Language of document : ECLI:EU:T:2000:289

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção Alargada)

12 de Dezembro de 2000 (1)

«Auxílios de Estado - Recapitalização da Alitalia pelas autoridades italianas - Qualificação da medida - Critério do investidor privado - Exame pela Comissão»

No processo T-296/97,

Alitalia - Linee aeree italiane SpA, com sede em Roma (Itália), representada por F. Sciaudone e G. M. Roberti, advogados no foro de Nápoles, M. Siragusa, advogado no foro de Roma, G. Scassellati Sforzolini, advogado no foro de Bolonha, M. Beretta, advogado no foro de Bérgamo, e F. M. Moretti, advogado no foro de Veneza, bem como, inicialmente, por A. Tizzano, advogado no foro de Nápoles, com domicílioescolhido no Luxemburgo no escritório dos advogados Elvinger, Hoss e Prussen, 2, place Winston Churchill,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por D. Triantafyllou, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente, assistido por A. Abate e E. Cappelli, advogados no foro de Roma, com domicílio escolhido no Luxemburgo, no gabinete de C. Gómez de la Cruz, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

recorrida,

apoiada pela

Air Europe SpA, com sede em Gallarate (Itália), representada por L. Pierallini e A. Costantini, advogados no foro de Roma, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do advogado A. Lorang, 51, rue Albert 1er,

e pela

Air One SpA, com sede em Chieti (Itália), representada por M. Merola, advogado no foro de Roma, e A. Sodano del Foro Adele, advogado no foro de Nápoles, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório de A. Lorang, 51, rue Albert 1er,

intervenientes,

que tem por objecto um pedido de anulação da Decisão 97/789/CE da Comissão, de 15 de Julho de 1997, relativa à recapitalização da companhia Alitalia (JO L 322, p. 44),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Terceira Secção Alargada),

composto por: K. Lenaerts, presidente, J. Azizi, R. M. Moura Ramos, M. Jaeger e P. Mengozzi, juízes,

secretário: J. Palacio González, administrador

vistos os autos e após a audiência de 27 de Junho de 2000,

profere o presente

Acórdão

Factos que deram origem ao litígio

1.
    A recorrente é uma companhia aérea cujo capital era detido, em 1 de Julho de 1996, em cerca de 90%, pela sociedade financeira do Estado italiano «Istituto per la ricostruzione industriale SpA» (a seguir, «IRI», sendo o resto detido por investidores privados.

2.
    A recorrente ocupa o quinto lugar entre as companhias aéreas europeias em termos de passageiros-quilómetros transportados, a seguir à British Airways, Lufthansa, Air France e KLM. O seu volume de negócios, da ordem dos 7,83 biliões de liras italianas (LIT) em 1996 (cerca de 4 mil milhões de euros), é comparável ao da SAS e ligeiramente inferior ao da Swissair. Embora a rede da recorrente cubra principalmente a Itália e a Europa, inclui igualmente 40 destinos intercontinentais situados na América do Norte e do Sul, em África e no Médio e Extremo Oriente.

3.
    A recorrente detém participações no capital de outras companhias aéreas. Assim, ela controla a 100% a empresa Avianova, transformada em Julho de 1996 na Alitalia Team SpA ( a seguir, «Alitalia Team»), e detém 45% das participações na empresa de voos charter Eurofly, e 27,61% na Air Europe. No momento da interposição do recurso, detinha ainda uma participação de 30% na companhia nacional húngara Malev.

4.
    A recorrente detém também um número limitado de participações no capital de empresas com actividades ligadas à do transporte aéreo. Todavia, o transporte aéreo de passageiros e de mercadorias representa 92% do conjunto do volume de negócios do grupo.

5.
    No início dos anos 90, a recorrente sofreu uma descapitalização. Durante esse mesmo período, a recorrente teve de enfrentar dificuldades ligadas à guerra do Golfo, à recessão dos anos de 1992 e 1993 no sector aéreo e à concorrência acrescida decorrente do processo de liberalização do mercado de transporte aéreo. Por consequência, a receita unitária média da recorrente (yield) sofreu uma redução de 22% entre 1990 e 1995. Esses acontecimentos levaram a recorrente a reduzir os seus custos de exploração e a melhorar a sua produtividade, nomeadamente através da redução dos efectivos em terra. Assim, o custo de exploração por tonelada-quilómetro oferecida diminuiu de 13% e o número de toneladas-quilómetros por trabalhador aumentou em 60% durante o período de 1990-1995.

6.
    A despeito desses esforços, a recorrente não conseguiu entrar na via da rentabilidade. O seu endividamento passou de 0,653 bilião de LIT em 1990 para 3,42 biliões em 1995, gerando importantes encargos financeiros.

7.
    Em 31 de Março de 1996, as perdas acumuladas da recorrente atingiam 0,905 bilião de LIT e o património líquido da companhia era de 0,15 bilião de LIT. Essa situação conduziu a recorrente a adoptar, em Julho de 1996, um plano de reestruturação para o período de 1996-2000, acompanhado do projecto de importantes injecções de capital por parte do IRI.

8.
    O plano de reestruturação era composto por duas fases, uma fase de saneamento (1996-1997) e uma fase de desenvolvimento (1998-2000).

9.
    A fase de saneamento visava reduzir os custos de exploração da recorrente e repor o rácio «dívidas/fundos próprios» a um nível razoável. Incluía, portanto, uma componente financeira e uma componente de gestão. A componente de gestão tendia a tornar a empresa competitiva a curto prazo, através da prossecução de três objectivos principais: a redução dos custos, a optimização das receitas e a alienação de actividades não estratégicas.

10.
    No que toca, em particular, à redução dos custos, esta seria realizada pelo aumento da produtividade e por reduções salariais. O acordo a que chegaram a empresa e os representantes sindicais em 19 de Junho de 1996 resultaria, durante o período quinquenal de 1996-2000, em economias de mais de 1 bilião de LIT. Como contrapartida dessa redução de encargos salariais, os trabalhadores da recorrente receberiam acções Alitalia num valor de 0,31 bilião de liras (o que representa para a companhia um custo total de 0,52 bilião com os encargos fiscais e as cotizações para a assistência social) correspondendo a uma economia anual realizada a prazo, em matéria de custos com pessoal. O plano prevê também a constituição de uma sociedade autónoma, inteiramente controlada pela recorrente, que contratará a nova tripulação de cabina em condições menos onerosas. Esta nova sociedade, denominada Alitalia Team, foi constituída em 23 de Julho de 1996.

11.
    A componente financeira do plano comunicado à Comissão em Junho de 1996 previa injecções de capital de um montante total de 3,31 biliões de LIT, dos quais 1,5 biliões a receber do IRI antes do final de 1996, uma segunda prestação de 1,5 biliões a receber em 1997 e 0,31 bilião correspondentes à participação do pessoal no capital da empresa, tal como indicado no n.° 10 supra. Dos 1,5 biliões correspondentes à primeira prestação, 1 bilião fora já adiantado à recorrente pelo IRI em Junho de 1996.

12.
    A fase de desenvolvimento baseava-se principalmente na entrada em funcionamento da plataforma de correspondência de Malpensa a partir de 1998. Segundo o plano, o desenvolvimento do aeroporto de Malpensa permitiria à recorrente efectuar um reposicionamento nos mercados mais importantes e mais ricos da Europa: o do norte de Itália. A criação da plataforma de Malpensa seria acompanhada por uma reestruturação do terminal do aeroporto de Roma-Fiumicino, que constituía, na altura, o ponto-charneira da rede da Alitalia. Por outro lado, a recorrente pretendia, durante a fase de desenvolvimento, criar serviços de vaivém nas ligações internas italianas mais importantes, reorganizar a sua rede internacional, desenvolver uma estratégia de alianças com parceiros externos e aumentar a sua frota.

Processo administrativo

13.
    Por carta de 29 de Julho de 1996, as autoridades italianas informaram a Comissão do plano de reestruturação. Tratava-se, segundo as autoridades italianas, de um planoessencialmente destinado a preparar a privatização da recorrente. Não conteria elementos de auxílio.

14.
    Por carta de 9 de Agosto de 1996, a Comissão indicou às autoridades italianas que a operação seria examinada à luz das disposições do artigo 92.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 87.° CE) e no quadro do procedimento previsto pelo artigo 93.°, n.° 2, do Tratado CE (actual artigo 88.°, n.° 2, CE).

15.
    A Comissão decidiu, em 9 de Outubro de 1996, dar início ao processo previsto no n.° 2 do artigo 93.° do Tratado CE relativamente aos aumentos de capital previstos no plano. Disso informou as autoridades italianas por carta de 21 de Outubro de 1996, que foi objecto de uma comunicação publicada em 16 de Novembro de 1996, no Jornal Oficial das Comunidades Europeias (JO C 346, p. 13, a seguir a «comunicação de 16 de Novembro de 1996»).

16.
    Na comunicação de 16 de Novembro de 1996, a Comissão explicou que abertura do processo era devida à natureza das injecções de capital efectuadas pelo IRI, que podem ser qualificadas de recursos estatais na acepção do artigo 92.°, n.° 1, do Tratado, e às sérias dúvidas da Comissão quanto à:

-    existência de um auxílio, tendo em conta as fracas probabilidades de remuneração, de forma satisfatória, do esforço financeiro realizado pelo IRI;

-     possibilidade de conceder a um eventual auxílio o benefício de uma das derrogações previstas nos n.os 2 e 3 do artigo 92.° do Tratado.

17.
    A Comissão recorreu a uma empresa de consultores independente (Ernst & Young) a fim de recolher informações sobre várias questões em relação às quais tinha manifestado dúvidas.

18.
    Por ofício de 21 de Novembro de 1996, as autoridades italianas apresentaram as suas observações relativas à abertura do procedimento do artigo 93.°, n.° 2, do Tratado.

19.
    Os Governos britânico, dinamarquês, norueguês e sueco, oito companhias aéreas concorrentes da recorrente e duas associações apresentaram observações na sequência da abertura do processo.

20.
    Em 11 de Dezembro de 1996, os consultores da Comissão entregaram um relatório sobre o plano inicial. Eles entendem que o plano de reestruturação aparenta-se mais a um «turnaround plan» (a seguir «plano de recuperação» que a um «business plan» (a seguir «plano estratégico»), de forma que a taxa anual de rendimento mínimo requerido ou «hurdle rate» (a seguir, «taxa mínima»), por um investidor em tal situação se situaria entre os 30 e os 40%. A taxa de rendimento interna (a seguir «taxa interna») da injecção de capital de 3 biliões de LIT, tal como foi recalculada após um ajustamento dos elementos apresentados pela recorrente, varia entre - 12,5% e + 25,7% emfunção dos diversos cenários considerados (inclusão, ou exclusão, dos custos de insolvência, inclusão, ou exclusão, do financiamento do programa de reformas antecipadas pelo Estado ou pela companhia, hipóteses divergentes sobre a taxa de crescimento do fluxo de caixa após o ano 2000 e sobre a participação detida pelo IRI no capital da Alitalia na perspectiva do ano 2000). Esta continua, portanto, segundo os consultores, inferior à taxa mínima, tendo em conta os riscos em que incorre o investidor.

21.
    No seu relatório, os consultores da Comissão sustentam também que o programa de reformas antecipadas previsto a favor dos trabalhadores da recorrente, suportado pelo orçamento do Estado italiano num montante de cerca de 0,16 bilião de LIT poderia incluir elementos de auxílio de Estado.

22.
    O relatório dos consultores foi notificado ao Governo italiano em 12 de Dezembro de 1996. Num documento com data de 20 de Dezembro de 1996, as autoridades italianas formularam observações sobre esse relatório.

23.
    Os comentários dos Estados e de terceiros interessados, apresentados na sequência da comunicação de 16 de Novembro de 1996, foram também transmitidos às autoridades italianas, que lhe responderam por carta de 15 de Janeiro de 1997. Nessa carta, as autoridades italianas sublinham mais uma vez que o plano de reestruturação da recorrente não inclui qualquer elemento de auxílio de Estado.

24.
    Na base do conjunto das informações de que dispunha, nomeadamente, do relatório fornecido pelos consultores, em 11 de Dezembro de 1996, a Comissão informou as autoridades italianas e os dirigentes da recorrente, por carta de 22 de Janeiro de 1997, que o plano de reestruturação da companhia não se afigurava suficiente para encarar a hipótese da adopção de uma decisão positiva e que se afigurava indispensável obter elementos de informação suplementares a fim de examinar as adaptações necessárias. A esse propósito, teve lugar, em Roma, em 24 de Janeiro de 1997, uma reunião entre a Comissão, a recorrente e os seus respectivos consultores.

25.
    No decurso do mês de Fevereiro de 1997, a recorrente entregou à Comissão uma versão adaptada do plano de reestruturação. Ele comportava principalmente os seguintes elementos:

-     uma redução, a partir de 1997, de perto de 10% do número de ligações e de frequências exploradas pela recorrente, fixando-se o total de voos assim anulados em cerca de 27 000 por ano;

-    a manutenção da sua frota ao nível existente até ao fim da execução do plano de reestruturação;

-     a redução do montante total do aumento de capital previsto, o qual passa de 3 biliões de LIT para 2,8 biliões de LIT, essencialmente devido a uma menor necessidade de investimentos;

-     a cessão de participações que a recorrente tem no sistema informatizado de reservas Galileo;

-     o alinhamento do método de amortização das aeronaves com o método em vigor nas outras grandes companhias comunitárias.

26.
    Em 21 de Fevereiro de 1997, os consultores da Comissão entregaram um projecto de relatório sobre o plano modificado. Esse projecto conclui que, embora o plano de Fevereiro de 1997 pareça efectivamente mais prudente que o plano inicial e apresente um carácter muito menos expansionista, baseia-se ainda em várias hipóteses optimistas. Os consultores são, por conseguinte, de opinião que a taxa mínima não poderá ser inferior a 30% devido à persistência de importantes riscos ligados à operação. Ainda segundo os consultores, essa taxa continua largamente superior à taxa interna, embora esta, que se situa entre os 13,2 e os 26,9%, tenha melhorado sensivelmente pelas adaptações efectuadas.

27.
    As autoridades italianas apresentaram comentários sobre o projecto de relatório dos consultores de 21 de Fevereiro de 1997, num documento entregue à Comissão em 25 de Março de 1997 bem como numa carta de 3 de Abril de 1997.

28.
    No decurso de uma reunião que se realizou em Bruxelas em 8 de Abril de 1997 entre a Comissão e a recorrente, esta declarou-se disposta a tomar a seu cargo os custos directos atinentes ao programa de reformas antecipadas se a Comissão considerasse que a operação correspondia ao critério do investidor em economia de mercado (carta da recorrente à Comissão de 15 de Abril de 1997). Por carta de 17 de Abril de 1997, o Ministério de Transportes italiano confirmou ainda que «a Alitalia (tinha) indicado à Comissão Europeia que ela estava disposta a tomar a cargo a totalidade do programa de reformas antecipadas que se estende pelo período de 1995-1997, se tal for a condição para ver o aumento de capital aprovado enquanto operação que corresponde ao critério do investidor em economia de mercado».

29.
    Por ofício de 18 de Abril de 1997, a Comissão indicou à recorrente e ao Governo italiano que não se encontrava em condições de adoptar uma decisão positiva baseada no princípio do investidor em economia de mercado quanto a este processo. A seguir a essa troca de correspondência, realizaram-se várias reuniões entre as autoridades italianas, a recorrente e a Comissão.

30.
    Com vista à reunião de 16 de Maio de 1997, a Comissão entregou à recorrente, em 14 de Maio de 1997, um documento informal contendo, por um lado, orientações possíveis para melhorar o plano da sua reestruturação a fim de atingir um grau razoável de certeza quanto à sua viabilidade e, por outro, indicações das condições a que seria subordinada a autorização de um auxílio de Estado à recorrente. Uma das «questões a resolver» mencionada por esse documento era «(o) tratamento dos custos das reformas antecipadas». «O Governo italiano deve dar a garantia de que esses custos serão postos directamente a cargo da Alitalia para o período de 1995-2001 inclusive.As somas já pagas a esse título pelo Estado italiano ser-lhe-ão reembolsadas com os juros antes da decisão da Comissão.»

31.
    As reuniões que tiveram lugar em Maio e Junho de 1997 incidiam, nomeadamente, nas seguintes modificações do plano de reestruturação:

-    uma aceleração do processo de redução dos custos através de uma transferência de pessoal da recorrente para a Alitalia Team mais rápida do que fora anteriormente previsto,

-    uma redução do montante do aumento de capital previsto para 2,75 biliões de LIT. Além disso, o aumento de capital seria dividido em três prestações: a primeira, de um montante de 2 biliões de LIT (incluindo o bilião concedido a título de adiantamento em Junho de 1996), a pagar imediatamente, após a adopção de uma decisão positiva; a segunda, de um montante de 0,5 bilião de LIT, a pagar em Maio de 1998 e a terceira, de um montante de 0,25 bilião de liras, a pagar em Maio de 1999,

-    a cessão das participações da Alitalia na companhia húngara Malev, bem como em seis aeroportos regionais italianos (Génova, Nápoles, Rimini, Florença, Lamezia Terme e Turim).

32.
    Em 18 de Junho de 1997, os consultores da Comissão entregaram um relatório a esta sobre o plano de reestruturação modificado. Trata-se da versão definitiva do relatório de 21 de Fevereiro de 1997 (v. supra n.° 26).

33.
    Em 26 de Junho de 1997, as autoridades italianas transmitiram à Comissão a versão definitiva do plano de reestruturação da recorrente, que «contém as adaptações suplementares pedidas pela Comissão». O plano definitivo compreende todas as adaptações descritas no n.° 31 supra. No seu ofício de 26 de Junho de 1997, «o Governo italiano reconhece que o plano (de reestruturação) é acompanhado de medidas de auxílios estatais» e compromete-se a respeitar certas condições.

34.
    Em 4 de Julho de 1997, os consultores da Comissão entregaram um relatório complementar que toma em consideração as últimas modificações introduzidas no plano de reestruturação bem como a carta das autoridades italianas de 26 de Junho de 1997. No seu relatório, os consultores concluem que «o plano não contém elementos susceptíveis e o tornar irrealista (...), que pode ser considerado viável e que permite à companhia reencontrar uma rentabilidade satisfatória». Consideram, além disso, que o montante da injecção de capital «pode ser considerada como indispensável e adequada face aos objectivos do plano e às necessidades geradas pelo esforço de reestruturação».

35.
    Em 4 de Julho de 1997, a recorrente creditou o montante de 56,6 mil milhões de LIT numa conta bloqueada aberta junto da Banca nazionale del lavoro, em execução do compromisso assumido pelo Governo italiano perante a Comissão, respeitante ao programa das reformas antecipadas. Em 14 de Julho de 1997, designou dois notáriosde Roma na qualidade de depositários de bens arrestados com a missão de pagar esse montante ao Estado italiano a título de restituição dos incentivos à reforma antecipada pagos a 700 assalariados no decurso do período de 1995-1997.

Decisão recorrida

36.
    Em 15 de Julho de 1997, a Comissão adoptou a Decisão 97/789/CE, relativa à recapitalização da companhia Alitalia (JO L 322, p. 44; a seguir, «decisão recorrida»), que pode resumir-se como se segue.

37.
    Após ter sido descrita a situação financeira preocupante em que a recorrente se encontrava em 1996, que deu lugar à adopção do plano de reestruturação, a Comissão descreve as linhas desse plano e as modificações que lhe foram introduzidas no decurso do processo administrativo.

38.
    A Comissão salienta que, no decurso das suas negociações com o Governo italiano, este formulou uma série de compromissos respeitantes à execução do plano de reestruturação da recorrente. Esses compromissos foram reproduzidos, sob a forma de condições, no dispositivo da decisão recorrida.

39.
    A Comissão entende que a dotação em capital no montante de 2,75 biliões de LIT que o IRI se propõe efectuar em proveito da recorrente constitui um auxílio de Estado na acepção do artigo 92.°, n.° 1, do Tratado e do artigo 61.°, n.° 1, do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (a seguir o «Acordo EEE»). A decisão recorrida menciona, para esse efeito, que «a (taxa interna) do investimento no montante de 2,75 biliões de LIT no capital da Alitalia apresenta, para o IRI, uma percentagem próxima de 20%, tendo em conta o facto de a Alitalia ter assumido directamente o custo das pré-reformas. Esta (taxa interna) continua a ser inferior à (taxa mínima) exigid(a) por um investidor privado a operar segundo as leis do mercado para proceder à injecção de capital em causa. Nessas condições, a Comissão é de opinião que o princípio do investidor em economia de mercado não é observado no presente caso.» (ponto VII, oitavo parágrafo)

40.
    Após ter excluído a aplicação de outras disposições derrogatórias do Tratado e do Acordo EEE, a Comissão verifica em que medida se dá satisfação aos critérios fixados pelo artigo 92.°, n.° 3, alínea c), do Tratado e pelo artigo 61.°, n.° 3, alínea c), do Acordo EEE.

41.
    Para esse efeito, examina se o aumento de capital da recorrente em 2,75 biliões de LIT preenche as diferentes condições previstas na comunicação da Comissão relativa à aplicação dos artigos 92.° e 93.° do Tratado CE e do artigo 61.° do Acordo EEE aos auxílios de Estado no sector da aviação (JO 1994, C 350, p. 5; a seguir, «comunicação para a aviação»).

42.
    A Comissão reconhece que o objectivo do plano de reestruturação cuja completa execução as autoridades italianas se comprometeram assegurar, consiste em restaurar a competitividade da recorrente e em permitir a privatização. Segundo a Comissão, o aumento de capital traduzir-se-á por uma forte redução do endividamento e por uma estrutura financeira comparável à da maior parte das concorrentes da companhia. A Comissão acrescenta que o plano é, em si mesmo, suficiente para garantir a sobrevivência e a prosperidade da recorrente. Além disso, a Comissão entende que o conjunto dos compromissos assumidos pelas autoridades italianas corresponde às preocupações que ela exprimiu aquando da abertura do processo administrativo.

43.
     A Comissão é de opinião que o auxílio não provocará um excesso de capitalização da recorrente. Verifica-se que o montante total de 2,75 biliões de LIT era efectivamente necessário para cobrir os custos da reestruturação prevista no plano, estimados em 0,9 bilião LIT e a redução a um nível razoável do endividamento da companhia, o qual atingiu 3,42 biliões de LIT no final do ano de 1995, em comparação com 0,422 bilião de LIT para os capitais próprios. A Comissão considera, além disso, que não resulta dos elementos de que dispõe que a concessão do auxílio possa redundar num resultado que seja contrário a disposições do Tratado.

44.
    Finalmente e de forma geral, no que diz respeito ao interesse comunitário, a Comissão considera que «a recapitalização e a reestruturação da Alitalia contribuirão para o desenvolvimento da actividade do sector dos transportes aéreos na Comunidade e no (EEE), desde logo e, nomeadamente, devido ao facto de, por um lado, a Alitalia ser a principal transportadora numa parte importante da Comunidade e, por outro, a existência de várias grandes companhias aéreas comunitárias constituir uma garantia da manutenção de uma situação equilibrada em termos de concorrência» (decisão recorrida, ponto VIII, último parágrafo).

45.
    Nos termos do artigo 1.° da decisão recorrida, o auxílio concedido pelo Estado italiano à recorrente sob a forma de uma dotação de capital de um montante total de 2,75 biliões de LIT, que visa garantir a reestruturação da companhia em conformidade com o plano comunicado à Comissão em 29 de Julho de 1996 e adaptado em 26 de Junho de 1997, é considerado compatível com o mercado comum e com o Acordo EEE, nos termos do n.° 3, alínea c), do artigo 92.° do Tratado CE e do n.° 3, alínea c), do artigo 61.° do Acordo EEE, sujeito ao cumprimento, por parte das autoridades italianas, dos seus compromissos enumerados no referido artigo. A Comissão lamenta, todavia, que, em desconhecimento do artigo 93.°, n.° 3, do Tratado CE (actual artigo 88.°, n.° 3, CE), o Governo italiano tenha concedido à recorrente em Junho de 1996 um adiantamento de 1 bilião de LIT, a imputar na primeira prestação de 2 biliões de LIT.

46.
    O artigo 2.° da decisão recorrida subordina o pagamento das segunda (0,5 bilião de LIT) e terceira (0,25 bilião de LIT) prestações ao respeito desses compromissos bem como à efectiva concretização do plano de reestruturação e dos resultados previstos nesse plano. Ordena-se ao Governo italiano que apresente à Comissão, antes da disponibilização da segunda e da terceira prestações de auxílio previstas para Maio de1998 e Maio de 1999 respectivamente, um relatório, a fim de permitir à Comissão formular observações com o apoio de um consultor independente.

47.
    O artigo 3.° da decisão recorrida dispõe que os compromissos e condições referidos no artigo 1.° dizem respeito tanto à recorrente como à Alitalia Team.

48.
    A decisão recorrida foi notificada ao Governo italiano por carta de 31 de Julho de 1997 e foi publicada no Jornal Oficial de 25 de Novembro de 1997.

Tramitação do processo e pedidos das partes

49.
    Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 26 de Novembro de 1997, a recorrente interpôs recurso de anulação da decisão recorrida.

50.
    Por acto separado, que deu entrada na Secretaria do Tribunal em 22 de Dezembro de 1997, a Comissão suscitou uma questão prévia de inadmissibilidade, ao abrigo do artigo 114.°, n.° 1, do Regulamento de Processo.

51.
    Por despacho de 15 de Julho de 1998, o Tribunal (Quarta Secção Alargada) decidiu reservar para final a decisão sobre essa questão prévia de inadmissibilidade.

52.
    Por despacho do presidente da Terceira Secção Alargada do Tribunal de 18 de Maio de 1999, a Air Europe, a Air One e a Lauda Air foram admitidas a intervir em apoio das conclusões da Comissão. Todavia, por despacho do presidente da Terceira Secção Alargada do Tribunal de 1 de Fevereiro de 2000, a Lauda Air foi cancelada do registo como parte interveniente.

53.
    Por carta de 16 de Julho de 1999, a Air One informou a Secretaria do Tribunal que não encarava a hipótese de apresentar observações escritas. A Air Europe apresentou um articulado de intervenção em 11 de Outubro de 1999, em relação ao qual as partes principais apresentaram as suas observações.

54.
    Com base no relatório preliminar do juiz-relator, o Tribunal (Terceira Secção Alargada) decidiu iniciar a fase oral do processo, e no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do Regulamento de Processo colocou diversas questões, por escrito, às partes, às quais se respondeu no prazo fixado.

55.
    As partes principais foram ouvidas em alegações e em respostas às questões do Tribunal, na audiência que se efectuou em 27 de Junho de 2000. As intervenientes Air Europe e Air One não compareceram à audiência, para a qual tinham sido convocadas.

56.
    A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    anular a decisão recorrida na sua totalidade;

-    A título subsidiário

        -    anular as condições da autorização do auxílio referidas no artigo 1.°, pontos 2 a 8, da decisão recorrida;

        -    anular também a condição que se traduz em impor-lhe que assuma os encargos decorrentes do regime de reformas antecipadas previsto no Decreto n.° 546/1996;

-    condenar a Comissão nas despesas do processo.

57.
    A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

--    declarar o recurso inadmissível ou desprovido de fundamento;

-    condenar a recorrente nas despesas.

58.
    A Air Europe conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    acolher os pedidos da Comissão;

-    condenar a recorrente nas despesas, incluindo as efectuadas pela interveniente.

Quanto à admissibilidade

59.
    Em apoio da sua questão prévia de inadmissibilidade, a Comissão sustenta que a petição foi introduzida extemporaneamente. Lembra que resulta de jurisprudência constante, por um lado, que cabe àquele que tem conhecimento da existência de um acto que lhe diz respeito pedir o seu texto integral num prazo razoável, e, por outro, que o prazo de recurso só começa a correr a partir do momento em que o terceiro a quem o acto diz respeito tem um conhecimento exacto do conteúdo e dos fundamentos do acto em causa, por forma a poder tirar proveito do seu direito de recurso (acórdão do Tribunal de Justiça de 6 de Julho de 1988, Dillinger Hüttenwerke/Comissão, 236/86, Colect., p. 3761; despacho do Tribunal de Justiça de 5 de Março de 1993, Ferriere Acciaierie Sarde/Comissão, C-102/92, Colect., p. I-801, n.° 19; conclusões do advogado-geral M. Cosmas com vista ao acórdão do Tribunal de Justiça de 19 de Fevereiro de 1998, Comissão/Conselho, C-309/95, Colect., p. I-655, I-657, n.os 35 e 38; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 19 de Maio de 1994, Consorzio gruppo di azione locale «Murgia Messapica»/Comissão, T-465/93, Colect., p. II-361).

60.
    Quanto ao conhecimento exacto pela recorrente do conteúdo e da fundamentação da decisão recorrida, resultaria de uma carta de 1 de Agosto de 1997 da Representação Permanente Italiana na Comissão que se reporta às informações confidenciais contidas na decisão recorrida e respeitantes à recorrente que esta deve ter tido, nessa altura, conhecimento do texto integral da decisão recorrida. Esse conhecimento exacto do conteúdo e dos fundamentos da referida decisão resultaria ainda da carta da recorrentedirigida à Representação Permanente Italiana, em 9 de Setembro de 1997. A título subsidiário, a Comissão alega que a recorrente não pediu a comunicação da decisão recorrida num prazo razoável. A Comissão lembra que difundiu um comunicado de imprensa em 15 de Julho de 1997. Como havia razões imperativas ditadas pela urgência da realização do plano de reestruturação, a recorrente deveria ter pedido imediatamente comunicação da decisão recorrida, dirigindo-se, tal sendo o caso, aos serviços da Comissão.

61.
    A este propósito, o Tribunal recorda que, em conformidade com a redacção do artigo 173.°, quinto parágrafo, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 230.°, quinto parágrafo, CE), o critério da data da tomada de conhecimento do acto como início do prazo de recurso tem carácter subsidiário relativamente às datas da publicação ou da notificação do acto (acórdão do Tribunal de Justiça de 10 de Março de 1998, Alemanha/Conselho, C-122/95, Colect., p. I-973, n.° 35; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Outubro de 1999, Salomon/Comissão, T-123/97, Colect., II-2925, n.° 42).

62.
    Há que recordar que a Comissão se comprometeu a publicar no Jornal Oficial, série L, o texto integral das decisões de autorizações condicionais de auxílios estatais adoptadas, como no caso vertente, na sequência do processo do artigo 93.°, n.° 2, do Tratado [ver Droit de la concurrence dans les Communautés européennes, volume II A, 1995, p. 43, ponto 53, e p. 55, ponto 90, alínea d)].

63.
    No caso em apreço, a Comissão não notificou a decisão impugnada à recorrente. Tendo essa decisão sido publicada no Jornal Oficial de 25 de Novembro de 1997, é esta data que marca o início do prazo em relação à recorrente.

64.
    Segue-se que o presente recurso, interposto em 26 de Novembro de 1997, foi interposto dentro do prazo previsto no artigo 173.°, quinto parágrafo, do Tratado.

65.
    Deve, por conseguinte, rejeitar-se a argumentação contra a admissibilidade do recurso.

Quanto ao mérito

66.
    A recorrente invoca três fundamentos em apoio do seu recurso. O primeiro é tirado de uma aplicação errada, pela Comissão, do principio do investidor em economia de mercado (a seguir, «critério do investidor privado»). O segundo fundamento é tirado do carácter excessivo das condições impostas pelo artigo 1.° da decisão recorrida. O terceiro fundamento é extraído de uma violação dos direitos de defesa.

Quanto ao fundamento tirado de uma aplicação errada do critério do investidor privado

Observações preliminares

67.
    Deve recordar-se, em primeiro lugar, que o IRI, que procedeu à recapitalização da recorrente, é uma sociedade financeira do Estado italiano. A recorrente não contesta que os poderes públicos italianos participaram directamente no aumento de capital previsto no seu plano de reestruturação. Todavia, sustenta que a Comissão qualificou erradamente de auxílio de Estado a entrada de capital do IRI no valor de 2,75 biliões de LIT. A recorrente entende, com efeito, que o investimento do IRI respeita o critério do investidor privado ou, por outras palavras, que, em condições similares, um investidor privado teria sido levado a proceder a uma entrada financeira de tal importância.

68.
    Há que apreciar, no caso em apreço, se a Comissão pôde com razão concluir que a entrada de capital de 2,75 biliões de LIT que o IRI se propunha efectuar no momento da adopção da decisão recorrida, e que tinha sido já parcialmente pago nessa altura (v. supra n.° 11), constituía um auxílio de Estado na acepção do artigo 92.°, n.° 1, do Tratado.

69.
    O fundamento comporta três partes. Na primeira parte, a recorrente alega que o investimento do IRI respeita, em si, o critério do investidor privado em virtude da uma participação de investidores privados no seu capital. Na segunda parte, a recorrente sustenta que a Comissão cometeu erros manifestos de apreciação no cálculo da taxa mínima e da taxa interna que arrasta uma violação do artigo 92.°, n.° 1, do Tratado e do princípio da igualdade de tratamento e não fundamentou suficientemente a sua decisão quanto a esse ponto. Na terceira parte, a recorrente denuncia a abordagem puramente matemática, pela Comissão, do critério do investidor privado em violação dos princípios da comunicação da Comissão, de 13 de Novembro de 1993, aos Estados-Membros sobre a aplicação dos artigos 92.° e 93.° do Tratado CEE e do artigo 5.° da Directiva 80/723/CEE da Comissão às empresas públicas do sector das indústrias tradicionais (JO C 307, p. 3).

70.
    Sem contestar formalmente a admissibilidade do presente fundamento, a Comissão entende que a recorrente não poderá pôr em questão a qualificação da entrada de capital do IRI como auxílio de Estado, uma vez que as próprias autoridades italianas, na sua carta de 26 de Junho de 1997, reconheceram que o financiamento do plano de reestruturação da recorrente pelo IRI comporta elementos de auxílio (v. supra, n.° 33).

71.
    A este propósito, há, em primeiro lugar, que repor esta declaração de 26 de Maio de 1997 no seu contexto. Na sua carta à Comissão, de 29 de Julho de 1996 (v. supra, n.° 13) as autoridades italianas tinham sustentadï que o investimento previsto pelo IRI no capital da recorrente não constituía um auxílio de Estado, pois satisfazia, em sua opinião, o critério do investidor privado. Até 26 de Junho de 1997, as autoridades italianas mantiveram essa posição (carta do Ministério dos Ôransportes italiano à Comissão de 23 de Dezembro de 1996, carta das autoridades italianas à Comissão de 15 de Janeiro de 1997 (decisão recorrida, ponto IV, décimo primeiro e último parágrafos), documento entregue pelas autoridades italianas à Comissão em 25 de Março de 1997 (decisão recorrida, ponto VI, terceiro parágrafo), carta das autoridades italianas à Comissão de 3 de Abril de 1997 (decisão recorrida, ponto VI, terceiroparágrafo). além disso, ao longo de todo o processo administrativo, a recorrente alega que o investimento do IRI satisfazia o critério do investidor privado.

72.
    Foi só no fim do processo administrativo que as autoridades italianas reconheceram que o plano comportava elementos de auxílio com vista a obter uma decisão de aprovação por parte da Comissão e a poder proceder à entrada de capital. Com efeito, resulta da carta de 26 de Junho de 1997 que as autoridades italianas fizeram essa declaração «para efeitos de recapitalização da Alitalia» («allo scopo di conseguire la ricapitalizzazione dell'Alitalia»).

73.
    De qualquer forma, o exercício, pela Comissão, das suas competências nos termos do artigo 92.°, n.° 3, do Tratado pressupõe a existência de uma medida de auxílio de Estado, na acepção do artigo 92.°, n.° 1, do Tratado. Por isso, independentemente da qualificação dada pelo Estado-Membro em causa à medida notificada, a Comissão é obrigada, antes de adoptar uma decisão nos termos da disposto no artigo 92.°, n.° 3, do Tratado, a verificar se a medida constitui um auxílio de Estado na acepção do artigo 92.°, n.° 1, do Tratado.

74.
    Ora, no caso em apreço, o facto de a Comissão ter qualificado de auxílio de Estado, na decisão recorrida, o investimento do IRI no capital da recorrente lesa manifestamente esta. Com efeito, essa qualificação permitiu à Comissão examinar, na decisão recorrida, a compatibilidade da medida com o mercado comum e impor condições que afectam directamente as operações da recorrente. Ademais, essa qualificação levou a Comissão a reconhecer uma violação do artigo 93.°, n.° 3, do Tratado e, portanto, a ilegalidade do pagamento de 1 bilião de LIT efectuado em Junho de 1996.

75.
    Segue-se, portanto, que a recorrente está no direito de submeter ao controlo do órgão jurisdicional comunitário a qualificação que a Comissão fez, na decisão recorrida, do investimento do IRI. A argumentação da Comissão deve, portanto, ser rejeitada e há que examinar a procedência das diferentes partes do presente fundamento.

Primeira parte: a participação de investidores privados na recapitalização

76.
    A recorrente sustenta que a participação dos investidores privados no esforço da sua recapitalização demonstra, por si, que essa recapitalização respeita o critério do investidor privado. A Comissão teria ignorado manifestamente esse ponto. A decisão recorrida menciona, com efeito, que «não se verifica... a participação de qualquer investidor privado no aumento de capital em questão no montante de 2,75 biliões de (LIT)» (ponto VII, quinto parágrafo).

77.
    Por outro lado, a recorrente lembra que os assalariados da companhia, que são investidores privados, tinham aceitado subscrever o aumento de capital num montante igual a 0,31 bilião de LIT, o que representa cerca de 20% do seu capital. Por outro lado, salienta que ela é uma sociedade cotada na Bolsa de Valores italiana em que osaccionistas privados detinham 13,6% do capital em 1 de Julho de 1996. Insiste no facto de, em virtude do direito italiano, as acções que constituíram objecto de opção pelos accionistas existentes devem ser objecto de oferta na bolsa. Tendo em conta o facto de o IRI, à excepção do adiantamento de 1 bilião já pago em 1 de Julho de 1996, se ter simplesmente declarado disposto a participar nas diferentes fases da recapitalização da recorrente, o IRI só subscreveria na sua integralidade o aumento de capital previsto na hipótese de nenhuma pessoa privada participar nele.

78.
    Além disso, o Governo italiano teria manifestado a sua firme intenção de proceder à privatização da recorrente a breve trecho, uma vez obtida a autorização de aumentar o capital (carta de 20 de Dezembro de 1996 do Presidente do Conselho de Ministros italiano ao presidente da Comissão; anexo 13 da petição), suprimindo, no decurso do ano de 1996, a disposição legal que prevê que 51% do capital da companhia devem ser detidos pelo sector público.

79.
    A recorrente explica, em seguida, que o IRI lhe pagou 2 biliões de LIT (1 bilião em Junho de 1996 e 1 bilião em 1997). O IRI teria, em seguida, recebido o produto da venda de 18,4% do capital da companhia a investidores privados por um montante de cerca de 0,787 bilião de LIT. Outro aumento de capital que foi subscrito no valor de 1 bilião por investidores privados teria sido decidido em Janeiro de 1998. A recorrente sustenta, por isso, que, mesmo sem ter em conta a entrada dos assalariados, o investimento total do IRI (1, 213 biliões de LIT) na sua reestruturação é inferior à entrada dos accionistas privados (1,787 biliões de LIT). A recorrente acrescenta que, no momento da apresentação da réplica, o IRI detinha 53% do seu capital e os accionistas privados 47%. Finalmente, a recorrente sublinha que o sucesso da participação privada no aumento do seu capital foi tal que o pagamento pelo IRI das segunda (0,5 bilião de LIT) e terceira (0,25 bilião de LIT) prestações autorizadas pela decisão recorrida não tiveram lugar. Refere-se ainda ao relatório dos consultores da Comissão, de 27 de Maio de 1998, em que estes observam que «o montante investido pelo IRI revelou inferior e a rentabilidade proporcionalmente superior às previsões do plano». A Comissão teria, portanto, cometido um erro manifesto na apreciação do plano de reestruturação na medida em que este, desde a sua primeira versão, e tendo em conta a situação existente ao tempo e os desenvolvimentos previsíveis a curto prazo, teria sido apta a satisfazer o critério do investidor privado.

80.
    O Tribunal lembra que o critério relativo ao comportamento de um investidor privado que opera em condições normais de uma economia de mercado é uma emanação do princípio da igualdade de tratamento entre os sectores público e privado, princípio segundo o qual os capitais disponibilizados, directa ou indirectamente, a uma empresa pelo Estado, em circunstâncias que correspondem às condições normais do mercado, não poderão ser qualificados de auxílios de Estado (acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de Março de 1991, Itália/Comissão, C-303/88, Colect., p. I-1433, a seguir «acórdão ENI-Lanerossi», n.° 20; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Dezembro de 1996, Air France/Comissão, T-358/94, Colect., p. II-2109, n.° 70).

81.
    Deve assim considerar-se que uma entrada de capitais em fundos públicos satisfaz o critério do investidor privado e não implica a concessão de um auxílio de Estado, entre outros casos, quando essa entrada tem lugar concomitantemente com uma entrada significativa de capital por parte de um investidor privado efectuada em condições comparáveis (v. neste sentido, acórdão Air France/Comissão, citado no n.° 80 supra, n.os 148 e 149).

82.
    No que toca, em primeiro lugar, à participação dos assalariados no capital da recorrente, a Comissão pôde razoavelmente decidir que «não poderia... ser aqui tomada em consideração visto ocorrer em condições muito diferentes» das da entrada de capital do IRI (decisão recorrida, ponto VII, quinto parágrafo).

83.
    A esse propósito, há que recordar que, por virtude do acordo que foi concluído em 19 de Junho de 1996, os assalariados da recorrente deram o seu consentimento à uma redução salarial. Em contrapartida, os assalariados iam receber acções da Alitalia num montante total de 0,31 bilião de LIT correspondente à economia anual realizada a prazo em matéria de custos de mão-de-obra.

84.
    Nestas circunstâncias, a tomada em participação dos assalariados no capital da recorrente, que efectivamente teve lugar, não demonstra, por si, que a entrada de capital efectuada pelo IRI satisfaz o critério do investidor privado. Deve sublinhar-se, a esse respeito, que o comportamento de um investidor privado em economia de mercado é guiado por perspectivas de rentabilidade (acórdãos do Tribunal de Justiça de 21 de Março de 1991, Itália/Comissão, C-305/89, Colect., p. I-1603, a seguir «acórdão Alfa Romeo», n.° 20, e de 14 de Setembro de 1994, Espanha/Comissão, C-278/92, C-279/92 e 280/92, Colect, p. I-4103, n.os 20 a 22; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Setembro de 1998, BFM e EFIM/Comissão, T-126/96 e T-127/96, Colect., p. II-3437, n.° 79). Ora, a tomada em participação dos assalariados foi inspirada por considerações de manutenção do emprego e, por isso, sobretudo, por considerações de viabilidade económica e de sobrevivência da recorrente antes que por perspectivas de rentabilidade.

85.
    Em seguida, no que toca à participação de investidores privados, a Comissão considerou, na decisão recorrida: «Mesmo supondo que os 10% de capital da Alitalia propriedade de investidores privados possam ser considerados como apresentando um real significado económico, não se verifica, de qualquer forma, a participação de qualquer investidor privado no aumento de capital em questão no montante de 2,75 biliões (de LIT).» (ponto VII, quinto parágrafo.)

86.
    Há que recordar que, no quadro de um recurso de anulação nos termos do artigo 173.° do Tratado, a legalidade de um acto comunitário deve ser apreciada em função dos elementos de facto e de direito existentes na data em que o acto foi adoptado (acórdão do Tribunal de Justiça de 5 de Outubro de 2000, Alemanha/Comissão, C-288/96, ainda não publicado na Colectânea de Jurisprudência, n.° 34; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 25 de Junho de 1998, British Airways e o. e British MidlandAirways/Comissão, T-371/94 e T-394/94, Colect., p. II-2405, n.° 81, e Salomon/Comissão, referido no n.° 61 supra, n.° 115).

87.
    Ora, ao longo de todo o processo administrativo, as autoridades italianas e a recorrente basearam-se, para efeitos de cálculo do rendimento do investimento, na hipótese de que o IRI ia subscrever só os aumentos de capital previstos.

88.
    Há que recordar, a esse propósito, que o plano inicial previa uma injecção de capital de 3 biliões de LIT a efectuar pelo IRI e uma participação no valor de 0,31 bilião de LIT no capital por parte dos assalariados da recorrente. Tendo em conta a parte já detida pelos accionistas minoritários, entendia-se que a parte do IRI no capital, para efeitos da operação, seria de cerca de 80%. Esse ponto foi aliás confirmado na resposta das autoridades italianas de 6 de Setembro de 1996 a um pedido de informações da Comissão, em que se explica:

«para simplificar o cálculo, partiu-se da hipótese de que, no termo do processo de recapitalização, os accionistas minoritários actuais deterão uma parte muito fraca do capital da companhia. Os assalariados receberão acções em contrapartida das reduções salariais e dos aumentos de produtividade. Nesse contexto, pode prever-se que os assalariados deterão cerca de 20% das acções e o IRI, os 80% restantes.»

89.
    Há ainda que acrescentar que, segundo a recorrente, uma participação do IRI no seu capital no valor de 80% para o fim da sua reestruturação era uma estimativa mínima. A recorrente explicou ao logo de uma exposição que ela fez à Direcção-Geral Transportes (DG VII), em 23 de Outubro de 1996: «(A) hipótese de 80% constitui o cenário mais pessimista.» No decurso dessa mesma apresentação, afirmou, além disso: «(A) presença dos accionistas minoritários existentes (cerca de 10% actualmente) será massivamente diluída, provavelmente menos de 1% (...) os trabalhadores terão cerca de 20% das acções ordinárias mas espera-se que terão somente uma participação efectiva de 12 a 15%».

90.
    Na base dos dados que foram comunicados à Comissão, os seus consultores lembraram, no seu relatório de 11 de Dezembro de 1996: «(o) plano supõe que a recapitalização total de 3 biliões de LIT será subscrita pelo IRI.» (section IV, C, 2.) Além disso, consideraram o que se segue: «(S)egundo o plano, a participação do IRI no capital era reputada ser de 80% (...) Parece mais provável que no ano 2000, a participação do IRI no capital da Alitalia será mais elevada que a participação de 80% inicialmente prevista.» (section IV, C, 2.)

91.
    Longe de contradizer essas afirmações, a recorrente, num documento de 19 de Dezembro de 1996 comunicado pelas autoridades italianas à Comissão por carta de 20 de Dezembro de 1996, reconheceu como aceitável o ponto de vista dos consultores da Comissão segundo o qual «a taxa de participação do IRI no capital da Alitalia no fim do plano (seria) provavelmente mais elevada que previsto pela 'submission‘ de Julho último». Ela informou ainda a Comissão, por carta de 15 de Abril de 1997, que o IRI ia subscrever a integralidade do aumento de capital, que era nessa altura fixada em 2,8biliões de LIT. com efeito, a carta menciona: «(O) IRI prevê pagar 2,8 biliões de LIT segundo o esquema seguinte: 1 bilião de LIT em Julho de 1996, 0,5 bilião de LIT em Julho de 1997 e o saldo de 1,3 biliões de LIT em Dezembro de 1997. Nenhuma outra entrada em fundos públicos está prevista.»

92.
    Nessas condições, foi com razão que a Comissão considerou, na decisão recorrida: «não se verifica... a participação de qualquer investidor privado no aumento de capital em questão no montante de 2,75 biliões de LIT.» Mesmo que, segundo os dizeres do Governo italiano, «o objectivo prioritário do plano de reestruturação (fosse) criar o fundamento para um processo de privatização da sociedade» e que, para esse efeito, fosse considerado possível que investidores privados pudessem subscrever uma parte da segunda prestação da recapitalização prevista (plano de reestruturação de Julho de 1996), tratava-se de uma simples hipótese que a própria recorrente não teve em conta no cálculo de rendimento do investimento efectuado pelo IRI.

93.
    Finalmente, o facto de o plano de reestruturação ter em vista criar condições favoráveis à privatização da recorrente não demonstra que o investimento do IRI satisfazia o critério do investidor privado. Mesmo que a possibilidade de uma participação por parte de investidores privados estivesse prevista no plano de reestruturação e que, efectivamente, tal tomada em participação no capital da recorrente tivesse tido lugar após a adopção da decisão impugnada, tais circunstâncias, na falta da existência, no momento da adopção da decisão recorrida, de um compromisso formal de um investidor privado no sentido de efectuar uma entrada de capital com significado económico real, não demonstram, à luz do que foi explicitado no n.° 86 supra, que o comportamento do IRI satisfaça o critério do investidor privado.

94.
    Resulta de tudo o que precede que a primeira parte do primeiro fundamento deve ser rejeitada.

Segunda parte: erros manifestos de apreciação no cálculo da taxa mínima e da taxa interna que implicam uma violação do artigo 92.°, n.° 1, do Tratado bem como do princípio da igualdade de tratamento e insuficiência de fundamentação.

- Observações preliminares

95.
    Deve recordar-se que o conceito de auxílio de Estado, tal como é definido no Tratado, apresenta carácter jurídico e deve interpretar-se com base em elementos objectivos. Por essa razão, o juiz comunitário deve, em princípio e tendo em conta tanto os elementos concretos do litígio submetido à sua apreciação como o carácter técnico ou complexo das apreciações feitas pela Comissão, exercer uma fiscalização exaustiva no que diz respeito à questão de saber se uma medida cai no âmbito de aplicação do artigo 92.°, n.° 1, do Tratado (acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Maio de 2000, França/Ladbroke Racing e Comissão, C-83/98 P, ainda não publicado na Colectânea de Jurisprudência, n.° 25).

96.
    Entendeu-se que, para avaliar se a intervenção de um investidor público no capital de uma empresa constitui um auxílio estatal, há que apreciar se, em circunstâncias semelhantes, um investidor privado de dimensão comparável à do investidor público poderia ter sido levado a proceder a entradas de capital dessa importância. A esse respeito, foi especificado que, se bem que o comportamento do investidor privado, a que deve ser comparada a intervenção do investidor público que prossegue objectivos de política económica, não seja necessariamente o do investidor normal que coloca capitais com vista à sua rentabilização a mais ou menos curto prazo, deve, pelo menos, ser o de uma holding privada ou de um grupo privado de empresas que prossiga uma política estrutural, global ou sectorial e ser orientado por perspectivas de rentabilidade a mais longo prazo (acórdãos Alfa Romeo, referido no n.° 84 supra, n.° 20, Espanha/Comissão, referido no n.° 84 supra, n.os 20 a 22, e BFM e EFIM/Comissão, referido no n.° 84 supra, n.° 79).

97.
    Em conformidade com esses princípios, a Comissão explicitou, na sua comunicação para a aviação, a sua metodologia para decidir a questão de saber se fundos públicos concedidos a companhias aéreas constituem auxílios de Estado na acepção do artigo 92, n.° 1, do Tratado. Assim, no ponto 28 da comunicação para a aviação, a Comissão explica:

«O (critério do investidor privado) será normalmente satisfeito quando a estrutura da empresa e as perspectivas futuras forem tais que seja razoável esperar que o capital investido seja normalmente remunerado num prazo de tempo razoável, através do pagamento de dividendos ou da apreciação do capital, tomando como referência uma empresa privada comparável.»

A Comissão acrescenta igualmente no ponto 28 da referida comunicação:

«Um investidor privado numa economia de mercado disponibilizaria normalmente capital fresco se o valor actual dos cash flows futuros esperados do projecto em causa (que remunerariam o investidor através do pagamento de dividendos e/ou de ganhos de capital, e ajustados em função do risco) exceder o investimento líquido.»

98.
    Deve, em seguida, reconhecer-se que a Comissão, para avaliar se um investimento do IRI satisfaz o critério do investidor privado e, portanto, para apreciar se este comporta elementos de auxílio de Estado na acepção do artigo 92.°, n.° 1, do Tratado, inspirou-se dos princípios da sua comunicação para a aviação. Com efeito, a Comissão, na decisão recorrida (ponto VII), comparou o montante do investimento do IRI com o valor dos cash flows futuros descontados do projecto actualizado por meio da taxa mínima que exigiria um investidor privado. Concluiu que, no caso em apreço, a taxa interna ficava abaixo da taxa mínima e, que, por consequência, o investimento não satisfazia o critério do investidor privado.

99.
    O método aplicado pela Comissão na decisão recorrida não poderá ser criticado enquanto tal. Resulta, com efeito, de jurisprudência constante que a Comissão pode impor-se a si própria orientações para o exercício dos seus poderes de apreciação poractos como a comunicação para a aviação, na medida em que eles contenham regras indicativas sobre a orientação a seguir por essa instituição e que não se afastem das normas do Tratado (acórdão do Tribunal de Justiça de 24 de Março de 1993, CIRFS e o./Comissão, C-313/90, Colect., p. I-1125, n.os 34 e 36; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Dezembro de 1996, AIUFFASS e AKT/Comissão, T-380/94, Colect., p. II-2169, n.° 57, e de 5 de Novembro de 1997, Ducros/Comissão, T-149/95, Colect., p. II-2031, n.° 61, e de 30 de Abril de 1998, Vlaams Gewest/Comissão, T-214/95, Colect., p. II-717, n.° 79).

100.
    Deve, aliás, reconhecer-se que a recorrente não contesta o método aplicado pela Comissão para apreciar se o investimento do IRI satisfaz o critério do investidor privado. Com efeito, a Comissão e a recorrente estão de acordo em reconhecer que a questão de saber se o investimento do IRI satisfaz o critério do investidor privado deve ser apreciada comparando a taxa interna com a taxa mínima.

101.
    A fim de fixar a taxa mínima e a taxa interna, a Comissão recorre a consultores independentes, isto é, à Ernst & Young (decisão recorrida, ponto V, primeiro parágrafo), que redigiram os diversos relatórios (v. supra n.os 20, 26, 32 e 34).

102.
    Na base das informações assim recolhidas, a Comissão, na decisão recorrida, reteve uma taxa mínima de 30%. Mesmo que, como o alega a recorrente, a apreciação jurídica da decisão recorrida não quantifique a taxa mínima, resulta da parte intitulada «Factos» na decisão recorrida (pontos V, segundo parágrafo, e VI, segundo parágrafo), bem como dos articulados apresentados no decurso da instância, que a Comissão fixou esta em 30%.

103.
    No que toca à taxa interna, a Comissão explica, na decisão recorrida, que ela apresenta para o investimento de 2,75 biliões de LIT uma «percentagem próxima dos 20%» (ponto VII, oitavo parágrafo). Na sequência da resposta a uma questão escrita do Tribunal, a Comissão explicou que «se trata de um valor médio, compreendido entre as taxas de 13,1% e de 24,8%, taxas que representam os valores mínimos e máximos da (taxa interna) calculados pela (Ernst & Young). v. p. 13 e 14 do relatório de 18 de Junho de 1997, 'Section IV-A. Calculation of the IRR‘».

104.
    Todavia, segundo a recorrente, a Comissão não teria fixado correctamente a taxa interna e a taxa mínima na decisão recorrida, de forma que a conclusão a que a Comissão chegou, isto é, que o investimento do IRI não satisfaz o critério do investidor privado, está inquinada de ilegalidade.

105.
    A esse propósito, deve recordar-se que a apreciação, pela Comissão, da questão de saber se um investimento satisfaz o critério do investidor privado implica uma apreciação económica complexa (acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de Fevereiro de 1996, Bélgica/Comissão, Colect., p. I-723, n.os 10 e 11: acórdãos Air France/Comissão, referido no n.° 80 supra, n.° 71, e BFM e EFIM/Comissão, referido no n.° 84 supra, n.° 81). Ora, a Comissão, quando adopta um acto queimplica uma apreciação económica tão complexa, goza de um amplo poder de apreciação e o controlo jurisdicional do referido acto, mesmo que seja em princípio «completo» no que toca à questão de saber se uma medida entra no âmbito de aplicação do artigo 92.°, n.° 1, do Tratado (acórdão França/Ladbroke Racing e Comissão, referido no n.° 95 supra, n.° 25), deve limitar-se à verificação do respeito das regras de processo e de fundamentação, da exactidão material dos factos apurados para operar a escolha contestada, da ausência de erro manifesto na apreciação desses factos ou da ausência de desvio de poder (acórdão Bélgica/Comissão, já referido, n.° 11, e jurisprudência citada). Em particular, não cabe ao Tribunal sobrepor a sua apreciação à do autor da decisão (acórdãos AIUFFASS e AKT/Comissão, referido no n.° 99 supra, n.° 56, BFM e EFIM/Comissão, referido no n.° 84 supra, n.° 81, e British Airways e o. e British Midland Airways/Comissão, referido no n.° 86 supra, n.° 79).

106.
    É à luz destas considerações que devem ser apreciados os argumentos avançados no caso em apreço pelas partes.

- No que toca às críticas relativas aos elementos em que a Comissão e os seus consultores se basearam para fixar a taxa mínima

107.
    Deve recordar-se que a decisão recorrida, no tocante à fixação da taxa mínima, remete para os relatórios dos consultores da Comissão (pontos V e VI). A fundamentação da decisão recorrida coincide com a fundamentação dos relatórios dos consultores sobre este ponto.

108.
    Há que reconhecer que os consultores da Comissão afirmam, nos seus relatórios de 11 de Dezembro de 1996 e de 18 de Junho de 1997, ter fixado a taxa mínima da forma seguinte:

«Para determinar a taxa de rendimento que um investidor racional em economia de mercado esperaria do seu investimento no capital da Alitalia,

-    fizemos revisão das características do plano com vista a apreciar se as acções previstas tinham a natureza de um 'plano de recuperação‘ ou de 'um plano estratégico‘, bem como o nível dos riscos associados a essas acções

-    entrevistámos diferentes investidores e analistas, e

-    limos decisões anteriores da Comissão (processo Iberia)».

109.
    A recorrente critica cada um dos elementos em que os consultores da Comissão se basearam para reter uma taxa mínima de 30% e sublinha que essa taxa não poderá exceder 20% no caso em apreço.

110.
    Deve sublinhar-se, em primeiro lugar, que a Comissão não poderá afirmar que a recorrente, ao considerar que a taxa mínima em 30% é desproporcionada, se contradiz, pois, no relatório de 9 de Dezembro de 1996 que ela tinha dirigido à Comissão,explicara: «Resulta de entrevistas com analistas financeiros e investidores nas companhias aéreas que, no caso de companhia aérea tipo em dificuldade, o rendimento exigido para uma nova injecção de capital situa-se entre os 30% e 40%.» com efeito, a Comissão isola este extracto do seu contexto. A recorrente tinha sublinhado no seu relatório que, do facto de a sua reestruturação apresentar uma fraca probabilidade de insucesso, a taxa mínima no caso em apreço se aproximava mais da taxa de rendimento normal de 14,78% que da taxa de rendimento «de reestruturação» requerida para um investimento numa companhia aérea em dificuldades, que se situa, segundo a recorrente, entre os 30% e os 40%.

111.
    Em primeiro lugar, a recorrente alega que a qualificação do plano de reestruturação como plano estratégico ou como plano de recuperação é desprovida de pertinência para fixar a taxa mínima. Os riscos inerentes a tal plano não dependeriam da sua qualificação.

112.
    No entanto, deve reconhecer-se que o argumento da recorrente assenta numa leitura errada dos relatórios dos consultores e da decisão recorrida.

113.
    Com efeito, resulta dos relatórios dos consultores que estes «fizeram revisão das características do (p)lano) com vista a apreciar se as acções previstas tinham a natureza de plano de recuperação ou de plano estratégico» (relatórios de Dezembro de 1996 e de Junho de 1997, section IV, ponto E.1). A Comissão sublinha, para esse efeito, que o plano de reestruturação da recorrente previa mais de trinta projectos significativos e importantes de «ruptura» e de optimização, ou combinando as duas características. Em seguida, os consultores da Comissão afirmam que examinaram para cada uma das diferentes acções previstas pelo plano «o nível de risco associado com as suas acções» (relatórios de Dezembro de 1996 e de Junho de 1997, section IV, ponto E.1).

114.
    Por isso, a recorrente não poderá afirmar que os consultores da Comissão, após terem «cegamente» qualificado o plano de reestruturação da recorrente como plano de recuperação, fixaram a taxa mínima a um nível elevado em virtude dessa qualificação. Pelo contrário, a Comissão e os seus consultores procederam a uma análise dos diferentes elementos do plano e dos riscos associados a esses elementos antes de decidir que o plano constituía um plano de recuperação e fixaram, em seguida, uma taxa mínima elevada que tinha em conta os riscos associados às diferentes acções previstas no plano.

115.
    O argumento da recorrente deve, por isso, ser rejeitado.

116.
Em segundo lugar, a recorrente sustenta que os investidores e analistas que foram consultados pela Ernst & Young não tinham um conhecimento suficiente da sua situação financeira e do seu plano de reestruturação para poder dar uma opinião fundada no tocante à taxa mínima do investimento do IRI. A fim de poder verificar, por um lado, se as pessoas abordadas pelos consultores da Comissão puderam formar uma opinião fundada e fiável sobre a taxa mínima a aplicar e, por outro, a exactidãoe o carácter exaustivo do inquérito levado a cabo, a recorrente julga indispensável que o Tribunal peça aos consultores da Comissão que precisem o tipo de peritos consultados, as questões postas, as informações fornecidas às pessoas interrogadas e as respostas recebidas.

117.
    A recorrente afirma ainda que ela tinha preparado especialmente para os consultores da Comissão um documento que compreende as informações não confidenciais necessárias a uma avaliação correcta do seu plano de reestruturação. Ela sugerira que comunicassem essas informações aos investidores consultados. Indigna-se, por isso, com o facto de os consultores da Comissão não terem tomado em consideração esse documento.

118.
    Em resposta à argumentação da recorrente, a Comissão produziu uma carta dos seus consultores de 28 de Outubro de 1998, em que estes afirmam ter contactado os seus colegas em Londres, Paris, Madrid e Frankfurt a fim de fixar a taxa mínima para o investimento do IRI. Por seu turno, os representantes locais da Ernst & Young teriam contactado «investidores de reputação mundial e bancos que são muitas vezes envolvidos em tais avaliações». Os investidores consultados teriam baseado as suas respostas «no conhecimento que eles tinham da (s)ociedade e nas informações que os consultores estavam autorizados a revelar». A Comissão diz não se recordar de ter recebido o documento que a recorrente preparara para a Ernst & Young.

119.
    A título de medidas de organização do processo adoptadas em 25 de Abril de 2000, o Tribunal pediu à recorrente que produzisse o documento que ela afirma ter preparado para as consultas de investidores pela Ernst & Young.

120.
    Por carta de 24 de Maio de 2000, a recorrente comunicou um documento intitulado «nota que prepara as discussões com os investidores a propósito da Alitalia». Esse documento, de uma página somente, compreende, em primeiro lugar, os «números-chave» da recorrente para os anos de 1995 (números actuais) e 2000 (números estimados) e menciona, em seguida, os «elementos chave» do plano, isto é a instalação de uma nova direcção, o aumento do capital em 3,3 biliões de LIT, a plataforma de Malpensa, a criação da Alitalia Team e o acordo histórico concluído com os sindicatos.

121.
    Todavia, nenhum elemento avançado pela recorrente permite pôr em dúvida que os peritos que foram consultados pela Ernst & Young não dispunham das informações necessárias para avaliar a taxa mínima no caso em apreço.

122.
    A esse propósito, deve recordar-se que, na sua comunicação de 16 de Novembro de 1996 que tinha sido publicada no Jornal Oficial (v. supra n.os 15 e 16), a Comissão tinha anunciado que «recorrerá... a um ou vários consultores independentes» a fim de verificar se o plano de reestruturação satisfazia o critério do investidor privado (JO C 346, especialmente p. 22). Os investidores que foram consultados pela Ernst & Young tiveram, portanto, de ter conhecimento do conteúdo da referida comunicação no momento em que essas consultas ocorreram.

123.
     Deve reconhecer-se que a comunicação de 16 de Novembro de 1996 comporta cinco páginas de informações sobre a estrutura da recorrente, a evolução da situação financeira entre 1990 a 1995, os números para 1995 (que, de qualquer modo, eram já públicos nessa altura), as grandes linhas do plano de reestruturação e a evolução prevista para o período que vai de 1996 a 2000. As informações contidas na comunicação de 16 de Novembro de 1996 respeitante à situação financeira da recorrente e ao seu plano de reestruturação são muito mais detalhadas que as informações contidas no documento «nota que prepara as discussões com os investidores a propósito da Alitalia». Ora, segundo a recorrente, esse documento continha já «as informações necessárias a uma avaliação correcta do plano da companhia». Nestas condições, o argumento da recorrente deve ser rejeitado, sem que haja necessidade de tomar outras medidas de organização do processo.

- No que toca à falta de fundamentação relativa à fixação da taxa mínima

124.
    A recorrente afirma que a Comissão não fundamentou suficientemente a aplicação da taxa mínima retida na Decisão 96/278/CE da Comissão, de 31 de Janeiro de 1996, relativa à recapitalização da companhia Iberia (JO L 104, p. 25, a seguir «decisão Iberia»), ao investimento do IRI. A recorrente sublinha, para esse efeito, que a situação da Iberia no momento da adopção da decisão Iberia era totalmente diferente da sua própria situação no momento da adopção da decisão recorrida.

125.
    A Comissão objecta que a argumentação da recorrente deve ser declarada inadmissível uma vez que é baseada em informações confidenciais que os consultores da recorrente obtiveram no decurso do processo administrativo que precede a adopção da decisão Iberia. Os consultores da recorrente foram, com efeito, no caso Iberia, os consultores da Comissão. De qualquer forma, a Comissão não era obrigada a fornecer, na decisão recorrida, explicações específicas sobre a comparação do plano de reestruturação da recorrente com o da Iberia (acórdão British airways e o. e British Midland Airways/Comissão, referido no ponto 86 supra, n.° 443).

126.
    O Tribunal entende que o argumento da Comissão tirado da inadmissibilidade da argumentação da recorrente é desprovido de objecto uma vez que, para efeitos do exame desta (v. infra n.os 127 a 137), deveremos basear-nos unicamente em elementos que não têm carácter confidencial em relação à recorrente, isto é, em extractos da decisão Iberia, que foi publicada no Jornal Oficial (v. supra n.° 124), e em passagens dos relatórios dos consultores da Comissão, que foram comunicados por esta à recorrente.

127.
    O Tribunal considera, em primeiro lugar, que a Comissão não poderá afirmar que, do facto de a recorrente e a Iberia serem duas companhias aéreas diferentes reestruturadas em épocas diferentes, não teria sido obrigada a fornecer, na decisão recorrida, explicações específicas sobre a comparação do plano de reestruturação da recorrente com o da Iberia. Com efeito, a própria Comissão e os seus consultores referem-se, para efeitos de fixar a taxa mínima para o investimento do IRI, à decisão Iberia (v.supra n.os 107 e 108) e sublinharam, assim, a pertinência da comparação entre a situação da recorrente e a da Iberia a esse respeito.

128.
    Em seguida, deve salientar-se que, na decisão Iberia a Comissão fixou a taxa mínima a um nível de 30% na base das seguintes considerações:

«(...) a Comissão considera que a (taxa mínima) que exigiria um investidor actuando segundo as leis do mercado para realizar esta injecção de capital é de pelo menos 30%, devido à importância da soma aprovada e, sobretudo, dos riscos apresentados pela operação. Essa taxa mínima de 30%, aparentemente muito elevada e bastante superior às taxas praticadas no mercado, integra com efeito as probabilidades que existem de o programa não se desenrolar tal como previsto e de o rendimento real acabar por ser mais fraco. De resto, a taxa só pode ser superior ao custo dos recursos próprios, dado que este último não tem em conta todos os riscos ligados à companhia. Ora, apesar do quase desaparecimento dos riscos ligados aos seus compromissos na Arsa e à substancial melhoria dos seus resultados de exploração durante o ano de 1994 e durante o primeiro semestre de 1995, a Iberia é uma empresa cujo risco específico continua a ser muito elevado. As incertezas que se seguem pesam de forma especial sobre a continuação da recuperação da companhia, sobre a sua rentabilidade a longo prazo e sobre as projecções financeiras até 1999 em que se baseia o cálculo do valor da empresa a essa data:

- o programa de adaptação não se encontra concluído; concretamente, ainda não foram iniciadas as reduções de efectivos previstas;

- a companhia atravessou recentemente dificuldades sociais, que se traduziram nomeadamente em greves frequentes dos pilotos. Estes movimentos sociais, para além do seu custo directo na contabilidade da Iberia, prejudicam a imagem da companhia junto da sua clientela e poderiam colocar obstáculo à possibilidade de realizar os ganhos de produtividade previstos no programa;

- o programa, na sua forma presente, termina no final de 1996. Nessa data, a Iberia não terá ainda alcançado os níveis de produtividade e eficiência dos seus principais concorrentes comunitários. Um novo plano de redução de custos deverá ser então elaborado e negociado com os interlocutores sociais. O resultado destas negociações não pode ser previsto na hora actual;

- existem dúvidas quanto à existência e modalidades de intervenção de futuros parceiros externos que devem ainda ser escolhidos;

- os efeitos da liberalização das actividades de transporte aéreo e de assistência em terra (handling) na Europa sobre a rentabilidade a longo prazo da Iberia não podem ainda ser avaliados na sua totalidade.»

129.
    Na decisão Iberia, a Comissão decidiu, em seguida, que o investimento no capital dessa sociedade satisfazia o critério do investidor privado, uma vez que a taxa interna de 30% era igual à taxa mínima.

130.
    A Comissão reconhece que, no momento do processo administrativo que precede a adopção da decisão recorrida, a decisão Iberia era a única decisão em que ela tinha aplicado o critério da comparação entre a taxa interna e a taxa mínima a fim de apreciar se um investimento numa companhia aérea satisfaz o critério do investidor privado. A Comissão explica, para esse efeito, que se tratava do único processo diferente em que as partes em causa contestavam a qualificação da medida. Nestas circunstâncias, a decisão Iberia tinha manifestamente vocação para constituir um precedente para o cálculo da taxa mínima, no caso em apreço.

131.
    Consciente desse facto, a recorrente, ao longo de todo o processo administrativo, sustentou que a sua situação não era comparável à da Iberia tal como descrita na decisão Iberia e que, por consequência, a elevada taxa mínima retida nesta decisão não podia ser-lhe aplicada (exposição da recorrente à DG VII da Comissão, em 23 de Outubro de 1996 (p. 80); documento da recorrente de 19 de Dezembro de 1996, transmitido pelas autoridades italianas à Comissão, em 20 de Dezembro de 1996; carta dos consultores da recorrente à Comissão de 31 de Janeiro de 1997; documento enviado à Comissão com vista à reunião de 8 de Abril de 1997; estudos da recorrente para preparação do encontro de 8 de abril de 1997). A recorrente insistiu, nomeadamente, no facto de os elementos de incerteza que caracterizavam o processo Iberia não existirem no seu caso.

132.
    Quanto ao dever de fundamentação que incumbe à Comissão em relação à recorrente que, enquanto beneficiária da medida contestada, é parte interessada na acepção do artigo 93.°, n.° 2, do Tratado, há que recordar que, mesmo que a Comissão não seja obrigada a responder a todos os argumentos invocados no decurso do processo administrativo por um interessado, é, porém, obrigada a expor de maneira suficiente, na sua decisão, as razões pelas quais os elementos essenciais da argumentação de uma parte não podem ser retidos (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 2 de Abril de 1998, Comissão/Sytraval e Brink's France, C-367/95 P, Colect., p. I-1719, n.os 63 e 64). Tendo em conta o facto - reconhecido pela Comissão (v. supra n.° 130) - que a decisão Iberia constituía o único precedente na sua prática decisória no que toca ao cálculo da taxa mínima para um investimento feito pelas autoridades públicas numa companhia aérea, deve considerar-se que a argumentação da recorrente que procura distinguir a sua situação da da Iberia revestia um carácter essencial na sua demonstração de que o investimento do IRI satisfazia o critério do investidor privado. Nestas condições, a Comissão era obrigada a responder-lhe na decisão recorrida.

133.
    Ora, deve reconhecer-se que, na decisão recorrida e nos relatórios dos consultores da Comissão, para os quais a referida decisão remete, registam-se certas particularidades da situação da recorrente, que tinham nomeadamente sido postas em destaque por esta para distinguir a sua situação da da companhia Iberia.

134.
    Assim, o relatório dos consultores de Dezembro de 1996 sublinha, no quadro da avaliação da taxa mínima, a existência de um acordo que foi concluído com os sindicatos e o facto de certos projectos importantes, entre os quais nomeadamente o relativo ao «transportador altamente competitivo», isto é, Alitalia Team, já terem arrancado (ponto IV.E.2).

135.
    Além disso, na decisão recorrida, é confirmado que «o plano (de reestruturação) recebeu a aprovação dos parceiros sociais da empresa» (ponto II, terceiro parágrafo; v. também ponto II, sexto parágrafo) e que a «Alitalia Team foi constituída em 23 de Julho de 1996» (ponto II, sexto parágrafo). A decisão recorrida regista ainda o que se segue: «o objectivo (do plano de reestruturação) consiste em restaurar a competitividade da Alitalia e permitir a sua privatização no novo contexto do mercado comunitário liberalizado. Com esta dupla finalidade, o aumento de capital traduzir-se-á por uma forte redução do endividamento e por um regresso a uma estrutura financeira comparável à da maior parte das concorrentes da companhia. O saneamento da estrutura do passivo do balanço implicará igualmente uma diminuição substancial dos encargos financeiros. O plano prevê, por outro lado, a prossecução dos esforços já empreendidos pela Alitalia em matéria de produtividade e de custos. A Comissão salienta, além disso, que a produtividade do pessoal da empresa se situa actualmente a um nível igual ao das suas principais concorrentes comunitárias...» (ponto VIII, sétimo parágrafo). Além disso, explica-se na decisão recorrida : «o plano, tal como melhorado e adaptado a partir do mês de Janeiro de 1997, é realista e permite à Alitalia recuperar uma rentabilidade satisfatória na perspectiva do ano 2000.» (ponto VI, sétimo parágrafo, v. também ponto VIII, décimo primeiro parágrafo). Além disso, a Comissão sublinha:

«(O)s resultados altamente positivos previstos na perspectiva do ano 2000 deveriam simultaneamente satisfazer as necessidades em termos de activo circulante e de financiamento dos investimentos indispensáveis à actividade a longo prazo da companhia, bem como oferecer perspectivas de viabilidade a longo prazo. Deveriam igualmente inspirar confiança aos investidores e abrir caminho para o desenvolvimento de alianças com outras companhias.» (ponto VIII, nono parágrafo.).

136.
    Resulta do que precede que a fundamentação da decisão recorrida respeitante ao cálculo da taxa mínima não deixa transparecer, de uma forma clara e inequívoca, o raciocínio da Comissão de forma a permitir à recorrente conhecer as razões da medida tomada a fim de defender os seus direitos e ao Tribunal comunitário exercer o seu controlo (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 30 de Abril de 1998, Cityflyer Express/Comissão, T-16/96, Colect., p. II-757, n.os 64 e 65, e jurisprudência referida). Com efeito, a Comissão não explicou, na decisão recorrida, porque é que julgava necessário aplicar ao investimento do IRI a mesma taxa mínima de 30% que tinha retido na decisão Iberia, quando as declarações feitas na decisão recorrida levam a pensar, nomeadamente, que vários factores de risco conduziram a Comissão, na decisão Iberia, a fixar a taxa mínima a esse nível «muito elevado e bastante superior às taxas apuradas no mercado» não estavam presentes ou estavam-no em menor medida no caso Alitalia (comparar os n.os 128 e 135 supra).

137.
    Há que concluir que a decisão recorrida está inquinada por uma falta de fundamentação na medida em que retém para o investimento do IRI a mesma taxa mínima que a determinada na decisão Iberia.

- No que respeita às críticas relativas aos elementos de cálculo da taxa interna

138.
    Em primeiro lugar, a recorrente alega que a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação ao excluir, no cálculo da taxa interna, os custos de insolvência. Os custos de insolvência obter-se-iam pelo cálculo da diferença entre o montante dos empréstimos concedidos, que serão reembolsos na sua totalidade no caso de uma nova injecção de capital, e o valor de reembolso desses mesmos empréstimos em caso de insolvência. A Comissão, tendo em conta esses custos, ter-se-ia afastado das regras financeiras ordinariamente seguidas pelas empresas, dos pareceres dos seus consultores, bem como da sua própria prática decisória. A recorrente explica que a Cofiri, uma sociedade do grupo IRI, lhe tinha disponibilizado empréstimos nas condições do mercado da ordem dos 1,6 biliões de LIT. Os custos de insolvência para os empréstimos concedidos pela Cofiri ascenderiam a 1,14 biliões de LIT. Para o cálculo dos custos de insolvência, haveria também que ter em conta a degradação da cotação do IRI em consequência de uma eventual liquidação da recorrente.

139.
    A recorrente sustenta que o facto de 0,9 bilião de LIT ter sido reembolsado imediatamente à Cofiri, e, portanto à IRI, graças ao pagamento da primeira prestação de 1 bilião de LIT, em Junho de 1996 pelo IRI (v. supra n.° 11), é um elemento significativo para o cálculo da taxa interna. Mesmo que essa operação constituísse uma conversão de dívida em capital, tal declaração seria desprovida de qualquer incidência para efeitos de aplicação do artigo 92.°, n.° 1, do Tratado.

140.
    A Comissão objecta que a questão da inclusão ou da exclusão dos custos de insolvência é desprovida de objecto para a qualificação do investimento como auxílio de Estado. Sublinha, para esse efeito, que, segundo os cálculos dos seus consultores, a taxa interna mais favorável à recorrente, incluindo custos de insolvência, seria de 24,8%. Quanto às razões justificativas da exclusão dos custos de insolvência no cálculo da taxa interna, a Comissão refere-se ao ponto VII, sétimo parágrafo, da decisão recorrida. A Comissão entende que o adiantamento de um montante de 1 bilião de LIT pago pelo IRI em Junho de 1996 (v. supra n.° 11), que foi utilizado para reembolsar os empréstimos disponibilizados pela Cofiri, deve ser equiparado a uma conversão de empréstimos em capital.

141.
    A Comissão alega ainda que a concessão de empréstimos à recorrente, mesmo nas condições normais do mercado, pela Cofiri, uma empresa pública, suscita questões sobre a sua natureza de auxílio de Estado, uma vez que a recorrente, também ela uma empresa pública, goza de uma garantia implícita e ilimitada do Estado. A Comissão explica que não podia integrar no valor actual fluxos de tesouraria de subvenções cuja legalidade é duvidosa.

142.
    O Tribunal reconhece, em primeiro lugar, que, na decisão impugnada, a Comissão afirma que, para efeitos de cálculo da taxa interna, excluiu os custos de insolvência. Explica, com efeito, «que não se justifica, nas circunstâncias presentes, tomar em consideração, a título das receitas esperadas, os custos que o IRI seria obrigado a assumir no caso de liquidação da Alitalia» (ponto VII, sétimo parágrafo).

143.
    A recorrente não poderá afirmar que, ao agir assim, a Comissão se tenha afastado a opinião expressa pelos seus consultores. Deve, com efeito, reconhecer-se que os consultores da Comissão, em momento algum do processo administrativo, afirmaram que os custos de insolvência deviam ser incluídos no cálculo da taxa interna. No seu relatório de 18 de Junho de 1997, eles indicaram (p. 23): «(A)s taxas de rendimento podem ser calculadas incluindo a remuneração dos empréstimos do IRI.» Os consultores avaliaram, então, a taxa interna uma vez excluindo (p. 13), e outra incluindo (p. 14), os custos de insolvência nos seus cálculos.

144.
    A Comissão fundamenta a sua decisão de excluir os custos de insolvência da taxa interna da seguinte forma:

«(E)stes custos de insolvência decorrem, essencialmente, da perda de empréstimos a curto prazo concedidos à Alitalia pela sociedade financeira Cofiri, filial do IRI, até ao mês de Junho de 1996. Estes empréstimos foram reembolsados a partir dos meses de Junho e Julho de 1996, graças ao pagamento, nessa mesma data, de um adiantamento no valor de 1 bilião de (LIT), o que permite, aliás, considerar na prática esta operação dupla como uma conversão de empréstimos em capital. Na verdade, um investidor privado guiado por perspectivas de rentabilidade a mais longo prazo não basearia a sua decisão numa eventual vantagem imediata, caso a verdadeira situação da empresa não fosse suficientemente boa para justificar compromissos duradouros.» (ponto VII, sétimo parágrafo.)

145.
    Não é contestado que a maior parte da injecção de capital de 1 bilião de LIT efectuada em 1996 serviu para reembolsar ao IRI empréstimos de um montante de cerca de 0,9 bilião de LIT e que essa operação pode ser considerada como uma conversão de empréstimos em capital.

146.
    Deve, em seguida, reconhecer-se que essa conversão de empréstimos em capital encaixa perfeitamente nos objectivos do plano de reestruturação da recorrente. Com efeito, um dos objectivos principais prosseguido pelo plano era reduzir o rácio «dívidas/fundos próprios» (ponto II, quarto, décimo primeiro e décimo segundo parágrafos, e ponto VIII, sétimo parágrafo, da decisão recorrida).

147.
    A Comissão não poderá, todavia, afirmar que tal «conversão» traz apenas uma vantagem imediata. Com efeito, como o reconhece na decisão recorrida, uma redução do endividamento reduz os custos financeiros da recorrente (ponto II, décimo segundo parágrafo, e ponto VIII, sétimo parágrafo). Ora, a redução dos custos financeiros aumenta a rentabilidade da recorrente, o que contribui para o financiamento dos investimentos indispensáveis à sua actividade a longo prazo.

148.
    O argumento da Comissão tirado da eventual natureza de auxílio de Estado dos empréstimos concedidos pela Cofiri deve ser também rejeitado. Com efeito, a decisão recorrida não avança esse fundamento para justificar a exclusão dos custos de insolvência do cálculo da taxa interna. Além disso, no seu relatório de 18 de Junho de 1997, os consultores da Comissão reconheceram que, durante o período que vai de Março de 1994 a Março de 1996, a recorrente «estava em condições de obter novas linhas de crédito junto de instituições financeiras privadas» e que as «condições aplicadas pel(a) Cofiri», durante esse período, não apresentavam «diferenças essenciais em relação ao mercado»(section IV, F.2).

149.
    Além disso, deve reconhecer-se que o raciocínio da Comissão relativo aos custos de insolvência é circular. Deve recordar-se, para esse efeito, que, na decisão recorrida, a Comissão procede ao cálculo da taxa interna para apreciar se um investidor privado poderia ter sido levado a efectuar um investimento no valor de 2,75 biliões de LIT no capital da recorrente. Todavia, a explicação avançada pela Comissão para justificar a decisão de excluir os custos de insolvência do cálculo da taxa interna é já baseada na premissa de que um investidor privado não faria o investimento em questão. Com efeito, resulta dessa explicação que a Comissão considerava que «a verdadeira situação da empresa não (era)suficientemente boa para justificar compromissos duradouros» da parte de «um investidor privado guiado por perspectivas de rentabilidade a mais longo prazo» (ponto VII, sétimo parágrafo).

150.
    Deve, portanto, reconhecer-se que, no caso em apreço, a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação, ao considerar, na base dos fundamentos avançados na decisão recorrida, que os custos de insolvência relativos aos empréstimos concedidos pela Cofiri deviam ser excluídos do cálculo da taxa interna.

151.
    Finalmente, o argumento da Comissão de que a questão da inclusão ou da exclusão dos custos de insolvência seria desprovida de pertinência (v. supra n.° 140) deve ser rejeitado. O facto de a Comissão explicar no quadro da apreciação do critério do investidor privado (ponto VII da decisão) que, no caso em apreço, os custos de insolvência devem ser excluídos constitui um indício suficiente de que essa questão é pertinente para a avaliação do ponto de saber se o investimento do IRI constitui um auxílio de Estado. Além disso, no quadro do contencioso de anulação, não cabe ao Tribunal reavaliar a taxa interna para o investimento e apreciar se a referida taxa, na hipótese de os custos de insolvência terem sido incluídos no seu cálculo, ficaria inferior à taxa mínima (acórdãos AIUFFASS e AKT/Comissão, referido no n.° 99 supra, n.° 56, BFM e EFIM/Comissão, referido no n.° 84 supra, n.° 81, e British Airways e o. e British Midland Airways/Comissão, referido no n.° 86 supra, n.° 79).

152.
    Em segundo lugar, a recorrente alega que a Comissão a forçou arbitrariamente a tomar a seu cargo o custo, que incumbe ao Estado por virtude do Decreto-Lei n.° 546, de 23 de Outubro de 1996 (convertido em Lei n.° 640, de 20 de Dezembro de 1996), da reforma antecipada de 700 dos seus trabalhadores, reduzindo em dois pontos pelomenos, segundo os cálculos dos consultores da Comissão, a taxa de rentabilidade do investimento do IRI.

153.
    Todavia, como o sublinha, com razão, a Comissão, a recorrente comprometeu-se irrevogavelmente, antes da adopção da decisão recorrida, a tomar a seu cargo os custos da reforma antecipada de 700 assalariados (v. supra n.os 28 e 35) Por essa razão, a apreciação jurídica e o dispositivo da decisão recorrida não contêm qualquer sinal da decisão da recorrente de suportar os custos . A Comissão dá conta unicamente disso na parte intitulada «Factos» da decisão recorrida.

154.
    Mesmo que, inicialmente, a recorrente tenha assumido o compromisso em questão na condição de a decisão final reconhecer que a recapitalização constitui um investimento conforme ao critério do investidor privado, deve reconhecer-se que, pela constituição de um arresto, em Julho de 1997, esse compromisso se tornou irrevogável (v. supra n.° 35). A Comissão devia então verificar se o investimento satisfazia o critério do investidor privado tendo em conta essa nova realidade.

155.
    Finalmente, a recorrente poderia ter resistido, no decurso do processo administrativo, à pretensa pressão por parte da Comissão para tomar o compromisso em questão ou, alternativamente, como para as outras «condições», poderia ter evitado assumir um compromisso unilateral irrevogável. Se a recorrente se tivesse comportado dessa forma no decurso do processo administrativo, a Comissão teria tomado posição sobre a questão dos custos das reformas antecipadas de 700 assalariados na decisão recorrida ou noutra decisão cuja legalidade poderia ter sido apreciada pelo Tribunal.

156.
    Segue-se que o argumento da recorrente tirado do cálculo pretensamente errado da taxa interna em virtude do facto de a Comissão a ter forçado a tomar a seu cargo o custo da reforma antecipada de 700 dos seus trabalhadores deve ser rejeitado.

- No que respeita à crítica relativa à não tomada em consideração da última versão do plano de reestruturação para o cálculo da taxa mínima e da taxa interna

157.
    A recorrente denuncia o facto de as últimas modificações que foram introduzidas no plano de reestruturação, em Junho de 1997, não terem conduzido os consultores da Comissão e esta a reavaliar a taxa mínima e a taxa interna. Entende que as últimas modificações tiveram um efeito directo sobre os riscos ligados ao investimento e sobre a sua rentabilidade.

158.
    Há que recordar que, no seu primeiro relatório de Dezembro de 1996 preparado na base do plano de reestruturação que tinha comunicado à Comissão em Julho de 1996, os consultores calcularam uma taxa mínima que se situava entre 30 e 40%. Entendiam que a taxa mínima se aproximava antes da parte inferior dessa forquilha. Segundo os consultores, a taxa interna variava entre - 12,5% e + 25,7% (relatório de 11 de Dezembro de 1996, section IV; decisão recorrida, ponto V, segundo parágrafo).

159.
    No que toca ao plano de reestruturação modificado de Fevereiro de 1997, este foi objecto de análise no projecto de relatório de 21 de Fevereiro de 1997, cuja versão definitiva data de 18 de Junho e de 1997 (v. supra n.° 32). Nesse relatório, os consultores explicam que a taxa mínima devia ser fixada da em 30%. A taxa interna variava entre + 13,1% e + 24,8% (relatório de 18 de Junho de 1997, section IV; v. também decisão recorrida, ponto IV, segundo parágrafo, e ponto VII, oitavo parágrafo).

160.
    Em seguida, como a Comissão o sublinha na decisão recorrida, realizaram-se várias reuniões no decurso dos meses de Maio e Junho de 1997 que deram lugar a uma melhoria suplementar do plano de reestruturação sobre os seguintes pontos: uma aceleração do processo de redução dos custos através de uma transferência de pessoal da Alitalia para a Alitalia Team mais rápida do que fora anteriormente previsto; uma redução do montante do aumento de capital previsto para 2,75 biliões de LIT; a cessão das participações da Alitalia na companhia húngara Malev, bem como em seis aeroportos regionais italianos (decisão recorrida, ponto VI, quinto parágrafo). Essas últimas adaptações introduzidas no plano de reestruturação foram comunicadas à Comissão pelas autoridades italianas por carta de 26 de Junho de 1997. Todavia, os consultores da Comissão, no seu relatório complementar de 4 de Junho de 1997, não reavaliaram a taxa de mínima e a taxa interna na base das últimas adaptações introduzidas no plano de reestruturação em Junho de 1997.

161.
    É claro para as partes que a taxa mínima e a taxa interna que foram retidas na decisão recorrida são as que tinham sido calculadas pelos consultores da Comissão no seu relatório de 18 de Junho de 1997 na base da penúltima versão do plano de reestruturação. A Comissão, com efeito, fixou a taxa mínima em 30% (decisão recorrida, ponto VI, segundo parágrafo, e ponto VII, oitavo parágrafo). A taxa interna, que foi fixada «(n)uma percentagem próxima de 20%» (decisão recorrida, ponto VII, oitavo parágrafo), constitui, como a Comissão o confirmou em resposta a uma questão por escrito, a média dos valores avançados no relatório de 18 de Junho de 1997 (v. supra n.° 103).

162.
    Segue-se, portanto, que, na decisão recorrida, a Comissão não reavaliou a taxa mínima e a taxa interna na base da última versão do plano de reestruturação da recorrente.

163.
    A Comissão explica todavia no seu articulado de defesa: «(P)ela sua própria natureza, as (últimas) modificações (introduzidas no plano de reestruturação) não podiam ter incidência decisiva sobre as incógnitas do investimento de um capital de risco na óptica do investidor privado que opera segundo as leis da economia de mercado... Na sequência das modificações introduzidas em Junho de 1997, as condições que permitem reduzir posteriormente a (taxa mínima) não estavam reunidas; com efeito, esta tinha sido já reduzida de 30-40%, segundo as estimativas da primeira versão do plano, para um nível mínimo de 30% na segunda versão.» A fim de sublinhar os riscos associados ao plano de reestruturação, a Comissão assinala que os controlos efectuados em Abril de 1998 deixaram transparecer a inobservância do plano de reestruturação no que tocaà produtividade do pessoal e às modalidades de redução dos efectivos. Além disso, a recorrente não teria respeitado diversas condições impostas pela decisão recorrida (v. decisão da Comissão de 3 de Junho de 1998 relativa à segunda prestação do auxílio à reestruturação da Alitalia, aprovada pela Comissão em 15 de Julho (JO C 290, p. 3). Quanto à taxa interna, a Comissão afirma, na sua tréplica, que essa taxa reavaliada na base da última versão do plano atinge no máximo um nível de 26,1%, incluindo mesmo os custos de insolvência (pontos 58 a 60 e anexo III da tréplica) A taxa interna continuaria, assim, ainda inferior à taxa mínima. A Comissão refere-se também aos maus resultados obtidos pela recorrente em 1999.

164.
    Há que recordar que, a fim de apreciar a legalidade da decisão recorrida, o Tribunal toma em consideração só elementos de que a Comissão dispunha no momento em que adoptou a decisão recorrida (acórdãos Alemanha/Comissão, referido no n.° 86 supra, n.° 34, British Airways e o. e British Midland Airways/Comissão, referido no n.° 86 supra, n.° 81, e Solomon/Comissão, referido no n.° 61 supra, n.° 115). Toda a argumentação da Comissão que se reporta a eventos que ocorreram após a adopção da decisão recorrida deve, portanto, ser rejeitada.

165.
    Deve recordar-se, em seguida, que a Comissão, em plena conformidade com as linhas directrizes que tinha editado na sua comunicação para a aviação (v. supra n.os 96 a 99), considerou, na decisão recorrida, que o método a aplicar a fim de avaliar se o investimento do IRI satisfazia o critério do investidor privado consistia em comparar a taxa interna com a taxa mínima do investimento (ponto VII, sétimo e oitavo parágrafos).

166.
    A taxa mínima, como a descreve a Comissão no seu articulado de defesa, «compreende o prémio de risco exigido pelo investidor privado para assumir um certo compromisso financeiro. A taxa é, portanto, directamente proporcional ao risco inerente ao investimento». No que toca à taxa interna, a Comissão explica que exprime «a rentabilidade fundamental da operação» (decisão recorrida, ponto VI, segundo parágrafo).

167.
    Ora, a própria Comissão reconheceu na decisão recorrida que as últimas melhorias introduzidas no plano de reestruturação «reduzem os riscos inerentes ao plano de reestruturação e aumentam ainda mais a rentabilidade da injecção de capital» (ponto VI, sétimo parágrafo). Afigura-se, portanto, que essas últimas modificações são susceptíveis de aumentar a taxa interna (rentabilidade acrescida) e de fazer descer a taxa mínima (riscos reduzidos).

168.
    Nestas condições, a Comissão deveria ter reavaliado a taxa mínima e a taxa interna na base da última versão do plano de reestruturação para poder apreciar correctamente se o investimento do IRI satisfaz o critério do investidor privado.

169.
    Segue-se, portanto, que a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação, ao considerar que as modificações introduzidas no plano de reestruturação em Junho de 1997, que, segundo confessou, reduziam ainda os riscos inerentes a esse plano emelhoravam a rentabilidade da empresa, não tinham qualquer incidência no cálculo da taxa mínima e da taxa interna e, portanto, na apreciação do ponto de saber se o investimento do IRI satisfazia o critério do investidor privado.

170.
    Quanto ao argumento da Comissão de que uma reavaliação da taxa mínima e da taxa interna na base da última versão do plano de reestruturação demonstraria que um investidor privado não teria feito o investimento em questão, deve recordar-se que, no quadro do contencioso de anulação, o Tribunal pronuncia-se sobre a legalidade das apreciações feitas pela Comissão na decisão recorrida. Não cabe ao Tribunal, no quadro de tal contencioso, reavaliar a taxa mínima e a taxa interna para o investimento e pronunciar-se sobre a questão de saber se um investidor privado teria sido levado a fazer o investimento que o IRI se propunha fazer no momento da adopção da decisão recorrida (acórdãos AIUFFASS e AKT/Comissão, referido no n.° 99 supra, n.° 56, BFM e EFIM/Comissão, referido no n.° 84 supra, n.° 81, e British Airways e o. e British Midland Airways/Comissão, referido no n.° 86 supra, n.° 79).

171.
    Tendo em conta a falta de fundamentação reconhecida no n.° 137 supra e os erros manifestos de apreciação reconhecidos nos n.° 150 e 169 supra, há que acolher os pedidos da recorrente e anular a decisão recorrida, sem que haja necessidade de conhecer ainda dos outros argumentos relativos ao primeiro fundamento e dos outros fundamentos da petição.

Quanto às despesas

172.
    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas, se tal tiver sido pedido. Tendo a Comissão sido vencida, há que decidir que suportará, além das suas próprias despesas, as da recorrente, em conformidade com os pedidos por esta formulados.

173.
    Em conformidade com o artigo 87.°, n.° 4, do Regulamento de Processo, as intervenientes suportarão as sua próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção Alargada),

decide:

1)    A Decisão 97/789/CE da Comissão, de 15 de Julho de 1997, relativa à recapitalização da companhia Alitalia, é anulada.

2)     A Comissão suportará as suas próprias despesas bem como as efectuadas pela recorrente.

3)    A Air One SpA e a Air Europe SpA suportarão as suas próprias despesas.

Lenaerts
Azizi
Moura Ramos

            Jaeger                        Mengozzi

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 12 de Dezembro de 2000.

O secretário

O presidente

H. Jung

J. Azizi


1: Língua do processo: italiano.