Language of document : ECLI:EU:T:2020:181

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção alargada)

13 de maio de 2020 (*)

«Auxílios de Estado — Setor aéreo — Auxílio concedido por Itália a favor dos aeroportos sardos — Decisão que declara o auxílio em parte compatível e em parte incompatível com o mercado interno — Imputabilidade ao Estado — Beneficiários — Vantagem para as companhias aéreas cocontratantes — Princípio do operador privado em economia de mercado — Afetação das trocas comerciais entre Estados‑Membros — Violação da concorrência — Dever de fundamentação — Regime de auxílios — Auxílio de minimis — Recuperação»

No processo T‑716/17,

Germanwings GmbH, com sede em Colónia (Alemanha), representada por A. Martin‑Ehlers, advogado,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por T. Maxian Rusche e S. Noë, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto um pedido, apresentado ao abrigo do artigo 263.o TFUE, de anulação da Decisão (UE) 2017/1861 da Comissão, de 29 de julho de 2016, relativa ao auxílio estatal SA 33983 (2013/C) (ex 2012/NN) (ex 2011/N) — Itália — Compensação aos aeroportos da Sardenha por obrigações de serviço público (SIEG) (JO 2017, L 268, p. 1),

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção alargada),

composto por: S. Papasavvas, presidente, J. Svenningsen (relator), V. Valančius, Z. Csehi e P. Nihoul, juízes,

secretário: P. Cullen, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 3 de outubro de 2019,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

 Quanto às medidas controvertidas

1        A ilha da Sardenha (Itália) tem cinco aeroportos, entre os quais figuram os aeroportos de Alghero, de Cagliari‑Elmas e de Olbia.

2        O aeroporto de Alghero é explorado pela So.Ge.A.Al SpA (a seguir «SOGEAAL») cujo capital foi integralmente subscrito por organismos públicos locais e é detido, maioritariamente, pela Regione autonoma della Sardegna (Região autónoma da Sardenha, Itália, a seguir «Região autónoma»), incluindo indiretamente por intermédio da Società Finanziaria Industriale Regione Sardegna (SFIRS). O aeroporto de Cagliari‑Elmas, por sua vez, é explorado pela So.G.Aer SpA (a seguir «SOGAER»), uma sociedade cujas quotas são maioritariamente detidas pela Câmara de Comércio de Cagliari (a seguir «CCIA de Cagliari», enquanto o aeroporto de Olbia é explorado pela GEASAR SpA (a seguir «GEASAR»), uma sociedade registada em Olbia cuja maioria das ações é detida por uma empresa privada, a Meridiana SpA.

 Quanto às disposições adotadas pela Região autónoma

–       Quanto ao artigo 3.o da Lei n.o 10/2010

3        Em 13 de abril de 2010, a Região autónoma adotou a legge regionale n.o 10 — Misure per lo sviluppo del trasporto aereo (Lei regional n.o 10 — Medidas de desenvolvimento do transporte aéreo) (Bollettino ufficiale della Regione autonoma della Sardegna) n.o 12, de 16 de abril de 2010) (a seguir «Lei n.o 10/2010»).

4        O artigo 3.o da Lei n.o 10/2010, sob a epígrafe «Incentivos para a dessazonalização das ligações aéreas da ilha» (Incentivi alla destagionalizzazione dei collegamenti aerei isolani), tem a seguinte redação:

«1.      São autorizadas despesas no montante de 19 700 000 [euros] para o ano de 2010 e de 24 500 000 [euros] para cada um dos anos de 2011 a 2013 para o financiamento dos aeroportos da ilha com vista ao reforço e ao desenvolvimento do transporte aéreo enquanto serviço de interesse económico geral, incluindo através da dessazonalização das ligações aéreas, em conformidade com a Comunicação da Comissão 2005/C 312/01, relativa às orientações comunitárias sobre o financiamento dos aeroportos e os auxílios estatais ao arranque das companhias aéreas que operam a partir de aeroportos regionais.

2.      Os critérios, a natureza e a duração da oferta de transporte, bem como as diretrizes para a elaboração dos planos de atividades por parte das sociedades gestoras de aeroportos, que têm em conta as medidas relativas à continuidade territorial referidas no artigo 2.o, são definidos por resolução do executivo regional, a adotar sob proposta do conselheiro regional dos transportes, de acordo com os conselheiros para a planificação, o orçamento, o crédito e o ordenamento regional, o turismo, o artesanato e o comércio, a agricultura e a reforma agropecuária, os bens culturais, a informação, o lazer e o desporto.

3.      A resolução referida no n.o 2 e os planos de atividades, incluindo aqueles já definidos pelas sociedades de gestão aeroportuária à data da entrada em vigor da presente lei, acompanhados dos respetivos atos e contratos, são financiados se forem estabelecidos em conformidade com os critérios, a natureza, a duração da oferta de transporte e as diretrizes referidas no n.o 2 e forem previamente submetidos a parecer vinculativo da comissão competente.»

–       Quanto aos atos de execução da Lei n.o 10/2010

5        Em conformidade com o artigo 3.o, n.o 2, da Lei n.o 10/2010, o executivo da Região autónoma adotou vários atos de aplicação das medidas previstas neste artigo 3.o (a seguir «atos de execução»), nomeadamente, a deliberazione della Giunta regionale n.o 29/36 (Decisão do Conselho Regional n.o 29/36), de 29 de julho de 2010 (a seguir «Decisão Regional n.o 29/36»), a deliberazione della Giunta regionale n.o 43/37 (Decisão do Conselho Regional n.o 43/37), de 6 de dezembro de 2010 (a seguir «Decisão Regional n.o 43/37»), e a deliberazione della Giunta regionale n.o 52/117 (Decisão do Conselho Regional n.o 52/117), de 23 de dezembro de 2011 (a seguir «Decisão Regional n.o 52/117») (a seguir, em conjugação com o artigo 3.o da Lei n.o 10/2010, «medidas controvertidas»).

6        Estes atos de execução definem três tipos de «atividades» pelos quais os operadores aeroportuários podem receber uma compensação da Região autónoma para os anos de 2010 a 2013, designadamente:

–        O aumento do tráfego aéreo pelas companhias aéreas (a seguir «atividade 1»);

–        a promoção da ilha da Sardenha enquanto destino turístico pelas companhias aéreas (a seguir «atividade 2»);

–        outras atividades de promoção confiadas pelos operadores aeroportuários, por conta da Região autónoma, a prestadores de serviços distintos das companhias aéreas (a seguir «atividade 3»).

7        A Decisão Regional n.o 29/36, por um lado, precisava que, na aplicação do artigo 3.o da Lei n.o 10/2010, o objetivo de reduzir a sazonalidade das ligações aéreas consistia em aumentar a frequência dos voos durante a época média e a época de inverno, assim como em abrir novas ligações aéreas. Por outro, esta decisão indicava que o objetivo final, prosseguido pelas medidas previstas no artigo 3.o da Lei n.o 10/2010 de promoção de uma política regional de transporte aéreo, era o reforço da coesão económica, social e territorial, assim como o desenvolvimento das economias locais, do turismo e da cultura da ilha da Sardenha.

8        A este respeito, a Decisão Regional n.o 29/36 definia os critérios, a natureza e a duração dos serviços de transporte em relação aos quais podia ser concedida uma compensação durante o período de 2010 a 2013, assim como as orientações para a elaboração e a avaliação dos «planos de atividades» elaborados pelos operadores aeroportuários.

9        Concretamente, para receber um financiamento previsto pela Lei n.o 10/2010, um operador aeroportuário devia submeter à aprovação da Região autónoma um plano de atividades pormenorizado. Este plano devia identificar as atividades, entre as atividades 1 a 3 referidas no n.o 6 supra, que o operador aeroportuário tencionava executar para alcançar os objetivos da Lei n.o 10/2010. Este plano devia eventualmente ser concretizado por acordos específicos entre o operador aeroportuário e as companhias aéreas.

10      Quando um operador aeroportuário pretendia receber um financiamento para a atividade 1, o plano de atividades que apresentava à Região autónoma devia identificar as «ligações de interesse estratégico» (nacionais e internacionais) e definir os objetivos anuais em matéria de frequência de voos, de novas ligações e de número de passageiros.

11      Segundo as autoridades italianas, a exploração destas ligações de interesse estratégico constituía assim o serviço de interesse económico geral que as companhias aéreas prestavam em contrapartida de uma compensação.

12      Um plano de atividades que desse execução à atividade 2 devia definir as atividades específicas de marketing e de publicidade que visavam aumentar o número de passageiros e promover a zona de atração do aeroporto.

13      A Decisão Regional n.o 29/36 previa que os planos de atividades deviam ser apoiados por previsões relativas às perspetivas de rendibilidade das atividades que identificavam.

14      Resulta da Decisão Regional n.o 29/36 que os planos de atividades deviam respeitar certos princípios:

–        as ligações de interesse estratégico determinadas pelos planos não podiam sobrepor‑se às ligações já exploradas no âmbito de um regime de obrigação de serviço público;

–        o financiamento concedido a cada ligação subvencionada devia ser degressivo ao longo do tempo;

–        o acordo financeiro celebrado com as companhias aéreas devia incluir um plano de promoção do território.

15      No caso de a Região autónoma constatar incoerências entre, por um lado, os planos de atividades apresentados pelos operadores aeroportuários e, por outro, as disposições da Lei n.o 10/2010 e os seus atos de execução, podia exigir que estes planos de atividades fossem alterados.

16      Após ter aprovado os diferentes planos de atividades que lhe eram apresentados pelos operadores aeroportuários, a Região autónoma distribuía os recursos financeiros disponíveis para cada um dos anos de 2010 a 2013 entre os operadores aeroportuários.

17      Quando a soma das compensações pedidas pelos operadores aeroportuários era superior ao montante previsto pela Lei n.o 10/2010, a Decisão Regional n.o 29/36 previa critérios de atribuição preferenciais.

18      Os montantes definitivos das contribuições anuais eram determinados a posteriori tendo em conta os montantes, eventualmente inferiores aos previstos nos planos de atividades, efetivamente pagos pelos operadores aeroportuários no âmbito da execução dos referidos planos. Para confirmar esses montantes, os referidos operadores deviam apresentar relatórios que precisavam, designadamente, os custos efetivamente suportados pelas ações realizadas e que deviam ser acompanhados de documentos comprovativos.

19      Por outro lado, os atos de execução previam que os operadores aeroportuários deviam assegurar o acompanhamento do desempenho das companhias aéreas. Em particular, exigiam que os acordos específicos celebrados entre os operadores aeroportuários e as companhias aéreas previssem a aplicação de sanções às companhias aéreas em caso de incumprimento dos objetivos previamente definidos, nomeadamente, em matéria de frequência de voos e de número de passageiros.

20      Por último, as contribuições da Região autónoma eram pagas por intermédio de um fundo regional ad hoc constituído e gerido pela SFIRS, que retinha 4 % sobre os montantes totais definitivos das referidas contribuições. Por outro lado, uma vez que apenas uma primeira fração, correspondente a 20 % dos fundos devidos a título de um ano de referência, era paga a priori, os operadores aeroportuários podiam pedir à SFIRS adiantamentos financeiros, os quais eram concedidos contra pagamento de comissões e de juros.

 Quanto ao contrato controvertido

21      A recorrente, Germanwings GmbH, é uma companhia aérea de transporte de passageiros «low‑cost», ativa desde 2002, que explora, nomeadamente, uma rede de ligações de curto, médio e longo curso, principalmente de e para aeroportos da União Europeia, incluindo o de Cagliari‑Elmas.

22      A SOGAER, operador do aeroporto de Cagliari‑Elmas, publicou, no seu sítio Internet, um anúncio em que convidava as companhias aéreas a apresentaram‑lhes planos de negócios relativos à exploração das rotas de e para este aeroporto, assim como relativos à celebração de contratos de marketing destinados a promover a ilha da Sardenha.

23      A SOGAER apresentou à Região autónoma os planos de atividades para o ano de 2010 e para o triénio 2011‑2013, acompanhados dos pedidos de financiamento correspondentes. Estes planos foram aprovados e os montantes atribuídos à SOGAER para 2010 e para o período de 2011 a 2013 foram respetivamente fixados pelas Decisões Regionais n.o 43/37 e n.o 52/117.

24      Neste contexto, a recorrente e a SOGAER celebraram um contrato em 2012 (a seguir «contrato controvertido»). Através deste contrato, a recorrente comprometia‑se, contra uma remuneração no montante de 30 000 euros, a promover a região da Sardenha, Cagliari, assim como as suas ligações diretas entre Cagliari‑Elmas e Colónia‑Bona (Alemanha) e entre Cagliari‑Elmas e Estugarda (Alemanha). Para este fim, a recorrente confiou a organização de uma campanha de promoção a um prestador de serviços terceiro, com um custo total de 40 000,18 euros, tendo a diferença com o montante de 30 000 euros proveniente da SOGAER sido assumido pela recorrente. Esta campanha de promoção decorreu entre 10 de dezembro de 2012 e 9 de janeiro de 2013.

25      Em 20 de dezembro de 2012, a recorrente emitiu uma fatura no montante de 30 000 euros. A SOGAER liquidou esta fatura, pagando o referido montante por transferência eletrónica em 19 de abril de 2013 (a seguir «pagamento controvertido»).

 Quanto à decisão impugnada

26      Em 30 de novembro de 2011, a República Italiana, nos termos do artigo 108.o, n.o 3, TFUE, notificou à Comissão a Lei n.o 10/2010, que foi examinada em conformidade com o capítulo III do Regulamento (CE) n.o 659/1999 do Conselho, de 22 de março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo 93.o do Tratado CE (JO 1999, L 83, p. 1).

27      Por carta de 23 de janeiro de 2013, a Comissão informou a República Italiana da sua decisão de dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE relativamente ao regime notificado (a seguir «regime de auxílios controvertido»). Através da publicação desta decisão no Jornal Oficial da União Europeia em 30 de maio de 2013 (JO 2013, C 152, p. 30), a Comissão convidou as partes interessadas a apresentarem as suas observações sobre o alegado regime de auxílios.

28      As autoridades italianas e as partes interessadas, incluindo os operadores dos aeroportos de Alghero, de Cagliari‑Elmas e de Olbia, apresentaram observações escritas. A recorrente não apresentou observações escritas. A Comissão comunicou as observações das partes interessadas às autoridades italianas, as quais puderam apresentar os seus comentários sobre as mesmas.

29      Por cartas de 24 de fevereiro de 2014, a Comissão informou as partes interessadas da adoção, em 20 de fevereiro de 2014, de uma comunicação intitulada «Orientações relativas aos auxílios estatais a aeroportos e companhias aéreas» (JO 2014, C 99, p. 3), e do facto de estas orientações serem aplicáveis ao caso em apreço a contar da data da sua publicação no Jornal oficial. Em 15 de abril de 2014, uma comunicação que convidava os Estados‑Membros e as partes interessadas a apresentarem as suas observações sobre a aplicação ao presente processo das referidas orientações, no prazo de um mês a contar da data de publicação das referidas orientações, foi publicada no Jornal oficial (JO 2014, C 113, p. 30).

30      Em 29 de julho de 2016, a Comissão adotou a Decisão (UE) 2017/1861, relativa ao auxílio estatal SA 33983 (2013/C) (ex 2012/NN) (ex 2011/N) — Itália — Compensação aos aeroportos da Sardenha por obrigações de serviço público (SIEG) (JO 2017, L 268, p. 1, a seguir «decisão impugnada»), cujo dispositivo tem a seguinte redação:

«Artigo 1. o

1.      O regime estabelecido pela Itália através da Lei [n.o 10/2010] não constitui um auxílio estatal na aceção do artigo 107.o, n.o 1, [TFUE] a favor [da] SOGEAAL […], [da] SOGAER […] e [da] GEASAR […]

2.      O regime estabelecido pela Itália através da Lei n.o 10/2010 constitui um auxílio estatal na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do Tratado, a favor das companhias aéreas Ryanair/AMS, easyJet, Air Berlin, Meridiana, Alitalia, Air Italy, [Volotea], Wizzair, Norwegian, JET2.COM, Niki, Tourparade, [recorrente], Air Baltic e Vueling, na medida em que está relacionado com as atividades dessas companhias no aeroporto Cagliari‑Elmas e no aeroporto de Olbia.

3.      O auxílio estatal referido no n.o 2 foi executado pela Itália em violação do artigo 108.o, n.o 3, [TFUE].

4.      O auxílio estatal a que se refere o n.o 2 é incompatível com o mercado interno.

Artigo 2. o

1.      A Itália deve recuperar junto dos beneficiários os auxílios estatais referidos no artigo 1.o, n.o 2.

2.      Tendo em conta que a Ryanair e a AMS constituem uma unidade económica única para efeitos da presente decisão, devem ser conjuntamente responsáveis pelo reembolso dos auxílios estatais recebidos por qualquer uma das duas.

3.      Os montantes a recuperar serão acrescidos de juros desde a data em que foram colocados à disposição dos beneficiários até à data da sua recuperação efetiva.

[…]

5.      A Itália deve cancelar todos os pagamentos pendentes do auxílio referido no artigo 1.o, n.o 2, com efeitos a contar da data de adoção da presente decisão.

Artigo 3. o

1.      A recuperação do auxílio referido no artigo 1.o, n.o 2, deve ser imediata e efetiva.

2.      A Itália deve garantir a aplicação da presente decisão no prazo de quatro meses a contar da data da respetiva notificação.

Artigo 4. o

1.      No prazo de dois meses a contar da notificação da presente decisão, a Itália deve transmitir as seguintes informações:

–        A lista dos beneficiários que receberam auxílios ao abrigo do regime referido no artigo 1.o, n.o 2, e o montante total do auxílio recebido por cada beneficiário ao abrigo do regime,

–        O montante total (capital e juros) a recuperar junto de cada beneficiário,

–        Uma descrição pormenorizada das medidas já adotadas e previstas para dar cumprimento à presente decisão,

–        Documentos comprovativos de que os beneficiários foram intimados a reembolsar o auxílio.

2.      A Itália deve manter a Comissão regularmente informada sobre a evolução das medidas nacionais adotadas para aplicar a presente decisão até estar concluída a recuperação do auxílio referido no artigo 2.o A pedido da Comissão, deve apresentar imediatamente informações sobre as medidas já tomadas e previstas para lhes dar cumprimento. Deve fornecer também informações pormenorizadas sobre os montantes do auxílio e dos juros já recuperados junto dos beneficiários.

Artigo 5. o

A República Italiana é a destinatária da presente decisão».

31      No que respeita ao alcance da decisão impugnada, a Comissão indicou, nos considerandos 344 a 346 desta decisão, que a mesma não devia abranger as medidas de auxílios já objeto de uma investigação, distinta, relativa ao aeroporto de Alghero. Com efeito, no que respeita a este aeroporto, os contratos celebrados entre a SOGEAAL e a sociedade Ryanair Ltd, já em 2003 e posteriormente prorrogados, foram objeto de uma denúncia apresentada por uma companhia aérea italiana. Desde então, foram objeto de uma denúncia apresentada por uma companhia aérea italiana. Esta conduziu à abertura, pela Comissão Europeia, em 12 de setembro de 2007, do procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE em relação a um presumível auxílio estatal concedido pelo aeroporto de Alghero a favor da Ryanair e de outras transportadoras aéreas (JO 2008, C 12, p. 7). Em 27 de junho de 2012, este procedimento foi ampliado, a fim de incluir as medidas adicionais adotadas pela República Italiana que não eram objeto da denúncia inicial (JO 2013, C 40, p. 15), entre as quais figuravam «[t]odas as medidas concedidas à Ryanair e à sua filial AMS, bem como às outras companhias aéreas que utilizam o aeroporto a partir de 2000 […] inclu[indo] contribuições financeiras concedidas diretamente pela SOGEAAL ou transmitidas através dela, por meio de vários acordos sobre serviços aeroportuários e sobre serviços de marketing, desenvolvidos com a Ryanair e outras transportadoras aéreas a partir de 2000».

32      O referido procedimento deu origem à adoção, pela Comissão, da Decisão (UE) 2015/1584, de 1 de outubro de 2014, relativa ao auxílio estatal SA.23098 (C 37/07) (ex NN 36/07) concedido pela Itália à Società di Gestione dell'Aeroporto di Alghero So.Ge.A.AL S.p.A. e a várias transportadoras aéreas que operam no aeroporto de Alghero (JO 2015, L 250, p. 38), na qual a Comissão considerou, nomeadamente, em aplicação do princípio do operador privado em economia de mercado, que os contratos celebrados pela SOGEAAL, controlada pela Região autónoma, com determinadas companhias aéreas e que tinham por objeto a promoção ou o arranque de novas ligações aéreas de e para o aeroporto de Alghero, assim como atividades de marketing e de publicidade não constituíam auxílios na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. No que respeita a outras companhias aéreas, entre as quais a recorrente, que celebraram contratos análogos com a SOGEAAL, a Comissão considerou que estes contratos constituíam auxílios, na aceção da mesma disposição, incompatível com o mercado interno.

33      Contudo, no que respeita ao período compreendido entre 2010 e 2013, a recorrente não celebrou contratos com a SOGEAAL abrangidos pelo regime de auxílios instituído pela Lei n.o 10/2010.

34      A este título, embora nem todos os pagamentos efetuados pela SOGEAAL a título das atividades 1 e 2 previstas nos termos da Lei n.o 10/2010 pelos atos de execução estivessem abrangidos pelos contratos examinados no âmbito da investigação distinta que incidiu exclusivamente sobre o aeroporto de Alghero, a Comissão considerou que a grande maioria desses pagamentos foi avaliada nesse outro processo. Além disso, a Comissão afirmou que «nem sempre [era] fácil distingui‑los claramente, dado que a relação financeira entre a SOGEAAL e uma dada companhia aérea, no período em causa, pod[ia]e ser regida por diversos contratos e só alguns deles foram considerados [no outro processo referido]». Assim, considerou adequado excluir do âmbito da decisão impugnada todos os acordos que as companhias aéreas e a SOGEAAL celebraram ao abrigo do regime de auxílios controvertido, ou seja, por outras palavras, a parte das medidas controvertidas relativa ao aeroporto de Alghero.

35      Por último, a Comissão considerou, na decisão impugnada, que o procedimento iniciado no caso em apreço não era relativo ao eventual auxílio concedido pelos operadores aeroportuários a outros prestadores de serviços que não as companhias aéreas e referente à atividade 3. Assim, declarou, no considerando 346 da decisão impugnada, que não podia tomar posição sobre este ponto.

 Quanto aos desenvolvimentos posteriores à decisão impugnada

36      A recorrente teve conhecimento da decisão impugnada por carta da Região autónoma de 4 de agosto de 2016, recebida em 15 de agosto de 2016. A Região autónoma aí informava a recorrente da adoção da decisão impugnada e convidava‑a a indicar, com base numa versão resumida da decisão impugnada anexada à referida carta, que dados deviam ser omitidos na versão publicada no Jornal Oficial, cuja publicação teve lugar em 18 de outubro de 2017.

37      Por carta de 19 de agosto de 2016, a recorrente respondeu à Região autónoma indicando que não estava em condições de compreender plenamente a decisão impugnada, por faltarem excertos. Todavia, identificou nesta carta os elementos que considerava serem confidenciais.

38      Em 7 de junho de 2017, a Região autónoma adotou uma decisão de recuperação, notificada à recorrente em 10 de agosto de 2017, acompanhada de uma cópia da decisão impugnada em versão não confidencial a seu respeito. A referida decisão obrigava a recorrente a restituir à Região autónoma um montante de 28 881 euros, acrescido de juros no montante de 1 678,48 euros, ou seja, um total de 30 559,48 euros.

39      Na sequência desta decisão de recuperação, a recorrente, por correio eletrónico de 14 de agosto de 2017, contestou junto da Comissão a obrigação de restituir o montante exigido na referida decisão, na medida em que este constituía um auxílio de minimis na aceção do Regulamento (CE) n.o 1998/2006 da Comissão, de 15 de dezembro de 2006, relativo à aplicação dos artigos [107.o e 108.o TFUE] aos auxílios de minimis (JO 2006, L 379, p. 5, a seguir «Regulamento de minimis 2006»). Por outro lado, a recorrente pedia à Comissão para lhe fornecer uma confirmação escrita nesse sentido que pudesse invocar no âmbito do recurso nacional que pretendia interpor da referida decisão.

40      Por correio eletrónico de 18 de agosto de 2017, a Comissão informou a recorrente de que não podia fornecer a confirmação pedida, precisando, nomeadamente, por um lado, que a decisão impugnada não previa uma derrogação à obrigação de recuperação para os auxílios de minimis, tanto sob o regime do Regulamento de minimis de 2006 como sob o Regulamento (UE) n.o 1407/2013 da Comissão, de 18 de dezembro de 2013, relativo à aplicação dos artigos 107.o e 108.o [TFUE] aos auxílios de minimis (JO 2013, L 352, p. 1, a seguir «Regulamento de minimis de 2013»), e, por outro, que o «requisito de transparência», previsto em cada um destes regulamentos, não estava preenchido.

41      Por correio eletrónico de 23 de agosto de 2017, a recorrente contestou a análise da Comissão. Em seguida, a recorrente contactou por telefone o serviço jurídico da Comissão, o qual a informou, num correio eletrónico de 13 de outubro de 2017, de que a posição dos serviços da Comissão não se tinha alterado.

 Tramitação do processo e pedidos das partes

42      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 18 de outubro de 2017, a recorrente interpôs o presente recurso.

43      Em 5 de abril de 2018 e na sequência de uma dupla troca de articulados, a fase escrita do processo foi encerrada.

44      Em 16 de maio de 2018, o Tribunal Geral, ouvidas as partes, decidiu suspender a instância até ao encerramento da fase escrita do processo nos processos conexos Ryanair e Airport Marketing Services/Comissão (T‑833/17) e easyJet Airline/Comissão (T‑8/18), que interveio nestes processos, respetivamente, em 21 de setembro e em 23 de julho de 2018.

45      Em 19 de junho de 2019, o Tribunal Geral, por ocasião da sua conferência plenária, decidiu, sob proposta da Primeira Secção e do vice‑presidente, em aplicação do artigo 28.o do seu Regulamento de Processo, remeter o processo à Primeira Secção em formação alargada a cinco juízes.

46      Sob proposta do juiz‑relator, o Tribunal Geral decidiu em seguida dar início à fase oral do processo. Para o efeito, a recorrente e a Comissão foram convidadas a apresentar documentos e a responder por escrito a questões colocadas pelo Tribunal Geral a título de medidas de organização do processo. A recorrente e a Comissão deram cumprimento a estas medidas no prazo fixado, em 3 de setembro de 2019. Em 6 de setembro de 2019, a Comissão apresentou em seguida um complemento de resposta às referidas medidas de organização, o qual foi apenso aos autos.

47      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal Geral na audiência de 3 de outubro de 2019. Nesta ocasião, a Comissão precisou que, contrariamente aos termos da tréplica, segundo os quais concluía pedindo que o recurso fosse julgado inadmissível ou, a título subsidiário, improcedente, concluía pedindo, na realidade, que o recurso fosse julgado improcedente.

48      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão impugnada e, em particular, o seu artigo 1.o, n.o 2, na medida em que a recorrente aí é referida, bem como o seu artigo 2.o, n.o 1, na medida em que a recuperação declarada respeita à recorrente;

–        condenar a Comissão nas despesas.

49      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

50      A recorrente invoca três fundamentos de anulação da decisão impugnada, relativos, em substância:

–        em primeiro lugar, a uma violação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, na medida em que a Comissão não demonstrou a existência de um auxílio, por não ter apreciado se a SOGAER tinha agido como um operador privado em economia de mercado;

–        em segundo lugar, a uma violação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, na medida em que a Comissão não demonstrou que o auxílio de que a recorrente teria beneficiado falseava ou ameaçava falsear a concorrência e afetas as trocas comerciais entre os Estados‑Membros;

–        em terceiro lugar, a um erro de direito por a Comissão não ter apreciado se o pagamento controvertido constituía um auxílio de minimis.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo a violação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, na medida em que a Comissão não demonstrou a existência de um auxílio, por não ter examinado se a SOGAER tinha agido como um operador privado em economia de mercado

51      Em apoio do primeiro fundamento, que se divide em duas partes, a recorrente considera que a Comissão não demonstrou a existência de um auxílio a seu favor. No âmbito da primeira parte do primeiro fundamento, a recorrente alega, em substância, que uma vez que há que distinguir dois «níveis» diferentes, nomeadamente, o da Região autónoma e o dos operadores aeroportuários, o nível relevante para apreciar a existência de um auxílio estatal é, contrariamente à abordagem seguida na decisão impugnada, o dos operadores aeroportuários, entre os quais a SOGAER em primeiro lugar.

52      No âmbito da segunda parte, a recorrente alega que uma apreciação da existência de um auxílio estatal ao nível da SOGAER teria permitido à Comissão concluir que o pagamento controvertido se enquadrava na aplicação do princípio do operador privado em economia de mercado (a seguir «princípio do operador privado»).

53      A Comissão conclui pedindo que o primeiro fundamento seja julgado inoperante e, em todo o caso, improcedente. Por outro lado, suscita vários fundamentos de inadmissibilidade sobre os quais, na medida em que dizem respeito a cada uma das duas partes do primeiro fundamento, se impõe decidir no âmbito do exame, sucessivo, dessas mesmas partes.

 Quanto à primeira parte do primeiro fundamento, relativa ao nível pertinente para apreciar a existência de um auxílio estatal

54      A recorrente alega que, para apreciar a existência de um auxílio estatal no caso em apreço, o nível pertinente de análise era o nível da SOGAER, uma vez que, em substância, o comportamento desta devia ser apreciado independentemente do regime de auxílios controvertido estabelecido pela Região autónoma.

55      Em primeiro lugar, a recorrente salienta que o regime de auxílios controvertido não prevê, só por si, subvenções a seu favor. Com efeito, como resulta, nomeadamente, dos considerandos 76, 78 e 86, alínea d), da decisão impugnada, a Região autónoma colocou os seus fundos à disposição dos operadores aeroportuários e não das companhias aéreas, com as quais, de resto, não tinha relação contratual. Além disso, esta Região foi a fonte de financiamento dos pagamentos efetuados às companhias aéreas.

56      Em segundo lugar, os operadores aeroportuários decidiram, de forma autónoma, celebrar contratos com as companhias aéreas e, sendo caso disso, solicitar fundos à Região autónoma com vista a transferi‑los para as companhias aéreas, uma vez que estes operadores não tinham qualquer obrigação de solicitar tais fundos. Com efeito, a referida Região não controlava nem a SOGAER, nem a CCIA de Cagliari, a qual é uma entidade pública independente da Região autónoma e, por conseguinte, não está em condições de pressionar a SOGAER no sentido de a obrigar a solicitar os fundos. Por outro lado, a eventual decisão dos operadores aeroportuários de solicitarem os fundos dependia de considerações económicas dos mesmos, tanto mais que estes operadores deviam, para aceder aos fundos, pagar uma «remuneração» à Região, designadamente, uma taxa de retenção de 4 %, bem como, eventualmente, as comissões e os juros referidos no n.o 20 supra. Assim, apenas solicitaram fundos à referida Região quando os lucros esperados de um contrato com uma determinada companhia aérea excediam os custos correspondentes a esta remuneração e todos os outros custos pertinentes.

57      Na realidade, segundo a recorrente, importa apreciar, sem ter em conta o regime de auxílios controvertido, o comportamento da SOGAER à luz das regras que regem os auxílios estatais, uma vez que, na medida em que 94,35 % do seu capital é detido pela CCIA de Cagliari, esta constitui uma empresa pública, conforme referido no considerando 55 da decisão impugnada, na aceção da Diretiva 2006/111/CE da Comissão, de 16 de novembro de 2006, relativa à transparência das relações financeiras entre os Estados‑Membros e as empresas públicas, bem como à transparência financeira relativamente a certas empresas (JO 2006, L 318, p. 17). A SOGAER encontra‑se numa situação análoga à dos operadores dos aeroportos de Pau‑Béarn e de Nîmes‑Uzès‑Le Vigan, igualmente controlados por Câmaras de Comércio locais, as quais constituíam órgãos do Estado francês, conforme constatou o Tribunal Geral nos seus Acórdãos de 13 de dezembro de 2018, Ryanair e Airport Marketing Services/Comissão (T‑53/16, EU:T:2018:943), e de 13 de dezembro de 2018, Ryanair e Airport Marketing Services/Comissão (T‑165/15, EU:T:2018:953).

58      A Comissão invoca uma exceção de inadmissibilidade contra, em substância, toda a primeira parte do primeiro fundamento. A título subsidiário, a Comissão conclui pedindo que esta primeira parte seja julgada improcedente.

–       Quanto à admissibilidade da primeira parte do primeiro fundamento

59      A Comissão considera que, no âmbito da réplica, a recorrente reconheceu que o princípio do operador privado não era aplicável à Região autónoma e desenvolveu uma argumentação baseada no facto de a SOGAER, e não a Região autónoma, ser o único órgão financiador do auxílio em causa. Esta argumentação, que, em substância, constitui a primeira parte do primeiro fundamento, é nova e, por conseguinte, inadmissível.

60      A recorrente, em resposta a uma questão do Tribunal Geral, contesta que a primeira parte seja inadmissível.

61      A este respeito, importa recordar que os argumentos cuja essência apresenta um nexo estreito com o fundamento de anulação apresentado na petição, não podem ser considerados fundamentos novos, na aceção do Regulamento de Processo, embora tenham sido formulados pela primeira vez na réplica. Tais argumentos constituem uma ampliação de um fundamento anteriormente invocado e a sua apresentação na réplica é admitida pelo órgão jurisdicional da União (v., neste sentido, Acórdão de 28 de janeiro de 1999, BAI/Comissão, T‑14/96, EU:T:1999:12, n.o 66 e jurisprudência referida). No entanto, a admissibilidade de tais argumentos aduzidos na réplica como ampliação de fundamentos da petição não pode ser invocada com o objetivo de compensar a inobservância, no momento da apresentação do recurso, dos requisitos do artigo 76.o, alínea d), do Regulamento de Processo, o que esvaziaria esta disposição da sua substância (v., neste sentido, Despacho de 19 de maio de 2008, TF1/Comissão, T‑144/04, EU:T:2008:155, n.o 30).

62      No caso em apreço, embora seja verdade que, na petição, a recorrente não precisou expressamente que considerava que a SOGAER era o órgão «financiador» do auxílio em causa, aí contestou, no entanto, a abordagem adotada pela Comissão na decisão impugnada. Desde a petição, a recorrente alegou que o contrato controvertido, e não as medidas tomadas pela Região autónoma, deveria ter sido apreciado à luz do princípio do operador privado, afirmando que «o regime previsto pela [Lei n.o 10/2010] não [era] relevante, uma vez que não [incluía], em si mesmo, nenhuma subvenção a favor da recorrente»; que «a [Região autónoma] não [tinha] pago subvenções a favor da recorrente»; que «a subvenção [era] paga às companhias aéreas pelos operadores aeroportuários, pelo que [era] esta relação contratual que deveria ter sido apreciada sob o ângulo da existência de um auxílio», e que «o elemento determinante [era] […] constituído pela celebração do acordo de marketing entre o operador aeroportuário, por um lado, e a recorrente, por outro».

63      Por outro lado, a recorrente, desde a petição, invocou o facto de a SOGAER constituir uma empresa pública, circunstância que, em seu entender, justificava que se apreciasse se este operador aeroportuário tinha agido enquanto operador privado.

64      Daqui resulta que a argumentação da recorrente, segundo a qual a SOGAER é o órgão financiador do auxílio pertinente, não é nova e que os argumentos invocados, na réplica, no âmbito da primeira parte, constituem uma ampliação do primeiro fundamento tal como formulado na petição. Por conseguinte, a primeira parte do primeiro fundamento é admissível.

–       Quanto ao mérito da primeira parte do primeiro fundamento

65      Nos termos do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, são declarados incompatíveis com o mercado interno, na medida em que afetem as trocas comerciais entre os Estados‑Membros, os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções. Assim, a qualificação de «auxílios de Estado» na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE pressupõe a reunião de quatro condições, a saber, que exista uma intervenção do Estado ou através de recursos estatais, que essa intervenção seja suscetível de afetar as trocas comerciais entre os Estados‑Membros, que conceda uma vantagem ao seu beneficiário e que falseie ou ameace falsear a concorrência (v. Acórdão de 13 de setembro de 2017, ENEA, C‑329/15, EU:C:2017:671, n.o 17 e jurisprudência referida).

66      No que respeita à primeira das condições relativas à qualificação de auxílio estatal, importa recordar que uma intervenção do Estado ou com recursos do Estado não tem de ser necessariamente uma medida decretada pelo poder central do Estado em causa. Essa medida pode muito bem emanar de uma autoridade infraestatal. Com efeito, uma medida adotada por uma coletividade territorial e não pelo poder central é suscetível de constituir um auxílio se estiverem preenchidas as condições impostas pelo artigo 107.o, n.o 1, TFUE (Acórdãos de 14 de outubro de 1987, Alemanha/Comissão, 248/84, EU:C:1987:437, n.o 17, e de 6 de setembro de 2006, Portugal/Comissão, C‑88/03, EU:C:2006:511, n.o 55). Por outras palavras, as medidas tomadas por entidades infraestatais, descentralizadas, federadas, regionais ou outras dos Estados‑Membros, qualquer que seja o seu estatuto jurídico e a sua designação, caem, da mesma forma que as medidas tomadas pelo poder federal ou central, no âmbito de aplicação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, se estiverem preenchidas as condições dessa disposição (Acórdãos de 6 de março de 2002, Diputación Foral de Álava e o./Comissão, T‑92/00 e T‑103/00, EU:T:2002:61, n.o 57, e de 12 de maio de 2011, Região Nord‑Pas‑de‑Calais e Communauté d’agglomération du Douaisis/Comissão, T‑267/08 e T‑279/08, EU:T:2011:209, n.o 108).

67      No que respeita ainda a esta primeira condição, importa recordar que, as vantagens, para que possam ser qualificadas de auxílios na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, devem, por um lado, ser concedidas direta ou indiretamente através de recursos estatais, e, por outro, ser imputáveis ao Estado (v. Acórdãos de 16 de maio de 2002, França/Comissão, C‑482/99, EU:C:2002:294, n.o 24 e jurisprudência referida, e de 13 de setembro de 2017, ENEA, C‑329/15, EU:C:2017:671, n.o 20 e jurisprudência referida), sendo estas duas subcondições cumulativas (v., neste sentido, Acórdãos de 28 de março de 2019, Alemanha/Comissão, C‑405/16 P, EU:C:2019:268, n.os 48 e 63 e jurisprudência referida, e de 5 de abril de 2006, Deutsche Bahn/Comissão, T‑351/02, EU:T:2006:104, n.o 103 e jurisprudência referida).

68      No caso em apreço, a Comissão, nos considerandos 355 a 361 da decisão impugnada que figuram no título «7.2.1.2. Recursos estatais e imputabilidade ao Estado», apreciou conjuntamente as duas subcondições relativas à utilização de recursos estatais e à imputabilidade ao Estado. Antes de mais, declarou, no considerando 356 desta decisão que, no que respeita ao regime de auxílios controvertido, este era financiado por recursos provenientes da Região autónoma e, como tinha a sua origem numa lei regional, era imputável a esta Região e, in fine, ao Estado italiano.

69      Em seguida, a Comissão, nos considerandos 357 a 360 da decisão impugnada, apreciou os fluxos financeiros dos operadores aeroportuários para as companhias aéreas. Neste âmbito, descreveu o mecanismo instituído pela Região autónoma, segundo o qual esta entidade estatal fornecia financiamentos aos operadores aeroportuários que os solicitavam à condição de estes lhe submeterem para aprovação planos de atividades nos quais os referidos operadores deviam detalhar a forma como pretendiam utilizar os referidos fundos, nomeadamente, para remunerar as companhias aéreas cocontratantes, como resulta da apresentação detalhada do funcionamento do regime de auxílios controvertido efetuada no título «2.7. Mecanismo e estrutura do financiamento instituído pela Região da Sardenha» da decisão impugnada. A Comissão baseou‑se nesta descrição para chegar à conclusão, que figura no considerando 360 da decisão impugnada, segundo a qual os operadores aeroportuários deviam ser considerados intermediários entre a Região autónoma e as companhias aéreas, de modo que os pagamentos recebidos por estas companhias eram financiados por fundos provenientes da referida Região, e eram imputáveis a esta última.

70      Com base neste raciocínio que estabelece um nexo entre a Região autónoma e as companhias aéreas, a Comissão, no considerando 361 da decisão impugnada, concluiu que os pagamentos efetuados pelos operadores aeroportuários a essas companhias eram financiados através de recursos estatais do Estado italiano e eram‑lhe imputáveis.

71      A recorrente, com a argumentação que apresentou no âmbito da primeira parte do primeiro fundamento, põe em causa, em substância, este raciocínio. Não contesta, como a Comissão declarou no considerando 356 da decisão impugnada, que os fundos colocados à disposição dos operadores aeroportuários, num período plurianual, para que estes últimos tomassem ações com vista a promover a região da Sardenha como destino turístico, constituíam recursos da Região autónoma, e, por isso, do Estado italiano, e que a decisão de conceder tais fundos aos referidos operadores era imputável à referida Região, e, por conseguinte, ao referido Estado. Em contrapartida, contesta a conclusão da Comissão, resultante dos considerandos 358 a 360 da decisão impugnada, segundo a qual estes operadores, entre os quais a SOGAER, podiam ser considerados intermediários entre a Região e as companhias aéreas.

72      Segundo a recorrente, embora seja verdade que o pagamento controvertido foi efetuado através de «recursos estatais» e que era imputável ao Estado italiano, isso não resultava de uma implicação da SOGAER no regime de auxílios controvertido estabelecido pela Região autónoma, mas antes do facto de a SOGAER ser uma empresa pública controlada por um órgão do Estado italiano, designadamente, a CCIA de Cagliari. Por outras palavras, a Comissão concluiu erradamente que o pagamento controvertido implicava uma intervenção do Estado italiano por intermédio da referida região, e não por intermédio da SOGAER. Nestas condições, a SOGAER constituiu o «nível» relevante para a apreciação da existência de um auxílio estatal.

73      A este respeito, há que considerar que, embora a recorrente não evoque expressamente as duas subcondições cumulativas que constituem a primeira das condições relativas à qualificação de auxílio estatal, contesta, implícita mas necessariamente, tanto, por um lado, a origem estatal regional do dinheiro utilizado pelos operadores aeroportuários para remunerar as companhias aéreas no âmbito dos contratos que estes tinham celebrado com as mesmas como, por outro, a imputabilidade à Região autónoma dos pagamentos efetuados por estes operadores no âmbito da execução dos contratos, celebrados com companhias aéreas tais como a recorrente.

74      Quanto à utilização de «recursos» regionais, há que afastar a argumentação da recorrente segundo a qual os fundos da Região autónoma não são relevantes, uma vez que foram colocados à disposição dos operadores aeroportuários e não das companhias aéreas, as quais apenas receberam pagamentos dos referidos operadores.

75      Com efeito, importa recordar que já foi declarado que, no exame de uma medida, a Comissão pode ser levada a examinar se uma vantagem pode ser considerada indiretamente concedida a operadores diferentes do recetor imediato da transferência de recursos estatais (v., neste sentido, Acórdão de 13 de junho de 2002, Países Baixos/Comissão, C‑382/99, EU:C:2002:363, n.os 61 e 62). A este título, o juiz da União também admitiu que uma vantagem diretamente concedida a determinadas pessoas singulares ou coletivas podia constituir uma vantagem indireta e, por isso, um auxílio estatal para outras pessoas coletivas que eram empresas (v., neste sentido, Acórdãos de 19 de setembro de 2000, Alemanha/Comissão, C‑156/98, EU:C:2000:467, n.os 22 a 35; de 13 de junho de 2002, Países Baixos/Comissão, C‑382/99, EU:C:2002:363, n.os 38 e 60 a 66; de 4 de março de 2009, Associazione italiana del risparmio gestito et Fineco Asset Management/Comissão, T‑445/05, EU:T:2009:50, n.o 127 e jurisprudência referida, e de 15 de junho de 2010, Mediaset/Comissão, T‑177/07, EU:T:2010:233).

76      No caso em apreço, os fundos colocados à disposição dos operadores aeroportuários devem ser considerados como tendo sido indiretamente concedidos às companhias aéreas, uma vez que o mecanismo estabelecido pela Região autónoma permitia assegurar que estes fundos correspondiam às remunerações pagas pelos referidos operadores a estas companhias. A este título, há que assinalar que, embora a recorrente ponha em causa o papel de intermediários desempenhado pelos operadores aeroportuários, não contestou a existência ou o funcionamento do referido mecanismo.

77      Ora, este mecanismo previa uma espécie de sistema de apuramento. Mais particularmente, a Decisão Regional n.o 29/36 previa que os operadores aeroportuários selecionados receberiam um adiantamento de 20 % dos fundos devidos a título do ano de referência, seguido de um pagamento de uma segunda fração de 60 %, escalonada e condicionada à apresentação de relatórios trimestrais, e, por fim, uma última fração de 20 % mediante apresentação dos documentos que permitiam à Região autónoma verificar se a atividade tinha sido corretamente executada, que os objetivos tinham sido alcançados e que os custos suportados eram reais. Por conseguinte, este mecanismo de controlo destinava‑se a impedir que os operadores aeroportuários obtivessem o reembolso de montantes distintos dos que suportaram para remunerar as companhias aéreas cocontratantes, tais como a recorrente, e que são objeto da obrigação de recuperação prevista no artigo 2.o da decisão impugnada. A existência deste mecanismo confirma igualmente que as prestações de tais companhias aéreas eram financiadas pela referida Região, uma vez que os montantes adiantados pelos operadores aeroportuários para remuneração das companhias aéreas cocontratantes correspondiam aos fundos que recebiam, no final do processo, da Região autónoma.

78      Por outro lado, como resulta dos considerandos 242 a 246, assim como 313, 314 e 317 da decisão impugnada, que expõem as observações que tinham apresentado no âmbito do procedimento administrativo perante a Comissão, os próprios operadores aeroportuários de Olbia e de Cagliari‑Elmas explicaram que, de facto, tinham adiantado os montantes correspondentes ao pagamento das companhias aéreas cocontratantes que forneciam as prestações pretendidas pela Região autónoma para promover o turismo da Sardenha e que, em seguida, tinham apresentado à referida Região autónoma os seus relatórios contabilísticos com os custos realmente suportados para obterem o reembolso pela Região autónoma. Neste âmbito, a SOGAER, com a qual a recorrente celebrou o contrato controvertido, afirmou inclusivamente, como figura no considerando 314 da decisão impugnada, que a Região autónoma a tinha obrigado a demonstrar que as companhias aéreas prestadoras tinham recebido a totalidade das contribuições regionais e que, consequentemente, era apenas uma intermediária que lhes transmitiu os montantes recebidos da Região autónoma. Por outro lado, a própria República Italiana alegou, como resulta do considerando 340 da decisão impugnada, que, em substância, o operador aeroportuário de Olbia tinha transferido para as companhias aéreas a totalidade do montante das contribuições que este operador tinha recebido da Região autónoma.

79      Além disso, a própria recorrente indicou que os pagamentos efetuados pelos operadores aeroportuários em benefício das companhias aéreas eram «financiados» pela Região autónoma sob a forma de uma transferência para os operadores aeroportuários.

80      Por conseguinte, afigura‑se claramente que os fundos utilizados pelos operadores aeroportuários para remunerar as companhias aéreas no âmbito dos contratos que tinham celebrado com estas constituíam recursos estatais provenientes da Região autónoma.

81      No que respeita à «imputabilidade» à Região autónoma dos contratos celebrados pelos operadores aeroportuários com as companhias aéreas, a recorrente sublinha, em particular, o facto de a Lei n.o 10/2010 não incluir, em si mesma, auxílios a favor das companhias aéreas e de a Região autónoma não ter celebrado contratos com estas companhias.

82      Ora, importa observar que a inexistência de vínculo jurídico direto entre as companhias aéreas e a Região autónoma não é suscetível de obstar a que sejam imputados a esta última os contratos celebrados pelos operadores aeroportuários. Com efeito, resulta da jurisprudência que o conceito de intervenção através de recursos estatais visa incluir, não apenas as vantagens concedidas diretamente pelo Estado, mas também as vantagens concedidas por intermédio de um organismo público ou privado, designado ou instituído por este Estado com vista a gerir o auxílio (v., neste sentido, Acórdãos de 22 de março de 1977, Steinike e Weinlig, 78/76, EU:C:1977:52, n.o 21; de 17 de março de 1993, Sloman Neptun, C‑72/91 e C‑73/91, EU:C:1993:97, n.o 19, e de 30 de maio de 2013, Doux Élevage e Coopérative agricole UKL‑ARREE, C‑677/11, EU:C:2013:348, n.o 26). O Tribunal de Justiça justificou a inclusão de vantagens concedidas por intermédio de organismos distintos do Estado no âmbito de aplicação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE pela necessidade de preservar o efeito útil das regras relativas aos «auxílios concedidos pelos Estados» definidas nos artigos 107.o a 109.o TFUE, evitando que o simples facto de criar instituições autónomas encarregadas da distribuição de auxílios possa permitir aos Estados‑Membros contornar as regras relativas aos auxílios de Estado (Acórdão de 16 de maio de 2002, França/Comissão, C‑482/99, EU:C:2002:294, n.o 23).

83      Embora esta jurisprudência vise as vantagens concedidas por intermédio de organismos, investidos de prerrogativas de poder público ou de missões de interesse geral e instituídos ou designados para gerir o auxílio, não pode, todavia, daí deduzir‑se que, além das vantagens distribuídas diretamente pelo Estado, apenas estes casos estão abrangidos pelo âmbito de aplicação da proibição prevista no artigo 107.o, n.o 1, TFUE. Pelo contrário, conforme já foi recordado anteriormente, mesmo uma vantagem diretamente concedida a certas pessoas singulares ou coletivas pode constituir uma vantagem indireta e, portanto, um auxílio de Estado para outras pessoas coletivas que são empresas (v. Acórdão de 19 de setembro de 2000, Alemanha/Comissão, C‑156/98, EU:C:2000:467, n.os 22 a 35; de 13 de junho de 2002, Países Baixos/Comissão, C‑382/99, EU:C:2002:363, n.os 38 e 60 a 66; de 4 de março de 2009, Associazione italiana del risparmio gestito e Fineco Asset Management/Comissão, T‑445/05, EU:T:2009:50, n.o 127, e de 15 de junho de 2010, Mediaset/Comissão, T‑177/07, EU:T:2010:233), e isto sem que tenha sido exigido, nestes processos em que o intermediário era uma pessoa singular ou coletiva, que as vantagens em causa tenham transitado por uma estrutura especificamente designada ou instituída por este Estado com vista a gerir o auxílio.

84      Além disso, resulta da jurisprudência que a imputabilidade de uma medida ao Estado pode ser deduzida de um conjunto de indícios resultante das circunstâncias do caso concreto e do contexto em que tal medida é adotada e, em particular de indícios que indiquem, no caso concreto, um envolvimento das autoridades públicas na adoção da referida medida, tendo também em conta o alcance desta, o seu conteúdo ou as condições de que se reveste (v., neste sentido, Acórdãos de 16 de maio de 2002, França/Comissão, C‑482/99, EU:C:2002:294, n.os 52 a 56, e de 17 de setembro de 2014, Commerz Nederland, C‑242/13, EU:C:2014:2224, n.os 31 a 33).

85      No caso em apreço, embora seja certo que a Lei n.o 10/2010 refere os operadores aeroportuários e não as companhias aéreas como sendo formalmente os beneficiários dos pagamentos previstos por esta lei, afigura‑se, no entanto, que o comportamento desses operadores foi determinado pela Região autónoma, uma vez que, em aplicação do mecanismo estabelecido por esta lei e pelos seus atos de execução, os fundos colocados à sua disposição deviam ser e de facto foram utilizados segundo as instruções desta Região.

86      Com efeito, o artigo 3.o, n.o 2, da Lei n.o 10/2010 previa expressamente que os critérios, a natureza e a duração da oferta de transporte, assim como as diretrizes para a elaboração dos planos de atividades pelos operadores aeroportuários deviam ser adotados por resoluções do executivo regional, ao passo que o artigo 3.o, n.o 3, desta lei previa, também expressamente, que os planos de atividades estabelecidos pelos operadores aeroportuários deviam ser acompanhados dos atos e dos contratos correspondentes e que apenas seriam financiados se tivessem sido estabelecidos em conformidade com os critérios, a natureza, a duração da oferta de transporte e as diretrizes adotadas pelo executivo regional e apenas se tivessem sido previamente submetidos a parecer vinculativo da comissão competente.

87      Além disso, resulta do regime estabelecido pela Lei n.o 10/2010 que as disposições desta última devem necessariamente ser lidas em conjugação com os textos cuja adoção pelo executivo regional estava prevista pela referida lei e que condicionavam os pagamentos efetuados pela Região autónoma aos operadores aeroportuários em causa no processo principal. Ora, estes, em particular a Decisão Regional n.o 29/36, previam expressamente que os operadores aeroportuários deviam submeter os seus planos de atividades à aprovação da Região autónoma e que os referidos planos deviam, para poderem ser elegíveis para o financiamento previsto pela referida Região, ser elaborados em conformidade com os critérios, a natureza e a duração da oferta de transporte, bem como com as diretrizes adotadas pelo executivo regional.

88      Em seguida, o mecanismo estabelecido pela Região autónoma previa, além de os planos de atividades serem submetidos a montante do processo para aprovação pela Região autónoma, que os operadores aeroportuários, conforme já foi referido no n.o 77 supra, deviam apresentar relatórios trimestrais com vista ao pagamento de 60 % do auxílio e apenas podiam obter a última fração do pagamento, de 20 %, depois de provarem que tinham respeitado as instruções da Região autónoma. Assim, as verificações, prévias ao reembolso dos montantes adiantados pelos operadores aeroportuários, eram suscetíveis de permitir à Região autónoma controlar as iniciativas dos operadores aeroportuários, uma vez que apenas aquelas estabelecidas em conformidade com as suas diretrizes e justificadas pela apresentação dos documentos contratuais e contabilísticos relevantes podiam dar lugar ao financiamento previsto pelo regime de auxílios controvertido.

89      A influência da Região autónoma sobre o conteúdo e o alcance das iniciativas dos operadores aeroportuários é corroborada por estes últimos. Com efeito, como resulta do considerando 237 da decisão impugnada, a GEASAR declarou ter negociado as propostas de atividades de marketing, tendo as companhias aéreas respondido ao convite à manifestação de interesse que este operador aeroportuário tinha publicado no seu sítio Internet, tendo em conta o plano de marketing turístico elaborado pela Região autónoma como um dos seus instrumentos de planeamento. Por sua vez, a SOGAER alegou, como resulta do considerando 313 da decisão impugnada, que, ao abrigo do regime de auxílios controvertido, a referida Região concedia uma compensação que era meramente canalizada através do operador aeroportuário, e isto «como parte de um plano decidido, financiado e controlado pela Região [autónoma]».

90      No que respeita mais particularmente à celebração de contratos com as companhias aéreas, é certo que a Lei n.o 10/2010 não referia ações específicas que deviam ser propostas pelos operadores aeroportuários nos planos de atividades, nem identificava as companhias aéreas que deviam ser solicitadas. No entanto, a referência, no artigo 3.o, n.o 3, da Lei n.o 10/2010, aos contratos que devem ser apresentados pelos operadores aeroportuários e a referência, na Decisão Regional n.o 29/36, aos casos em que os planos de atividades são implementados por companhias aéreas confirmam que a Região autónoma incentivava os operadores aeroportuários a recorrerem às companhias aéreas, uma vez que estas entidades são as únicas a poder celebrar contratos com as companhias aéreas relativos à abertura ou à manutenção de ligações aéreas, às suas frequências e objetivos em termos de passageiros, e que a referida Região decidia quais eram as linhas aéreas que seriam consideradas elegíveis. Além disso, no que respeita às atividades de marketing, a Região autónoma estabeleceu uma distinção entre aquelas que seriam oferecidas pelas companhias aéreas, confirmando o recurso necessário dos operadores aeroportuários a tais companhias, e aquelas que seriam oferecidas por prestadores distintos das companhias aéreas, as quais não estão em causa no processo principal e cuja existência, em todo o caso, não é suscetível de influenciar a questão de saber se os fundos recebidos pela recorrente provinham do orçamento da referida Região e lhe eram imputáveis.

91      Assim, resulta das diferentes disposições que constituem o mecanismo estabelecido pela Região autónoma, qualificados pela Comissão como controlos «ex ante» e «ex post», que esta Região controlava estreitamente, a montante, os planos de atividades apresentados pelos operadores aeroportuários, nomeadamente, as ligações aéreas em causa e as prestações de marketing previstas, tal como, a jusante, os montantes atribuídos pelos operadores aeroportuários como remuneração das referidas prestações oferecidas pelas companhias aéreas no âmbito da promoção da ilha da Sardenha enquanto destino turístico. Deste modo, a Região autónoma assumiu um controlo suficiente sobre os comportamentos contratuais dos operadores aeroportuários que decidiram solicitar os fundos no âmbito do regime de auxílios controvertido, a ponto de considerar que os referidos comportamentos lhe eram imputáveis.

92      Por outro lado, há que assinalar que os documentos do processo no Tribunal Geral, nomeadamente apresentados pela Comissão para comprovar o funcionamento do mecanismo estabelecido pela Região autónoma, corroboram as conclusões anteriores relativas tanto à imputabilidade à Região autónoma dos contratos entre os operadores aeroportuários e as companhias aéreas como à origem estatal regional dos recursos utilizados para pagar estas companhias. Antes de mais, no que respeita ao contrato controvertido entre a SOGAER e a recorrente, o seu preâmbulo precisa expressamente que «[a] Região [autónoma] [tinha] decidido aumentar os seus investimentos em marketing nas indústrias do setor dos transportes e do turismo»; que, para o efeito, «fornec[ia] anualmente à SOGAER um montante que esta empresa [devia] despender para alcançar este objetivo»; que, «[à] luz da vontade da Região [autónoma], a SOGAER [tinha] publicado um anúncio no seu sítio Internet a fim de investir em atividades de marketing concebidas para promover as atrações turísticas do sul da Sardenha»; que, «[e]m conformidade com as diretrizes publicadas pela Região [autónoma, a] SOGAER [tinha] elaborado um plano de atividades que descrevia a estratégia e as ações que [deviam ser] executadas a fim de alcançar o objetivo de desenvolvimento do tráfego» e que «[e]ste plano de atividades [tinha] sido aprovado pelo comité do Conselho Regional em conformidade com o artigo 3.o, n.o 3, da Lei [10/2010]». Além disso, este contrato incluía uma cláusula que precisava expressamente que este estava sujeito às disposições da Lei n.o 10/2010.

93      Em seguida, no que respeita ao plano de atividades elaborado, a montante, pela SOGAER para os anos de 2011 a 2013, o qual foi aprovado pela Região autónoma no âmbito da Decisão Regional n.o 39/42, este identifica efetivamente as ações de marketing que devem ser executadas pela recorrente. A Comissão apresentou igualmente uma cópia da fatura, relativa ao pagamento controvertido, emitida pela recorrente em 20 de dezembro de 2012 e que a SOGAER comunicou, a jusante, à Região autónoma no âmbito das verificações prévias ao reembolso dos montantes adiantados por este operador aeroportuário.

94      Por último, nas Decisões da Região autónoma n.os 322 e 300, respetivamente de 13 de junho de 2013 e de 16 de junho de 2014, que fixam o montante anual definitivo das contribuições concedidas à SOGAER para os anos de 2012 e 2013, considerando‑se que o montante concedido à SOGAER para o ano de 2012 serviu, nomeadamente, para reembolsar o pagamento controvertido, a Região autónoma indicou explicitamente que «a intervenção referida na Lei [n.o 10/2010] [era] realizada por intermédio dos operadores aeroportuários, que desempenha[vam] o papel de intermediários e de precursores operacionais da transferência de recursos para as companhias aéreas, segundo a via determinada pela própria Região, tal como estabelecida na Lei [n.o 10/2010] e nas medidas de aplicação» (che l’intervento di cui alla LR. n.o 10/2010 si realizza attraverso le societa di gestione aeroportuale, che fungono da tramiti operativi e da soggetti anticipatori del trasferimento di risorse a favore dei vettori, secondo il percorso dalla Regione stessa disegnato con la sopraccitata legge regionale n.o 10/2010 e con e delibere di attuazione della stessa) e que «as companhias aéreas deveriam ser consideradas os destinatários reais e únicos dos fluxos de recursos financeiros em virtude da Lei [n.o 10/2010]» (che i vettori debbano considerarsi i reali ed unici destinatari dei flussi delle risorse di cui alla predetta legge regionale).

95      Tendo em consideração todos estes elementos, resulta tanto do mecanismo instituído pela Região autónoma através do regime de auxílios controvertido como da sua implementação que os contratos celebrados pelos operadores aeroportuários com as companhias aéreas e os pagamentos efetuados a estas em execução dos referidos contratos implicavam fundos estatais regionais e eram imputáveis à Região autónoma.

96      Esta conclusão não é posta em causa pelos argumentos da recorrente, expostos no n.o 56 supra, relativos ao facto de os operadores aeroportuários, entre os quais a SOGAER, serem livres para solicitar, ou não, fundos à Região autónoma e de esta escolha ser orientada pelas suas próprias considerações económicas.

97      A este respeito, por um lado, embora a iniciativa de apresentar planos de atividades à Região autónoma com vista a solicitar os seus fundos incumbisse formalmente aos operadores aeroportuários, uma vez tomada a sua decisão de participar no regime de auxílios controvertido, a sua margem de apreciação quanto às ações concretas a realizar era, como alega em substância a Comissão, largamente reduzida pelos critérios e diretrizes fixadas por esta Região. Ora, resulta manifestamente do conteúdo do contrato controvertido, exposto no n.o 92 supra, que o pagamento controvertido se inseria no âmbito do regime de auxílios controvertido.

98      Por outro lado, no que respeita às próprias considerações económicas dos operadores aeroportuários, importa recordar que os preços faturados pelas companhias aéreas pelas suas prestações, nomeadamente de marketing, foram financeiramente suportados pela Região autónoma e não por estes operadores. Assim, a parte de risco suportada por estes operadores era marginal, uma vez que apenas dizia respeito à taxa de retenção de 4 % e às comissões e juros que deviam ser pagos à SFIRS.

99      Por outro lado, importa recordar que a finalidade prosseguida por intervenções estatais não basta para as fazer escapar à qualificação de «auxílios» na aceção do artigo 107.o TFUE. Com efeito, este artigo não distingue consoante as causas ou os objetivos das intervenções estatais, antes definindo essas intervenções em função dos respetivos efeitos (v. Acórdão de 22 de dezembro de 2008, British Aggregates/Comissão, C‑487/06 P, EU:C:2008:757, n.os 84 e 85 e jurisprudência referida; Acórdão de 26 de novembro de 2015, Espanha/Comissão, T‑461/13, EU:T:2015:891, n.o 39).

100    Ora, uma vez que, conforme já foi anteriormente recordado, no exame de uma medida, a Comissão pode ser levada a examinar se uma vantagem pode ser considerada indiretamente concedida a operadores diferentes do recetor imediato da transferência de recursos estatais (v., neste sentido, Acórdão de 13 de junho de 2002, Países Baixos/Comissão, C‑382/99, EU:C:2002:363, n.os 61 e 62), há que considerar que, na medida em que se possa demonstrar, como no caso em apreço, que uma vantagem proveniente de recursos estatais foi transferida pelo recetor imediato para um beneficiário final, é irrelevante que esta transferência tenha sido efetuada pelo recetor imediato segundo uma lógica comercial ou, pelo contrário, que tenha respondido a um objetivo de interesse geral.

101    Isto é corroborado pela jurisprudência que estabelece que uma vantagem diretamente concedida a certas pessoas singulares ou coletivas pode constituir uma vantagem indireta e, portanto, um auxílio de Estado para outras pessoas coletivas que são empresas (v., neste sentido, Acórdãos de 19 de setembro de 2000, Alemanha/Comissão, C‑156/98, EU:C:2000:467, n.os 22 a 35; de 13 de junho de 2002, Países Baixos/Comissão, C‑382/99, EU:C:2002:363, n.os 38 e 60 a 66; de 4 de março de 2009, Associazione italiana del risparmio gestito e Fineco Asset Management/Comissão, T‑445/05, EU:T:2009:50, n.o 127, e de 15 de junho de 2010, Mediaset/Comissão, T‑177/07, EU:T:2010:233). Com efeito, nos processos que deram origem a estes acórdãos, a transferência da vantagem por pessoas singulares ou coletivas, recetoras imediatas de recursos estatais, inseria‑se numa relação comercial, o que confirma que a existência de uma razão comercial subjacente à transferência é irrelevante para efeitos da apreciação, à luz do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, do fluxo seguido pelos recursos de origem estatal até ao beneficiário final.

102    Quanto à argumentação, avançada pela recorrente, relativa à qualificação da SOGAER como «empresa pública», na aceção da Diretiva 2006/111, há que constatar que é inoperante e, em todo o caso, improcedente. Com efeito, a Comissão não se baseou em tal qualificação da SOGAER para imputar ao Estado italiano o pagamento controvertido. Em contrapartida, a Comissão baseou‑se no mecanismo estabelecido pela Região autónoma para chegar à conclusão de que os pagamentos recebidos pelas companhias aéreas provinham de recursos desta Região e eram‑lhes imputáveis, bem como, por conseguinte, ao Estado italiano. Neste contexto, os operadores aeroportuários em causa, entre os quais a SOGAER, apenas desempenharam um papel de intermediários, pelo que, como afirma a Comissão, a sua eventual qualificação como empresa pública, era irrelevante.

103    Nestas condições, é igualmente irrelevante que, nos Acórdãos de 13 de dezembro de 2018, Ryanair e Airport Marketing Services/Comissão (T‑53/16, EU:T:2018:943), e de 13 de dezembro de 2018, Ryanair e Airport Marketing Services/Comissão (T‑165/15, EU:T:2018:953), evocados pela recorrente, o Tribunal Geral tenha declarado que a Comissão tinha considerado acertadamente que as duas Câmaras de Comércio em causa, que controlavam, respetivamente, os aeroportos de Pau‑Béarn e de Nîmes‑Uzès‑Le Vigan, constituíam autoridades públicas cujas decisões eram imputáveis ao Estado francês. Com efeito, mesmo admitindo que a CCIA de Cagliari constitui uma autoridade pública e que a situação do aeroporto de Cagliari‑Elmas é comparável à dos dois aeroportos em causa nesses outros processos, de modo que os comportamentos deste aeroporto seriam imputáveis à CCIA de Cagliari, e, por conseguinte, ao Estado italiano, a verdade é que, no presente processo, o comportamento especificamente em causa, designadamente a celebração do contrato controvertido e o pagamento controvertido, é, tendo em consideração o exposto, imputável à Região autónoma, tendo o aeroporto de Cagliari‑Elmas apenas desempenhado um papel de intermediário.

104    De qualquer modo, importa observar que, ao contrário das circunstâncias específicas dos processos que deram origem aos Acórdãos de 13 de dezembro de 2018, Ryanair e Airport Marketing Services/Comissão (T‑53/16, EU:T:2018:943), e de 13 de dezembro de 2018, Ryanair e Airport Marketing Services/Comissão (T‑165/15, EU:T:2018:953), no caso em apreço, por um lado, não está demonstrado que a CCIA de Cagliari constituía uma autoridade pública, limitando‑se a recorrente a constatar, conforme figura no considerando 55 da decisão impugnada, que, em virtude do direito italiano, a CCIA de Cagliari é uma «entidade pública autónoma». Por outro, o aeroporto de Cagliari‑Elmas é explorado pela SOGAER, e não pela CCIA de Cagliari, e a recorrente não pretendeu demonstrar que os comportamentos deste operador aeroportuário, mesmo sendo maioritariamente detido pela CCIA de Cagliari, eram imputáveis a esta tendo em conta os requisitos estabelecidos no Acórdão de 16 de maio de 2002, França/Comissão (C‑482/99, EU:C:2002:294).

105    Por último, no que respeita à alegação da recorrente segundo a qual a Comissão pretendia, no âmbito do presente litígio, completar a fundamentação da decisão impugnada afirmando que os contratos celebrados entre os operadores aeroportuários e as companhias aéreas tinham como único objetivo distribuir os fundos colocados à disposição pela Região autónoma, basta constatar que, com esta afirmação, a Comissão remete manifestamente para o papel de intermediários desempenhado por estes operadores, o qual é exposto, nomeadamente, nos considerandos 357 a 360 e recordado nos considerandos 388 e 402 da decisão impugnada. Por conseguinte, a alegação da recorrente deve ser afastada.

106    Tendo em conta todas as considerações anteriores, a Comissão não incorreu em erro de direito ao declarar, nos considerandos 357 a 360 da decisão impugnada, que os operadores aeroportuários podiam ser considerados intermediários entre a Região autónoma e as companhias aéreas, e ao concluir que os pagamentos, entre os quais o pagamento controvertido, efetuados pelos operadores aeroportuários às referidas companhias aéreas, correspondiam a recursos da Região autónoma e eram‑lhes imputáveis. Por conseguinte, uma vez que a Comissão não incorreu em erro quanto ao «nível» relevante para a apreciação da existência de um auxílio estatal, a primeira parte do primeiro fundamento deve ser julgada improcedente.

 Quanto à segunda parte do primeiro fundamento, relativa à aplicação do princípio do operador privado ao nível da SOGAER

107    A recorrente alega que, uma vez que os operadores aeroportuários constituem o «nível» relevante de análise, só é importante a questão de saber se a SOGAER, agindo de forma autónoma, atuou segundo o princípio do operador privado efetuando o pagamento controvertido.

108    Assim, as considerações da Comissão relativas às intenções da Região autónoma, que consistiam, designadamente, no facto de esta pretender alcançar objetivos de política pública e não objetivos de rendibilidade, são irrelevantes. De igual modo, a inexistência de plano de negócios, de análise ex ante da rendibilidade ou de qualquer outro documento interno, que permita estabelecer eventuais objetivos de rendibilidade prosseguidos pela Região, é irrelevante.

109    Segundo a recorrente, para apreciar se a SOGAER tinha atuado segundo o princípio do operador privado ao celebrar o contrato controvertido, a Comissão deveria, em conformidade com a sua prática decisória e com a abordagem adotada pelo Tribunal Geral no Acórdão de 17 de dezembro de 2008, Ryanair/Comissão (T‑196/04, EU:T:2008:585), compensar os custos e as receitas ligados ao referido contrato. Se tal compensação conduzisse a um balanço negativo, isso implicaria a existência de um auxílio estatal.

110    Ora, não existe qualquer razão para que, no processo principal, a Comissão não tenha levado a cabo o exercício de compensação dos custos e das receitas ligados ao contrato controvertido. Quanto a este aspeto, a recorrente acusa a Comissão de não ter apresentado justificações quanto à sua conclusão, formulada nos considerandos 386 e 387 da decisão impugnada, segundo a qual não lhe teria sido possível avaliar as relações financeiras entre os operadores aeroportuários e as companhias aéreas, mesmo que os concursos tenham sido organizados para selecionar estas companhias aéreas. Acusa igualmente a Comissão de não ter tomado a iniciativa de pedir aos operadores aeroportuários para apresentar as análises ex ante da rendibilidade dos contratos celebrados com as companhias aéreas.

111    No que respeita mais particularmente às receitas a ter em conta, na execução do exercício de compensação dos custos e das receitas ligadas ao contrato controvertido, estão em causa as que resultam, para o aeroporto de Cagliari‑Elmas, das ligações aéreas operadas pela recorrente a partir deste aeroporto, designadamente, como teria revelado uma simples pesquisa na Internet, as ligações entre Cagliari‑Elmas e Colónia‑Bona, assim como entre Cagliari‑Elmas e Estugarda. Aliás, a própria Comissão, no considerando 376 da decisão impugnada, estabelece uma ligação entre os contratos de marketing celebrados pelos operadores aeroportuários com as companhias aéreas e as ligações aéreas operadas por estas a partir dos aeroportos em causa.

112    Quanto aos custos que devem ser tidos em conta neste exercício de compensação, a recorrente considera que o pagamento controvertido não é relevante. Na realidade, há que ter em consideração, a título dos custos relevantes, os custos de financiamento da SOGAER para obter os fundos que permitiram efetuar o referido pagamento (a seguir «custos de financiamento»). Conforme já foi evocado no âmbito da primeira parte do primeiro fundamento, no n.o 56 supra, os operadores aeroportuários, para acederem aos fundos da Região autónoma, deviam pagar‑lhe uma «remuneração» que assume a forma de uma taxa de retenção de 4 %, assim como, eventualmente, comissões e juros. Ora, o montante destes custos de financiamento é significativamente inferior ao montante de 30 000 euros correspondente ao pagamento controvertido.

113    Em contrapartida, foi inadequado reter o pagamento controvertido, tendo em conta que tinha sido financiado pela Região autónoma e que esta não formava uma unidade com a SOGAER. A este título, o Acórdão de 17 de dezembro de 2008, Ryanair/Comissão (T‑196/04, EU:T:2008:585), não pode ser invocado de forma útil, uma vez que, contrariamente ao que sucede no caso em apreço, no qual a Região autónoma não detinha a SOGAER, a Região da Valónia detinha todas as ações do operador aeroportuário do aeroporto de Charleroi (Bélgica).

114    A Comissão considera, a título principal, que a segunda parte do primeiro fundamento é inoperante, na medida em que apenas põe em causa as conclusões, que figuram nos considerandos 385 a 387 da decisão impugnada, sobre a aplicação concreta do princípio do operador privado, sem contestar a conclusão, que figura nos considerandos 380 a 383 da referida decisão, sobre a «inaplicabilidade» do referido princípio, com o fundamento de que a Região autónoma prosseguia objetivos de política económica geral e não objetivos de rendibilidade dos aeroportos em causa. A título subsidiário, a Comissão considera que a segunda parte é improcedente.

115    Por outro lado, no que respeita mais particularmente ao argumento de que os custos de financiamento devem ser considerados custos relevantes no exercício de compensação evocado pela recorrente, o mesmo é inadmissível.

–       Quanto à admissibilidade do argumento relativo aos custos de financiamento

116    Segundo a Comissão, a recorrente, com o seu argumento relativo aos custos de financiamento, alega, na réplica, que estes custos, e não o pagamento controvertido, constituem o auxílio relevante. Deste modo, a recorrente apresenta um fundamento novo e, por conseguinte, inadmissível.

117    A recorrente, em resposta a uma questão do Tribunal Geral sobre este ponto, explicou que tal argumento constituía uma extensão da sua argumentação principal, segundo a qual a Comissão deveria ter apreciado a existência de um auxílio estatal ao nível da SOGAER e não ao nível da Região autónoma. A título subsidiário, acrescentou que o balanço, resultante de uma compensação dos custos e das receitas ligadas ao contrato controvertido, é positivo, tendo em conta tanto o montante de 30 000 euros do pagamento controvertido como o montante dos custos de financiamento, significativamente inferior a 30 000 euros, excluindo assim a existência de um auxílio estatal nas duas hipóteses.

118    A este respeito, há que constatar que, embora a recorrente, desde a petição, alegue que se deveria verificar se a SOGAER tinha agido como um operador privado e efetuar um exercício de compensação dos custos e das receitas ligadas ao contrato controvertido, que deve ser entendido no sentido de que visa uma análise da rendibilidade incremental do contrato controvertido, nesta fase da referida petição, apenas se referiu ao pagamento controvertido e nunca aos custos de financiamento. Foi na fase da réplica que a recorrente evocou, pela primeira vez, os custos de financiamento, demonstrando assim uma evolução quanto aos custos relevantes a ter em conta no âmbito da análise da rendibilidade incremental.

119    Por outro lado, a recorrente procedeu a uma alteração semelhante na sua argumentação no âmbito do terceiro fundamento, relativo à existência de um auxílio de minimis. Enquanto, na petição, alegou que o montante do pagamento controvertido era largamente inferior ao limiar relevante de 200 000 euros, em seguida, na réplica, referiu o montante dos custos de financiamento, significativamente inferior a 30 000 euros.

120    Ora, ao proceder deste modo, a recorrente alterou um aspeto essencial da sua argumentação, uma vez que, ao abrigo de um argumento que precisa a análise da rendibilidade incremental evocada na petição, contesta o próprio objeto do auxílio identificado na decisão impugnada e, in fine, o montante que, eventualmente, deveria ser objeto de reembolso por força da obrigação de recuperação prevista no artigo 2.o da decisão impugnada.

121    Tendo em consideração o exposto, o argumento relativo aos custos de funcionamento não constitui uma ampliação, na aceção da jurisprudência recordada no n.o 61, supra, da segunda parte do primeiro fundamento tal como foi apresentada na petição. Por conseguinte, o referido argumento deve ser julgado inadmissível.

–       Quanto ao mérito da segunda parte do primeiro fundamento

122    A recorrente alega que a Comissão deveria ter apreciado se a SOGAER, ao celebrar o contrato controvertido e ao efetuar o pagamento controvertido, agiu segundo o princípio do operador privado.

123    A este respeito, importa começar por recordar que, pelos motivos expostos no âmbito da apreciação da primeira parte do primeiro fundamento, a recorrente comete um erro quando afirma que a SOGAER constitui o nível relevante para apreciar a existência de um auxílio estatal.

124    Na medida em que se baseia numa premissa errada, a segunda parte do primeiro fundamento só pode ser julgada improcedente. Com efeito, uma vez que os operadores aeroportuários apenas desempenharam um papel de intermediários, o princípio do operador privado não era aplicável ao seu nível, como declarou, em substância, a Comissão no considerando 387 da decisão impugnada. Assim, contrariamente ao que afirma a recorrente, a Comissão fundamentou corretamente a sua conclusão, segundo a qual não lhe teria sido possível avaliar as relações financeiras entre os operadores aeroportuários e as companhias aéreas, precisando, nesse considerando, que os referidos operadores não se comportaram como operadores em economia de mercado, uma vez que se limitaram a executar o regime de auxílios controvertido concebido pela Região autónoma.

125    A título adicional, importa observar que os operadores aeroportuários em causa, designadamente os de Cagliari‑Elmas e de Olbia, não eram detidos pela Região autónoma, o que, aliás, não é contestado pela recorrente. Por conseguinte, a referida Região não podia esperar, enquanto acionista, um rendimento económico a mais ou menos longo prazo dos fundos que colocava à disposição dos referidos operadores e o princípio do operador privado não era, igualmente por esta razão, aplicável.

126    Resulta do exposto que, uma vez que as transações efetuadas entre as companhias aéreas e os operadores aeroportuários não deviam ser apreciadas à luz do princípio do operador privado, a Comissão não tinha que apreciar a sua aplicação concreta no caso da recorrente.

127    Assim, em primeiro lugar, a Comissão não tinha de proceder a uma análise da rendibilidade incremental do contrato controvertido. Por conseguinte, a alegada demonstração, apresentada pela recorrente em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal Geral, da rendibilidade do pagamento controvertido é irrelevante. Em todo o caso, há que constatar que esta demonstração não pode ser considerada uma análise válida da rendibilidade incremental. Basta observar, em particular, que a recorrente identifica, a título de receitas relevantes, todas as taxas aeroportuárias pagas pela recorrente à SOGAER para um período compreendido entre 2011 e 2015. Ao fazê‑lo, inclui as taxas aeroportuárias, para cerca de dois anos, anteriores ao lançamento da campanha de promoção em causa no contrato controvertido e não avalia o montante das referidas taxas que resultaria de um aumento da frequência do aeroporto de Cagliari‑Elmas na sequência da referida campanha. Por outro lado, a recorrente identifica, a título dos custos relevantes, apenas o pagamento controvertido, ignorando outros custos da SOGAER ligados, nomeadamente, a tal aumento da frequência do referido aeroporto.

128    Quanto ao restante, basta assinalar que a recorrente efetua uma leitura errada do considerando 376 da decisão impugnada, o qual não é relativo às modalidades da análise da rendibilidade incremental. Este considerando diz respeito à questão, distinta, de saber se os custos dos serviços de marketing previstos pelos contratos celebrados entre os operadores aeroportuários e as companhias aéreas constituem custos que normalmente deveriam ficar a cargo destas companhias.

129    Em segundo lugar, a Comissão, contrariamente ao que alega a recorrente, não tinha a obrigação de pedir oficiosamente aos operadores aeroportuários para apresentarem eventuais análises ex ante da rendibilidade dos pagamentos efetuados às companhias aéreas, uma vez que estas análises eram igualmente abrangidas pela aplicação concreta do princípio do operador privado ao nível da SOGAER. Por outro lado, como afirma corretamente a Comissão, algumas partes interessadas, entre as quais a SOGAER, apresentaram observações, relativas, nomeadamente, à potencial aplicação do princípio do operador privado, acompanhadas dos documentos que estas partes consideravam relevantes, ao passo que a recorrente não participou no procedimento administrativo.

130    Nestas circunstâncias, não se pode criticar a Comissão por não ter tido em conta eventuais elementos de facto ou de direito que lhe podiam ter sido apresentados durante o procedimento administrativo, mas que não o foram, não tendo a Comissão a obrigação de apreciar oficiosamente e por suposição os elementos que lhe poderiam ter sido apresentados (v., neste sentido, Acórdão de 12 de setembro de 2019, Achemos Grupė e Achema/Comissão, T‑417/16, não publicado, em sede de recurso, EU:T:2019:597, n.o 60).

131    Em terceiro lugar, é igualmente irrelevante o argumento apresentado pela recorrente, na audiência, segundo o qual o facto de ter investido 10 000 euros, além do montante de 30 000 euros pago pela SOGAER, na campanha de promoção objeto do contrato controvertido, conforme evocado no n.o 24 supra, tende a demonstrar que a SOGAER agiu como um operador privado.

132    Quanto ao restante, na medida que a recorrente procura extrair argumentos da jurisprudência segundo a qual a participação, concomitante e em condições comparáveis, de organismos públicos e de operadores privados, numa determinada operação, permitiria deduzir que essa operação se faz em condições suscetíveis de satisfazer o princípio do operador privado (v., neste sentido, Acórdão de 12 de dezembro de 2000, Alitalia/Comissão, T‑296/97, EU:T:2000:289, n.o 81 e jurisprudência referida), esta argumentação deve ser rejeitada. Com efeito, no presente processo, não se pode considerar que a SOGAER participou, em condições comparáveis, na mesma operação que a recorrente, uma vez que a SOGAER não é uma companhia aérea. Assim, a SOGAER não podia esperar benefícios análogos aos que a recorrente esperava realizar da sua participação financeira nessa campanha, nomeadamente, os provenientes de um aumento das vendas de bilhetes ou de prestações a bordo das suas aeronaves para as ligações aéreas em causa.

133    Por último, no que diz respeito à alegação da recorrente segundo a qual o princípio do operador privado devia aplicar‑se ao nível dos operadores aeroportuários, tendo em conta que a própria decisão impugnada, nomeadamente nos considerandos 382 e 385, refere que não é aplicável ao nível da Região autónoma, há que constatar que a recorrente faz uma leitura errada destes considerandos. Com efeito, destes considerandos resulta unicamente que, no âmbito da apreciação da existência de um auxílio estatal ao nível desta Região, o princípio do operador privado não era aplicável, uma vez que esta pretendia atingir objetivos de política pública e não o rendimento que um operador privado podia esperar de transações com companhias aéreas.

134    Tendo em consideração o exposto, a segunda parte do primeiro fundamento deve ser julgada parcialmente inadmissível e parcialmente improcedente e, por conseguinte, o primeiro fundamento deve ser julgado improcedente na íntegra.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo a uma violação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, na medida em que a Comissão não demonstrou que o auxílio de que a recorrente beneficiou falseava ou ameaçava falsear a concorrência e afetava as trocas comerciais entre os EstadosMembros

135    Em apoio do segundo fundamento, relativo ao facto de a Comissão não ter demonstrado que o auxílio de que a recorrente beneficiou falseava ou ameaçava falsear a concorrência e afetava as trocas comerciais entre os Estados‑Membros, a recorrente alega, no âmbito de uma primeira parte, que a Comissão devia ter demonstrado de que modo o pagamento controvertido, e não o regime de auxílios controvertido, falseou ou ameaçava falsear a concorrência e afetou as trocas comerciais entre os Estados‑Membros. No âmbito de uma segunda parte, apresentada a título subsidiário, a recorrente alega que, mesmo admitindo que a Comissão se possa limitar a apreciar o referido regime, a decisão impugnada está insuficientemente fundamentada quanto ao facto de este regime ser suscetível de falsear a concorrência e de afetar as trocas comerciais.

136    A Comissão conclui pedindo que o segundo fundamento seja julgado parcialmente inadmissível e parcialmente improcedente. Em particular, na medida em que a recorrente afirma que o pagamento controvertido constitui um auxílio individual, concedido ad hoc e não em aplicação de um regime de auxílios, a primeira parte é inadmissível.

 Quanto à primeira parte, relativa à apreciação do pagamento controvertido em vez do regime de auxílios controvertido

137    A recorrente alega que, tendo em conta o facto de que, entre as dezasseis companhias aéreas em causa, recebeu o pagamento menos elevado, no montante de 30 000 euros, não se pode aceitar que a Comissão tenha posto todas estas companhias no mesmo plano e não tenha apreciado isoladamente o pagamento controvertido. Além disso, considera que a Comissão não se podia limitar a apreciar o impacto do regime de auxílios controvertido na concorrência e nas trocas comerciais entre Estados‑Membros, uma vez que o presente litígio não diz respeito um regime de auxílios.

138    A Comissão alega, com base, nomeadamente, na jurisprudência resultante do Acórdão de 9 de junho de 2011, Comitato «Venezia vuole vivere» e o./Comissão (C‑71/09 P, C‑73/09 P e C‑76/09 P, EU:C:2011:368, n.o 63), que, no caso de um regime de auxílios, pode limitar‑se a estudar as características do regime em causa, para apreciar, nos fundamentos da decisão, se, em razão dos montantes ou das percentagens elevadas dos auxílios, das características dos investimentos apoiados ou de outras modalidades que tal regime prevê, este assegura uma vantagem sensível aos beneficiários relativamente aos seus concorrentes e é suscetível de beneficiar essencialmente empresas que participam nas trocas comerciais entre Estados‑Membros. Assim, numa decisão que incide sobre um regime dessa natureza, a Comissão não está obrigada a efetuar uma análise do auxílio concedido em cada caso individual com base nesse regime. Apenas na fase da recuperação dos auxílios será necessário verificar a situação individual de cada empresa em causa.

139    Por outro lado, segundo a Comissão, na medida em que a recorrente alega que o pagamento controvertido constitui um auxílio individual ad hoc e não um auxílio individual concedido em aplicação de um regime de auxílios e, assim, contesta a qualificação de «regime de auxílios» das medidas controvertidas, esta última não apresentou nenhuma explicação nem, a fortiori, provas que sustentem a sua posição, pelo que tal argumento é inadmissível. A título subsidiário, este argumento é improcedente, uma vez que os operadores aeroportuários não dispõem de qualquer poder de apreciação e limitam‑se a transferir um auxílio individual em aplicação do regime de auxílios controvertido.

140    A este respeito importa observar em primeiro lugar que a recorrente, no âmbito do primeiro fundamento, alegou que a Comissão devia ter apreciado a existência de um auxílio estatal ao nível da SOGAER e não ao nível da Região autónoma. Ora, esta argumentação foi julgada improcedente.

141    Por conseguinte, na medida em que a argumentação da recorrente, apresentada no âmbito da primeira parte do segundo fundamento, assenta na argumentação desenvolvida no âmbito da primeira parte do primeiro fundamento, no sentido de que se deve apreciar isoladamente o pagamento controvertido, uma vez que a SOGAER constitui o nível relevante para a apreciação da existência de um auxílio estatal, esta argumentação baseia‑se numa premissa errada e, por isso, deve ser julgada improcedente. A remissão, por parte da recorrente, para o considerando 48 da decisão impugnada, que se limita a constatar que os operadores aeroportuários deviam celebrar acordos de marketing para executar a atividade 2, não pode infirmar esta conclusão.

142    No entanto, na medida em que a recorrente pretende, como afirma a Comissão, contestar a qualificação enquanto regime de auxílios das medidas controvertidas, importa apreciar igualmente se este aspeto da argumentação da recorrente é admissível e, eventualmente, procedente.

143    Questionada pelo Tribunal Geral sobre a admissibilidade de tal argumentação, a recorrente considera ter explicado a sua posição a este respeito ao afirmar, no âmbito do primeiro fundamento, que a Comissão, para apreciar a existência de um auxílio estatal, devia ter apreciado o contrato controvertido em vez do regime de auxílios controvertido que é irrelevante. De resto, esta posição é coerente com o considerando 48 da decisão impugnada que visa expressamente os contratos de marketing celebrados entre os operadores aeroportuários e as companhias aéreas. Assim, a recorrente considera que, através da sua exceção de inadmissibilidade, a Comissão pretende inverter o ónus da prova, uma vez que era à própria que incumbia, tendo em conta o facto de a SOGAER ser uma empresa pública, verificar se este operador aeroportuário tinha agido como um operador privado em economia de mercado.

144    Por outro lado, baseando‑se no n.o 87 do Acórdão de 14 de fevereiro de 2019, Bélgica e Magnetrol International/Comissão (T‑131/16 e T‑263/16, em sede de recurso, EU:T:2019:91), a recorrente acrescenta que a qualificação de regime de auxílios depende, nomeadamente, da condição de as autoridades relevantes não disporem de margem de apreciação quanto à determinação dos elementos essenciais do auxílio em causa e quanto à oportunidade da sua concessão, o que não sucede no processo principal, uma vez que a decisão impugnada não faz qualquer referência à falta de margem de apreciação no que diz respeito aos operadores aeroportuários na execução do regime de auxílios controvertido.

145    A este respeito importa recordar que, por força do artigo 21.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, aplicável ao processo no Tribunal Geral nos termos do artigo 53.o, primeiro parágrafo, do mesmo Estatuto, e do artigo 76.o, alínea d), do Regulamento de Processo, a petição deve indicar o objeto do litígio, os fundamentos e argumentos invocados e uma exposição sumária dos referidos fundamentos. Esta indicação deve ser suficientemente clara e precisa para permitir ao recorrido preparar a sua defesa e ao Tribunal Geral exercer a sua fiscalização jurisdicional. Segundo jurisprudência constante, para garantir a segurança jurídica e uma boa administração da justiça é necessário, para que um argumento seja admissível, que os elementos essenciais de facto e de direito em que este se baseia resultem, pelo menos sumariamente, mas de um modo coerente e compreensível, do texto da própria petição (v., neste sentido, Acórdãos de 19 de abril de 2012, Evropaïki Dynamiki/Comissão, T‑49/09, não publicado, EU:T:2012:186, n.o 90, e de 16 de outubro de 2013, TF1/Comissão, T‑275/11, não publicado, EU:T:2013:535, n.o 95).

146    No caso em apreço, resulta dos argumentos expostos no n.o 137 supra que a recorrente se limitou essencialmente a afirmar que não se pode aceitar que a Comissão ponha todas companhias aéreas no mesmo plano e que o presente litígio não diz respeito a um regime de auxílios. A recorrente evocou ainda o regime de auxílios controvertido no âmbito do terceiro fundamento, mas unicamente para afirmar que «o litígio não tem por objeto o regime de apoio às companhias aéreas, mas a obrigação de restituição concreta» imposta pela decisão impugnada. Há que constatar que a recorrente não explica de que modo a Comissão errou ao declarar, no considerando 349 da decisão impugnada, que as medidas controvertidas constituíam um regime de auxílios na aceção do artigo 1.o, alínea d), do Regulamento 2015/1589, tanto mais que não evoca nem este considerando nem esta disposição.

147    É certo que não está excluído que alguns dos argumentos apresentados em apoio da primeira parte do primeiro fundamento possam ser relevantes no âmbito de uma argumentação que visa contestar a qualificação de regime de auxílios das medidas controvertidas. Todavia, isso não basta para se admitir que a recorrente pôs em causa essa qualificação. Com efeito, tal qualificação de regime de auxílios é de natureza diferente da apreciação da existência de um auxílio estatal. Assim, esta última apreciação consiste em examinar se, num caso concreto, os quatro critérios cumulativos previstos no artigo 107.o, n.o 1, TFUE estão preenchidos. Em contrapartida, a qualificação de regime de auxílios visa permitir à Comissão, no âmbito de um único procedimento administrativo, realizar este exame conjuntamente para vários auxílios individuais, para efeitos de eficácia processual (v., neste sentido, Acórdão de 5 de outubro de 1994, Itália/Comissão, C‑47/91, EU:C:1994:358, n.o 21).

148    Ora, ao não fundamentar a sua argumentação destinada a contestar a qualificação de regime de auxílios das medidas controvertidas, a recorrente limita a Comissão e o Tribunal Geral a procederem por via de conjeturas quanto aos raciocínios e às considerações precisas, tanto factuais como jurídicas, que poderiam estar na base da sua contestação. Ora, nomeadamente, é esta situação, fonte de insegurança jurídica e incompatível com uma boa administração da justiça, que o artigo 76.o do Regulamento de Processo pretende evitar (v., neste sentido, Despacho de 19 de maio de 2008, TF1/Comissão, T‑144/04, EU:T:2008:155, n.o 57).

149    Daqui decorre que, contrariamente ao que alega a recorrente, o requisito que a obriga a fundamentar o seu argumento não implica uma inversão do ónus da prova. Uma vez que a Comissão, na decisão impugnada, considerou que a Lei n.o 10/2010 e os seus atos de execução constituíam um regime de auxílios, cabia à recorrente, se pretendesse contestar esta qualificação, apresentar argumentos nesse sentido.

150    A análise anterior não é posta em causa pelo argumento da recorrente relativo ao n.o 87 do Acórdão de 14 de fevereiro de 2019, Bélgica e Magnetrol International/Comissão (T‑131/16 e T‑263/16, em sede de recurso, EU:T:2019:91), uma vez que a recorrente não pode, numa resposta a uma pergunta do Tribunal Geral, suprir o facto de não ter sido feita uma apresentação suficientemente clara e precisa, no texto da própria petição, de um fundamento que contesta a qualificação de regime de auxílios das medidas notificadas, sob pena de esvaziar de qualquer conteúdo o artigo 76.o, alínea d), do Regulamento de Processo (v., neste sentido, Despacho de 19 de maio de 2008, TF1/Comissão, T‑144/04, EU:T:2008:155, n.o 30).

151    Em todo o caso, este argumento é errado. Com efeito, os operadores aeroportuários não constituíam as «autoridades nacionais» visadas pelo requisito, resultante do n.o 87 do Acórdão de 14 de fevereiro de 2019, Bélgica e Magnetrol International/Comissão (T‑131/16 e T‑263/16, em sede de recurso, EU:T:2019:91), segundo o qual as autoridades nacionais que aplicam um regime de auxílios não podem dispor de uma margem de apreciação quanto à determinação dos elementos essenciais do auxílio em causa e quanto à oportunidade da sua concessão, uma vez que tal papel cabia, por força da Lei n.o 10/2010 e dos seus textos de aplicação, ao executivo regional da Região autónoma. Por outro lado, contrariamente ao que afirma a recorrente, resulta da decisão impugnada, nomeadamente nos considerandos 360, 387 e 402, que a Comissão considerou que os referidos operadores não dispunham de uma margem de apreciação, uma vez que desempenhavam um papel de intermediários na execução do regime de auxílios controvertido.

152    Tendo em consideração o exposto, há que concluir que a primeira parte do segundo fundamento deve ser julgada parcialmente inadmissível e parcialmente improcedente.

 Quanto à segunda parte do segundo fundamento, relativa à insuficiência de fundamentação quanto ao impacto do regime de auxílios controvertido sobre a concorrência e sobre as trocas comerciais entre os EstadosMembros

153    A recorrente alega, em substância, que, admitindo que a Comissão se possa limitar a apreciar o regime de auxílios controvertido, a decisão impugnada está insuficientemente fundamentada quanto ao facto de esse regime ser suscetível de falsear a concorrência e de afetar as trocas comerciais entre os Estados‑Membros. Em particular, nos considerandos 390 a 392 da decisão impugnada, a Comissão limitou‑se, no essencial, a apresentar um raciocínio circular constituído por alegações relativas à liberalização do setor dos transportes aéreos, sem explicar em que medida a recorrente beneficiou de uma vantagem sensível, como exige, no entanto, a jurisprudência resultante do Acórdão de 14 de outubro de 1987, Alemanha/Comissão (248/84, EU:C:1987:437, n.o 18).

154    A Comissão entende que os considerandos 390 a 392 da decisão impugnada, cujas constatações não são contestadas pela recorrente, estão suficientemente fundamentados à luz da jurisprudência relevante, incluindo o Acórdão de 14 de outubro de 1987, Alemanha/Comissão (248/84, EU:C:1987:437).

155    A este respeito, para efeitos da qualificação de uma medida nacional como auxílio estatal, não é necessário demonstrar o impacto real do auxílio em causa sobre as trocas comerciais entre os Estados‑Membros e uma distorção efetiva da concorrência, mas apenas a examinar se este auxílio é suscetível de afetar essas trocas comerciais e falsear a concorrência (v., neste sentido, Acórdãos de 15 de dezembro de 2005, Itália/Comissão, C‑66/02, EU:C:2005:768, n.o 111, e de 9 de junho de 2011, Comitato «Venezia vuole vivere» e o./Comissão, C‑71/09 P, C‑73/09 P e C‑76/09 P, EU:C:2011:368, n.o 134).

156    Em particular, quando um auxílio concedido por um Estado‑Membro reforça a posição de uma empresa relativamente às demais empresas concorrentes nas trocas comerciais no interior da União, deve entender‑se que tais trocas comerciais são influenciadas pelo auxílio (v. Acórdão de 9 de outubro de 2014, Ministerio de Defensa e Navantia, C‑522/13, EU:C:2014:2262, n.os 51 e 52 e jurisprudência referida).

157    Por outro lado, no caso de um regime de auxílios, a Comissão pode limitar‑se a estudar as características do regime em causa, para apreciar, nos fundamentos da decisão, se, em razão dos montantes ou das percentagens elevadas dos auxílios, das características dos investimentos apoiados ou de outras modalidades que tal regime prevê, este assegura uma vantagem sensível aos beneficiários relativamente aos seus concorrentes e é suscetível de beneficiar essencialmente empresas que participam nas trocas comerciais entre Estados‑Membros. Assim, numa decisão que incide sobre um regime dessa natureza, a Comissão não está obrigada a efetuar uma análise do auxílio concedido em cada caso individual com base nesse regime. Apenas na fase da recuperação dos auxílios será necessário verificar a situação individual de cada empresa em causa (v., neste sentido, Acórdãos de 14 de outubro de 1987, Alemanha/Comissão, 248/84, EU:C:1987:437, n.o 18, e de 9 de junho de 2011, Comitato «Venezia vuole vivere» e o./Comissão, C‑71/09 P, C‑73/09 P e C‑76/09 P, EU:C:2011:368, n.o 63).

158    No caso em apreço, a Comissão, nos considerandos 390 a 392 da decisão impugnada, explicou que as companhias aéreas, que beneficiavam dos pagamentos efetuados pelos operadores aeroportuários em virtude do regime de auxílios controvertido, atuavam num setor caracterizado por uma concorrência intensa entre operadores provenientes de Estados‑Membros diferentes e, assim, participavam em trocas comerciais no interior da União. Por outro lado, importa observar, como resulta, aliás, da decisão impugnada, nomeadamente do quadro 15 que figura no considerando 427, que os montantes dos pagamentos efetuados a favor das companhias aéreas podiam ser elevados.

159    Tendo em conta os princípios recordados nos n.os 155 a 157 supra, contrariamente ao que alega a recorrente, os considerandos 390 a 392 da decisão impugnada eram suficientes tendo em conta o dever de fundamentação que incumbe à Comissão e esta também não tinha que explicar de que modo a recorrente, especificamente, retirava uma vantagem sensível do regime de auxílios controvertido (v., neste sentido, Acórdãos de 7 de março de 2002, Itália/Comissão, C‑310/99, EU:C:2002:143, n.os 88 e 89, e de 9 de junho de 2011, Comitato «Venezia vuole vivere» e o./Comissão, C‑71/09 P, C‑73/09 P e C‑76/09 P, EU:C:2011:368, n.os 114 e 121).

160    Assim, há que julgar improcedente a segunda parte do segundo fundamento e, por conseguinte, julgar improcedente na íntegra o segundo fundamento.

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo a um erro pelo facto de a Comissão não ter apreciado se o pagamento controvertido constituía um auxílio de minimis

161    No âmbito do terceiro fundamento que se divide em duas partes, a recorrente alega, em substância, que a Comissão incorreu em erro, por um lado, ao não apreciar oficiosamente se o pagamento controvertido constituía um auxílio de minimis e, por outro, ao considerar que o Regulamento de minimis de 2006 não se aplicava ao referido pagamento.

162    A Comissão conclui pedindo que o terceiro fundamento seja julgado inoperante e, em todo o caso, improcedente.

 Quanto à primeira parte do terceiro fundamento, relativa à apreciação oficiosa do caráter de minimis do pagamento controvertido

163    A recorrente alega que a Comissão, no âmbito da sua apreciação da existência de um auxílio estatal, cometeu um erro ao não verificar se o pagamento controvertido tinha um caráter de minimis, uma vez que tal verificação está intimamente ligada à apreciação do critério de afetação das trocas comerciais entre Estados‑Membros e constitui, por conseguinte, uma questão jurídica que a Comissão deveria apreciar sempre por sua própria iniciativa.

164    Esta conclusão não é posta em causa pela jurisprudência, resultante do Acórdão de 9 de junho de 2011, Comitato «Venezia vuole vivere» e o./Comissão (C‑71/09 P, C‑73/09 P e C‑76/09 P, EU:C:2011:368), evocada pela Comissão para sustentar que, no âmbito de um regime de auxílios, a apreciação do eventual caráter de minimis de medidas cabe às autoridades nacionais. Com efeito, neste outro processo, antes de mais, a Comissão, contrariamente ao que sucede no processo principal, apreciou expressamente a questão dos auxílios de minimis no considerando 110 da sua Decisão 2000/394/CE, de 25 de novembro de 1999, relativa às medidas de auxílio a favor das empresas situadas nos territórios de Veneza e de Chioggia previstas pelas Leis n.o 30/1997 e n.o 206/1995, que estabelecem reduções dos encargos sociais (JO 2000, L 150, p. 50), decisão esta que era objeto de impugnação no âmbito do referido acórdão. Em seguida, contrariamente à decisão impugnada que apenas visa auxílios incompatíveis com o mercado interno, a Decisão 2000/394 contém um dispositivo «misto» que ordena a recuperação de determinados auxílios incompatíveis, concluindo que outros auxílios são compatíveis com o mercado interno, pelo que a execução dessa decisão exigiu necessariamente uma apreciação autónoma pelas autoridades nacionais. Por último, no processo principal, o artigo 1.o, n.o 2, do dispositivo da decisão impugnada identifica nominalmente a recorrente como beneficiária de um auxílio e o artigo 2.o, n.o 1, do referido dispositivo exige a sua recuperação, impedindo assim uma apreciação autónoma pelas autoridades nacionais, ao passo que o dispositivo da Decisão 2000/394 não identificava nominalmente os beneficiários dos auxílios cuja recuperação ordenava.

165    A Comissão também errou ao alegar que não tinha a obrigação de apreciar oficiosamente a existência de um auxílio de minimis, uma vez que não tinha sido interpelada nesse sentido pela recorrente durante o procedimento administrativo. A este respeito, o Acórdão de 22 de janeiro de 2013, Salzgitter/Comissão (T‑308/00 RENV, EU:T:2013:30, n.o 121), evocado pela Comissão, é irrelevante, uma vez que a passagem deste acórdão em que se baseia a Comissão diz respeito ao critério da seletividade de uma medida e não, como sucede no processo principal, ao critério da afetação das trocas comerciais. Por outro lado, no decurso do procedimento administrativo anterior à decisão que foi impugnada no âmbito do referido acórdão, a República Federal da Alemanha não alegou que a coexistência do regime fiscal objeto da apreciação pela Comissão e de um regime fiscal distinto era suscetível de eliminar a seletividade de parte das vantagens controvertidas obtidas pela recorrente no processo em causa. Ora, esta omissão diz respeito a factos relevantes e constitui, por isso, uma questão de facto, ao passo que, no caso em apreço, a alegada omissão da recorrente diz respeito ao caráter de minimis do pagamento controvertido e, por conseguinte, a uma questão jurídica que a Comissão devia examinar oficiosamente.

166    A Comissão conclui pedindo que a primeira parte do terceiro fundamento seja julgada improcedente.

167    A este respeito importa recordar que, no âmbito da apreciação de um regime de auxílios, a Comissão pode limitar‑se a estudar as características do regime em causa e não tem de efetuar uma análise do auxílio concedido em cada caso individual com fundamento em tal regime. Apenas na fase da recuperação dos auxílios será necessário verificar, ao nível nacional, a situação individual de cada empresa em causa (v., neste sentido, Acórdão de 9 de junho de 2011, Comitato «Venezia vuole vivere» e o./Comissão, C‑71/09 P, C‑73/09 P e C‑76/09 P, EU:C:2011:368, n.o 63).

168    Daqui decorre que, contrariamente ao que alega a recorrente, a Comissão não tinha de apreciar se o pagamento controvertido tinha um caráter de minimis, cabendo esta apreciação às autoridades italianas na fase da recuperação do auxílio.

169    Esta constatação não é posta em causa pelos três argumentos apresentados pela recorrente para limitar o alcance da jurisprudência recordada no n.o 167 supra, procurando distinguir a decisão impugnada da Decisão 2000/394, a qual era objeto de impugnação no âmbito dos recursos que deram origem a esta jurisprudência.

170    Em primeiro lugar, no que respeita ao facto de que, contrariamente ao que sucede no processo principal, a Decisão 2000/394 refere expressamente, no considerando 110, as regras de minimis, basta constatar que a Comissão não realizou, no considerando 110, uma apreciação concreta do caráter de minimis das medidas em causa na referida decisão, mas limitou‑se, como afirma corretamente a Comissão, a efetuar uma remissão de natureza geral para as regras de minimis. Por conseguinte, a inexistência de um considerando análogo na decisão impugnada não pode justificar distinguir o presente processo das circunstâncias relevantes no processo que deu origem ao Acórdão de 9 de junho de 2011, Comitato «Venezia vuole vivere» e o./Comissão (C‑71/09 P, C‑73/09 P e C‑76/09 P, EU:C:2011:368). Esta conclusão impõe‑se ainda mais porque, como salienta a Comissão, os regulamentos de minimis são, por força do artigo 288.o TFUE, diretamente aplicáveis em todos os Estados‑Membros.

171    Por outro lado, um raciocínio do Tribunal Geral semelhante à argumentação apresentada pela recorrente já foi afastado pelo Tribunal de Justiça. Com efeito, no Acórdão de 28 de novembro de 2008, Hotel Cipriani e o./Comissão (T‑254/00, T‑270/00 e T‑277/00, EU:T:2008:537, n.os 100 a 111 e 251 a 252), o Tribunal Geral declarou que, embora não incumbisse às autoridades nacionais, na execução da decisão em causa nesse processo, verificar em cada caso individual se estavam reunidas as condições de aplicação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, estas autoridades não deviam, nesse caso específico, recuperar os auxílios individuais de minimis, uma vez que a Decisão 2000/394 devia ser interpretada, tendo em conta o seu considerando de minimis, no sentido de que exclui a qualificação de auxílio para as medidas que respeitavam a regra de minimis. Todavia, no seu Acórdão de 9 de junho de 2011, Comitato «Venezia vuole vivere» e o./Comissão (C‑71/09 P, C‑73/09 P e C‑76/09 P, EU:C:2011:368), que decidiu em sede de recurso do Acórdão de 28 de novembro de 2008, Hotel Cipriani e o./Comissão (T‑254/00, T‑270/00 e T‑277/00, EU:T:2008:537), o Tribunal de Justiça declarou que, na medida em que o Tribunal Geral, para chegar a esta conclusão, se baseou numa interpretação errada do alcance dessa decisão, segundo a qual as autoridades nacionais não estavam obrigadas a verificar, em cada caso individual, se a vantagem concedida podia, no que diz respeito ao beneficiário, falsear a concorrência e afetar as trocas comerciais no interior da União, este tinha ignorado a jurisprudência anterior do Tribunal de Justiça, segundo a qual, quando a Comissão se pronuncia por via geral e abstrata sobre um regime de auxílios que declara incompatível com o mercado interno e ordena a recuperação dos auxílios recebidos a título desse regime, cabe ao Estado‑Membro verificar a situação individual de cada empresa em causa, a fim de proceder à recuperação (v., neste sentido, Acórdão de 9 de junho de 2011, Comitato «Venezia vuole vivere» e o./Comissão, C‑71/09 P, C‑73/09 P e C‑76/09 P, EU:C:2011:368, n.os 61 a 64 e 114 a 117).

172    Em segundo lugar, no que respeita ao argumento relativo ao caráter «misto» do dispositivo da Decisão 2000/394, basta assinalar que, tendo em conta as considerações expostas no n.o 171 supra, o Tribunal de Justiça, quando evocou a necessidade de uma apreciação individualizada pelas autoridades nacionais, não se baseou nesta circunstância, mas recordou a jurisprudência relativa às obrigações das autoridades nacionais na execução de uma decisão da Comissão relativa a um regime de auxílios.

173    Em terceiro lugar, é efetivamente verdade que o dispositivo da Decisão 2000/394 não identifica nominalmente os auxílios incompatíveis com o mercado interno, contrariamente ao artigo 1.o, n.o 2, do dispositivo da decisão impugnada que identifica nominalmente a recorrente. No entanto, esta circunstância é irrelevante, uma vez que a verificação da situação individual da recorrente cabe necessariamente às autoridades italianas, uma vez que a Comissão se limitou a uma análise das características do regime de auxílios controvertido. Em todo o caso, resulta de uma leitura do dispositivo da decisão impugnada, além do seu artigo 1.o, n.o 2, que a Comissão espera que as autoridades italianas realizem uma apreciação individualizada da situação dos beneficiários, dado que, no artigo 4.o do referido dispositivo, pede à República Italiana que lhe comunique, designadamente, a lista exata dos beneficiários, o montante total a recuperar junto de cada beneficiário e uma descrição detalhada das medidas já adotadas e previstas para dar cumprimento à decisão impugnada.

174    Quanto a este ponto, verifica‑se que as autoridades italianas notificaram à recorrente uma decisão de recuperação. Interpelada a este respeito na audiência, a recorrente respondeu que não interpôs recurso nacional da referida decisão, contrariamente ao que, no entanto, tinha anunciado à Comissão no âmbito dos seus contactos posteriores à adoção da decisão impugnada. Ora, à luz da jurisprudência acima referida, relativa aos papéis respetivos da Comissão e das autoridades nacionais, a recorrente não pode utilizar o presente recurso para compensar a sua falta de diligência em interpor um recurso nacional.

175    Quanto ao restante, há que rejeitar a argumentação da recorrente destinada a contestar a pertinência do processo que deu origem ao Acórdão de 22 de janeiro de 2013, Salzgitter/Comissão (T‑308/00 RENV, EU:T:2013:30). Uma vez que a apreciação da situação individual dos beneficiários de um regime de auxílios cabe às autoridades nacionais e não à Comissão, a questão de saber se esta devia examinar apenas o caráter de minimis do pagamento controvertido, sem ser interpelada neste sentido pela recorrente, é inoperante.

176    Tendo em consideração o exposto, a primeira parte do terceiro fundamento deve ser julgada improcedente.

 Quanto à segunda parte do terceiro fundamento, relativa à aplicação dos regulamentos de minimis

177    A recorrente invoca o caráter de minimis do pagamento controvertido, alegando que o referido pagamento cumpre os requisitos do Regulamento de minimis de 2006.

178    Em particular, no que respeita, antes de mais, ao âmbito de aplicação do Regulamento de minimis de 2006, a recorrente considera que este regulamento é aplicável ratione materiae e ratione temporis no presente processo, em vez do Regulamento de minimis de 2013, como deixou entender a Comissão no seu correio eletrónico de 18 de agosto de 2017.

179    Em seguida, quanto às condições a preencher para que um auxílio seja considerado de minimis, a recorrente considera que o limite de 200 000 euros durante um período de três exercícios fiscais, fixado no artigo 2.o, n.o 2, do regulamento de minimis de 2006, não foi ultrapassado no caso em apreço, tendo em conta o montante de 30 000 euros do pagamento controvertido. Esta conclusão aplica‑se, por maioria de razão, no que respeita ao montante dos custos de financiamento, que constitui o montante relevante tal como a recorrente afirmou no âmbito do segundo fundamento. Por outro lado, a Comissão afirma erradamente que é improvável que o limite de 200 000 euros não tenha sido ultrapassado, devido aos numerosos auxílios de que beneficiou o grupo Lufthansa, ao qual pertence a recorrente. Em especial, os auxílios concedidos às outras entidades do grupo Lufthansa não podem ser tidos em conta, uma vez que o «conceito funcional de empresa», no qual a Comissão se apoia, não é aplicável, por não figurar no Regulamento de minimis de 2006.

180    No que respeita ao requisito previsto no artigo 2.o, n.o 4, do Regulamento de minimis de 2006, que impõe que se possa calcular precisa e previamente o «equivalente‑subvenção bruto» de um auxílio, evocado pela Comissão no seu correio eletrónico de 18 de agosto de 2017, a recorrente contesta que seja aplicável ao pagamento controvertido.

181    Em todo o caso, a recorrente contesta que lhe incumba demonstrar que os requisitos do Regulamento de minimis de 2006 estão preenchidos no caso em apreço. O referido regulamento prevê que o ónus da prova recai sobre os beneficiários de auxílios face às autoridades nacionais, mas não prevê esse ónus face à Comissão.

182    A Comissão conclui pedindo que a segunda parte seja julgada inoperante, uma vez que, mesmo admitindo que o pagamento controvertido possa ter um caráter de minimis, tal constatação cabe às autoridades italianas. Em todo o caso, esta segunda parte é improcedente, visto que a recorrente não demonstrou que todos os requisitos do Regulamento de minimis de 2006 estavam preenchidos no caso em apreço.

183    A este respeito, basta observar que os argumentos apresentados em apoio da segunda parte do terceiro fundamento são inoperantes. Com efeito, como resulta da apreciação da primeira parte do terceiro fundamento, não cabia à Comissão apreciar o eventual caráter de minimis do pagamento controvertido. Neste contexto, tais argumentos, que, além disso, são essencialmente dirigidos contra a posição formulada pela Comissão no âmbito de trocas de correios eletrónicos posteriores à adoção da decisão impugnada, não são suscetíveis de pôr em causa a legalidade dessa decisão.

184    Quanto ao restante, a recorrente alegou, na audiência, que o pagamento controvertido, que foi efetuado em 19 de abril de 2013, não foi financiado por fundos provenientes da Região autónoma, uma vez que, conforme resulta do considerando 89, alínea b), da decisão impugnada, as contribuições anuais para a SOGAER e a GEASAR relativas ao ano de 2013 tinham sido efetivamente aprovadas pela referida Região, mas acabaram por nunca lhes serem pagas.

185    A este respeito resulta do quadro 15, que figura no considerando 427 da decisão impugnada, bem como de quadros que resumem as ações empreendidas pela SOGAER no período compreendido entre 2010 e 2013, evocados no considerando 113 da decisão impugnada e apresentados pela Comissão em resposta a uma questão escrita do Tribunal Geral, que deve considerar‑se que o contrato controvertido se insere no ano de 2012. Por conseguinte, o pagamento controvertido, efetuado na primavera de 2013, estava abrangido pela contribuição regional para o ano de 2012, que foi paga à SOGAER. Em todo o caso, na medida em que a recorrente pretende contestar esta conclusão, tal questão está abrangida pela apreciação, por parte das autoridades italianas, da sua situação individual.

186    Tendo em consideração o exposto, há que julgar improcedente o terceiro fundamento e, por conseguinte, o recurso na íntegra.

 Quanto às despesas

187    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, em conformidade com o pedido da Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção alargada)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A Germanwings GmbH é condenada nas despesas.

Papasavvas

Svenningsen

Valančius

Csehi

 

      Nihoul

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 13 de maio de 2020.

Assinaturas


Índice


Antecedentes do litígio

Quanto às medidas controvertidas

Quanto às disposições adotadas pela Região autónoma

– Quanto ao artigo 3.o da Lei n.o 10/2010

– Quanto aos atos de execução da Lei n.o 10/2010

Quanto ao contrato controvertido

Quanto à decisão impugnada

Quanto aos desenvolvimentos posteriores à decisão impugnada

Tramitação do processo e pedidos das partes

Questão de direito

Quanto ao primeiro fundamento, relativo a violação do artigo 107. o, n.o 1, TFUE, na medida em que a Comissão não demonstrou a existência de um auxílio, por não ter examinado se a SOGAER tinha agido como um operador privado em economia de mercado

Quanto à primeira parte do primeiro fundamento, relativa ao nível pertinente para apreciar a existência de um auxílio estatal

– Quanto à admissibilidade da primeira parte do primeiro fundamento

– Quanto ao mérito da primeira parte do primeiro fundamento

Quanto à segunda parte do primeiro fundamento, relativa à aplicação do princípio do operador privado ao nível da SOGAER

– Quanto à admissibilidade do argumento relativo aos custos de financiamento

– Quanto ao mérito da segunda parte do primeiro fundamento

Quanto ao segundo fundamento, relativo a uma violação do artigo 107. o, n.o 1, TFUE, na medida em que a Comissão não demonstrou que o auxílio de que a recorrente beneficiou falseava ou ameaçava falsear a concorrência e afetava as trocas comerciais entre os EstadosMembros

Quanto à primeira parte, relativa à apreciação do pagamento controvertido em vez do regime de auxílios controvertido

Quanto à segunda parte do segundo fundamento, relativa à insuficiência de fundamentação quanto ao impacto do regime de auxílios controvertido sobre a concorrência e sobre as trocas comerciais entre os Estados Membros

Quanto ao terceiro fundamento, relativo a um erro pelo facto de a Comissão não ter apreciado se o pagamento controvertido constituía um auxílio de minimis

Quanto à primeira parte do terceiro fundamento, relativa à apreciação oficiosa do caráter de minimis do pagamento controvertido

Quanto à segunda parte do terceiro fundamento, relativa à aplicação dos regulamentos de minimis

Quanto às despesas


*      Língua do processo: alemão.