Language of document : ECLI:EU:T:2014:88

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção)

27 de fevereiro de 2014 (*)

«Concorrência — Acordos, decisões e práticas concertadas — Mercado mundial dos ecrãs de visualização de cristais líquidos (LCD) — Acordos e práticas concertadas em matéria de preços e de capacidades de produção — Vendas internas — Direitos de defesa — Coimas — Imunidade parcial da coima — Infração única e continuada — Princípio ne bis in idem»

No processo T‑128/11,

LG Display Co. Ltd, com sede em Seul (Coreia do Sul),

LG Display Taiwan Co. Ltd, com sede em Taipé (Taiwan),

representadas por A. Winckler e F.‑C. Laprévote, advogados,

recorrentes,

contra

Comissão Europeia, representada por P. Van Nuffel e F. Ronkes Agerbeek, na qualidade de agentes, assistidos por S. Kingston, barrister,

recorrida,

que tem por objeto um pedido de anulação parcial da Decisão C (2010) 8761 final da Comissão, de 8 de dezembro de 2010, relativa a um processo nos termos do artigo 101.° [TFUE] e do artigo 53.° do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (processo COMP/39.309 — LCD), e de redução do montante da coima aplicada às recorrentes por essa decisão,

O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção),

composto por: H. Kanninen, presidente, G. Berardis (relator) e C. Wetter, juízes,

secretário: N. Rosner, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 26 de abril de 2013,

profere o presente

Acórdão (1)

 Antecedentes do litígio

 Sociedades em causa no presente processo

1        A LG Display Co. Ltd (a seguir «LGD»), anteriormente denominada LG Philips LCD Co. Ltd, é uma sociedade de direito coreano que controla um grupo de sociedades estabelecidas em todo o mundo e que exercem a sua atividade no âmbito da produção de ecrãs de visualização de cristais líquidos de matriz ativa (a seguir «LCD»).

2        A LGD foi criada, em 26 de julho de 1999, através de um acordo de empresa comum celebrado entre a sociedade de direito coreano LG Electronics, Inc. (a seguir «LGE»), e a sociedade de direito neerlandês Koninklijke Philips Electronics NV (a seguir «Philips»).

3        No período compreendido entre 26 de julho de 1999 e 23 de julho de 2004, a LGE e a Philips detinham cada uma 50% do capital da LGD. As suas respetivas participações desceram posteriormente para 37,9% e para 32,87%.

4        A LG Display Taiwan Co. Ltd, anteriormente denominada LG Philips LCD Taiwan (a seguir «LGDT»), é uma sociedade de direito taiwanês, filial a 100% da LGD, ativa no setor da produção e do fornecimento de LCD.

[omissis]

 Decisão impugnada

[omissis]

19      Na decisão impugnada, a Comissão declarou a existência de um acordo entre seis grandes fabricantes internacionais de LCD, entre os quais as recorrentes, relativo às duas categorias seguintes destes produtos, de tamanho igual ou superior a doze polegadas: os LCD para as tecnologias de informação, como os que são utilizados em computadores portáteis compactos e em monitores de computadores, e os LCD para televisores (a seguir, em conjunto, «LCD cartelizados»).

20      Segundo a decisão impugnada, este cartel assumiu a forma de uma infração única e continuada nos termos do artigo 101.° TFUE e do artigo 53.° do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (EEE), cuja duração se estendeu, pelo menos, entre 5 de outubro de 2001 e de 1 de fevereiro de 2005 (a seguir «período em que a infração foi cometida»). Durante esse período, os participantes no cartel realizaram numerosas reuniões multilaterais, a que davam o nome de «reuniões Cristal», principalmente em hotéis de Taiwan. Estas reuniões tinham um objetivo claramente anticoncorrencial, uma vez que constituíam a ocasião para os participantes, nomeadamente, fixarem preços mínimos para os LCD cartelizados, discutirem as suas projeções de preços para evitar a respetiva diminuição e coordenarem os aumentos de preços, bem como para fixarem os níveis de produção. Durante o período em que a infração foi cometida, os participantes no cartel encontraram‑se também em reuniões bilaterais e trocaram frequentemente informações sobre os assuntos debatidos nas «reuniões Cristal». Por outro lado, tomaram medidas para verificar se as decisões adotadas por ocasião dessas reuniões eram aplicadas (considerandos 70 a 74 da decisão impugnada).

[omissis]

22      Em aplicação das Orientações de 2006, em primeiro lugar, a Comissão definiu o valor das vendas de LCD cartelizados direta ou indiretamente afetadas pela infração. Para o efeito, a Comissão determinou as três seguintes categorias de vendas efetuadas pelos participantes no cartel:

¾        «vendas EEE diretas», a saber, vendas de LCD cartelizados a outra empresa dentro do EEE;

¾        «vendas EEE diretas por intermédio de produtos transformados», a saber, vendas de LCD cartelizados integrados, no grupo a que o produtor pertence, em produtos acabados que são vendidos a outra empresa dentro do EEE;

¾        «vendas indiretas», a saber, vendas de LCD cartelizados a outra empresa situada fora do EEE, que incorpora em seguida os ecrãs em produtos acabados que vende no EEE (considerando 380 da decisão impugnada).

23      No entanto, a Comissão considerou que podia limitar‑se a tomar em consideração as duas primeiras categorias acima mencionadas no n.° 22, não sendo necessário incluir a terceira categoria para que as coimas aplicadas pudessem atingir um nível dissuasor suficiente (considerando 381 da decisão impugnada).

24      Em vez de utilizar o valor das vendas realizadas por uma empresa durante o último ano completo em que participou na infração, como está previsto no ponto 13 das Orientações de 2006, a Comissão considerou que era mais adequado utilizar, no presente caso, o valor anual médio das vendas durante o período completo em que a infração foi cometida, devido nomeadamente ao crescimento exponencial das vendas da maioria das empresas em causa durante os anos abrangidos pela decisão impugnada (considerando 384 da decisão impugnada).

25      No que respeita às recorrentes, a Comissão, não obstante as objeções formuladas por estas, considerou que o cálculo do valor das vendas pertinentes devia tomar igualmente em consideração as suas vendas à LGE e à Philips. Com efeito, por um lado, as vendas a estas últimas sociedades foram, também elas, objeto de discussões entre os participantes no cartel em causa e, por outro, o preço respeitante a estas vendas foi influenciado pelas circunstâncias que caracterizam o mercado, a saber, pela existência de preços cartelizados. Assim, para as recorrentes, o total das vendas pertinentes realizadas durante o período em que a infração foi cometida foi fixado em 2 296 240 479 euros, equivalendo a média anual, que é obtida através da divisão do referido montante pela duração do cartel igual a 4,33 anos, a 530 309 579 euros (considerandos 386 e 396 e quadro n.° 4 da decisão impugnada).

[omissis]

31      Com base nestas considerações, a Comissão, no artigo 2.° da decisão impugnada, condenou solidariamente as recorrentes no pagamento de uma coima de 215 000 000 euros.

 Tramitação processual e pedidos das partes

32      Por petição inicial apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 23 de fevereiro de 2011, as recorrentes interpuseram o presente recurso.

33      Depois de a Comissão ter apresentado a tréplica, em 8 de dezembro de 2011, as recorrentes apresentaram uma oferta de prova suplementar, ao abrigo do artigo 48.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, em apoio do quarto fundamento invocado na sua petição inicial (a seguir «oferta de prova suplementar»).

34      A Comissão apresentou as suas observações sobre a oferta de prova suplementar em 26 de janeiro de 2012.

35      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Sexta Secção) decidiu dar início à fase oral e, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do Regulamento de Processo, colocou por escrito questões às partes, tendo estas respondido no prazo concedido.

36      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões orais colocadas pelo Tribunal Geral na audiência de 26 de abril de 2013.

37      Na sequência desta, tendo a fase oral do processo sido deixada em aberto, o Tribunal Geral colocou por escrito outras questões às partes, tendo estas respondido nos prazos concedidos.

38      A fase oral do processo foi encerrada por decisão do presidente da Sexta Secção do Tribunal Geral de 12 de julho de 2013.

39      As recorrentes concluem pedindo ao Tribunal que se digne:

¾        anular parcialmente a decisão impugnada e reduzir substancialmente o montante da coima que lhes foi aplicada por força dessa decisão;

¾        condenar a Comissão nas despesas;

¾        tomar qualquer outra medida que considere ser adequada.

40      A Comissão conclui pedindo ao Tribunal que se digne:

¾        negar provimento ao recurso;

¾        condenar as recorrentes nas despesas.

 Questão de direito

[omissis]

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo ao facto de a Comissão ter, erradamente e em violação dos direitos de defesa das recorrentes, incluído as suas vendas internas no cálculo do montante da coima

[omissis]

 Quanto à primeira parte, relativa à violação das Orientações de 2006

[omissis]

—       Quanto à tomada em consideração das vendas às empresas coligadas com as recorrentes

60      As recorrentes alegam, no essencial, que o facto de não formarem uma empresa única com a LGE e com a Philips na aceção da jurisprudência acima recordada no n.° 54, embora tenha como consequência que não se pode considerar que estas últimas são conjunta e solidariamente responsáveis pela infração cometida pelas recorrentes, não é pertinente para determinar se os LCD cartelizados que as recorrentes venderam à LGE e à Philips faziam parte das vendas relacionadas com a infração declarada na decisão recorrida, na aceção do ponto 13 das Orientações de 2006.

61      A este respeito, há que observar que a Comissão não afirmou que as vendas das recorrentes à LGE e à Philips eram abrangidas pela infração pelo simples facto de não se tratar de vendas entre sociedades que fazem parte de uma empresa única, na aceção da jurisprudência acima recordada no n.° 54.

62      Com efeito, o facto de, na decisão impugnada, a Comissão não ter declarado que as recorrentes, a LGE e a Philips, formavam uma empresa única constituiu uma condição necessária para incluir as vendas das recorrentes à LGE e à Philips na categoria das «vendas EEE diretas», que pressupõe que as vendas em questão sejam feitas a terceiros independentes. No entanto, a Comissão continuava a estar obrigada a explicar qual era a ligação entre as vendas das recorrentes à LGE e à Philips e o acordo.

63      A este respeito, a Comissão, no considerando 396 da decisão impugnada, considerou que esta ligação consistia no facto de, em primeiro lugar, as vendas de LCD cartelizados aos clientes, como a LGE e a Philips, que estavam ligados aos participantes no cartel, eram um assunto debatido entre estes últimos e, em segundo lugar, o preço das vendas a esses clientes era influenciado pelas circunstâncias que caracterizavam o mercado, a saber, pela existência de preços cartelizados.

[omissis]

 Quanto à terceira parte, relativa à violação do princípio da igualdade de tratamento

[omissis]

136    Relativamente às recorrentes, a Comissão acabou por considerar que não formavam, juntamente com a LGE e a Philips, uma empresa única. A este respeito, há que salientar que as recorrentes não forneceram o menor elemento que ponha em causa esta conclusão da Comissão.

137    Assim, as vendas das recorrentes à LGE e à Philips foram incluídas na categoria das «vendas EEE diretas».

138    Se a Comissão não tivesse procedido deste modo, teria permitido que as recorrentes beneficiassem de uma vantagem relativamente aos outros participantes no cartel que, como elas, não estavam verticalmente integrados, na medida em que não formavam uma empresa única com as sociedades às quais vendiam os seus LCD cartelizados.

139    O facto de, no que se refere aos participantes no cartel que, contrariamente às recorrentes, tinham sido considerados empresas únicas verticalmente integradas, a Comissão ter incluído as vendas pertinentes na categoria das «vendas EEE diretas através de produtos transformados» não pode ser criticado do ponto de vista da observância do princípio da igualdade de tratamento, na medida em que a existência de uma empresa única dá origem a uma situação diferente, que justifica que se tenha aplicado essa outra categoria aos referidos participantes.

140    No que respeita ao argumento das recorrentes relativo à alegada discriminação efetuada consoante as vendas internas a um grupo visassem sociedades filiais ou sociedades‑mãe, basta referir que a Comissão aplicou, corretamente, o conceito de empresa única. Assim, considerou‑se que as sociedades filiais a 100% pertenciam à mesma empresa que os participantes no acordo, ao passo que não se considerou que as sociedades que tinham uma participação acionista nas sociedades que faziam parte do cartel fossem sociedades‑mãe, na medida em que não foi demonstrado que os requisitos previstos para esse efeito na jurisprudência estavam preenchidos. Ora, a Comissão considerou que tal não sucedia com a LGE e com a Philips relativamente às recorrentes, as quais não põem em causa esta conclusão. Em contrapartida, nos casos em que uma das empresas participantes no cartel efetuou vendas no EEE a terceiros independentes, essas vendas foram tomadas em consideração pela Comissão, independentemente da sociedade (filial ou mãe), abrangida por esta empresa, que materialmente vendeu os LCD cartelizados.

141    Quanto ao facto de a Comissão ter decidido não tomar em consideração, para efeitos do cálculo do montante da coima, a terceira categoria de vendas definida no considerando 380 da decisão impugnada, a saber, as «vendas indiretas» (v. n.° 22 supra), há que observar que, embora seja verdade que determinados LCD cartelizados, fornecidos a terceiros pelos participantes no cartel instalados fora do EEE, acabaram por ser colocados em produtos acabados vendidos no EEE, não se pode negar que a relação entre o cartel e o território do EEE, na aceção do ponto 13 das Orientações de 2006, era mais fraca do que a que existia no que diz respeito às duas categorias de vendas que a decisão impugnada tomou em consideração.

142    Além disso, na medida em que a exclusão das «vendas indiretas» foi aplicada a todos os participantes no cartel, não pode ser declarada uma discriminação a este respeito.

[omissis]

 Quanto ao segundo fundamento, relativo ao facto de a Comissão ter erradamente recusado conceder às recorrentes uma imunidade da coima relativamente ao ano de 2005

155    As recorrentes consideram que a Comissão lhes devia ter concedido uma imunidade parcial, ao abrigo do ponto 23, alínea b), último parágrafo, da Comunicação de 2002 sobre a clemência, não apenas em relação ao ano de 2006 mas também em relação ao ano de 2005. Com efeito, através do seu pedido oral de clemência de 17 de julho de 2006, bem como através da sua declaração oral complementar de 20 de julho de 2006, acompanhada de numerosos documentos probatórios, as recorrentes foram as primeiras a dar conhecimento à Comissão de factos que esta anteriormente desconhecia, a saber, que o cartel sobre os LCD prosseguiu em 2005. A este respeito, as recorrentes alegam que os documentos apresentados pela Samsung em 18 de julho de 2006, depois de formulado o seu pedido oral, não permitem provar que se realizaram «reuniões Cristal» durante o ano de 2005, e que a declaração oral complementar da Samsung de 20 de julho de 2006, embora descreva contactos entre concorrentes em 2005, não foi acompanhada de documentos probatórios.

[omissis]

157    Há que recordar que, nos termos do ponto 23 da Comunicação de 2002 sobre a clemência, está previsto o seguinte:

«23      Na decisão final adotada no termo do processo administrativo, a Comissão determinará:

a)      Se os elementos de prova fornecidos por uma empresa apresentaram um valor acrescentado significativo relativamente aos elementos de prova na posse da Comissão nesse momento;

b)      O nível de redução de que a empresa beneficiará, que será determinado da seguinte forma tendo por base a coima que de outra forma seria aplicada:

¾        [à] primeira empresa que preencha as condições previstas no ponto 21: uma redução de 30‑50%;

¾        […]

Além disso, se uma empresa fornecer elementos de prova relacionados com factos anteriormente desconhecidos da Comissão, com incidência direta sobre a gravidade ou duração do cartel presumido, a Comissão não tomará em consideração estes elementos ao fixar o montante de qualquer coima a aplicar à empresa que os forneceu.»

[omissis]

 Resenha dos princípios gerais

[omissis]

166    Deste modo, o ponto 23, alínea b), último parágrafo, da Comunicação de 2002 sobre a clemência não abrange os casos em que uma empresa tenha simplesmente apresentado elementos de prova novos ou mais completos relativamente a factos que a Comissão já conhecia. O referido parágrafo também não se aplica aos casos em que uma empresa leva ao conhecimento da Comissão factos novos que, todavia, não permitem alterar a apreciação da Comissão sobre a gravidade ou sobre a duração do cartel. Em contrapartida, esta disposição aplica‑se exclusivamente aos casos em que estejam preenchidos dois requisitos: em primeiro lugar, a empresa em causa é a primeira a provar factos que a Comissão antes ignorava e, em segundo lugar, estes factos, tendo uma incidência direta na gravidade ou na duração do cartel presumido, permitem que a Comissão chegue a novas conclusões sobre a infração (acórdão Transcatab/Comissão, já referido, n.° 382).

167    Há que fazer uma interpretação restritiva dos requisitos previstos para a aplicação do ponto 23, alínea b), último parágrafo, da Comunicação de 2002 sobre a clemência, limitando‑a aos casos em que uma sociedade parte num cartel fornece uma informação nova à Comissão, relativa à gravidade ou à duração da infração, excluindo os casos em que a sociedade mais não fez do que fornecer elementos que permitem reforçar as provas relativas à existência da infração. A este respeito, importa recordar que, na medida em que o procedimento de clemência constitui uma exceção ao princípio segundo o qual uma empresa deve ser punida por qualquer infração ao direito da concorrência, as normas que se lhe referem, devem, por conseguinte, ser objeto de interpretação estrita. Por outro lado, há que salientar que a eficácia dos programas de clemência seria afetada se as empresas deixassem de ser incentivadas a serem as primeiras a apresentar informações através da denúncia de acordos, decisões ou práticas concertadas à Comissão.

[omissis]

 Aplicação ao presente caso

170    Antes de mais, há que constatar que as recorrentes não contestam a cronologia dos acontecimentos do mês de julho de 2006, conforme identificada pela Comissão. Assim, é facto assente que:

¾        as recorrentes prestaram uma declaração oral em 17 de julho de 2006;

¾        a Samsung apresentou determinados elementos de prova em 18 de julho de 2006;

¾        A Samsung prestou uma declaração oral em 20 de julho de 2006, às 9 h 40 m;

¾        as recorrentes prestaram uma declaração oral e apresentaram elementos de prova em 20 de julho de 2006, às 15 h 30 m.

171    Daqui resulta que, para beneficiar da imunidade parcial para o ano de 2005, as recorrentes têm de provar que as informações que forneceram em 17 de julho de 2006 observam os requisitos previstos no ponto 23, alínea b), último parágrafo, da Comunicação de 2002 sobre a clemência, conforme acima resumidos no n.° 166. Não sendo feita essa prova, as recorrentes têm de provar, por um lado, que, não obstante as informações divulgadas pela Samsung em 18 e 20 de julho de 2006, a Comissão ignorava que a infração declarada na decisão impugnada prosseguiu em 2005 e, por outro, que as informações apresentadas pelas recorrentes em 20 de julho de 2006 preenchiam os requisitos em causa.

172    Importa verificar se, com os argumentos invocados em apoio do presente fundamento, as recorrentes conseguiram demonstrar que deviam ter beneficiado da imunidade parcial para o ano de 2005.

173    Em primeiro lugar, segundo as recorrentes, a Comissão interpretou incorretamente o ponto 23, alínea b), último parágrafo, da Comunicação de 2002 sobre a clemência, ao exigir que, para obter a imunidade parcial, apresentassem provas suficientes para demonstrar os factos em causa. Com efeito, a redação da referida comunicação, conforme interpretada pela Comissão noutros processos, limita‑se a prever que essas provas devem ser pertinentes. Por outro lado, a Comissão aplicou um tratamento mais favorável à Samsung, concedendo‑lhe a imunidade com base em informações cuja qualidade não era superior à das informações fornecidas pelas recorrentes.

174    A este respeito, há que observar que, em conformidade com os princípios acima recordados nos n.os 161 a 168, a Comissão considerou corretamente que as informações fornecidas pelas recorrentes em 17 de julho de 2006 eram demasiado vagas para preencher os requisitos previstos na disposição em causa, conforme interpretada pela jurisprudência.

175    Com efeito, a leitura da declaração das recorrentes de 17 de julho de 2006 permite concluir que foi com razão que a Comissão, no considerando 467 da decisão impugnada, referiu o seguinte:

«[...] No presente caso, as simples alegações feitas oralmente em 17 de julho de 2006, segundo as quais até ao início de 2005 continuaram a realizar‑se reuniões, semelhantes às de 5 e de 19 de outubro de 2001, e, depois daquela data, continuou a proceder‑se a algumas trocas de informações durante um determinado período de tempo ou que preços mínimos e linhas de orientação das tarifas eram por vezes discutidos ou acordados, mas que para além destes factos, estas reuniões se limitavam a trocas de informações sobre os preços, as capacidades e a produção, não são suficientes para determinar que a infração ocorreu durante todo o ano de 2005. No momento em que [a LGD] apresentou este tipo de elementos de prova respeitantes ao ano de 2005 e também aos dois primeiros meses de 2006, designadamente através da sua declaração de 20 de julho de 2006, a Samsung, na qualidade de requerente de imunidade, já tinha, com as suas declarações de 18 e 20 de julho de 2006, informado de forma suficiente a Comissão sobre a continuação da infração em 2005 [...]»

176    Ao invés do que as recorrentes alegam, não se pode considerar que a sua declaração comporta elementos de prova precisos e fundamentados, que têm uma incidência direta na duração da infração na aceção da jurisprudência acima recordada no n.° 168, de que a infração prosseguiu durante todo o ano de 2005. Com efeito, ainda que a declaração indique que informações sobre os preços, o mercado e as condições de abastecimento a nível mundial, bem como informações respeitantes às relações com determinados clientes, foram trocadas por ocasião de reuniões que se realizaram entre outubro de 2001 e o início do ano de 2005, só estão em seguida em causa, após essa data, «determinadas trocas de informações» durante um «certo lapso de tempo», sem que se tenha precisado de que tipo de informações se trata. As referências, contidas na declaração, a trocas de informações sobre os preços referem‑se às reuniões acima referidas realizadas entre 2001 e o início do ano de 2005. Nada na declaração evoca a troca de informações sobre os preços no período posterior ao início do ano de 2005. A declaração também não precisa em que data, em 2005, se alterou a natureza das reuniões, limitando‑se a indicar que essa alteração ocorreu no início do ano.

177    Daqui resulta que as informações contidas na declaração das recorrentes relativas ao ano de 2005 são demasiado vagas para terem uma incidência direta na duração do acordo.

178    Quanto ao facto de a Comissão ter aplicado à Samsung critérios menos limitativos quando lhe reconheceu a imunidade relativamente a qualquer coima, basta constatar que o teste a aplicar para esse efeito, descrito no ponto 8, alínea b), da Comunicação de 2002 sobre a clemência, é diferente do previsto no ponto 23, alínea b), último parágrafo, da mesma. Com efeito, a primeira das referidas disposições prevê que a imunidade total é concedida à empresa que for a primeira a fornecer elementos de prova que, no entender da Comissão, lhe permitam verificar a existência de um cartel.

179    O facto de se tratar de testes diferentes constitui uma justificação objetiva, que permite que a Comissão não trate a Samsung e as recorrentes da mesma maneira, sem no entanto violar o princípio da igualdade de tratamento (v. jurisprudência acima recordada no n.° 131).

[omissis]

189    Por outro lado, é efetivamente verdade que o último elemento de prova fornecido pela Samsung, acima referido no n.° 187, não é mencionado na decisão impugnada, que se baseia a maioria das vezes nas provas apresentadas pelas recorrentes relativas ao ano de 2005. Contudo, a inexistência de referências na decisão impugnada a cada uma das provas fornecidas pela Samsung não tem incidência no facto de, no momento em que foi feita a declaração das recorrentes de 20 de julho de 2006, a Comissão não desconhecer, devido aos elementos fornecidos por aquela empresa, que em 2005 tinham continuado a efetuar‑se contactos bilaterais entre certos participantes no cartel.

190    A circunstância de a Comissão ter frequentemente utilizado as informações fornecidas pelas recorrentes em 20 de julho de 2006 confirma que as mesmas tinham efetivamente um valor probatório superior ao dos elementos anteriormente revelados pela Samsung. Todavia, é precisamente por essa razão que a Comissão considerou que os elementos fornecidos pelas recorrentes tinham um «valor acrescentado significativo» na aceção dos pontos 21 e 22 da Comunicação de 2002 sobre a clemência, o que justificou uma redução de 50% do montante da coima. A este respeito, há que salientar que os critérios de apreciação para a concessão desta redução são diferentes daqueles, acima recordados no n.° 166, que devem ser utilizados para determinar se a declaração das recorrentes de 20 de julho de 2006 podia dar origem à concessão da imunidade parcial também para o ano de 2005.

[omissis]

192    Em quarto lugar, no que respeita ao facto de as informações apresentadas pela Samsung não dizerem respeito às «reuniões Cristal», mas apenas a contactos bilaterais, há que recordar que a decisão impugnada, nomeadamente no considerando 70, define a infração em causa como abrangendo não apenas as «reuniões Cristal» mas também as reuniões e os contactos bilaterais entre os participantes. Por conseguinte, os elementos de prova relativos à existência desses contactos durante o ano de 2005 são pertinentes para provar que a infração única declarada na decisão impugnada prosseguiu ao longo de todo esse ano.

193    No que se refere ao facto de as provas apresentadas pela Samsung não visarem especificamente a participação das recorrentes no cartel em 2005, por um lado, há que recordar que, como acima se observou no n.° 185, uma das mensagens de correio eletrónico apresentadas pela Samsung evoca a possibilidade de questionar as recorrentes quanto às suas intenções respeitantes a certos preços, o que demonstra que estas continuavam a participar no cartel. Por outro lado, segundo a jurisprudência, uma vez que se trata de uma infração única e continuada, uma empresa que tenha participado numa infração através de comportamentos que lhe eram específicos, que se integram nos conceitos de acordo ou de prática concertada abrangidos pelo artigo 101.°, n.° 1, TFUE e que visam contribuir para a realização da infração no seu todo, pode ser também responsável, relativamente a todo o período da sua participação na referida infração, pelos comportamentos postos em prática por outras empresas no âmbito da mesma infração (acórdãos do Tribunal Geral de 12 de dezembro de 2007, BASF e UCB/Comissão, T‑101/05 e T‑111/05, Colet., p. II‑4949, n.° 160, e de 2 de fevereiro de 2012, Denki Kagaku Kogyo e Denka Chemicals/Comissão, T‑83/08, n.° 242).

194    Resulta do exposto que os argumentos das recorrentes destinados a obter imunidade parcial para o ano de 2005 não procedem.

195    Nestas circunstâncias, há que analisar, em último lugar, o argumento das recorrentes, apresentado a título subsidiário, relativo à circunstância de, pelo facto de a Comissão lhes ter reconhecido imunidade parcial relativamente ao mês de janeiro de 2006, haver que excluir este mês de todas as fases do cálculo do montante da coima na parte que lhes diz respeito.

196    A este propósito, há que recordar que, como se indica no quadro n.° 5 da decisão impugnada, a Comissão excluiu o mês de janeiro de 2006 do cálculo do coeficiente relativo à duração da infração no que se refere às recorrentes. Com efeito, foi‑lhes aplicado um coeficiente igual a 4,16, ao passo que aquele que foi aplicado aos outros participantes no acordo era igual a 4,25, correspondente à duração do período em que a infração foi cometida, arredondada para o valor inferior.

197    No entanto, para definir o valor das vendas de bens relacionadas com a infração, valor a partir do qual é obtido o montante de base para o cálculo da coima, a Comissão, para todos os participantes na infração, calculou a média das suas vendas durante todo o período em que a infração foi cometida, incluindo o mês de janeiro de 2006.

198    Por conseguinte, a Comissão também tomou em consideração para as recorrentes o total das suas vendas durante o período em que a infração foi cometida, incluindo o mês de janeiro de 2006, e dividiu o montante obtido por 4,33, duração do período em que a infração foi cometida, arredondada para o montante superior.

199    Há que recordar que, como a Comissão reconheceu no considerando 468 da decisão impugnada, o facto de se reconhecer às recorrentes imunidade parcial em relação ao ano de 2006 significa que, para efeitos do cálculo do montante da coima a aplicar, há que tratá‑las como tendo participado na infração entre 5 de outubro de 2001 e 31 de dezembro de 2005. Numa formulação mais próxima dos termos do ponto 23, alínea b), último parágrafo, da Comunicação de 2002 sobre a clemência, não devem ser tomados em consideração factos posteriores a 31 de dezembro de 2005 para fixar o montante da referida coima.

200    Ora, devido à maneira como procedeu reativamente às recorrentes, a Comissão não respeitou o seu próprio compromisso de não tomar em consideração o período abrangido pela imunidade parcial, concedida ao abrigo do ponto 23, alínea b), último parágrafo, da Comunicação de 2002 sobre a clemência.

201    Com efeito, esta disposição não prevê que a Comissão não tome em consideração factos abrangidos pela referida imunidade apenas para efeitos do coeficiente relativo à duração da infração, devendo‑lhe ser reconhecido um alcance mais geral, o que exclui, por conseguinte, que se tomem em consideração os referidos factos para todos os aspetos relativos à fixação do montante da coima, incluindo para o cálculo da média do valor das vendas pertinentes. No essencial, a imunidade parcial, conforme prevista na Comunicação de 2002 sobre a clemência, equivale assim a uma «ficção jurídica» nos termos da qual, para efeitos do cálculo do montante da coima, a Comissão deve considerar que a empresa que beneficia dessa imunidade não participou na infração durante o período abrangido por esse benefício.

202    Por este motivo, há que rejeitar a tese da Comissão segundo a qual a imunidade parcial não tem nenhuma incidência na escolha do ano ou dos anos de referência utilizados para calcular o valor das vendas pertinentes no cálculo do montante de base da coima, servindo este valor apenas para avaliar a influência do participante no acordo.

203    Resulta do exposto que o presente fundamento deve ser julgado parcialmente procedente, na medida em que a Comissão tomou erradamente em consideração o mês de janeiro de 2006 no cálculo do valor das vendas das recorrentes para efeitos do cálculo do montante da coima que lhes foi aplicada.

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo ao facto de a Comissão ter erradamente recusado considerar que a cooperação das recorrentes constitui uma circunstância atenuante para efeitos do cálculo do montante da coima

[omissis]

205    De acordo com o ponto 29, quarto travessão, das Orientações de 2006, pode constituir uma circunstância atenuante, suscetível de dar lugar a uma redução do montante da coima, o facto de «a empresa em causa colabora[r] efetivamente com a Comissão, fora do âmbito de aplicação da Comunicação [de 2002] sobre a clemência e para além das suas obrigações legais de cooperação».

206    A este respeito, há que considerar que esta disposição deve ser interpretada no sentido de que não permite que uma empresa beneficie de uma dupla redução do montante da coima, ao abrigo da Comunicação de 2002 sobre a clemência e ao abrigo das Orientações de 2006, relativamente à mesma cooperação com a Comissão.

207    Com efeito, resulta da jurisprudência que, no que respeita a infrações abrangidas pelo âmbito de aplicação da Comunicação de 2002 sobre a clemência, em princípio, o interessado não pode validamente acusar a Comissão de não ter tomado em consideração o grau da sua cooperação como circunstância atenuante, fora do quadro jurídico da referida comunicação (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal Geral de 15 de março de 2006, BASF/Comissão, T‑15/02, Colet., p. II‑497, n.° 586, e de 14 de julho de 2011, Arkema France/Comissão, T‑189/06, Colet., p. II‑5455, n.° 178). Na medida em que a Comissão tomou em consideração a cooperação das recorrentes, ao reduzir o montante da coima em aplicação da Comunicação de 2002 sobre a clemência, não pode ser validamente acusada de não ter aplicado uma redução suplementar do montante da coima aplicada às recorrentes, fora do âmbito de aplicação da referida comunicação.

208    Daqui resulta que a jurisprudência segundo a qual, em situações excecionais, a Comissão é obrigada a conceder uma redução do montante da coima a uma empresa ao abrigo do ponto 29, quarto travessão, das Orientações de 2006 (v., neste sentido, acórdão de 17 de maio de 2011, Arkema France/Comissão, já referido, n.° 170, e acórdão Transcatab/Comissão, já referido, n.° 330) deve ser interpretada no sentido de que a existência dessas situações pressupõe que a cooperação da empresa em causa, embora excedendo a sua obrigação legal de cooperar, não lhe confere, contudo, direito a uma redução do montante da coima ao abrigo da Comunicação de 2002 sobre a clemência.

209    No presente caso, uma vez que a Comissão acusa as recorrentes de terem participado num cartel, é incontestável que se trata de uma infração que se enquadra efetivamente no âmbito de aplicação da Comunicação de 2002 sobre a clemência (v., por analogia, acórdão do Tribunal de Justiça de 28 de junho de 2005, Dansk Rørindustri e o./Comissão, C‑189/02 P, C‑202/02 P, C‑205/02 P a C‑208/02 P e C‑213/02 P, Colet., p. I‑5425, n.° 381).

210    Do mesmo modo, é facto assente que as recorrentes beneficiaram de uma redução do montante da coima em aplicação da referida comunicação.

211    Nestas circunstâncias, as recorrentes só podem beneficiar de uma redução suplementar, a título de circunstância atenuante, ao abrigo de uma cooperação diferente daquela já foi tomada em consideração no âmbito da Comunicação de 2002 sobre a clemência e que preencha os requisitos exigidos para a aplicação do ponto 29, quarto travessão, das Orientações de 2006.

[omissis]

 Quanto ao quarto fundamento, relativo à exclusão do processo dos fornecedores japoneses de LCD

[omissis]

 Quanto ao conceito de infração única e continuada

[omissis]

220    Em primeiro lugar, há que recordar que o conceito de infração única visa uma situação na qual várias empresas participaram numa infração constituída por um comportamento continuado que prosseguiu uma única finalidade económica que visa falsear a concorrência ou ainda em infrações individuais ligadas entre si por uma identidade de objeto (mesma finalidade de todos os elementos) e de sujeitos (identidade das empresas em causa, conscientes da participação no objetivo comum) (v. acórdão do Tribunal Geral de 28 de abril de 2010, Amann & Söhne e Cousin Filterie/Comissão, T‑446/05, Colet., p. II‑1255, n.° 89 e jurisprudência referida).

221    Em seguida, há que referir que uma violação do artigo 101.°, n.° 1, TFUE pode resultar não apenas de um ato isolado mas também de uma série de atos ou ainda de um comportamento continuado. Esta interpretação não pode ser contestada pelo facto de um ou de diversos elementos dessa série de atos ou de esse comportamento continuado também poderem constituir, eles próprios e considerados de forma isolada, uma violação da referida disposição. Quando as diferentes ações se inscrevem num plano global, em razão do seu objeto idêntico que falseia o jogo da concorrência no mercado único, a Comissão pode imputar a responsabilidade por essas ações às empresas em causa em função da sua participação na infração considerada no seu todo (v. acórdão Amann & Söhne e Cousin Filterie/Comissão, já referido, n.° 90 e jurisprudência referida).

222    A este respeito, em primeiro lugar, há que observar que, embora esta jurisprudência permita à Comissão investigar, através de um único procedimento e de uma única decisão, simultaneamente vários comportamentos que podiam ter sido investigados de forma individual, dela não decorre a obrigação de a Comissão proceder dessa forma. Assim, em princípio, a Comissão não pode ser acusada de investigar separadamente diferentes comportamentos que podia ter reagrupado numa infração única e continuada. Além disso, cada um desses comportamentos pode conter em si mesmo várias infrações.

223    Daqui resulta que a Comissão dispõe de um poder de apreciação relativamente ao âmbito dos procedimentos a que dá início. Com efeito, segundo a jurisprudência, a Comissão não pode ser obrigada a declarar e a punir todos os comportamentos anticoncorrenciais e os órgãos jurisdicionais da União não podem — ainda que com vista a uma redução do montante da coima — declarar que a Comissão, atendendo às provas que tem à sua disposição, devia ter provado a existência de uma infração durante um certo período e contra uma empresa determinada (v., neste sentido, acórdão Tokai Carbon e o./Comissão, já referido, n.os 369 e 370).

224    O exercício deste poder está sujeito a fiscalização jurisdicional. Contudo, resulta da jurisprudência que só se podia considerar que a opção da Comissão constitui um desvio de poder se se demonstrasse que esta deu início, sem razão objetiva, a dois procedimentos distintos relativos a uma situação de facto única (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de junho de 2010, Comissão/Alrosa, C‑441/07 P, Colet., p. I‑5945, n.° 89).

225    No presente caso, a Comissão considerou que a recorrente não dispunha, ou ainda não dispunha, de provas suficientes contra os fornecedores japoneses e optou, deste modo, por não dar início simultaneamente a um procedimento contra estes e contra as recorrentes e as outras destinatárias da decisão impugnada. Ora, esta circunstância constitui um motivo objetivo, que justifica a escolha da Comissão. É evidente que, no âmbito do processo iniciado contra fornecedores japoneses, a Comissão é obrigada a respeitar, designadamente, o princípio ne bis in idem relativamente às recorrentes.

[omissis]

228    No presente caso, há que observar, antes de mais, que a infração que a Comissão imputa aos destinatários da decisão impugnada consiste no facto de terem participado, por um lado, nas «reuniões Cristal», no decurso das quais fixaram preços mínimos para os LCD cartelizados, discutiram projeções de preços para evitar a respetiva diminuição e coordenaram os respetivos aumentos de preços, bem como os seus níveis de produção, e, por outro, em reuniões bilaterais relativas a assuntos discutidos nas «reuniões Cristal» (v. n.° 20 supra).

229    Ora, as recorrentes reconhecem que os fornecedores japoneses não participaram nas «reuniões Cristal», mas noutras reuniões, nas quais, contudo, as destinatárias da decisão impugnada não participaram.

230    Ainda que se admita que também os fornecedores japoneses participaram, entre si ou igualmente com as destinatárias da decisão impugnada, num cartel destinado a falsear a concorrência nos preços dos LCD, não se pode considerar que a sua estratégia para este efeito decorre necessariamente do mesmo plano global e emprega os mesmos métodos que foram definidos pelas destinatárias da decisão impugnada.

231    A falta de prova relativa a um plano global e aos métodos comuns constitui um motivo objetivo que permite que a Comissão investigue a infração cometida pelas recorrentes sem incluir no mesmo procedimento a infração eventualmente cometida pelos fornecedores japoneses.

[omissis]

234    Além disso, importa afastar o argumento que as recorrentes pretendem retirar do facto de a Comissão ter sustentado, nos seus articulados apresentados ao Tribunal Geral, que foi para respeitar os princípios estabelecidos no acórdão do Tribunal Geral de 12 de outubro de 2007, Pergan Hilfsstoffe für industrielle Prozesse/Comissão (T‑474/04, Colet., p. II‑4225, n.os 72 a 82), que a mesma não incluiu referências aos fornecedores japoneses na decisão impugnada, embora estes tivessem sido mencionados na comunicação de acusações, apesar de não serem seus destinatários.

235    A este respeito, importa recordar que resulta, com efeito, do acórdão Pergan Hilfsstoffe für industrielle Prozesse/Comissão, já referido, que, para respeitar nomeadamente a presunção de inocência, a Comissão deve evitar publicar, nas suas decisões, referências que sejam simplesmente suscetíveis de acusar uma empresa pela prática de uma infração, quando o dispositivo dessa decisão não vise a dita empresa. No entanto, o facto de, nos termos dos princípios estabelecidos no referido acórdão, a Comissão não ter mencionado os fornecedores japoneses na decisão impugnada significa apenas que respeitou a presunção de inocência relativamente a esses fornecedores. Em contrapartida, esta falta de menção não pode ser interpretada no sentido de que a Comissão tomou posição, ainda que implicitamente, sobre a participação dos fornecedores japoneses em práticas anticoncorrenciais relativas aos LCD cartelizados.

[omissis]

 Quanto à alegada violação do dever de fundamentação

[omissis]

238    A este respeito, há que recordar que a Comissão não tinha obrigação de expor, na decisão impugnada, os motivos pelos quais os fornecedores japoneses não foram investigados. Com efeito, o dever de fundamentação de um ato não pode incluir uma obrigação, para a instituição sua autora, de fundamentar o facto de não ter adotado outros atos semelhantes dirigidos a terceiros (acórdãos do Tribunal Geral de 8 de julho de 2004, JFE Engineering e o./Comissão, T‑67/00, T‑68/00, T‑71/00 e T‑78/00, Colet., p. II‑2501, n.° 414, e de 4 de julho de 2006, Hoek Loos/Comissão, T‑304/02, Colet., p. II‑1887, n.° 63). A argumentação invocada pelas recorrentes deve assim ser afastada.

 Quanto às alegadas violações dos princípios da segurança jurídica e ne bis in idem

[omissis]

242    No presente caso, as recorrentes não podem invocar o princípio non bis in idem, uma vez que o seu recurso tem por objeto a decisão que põe termo ao primeiro processo que a Comissão iniciou contra as recorrentes a respeito de uma infração relativa aos LCD cartelizados. Com efeito, este princípio só pode ser invocado contra uma decisão que encerra um eventual segundo processo, que seja relativo à mesma infração. Em contrapartida, este princípio não pode desempenhar um papel relativamente à decisão impugnada, cuja existência constitui uma condição sine qua non para que o princípio em questão possa ser invocado relativamente a um segundo procedimento.

243    A segurança jurídica das recorrentes é garantida pelo facto de que seria contrária ao princípio ne bis in idem qualquer decisão da Comissão que as investigasse relativamente à mesma infração visada pela decisão impugnada. É evidente que a observância deste princípio não pode ser feita de forma preventiva, no âmbito do presente recurso, o qual tem por objeto a decisão impugnada.

244    Relativamente à circunstância segundo a qual a Comissão deu início a um procedimento contra os fornecedores japoneses, em cujo âmbito solicitou informações às recorrentes, não tem nenhuma incidência na legalidade da decisão impugnada nem no montante da coima aplicada às recorrentes. Com efeito, o facto de terem sido investigadas devido à infração declarada na decisão impugnada não determina que as recorrentes fiquem eximidas do seu dever de cooperar com a Comissão para efeitos de um processo suscetível de conduzir à constatação de uma infração cometida por outras empresas, ou inclusivamente pelas recorrentes, desde que os factos invocados pela Comissão para esse efeito sejam diferentes daqueles em que a decisão impugnada se baseia, sendo especificado que esta última não abrangia os fornecedores japoneses.

[omissis]

 Quanto à alegada violação do princípio da proporcionalidade

[omissis]

248    Importa observar que o caráter proporcionado de uma coima deve ser apreciado à luz de todas as circunstâncias da infração (v. acórdão do Tribunal Geral de 29 de novembro de 2005, SNCZ/Comissão, T‑52/02, Colet., p. II‑5005, n.° 58 e jurisprudência referida). Ora, os riscos, invocados pelas recorrentes, de ter de suportar despesas suplementares na sequência de um segundo procedimento iniciado pela Comissão contra, nomeadamente, fornecedores japoneses não podem ser considerados como circunstâncias relativas à infração cometida pelas recorrentes que foi declarada na decisão impugnada.

[omissis]

 Exercício da competência de plena jurisdição

252    Para além da anulação parcial da decisão impugnada, as recorrentes pedem ao Tribunal Geral que reduza o montante da coima que a Comissão lhes foi aplicou, baseando‑se no facto de que esta cometeu os erros visados pelos fundamentos acima examinados e, no que respeita à exclusão do processo dos fornecedores japoneses de LCD, também na possibilidade de que o início de um procedimento que visa estes fornecedores poder causar um prejuízo às recorrentes.

253    Resulta da análise dos fundamentos das recorrentes que o único erro cometido pela Comissão quando da fixação da coima que lhes foi aplicada consiste no facto de ter tomado em consideração o mês de janeiro de 2006 no cálculo da média do valor das respetivas vendas (n.os 195 a 203 supra). Por outro lado, pelas razões acima explicadas no n.° 244, não se pode considerar que a abertura, por parte da Comissão, de um procedimento que visa os fornecedores japoneses causou um prejuízo às recorrentes. Seja como for, esta circunstância não teve incidência na gravidade nem na duração da infração cometida pelas recorrentes.

254    Nestas circunstâncias, há que examinar o pedido das recorrentes no sentido de que o Tribunal Geral corrija o erro relativo ao mês de janeiro de 2006 e reduza, consequentemente, o montante da coima que a Comissão lhes aplicou.

255    Há que recordar que a fiscalização da legalidade das decisões adotadas pela Comissão é completada pela competência de plena jurisdição, que é reconhecida ao juiz da União pelo artigo 31.° do Regulamento (CE) n.° 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigo 81.° [CE] e 82.° [CE] (JO 2003, L 1, p. 1), em conformidade com o disposto no artigo 261.° TFUE. Esta competência permite que o juiz, para além da simples fiscalização da legalidade da sanção, substitua a apreciação da Comissão pela sua própria apreciação e, consequentemente, suprima, reduza ou agrave o montante da coima ou da sanção pecuniária compulsória aplicada.

256    Assim, cabe ao Tribunal Geral, no âmbito da sua competência de plena jurisdição, apreciar, na data em que adota a sua decisão, se foi aplicada às recorrentes uma coima cujo montante reflete corretamente a gravidade e a duração da infração em causa (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 27 de setembro de 2012, Shell Petroleum e o./Comissão, T‑343/06, n.° 117 e jurisprudência referida).

257    No presente caso, deve observar‑se que as partes estão de acordo sobre o facto de que excluir o mês de janeiro de 2006 do cálculo da média do valor das vendas pertinentes das recorrentes tem como consequência que, ao aplicar à referida média o mesmo método que foi seguido na decisão impugnada, o montante da coima a aplicar às recorrentes é de 210 000 000 euros.

258    Por conseguinte, não havendo outros elementos suscetíveis de justificar uma revisão mais significativa do montante da coima aplicada às recorrentes na decisão impugnada e tendo em conta todas as circunstâncias do presente caso, esse montante deve ser reduzido para 210 000 000 euros.

259    Por outro lado, atendendo ao exposto, há que julgar improcedentes os restantes pedidos constantes da petição inicial.

[omissis]

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção)

decide:

1)      O montante da coima aplicada solidariamente à LG Display Co. Ltd e à LG Display Taiwan Co. Ltd no artigo 2.° da Decisão C (2010) 8761 final da Comissão, de 8 de dezembro de 2010, relativa a um processo nos termos do artigo 101.° [TFUE] e do artigo 53.° do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (processo COMP/39.309 — LCD), é fixado em 210 000 000 euros.

2)      É negado provimento ao recurso quanto ao restante.

3)      A LG Display e a LG Display Taiwan suportarão as suas próprias despesas, bem como três quartos das despesas efetuadas pela Comissão Europeia.

4)      A Comissão suportará um quarto das suas próprias despesas.

Kanninen

Berardis

Wetter

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 27 de fevereiro de 2014.

Assinaturas


* Língua do processo: inglês.


1 —      Apenas são reproduzidos os números do presente acórdão cuja publicação o Tribunal considera útil.