prova nesse sentido e limitou‑se a afirmar que os Países Baixos não reagiram «de maneira adequada» face à infração cometida pelos PTU em causa.

69      O Reino dos Países Baixos salienta ainda que, de acordo com as Decisões PTU de 1991 e de 2001, a emissão dos certificados EUR. 1 incumbia unicamente às autoridades dos PTU, sendo que as autoridades dos Estados‑Membros não dispunham de nenhuma possibilidade de ingerência nem estavam sujeitas a nenhuma responsabilidade a este respeito. Em especial, estas Decisões PTU de 1991 e de 2001 previam um sistema de cooperação administrativa entre, por um lado, as autoridades dos PTU e, por outro, a Comissão e as autoridades dos Estados‑Membros, que permitia verificar o cumprimento destas decisões e abordar diretamente, para este efeito, as autoridades dos PTU. Além disso, os problemas entre os PTU e a União deviam ser resolvidos no âmbito da parceria.

70      Além do mais, questionar a responsabilidade dos Países Baixos enquanto Estado‑Membro é contrário ao princípio da segurança jurídica e ao princípio da boa administração. A este respeito, o Reino dos Países Baixos sustenta que, contrariamente à jurisprudência decorrente do Acórdão de 13 de novembro de 2014, Nencini/Parlamento (C‑447/13 P, EU:C:2014:2372, n.o 48), a Comissão não atuou num prazo razoável, na medida em que esta instituição pediu a colocação à disposição dos direitos aduaneiros em questão, respetivamente, mais de sete anos e mais de onze anos depois de o OLAF ter detetado as irregularidades em causa.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

71      A título preliminar, há que sublinhar que, embora, à época do comportamento das autoridades de Curaçau e de Aruba que está na origem da presente ação por incumprimento, o princípio da cooperação leal estivesse consagrado no artigo 5.o do Tratado CE e, posteriormente, tivesse sido consagrado no artigo 10.o CE, estas disposições, quando a Comissão pediu ao Reino dos Países Baixos que compensasse a perda de recursos próprios que, na sua opinião, resulta desse comportamento, tinham sido substituídas pelo artigo 4.o, n.o 3.o TUE. Daqui decorre que a ação deve ser analisada à luz do princípio da cooperação leal conforme consagrado nesta última disposição.

72      Por força do artigo 4.o, n.o 3, segundo parágrafo, TUE, o Reino dos Países Baixos, na qualidade de Estado‑Membro da União, está obrigado a tomar todas as medidas gerais ou específicas adequadas para garantir a execução das suas obrigações decorrentes dos Tratados ou dos atos das instituições da União.

73      Para este efeito, embora incumba a todas as autoridades deste Estado‑Membro assegurar o respeito pelas normas do direito da União no âmbito das suas competências, o referido Estado‑Membro continua a ser, por força do artigo 258.o TFUE, o único responsável, perante a União, pelo cumprimento das obrigações que resultam deste direito (v., neste sentido, Acórdãos de 4 de outubro de 2012, Byankov, C‑249/11, EU:C:2012:608, n.o 64 e jurisprudência referida, e de 13 de maio de 2014, Comissão/Espanha, C‑184/11, EU:C:2014:316, n.o 43 e jurisprudência referida).

74      Ora, como a Comissão esclareceu na sua réplica, a presente ação por incumprimento não se baseia em erros cometidos pelas autoridades dos Países Baixos, mas na responsabilidade deste Estado‑Membro pela perda de recursos próprios resultante da violação, que não é contestada, das disposições das Decisões PTU de 1991 e de 2001 que regem a emissão de certificados EUR. 1 pelas autoridades de Curaçau e de Aruba.

75      Conforme resulta do artigo 227.o, n.o 3, do Tratado CE, lido em conjugação com o anexo IV deste (que passaram a artigo 299.o, n.o 3, CE e a anexo II do Tratado CE e, em seguida, a artigo 355.o, n.o 2, TFUE e a anexo II do Tratado FUE), Curaçau e Aruba figuravam entre os PTU enumerados no referido anexo e estavam, por este motivo, sujeitos ao regime especial de associação definido na parte IV do Tratado CE, que agrupava os artigos 131.o a 137.o deste (que passaram a artigos 182.o CE a 188.o CE e, em seguida, a artigos 198.o a 204.o TFUE), regime cujas modalidades e procedimentos foram definidos nas Decisões PTU de 1991 e de 2001, com base no artigo 136.o do referido Tratado (que passou a artigo 187.o CE e, em seguida, a artigo 203.o TFUE).

76      Neste contexto, importa sublinhar que, embora o Tribunal de Justiça já tenha declarado que as disposições gerais do Tratado CE, a saber, as que não figuram na parte IV deste, não são aplicáveis aos PTU sem referência expressa (Acórdão de 5 de junho de 2014, X e TBG, C‑24/12 e C‑27/12, EU:C:2014:1385, n.o 45 e jurisprudência referida), o incumprimento imputado ao Reino dos Países Baixos não está abrangido pela situação contemplada nesta jurisprudência. Com efeito, a Comissão não alega que o princípio da cooperação leal se aplica a Curaçau e a Aruba, mas sustenta que o Reino dos Países Baixos está obrigado, por força deste princípio, a responder pelas consequências da emissão irregular de certificados EUR. 1 pelas autoridades de Curaçau e de Aruba. Ora, como se recordou no n.o 72 do presente acórdão, o referido princípio impõe‑se ao Reino dos Países Baixos, na qualidade de Estado‑Membro da União.

77      À luz destas considerações, há que analisar, em primeiro lugar, se o Reino dos Países Baixos é responsável, por força das obrigações que lhe incumbem, na qualidade de Estado‑Membro, a título do artigo 4.o, n.o 3, TUE, perante a União, pela eventual emissão de certificados EUR. 1 realizada pelas autoridades de Curaçau e de Aruba em violação das Decisões PTU de 1991 e de 2001, em segundo lugar, se Reino dos Países Baixos está obrigado, por força desta disposição, a compensar o montante — sendo caso disso, acrescido de juros de mora — da eventual perda de recursos próprios da União daí resultante e, em terceiro lugar, em caso de resposta afirmativa, se o incumprimento imputado ao Reino dos Países Baixos tem fundamento.

–       Quanto à responsabilidade do Reino dos Países Baixos devido à eventual emissão irregular de certificados EUR. 1 pelas autoridades de Curaçau e de Aruba

78      A Comissão sustenta que é devido às relações especiais que ligam Curaçau e Aruba ao Reino dos Países Baixos que este Estado‑Membro deve responder, perante a União, pelos atos e omissões das autoridades de Curaçau e de Aruba, quando estas emitiram certificados EUR. 1 em violação das Decisões PTU de 1991 e de 2001.

79      O Reino dos Países Baixos é um dos Estados‑Membros que, de acordo com o artigo 131.o, primeiro parágrafo, do Tratado CE (que passou a artigo 182.o, primeiro parágrafo, CE e, em seguida, a artigo 198.o, primeiro parágrafo, TFUE), mantêm «relações especiais» com PTU. Nos termos desta disposição, a sujeição destes países e territórios ao regime especial de associação definido na parte IV do Tratado CE baseava‑se, à época da emissão desses certificados, nessas relações especiais.

80      As referidas relações especiais caracterizam‑se pelo facto de os PTU não serem Estados independentes, mas constituírem países e territórios que dependem desse Estado, o qual garante, nomeadamente, a sua representação no plano internacional [v., neste sentido, Parecer 1/78 (Acordo internacional sobre a borracha natural), de 4 de outubro de 1979, EU:C:1979:224, n.o 62, e Parecer 1/94 (Acordos anexos ao acordo que cria a OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 17].

81      Nos termos do artigo 131.o do Tratado CE (que passou a artigo 182.o CE e, em seguida, a artigo 198.o TFUE), só beneficiam da aplicação do regime especial de associação definido na parte IV deste Tratado, que visa promover o desenvolvimento económico, social e cultural dos PTU, os países e territórios que mantêm relações especiais com o Estado‑Membro em questão, o qual pediu que o regime especial de associação lhes fosse aplicável. No que diz respeito, concretamente, a Curaçau e Aruba, que faziam parte das Antilhas Neerlandesas quando da entrada em vigor do Tratado CEE, os Estados‑Membros celebraram a Convenção 64/533/CEE, de 13 de novembro de 1962, que alterou o Tratado que institui a Comunidade Económica Europeia, com vista a tornar aplicável às Antilhas Neerlandesas o regime especial de associação definido na parte IV deste Tratado (JO 1964, 150, p. 2414).

82      Assim, os termos utilizados, nomeadamente, no primeiro considerando, bem como no artigo 234.o e no artigo 235.o, n.o 2, da Decisão PTU de 1991 e, em especial, nos artigos 4.o e 7.o da Decisão PTU de 2001, para designar o Estado‑Membro «a que o PTU em causa esteja ligado» ou o Estado‑Membro «a que estão ligados» os PTU, constituem a expressão das relações especiais existentes entre estes, nos termos do artigo 131.o, primeiro parágrafo, do Tratado CE (que passou a artigo 182.o, primeiro parágrafo, CE e, em seguida, a artigo 198.o, primeiro parágrafo, TFUE). Esta interpretação é corroborada pelo artigo 1.o da Decisão PTU de 1991, lido em conjugação com o anexo I, n.o 4, desta, do qual resulta que Curaçau e Aruba eram PTU «do» Reino dos Países Baixos.

83      Além disso, no âmbito do referido regime especial de associação, os produtos originários de Curaçau e de Aruba beneficiavam de um acesso privilegiado ao mercado interno com isenção de direitos aduaneiros e de encargos de efeito equivalente, em conformidade com o artigo 133.o, n.o 1, do Tratado CE (que passou a artigo 184.o, n.o 1, CE e, em seguida, a artigo 200.o, n.o 1, TFUE), lido em conjugação com o artigo 101.o, n.o 1, o artigo 108.o, n.o 1, primeiro travessão, e o anexo II da Decisão PTU de 1991 (artigo 35.o e anexo III da Decisão PTU de 2001).

84      Ora, a emissão de certificados EUR. 1 era regida pelo direito da União. De facto, nos termos do artigo 12.o, n.o 6, do anexo II da Decisão PTU de 1991 (artigo 15.o, n.o 4, do anexo III da Decisão PTU de 2001), o qual era aplicável aos territórios dos PTU por força do seu artigo 237.o, estes certificados, que comprovavam essa origem, deviam ser emitidos pelas autoridades dos PTU. Assim, quando estas autoridades emitiam tais certificados, estavam obrigadas a respeitar as exigências constantes do anexo II da Decisão PTU de 1991 (anexo III da Decisão PTU de 2001).

85      Além disso, os procedimentos previstos nas Decisões PTU de 1991 e de 2001 para resolver os diferendos ou os problemas que pudessem surgir neste contexto refletiam o caráter central que revestiam, para o regime de associação definido na parte IV do Tratado CE, as relações especiais, na aceção do artigo 131.o, primeiro parágrafo, do Tratado CE (que passou a artigo 182.o, primeiro parágrafo, CE e, em seguida, a artigo 198.o, primeiro parágrafo, TFUE), entre o PTU em causa e o Estado‑Membro a que se encontrava sujeito.

86      A este respeito, importa ter em conta, em especial, o artigo 26.o, n.o 7, do anexo II da Decisão PTU de 1991 e o artigo 34.o do anexo III da Decisão PTU de 2001, nos termos dos quais os diferendos relativos à legalidade dos certificados EUR. 1 que não pudessem ser resolvidos entre as autoridades aduaneiras do Estado de importação e as do PTU de exportação deviam sê‑lo ao nível do Comité de Origem e, depois, do Comité do Código Aduaneiro, no âmbito de um procedimento em que participava, nomeadamente, um representante do Estado‑Membro a que o PTU de exportação estava sujeito, mas não as autoridades locais competentes desse PTU.

87      Além disso, no que respeita à eventual resolução de problemas que viessem a colocar‑se no contexto de uma emissão irregular de certificados EUR. 1 no âmbito da parceria referida nos artigos 234.o e 235.o da Decisão PTU de 1991 (posteriormente, artigo 7.o da Decisão PTU de 2001), há que constatar que esta parceria não podia assentar num diálogo bilateral entre o PTU em causa e a Comissão, antes tornava necessária uma concertação trilateral na qual deviam participar, além da Comissão, o Estado‑Membro a que o PTU se encontrava sujeito e as autoridades locais competentes deste. Nos termos do artigo 10.o, primeiro parágrafo, da Decisão PTU de 1991, a participação do Estado‑Membro a que o PTU se encontrava sujeito nessa concertação trilateral era necessária para garantir o respeito pelas «competências dos poderes centrais respetivos dos Estados‑Membros em questão». De modo semelhante, o artigo 7.o, n.o 1, da Decisão PTU de 2001 punha a tónica na necessidade de respeitar «a forma como estão organizadas as instituições dos Estados‑Membros em causa».

88      Nestas condições, a existência de relações especiais, na aceção do artigo 131.o, primeiro parágrafo, do Tratado CE (que passou a artigo 182.o, primeiro parágrafo, CE e, em seguida, a artigo 198.o, primeiro parágrafo, TFUE), entre o Reino dos Países Baixos e os seus PTU pode dar origem a uma responsabilidade específica deste Estado‑Membro perante a União, quando as autoridades destes PTU emitam certificados EUR. 1 em violação das referidas decisões.

89      Todavia, o Reino dos Países Baixos contesta a existência de tal responsabilidade. Primeiro, sustenta que, uma vez que o Tratado CE foi ratificado apenas pelos Países Baixos, há que distinguir entre Curaçau e Aruba, por um lado, e o Reino dos Países Baixo, na qualidade de Estado‑Membro, por outro, nos termos da jurisprudência decorrente do Parecer  1/78 (Acordo internacional sobre a borracha natural), de 4 de outubro de 1979 (EU:C:1979:224, n.o 62). Segundo, o Reino dos Países Baixos entende que o sistema de cooperação administrativa estabelecido nas Decisões PTU de 1991 e de 2001 permitia abordar diretamente as autoridades dos referidos PTU, pelo que a Comissão não pode responsabilizar o Reino dos Países Baixos pelos atos daquelas autoridades ao abrigo do artigo 4.o, n.o 3, TUE. Terceiro, o reconhecimento de tal responsabilidade afeta a autonomia destes PTU, em violação do artigo 4.o, n.o 2, TUE e do artigo 73.o da Carta das Nações Unidas.

90      No que diz respeito ao primeiro argumento, é certo que o Tribunal de Justiça decidiu, no essencial, no n.o 62 do parecer referido no número anterior, que, quando um Estado‑Membro celebra um acordo internacional como representante internacional de um PTU que depende do referido Estado, não atua na qualidade de Estado‑Membro. Ora, essa constatação, que permitiu ao Tribunal de Justiça concluir que tal representação não tinha impacto na «delimitação das esferas de competência dentro da Comunidade», não é pertinente para apreciar a responsabilidade de um Estado‑Membro no contexto da emissão, pelas autoridades de um PTU que depende desse Estado‑Membro, de certificados EUR. 1 em violação das Decisões PTU de 1991 e de 2001, emissão que era regulada pelas normas do direito da União aplicáveis no território dos PTU.

91      Quanto ao segundo argumento do Reino dos Países Baixos, relativo ao sistema de cooperação administrativa estabelecido pelas Decisões PTU de 1991 e de 2001, é verdade que, em conformidade com o disposto no artigo 26.o, n.o 6, do anexo II da Decisão PTU de 1991 e, posteriormente, no artigo 32.o, n.o 8, do anexo III da Decisão PTU de 2001, incumbia às autoridades do PTU em causa, nomeadamente, efetuar os inquéritos necessários quando o processo de controlo referido no artigo 26.o, n.o 1, do anexo II da primeira decisão e, posteriormente, no artigo 32.o, n.o 2, do anexo III da segunda decisão ou qualquer outra informação disponível parecesse indicar que as disposições destes anexos não eram respeitadas. Contudo, por um lado, estas mesmas disposições previam que a Comissão «pode participar» nos inquéritos que visassem detetar e evitar infrações às disposições que regem a emissão dos certificados EUR. 1, sem que lhe fosse imposta uma obrigação a este respeito. Por outro lado, embora o artigo 26.o, n.o 7, do anexo II da Decisão PTU de 1991 e, posteriormente, o artigo 34.o do anexo III da Decisão PTU de 2001 previssem que os litígios decorrentes de tais inquéritos ou que suscitassem um problema de interpretação «serão submetidos» a um procedimento de regulação de diferendos, resulta dos próprios termos destas disposições que estas visavam unicamente os litígios que surgissem entre o Estado de importação e o PTU de exportação e, consequentemente, não se impunham à Comissão.

92      Por outro lado, contrariamente ao que o Reino dos Países Baixos sustenta, as disposições relativas à concertação denominada «parceria» também não se opõem a que um Estado‑Membro possa ser responsabilizado, nos termos do artigo 4.o, n.o 3, TUE, pela emissão irregular de certificados EUR. 1 pelas autoridades dos seus PTU. De facto, de acordo com a própria redação do artigo 234.o da Decisão PTU de 1991, a ação da União devia apenas apoiar‑se «tanto quanto possível» nessa concertação entre a Comissão, o Estado‑Membro a que o PTU se encontrava sujeito e as autoridades locais competentes deste último. Além disso, de acordo com o artigo 235.o, n.o 2, dessa decisão, «podem ser criados» grupos de trabalho de associação, a pedido, nomeadamente, dos PTU em questão, para tratar de todos os problemas que se coloquem entre os PTU e a União. De modo semelhante, o artigo 7.o, n.o 3, da Decisão PTU de 2001 previa apenas que os grupos de trabalho de parceria instituídos por cada PTU «poderão ser convocados» a pedido, nomeadamente, de um PTU. Assim, embora seja verdade que este processo de parceria, no presente caso, não foi aplicado, também é verdade que a redação destas disposições indica que estas conferiam natureza facultativa a tal aplicação.

93      O terceiro argumento, relativo à autonomia constitucional de Curaçau e de Aruba, também não pode proceder, uma vez que o Reino dos Países Baixos não explica como é que a responsabilidade de um Estado‑Membro pelos atos dos seus PTU, que não prejudica as missões que as Decisões PTU de 1991 e de 2001 confiam a estes últimos, pode afetar a autonomia destes.

94      Importa ainda apreciar a questão de saber quais são os tipos de erros cometidos por um PTU no contexto da emissão de certificados EUR. 1 pelos quais deve ser considerado responsável o Estado‑Membro a que este se encontra sujeito.

95      A este respeito, resulta do princípio da cooperação leal, consagrado no artigo 4.o, n.o 3, TUE, que os Estados‑Membros são obrigados a adotar todas as medidas adequadas para garantir o alcance e a eficácia do direito da União (v., neste sentido, Acórdãos de 7 de outubro de 2010, Stils Met, C‑382/09, EU:C:2010:596, n.o 44, e de 5 de dezembro de 2017, Alemanha/Conselho, C‑600/14, EU:C:2017:935, n.o 94).

96      Ora, atendendo ao caráter preferencial e derrogatório do regime aduaneiro de que beneficiavam os produtos originários dos PTU, nas condições previstas no artigo 133.o, n.o 1, do Tratado CE (que passou a artigo 184.o, n.o 1, CE e, em seguida, a artigo 200.o, n.o 1, TFUE) e no artigo 101.o, n.o 1, lido em conjugação com o artigo 108.o, n.o 1, primeiro travessão, e com o anexo II da Decisão PTU de 1991 (artigo 35.o e anexo III da Decisão PTU de 2001), a obrigação recordada no número anterior impõe‑se com especial rigor no presente caso. Por conseguinte, a responsabilidade perante a União que cabe ao Estado‑Membro ao qual um PTU esteja sujeito estende‑se, por força do disposto no artigo 4.o, n.o 3, TUE, a qualquer erro cometido pelas autoridades deste PTU, no contexto da emissão de certificados EUR. 1.

97      Face a todas estas considerações, há que concluir que o Reino dos Países Baixos, por força das obrigações que lhe incumbem na qualidade de Estado‑Membro nos termos do artigo 131.o, primeiro parágrafo, do Tratado CE (que passou a artigo 182.o, primeiro parágrafo, CE e, em seguida, a artigo 198.o, primeiro parágrafo, TFUE) e do artigo 4.o, n.o 3, TUE, é responsável, perante a União, por uma eventual emissão pelas autoridades de Curaçau e de Aruba de certificados EUR. 1 em violação das Decisões PTU de 1991 e de 2001 [v., por analogia, Acórdão, hoje proferido, Comissão/Reino Unido (Responsabilidade por atos de um PTU), C‑391/17, n.o 95].

–       Quanto à obrigação de compensar uma eventual perda de recursos próprios, por força do artigo 4.o, n.o 3, TUE

98      É jurisprudência constante que, por força do princípio da cooperação leal, os Estados‑Membros são obrigados a eliminar as consequências ilícitas da violação do direito da União. Por conseguinte, compete às autoridades dos Estados‑Membros adotar, no âmbito das suas competências, todas as medidas necessárias para sanar uma violação deste direito (v., neste sentido, Acórdãos de 21 de junho de 2007, Jonkman e o., C‑231/06 a C‑233/06, EU:C:2007:373, n.os 37 e 38; de 26 de julho de 2017, Comune di Corridonia e o., C‑196/16 e C‑197/16, EU:C:2017:589, n.o 35 e jurisprudência referida; e de 27 de junho de 2019, Belgisch Syndicaat van Chiropraxie e o., C‑597/17, EU:C:2019:544, n.o 54).

99      Na medida em que a emissão de um certificado EUR. 1 em violação das Decisões PTU de 1991 e de 2001 impede, nas condições previstas no artigo 220.o, n.o 2, alínea b), e no artigo 239.o do Código Aduaneiro, as autoridades do Estado‑Membro de importação em causa de cobrar os direitos aduaneiros que deviam ter cobrado se tal certificado EUR. 1 não tivesse sido emitido, a perda de recursos próprios tradicionais da União daí resultante constitui a consequência ilícita de uma violação do direito da União. Com efeito, de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, tal perda deve ser compensada quer com outro recurso próprio quer com uma adaptação das despesas (v., por analogia, Acórdãos de 15 de novembro de 2005, Comissão/Dinamarca, C‑392/02, EU:C:2005:683, n.o 54; e de 5 de outubro de 2006, Comissão/Alemanha, C‑105/02, EU:C:2006:637, n.o 88).

100    Por conseguinte, o Estado‑Membro que é responsável, perante a União, pela emissão irregular de tal certificado está obrigado, em conformidade com o princípio da cooperação leal, a adotar todas as medidas necessárias para sanar essa violação do direito da União e, em especial, deve compensar a perda de recursos próprios daí resultante [v., por analogia, Acórdão, hoje proferido, Comissão/Reino Unido (Responsabilidade por atos de um PTU), C‑391/17, n.o 98].

101    No que se refere, mais especificamente, à questão de saber se ao montante de tal perda de recursos próprios devem, se for caso disso, acrescer juros de mora, basta salientar que a mera compensação do montante dos direitos aduaneiros que não puderam ser cobrados não é suficiente para eliminar as consequências ilícitas da emissão irregular de um certificado EUR. 1.

102    Esta interpretação não pode ser posta em causa pelo argumento relativo ao princípio da segurança jurídica, invocado pelo Reino dos Países Baixos e pelo Reino Unido, segundo o qual tal obrigação de compensação não pode existir se não houver uma disposição expressa a esse respeito no direito da União. Com efeito, a obrigação de compensar a perda de recursos próprios resultante da emissão irregular de certificados EUR. 1 constitui apenas uma expressão específica da obrigação, decorrente do princípio da cooperação leal, segundo a qual os Estados‑Membros são obrigados a adotar todas as medidas necessárias para sanar uma violação do direito da União e eliminar as respetivas consequências ilícitas. Como resulta da jurisprudência constante recordada no n.o 98 do presente acórdão, esta última obrigação abrange todas as consequências ilícitas da violação desse direito, nomeadamente as que são de natureza financeira, como as que estão em causa no presente caso.

103    Contudo, os juros de mora só são calculados a partir da data do pedido apresentado ao Estado‑Membro em questão tendo em vista compensar a referida perda de recursos próprios.

104    Face a todas estas considerações, há que concluir que o Estado‑Membro que é responsável perante a União pela emissão irregular de certificados EUR. 1 por um PTU a ele sujeito está obrigado, em conformidade com o princípio da cooperação leal, a compensar uma eventual perda de recursos próprios, acrescida, se for caso disso, de juros de mora.

–       Quanto ao incumprimento imputado

105    Decorre dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça que, entre 1997 e 2000, bem como entre 2002 e 2003, foram importadas para os Países Baixos e para a Alemanha, com isenção de direitos de importação, mercadorias que beneficiaram de certificados EUR. 1 emitidos pelas autoridades de Curaçau e de Aruba.

106    É facto assente entre as partes que os certificados EUR. 1 em causa foram emitidos pelas referidas autoridades, apesar de as mercadorias em questão não cumprirem os requisitos exigidos para serem consideradas produtos de origem preferencial, nos termos do disposto no artigo 101.o, n.o 1, da Decisão PTU de 1991 e do artigo 35.o, n.o 1, da Decisão PTU de 2001. É igualmente facto assente que a violação destas disposições implicou para a União uma perda de recursos próprios, a título de direitos de importação.

107    Nestas condições, o Reino dos Países Baixos está obrigado, em conformidade com o artigo 4.o, n.o 3, TUE, a compensar o montante desta perda de recursos próprios, conforme a Comissão lhe pediu por cartas de 27 de janeiro e 31 de maio de 2012.

108    Todavia, o Reino dos Países Baixos alega que os princípios da segurança jurídica e da boa administração se opõem, no presente caso, à possibilidade de declarar que esta obrigação de compensação não foi cumprida, porque a Comissão não lhe pediu para proceder a essa compensação num prazo razoável, em conformidade com a jurisprudência decorrente do Acórdão de 13 de novembro de 2014, Nencini/Parlamento (C‑447/13 P, EU:C:2014:2372, n.o 48).

109    A este respeito, há que recordar que a jurisprudência decorrente do acórdão referido no número anterior diz respeito ao artigo 85.o‑B do Regulamento de Execução, que fixa o momento em que começa a correr o prazo de prescrição de cinco anos do artigo 73.o‑A do Regulamento Financeiro na data em que termina o prazo comunicado ao devedor na nota de débito.

110    É certo que, no referido acórdão, o Tribunal de Justiça declarou que, no silêncio dos textos aplicáveis, o princípio da segurança jurídica exige que a instituição em causa proceda a essa comunicação num prazo razoável, esclarecendo ainda que se deve presumir que o prazo de comunicação de uma nota de débito não é razoável quando essa comunicação seja efetuada depois de um período de cinco anos a contar do momento em que a instituição estava, em princípio, em condições de exigir o seu crédito (v., neste sentido, Acórdão de 13 de novembro de 2014, Nencini/Parlamento, C‑447/13 P, EU:C:2014:2372, n.os 48 e 49).

111    Contudo, sem que seja necessário analisar se o artigo 73.o‑A do Regulamento Financeiro e o artigo 85.o‑B do Regulamento de Execução se aplicam à obrigação de compensar uma perda de recursos próprios nos termos do artigo 4.o, n.o 3, TUE, como a que está em causa no caso em apreço, há que observar que a Comissão, em todo o caso, não ultrapassou o prazo de cinco anos para além do qual se deve presumir que o prazo de comunicação de uma nota de crédito não é razoável, segundo a jurisprudência decorrente do acórdão referido no número anterior. Com efeito, as partes não contestam que a perda de recursos próprios da União resultante da emissão irregular de certificados EUR. 1 pelas autoridades de Curaçau e de Aruba só se tornou definitiva em 2009. Na medida em que, antes dessa data, a Comissão não podia pedir a compensação da referida perda, há que considerar que esta respeitou o referido prazo de cinco anos quando, em 2012, pediu ao Reino dos Países Baixos que procedesse a essa compensação.

112    Consequentemente, há que declarar que, ao não ter compensado a perda de recursos próprios resultante da emissão irregular, à luz da Decisão PTU de 1991 e, posteriormente, da Decisão PTU de 2001, pelas autoridades de Curaçau e de Aruba, de certificados EUR. 1, no que se refere, respetivamente, a importações de leite em pó e de arroz provenientes de Curaçau durante o período de 1997/2000 e a importações de grumos e de sêmolas provenientes de Aruba durante o período de 2002/2003, o Reino dos Países Baixos não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do disposto no artigo 4.o, n.o 3, TUE.

 Quanto às despesas

113    Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação do Reino dos Países Baixos nas despesas e tendo este sido vencido, há que condená‑lo nas despesas.

114    Em aplicação do artigo 140.o, n.o 1, do mesmo Regulamento de Processo, segundo o qual os Estados‑Membros que intervenham no litígio devem suportar as suas próprias despesas, o Reino Unido suporta as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) decide:

1)      Ao não ter compensado a perda dos recursos próprios resultante da emissão irregular, à luz da Decisão 91/482/CEE do Conselho, de 25 de julho de 1991, relativa à associação dos países e territórios ultramarinos à Comunidade Económica Europeia, e, posteriormente, da Decisão 2001/822/CE do Conselho, de 27 de novembro de 2001, relativa à associação dos países e territórios ultramarinos à Comunidade Europeia, pelas autoridades de Curaçau e de Aruba, de certificados de circulação de mercadorias EUR. 1, no que se refere, respetivamente, a importações de leite em pó e de arroz provenientes de Curaçau durante o período de 1997/2000 e a importações de grumos e de sêmolas provenientes de Aruba durante o período de 2002/2003, o Reino dos Países Baixos não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do disposto no artigo 4.o, n.o 3, TUE.

2)      O Reino dos Países Baixos é condenado nas despesas.

3)      O Reino Unido da GrãBretanha e da Irlanda do Norte suporta as suas próprias despesas.

Assinaturas


* Língua do processo: neerlandês