Language of document : ECLI:EU:T:2022:556

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção alargada)

14 de setembro de 2022 (*)

«Acesso aos documentos — Regulamento (CE) n.o 1049/2001 — Comité Permanente dos Vegetais, Animais e Alimentos para Consumo Humano e Animal — Documento de orientação da EFSA relativo à avaliação dos riscos dos produtos fitofarmacêuticos para as abelhas — Posições individuais dos Estados‑Membros — Recusa de acesso — Artigo 4.o n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001 — Exceção relativa à proteção do processo decisório»

Nos processos apensos T‑371/20 e T‑554/20,

Pollinis France, com sede em Paris (França), representada por C. Lepage e T. Bégel, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por S. Delaude, C. Ehrbar e G. Gattinara, na qualidade de agentes,

recorrida,

O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção alargada),

composto por: A. Marcoulli (relatora), presidente, S. Frimodt Nielsen, J. Schwarcz, C. Iliopoulos e R. Norkus, juízes,

secretário: P. Cullen, administrador,

vistos os autos,

vista a Decisão de 15 de dezembro de 2020 de apensar os processos T‑371/20 e T‑554/20 para efeitos da conclusão da fase escrita do processo, da eventual fase oral e da decisão que põe termo à instância,

após a audiência de 6 de maio de 2022,

profere o presente

Acórdão

1        Com o seu recurso baseado no artigo 263.o TFUE, a recorrente, Pollinis France, pede a anulação da Decisão C(2020) 4231 final da Comissão, de 19 de junho de 2020 (a seguir «primeira decisão impugnada»), e da Decisão C(2020) 5120 final da Comissão, de 21 de julho de 2020 (a seguir «segunda decisão impugnada»), através das quais lhe foi recusado o acesso a determinados documentos relativos ao documento de orientação da Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA) sobre a avaliação dos riscos dos produtos fitofarmacêuticos para as abelhas, adotado pela EFSA em 27 de junho de 2013, publicado inicialmente em 4 de julho de 2013 e republicado depois em 4 de julho de 2014 (a seguir «documento de orientação sobre as abelhas de 2013») e lhe foi concedido um acesso parcial a determinados outros documentos relativos ao documento de orientação sobre as abelhas de 2013.

I.      Antecedentes do litígio

2        A recorrente é uma organização não governamental francesa que opera em defesa do ambiente e tem o objetivo de proteger as abelhas selvagens e comuns e promover a agricultura sustentável com o intuito de ajudar a preservar os polinizadores.

A.      Processo T371/20

3        Em 27 de janeiro de 2020, ao abrigo do Regulamento (CE) n.o 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO 2001, L 145, p. 43), e do Regulamento (CE) n.o 1367/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de setembro de 2006, relativo à aplicação das disposições da Convenção de Aarhus sobre o acesso à informação, participação do público no processo de tomada de decisão e acesso à justiça em matéria de ambiente às instituições e órgãos comunitários (JO 2006, L 264, p. 13), a recorrente apresentou à Comissão Europeia um pedido de acesso a determinados documentos relativos ao documento de orientação sobre as abelhas de 2013.

4        Após contactos que a Comissão teve com a recorrente para definir e reduzir o âmbito do seu pedido, este pedido foi limitado, em substância, aos documentos que consignam a posição dos Estados‑Membros, dos membros do Comité Permanente dos Vegetais, Animais e Alimentos para Consumo Humano e Animal (Standing Committee on Plants, Animals, Food and feeds) (a seguir «Scopaff») e da Comissão no que respeita ao documento de orientação sobre as abelhas de 2013, bem como a qualquer projeto sobre este assunto recebido ou redigido pela Comissão desde o mês de outubro de 2018.

5        Por carta de 16 de março de 2020, a Comissão recenseou 25 documentos abrangidos pelo pedido de acesso da recorrente, indicou que 6 documentos (documentos 20 a 25) estavam disponíveis no sítio Internet Europa e indeferiu o pedido de acesso para os restantes 19 documentos (documentos 1 a 19) ao abrigo da exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001. Decorre do quadro anexado a esta carta que os referidos documentos 1 a 19 são mensagens de correio eletrónico, por vezes acompanhadas de anexos, enviadas por determinados Estados‑Membros no âmbito do Scopaff entre janeiro e julho de 2019 e relativas, em substância, ao documento de orientação sobre as abelhas de 2013 ou à sua aplicação, designadamente a um projeto de alteração dos princípios uniformes de avaliação e de autorização dos produtos fitofarmacêuticos referidos pelo artigo 29.o, n.o 6, do Regulamento (CE) n.o 1107/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de outubro de 2009, relativo à colocação dos produtos fitofarmacêuticos no mercado e que revoga as Diretivas 79/117/CEE e 91/414/CEE do Conselho (JO 2009, L 309, p. 1) (a seguir «princípios uniformes»).

6        Em 25 de março de 2020, a recorrente apresentou um pedido confirmativo de acesso aos documentos.

7        Por mensagem de correio eletrónico de 15 de abril de 2020, a Comissão informou a recorrente de que o prazo para responder ao pedido confirmativo de acesso devia ser prorrogado e, por mensagem de correio eletrónico de 11 de maio de 2020, informou a recorrente de que não estava em condições de lhe comunicar uma resposta ao pedido confirmativo dentro do referido prazo prorrogado.

8        Perante a falta de resposta expressa ao pedido confirmativo, a recorrente interpôs, em 15 de junho de 2020, um recurso destinado a obter a anulação da decisão tácita de indeferimento (a seguir «decisão tácita de indeferimento»), em conformidade com o artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001.

9        Através da primeira decisão impugnada, transmitida à recorrente por mensagem de correio eletrónico de 22 de junho de 2020, a Comissão respondeu expressamente ao pedido confirmativo, ao conceder um acesso parcial ao documento 2, indeferindo o acesso a determinadas partes deste documento ao abrigo das exceções previstas no artigo 4.o, n.o 1, alínea b), e no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, e ao indeferir o acesso a todos os outros documentos visados por esse pedido (documentos 1 e 3 a 19) ao abrigo da exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001.

B.      Processo T554/20

10      Em 8 de abril de 2020, a recorrente apresentou à Comissão um segundo pedido de acesso a determinados documentos relativos ao documento de orientação sobre as abelhas de 2013. Este pedido era referente, em substância, à correspondência, ordens de trabalhos, atas ou relatórios das reuniões entre os membros do Scopaff e alguns funcionários ou membros da Comissão a respeito do documento de orientação sobre as abelhas de 2013 no período compreendido entre julho de 2013 e setembro de 2018.

11      Por carta de 8 de maio de 2020, a Comissão recenseou 59 documentos abrangidos pelo segundo pedido de acesso da recorrente e indeferiu este pedido para todos esses documentos ao abrigo da exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001. Decorre do quadro anexado a esta carta que os referidos documentos são mensagens de correio eletrónico ou «comentários», por vezes acompanhados de anexos, enviados por determinados Estados‑Membros no âmbito do Scopaff entre setembro de 2013 e dezembro de 2018 e relativos, em substância, ao documento de orientação sobre as abelhas de 2013 ou à sua aplicação (a seguir, em conjunto com os documentos 1 a 19 referidos no n.o 5, supra, «documentos pedidos»).

12      Em 25 de maio de 2020, a recorrente apresentou um pedido confirmativo de acesso aos referidos documentos.

13      Por correio eletrónico de 17 de junho de 2020, a Comissão informou a recorrente de que o prazo para responder ao pedido confirmativo devia ser prorrogado.

14      Através da segunda decisão impugnada, a Comissão respondeu ao pedido confirmativo, ao conceder um acesso parcial a quatro documentos (documentos 3, 10, 12 e 33), indeferindo o acesso a determinadas partes destes documentos ao abrigo das exceções previstas no artigo 4.o, n.o 1, alínea b), e no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, e ao indeferir o acesso a todos os outros documentos visados por esse pedido (documentos 1, 2, 4 a 9, 11, 13 a 32 e 34 a 59) ao abrigo da exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001. A Comissão precisou, ainda, que os referidos documentos eram todos mensagens de correio eletrónico.

II.    Pedidos das partes

15      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        declarar o articulado de adaptação da petição admissível e procedente no processo T‑371/20;

–        declarar o recurso admissível e procedente no processo T‑554/20;

–        anular a primeira e a segunda decisão impugnada;

–        condenar a Comissão a pagar à recorrente 3 000 euros a título de despesas em cada processo apenso.

16      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        declarar o recurso contra a decisão tácita de indeferimento desprovido de objeto e o articulado de adaptação da petição inadmissível e, a título subsidiário, negar provimento ao recurso por ser infundado no processo T‑371/20;

–        negar provimento ao recurso no processo T‑554/20;

–        julgar inadmissível o pedido de condenação da Comissão no pagamento de 3 000 euros a título de despesas em cada processo apenso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

III. Questão de direito

17      A recorrente apresenta quatro fundamentos, substancialmente idênticos, contra cada uma das decisões impugnadas.

18      O primeiro fundamento é relativo, em substância, à violação do artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001, uma vez que a Comissão não aplicou corretamente a exceção relativa à proteção do processo decisório. O segundo fundamento é relativo, em substância, à violação do artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001, na medida em que um interesse público superior justifica a divulgação dos documentos pedidos, os quais devem beneficiar do acesso mais amplo concedido aos documentos legislativos. O terceiro fundamento é relativo à violação do artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1367/2006, uma vez que a exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001 deve ser interpretada tanto mais estritamente quanto as informações pedidas dizem respeito a emissões para o ambiente. O quarto fundamento é relativo à aplicação errada do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), e do artigo 4.o, n.o 6, do Regulamento n.o 1049/2001.

19      Antes de examinar estes fundamentos, há que precisar o objeto do recurso no processo T‑371/20, tendo em conta o pedido de não conhecimento do mérito da Comissão e o articulado de adaptação da petição da recorrente.

A.      Quanto ao objeto do recurso no processo T371/20

20      Em 15 de julho de 2020, a Comissão apresentou um pedido de não conhecimento do mérito do recurso no processo T‑371/20. A recorrente apresentou um articulado de adaptação da petição em 18 de agosto de 2020. As observações da recorrente sobre o pedido de não conhecimento do mérito e as observações da Comissão sobre o articulado de adaptação da petição foram apresentadas, respetivamente, em 31 de agosto e 1 de outubro de 2020. Em 13 de novembro de 2020, o Tribunal Geral decidiu reservar para final o exame do pedido de não conhecimento do mérito.

21      Em primeiro lugar, é pacífico entre as partes que a decisão tácita de indeferimento foi substituída pela primeira decisão impugnada, na medida em que esta dá uma resposta expressa ao pedido confirmativo apresentado pela recorrente em 25 de março de 2020.

22      Importa recordar que, quando uma decisão tácita de recusa de acesso é revogada por efeito de uma decisão expressa tomada posteriormente, já não há que decidir do recurso na parte em que este tem por objeto a referida decisão tácita (Acórdão de 2 de julho de 2015, Typke/Comissão, T‑214/13, EU:T:2015:448, n.o 36; v., igualmente, neste sentido, Acórdão de 2 de outubro de 2014, Strack/Comissão, C‑127/13 P, EU:C:2014:2250, n.os 88 e 89).

23      Por conseguinte, como alega a Comissão, não há que decidir do pedido de anulação da decisão tácita de indeferimento.

24      Em segundo lugar, porém, nos termos do artigo 86.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a recorrente apresentou um articulado de adaptação da petição, atendendo à adoção da primeira decisão impugnada após a sua apresentação, com vista a que o recurso fosse doravante considerado um pedido de anulação dessa decisão expressa.

25      Ora, embora os pedidos das partes sejam caracterizados, em princípio, pela sua imutabilidade, o artigo 86.o do Regulamento de Processo prevê uma derrogação a este princípio. Assim, em conformidade com o artigo 86.o, n.os 1 e 2, do Regulamento de Processo, quando um ato cuja anulação é pedida é substituído por outro com o mesmo objeto, o recorrente pode, antes do encerramento da fase oral do processo ou antes da decisão do Tribunal Geral de decidir sem fase oral, adaptar a petição para ter em conta este elemento novo, introduzindo a referida adaptação por requerimento separado e dentro do prazo previsto no artigo 263.o, sexto parágrafo, TFUE, no qual pode ser pedida a anulação do ato que justifica a adaptação da petição.

26      No caso em apreço, a decisão tácita de indeferimento foi substituída pela primeira decisão impugnada e o articulado de adaptação da petição foi apresentado na forma e no prazo previstos para o efeito, o que, aliás, a Comissão reconheceu expressamente nas suas observações sobre o referido articulado de adaptação.

27      Por um lado, a Comissão observou, no entanto, de forma geral, que não foi precisado claramente se esse articulado substituía ou completava a petição, mas que se baseou neste último entendimento. Questionada a este respeito no âmbito de uma medida de organização do processo, a recorrente confirmou, na sua resposta apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 25 de março de 2022, que, efetivamente, o seu articulado de adaptação completava a petição. Ora, na medida em que esta última é a compreensão comum das partes e que, além disso, como decorre do artigo 86.o, n.o 4, do Regulamento de Processo, o articulado de adaptação não deve substituir integralmente a petição, mas deve conter os pedidos adaptados e, sendo caso disso, os fundamentos e argumentos adaptados, bem como as provas e os oferecimentos de prova relacionados com a adaptação dos pedidos, a observação da Comissão não pode pôr em causa a admissibilidade do articulado de adaptação enquanto tal.

28      Por outro lado, a Comissão invocou o caráter inadmissível, inoperante ou manifestamente infundado dos fundamentos apresentados no articulado de adaptação. Porém, uma vez que estas críticas têm por objeto a admissibilidade, o caráter operante ou o mérito dos referidos fundamentos, fazem parte da apreciação de cada um desses fundamentos e são, portanto, irrelevantes para a admissibilidade do articulado de adaptação no seu conjunto.

29      Por conseguinte, estando preenchidos no caso em apreço os requisitos previstos no artigo 86.o, n.os 1 e 2, do Regulamento de Processo, há que considerar que o recurso no processo T‑371/20 tem agora por objeto um pedido de anulação da primeira decisão impugnada.

30      Por outro lado, a este último respeito, a Comissão indicou, com base numa frase constante das observações sobre o pedido de não conhecimento do mérito apresentadas pela recorrente, que esta não parecia contestar a primeira decisão impugnada na parte em que tinha concedido um acesso parcial ao documento 2 (v. n.o 9, supra). Ora, há que salientar, por um lado, que a frase da recorrente invocada pela Comissão se limita a manifestar o seu interesse em obter a anulação da primeira decisão impugnada recordando que esta continuava a recusar o acesso a todos os outros documentos (n.o 9, supra) e, por outro, que o articulado de adaptação da petição não limita o objeto do recurso apenas aos documentos que foram objeto de uma recusa total de acesso. Aliás, questionada na audiência, a recorrente confirmou que os seus recursos se destinavam a pôr em causa as decisões impugnadas, incluindo na medida em que concediam um acesso parcial a determinados documentos, o que ficou a constar na ata da audiência. Por conseguinte, há que considerar que, contrariamente ao que foi sustentado pela Comissão, o recurso no processo T‑371/20 tem por objeto um pedido de anulação da primeira decisão impugnada no seu todo.

B.      Quanto ao primeiro fundamento, relativo, em substância, à violação do artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001, na medida em que a Comissão não aplicou corretamente a exceção relativa à proteção do processo decisório

31      A título preliminar, importa observar que, sem dúvida, o título e os pontos iniciais e finais do primeiro fundamento dos recursos conforme desenvolvido no articulado de adaptação no processo T‑371/20 e na petição no processo T‑554/20 se referem ao segundo parágrafo do artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001, retomando, nesse aspeto, a terminologia e a estrutura do primeiro fundamento apresentado na petição no processo T‑371/20, relativo à decisão tácita de indeferimento. No entanto, os desenvolvimentos referentes a esse fundamento, constantes do articulado de adaptação no processo T‑371/20 e na petição no processo T‑554/20, não versam apenas sobre uma alegada violação do segundo parágrafo da referida disposição, mas referem‑se mais concretamente aos motivos invocados pela Comissão nas decisões impugnadas e incidem igualmente sobre o primeiro parágrafo do artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001.

32      Por conseguinte, o primeiro fundamento divide‑se, em substância, em duas partes, relativas, a primeira, à violação do segundo parágrafo do artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001 e, a segunda, à violação do primeiro parágrafo da mesma disposição.

33      Desde já, no que respeita à primeira parte do primeiro fundamento, como alega a Comissão, na medida em que a recorrente se baseia numa argumentação relativa a uma má aplicação do artigo 4.o, n.o 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, ou mesmo na falta de indicação das razões que permitem aplicar a referida disposição, é forçoso constatar que esta parte é inoperante, uma vez que não pode conduzir à anulação das decisões impugnadas. Com efeito, nas mesmas, a Comissão não aplicou o artigo 4.o, n.o 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, mas recusou o acesso aos documentos pedidos com base na exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do regulamento. Aliás, a esse respeito, não é pertinente que a Comissão tenha, na sua carta de 16 de março de 2020 (v. n.o 5, supra), invocado o segundo parágrafo do n.o 3 do artigo 4.o, uma vez que os presentes processos não se destinam à anulação da referida carta, mas das decisões impugnadas, nas quais a Comissão se baseou na exceção prevista no primeiro parágrafo do n.o 3 do artigo 4.o do regulamento. Por conseguinte, a primeira parte do primeiro fundamento dever ser rejeitada por ser inoperante.

34      A segunda parte do primeiro fundamento, relativa à violação do artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, contém duas alegações. A recorrente contesta, em substância, por um lado, a pertinência da exceção prevista na referida disposição, invocada pela Comissão, na medida em que o processo decisório em causa não está em curso e, por outro, os motivos apresentados pela Comissão para justificar a aplicação dessa exceção.

1.      Observações preliminares

35      Em conformidade com o seu considerando 1, o Regulamento n.o 1049/2001 inscreve‑se na vontade de criar uma união em que as decisões são tomadas de uma forma tão aberta quanto possível e ao nível mais próximo possível dos cidadãos. Como recorda o considerando 2 do referido regulamento, o direito de acesso do público aos documentos das instituições está associado ao caráter democrático destas últimas (v. Acórdão de 22 de março de 2018, De Capitani/Parlamento, T‑540/15, EU:T:2018:167, n.o 57 e jurisprudência referida).

36      Para este efeito, o Regulamento n.o 1049/2001 tem por objetivo, como é indicado no seu considerando 4 e no seu artigo 1.o, conferir ao público um direito de acesso o mais amplo possível (v. Acórdão de 22 de março de 2018, De Capitani/Parlamento, T‑540/15, EU:T:2018:167, n.o 58 e jurisprudência referida).

37      Este direito não deixa de estar sujeito a determinados limites baseados em razões de interesse público ou privado. Mais especificamente, e em conformidade com o seu considerando 11, o Regulamento n.o 1049/2001 prevê, no seu artigo 4.o, um regime de exceções que autoriza as instituições a recusar o acesso a um documento, no caso de a divulgação do mesmo poder prejudicar um dos interesses protegidos por este artigo (v. Acórdão de 22 de março de 2018, De Capitani/Parlamento, T‑540/15, EU:T:2018:167, n.o 59 e jurisprudência referida).

38      Uma vez que essas exceções derrogam o princípio do acesso o mais amplo possível do público aos documentos, devem ser interpretadas e aplicadas de forma estrita (v. Acórdão de 22 de março de 2018, De Capitani/Parlamento, T‑540/15, EU:T:2018:167, n.o 61 e jurisprudência referida).

39      Em conformidade com o princípio da interpretação estrita, quando a instituição em causa decide recusar o acesso a um documento cuja comunicação lhe tenha sido solicitada, incumbe‑lhe, em princípio, explicar as razões pelas quais o acesso a esse documento poderia prejudicar concreta e efetivamente o interesse protegido por uma exceção prevista no artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001 que essa instituição invoca. Além disso, o risco desse prejuízo deve ser razoavelmente previsível e não puramente hipotético. A simples circunstância de um documento dizer respeito a um interesse protegido por uma exceção não basta para justificar a aplicação dessa exceção (v. Acórdão de 22 de março de 2018, De Capitani/Parlamento, T‑540/15, EU:T:2018:167, n.o 62 e jurisprudência referida).

40      Importa recordar, igualmente, que a aplicação da exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 pressupõe que se demonstre que o acesso aos documentos pedidos é suscetível de prejudicar concreta e efetivamente a proteção do processo decisório da instituição e que esse risco de prejuízo é razoavelmente previsível e não puramente hipotético (v. Acórdão de 22 de março de 2018, De Capitani/Parlamento, T‑540/15, EU:T:2018:167, n.o 63 e jurisprudência referida).

41      Para estar abrangido pela exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, o prejuízo causado ao processo decisório deve ser grave. É assim, nomeadamente, quando a divulgação do documento visado tem um impacto substancial no referido processo. A apreciação da gravidade depende de todas as circunstâncias da causa, nomeadamente dos efeitos negativos dessa divulgação sobre o processo decisório invocados pela instituição (Acórdão de 7 de junho de 2011, Toland/Parlamento, T‑471/08, EU:T:2011:252, n.o 71 e jurisprudência referida).

42      Não pode ser exigido às instituições que apresentem elementos de prova destinados a demonstrar a existência de tal risco. A este respeito, basta que a decisão contenha elementos tangíveis que permitam concluir que o risco de prejuízo do processo decisório é, à data da sua adoção, razoavelmente previsível e não puramente hipotético, referindo, nomeadamente, a existência, nessa data, de razões objetivas que permitam prever razoavelmente que esses prejuízos ocorreriam em caso de divulgação dos documentos pedidos (v. Acórdão de 22 de março de 2018, De Capitani/Parlamento, T‑540/15, EU:T:2018:167, n.o 65 e jurisprudência referida).

43      É à luz destas disposições e princípios que deve ser examinada a segunda parte do primeiro fundamento dos recursos.

2.      Quanto à primeira alegação da segunda parte do primeiro fundamento, relativa ao facto de o processo decisório não estar em curso

44      A recorrente alega que a interpretação e o uso pela Comissão da exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 não se justificam. Segundo a recorrente, o motivo apresentado pela Comissão para recusar o acesso, a saber, proteger o processo decisório em curso, é contrariado pela indicação da Comissão segundo a qual o processo decisório está parado. Esta última indicação é fonte de confusão e induz em erro, uma vez que o processo está «parado» ou «em curso». Mesmo admitindo que o processo decisório esteja suspenso e retome sobre uma versão revista do documento de orientação sobre as abelhas de 2013, este documento já não é o mesmo.

45      A Comissão retorque que processo decisório em causa não está concluído e esclarece que, nas decisões impugnadas, usou o termo «parado» no sentido de «suspenso» ou «em pausa». Além disso, o facto de o documento de orientação sobre as abelhas de 2013 poder ser alterado não é relevante para a aplicação da exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001. A fundamentação de cada uma das decisões impugnadas não é, portanto, contraditória.

46      A título preliminar, há que observar que, embora a Comissão tenha contestado a admissibilidade e a pertinência de muitos argumentos apresentados pela recorrente no âmbito da segunda parte do primeiro fundamento na medida em que não se referem à exceção aplicada nas decisões impugnadas ou que foram indevidamente apresentados na fase da réplica, não é forçosamente o caso dos argumentos relativos ao facto de o processo decisório não estar em curso reproduzidos no n.o 44, supra. Com efeito, nas suas observações sobre o articulado de adaptação da petição no processo T‑371/20, a Comissão reconheceu que esses argumentos constavam deste articulado e eram referentes à exceção invocada nas decisões impugnadas, referindo que, «abstração feita dos pontos […] do articulado de adaptação, que [faziam] referência ao facto de o processo decisório não estar em curso, a recorrente não [tinha] adapta[do] os seus fundamentos à nova base legal invocada na [primeira decisão impugnada]». Há, efetivamente, que constatar que esses argumentos foram apresentados no articulado de adaptação no processo T‑371/20. Além disso, a apresentação desses argumentos foi efetuada de forma idêntica na petição inicial no processo T‑554/20. Por conseguinte, qualquer alegação posterior da Comissão, apresentada nomeadamente na suas contestações ou durante a audiência, destinada a sugerir que esses argumentos são inadmissíveis ou inoperantes ou que a recorrente não contesta que o processo decisório em causa esteja em curso deve ser rejeitada por infundada.

47      Importa, portanto, examinar o mérito desta primeira alegação da recorrente.

48      Resulta dos autos que o documento de orientação sobre as abelhas de 2013 foi preparado pela EFSA em 2013 a pedido da Comissão. Este documento foi submetido ao parecer do Scopaff em 2013 pela Comissão, com vista à sua adoção nos termos do procedimento consultivo previsto no Regulamento (UE) n.o 182/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de fevereiro de 2011, que estabelece as regras e os princípios gerais relativos aos mecanismos de controlo pelos Estados‑Membros do exercício das competências de execução pela Comissão (JO 2011, L 55, p. 13), e em conformidade com os artigos 77.o e 79.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1107/2009.

49      É pacífico entre as partes que o documento de orientação sobre as abelhas de 2013 foi objeto de discussão durante vários anos no Scopaff, sem que tenha sido possível chegar a um acordo sobre o seu texto, devido à discordância entre os Estados‑Membros, e sem que a Comissão tenha conseguido assim adotar esse documento.

50      Perante a falta de adoção do documento de orientação sobre as abelhas de 2013 enquanto tal e para efeitos de aplicação parcial do referido documento, a Comissão propôs, em 2018, aplicar algumas partes do mesmo, introduzindo alterações aos princípios uniformes previstos pelo Regulamento (UE) n.o 546/2011 da Comissão, de 10 de junho de 2011, que dá execução ao Regulamento n.o 1107/2009 no que diz respeito aos princípios uniformes aplicáveis à avaliação e autorização dos produtos fitofarmacêuticos (JO 2011, L 155, p. 127). Em 2018, a Comissão submeteu, assim, ao parecer do Scopaff um projeto de regulamento de alteração do Regulamento n.o 546/2011, com vista à sua adoção nos termos do procedimento de regulamentação com controlo previsto pela Decisão 1999/468/CE do Conselho, de 28 de junho de 1999, que fixa as regras de exercício das competências de execução atribuídas à Comissão (JO 1999, L 184, p. 23), e em conformidade com o artigo 29.o, n.o 6, o artigo 78.o, n.o 1, alínea c), e o artigo 79.o, n.o 4, do Regulamento n.o 1107/2009.

51      É pacífico entre as partes que o Scopaff deu um parecer positivo sobre um projeto de regulamento de alteração do Regulamento n.o 546/2011 em julho de 2019, mas que este também não foi adotado pela Comissão, uma vez que, no âmbito do procedimento de regulamentação com controlo, o Parlamento Europeu opôs‑se à sua adoção em outubro de 2019, considerando, em substância, que o referido projeto não previa um nível suficiente de proteção.

52      Se até 2018 a Comissão não planejou a revisão do documento de orientação sobre as abelhas de 2013, em março de 2019, solicitou à EFSA a revisão do referido documento para que seja tida em conta a evolução científica desde 2013.

53      Foi, portanto, neste contexto que, nas decisões impugnadas, adotadas durante os meses de junho e julho de 2020, a Comissão indicou que, enquanto era aguardada a conclusão da revisão do documento de orientação sobre as abelhas de 2013 pela EFSA, o seu exame no Scopaff se encontrava «parado» e que isto significava que se podia considerar que processo decisório estava «em curso», uma vez que só seria retomado após a conclusão pela EFSA da revisão desse documento. Nas decisões impugnadas, a Comissão indicou, aliás, que tinha sublinhado junto da EFSA a importância da entrega do «seu relatório revisto» no mês de março de 2021 e lhe tinha solicitado também o envolvimento dos peritos dos Estados‑Membros e das partes interessadas, a fim de que todos os pontos de vista fossem tidos em conta, o que deveria permitir uma aceitação rápida do documento de orientação sobre as abelhas revisto.

54      Questionada na audiência sobre o estado do documento de orientação sobre as abelhas revisto, a Comissão referiu que qualquer consideração sobre o conteúdo e a natureza eventualmente vinculativa desse documento era hipotética, uma vez que o processo de revisão do referido documento pela EFSA ainda não estava concluído. O mesmo se aplicava a qualquer consideração sobre a forma da sua eventual adoção pela Comissão e sobre o procedimento que poderia ser seguido para o efeito.

55      Decorre das circunstâncias expostas nos n.os 48 a 54, supra, que, contrariamente ao que foi considerado pela Comissão nas decisões impugnadas, não se podia considerar que o processo decisório a que os documentos pedidos dizem respeito estava em curso no momento da adoção das referidas decisões.

56      Com efeito, é certo que se pode considerar que os documentos pedidos dizem respeito a um processo decisório da Comissão que decorreu de 2013 a 2019 e que visava a aplicação total ou parcial, pela Comissão, do documento de orientação sobre as abelhas de 2013, quer adotando esse documento de orientação enquanto tal nos termos do procedimento consultivo previsto pelo Regulamento n.o 182/2011 quer alterando os princípios uniformes previstos pelo Regulamento n.o 546/2011 nos termos do procedimento de regulamentação com controlo previsto pela Decisão 1999/468. No entanto, é forçoso constatar que, aquando da adoção das decisões impugnadas, nenhum processo decisório visava aplicar o referido documento de orientação de 2013, nem enquanto tal nem sob a forma de uma alteração dos princípios uniformes. Pelo contrário, a Comissão tinha decidido, implícita mas necessariamente, não aplicar o documento de orientação de 2013 e tinha mesmo solicitado expressamente à EFSA a sua revisão, revisão que, por ainda estar a decorrer no momento da adoção das decisões impugnadas, fez com que, aliás, fosse impossível determinar o conteúdo do eventual documento de orientação revisto, a forma da sua eventual adoção e o procedimento que seria eventualmente seguido para o efeito. Esta revisão implica, portanto, a própria falta de objeto de um processo decisório da Comissão no momento da adoção das decisões impugnadas.

57      O argumento da Comissão de que, apesar das circunstâncias mencionadas nos n.os 48 a 54, supra, continuava a ter por objetivo a aplicação de um documento de orientação sobre as abelhas, a fim de fornecer às autoridades dos Estados‑Membros um documento que fizesse referência aos «conhecimentos científicos e técnicos atuais» em conformidade com o artigo 36.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1107/2009, não permite chegar a uma conclusão diferente. Com efeito, mesmo admitindo a sua existência, este objetivo não implicava, por si só, que um processo decisório que tivesse por objeto o referido documento estivesse em curso no momento da adoção das decisões impugnadas. Pelo contrário, os elementos dos autos tendem a demonstrar que a Comissão tinha decidido deixar de implementar o documento de orientação sobre as abelhas de 2013 e que, sendo o caso, poderia existir um processo decisório que tivesse por objeto um documento de orientação sobre as abelhas revisto com a entrega pela EFSA deste documento à Comissão e que esta tinha decidido implementá‑lo, o que era, aliás, hipotético no momento da adoção das decisões impugnadas e ainda o era à data da audiência. Pelas mesmas razões, contrariamente ao que sustenta a Comissão, o facto de a recorrente ter pedido, ou ainda pedir, a adoção do documento de orientação sobre as abelhas de 2013 na íntegra não implica que um processo decisório referente a este documento estivesse em curso no momento da adoção das decisões impugnadas ou esteja ainda em curso.

58      Por outro lado, importa observar que o facto de a revisão do documento de orientação sobre as abelhas de 2013 pela EFSA estar ainda a decorrer não implica que estivesse ainda em curso um processo decisório da Comissão relativo à aplicação desse mesmo documento às datas de adoção das decisões impugnadas. Pelo contrário, a própria tramitação desse processo de revisão corrobora a conclusão de que, após a rejeição da alteração dos princípios uniformes, a Comissão já não conduzia, aquando da adoção das decisões impugnadas, nenhum processo decisório referente ao documento de orientação sobre as abelhas de 2013. Com efeito, como sublinhou a recorrente sem ser contraditada pela Comissão, esta última não planejou, até 2018, pedir essa revisão. Ora, como decorre das decisões impugnadas, a revisão parece ter sido contemplada devido à impossibilidade de adotar o documento de orientação sobre as abelhas de 2013 e na perspetiva de permitir uma aceitação rápida de um documento de orientação sobre as abelhas revisto.

59      Resulta daí que o processo decisório da Comissão que tem por objeto o documento de orientação sobre as abelhas de 2013 tinha sido encerrado no momento da adoção das decisões impugnadas e que, consequentemente, nas circunstâncias específicas dos presentes processos, a Comissão não podia validamente basear as referidas decisões na exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, destinada a proteger o processo decisório da instituição relativo a uma questão sobre a qual esta não tenha ainda decidido.

60      Com efeito, o artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001 faz uma distinção clara em função da circunstância de um processo estar encerrado ou não. Uma vez adotada a decisão, as exigências de proteção do processo decisório apresentam menor relevância, pelo que a divulgação de todo e qualquer documento além dos mencionados no artigo 4.o, n.o 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 nunca poderá prejudicar o referido processo e a recusa da divulgação desse documento não pode ser autorizada, mesmo quando a divulgação do mesmo pudesse prejudicar gravemente esse processo se tivesse tido lugar antes da adoção da decisão em causa. Assim, as razões invocadas por uma instituição e que podem justificar a recusa de acesso a um documento desse tipo, cuja comunicação tenha sido requerida antes do encerramento do procedimento administrativo, podem não ser suficientes para a recusa de divulgação do mesmo documento após a adoção da decisão (v., neste sentido, Acórdão de 21 de julho de 2011, Suécia/MyTravel e Comissão, C‑506/08 P, EU:C:2011:496, n.os 78, 80 e 82).

61      Por conseguinte, há que julgar procedente a primeira alegação da segunda parte do primeiro fundamento e, consequentemente, anular as decisões impugnadas na medida em que recusam o acesso aos documentos pedidos com fundamento no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001.

62      No entanto, nas circunstâncias dos presentes processos, importa igualmente examinar, além disso, a segunda alegação da segunda parte do primeiro fundamento, relativa aos motivos invocados pela Comissão nas decisões impugnadas para justificar a aplicação da exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, admitindo, portanto, que esta disposição seja aplicável ao caso em apreço.

3.      Quanto à segunda alegação da segunda parte do primeiro fundamento, relativa aos motivos invocados nas decisões impugnadas

63      A título preliminar, importa recordar que, nas decisões impugnadas, a Comissão se baseou, em substância, num conjunto de três motivos interligados para recusar o acesso aos documentos pedidos com fundamento no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001. Segundo a Comissão, em primeiro lugar, os procedimentos de comitologia preservam a confidencialidade das posições individuais dos Estados‑Membros. Em segundo lugar, a divulgação das posições dos Estados‑Membros trocadas num contexto de confidencialidade comprometem a cooperação entre os Estados‑Membros e a confiança mútua entre os Estados‑Membros e a Comissão. Determinadas circunstâncias à volta das discussões relativas ao documento de orientação sobre as abelhas de 2013 constituem provas sólidas da complexidade e da natureza sensível do processo decisório em causa, que deve ser protegido. Em terceiro lugar, a Comissão foi, e ainda é, alvo de pressões externas oriundas de diversas partes interessadas com interesses contraditórios, de modo que a divulgação dos documentos pedidos exporia um processo decisório longo e complexo a ainda mais pressões externas. A divulgação dos documentos pedidos reduziria a margem de manobra e a flexibilidade dos Estados‑Membros, que devem ser livres de explorar, sem pressões externas, todas as opções nos comités permanentes.

64      Antes de examinar os argumentos da recorrente que visam contestar estes motivos apresentados pela Comissão nas decisões impugnadas, importa, previamente, examinar a admissibilidade dos referidos argumentos, contestada pela Comissão por constituírem um fundamento novo.

a)      Quanto à admissibilidade dos argumentos da recorrente

65      Na réplica, a recorrente indica que confirma que as decisões impugnadas violam igualmente o primeiro parágrafo do n.o 3 do artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001, sem alterar a sua argumentação, a não ser para «substituir “segundo parágrafo” por “primeiro parágrafo”», porque o direito aplicável é o mesmo. De qualquer modo, a recorrente fez expressamente referência ao primeiro parágrafo no seu articulado de adaptação da petição no processo T‑371/20 e na sua petição no processo T‑554/20. Por conseguinte, esta argumentação não é um «novo fundamento», uma vez que o raciocínio exposto é exatamente o mesmo e já foi referido pela recorrente. Além disso, baseando‑se na jurisprudência relativa à ampliação dos fundamentos, a recorrente sustenta que, no caso em apreço, os dois parágrafos constituem «complementos necessários às condições de divulgação dos documentos […] no que respeita à necessidade de proteger o processo decisório» e que o sentido da sua argumentação, na petição e na réplica apresentadas em cada um dos processos apensos, é o mesmo. A recorrente concluiu que o primeiro fundamento não é, portanto, inadmissível na medida em que é referente ao primeiro parágrafo do n.o 3 do artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001.

66      Na tréplica, quanto à possibilidade de a recorrente esclarecer o âmbito do primeiro fundamento, a Comissão observa, a título preliminar, que a tese da recorrente assenta na premissa errada de que o primeiro e o segundo parágrafo do n.o 3, do artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001 se referem a uma única e mesma exceção, quando dizem respeito a duas exceções distintas que se aplicam de forma alternativa. Nesse âmbito, a Comissão sustenta, por um lado, que a recorrente confirmou que pretendia invocar uma violação do segundo parágrafo da referida disposição, não sendo, portanto, a invocação deste parágrafo um erro material. Em contrapartida, é a menção do primeiro parágrafo da referida disposição (uma vez no articulado de adaptação no processo T‑371/20 e uma vez na petição no processo T‑554/20) que constitui um erro material, pelo facto de não haver nenhuma argumentação autónoma a este respeito, tanto mais que as duas exceções se aplicam de forma alternativa. Se pretendesse desenvolver um raciocínio subsidiário ou cumulativo sobre o primeiro parágrafo, a recorrente deveria tê‑lo indicado claramente no articulado de adaptação no processo T‑371/20 ou na petição no processo T‑554/20; não pode operar esse alargamento de forma retroativa. A Comissão sustenta, por outro lado, que a recorrente não pode invocar na réplica argumentos referentes ao primeiro parágrafo com o fundamento de que estão estreitamente relacionados com os apresentados na petição, porque as duas exceções são distintas e protegem dois interesses diferentes. O facto de os documentos poderem ser abrangidos pelas duas exceções não tem pertinência para a apreciação que a Comissão deve efetuar, que difere consoante o interesse protegido seja um processo decisório em curso ou concluído. Além disso, não é pertinente o facto de a recorrente poder basear‑se na mesma argumentação. A Comissão concluiu, portanto, que a recorrente invocou na réplica um fundamento novo que é inadmissível.

67      Em primeiro lugar, há que rejeitar a alegação da recorrente segundo a qual a argumentação desenvolvida relacionada com o segundo parágrafo do n.o 3 do artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001 pode ser transposta para o primeiro parágrafo da mesma disposição, com o fundamento de que o direito aplicável é o mesmo e que a argumentação da recorrente pode, portanto, manter‑se a mesma substituindo simplesmente as palavras «segundo parágrafo» pelas palavras «primeiro parágrafo». Com efeito, esta alegação assenta em premissas erradas. Como decorre do n.o 60, supra, o raciocínio aplicável no âmbito de uma e de outra das exceções previstas no n.o 3 do artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001 não é o mesmo, uma vez que as duas exceções visam proteger dois interesses diferentes e são sujeitas a requisitos de aplicação diferentes. Ademais, a recorrente não pode legitimamente alegar poder basear‑se em outras disposições além das invocadas com o fundamento de que basta alterar, na sua argumentação, a referência às disposições em causa.

68      Em segundo lugar, a recorrente alega, no entanto, que, de qualquer modo, nos atos que deram início à instância, invocou uma violação do artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 e que, por conseguinte, podia, na réplica, proceder a uma ampliação da argumentação desenvolvida em apoio do que tinha invocado.

69      A este respeito, por um lado, basta recordar que, efetivamente, como resulta, aliás, dos n.os 44 a 46, supra, no articulado de adaptação da petição no processo T‑371/20 e na petição no processo T‑554/20, no âmbito do primeiro fundamento, a recorrente invocou expressamente a violação da exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, ao indicar que «a recorrente considera[va] que a interpretação e o uso pela Comissão da exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo (proteção do processo decisório em curso) do Regulamento […] n.o 1049/2001 não se justifica[va]».

70      Além disso, em coerência com o que tinha invocado, no articulado de adaptação no processo T‑371/20 e na petição no processo T‑554/20, a recorrente recordou expressamente, na argumentação desenvolvida no âmbito do primeiro fundamento, «o motivo dado pela Comissão para recusar o acesso aos documentos, a saber, “proteger o processo decisório em curso”».

71      Do mesmo modo, na parte introdutória tanto do articulado de adaptação no processo T‑371/20 como da petição no processo T‑554/20, a recorrente recordou que cada uma das decisões impugnadas era «baseada na exceção do primeiro parágrafo do n.o 3 (proteção do processo decisório em curso) do artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001».

72      Por outro lado, no articulado de adaptação no processo T‑371/20 e na petição no processo T‑554/20, a recorrente invocou, no âmbito do terceiro fundamento dos recursos, a violação do artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1367/2006, relacionado com a exceção prevista no primeiro parágrafo do n.o 3 do artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001.

73      Por conseguinte, decorre do teor do primeiro fundamento, tal como dos recursos no seu conjunto, que o artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 foi expressamente invocado pela recorrente no âmbito dos desenvolvimentos referentes ao primeiro fundamento dos recursos. O argumento da Comissão de que essas menções são erros de escrita da recorrente não pode, portanto, ser acolhido.

74      Embora seja de lamentar que, no articulado de adaptação no processo T‑371/20 e na petição no processo T‑554/20, a recorrente tenha, no âmbito do primeiro fundamento, invocado indistintamente disposições de alcance diferente, tais como o primeiro e o segundo parágrafo do n.o 3 do artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001, não é menos verdade que a invocação da violação do artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 resulta tanto do articulado de adaptação no processo T‑371/20 como da petição no processo T‑554/20.

75      Por outro lado, é sem dúvida exato que, além dos argumentos já recordados no n.o 44, supra, foi só na réplica que, em resposta às críticas da Comissão, a recorrente articulou mais a invocação do artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, desenvolvendo um argumento que visa sustentar mais a segunda parte do primeiro fundamento.

76      Nos termos do artigo 84.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, é proibido deduzir fundamentos novos no decurso da instância, a menos que esses fundamentos tenham origem em elementos de direito e de facto que se tenham revelado durante o processo. No entanto, um fundamento que constitua a ampliação de um fundamento formulado anteriormente, expressa ou implicitamente, na petição inicial e que apresente um nexo estreito com este deve ser julgado admissível. Por outro lado, os argumentos cuja substância apresente um nexo estreito com um fundamento enunciado na petição inicial não podem ser considerados fundamentos novos e a sua apresentação é admitida na fase da réplica ou da audiência (Acórdão de 8 de novembro de 2018, “Pro NGO!”/Comissão, T‑454/17, EU:T:2018:755, n.o 70).

77      Ora, no caso em apreço, contrariamente ao que sustenta a Comissão, a argumentação desenvolvida pela recorrente na réplica não constitui um fundamento novo, mas apresenta um nexo estreito com a invocação da violação do primeiro parágrafo do n.o 3 do artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001, que já constava do articulado de adaptação no processo T‑371/20 e na petição no processo T‑554/20.

78      Com efeito, no articulado de adaptação no processo T‑371/20 e na petição no processo T‑554/20, a recorrente alegou que a aplicação do primeiro parágrafo do n.o 3 do artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001 «não [era] justificada». Por outro lado, nos referidos atos, a recorrente acrescentou, é certo de forma geral, que «a Comissão não [tinha] explic[ado] como o acesso aos documentos pedidos prejudicaria específica e efetivamente o processo decisório». Na réplica, a recorrente explicitou por que razão, em seu entender, a Comissão «não [tinha] demonstr[ado] que a autorização de divulgação dos documentos pedidos teria feito correr um risco concreto e efetivo ao processo decisório em curso» e, mais precisamente, por que razão os fundamentos invocados nas decisões impugnadas não demonstravam «de forma adequada que a autorização de divulgação dos documentos faria correr um risco concreto, efetivo e sério ao processo decisório em curso». Os argumentos expostos na réplica em cada processo visam, portanto, desenvolver diretamente a alegação constante dos atos que deram início à instância e relativa à falta de justificação adequada que permita a aplicação da exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001.

79      Por conseguinte, uma vez que, no caso em apreço, os argumentos apresentados na réplica em cada processo, no que respeita à violação do artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, constituem uma ampliação do fundamento enunciado no articulado de adaptação no processo T‑371/20 e na petição no processo T‑554/20 referente a esta mesma disposição, devem ser considerados admissíveis.

80      Por outro lado, há que salientar, ainda, que estes argumentos, na medida em que incidem sobre os motivos apresentados nas decisões impugnadas, coincidem, em substância, com os argumentos desenvolvidos ‑ é certo, por vezes, de forma lamentavelmente imprecisa relativamente às disposições cuja violação era invocada ‑ no articulado de adaptação no processo T‑371/20 e na petição no processo T‑554/20, relacionados com o conteúdo concreto das decisões impugnadas (v. n.os 31 e 74, supra).

81      Importa, portanto, examinar os argumentos apresentados pela recorrente na réplica para pôr em causa os motivos recordados no n.o 63, supra, invocados pela Comissão nas decisões impugnadas.

b)      Quanto ao mérito dos argumentos da recorrente

82      A recorrente sustenta, por um lado, que o modelo de regulamento interno dos comités (JO 2011, C 206, p. 11; a seguir «modelo de regulamento interno») não pode prevalecer sobre o Regulamento n.o 1049/2001 e, por outro, que a Comissão não explicou por que razão a divulgação dos documentos pedidos teria feito correr um risco concreto e efetivo ao processo decisório em curso. Em primeiro lugar, a Comissão não demonstrou por que razão a afetação da confiança mútua entre os Estados‑Membros e a Comissão prejudicaria gravemente o processo decisório. O facto de o documento de orientação sobre as abelhas de 2013 ser objeto de discussão há mais de sete anos ou de revisão em curso não é pertinente a este respeito. Em segundo lugar, as pressões externas invocadas pela Comissão também não provam que a divulgação prejudicaria gravemente o processo decisório. Essas pressões nem deveriam ser tidas em consideração, uma vez que não são a consequência direta da divulgação dos documentos, cabendo às instituições tomar as medidas necessárias para as evitar. No caso em apreço, a Comissão não só não comprovou a veracidade das pressões alegadas, como não explicou as razões pelas quais essas pressões fariam correr «um risco sério» ao processo decisório. Em terceiro lugar, a Comissão deveria ter demonstrado a existência de um risco específico no que respeita a cada um dos documentos pedidos.

83      A Comissão sustenta que os argumentos da recorrente não têm fundamento. Por um lado, a recorrente ignora o quadro jurídico pertinente, em especial, o modelo de regulamento interno. Por outro lado, a recorrente parece contestar pela primeira vez, e de forma incoerente com a sua precedente argumentação, o facto de a Comissão ter sofrido pressões externas. Os elementos que comprovam a existência do risco para o processo decisório não devem ser considerados isoladamente, mas como fazendo parte de um conjunto de indícios concordantes. Além disso, a Comissão esclarece que não aplicou uma presunção geral, mas apreciou de forma específica o conteúdo de todos os documentos pedidos.

84      Desde já, importa rejeitar por ser infundados os argumentos da recorrente na medida em que possam ser entendidos no sentido de invocar uma falta ou insuficiência da fundamentação das decisões impugnadas. Com efeito, como resulta do n.o 63, supra, as decisões impugnadas fazem referência aos motivos que levaram a Comissão a recusar o acesso aos documentos pedidos. Em contrapartida, saber se os motivos invocados pela Comissão permitem justificar validamente essa recusa é questão que pertence ao mérito das decisões impugnadas, e não a uma falta ou insuficiência da fundamentação das mesmas. Por conseguinte, há que prosseguir com o exame desses motivos.

1)      Quanto à posição individual dos EstadosMembros nos procedimentos de comitologia

85      Nas decisões impugnadas, a Comissão indicou que os procedimentos de comitologia preservam a confidencialidade das posições individuais dos Estados‑Membros, o que se reflete em determinadas disposições do modelo de regulamento interno, adotado pela Comissão nos termos do artigo 9.o, n.o 1, do Regulamento n.o 182/2001, disposições que, segundo a Comissão, «excluem expressamente as posições individuais dos Estados‑Membros do acesso ao público».

86      A recorrente sustenta que o modelo de regulamento interno não pode prevalecer sobre o Regulamento n.o 1049/2001.

87      A Comissão retorque que a recorrente não tem em conta o quadro jurídico pertinente.

88      A título preliminar, há que salientar que o presente litígio não diz respeito, de forma geral, às regras que regulam os trabalhos dos comités de comitologia, nem ao acesso direto a esses trabalhos, mas apenas ao acesso, na sequência de um pedido de acesso apresentado ao abrigo do Regulamento n.o 1049/2001 pela recorrente, a determinados documentos trocados no Scopaff no âmbito do exame do documento de orientação sobre as abelhas de 2013, sendo esses documentos mensagens de correio eletrónico que contêm, em substância, a posição individual de alguns Estados‑Membros sobre o referido documento de orientação ou sobre um projeto de alteração dos princípios uniformes que visa a sua aplicação (v. n.os 5, 11 e 14, supra).

89      Em primeiro lugar, no caso em apreço, importa observar que, nas decisões impugnadas, para sustentar o motivo pelo qual a posição individual dos Estados‑Membros devia ser protegida nos procedimentos de comitologia e devia, portanto, ser excluída do acesso do público, a Comissão baseou‑se unicamente no conteúdo de duas disposições do modelo de regulamento interno, a saber, os seus artigos 10.o, n.o 2, e 13.o, n.o 2: a primeira das referidas disposições indica que «[a]s atas sumárias não mencionam a posição individual dos membros nos debates do comité» e a segunda que «[o]s debates do comité são confidenciais».

90      Por outras palavras, nas decisões impugnadas, a Comissão não se baseou nem nas disposições do Regulamento n.o 1049/2001, ou até do Regulamento n.o 182/2011, nem mesmo no conteúdo de um regulamento interno de que o Scopaff se teria efetivamente dotado.

91      Por outro lado, a este último respeito, questionada no âmbito de uma medida de organização do processo, a Comissão indicou, na sua resposta apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 15 de março de 2022 à questão de saber se o Scopaff era dotado de um regulamento interno, que este comité não o era, mas que organizava os seus trabalhos em conformidade com o modelo de regulamento interno. No entanto, a Comissão não produziu nenhum elemento de prova em apoio desta última indicação. Questionada na audiência sobre o fundamento desta abordagem do Scopaff, a Comissão não fez referência a um fundamento específico, mas indicou, em substância, que o Scopaff, embora não tenha retomado num regulamento interno as regras do modelo de regulamento interno, se referia às mesmas «por prática» para organizar os seus trabalhos.

92      Por conseguinte, é forçoso constatar que, contrariamente à situação tida em conta pelo Tribunal Geral no n.o 86 do Acórdão de 28 de maio de 2020, ViaSat/Comissão (T‑649/17, não publicado, EU:T:2020:235), relativa a algumas atividades de outro comité de comitologia, nenhum elemento nos autos permite, no caso em apreço, considerar que o Scopaff se dotou de regras internas correspondentes às disposições do modelo de regulamento interno invocadas pela Comissão nas decisões impugnadas e que sublinham a importância que esse comité atribui à confidencialidade de determinadas informações nele trocadas e dos seus debates.

93      Em segundo lugar, de qualquer modo, mesmo admitindo que o Scopaff tenha adotado ou seguido «por prática» as regras do modelo de regulamento interno, incluindo as disposições invocadas pela Comissão nas decisões impugnadas, esta circunstância não permite considerar que essas disposições, mesmo que devessem ser interpretadas no sentido de que sublinham o caráter confidencial dos debates do Scopaff e das posições expressas pelos Estados‑Membros nesse âmbito, podem excluir, por princípio, determinados documentos do âmbito de aplicação do Regulamento n.o 1049/2001.

94      Com efeito, importa salientar que o considerando 19 do Regulamento n.o 182/2011 precisa que deverá ser assegurado o acesso do público às informações sobre os trabalhos dos comités, nos termos do Regulamento n.o 1049/2001. Para o efeito, o artigo 9.o, n.o 2, do Regulamento n.o 182/2011 estabelece que se aplicam aos comités os princípios e condições de acesso do público aos documentos aplicáveis à Comissão (uma disposição idêntica consta, aliás, do artigo 7.o, n.o 2, da Decisão 1999/468). O Regulamento n.o 182/2011 recorda, assim, que os comités são sujeitos às mesmas regras que a Comissão no que respeita ao acesso do público aos documentos, isto é, às regras do Regulamento n.o 1049/2001, e não contém uma regra específica sobre o acesso do público aos documentos relativos aos trabalhos dos comités.

95      É certo que o artigo 9.o, n.o 1, do Regulamento n.o 182/2011 prevê que cada comité adota o seu regulamento interno com base no modelo de regulamento interno, que é elaborado pela Comissão, após ter consultado os Estados‑Membros, e publicado no Jornal Oficial da União Europeia.

96      Todavia, as disposições do regulamento interno de um comité, ou mesmo as do modelo de regulamento interno, tenham ou não sido retomadas pelo comité no seu regulamento interno, não podem permitir conceder, em resposta a um pedido de acesso do público, uma proteção aos documentos que vá além do que está previsto no Regulamento n.o 1049/2001.

97      Assim, as disposições do modelo de regulamento interno invocadas pela Comissão nas decisões impugnadas não podem permitir proteger as posições individuais expressas pelos Estados‑Membros além do previsto no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 (v., por analogia, Acórdão de 18 de dezembro de 2008, Muñiz/Comissão, T‑144/05, não publicado, EU:T:2008:596, n.o 92).

98      Além disso, decorre da jurisprudência que a regulamentação da União em matéria de acesso aos documentos não pode justificar que uma instituição recuse, por princípio, o acesso a documentos que digam respeito aos seus debates, em virtude de eles conterem informações relativas à posição tomada pelos representantes dos Estados‑Membros [v., neste sentido, Acórdão de 10 de outubro de 2001, British American Tobacco International (Investments)/Comissão, T‑111/00, EU:T:2001:250, n.o 52 e jurisprudência referida].

99      Decorre daí que, no que respeita ao acesso do público aos documentos inerentes aos trabalhos dos comités de comitologia, a Comissão não pode considerar que o quadro jurídico pertinente exclui, por princípio, o acesso do público às posições individuais dos Estados‑Membros.

100    Em terceiro lugar, há que observar, ainda, que as disposições do modelo de regulamento interno invocadas pela Comissão nas decisões impugnadas não podem ser interpretadas no sentido de que excluem o acesso do público, mediante pedido, às posições individuais dos Estados‑Membros.

101    Em primeiro lugar, o artigo 10.o, n.o 2, do modelo de regulamento interno versa sobre o conteúdo das «atas sumárias» dos trabalhos dos comités. Ora, como decorre do artigo 10.o, n.o 1, alínea c) do Regulamento n.o 182/2011, as atas sumárias são uns dos documentos que fazem parte do registo dos trabalhos dos comités mantido pela Comissão ao abrigo desta última disposição, documentos cujas referências são tornadas públicas no referido registo, em conformidade com o n.o 5 da mesma disposição. É certo que artigo 10.o do modelo de regulamento interno acrescenta, no seu n.o 2, que, embora as atas sumárias descrevam os pontos da ordem de trabalhos e os resultados da votação, «não mencionam a posição individual dos membros nos debates do comité». Porém, esta última disposição não tem por objeto o acesso do público aos documentos dos comités, mas o conteúdo do registo dos trabalhos dos comités, designadamente, o conteúdo de um dos documentos que o compõem, a ata sumária. Ora, a circunstância de a ata sumária não mencionar a posição individual dos Estados‑Membros não é pertinente em matéria de acesso aos documentos e não pode, portanto, prejulgar do acesso do público, mediante pedido, a documentos que façam referência a tais posições individuais. Além disso, contrariamente ao que sustentou a Comissão na audiência, a referida disposição não pode ser interpretada no sentido de que a posição individual dos Estados‑Membros não deve ser registada em nenhum documento, uma vez que a referida disposição diz apenas respeito ao conteúdo da ata sumária.

102    Por outro lado, na medida em que, no Tribunal Geral, a Comissão se baseou igualmente no artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 182/2011 para sustentar que a posição individual dos Estados‑Membros deve ser protegida, uma vez que só os resultados das votações constam do registo dos trabalhos dos comités, este argumento também deve ser afastado seguindo a mesma lógica. Com efeito, a referida disposição refere‑se apenas ao conteúdo do registo dos trabalhos do comité e não ao acesso do público aos documentos, que, como decorre do artigo 9.o, n.o 2, do Regulamento n.o 182/2011, pode ocorrer em conformidade com o Regulamento n.o 1049/2001.

103    Em segundo lugar, é certo que o artigo 13.o, n.o 2, do modelo de regulamento interno estabelece que «[o]s debates do comité são confidenciais».

104    No entanto, a referida disposição limita‑se, por um lado, a mencionar o caráter confidencial dos «debates do comité» e não de todo o procedimento no termo do qual os membros do comité deliberam (v., por analogia, Acórdão de 13 de julho de 2017, Saint‑Gobain Glass Deutschland/Comissão, C‑60/15 P, EU:C:2017:540, n.o 81). Por outro lado, sem necessidade de definir o conceito de «debates do comité» na aceção da referida disposição, basta salientar que o alcance desta disposição é relativizado pelo disposto no artigo 13.o do modelo de regulamento interno no seu conjunto. Com efeito, o seu n.o 1 prevê que os pedidos de acesso aos documentos do comité devem ser apreciados pela Comissão em conformidade com o Regulamento n.o 1049/2001 e o seu n.o 3 acrescenta que «[o]s documentos enviados aos membros do comité, aos peritos e aos representantes de terceiros são confidenciais […], a menos que seja concedido acesso aos mesmos de acordo com o n.o 1 ou que sejam divulgados de outra forma pela Comissão».

105    Assim, o artigo 13.o, n.os 1 e 3, do modelo de regulamento interno prevê a possibilidade, em conformidade com o Regulamento n.o 1049/2001, de ser concedido, nomeadamente, o acesso aos documentos enviados por um membro do comité aos outros membros do comité e que, neste caso, esses documentos não são ou deixam de ser confidenciais. Ora, estas disposições não excluem documentos, tais como mensagens de correio eletrónico, que contêm as observações ou as propostas de um membro do comité sobre um projeto de medida, sob pena de reduzir indevidamente o alcance do referido n.o 3 em matéria de acesso aos documentos.

106    Por outro lado, contrariamente ao que foi sustentado pela Comissão na audiência, nada apoia a interpretação segundo a qual, tendo em conta a alegada confidencialidade decorrente do artigo 13.o, n.o 2, do modelo de regulamento interno, os debates de um comité são, por princípio, sensíveis.

107    Decorre do que precede que, contrariamente ao que foi defendido pela Comissão nas decisões impugnadas, os procedimentos de comitologia, em especial o modelo de regulamento interno, não exigem, enquanto tais, que o acesso a documentos que fazem referência à posição individual dos Estados‑Membros no âmbito do Scopaff seja recusado a fim de proteger o processo decisório deste comité, na aceção do artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, o que não impede a Comissão, em casos devidamente justificados, de recusar o acesso a documentos relativos à posição individual dos Estados‑Membros no âmbito do referido comité quando existe o risco de a respetiva divulgação prejudicar concretamente os interesses protegidos pelas exceções previstas no artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001.

2)      Quanto à cooperação e à confiança mútua, à complexidade e à sensibilidade do processo decisório

108    Nas decisões impugnadas, a Comissão indicou que a divulgação da posição individual dos Estados‑Membros, expressa num contexto de confidencialidade, afeta negativamente a cooperação destes «nos procedimentos de comitologia» e afeta a confiança mútua entre os Estados‑Membros e a Comissão. A Comissão acrescentou, em substância, que o facto de o documento de orientação sobre as abelhas de 2013 ter sido objeto de discussões durante mais de seis anos, o facto de não ter sido alcançado um acordo entre os Estados‑Membros durante esse período e o facto de o referido documento de orientação ser objeto de uma revisão constituíam uma prova sólida da complexidade e da sensibilidade do processo decisório que devia ser protegido no caso em apreço. Além disso, na segunda decisão impugnada, a Comissão evocou a natureza politicamente sensível do documento de orientação sobre as abelhas de 2013, o que foi demonstrado pela duração das discussões a esse respeito.

109    A recorrente alega que a Comissão não explicou a razão pela qual a afetação da confiança mútua prejudicaria gravemente o processo decisório e a falta de pertinência das circunstâncias invocadas nas decisões impugnadas, quando é antes a falta de transparência que obsta ao processo decisório.

110    A Comissão retorque, em substância, que os elementos invocados nas decisões impugnadas devem ser considerados não individualmente, mas no seu conjunto.

111    Em primeiro lugar, uma vez que, nas decisões impugnadas, a Comissão evocou a necessidade de proteger a cooperação entre os Estados‑Membros, basta salientar, a este respeito, que a fundamentação da Comissão é de ordem abstrata e é referente a preservação desta cooperação nos procedimentos de comitologia em geral. Do mesmo modo, na medida em que, nas decisões impugnadas, a Comissão evocou a necessidade de proteger a confiança mútua entre a Comissão e os Estados‑Membros, uma vez que as posições individuais destes últimos foram trocadas «[n]um contexto de confidencialidade», é forçoso constatar que a fundamentação da Comissão é igualmente de ordem geral. Estas justificações baseiam‑se na premissa de que os procedimentos de comitologia protegem, perante um pedido de acesso aos documentos, a confidencialidade das posições individuais dos Estados‑Membros expressas no âmbito dos comités, premissa que, porém, já foi excluída no n.o 107, supra. São, portanto, justificações não concretamente relacionadas com as circunstâncias específicas do processo decisório em causa no presente processo.

112    Por conseguinte, como salienta a recorrente, as explicações constantes das decisões impugnadas não são suscetíveis de demonstrar de que modo a cooperação e a confiança mútua no processo decisório em causa seriam afetadas com a divulgação dos documentos pedidos.

113    Além disso, importa recordar que os Estados‑Membros têm um dever de cooperação leal recíproco e para com as instituições da União por força do artigo 4.o TUE, de modo que a divulgação dos documentos pedidos não pode, de qualquer modo, fazer recear a inobservância dessa obrigação a o enfraquecimento dos deveres dos Estados‑Membros a esse respeito.

114    Em segundo lugar, uma vez que, nas decisões impugnadas, a Comissão se baseou em determinadas circunstâncias factuais para sustentar que o processo decisório a proteger no caso em apreço era complexo e sensível, ou mesmo que o documento de orientação sobre as abelhas de 2013 era politicamente sensível, há que observar que a Comissão não se referiu ao conteúdo dos documentos pedidos, mas, de forma geral, ao processo decisório em causa no seu conjunto ou ao documento de orientação sobre as abelhas de 2013.

115    A este respeito, antes de mais, há que salientar que, nas decisões impugnadas, a Comissão não sustentou, nem a fortiori demonstrou, portanto, que os documentos pedidos eram de natureza sensível ou eram documentos sensíveis na aceção do artigo 9.o do Regulamento n.o 1049/2001, disposição que não está em causa no caso em apreço. Por outro lado, a Comissão também não alega que um Estado‑Membro lhe teria solicitado, em conformidade com o artigo 4.o, n.o 5, do Regulamento n.o 1049/2001, a não divulgação, sem o seu acordo, da sua posição relativa ao documento de orientação sobre as abelhas de 2013.

116    Em seguida, importa observar que decorre da jurisprudência que a alegada complexidade do processo decisório não constitui, em si mesma, uma razão particular para recear que a divulgação dos documentos pedidos prejudicaria gravemente esse processo (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 7 de junho de 2011, Toland/Parlamento, T‑471/08, EU:T:2011:252, n.o 81). Do mesmo modo, a circunstância de um assunto ser sensível não pode constituir, por si só, uma razão objetiva suficiente para recear um prejuízo grave para o processo decisório em caso de divulgação dos documentos pedidos (v., neste sentido, Acórdãos de 7 de junho de 2011, Toland/Parlamento, T‑471/08, EU:T:2011:252, n.o 80, e de 20 de setembro de 2016, PAN Europe/Comissão, T‑51/15, não publicado, EU:T:2016:519, n.o 34). Com efeito, um assunto alegadamente sensível não pode ser confundido com um documento sensível (Acórdão de 21 de abril de 2021, Pech/Conselho, T‑252/19, não publicado, pendente de recurso, EU:T:2021:203, n.o 57).

117    Assim, o Tribunal Geral já decidiu que a complexidade das discussões, as eventuais divergências nos pontos de vista entre os participantes ou a natureza sensível de um debate não permitem justificar, enquanto tais, a aplicação da exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 (v., neste sentido, Acórdão de 21 de abril de 2021, Pech/Conselho, T‑252/19, não publicado, pendente de recurso, EU:T:2021:203, n.o 56).

118    Por último, há que salientar que as circunstâncias invocadas pela Comissão nas decisões impugnadas não permitem recear um prejuízo grave para o processo decisório em caso de divulgação dos documentos pedidos.

119    Em primeiro lugar, o facto de o documento de orientação sobre as abelhas de 2013 ter sido objeto de discussão durante vários anos e o facto de, durante esse período, não ter sido alcançado um acordo entre os Estados‑Membros não corroboram a exigência de proteção dos documentos pedidos invocada pela Comissão, mas, pelo contrário, nas circunstâncias do caso em apreço, tendem a contrariá‑la. Com efeito, o processo decisório em causa não resultou na adoção do documento de orientação sobre as abelhas de 2013, quando é ponto assente que esse processo se realizou sem que o público tivesse acesso à posição individual dos Estados‑Membros a esse respeito. Assim, por um lado, a falta de resultado do processo não está relacionada com uma qualquer forma de informação ou de transparência para com o público e, por outro, não é demonstrado que a falta de acesso aos documentos pedidos permitiria a esse processo chegar a um resultado. A divulgação desses documentos não se afigura, portanto, suscetível de prejudicar o processo decisório em causa.

120    Em segundo lugar, o facto de o documento de orientação sobre as abelhas de 2013 ser objeto de revisão pela EFSA também não corrobora a exigência de proteção invocada pela Comissão. Com efeito, a divulgação dos documentos pedidos não tem repercussão na referida revisão, que é efetuada pela EFSA e não pela Comissão.

121    Decorre do que precedente que o motivo invocado nas decisões impugnadas relativo à cooperação e à confiança mútua, à complexidade e à sensibilidade do processo decisório não é suscetível de demonstrar, nas circunstâncias dos presentes processos, um risco de prejuízo grave para o processo decisório em causa.

3)      Quanto às pressões externas, à margem de manobra e à flexibilidade

122    Nas decisões impugnadas, a Comissão indicou que tinha sido, e ainda é, alvo de pressões externas por várias partes interessadas, que representam por vezes interesses divergentes. Acrescentou que os Estados‑Membros, e a própria Comissão, devem ter a liberdade de explorar todas as opções nos «comités permanentes» e ser livres de pressões externas. A divulgação dos documentos pedidos expõe um processo decisório longo e difícil a ainda mais pressões externas. Assim, segundo a Comissão, a divulgação dos documentos pedidos reduz a margem de manobra nas votações e a flexibilidade dos Estados‑Membros, prejudicando seriamente o processo decisório que será retomado na Comissão.

123    A recorrente alega que as pressões externas não devem ser tidas em conta e que, seja como for, não são consequência da divulgação dos documentos pedidos.

124    A Comissão retorque que a própria recorrente admitiu a existência dessas pressões.

125    Em primeiro lugar, no que respeita às pressões externas invocadas nas decisões impugnadas, decorre da jurisprudência que a proteção do processo decisório contra uma pressão externa específica pode constituir um fundamento legítimo para restringir o acesso a documentos relativos a esse processo decisório. No entanto, a realidade de tal pressão externa deve ser estabelecida com certeza e deve ser produzida prova de que o risco de afetar substancialmente o processo decisório em curso era razoavelmente previsível, devido a essa pressão externa (v., neste sentido, Acórdão de 18 de dezembro de 2008, Muñiz/Comissão, T‑144/05, não publicado, EU:T:2008:596, n.o 86).

126    Ora, é forçoso constatar que, nas decisões impugnadas, o motivo relativo à existência de pressões externas foi apresentado pela Comissão de forma geral e vaga.

127    Antes de mais, embora a Comissão tenha indicado que tinha sido, e ainda é, alvo de pressões externas por várias partes interessadas, importa salientar que essas pressões foram simplesmente alegadas e a sua existência não foi demonstrada nas decisões impugnadas. Por outro lado, a Comissão mencionou essas pressões de forma tão abstrata («[a] Comissão foi, e ainda é, alvo de pressões externas por várias partes interessadas, que representam por vezes interesses divergentes») que esta justificação poderia ser usada para qualquer processo decisório em qualquer domínio.

128    É certo que, como alega a Comissão, no articulado de adaptação da petição no processo T 371/20, a recorrente indicou que «reconhe[cia] que, neste processo, a Comissão [tinha sido] alvo de pressões externas». No entanto, além do facto de o controlo de legalidade do Tribunal Geral incidir sobre as decisões impugnadas e da enunciação da recorrente não poder colmatar, portanto, a falta de indicações constantes das decisões impugnadas, esta enunciação é tão vaga e geral como a da Comissão. Com efeito, embora a recorrente se refira a «este processo», também não esclarece quais são as pressões externas, pelo que não se pode concluir que a «realidade» das referidas pressões tenha sido estabelecida «com certeza» na aceção da jurisprudência recordada no n.o 125, supra.

129    Em seguida, de qualquer modo, como sublinha, em substância, a recorrente, a justificação invocada nas decisões impugnadas diz apenas respeito a pressões externas de que a própria Comissão foi alvo. Em contrapartida, as decisões impugnadas não referem nenhuma pressão externa a que teriam sido sujeitos os Estados‑Membros. Além disso, as decisões impugnadas não fornecem nenhum elemento que permita estabelecer um nexo entre as pressões externas sofridas pela Comissão, admitindo‑as provadas, e o prejuízo que resultaria da divulgação dos documentos pedidos, que fazem referência às posições individuais dos Estados‑Membros.

130    Por outro lado, importa recordar que, nas decisões impugnadas, a Comissão não sustentou que a falta de resultado no processo decisório seria consequência de pressões externas, mas indicou expressamente que decorria do desacordo entre os Estados‑Membros, o que não está relacionado com as alegadas pressões sofridas pela Comissão.

131    Por último, embora a Comissão tenha indicado que os Estados‑Membros e ela própria deviam ser livres de pressões externas para explorar qualquer opção nos «comités permanentes», basta observar que não se referiu ao processo decisório em causa no Scopaff, mas visou expressamente, de forma geral, os «comités permanentes» no seu conjunto.

132    Em segundo lugar, no que respeita à margem de manobra e à flexibilidade invocadas nas decisões impugnadas, antes de mais, há que salientar que a Comissão se limitou a fazer afirmações gerais, que não permitem demonstrar que a divulgação dos documentos pedidos resultaria numa redução da margem de manobra ou da flexibilidade dos Estados‑Membros no âmbito do Scopaff.

133    Com efeito, a Comissão não se referiu a nenhum elemento concreto suscetível de demonstrar uma qualquer deterioração da posição dos Estados‑Membros em caso de divulgação dos documentos pedidos. Pelo contrário, conforme observado no n.o 131, supra, quando indicou que os Estados‑Membros deviam poder explorar todas as opções, não se referiu à situação dentro do Scopaff no âmbito do processo decisório em causa, mas, de forma geral, à posição dos mesmos nos «comités permanentes».

134    Em seguida, na medida em que as decisões impugnadas devam ser entendidas no sentido de que visam estabelecer um nexo entre a redução da margem de manobra dos Estados‑Membros e as pressões externas sofridas pela Comissão, importa recordar que a Comissão não forneceu nenhum elemento que permitisse considerar que as referidas pressões alegadamente sofridas teriam repercussão na posição dos Estados‑Membros e que, portanto, a divulgação dos documentos pedidos reduziria a sua margem de manobra ou flexibilidade.

135    Por último, importa recordar que resulta da jurisprudência que a circunstância de a margem de manobra e a capacidade de obter um compromisso entre os Estados‑Membros serem reduzidas não pode caracterizar um risco suficientemente grave e razoavelmente previsível para justificar a aplicação do artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 (v., neste sentido, Acórdão de 20 de setembro de 2016, PAN Europe/Comissão, T‑51/15, não publicado, EU:T:2016:519, n.o 36).

136    Decorre do que precede que o motivo invocado nas decisões impugnadas relativo às pressões externas, à margem de manobra e à flexibilidade não é suscetível de demonstrar, nas circunstâncias dos presentes processos, um risco de prejuízo grave para o processo decisório em causa.

137    Daqui resulta que os motivos invocados pela Comissão nas decisões impugnadas não podem justificar, nas circunstâncias dos presentes processos, a aplicação da exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, mesmo admitindo, como foi referido no n.o 62, supra, que esta disposição seja aplicável no caso em apreço.

138    Por conseguinte, deve, igualmente, ser julgada procedente a segunda alegação da segunda parte do primeiro fundamento e, também nesta base, anular as decisões impugnadas na medida em que recusam o acesso aos documentos pedidos ao abrigo do artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001.

4.      Conclusões sobre o primeiro fundamento

139    Decorre de tudo o que precede que, nas decisões impugnadas, a Comissão violou o artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 ao recusar a divulgação dos documentos pedidos com o fundamento de que daí resultaria um prejuízo grave para o processo decisório em curso.

140    Consequentemente, não há que examinar a questão da existência de um interesse público superior que justificaria a divulgação dos documentos pedidos tendo em conta à respetiva natureza legislativa e ambiental, questão suscitada no âmbito do segundo e do terceiro fundamentos.

141    Em contrapartida, importa examinar o quarto fundamento.

C.      Quanto ao quarto fundamento, relativo à aplicação errada do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), e do artigo 4.o, n.o 6, do Regulamento n.o 1049/2001

142    A recorrente alega que as decisões impugnadas não podem basear‑se na necessidade de proteger a vida privada e a integridade do indivíduo relativamente aos dados pessoais contidos nos documentos pedidos, uma vez que, se tais informações constarem dos referidos documentos, a Comissão deve anonimizá‑las e divulgar as outras partes dos documentos.

143    A recorrente acrescenta que não está vinculada pelo teor das decisões impugnadas e que mantém que a Comissão poderia ter divulgado os documentos pedidos após ter anonimizado as informações sobre os dados pessoais: embora a Comissão o tenha feito relativamente ao documento 2 visado pela primeira decisão impugnada e relativamente aos documentos 3, 10, 12 e 33 visados pela segunda decisão impugnada, os restantes documentos ainda não foram publicados.

144    A Comissão retorque que o quarto fundamento está errado no plano factual e é inoperante.

145    A título preliminar, importa recordar que, nas decisões impugnadas, a Comissão concedeu um acesso parcial ao abrigo do artigo 4.o, n.o 6, do Regulamento n.o 1049/2001 a determinados documentos pedidos, a saber, o documento 2 visado pela primeira decisão impugnada e os documentos 3, 10, 12 e 33 visados pela segunda decisão impugnada (v. n.os 9 e 14, supra). Assim, ao mesmo tempo que concedeu o acesso a algumas partes dos referidos documentos, a Comissão recusou o acesso a outras partes dos mesmos. Para o efeito, a Comissão baseou‑se nas exceções que visam proteger, por um lado, o processo decisório em curso, nos termos do artigo 4, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, e, por outro, a vida privada e a integridade do indivíduo, nos termos do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do mesmo regulamento. É relativamente aos referidos documentos a que a recorrente teve acesso parcial que, nas decisões impugnadas, a Comissão aplicou, portanto, o artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 1049/2001, a fim de proteger os dados pessoais de determinados indivíduos.

146    Ora, como decorre da argumentação desenvolvida pela recorrente relacionada com o quarto fundamento, e conforme confirmou na audiência, a recorrente não pretende com este fundamento sustentar que, no que respeita aos documentos a que teve acesso parcial, a Comissão teria violado o artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 1049/2001, ao não lhe conceder acesso aos dados pessoais com base na referida disposição. Por outras palavras, embora contestando as decisões impugnadas pelo facto de concederem um acesso parcial a alguns dos documentos pedidos, a recorrente não pede para ter acesso aos dados pessoais protegidos pela Comissão que figuram nesses documentos e, aliás, não apresentou nenhum argumento para pôr em causa a aplicação que a Comissão fez da referida exceção a este respeito. Em contrapartida, o que a recorrente sustenta, em substância, é que a Comissão deveria ter seguido a mesma abordagem para os outros documentos pedidos, no sentido de que deveria, igualmente, ter‑lhe concedido um acesso parcial a esses outros documentos, limitando‑se a proteger apenas os eventuais dados pessoais neles contidos. Por conseguinte, a argumentação da recorrente visa, em substância, sustentar que a Comissão aplicou indevidamente o artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001.

147    Nestas circunstâncias, como alega a Comissão, é forçoso constatar que o quarto fundamento é inoperante, uma vez que, por um lado, não pode pôr em causa a aplicação que a Comissão fez, no caso em apreço, do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 1049/2001 e que, por outro, a aplicação da referida disposição não tem nenhuma incidência sobre a do artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, deste regulamento. Com efeito, uma eventual violação da primeira disposição, mesmo supondo‑a provada, não pode resultar, por si só, na divulgação dos documentos ou partes de documentos pedidos cujo acesso foi recusado ao abrigo da segunda disposição.

148    O quarto fundamento deve, portanto, ser julgado improcedente.

149    Uma vez que a segunda parte do primeiro fundamento foi julgada procedente no que respeita à sua primeira alegação (v. n.os 61 e 62, supra) e à sua segunda alegação (v. n.os 137 e 138, supra), devendo a procedência de cada uma destas alegações conduzir, por si só, à anulação das decisões impugnadas, há que anular as referidas decisões.

IV.    Quanto às despesas

150    A recorrente pede que a Comissão seja condenada, em cada um dos presentes processos, no pagamento do montante de 3 000 euros a título de despesas.

151    A este respeito, importa recordar que, na decisão que põe termo à instância, o Tribunal Geral determina exclusivamente a repartição das despesas entre as partes, sem se pronunciar sobre o respetivo montante. Em caso de reclamação, o montante das despesas recuperáveis pode ser objeto de um processo autónomo, regulado pelas disposições do artigo 170.o do Regulamento de Processo, distinto da decisão sobre a repartição das despesas. Assim, a fixação das despesas só pode ser efetuada após o acórdão ou o despacho que põe termo à instância (Acórdão de 6 de fevereiro de 2019, Karp/Parlamento, T‑580/17, não publicado, EU:T:2019:62, n.o 100).

152    Por conseguinte, há que julgar inadmissível a parte do pedido da recorrente relativa às despesas na qual pede que o Tribunal Geral fixe em 3 000 euros o montante a pagar pela Comissão a título de despesas em cada um dos presentes processos.

153    Porém, a recorrente pede a condenação da Comissão nas despesas.

154    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

155    Tendo a Comissão sido vencida no essencial, há que a condenar a suportar as suas próprias despesas e as efetuadas pela recorrente, em conformidade com o pedido desta última.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção alargada)

decide:

1)      As Decisões da Comissão Europeia C(2020) 4231 final, de 19 de junho de 2020, e C(2020) 5120 final, de 21 de julho de 2020, são anuladas, na medida em que recusam o acesso aos documentos pedidos com fundamento no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento (CE) n.o 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão.

2)      A Comissão é condenada nas despesas.

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 14 de setembro de 2022.

Assinaturas


*      Língua do processo: inglês