Language of document : ECLI:EU:T:2003:327

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

3 de Dezembro de 2003 (*)

«Marca comunitária – Regulamento (CE) n.° 40/94 – Motivos absolutos de recusa – Marca descritiva – Carácter distintivo adquirido pelo uso – Sinal nominativo TDI – Direito a ser ouvido – Âmbito do dever de fundamentação – Consequências da violação do dever de fundamentação»

No processo T‑16/02,

Audi AG, com sede em Ingolstadt (Alemanha), representada por L. von Zumbusch, advogado,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por A. von Mühlendahl e G. Schneider, na qualidade de agentes,

recorrido,

que tem por objecto um recurso interposto contra a decisão da Primeira Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) de 8 de Novembro de 2001 (processo R 652/2000‑1), rectificada pela decisão de 19 de Novembro de 2001, relativa ao registo do sinal nominativo TDI como marca comunitária,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Segunda Secção),

composto por: N. J. Forwood, presidente, J. Pirrung e A. W. H. Meij, juízes,

secretário: D. Christensen, administradora,

vista a petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 30 de Janeiro de 2002,

vista a contestação do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos), que deu entrada na Secretaria do Tribunal em 21 de Maio de 2002,

na sequência da audiência de 13 de Maio de 2003,

profere o presente

Acórdão

1       Em 7 de Março de 1996 a recorrente apresentou um pedido de marca comunitária nominativa ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (a seguir «Instituto»), ao abrigo do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), na versão alterada.

2       A marca cujo registo foi pedido é constituída pelo sinal nominativo TDI.

3       Os produtos e serviços para os quais foi pedido o registo da marca enquadram‑se nas classes 12 e 37, na acepção do acordo de Nice relativo à classificação internacional dos produtos e serviços aos quais se aplicam as marcas de fábrica ou de comércio, de 15 de Junho de 1957, revisto e alterado, e correspondem, para cada uma dessas classes, à seguinte descrição:

–       classe 12: «veículos automóveis e respectivas peças de construção»;

–       classe 37: «serviços de reparação e manutenção de veículos automóveis».

4       Por comunicação de 24 de Novembro de 1997, a examinadora indicou à recorrente que a marca requerida não era susceptível de ser registada por força do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

5       Por carta de 12 de Dezembro de 1997, a recorrente apresentou observações a este respeito e alegou, a título subsidiário, que a marca requerida adquirira um carácter distintivo na sequência do uso que dela fora feito. Além disso, pediu que fosse organizado um procedimento oral.

6       Na sequência de uma conversa telefónica que teve lugar em 16 de Dezembro de 1998 entre a examinadora e o representante da recorrente, este juntou nomeadamente, por carta de 22 de Janeiro de 1999, uma sondagem de opinião realizada na Alemanha, no mês de Agosto de 1996, tendo por base uma amostra representativa, bem como estatísticas sobre as exportações da recorrente, durante os anos de 1994 a 1997, para diferentes países, nomeadamente os demais Estados‑Membros para além da Alemanha, catálogos de venda e artigos de imprensa relativos a ensaios de automóveis.

7       Por decisão de 28 de Abril de 2000, a examinadora recusou o pedido ao abrigo do artigo 38.° do Regulamento n.° 40/94, com o fundamento de que o sinal nominativo TDI era desprovido de qualquer carácter distintivo, relativamente aos produtos e serviços em causa, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. Além disso, considerou que os elementos apresentados pela recorrente não eram suficientes para demonstrar que a marca pedida adquirira um carácter distintivo na sequência do uso que dela fora feito.

8       Em 16 de Junho de 2000, a recorrente interpôs recurso para o Instituto, ao abrigo do artigo 59.° do Regulamento n.° 40/94, contra a decisão da examinadora. Na alegação em que expôs os fundamentos do seu recurso, datada de 13 de Julho de 2000, a recorrente sustentou, em primeiro lugar, que a decisão da examinadora fora adoptada em violação do direito a ser ouvido. A este respeito, alegou nomeadamente que não tinha tido ocasião de apresentar observações sobre a apreciação da examinadora de que os elementos produzidos no decurso do processo não eram suficientes para demonstrar que a marca pedida tinha adquirido um carácter distintivo na sequência do uso que dela fora feito. Em segundo lugar, a recorrente afirmou que a decisão da examinadora estava inquinada por um erro de apreciação, uma vez que a marca pedida não era desprovida de carácter distintivo intrínseco. Em terceiro lugar e a título subsidiário, alegou que a marca pedida adquirira um carácter distintivo na sequência do uso que dela fora feito. A este respeito, considerou, nomeadamente, que a examinadora interpretou de modo erróneo os documentos que lhe foram apresentados no decurso do processo e que fundamentou insuficientemente a sua decisão. Aduziu ainda argumentos tendentes a demonstrar a razão pela qual os elementos contidos nesses documentos permitiam concluir que a marca pedida adquirira um carácter distintivo pelo uso.

9       Por decisão de 8 de Novembro de 2001 (a seguir «decisão impugnada»), notificada à recorrente em 21 de Novembro de 2001, a Primeira Câmara de Recurso negou provimento ao recurso, com o fundamento de que a marca pedida se englobava no âmbito do artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento n.° 40/94.

10     Em substância, a Câmara de Recurso considerou que, apesar de a decisão da examinadora se fundar no artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, decorria claramente dos fundamentos apresentados pela examinadora que ela se baseara também no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do mesmo regulamento (n.° 20 da decisão impugnada). A este respeito, a Câmara de Recurso declarou, em substância, que as letras «T», «D» e «I» significavam, respectivamente, «turbo», «diesel» ou «directo» e «injecção». Assim, a Câmara de Recurso considerou que, apesar das duas significações possíveis do sinal TDI, o consumidor médio o compreendia imediatamente e sem outra reflexão no sentido de «turbo directo injecção» ou «turbo diesel injecção» e que, portanto, a marca pedida era desprovida de carácter distintivo. Segundo a Câmara de Recurso, a utilização de siglas descritivas é corrente no sector automóvel. Neste contexto, a Câmara de Recurso considerou que as empresas desse sector tinham um interesse legítimo em poder servir‑se delas sem qualquer restrição (n.os 23 a 26 da decisão impugnada).

11     Quanto à questão de saber se a marca requerida adquiriu um carácter distintivo na sequência do uso que dela foi feito, a Câmara de Recurso exprimiu‑se, no essencial, nos seguintes termos:

«Os elementos de prova produzidos pela recorrente não eram suficientes para demonstrar que, na data do depósito, a marca tinha adquirido um carácter distintivo em todo o território da União Europeia na sequência do uso que dela foi feito. [Além disso,] à luz do carácter unitário da marca comunitária, a existência de um carácter distintivo na Alemanha não seria suficiente, tanto mais que o público alemão não é o único ao qual a combinação de letras ‘TDI’ é familiar. Também não seria possível inferir de um eventual carácter distintivo resultante do uso da marca na Alemanha que o sinal requerido possui tal carácter na totalidade do mercado europeu. [... O] exame da aquisição de um carácter distintivo resultante do uso que da marca foi feito deve ter em conta todos os elementos que permitam inferir que a marca se tornou capaz de servir de indicação quanto à origem [dos produtos ou dos serviços]. É assim que se tomarão em consideração elementos tais como a parte de mercado detida pela marca, a intensidade, o âmbito geográfico e a duração do uso dessa marca, a importância dos investimentos realizados pela empresa para a promover, a proporção dos meios interessados que identifica os produtos ou os serviços como provenientes de uma empresa determinada graças à marca, bem como as declarações das câmaras de comércio e indústria ou de outras associações profissionais. É também possível recorrer a sondagens de opinião. No que se refere às circunstâncias em que se pode considerar que as condições de implantação da marca nos meios interessados estão satisfeitas, não podem elas ser unicamente determinadas com base em dados gerais e abstractos, tais como percentagens determinadas. Esta constatação deve preferencialmente ser objecto de um exame caso a caso, que tenha em conta todas as provas produzidas. [...] Por consequência, nem o examinador nem as Câmaras de Recurso ou outra divisão do Instituto têm a possibilidade de informar com anterioridade um requerente de quais as provas que serão suficientes para demonstrar, num determinado caso concreto, que a marca conseguiu implantar‑se nos meios comerciais em causa.» (N.os 31 a 33 da decisão impugnada)

 Tramitação processual e pedidos das partes

12     A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–       anular a decisão impugnada;

–       condenar o Instituto nas despesas.

13     O Instituto conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–       negar provimento ao recurso;

–       condenar a recorrente nas despesas.

 Matéria de direito

14     A recorrente aduz cinco fundamentos de recurso. Os primeiros, segundo e terceiro fundamentos assentam, respectivamente, na violação do artigo 7.°, n.° 1, alíneas c) e b), do Regulamento n.° 40/94, e do artigo 7.°, n.° 3, do mesmo regulamento. O quarto fundamento assenta na violação do direito a ser ouvido, consagrado no artigo 73.° do Regulamento n.° 40/94. O quinto fundamento assenta na violação do dever de fundamentação.

 Quanto ao primeiro fundamento, assente na violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94

 Argumentos das partes

15     A recorrente contesta que as letras «T», «D» e «I» tenham significados definidos enquanto iniciais. Além disso, recorda que a decisão impugnada reconhece que estas letras podem corresponder, enquanto iniciais, a palavras muito diferentes e que mesmo o sinal TDI enquanto tal pode ter dois significados diferentes. Ora, segundo a recorrente, esta constatação é incompatível com a tese de que tal sinal é compreendido, pelo público pertinente, imediatamente e sem mais ampla reflexão.

16     Do mesmo modo, a recorrente recusa a tese do Instituto de que o público pertinente, que é constituído pelo consumidor médio, compreende imediatamente e sem mais ampla reflexão o sinal TDI no sentido de corresponder a «turbo directo injecção» ou «turbo diesel injecção». A este respeito, alega que os conceitos que estes termos abarcam são tecnicamente muito específicos. Além disso, afirma que «turbo diesel injecção» é tautológico, dado que qualquer motor diesel é um motor a injecção. Quando muito, o sinal TDI poderia constituir a sigla de «turbo directo injecção». A recorrente declara, no entanto, que não é deste modo que este sinal é utilizado e compreendido, dado que se trata de um motor diesel que, habitualmente, é designado por esta expressão e não pela de motor a injecção.

17     Segundo a recorrente, as eventuais associações que o público pertinente é levado a fazer com as diferentes letras de que a marca requerida se compõe são vagas na acepção do acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Abril de 2001, Bank für Arbeit und Wirtschaft/IHMI (EASYBANK) (T‑87/00, Colect., p. II‑1259, n.° 31). A este respeito, sustenta que resulta dos n.os 39 e 40 do acórdão do Tribunal de Justiça 20 de Setembro de 2001, Procter & Gamble/IHMI (C‑383/99 P, Colect., p. I‑6251) que o motivo absoluto de recusa referido no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 só poderia aplicar‑se se o sinal TDI, considerado no seu conjunto, fosse directamente descritivo. Ora, segundo a recorrente, não é esse o caso. Além disso, a recorrente alega que o Tribunal de Primeira Instância considerou, no seu acórdão de 31 de Janeiro de 2001, Wrigley/IHMI (DOUBLEMINT) (T‑193/99, Colect., p. II‑417), que bastava que um dos componentes de um sinal constituído por duas palavras tivesse uma significação dupla para excluir, em regra, o carácter descritivo do sinal considerado no seu conjunto. Do mesmo modo, resulta deste acórdão, segundo a recorrente, que, quando um sinal é constituído por vários componentes, cada um dos quais tem também várias significações, as diferentes combinações acarretam uma multiplicidade de significados do sinal considerado no seu conjunto que exclui que este possa ser compreendido, pelo público, como uma indicação directamente descritiva.

18     Neste contexto, a recorrente sublinha que, uma vez que o sinal TDI não descreve os produtos e serviços em causa, também não existe o imperativo de disponibilizar esse sinal a favor dos concorrentes.

19     Finalmente, a recorrente invoca o facto de o sinal nominativo TDI ter sido registado, enquanto marca nacional, na Alemanha, nos países do Benelux, em França e na Itália, bem como enquanto marca internacional. Ora, segundo a recorrente, estes registos constituem um índice importante da ausência de carácter descritivo da marca requerida, dado que os organismos nacionais competentes em matéria de marcas têm, cada um na parte que lhes diz respeito, um conhecimento superior ao do Instituto dos hábitos terminológicos nos diferentes territórios e espaços linguísticos da Comunidade. Neste contexto, a recorrente refere‑se tanto ao acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 31 de Janeiro de 2001, Mitsubishi HiTec Paper Bielefeld/IHMI (Giroform) (T‑331/99, Colect., p. II‑433), como ao n.° 8.1.4. das directivas de exame do Instituto.

20     O Instituto recorda, reportando‑se ao n.° 28 do acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 20 de Março de 2002, DaimlerChrysler/IHMI (CARCARD) (T‑356/00, Colect., p. II‑1963), que, para efeitos da aplicação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, há que examinar, com base num dado significado do sinal nominativo em causa, se existe, do ponto de vista do público‑alvo, uma relação suficientemente directa e concreta entre o sinal e as categorias de produtos e de serviços para os quais o registo é pedido. Além disso, cita o n.° 30 desse mesmo acórdão, segundo o qual, para cair sob a alçada do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, basta que um sinal nominativo, pelo menos num dos seus significados potenciais, designe uma característica dos produtos ou serviços em causa.

21     O Instituto considera que combinações de letras, como por exemplo as siglas, que, em si mesmas, não constituem palavras inteligíveis, podem também ser descritivas, na condição de o público pertinente associar a combinação de letras ao conceito que ela representa. A este respeito, cita o exemplo da combinação de letras «SA» que representa, no espírito do público, o conceito de «sociedade anónima».

22     Segundo o Instituto, a Câmara de Recurso considerou correctamente que a maioria do público pertinente compreende a sigla TDI no sentido de «turbo diesel injecção» e que, portanto, esta reveste um carácter descritivo. O facto de, segundo a recorrente, esta sigla ser desprovida de sentido no plano técnico e de, portanto, o consumidor ter uma ideia falsa do conteúdo descritivo da sigla em causa em nada modifica esta constatação, dado que o carácter descritivo de um sinal deve ser apreciado do ponto de vista do público pertinente – no caso, os adquirentes actuais e potenciais de automóveis – e não do do fabricante. Do mesmo modo, o Instituto afirma que o facto de o sinal TDI caracterizar um tipo de motor e não a totalidade do veículo não tem incidência sobre a regularidade da decisão impugnada, uma vez que uma marca tem também um carácter descritivo quando descreve uma componente essencial do produto.

23     Quanto aos registos nacionais anteriores invocados pela recorrente, o Instituto recorda, reportando‑se ao n.° 41 do acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 7 de Fevereiro de 2002, Mag Instrument/IHMI (Forma de lanternas portáteis) (T‑88/00, Colect., p. II‑467), que estes não vinculam o Instituto, apenas podendo servir de indício. Assinala ainda que o registo da marca TDI foi objecto de crítica na Alemanha e é contestado pela doutrina.

 Apreciação do Tribunal

24     A título liminar, há que realçar que a Câmara de Recurso considerou correctamente que, se bem que a decisão da examinadora apenas refira expressamente o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, decorre claramente dos fundamentos dessa decisão que ela se baseou também no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do mesmo regulamento (n.° 20 da decisão impugnada). Deste modo, ao fundar a sua própria decisão nesta última disposição a Câmara de Recurso não adoptou oficiosamente um novo motivo absoluto de recusa, relativamente ao qual teria a obrigação de dar à recorrente oportunidade de se pronunciar previamente.

25     Nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, será recusado o registo «[d]e marcas compostas exclusivamente por sinais ou indicações que possam servir, no comércio, para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica ou a época de fabrico do produto ou da prestação do serviço, ou outras características destes». Além disso, o artigo 7.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94 declara que o «n.° 1 é aplicável mesmo que os motivos de recusa apenas existam numa parte da Comunidade».

26     O artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 impede que os sinais ou indicações nele referidos sejam reservados a uma única empresa com base no seu registo como marca. Esta disposição prossegue ainda um fim de interesse geral, que exige que esses sinais ou indicações possam ser livremente utilizados por todos (v., por analogia, acórdãos do Tribunal de Justiça de 4 de Maio de 1999, Windsurfing Chiemsee, C‑108/97 e C‑109/97, Colect., p. I‑2779, n.° 25; de 8 de Abril de 2003, Linde e o., C‑53/01 a C‑55/01, Colect., p. I‑0000, n.° 73; e de 6 de Maio de 2003, Libertel, C‑104/01, Colect., p. I‑0000, n.° 52).

27     Nesta perspectiva, os sinais e as indicações referidos no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 são apenas os que podem servir, numa utilização normal do ponto de vista do consumidor, para designar, seja directamente seja por referência a uma das suas características essenciais, o produto ou o serviço para o qual é pedido o registo (acórdão Procter & Gamble/IHMI, já referido, n.° 39). A apreciação do carácter descritivo de um sinal só pode, portanto, ser feita, por um lado, relativamente aos produtos ou serviços em causa e, por outro, relativamente à compreensão que o público pertinente dele tem.

28     No caso vertente, a Câmara de Recurso considerou, no n.° 26 da decisão impugnada, que os produtos e serviços em causa são destinados ao consumidor médio, o que a recorrente não contestou. Ora, há que entender que os consumidores médios são avisados e estão normalmente informados e razoavelmente atentos [v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Junho de 1999, Lloyd Schuhfabrik Meyer, C‑342/97, Colect., p. I‑3819, n.° 26, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 7 de Junho de 2001, DKV/IHMI (EuroHealth), T‑359/99, Colect., p. II‑1645, n.° 27].

29     No que respeita ao argumento da recorrente de que os terceiros, e mais particularmente os seus concorrentes, não têm necessidade de utilizar o sinal nominativo em causa para designar os produtos e serviços referidos no pedido, há que realçar que a aplicação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 não depende da existência de um imperativo de disponibilidade concreto, actual ou sério (v., por analogia, acórdão Windsurfing Chiemsee, já referido, n.° 35). Além disso, o interesse geral subjacente ao artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 implica que todas as marcas exclusivamente constituídas por sinais ou indicações que possam servir para designar as características de um produto ou de um serviço, na acepção dessa disposição, devem estar à livre disposição de todos, não podendo ser objecto de registo (v., por analogia, o acórdão Linde e o., já referido, n.° 74). Deste modo, para a aplicação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 há apenas que examinar, com base num dado significado do sinal nominativo em causa, se existe, do ponto de vista do público pertinente, uma relação suficientemente directa e concreta entre o sinal e as características das categorias de produtos ou serviços para as quais o registo é requerido.

30     A título liminar, há que realçar que o sinal nominativo TDI é composto de três letras. Ora, como resulta dos documentos submetidos ao Tribunal pelo Instituto, as combinações de letras são comummente utilizadas, no sector automóvel, para indicar as características dos veículos, ou até, mais especificamente, as dos motores. Assim, este sinal não é inabitual na sua estrutura.

31     No que respeita ao significado do sinal nominativo TDI, resulta do n.° 26 da decisão impugnada, bem como dos esclarecimentos que o Instituto forneceu na sua contestação, que, para o Instituto, este sinal nominativo constitui a abreviatura de «turbo diesel injecção» ou então de «turbo directo injecção». A esse respeito, a recorrente alega erradamente que o sinal nominativo em causa não tem uma significação clara e determinada. Com efeito, tomando em consideração os produtos e serviços para os quais o registo é pedido e a compreensão desse sinal pelo público pertinente, os significados reconhecidos pela Câmara de Recurso revelam‑se exactos.

32     Esta análise não é infirmada pela alegação da recorrente de que nenhuma das letras «T», «D» e «I» tem um significado determinado, dado que cada uma delas pode evocar, enquanto inicial, palavras muito diversas. Com efeito, há que examinar o significado de um sinal nominativo enquanto tal, isto é, considerando‑o no seu conjunto. É esse também o caso quando um sinal nominativo, como o da marca requerida, é constituído por uma combinação de várias letras isoladas. Para efeitos da análise do significado de um tal sinal nominativo, a questão de saber se, consideradas isoladamente, as diferentes letras que o compõem têm também um significado claro e determinado é, portanto, desprovida de pertinência. O mesmo sucede quanto à questão de saber se outras combinações destas mesmas letras, com ou sem acrescento de outras letras, têm ou não um tal significado.

33     Seguidamente, a tese da recorrente de que «turbo diesel injecção» constitui uma tautologia não tem, mesmo supondo‑a correcta do ponto de vista técnico, qualquer pertinência. Com efeito, para efeito da apreciação do carácter descritivo de um sinal nominativo, há que ter em conta unicamente o ponto de vista do público pertinente, que não é susceptível, no caso vertente, de ter conhecimentos técnicos que lhe permitam compreender o carácter tautológico deste conceito. Além disso, o facto de um sinal nominativo ser tautológico não implica que não tenha uma significação clara e determinada. Além disso, a própria recorrente concede que o sinal TDI pode corresponder a «turbo directo injecção», alegando simultaneamente que não é desse modo que esse sinal é utilizado e compreendido, dado que se trata de um motor diesel que, habitualmente, é designado por essa expressão e não pela de motor de injecção. Este argumento apenas confirma, no entanto, a tese do Instituto de que, do ponto de vista do público pertinente, o sinal TDI pode corresponder a «turbo diesel injecção».

34     Quanto à natureza da relação existente entre o sinal nominativo TDI e os produtos e serviços referidos no pedido de marca, a decisão impugnada não contém precisões. No entanto, há que considerar que, no que respeita à primeira categoria de produtos referida no pedido de marca, consistente nos automóveis, este sinal nominativo designa a qualidade deles. Com efeito, o facto de ser dotado de um motor «turbo diesel injecção» ou «turbo directo injecção» constitui uma característica essencial de um veículo. Quanto à segunda categoria de produtos (partes da construção de automóveis), o sinal nominativo TDI designa o seu tipo.

35     No que respeita aos serviços de conservação e reparação referidos no pedido de marca, o sinal nominativo TDI designa a sua utilização. Quanto a este último aspecto, é certo que não pode excluir‑se que estas categorias de serviços incluam também serviços que não tenham qualquer relação com os automóveis dotados de um motor TDI e que, portanto, o sinal nominativo TDI não seja descritivo de todos os serviços englobáveis nestas categorias. Há no entanto que realçar que a recorrente pediu o registo do sinal nominativo em causa para cada uma delas no seu conjunto. Assim, deve confirmar‑se a apreciação da Câmara de Recurso, na medida em que se refere a estas categorias de serviços no seu conjunto (v., neste sentido, acórdão EuroHealth, já referido, n.° 33).

36     Neste contexto, contrariamente ao que pretende a recorrente, o facto de o sinal nominativo TDI poder ter dois significados diferentes não tem pertinência. Com efeito, no espírito do público pertinente, relativamente a cada um dos seus potenciais significados, este sinal nominativo designa uma característica dos produtos e dos serviços em causa que é susceptível de entrar em linha de conta aquando da escolha efectuada por esse público. Ora, essa conclusão não é infirmada na hipótese de uma ou outra parte do público pertinente ter presente apenas uma das duas significações possíveis do sinal nominativo TDI. A este respeito, importa recordar que, para cair sob a alçada do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, basta que um sinal nominativo, pelo menos num dos seus significados potenciais, designe, do ponto de vista do público pertinente, uma característica dos produtos ou serviços em causa (acórdão CARCARD, já referido, n.° 30; v., ainda, as conclusões do advogado‑geral F. G. Jacobs no processo IHMI/Wrigley, C‑191/01 P, Colect. 2003, p. I‑0000, n.os 42 a 47).

37     Existe portanto, do ponto vista do público pertinente, uma relação suficientemente directa e concreta entre o sinal nominativo TDI e as características dos produtos e serviços referidos no pedido de marca. Esta análise é confirmada pelo facto de, em determinadas publicações de natureza promocional, a própria recorrente utilizar esse sinal nominativo para descrever os diferentes modelos de veículos que comercializa. Assim, um anúncio publicitário reproduzido no anexo K 8 da petição e relativo ao modelo A 2 está assim redigido: «Un’ auto interamente in alluminio, da oggi anche in versione TDI» (um automóvel inteiramente em alumínio, agora também disponível em versão TDI). Do mesmo modo, noutro anúncio publicitário reproduzido no anexo K 8 da petição, o motor do modelo A 6 é apresentado como o «primeiro motor V 6 TDi».

38     A Câmara de Recurso indicou de modo implícito, no n.° 31 da decisão impugnada, que o sinal nominativo TDI é descritivo dos produtos e serviços em causa em toda a Comunidade. Esta análise é exacta. Com efeito, sendo os automóveis comercializados, em princípio, sob as mesmas denominações em todo o mercado interno, há que considerar que não existe diferença entre as diversas partes da Comunidade quanto à compreensão, pelo público pertinente, do significado de um sinal nominativo deste tipo – e em especial do sinal TDI – e da relação que existe entre ele e os produtos e serviços referidos no pedido de marca.

39     Daqui resulta que a Câmara de Recurso não cometeu qualquer erro de direito ao considerar que o sinal nominativo TDI podia servir para designar, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 e do ponto de vista do público pertinente, as características essenciais dos produtos e serviços referidos no pedido de marca.

40     Quanto aos registos do sinal nominativo TDI enquanto marca nacional em vários Estados‑Membros, invocados pela recorrente, há que recordar que o regime comunitário das marcas é um sistema autónomo que é constituído por um conjunto de regras e que prossegue objectivos que lhe são específicos, sendo a sua aplicação independente de qualquer sistema nacional [acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Dezembro de 2000, Messe München/IHMI (electrónica), T‑32/00, Colect., p. II‑3829, n.° 47, e de 5 de Dezembro de 2002, BioID/IHMI (BioID), T‑91/01, Colect., p. II‑5159, n.° 45]. Deste modo, o carácter registável de um sinal enquanto marca comunitária só deve ser apreciado com base na regulamentação comunitária pertinente. O Instituto e, sendo caso disso, o juiz comunitário não estão vinculados por uma decisão proferida ao nível de um Estado‑Membro ou de um país terceiro que admita o carácter registável desse mesmo sinal enquanto marca nacional. É esse o caso mesmo que tal decisão tenha sido tomada em aplicação de uma legislação nacional harmonizada por força da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1). Assim, os argumentos da recorrente assentes na existência dos supramencionados registos são inoperantes. Além disso, a recorrente não apresentou qualquer argumento substancial que pudesse ser extraído dessas decisões nacionais e invocado em apoio do fundamento aduzido.

41     Resulta do que precede que o fundamento assente na violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 deve ser rejeitado.

 Quanto ao terceiro fundamento, assente na violação do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94

 Argumentos das partes

42     A recorrente não aceita a tese, que se contém na decisão da examinadora, de que o facto de uma só empresa utilizar, ou utilizar muito mais frequentemente que outras, uma indicação descritiva determinada, com a consequência de grande parte do público pertinente lha atribuir, não é suficiente para lhe permitir registar essa indicação enquanto marca.

43     No que respeita à sondagem de opinião que apresentou à examinadora no decurso do processo, a recorrente afirma que dela resulta que, contrariamente à interpretação que lhe foi dada pela examinadora aquando da entrega do pedido de marca em 1996, 30% das pessoas interrogadas associavam o sinal TDI à sua empresa e, de um modo geral, 65% dessas pessoas conheciam esse sinal. A recorrente acrescenta que se trata de números elevados, que só são atingidos por um número muito restrito de marcas. Além disso, segundo a recorrente, estas taxas de implantação nos outros Estados‑Membros e, mais particularmente, em França e em Itália, eram e são comparáveis à taxa relativa à Alemanha, dado que as vendas e as despesas publicitárias o eram também.

44     Neste contexto, a recorrente alega que fez um uso considerável da marca pedida desde 1990. Assim, afirma ter vendido, até ao final do ano de 1996, 426 353 automóveis com esta marca em toda a Comunidade, o que corresponde a um volume de negócios de cerca de 10 600 milhões de euros. Os números relativos ao período decorrido até ao final do ano de 2001 elevam‑se, segundo a recorrente, a 1 611 337 automóveis, correspondendo a um volume de negócios de cerca de 45 000 milhões de euros. Além disso, a recorrente sustenta que as despesas publicitárias que efectua anualmente para a comercialização dos seus veículos com a marca requerida se elevam, na Alemanha, a várias dezenas de milhões de marcos alemães (DEM) e, noutros Estados‑Membros, como a França, o Reino Unido, a Itália e a Espanha, a vários milhões de marcos alemães. Finalmente, afirma deter, em toda a Comunidade, uma parte de mercado de 5% dos automóveis equipados com um motor diesel, o que equivale, segundo ela, à posição cimeira nesse segmento do mercado.

45     Além disso, a recorrente alega que, para avaliar a proporção do público pertinente capaz de compreender uma marca no sentido de indicar a origem comercial dos produtos ou serviços em causa (a seguir «grau de implantação da marca»), há ainda que ter em conta a utilização que dela é feita por outras empresas, quer ao abrigo de uma licença quer, no que respeita às empresas pertencentes ao mesmo grupo da requerente da marca, ao abrigo de uma simples autorização. No caso vertente, há pois lugar, segundo ela, a ter em conta a utilização da marca requerida pelas empresas do grupo Volkswagen, que são a Volkswagen, a Seat e a Skoda. A este respeito, a recorrente afirma que, em toda a Comunidade, estas empresas venderam, até ao final do ano de 1996, 475 266 automóveis e, até ao final do ano de 2000, 2 185 174 automóveis com a marca requerida. Além disso, segundo a recorrente, as despesas publicitárias efectuadas, na Alemanha, pelas empresas do grupo Volkswagen para a comercialização dos seus veículos com a marca requerida elevaram‑se, aproximadamente, a 4,4 milhões de DEM em 1995, 18,9 milhões de DEM em 1996, 2,9 milhões de DEM em 1997, 2,7 milhões de DEM em 1998, 29,2 milhões de DEM em 1999 e 28,4 milhões de DEM em 2000. Além disso, a recorrente afirma que estas empresas dispensaram, pelo menos desde 1995, vários milhões de marcos alemães por ano para fins publicitários em cada um dos grandes Estados‑Membros.

46     A título conservatório, a recorrente pede ao Tribunal que ordene, enquanto medida de instrução incidente sobre o facto de a marca TDI ter adquirido um carácter distintivo pelo uso que dela foi feito na Comunidade Europeia, a audição, com o estatuto de testemunha, de Klaus le Vrang, bem como a organização de uma sondagem de opinião.

47     O Instituto recorda que uma marca deve ter adquirido um carácter distintivo resultante do uso unicamente no território em que exista um motivo de recusa do registo. No que respeita ao grau de implantação da marca, o Instituto considera que, até hoje, a jurisprudência se limitou a definir critérios imprecisos. A este respeito, recorda que no n.° 52 do acórdão Windsurfing Chiemsee, já referido, o Tribunal de Justiça decidiu que as condições de registo da marca, referidas no artigo 3.°, n.° 3, da Primeira Directiva 89/104, estavam preenchidas quando os meios interessados, ou pelo menos uma fracção significativa deles, associavam à marca em causa uma determinada empresa, entendendo‑se que isto não podia ser estabelecido unicamente com base em dados gerais e abstractos, como determinadas percentagens. Neste contexto, o Instituto considera que, mesmo que isso não resulte claramente do acórdão Windsurfing Chiemsee, já referido, no caso de uma marca constituída por um só número ou uma só letra o grau de implantação reivindicado deve ser mais elevado do que no caso de indicações que apenas são descritivas de algumas particularidades dos produtos ou dos serviços.

48     No caso vertente, o Instituto sustenta que a recorrente demonstrou, pela sondagem de opinião que juntou aos autos, que o máximo de 22% das pessoas interrogadas associavam o sinal TDI a uma empresa determinada ou a várias empresas pertencentes a um mesmo grupo. O Instituto partilha a análise da examinadora e da Câmara de Recurso de que este número é demasiado pequeno para que dele seja possível retirar conclusões sobre a implantação da marca. Segundo o Instituto, foi também correctamente que a examinadora fez uma extrapolação para determinar a situação da recorrente nos outros Estados‑Membros e que daí concluiu que essas percentagens neles seriam provavelmente ainda mais baixas. Acrescenta que esta apreciação não é infirmada pelas despesas publicitárias ou pelos volumes de negócios invocados pela recorrente.

49     O mesmo se passa, segundo o Instituto, com os novos documentos juntos à petição com o fim de provar o grau de implantação da marca requerida, a admitir que a sua produção no Tribunal de Primeira Instância seja admissível. A este respeito, o Instituto afirma que os números que se contêm nesses documentos provam efectivamente uma forte actividade da recorrente nos domínios da publicidade e das vendas, sem no entanto demonstrarem que o grau de implantação da marca requerida era mais elevado no momento da entrega do pedido de marca do que na data em que a sondagem de opinião foi efectuada.

 Apreciação do Tribunal

50     Por força do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, os motivos absolutos de recusa constantes do artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) a d), do mesmo regulamento não se opõem no entanto ao registo de uma marca se esta, quanto aos produtos ou serviços para os quais o registo é pedido, tiver adquirido um carácter distintivo após o uso que dela foi feita. Com efeito, na hipótese referida pelo artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, o facto de o sinal que constitui a marca em questão ser efectivamente compreendido, pelo público pertinente, como uma indicação da origem comercial de um produto ou de um serviço é o resultado de um esforço económico do requerente da marca. Ora, esta circunstância justifica que sejam afastadas as considerações de interesse geral subjacentes ao n.° 1, alíneas b) a d), do mesmo artigo, que exigem que as marcas referidas por essas disposições possam ser livremente utilizadas por todos, a fim de se evitar criar uma vantagem concorrencial ilegítima a favor de um único operador económico (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 2 de Julho de 2002, SAT.1/IHMI (SAT.2) (T‑323/00, Colect., p. II‑2839, n.° 36).

51     Em primeiro lugar, resulta da jurisprudência relativa à interpretação do artigo 3.°, n.° 3, da Primeira Directiva 89/104, cujo conteúdo normativo é, em substância, idêntico ao do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, que a aquisição de um carácter distintivo pelo uso da marca exige que pelo menos uma fracção significativa do público pertinente identifique através da marca os produtos ou serviços em causa como provenientes de uma determinada empresa. Todavia, as circunstâncias em que se pode considerar preenchida a condição relacionada com a aquisição de um carácter distintivo pelo uso não podem ser estabelecidas unicamente com base em dados gerais e abstractos, tais como percentagens determinadas (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça, Windsurfing Chiemsee, já referido, n.° 52, e de 18 de Junho de 2002, Philips, C‑299/99, Colect., p. I‑5475, n.os 61 e 62).

52     Em segundo lugar, para provocar a aceitação do registo de uma marca ao abrigo do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, o carácter distintivo adquirido pelo uso dessa marca deve ser demonstrado na parte substancial da Comunidade onde a marca não o possuía à luz do artigo 7.°, n.° 1, alíneas b), c) e d), desse mesmo regulamento [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 30 de Março de 2000, Ford Motor/IHMI (OPTIONS), T‑91/99, Colect., p. II‑1925, n.° 27].

53     Em terceiro lugar, para apreciar, num determinado caso, a aquisição de um carácter distintivo pelo uso há que ter em consideração factores como, designadamente, a parte de mercado detida pela marca e a intensidade, a área geográfica e a duração do uso dessa marca, bem como a importância dos investimentos feitos pela empresa para a promover. A prova do carácter distintivo adquirido pode, designadamente, resultar das declarações das câmaras de comércio e de indústria ou de outras associações profissionais, bem como de sondagens de opinião (v., neste sentido, acórdãos Windsurfing Chiemsee, já referido, n.os 51 e 53, e Philips, já referido, n.° 60).

54     Em quarto lugar, a aquisição de um carácter distintivo pelo uso deve ter tido lugar anteriormente à apresentação do pedido [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Dezembro de 2002, eCopy/IHMI (ECOPY), T‑247/01, Colect., p. II‑5301, n.° 36].

55     É à luz destas considerações que há que examinar se, no caso vertente, a Câmara de Recurso cometeu um erro de direito ao considerar que a marca requerida não podia ser registada ao abrigo do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94.

56     Como foi realçado no n.° 38 supra, o motivo absoluto de recusa referido no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 existe, no que respeita à marca requerida, em toda a Comunidade. Assim, era em toda a Comunidade que esta marca devia ter adquirido um carácter distintivo pelo uso para poder ser registada ao abrigo do artigo 7.°, n.° 3, do mesmo regulamento.

57     No decurso do processo administrativo decorrido no Instituto, a recorrente alegou, de modo implícito, na sua carta de 22 de Janeiro de 1999 dirigida à examinadora, que a marca requerida tinha adquirido carácter distintivo pelo uso que dela tinha sido feito em toda a Comunidade. Reiterou esta posição na alegação em que expôs os fundamentos do seu recurso para o Instituto, datada de 13 de Julho de 2000.

58     No que diz respeito, para começar, aos mercados dos demais Estados‑Membros que não a Alemanha, a recorrente apenas produziu, no decurso do processo administrativo decorrido no Instituto, estatísticas sobre as suas exportações durante os anos de 1994 e 1997 para diversos países, nomeadamente para os outros Estados‑Membros para além da Alemanha, bem como catálogos de venda e artigos de imprensa relativos a ensaios de automóveis. Além disso, a sondagem de opinião produzida pela recorrente refere‑se apenas ao mercado alemão.

59     No n.° 31 da decisão impugnada, a Câmara de Recurso considerou implicitamente e sem fundamentar esta apreciação de modo circunstanciado que estes elementos eram insuficientes para demonstrar que, à data do depósito, a marca requerida tinha adquirido um carácter distintivo resultante do uso que dela fora feito nos outros Estados‑Membros para além da Alemanha.

60     A recorrente não trouxe, porém, ao processo qualquer elemento que permita concluir que esta apreciação não é exacta. Com efeito, os únicos valores relativos a vendas apresentados pela recorrente, os quais, aliás, de modo algum indicam a parte de mercado relativa à marca requerida, não permitem concluir que, nos demais Estados‑Membros para além da Alemanha, o público pertinente, ou pelo menos uma fracção significativa dele, compreende a marca requerida no sentido de indicar a origem comercial dos produtos e serviços em causa. O mesmo se passa com os catálogos de venda e com os artigos de imprensa.

61     Na sua petição, a recorrente invoca, no entanto, novos factos com o fim de comprovar a sua tese de que a marca requerida adquiriu garantidamente um carácter distintivo resultante do uso em toda a Comunidade. Mais em especial, invoca o número de veículos da marca requerida vendidos entre 1990 e 2001, o volume de negócios correspondente e as despesas publicitárias efectuadas anualmente para promover a venda dos seus automóveis sob essa marca. Finalmente, afirma deter, em toda a Comunidade, uma parte de mercado de 5% dos automóveis equipados com um motor diesel, o que, segundo ela, equivale à posição cimeira neste segmento do mercado. Além disso, pede ao Tribunal, a título conservatório, que ordene, enquanto medidas de instrução, a inquirição, como testemunha, de um dos seus empregados, Klaus le Vrang, e a organização de uma sondagem de opinião.

62     A este respeito, há que declarar que a invocação destes factos é inoperante.

63     Com efeito, há que começar por declarar que, por força de uma jurisprudência constante, a legalidade de um acto comunitário deve ser apreciada em função dos elementos de facto e de direito existentes na data em que o acto foi adoptado (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Outubro de 1999, Salomon/Comissão, T‑123/97, Colect., p. II‑2925, n.° 48, e de 14 de Maio de 2002, Graphischer Maschinenbau/Comissão, T‑126/99, Colect., p. II‑2427, n.° 33). Seguidamente, e por força do artigo 63.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94, a anulação ou a reforma de uma decisão da Câmara de Recurso só é possível se esta estiver ferida de ilegalidade substantiva ou formal. O recurso para o tribunal comunitário destina‑se assim apenas a controlar a legalidade da decisão da Câmara de Recurso e não a reabrir o processo. Deste modo, a legalidade de uma decisão da Câmara de Recurso não pode, em princípio, ser posta em causa pela invocação, no Tribunal de Primeira Instância, de factos que, se bem que anteriores à data de adopção dessa decisão, não foram no entanto invocados no decurso do procedimento administrativo no Instituto. Só poderia ser de outro modo se se demonstrasse que a Câmara de Recurso devia oficiosamente ter em conta esses factos no procedimento administrativo, antes de adoptar qualquer decisão no caso específico.

64     A este respeito, há que recordar que a Câmara de Recurso só é obrigada a ter em conta um facto susceptível de ser pertinente para a apreciação da aquisição de um carácter distintivo resultante do uso se o requerente da marca o invocou no decurso do processo administrativo decorrido no Instituto (acórdão ECOPY, já referido, n.° 47).

65     No caso vertente, os factos referidos no n.° 61 supra, não foram invocados no decurso do processo administrativo decorrido no Instituto. Assim, tais factos, mesmo que comprovados, não podem pôr em causa a legalidade da decisão impugnada. Há portanto que considerar, como indicado no n.° 62 supra, que a sua invocação é inoperante.

66     Além disso, pelas razões expostas no n.° 60 supra, tais factos também não permitem demonstrar que a marca requerida adquiriu um carácter distintivo resultante do uso que dela foi feito nos demais Estados‑Membros para além da Alemanha. No que respeita, mais particularmente, à alegação da recorrente de que detém, em toda a Comunidade, uma parte de mercado de 5% dos automóveis equipados com um motor diesel, há que realçar que este facto, mesmo que comprovado, também não permite concluir que, nos demais Estados‑Membros para além da Alemanha, o público pertinente, ou pelo menos uma fracção significativa dele, compreende a marca requerida no sentido de indicar a origem comercial dos produtos e serviços em causa. Além disso, no que respeita aos factos posteriores ao momento da entrega do pedido, feita em 7 de Março de 1996, são eles desprovidos de pertinência para a apreciação da aquisição de um carácter distintivo resultante do uso, por força da regra exposta no n.° 54 supra.

67     Pelas razões expostas nos n.os 62 a 65 supra, também não há que proceder às medidas de instrução solicitadas pela recorrente. Com efeito, o Instituto só está obrigado a ter em conta um elemento de prova destinado a demonstrar que a marca requerida adquiriu um carácter distintivo resultante do uso se o requerente da marca o tiver produzido durante o processo administrativo decorrido no Instituto (acórdão ECOPY, já referido, n.° 48).

68     A recorrente não comprovou, portanto, que a marca requerida tinha adquirido um carácter distintivo resultante do uso que dela foi feito nos demais Estados‑Membros para além da Alemanha. Ora, esta constatação é suficiente para rejeitar o fundamento assente na violação do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, sem que seja necessário examinar a questão de saber se a recorrente comprovou que a marca requerida tinha adquirido um carácter distintivo resultante do uso que dela foi feito na Alemanha.

 Quanto ao quarto fundamento, assente na violação do direito a ser ouvido

 Argumentos das partes

69     A recorrente alega que o Instituto violou, a seu respeito, o direito a ser ouvido consagrado no artigo 73.° do Regulamento n.° 40/94. Segundo ela, a examinadora convidara‑a, no decurso de uma conversa telefónica, a apresentar determinados documentos, deixando entender que a marca requerida seria registada, ao abrigo do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, após tais documentos serem produzidos. Ora, segundo a recorrente, o Instituto devia ter‑lhe indicado que considerava insuficientes os documentos apresentados, a fim de que ela pudesse produzir elementos de prova adicionais. Além disso, o Instituto deveria ter‑lhe indicado que exigia, como resulta do n.° 31 da decisão impugnada, a prova de que a marca requerida adquirira um carácter distintivo resultante do uso que dela fora feito no conjunto da Comunidade.

70     O Instituto responde que a alegada violação do direito a ser ouvido, invocada pela recorrente, diz respeito ao procedimento decorrido perante a examinadora e não ao processo decorrido perante a Câmara de Recurso. Neste contexto, sustenta que, em qualquer caso, a Câmara de Recurso não violou o direito a ser ouvido, dado que procedeu a um exame completo dos factos, fundamentos e argumentos apresentados pela recorrente.

 Apreciação do Tribunal

71     Nos termos do artigo 73.° do Regulamento n.° 40/94, as decisões do Instituto só podem basear‑se em motivos a respeito dos quais as partes tenham podido pronunciar‑se. Esta disposição incide tanto sobre os motivos de facto como sobre os fundamentos de direito, e ainda sobre os elementos de prova.

72     A título liminar, há que sublinhar que o argumento do Instituto de que a alegada violação do direito a ser ouvido, invocada pela recorrente, diz respeito ao procedimento decorrido perante a examinadora e não ao processo decorrido perante a Câmara de Recurso, é destituída de pertinência. Com efeito, na alegação em que expõe os fundamentos do seu recurso a recorrente sustenta que não tinha tido ocasião de apresentar observações sobre a apreciação da examinadora de que os elementos produzidos no decurso do procedimento perante ela decorrido não eram suficientes para demonstrar que a marca requerida adquirira um carácter distintivo na sequência do uso que dela fora feito. Deste modo, pelo presente fundamento a recorrente acusa, na verdade, a Câmara de Recurso de não ter anulado a decisão da examinadora, apesar do alegado vício de procedimento de que tal decisão estava inquinada.

73     A examinadora fundou a sua decisão no facto de apenas 22% das pessoas interrogadas associarem a marca requerida a uma empresa determinada. Ora, este facto resulta da sondagem de opinião que a própria recorrente apresentara. Foi no quadro da sua apreciação final desse facto à luz do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94 que a examinadora considerou que a condição relacionada com a aquisição de um carácter distintivo resultante do uso não tinha sido preenchida no caso vertente.

74     Nestas circunstâncias, a examinadora não estava obrigada a ouvir a recorrente a propósito da apreciação dos elementos de facto em que a sua decisão se fundamenta.

75     A este respeito, há que considerar que a apreciação dos factos faz parte do próprio acto decisório. Ora, o direito de ser ouvido é extensivo a todos os elementos de facto ou de direito que constituem o fundamento do acto decisório, mas não à posição final que a administração tem intenção de adoptar (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 21 de Janeiro de 1999, Neue Maxhütte Stahlwerke e Lech‑Stahlwerke/Comissão, T‑129/95, T‑2/96 e T‑97/96, Colect., p. II‑17, n.° 231).

76     Uma vez que a examinadora não estava, portanto, obrigada a ouvir a recorrente a propósito da apreciação dos elementos de facto em que fundou a sua decisão, esta não foi adoptada em violação do direito a ser ouvido.

77     Na sua petição, no entanto, a recorrente alega que a examinadora lhe indicou, no decurso de uma conversa telefónica, que a marca requerida seria registada, ao abrigo do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, se ela conseguisse apresentar determinados documentos relativos à aquisição de um carácter distintivo resultante do uso. Segundo o n.° 19 da decisão impugnada, contudo, a examinadora limitou‑se a indicar à recorrente os «documentos susceptíveis, a priori, de servir de prova [para demonstrar que a marca requerida estava implantada no público pertinente]» («welche Unterlagen [zur Glaubhaftmachung der Verkehrsdurchsetzung] grundsätzlich in Frage kommen können»). Ora, a recorrente não contestou estas constatações. Na audiência, concedeu, em resposta a uma pergunta do Tribunal, que a examinadora não declarara que os documentos em questão seriam a priori considerados suficientes para permitir o registo da marca requerida, de acordo com o artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94.

78     A este respeito, há que realçar, em primeiro lugar, que é lícito às instâncias do Instituto, pelo menos nos processos que impliquem uma única parte, recorrer a comunicações telefónicas, a fim de facilitar o bom decorrer do processo.

79     Em segundo lugar, no caso vertente, tendo em conta o conteúdo da comunicação oral, tal como actualmente admitido pelas partes, a examinadora não criou à recorrente esperanças fundadas, de modo que o princípio de protecção da confiança legítima não exigia que ela advertisse a recorrente da qualificação jurídica que ia fazer dos factos que resultam dos referidos documentos.

80     De qualquer modo, mesmo supondo que a decisão da examinadora tivesse sido adoptada em violação do direito a ser ouvido, a Câmara de Recurso nem por isso seria obrigada a anular a decisão da examinadora em razão desse único motivo, na ausência de qualquer ilegalidade quanto ao fundo da questão.

81     Com efeito, em virtude da continuidade funcional que existe entre o examinador e a Câmara de Recurso [acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Julho de 1999, Procter & Gamble/IHMI (BABY‑DRY), T‑163/98, Colect., p. II‑2383, n.os 38 a 44, e de 12 de Dezembro de 2002, Procter & Gamble/IHMI (forma de um sabão), T‑63/01, Colect., p. II‑5255, n.° 21], a competência das câmaras de recurso do Instituto implica um reexame das decisões tomadas pelas unidades do Instituto que se pronunciam em primeira instância. No quadro deste reexame, o resultado do recurso depende da questão de saber se uma nova decisão que tenha a mesma parte decisória que a decisão que foi objecto do recurso podia ou não ser legalmente adoptada no momento em que o recurso é decidido. Assim, mesmo que a decisão que é objecto do recurso não padeça de nenhuma ilegalidade, as Câmaras de Recurso podem, com a única reserva do artigo 74.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94, conceder provimento ao recurso, com base em novos factos invocados pela parte que o interpôs ou com base em novas provas por tal parte produzidas.

82     Por conseguinte, quando uma nova decisão com o mesmo dispositivo que a decisão que foi objecto do recurso pode ser adoptada no momento em que o recurso é decidido, a este deve, em princípio, ser negado provimento, mesmo que a decisão que é objecto do recurso esteja ferida de um vício processual. Isto é válido mesmo no caso de esse vício tornar incompleta a base jurídica ou factual da primeira decisão, pelo facto de a parte em causa ter sido impedida de invocar uma norma jurídica ou de carrear para o processo um elemento de facto ou de prova. Com efeito, esse vício pode ser regularizado durante o processo de recurso, dado que a Câmara de Recurso está obrigada, sob reserva da apresentação, durante o processo de recurso, de novos elementos de facto ou de prova, a fundar a sua decisão na mesma base jurídica e factual em que a unidade que se pronunciou em primeira instância deveria ter baseado a sua. Assim, com a única reserva do artigo 74.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94, não existe compartimentação entre o processo decorrido perante esta última unidade e o decorrido na Câmara de Recurso. A este respeito, o Instituto expõe com razão que, no presente processo, a Câmara de Recurso procedeu a um exame completo dos factos, fundamentos e argumentos apresentados pela recorrente.

83     No caso vertente verifica‑se, à luz das considerações feitas nos n.os 24 a 68 supra, que uma decisão com o mesmo dispositivo que a da examinadora, consistente no indeferimento do pedido de marca, podia ser adoptada no momento em que o recurso foi decidido. Deste modo, mesmo supondo que a decisão da examinadora tenha sido adoptada em violação do direito a ser ouvido, a Câmara de Recurso nem por isso teria a obrigação de a anular.

84     Resulta do que precede que há que rejeitar o fundamento assente na violação do direito a ser ouvido.

 Quanto ao quinto fundamento, assente na violação do dever de fundamentação

 Argumentos das partes

85     A recorrente afirma que a decisão impugnada não está suficientemente fundamentada, a despeito da exigência imposta pela regra 50, n.° 2, alínea h), do Regulamento (CE) n.° 2868/95 da Comissão, de 13 de Dezembro de 1995, relativo à execução do Regulamento n.° 40/94. A este respeito, alega, em primeiro lugar, que no n.° 30 da decisão impugnada a Câmara de Recurso se limitou, no que respeita à aplicação do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, a constatar que os elementos de prova produzidos pela recorrente eram insuficientes, sem explicar as razões subjacentes a esta conclusão. Em segundo lugar, a recorrente afirma que as considerações feitas nos n.os 25 e 26 da decisão impugnada, relativas à ausência de carácter distintivo intrínseco da marca requerida, apenas visam explicitamente a zona linguística germanofónica. Ora, segundo a recorrente, a decisão impugnada não contém suficiente fundamentação sobre a questão de saber qual a razão pela qual a prova da aquisição de um carácter distintivo resultante do uso foi exigida relativamente a todo o mercado comunitário.

86     O Instituto afirma que a Câmara de Recurso confirmou a apreciação da examinadora relativa à aplicação do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94. Assim, segundo o Instituto, a Câmara de Recurso fez sua a fundamentação contida na decisão da examinadora sobre este ponto. Ora, o Instituto sublinha que resulta dessa decisão que a examinadora considerou que a sondagem produzida pela recorrente revelava um grau de notoriedade demasiado fraco para permitir concluir que a marca requerida tinha adquirido um carácter distintivo em resultado do uso, mesmo apenas quanto ao mercado alemão.

 Apreciação do Tribunal

87     Por força do artigo 73.° do Regulamento n.° 40/94, as decisões do Instituto devem ser fundamentadas. Além disso, a regra 50, n.° 2, alínea h), do Regulamento n.° 2868/95 dispõe que a decisão da Câmara de Recurso deve incluir os fundamentos da decisão. A este respeito, há que considerar que o dever de fundamentação assim consagrado tem o mesmo alcance que o que decorre do artigo 253.° CE.

88     É de jurisprudência constante que a fundamentação exigida pelo artigo 253.° CE deve revelar de modo claro e inequívoco a razão de decidir do autor do acto. Esta obrigação tem o duplo objectivo de permitir, por um lado, aos interessados conhecerem as justificações da medida adoptada, para defenderem os seus direitos e, por outro, ao juiz comunitário exercer a sua fiscalização da legalidade da decisão (v., nomeadamente, acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Fevereiro de 1990, Delacre e o./Comissão, C‑350/88, Colect., p. I‑395, n.° 15, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Abril de 2000, Kuijer/Conselho, T‑188/98, Colect., p. II‑1959, n.° 36).

89     Além disso, resulta da jurisprudência que o contexto que envolve a tomada de decisão, que é, nomeadamente, caracterizado pelo intercâmbio entre o autor dela e a parte em causa, pode, em certas circunstâncias, aumentar as exigências de fundamentação (acórdão Kuijer/Conselho, já referido, n.os 44 e 45).

90     No caso vertente, a marca requerida só teria sido registável, ao abrigo do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, se tivesse adquirido um carácter distintivo em resultado do uso em toda a Comunidade (v. n.° 56 supra). A Câmara de Recurso estava portanto obrigada a expor – pelo menos no que respeita a uma parte substancial da Comunidade – as razões pelas quais os elementos de prova produzidos pela recorrente não permitiam concluir que a marca requerida aí tivesse adquirido um carácter distintivo em resultado do uso.

91     Não satisfazem estas exigências os fundamentos da decisão impugnada que expõem de modo geral que os elementos de prova produzidos pela recorrente não permitiam concluir que, à data da entrega do pedido, a marca tinha adquirido um carácter distintivo em todo o território da União Europeia na sequência do uso que dela fora feito (n.° 31, primeira frase, da decisão impugnada), nem os motivos pelos quais a Câmara de Recurso afirma que, à luz do carácter unitário da marca comunitária, a eventual existência de um carácter distintivo na Alemanha não seria suficiente (n.° 31, segunda frase, da decisão impugnada). O mesmo se passa com os fundamentos da decisão impugnada que reiteram os critérios da apreciação do carácter distintivo adquirido na sequência do uso, tal como desenvolvidos pela jurisprudência do Tribunal de Justiça (n.° 32 da decisão impugnada).

92     Contrariamente à fundamentação contida na decisão da examinadora, a adoptada pela Câmara de Recurso deixou – implicitamente – em aberto a questão de saber se a marca requerida tinha adquirido um carácter distintivo na sequência do uso que dela fora feito na Alemanha (n.° 31, segunda e terceira frases, da decisão impugnada). Relativamente à questão da eventual aquisição de um carácter distintivo resultante do uso que dela fora feito nos outros Estados‑Membros, a Câmara de Recurso limitou‑se a expor que não era possível inferir da eventual aquisição de um tal carácter distintivo na Alemanha que a marca requerida o possuía também em todo o mercado europeu (n.° 31, terceira frase, da decisão impugnada).

93     Contudo, na alegação que contém os fundamentos do seu recurso para o Instituto, a recorrente criticou, nomeadamente, o facto de a examinadora ter interpretado de modo errado os elementos de prova produzidos no decurso do processo perante ela decorrido. Além disso, afirmou que a tese da examinadora, segundo a qual o grau de implantação da marca pedida nos demais Estados‑Membros para além da Alemanha era provavelmente inferior ao grau de implantação que resultava da sondagem de opinião efectuada na Alemanha, não constituía uma fundamentação suficiente. Finalmente, apresentou argumentos destinados a mostrar que os elementos de prova produzidos no decurso do procedimento decorrido perante a examinadora permitiam concluir que a marca requerida tinha adquirido um carácter distintivo resultante do uso que dela fora feito nos demais Estados‑Membros para além da Alemanha.

94     Nestas condições e à luz do princípio exposto no n.° 89 supra, a Câmara de Recurso deveria ter respondido, pelo menos sumariamente, aos argumentos aduzidos pela recorrente contra os fundamentos adoptados na decisão da examinadora e, nomeadamente, devia ter exposto as razões pelas quais os elementos de prova produzidos no procedimento decorrido perante a examinadora não permitiam concluir que a marca requerida tinha adquirido um carácter distintivo em resultado do uso que dela fora feito nos demais Estados‑Membros para além da Alemanha.

95     Ao omitir fornecer estas explicações, a Câmara de Recurso não cumpriu os deveres de fundamentação que lhe incumbem por força do artigo 73.° do Regulamento n.° 40/94 e da regra 50, n.° 2, alínea h), do Regulamento n.° 2868/95.

96     Esta constatação não é, no entanto, suficiente para acarretar a anulação da decisão impugnada.

97     Com efeito, um recorrente não tem qualquer interesse legítimo na anulação por vício de forma dessa decisão, no caso de a anulação dessa decisão apenas poder dar lugar à adopção de uma nova decisão, idêntica, quanto ao fundo, à decisão anulada (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 6 de Julho de 1983, Geist/Comissão, 117/81, Recueil, p. 2191, n.° 7; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 18 de Dezembro de 1992, Díaz García/Parlamento, T‑43/90, Colect., p. II‑2619, n.° 54; e de 20 de Setembro de 2000, Orthmann/Comissão, T‑261/97, ColectFP, pp. I‑A‑181 e II‑829, n.os 33 e 35). Ora, no caso vertente, resulta do n.° 68 supra que não foi comprovado que a marca requerida tinha adquirido um carácter distintivo em resultado do uso, como previsto no artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94.

98     Assim, há que considerar que a recorrente não tem interesse legítimo na anulação da decisão impugnada, cuja única ilegalidade consiste num vício de fundamentação e cuja anulação apenas poderia, portanto, dar lugar à adopção de uma nova decisão idêntica quanto ao fundo.

99     O presente fundamento deve, portanto, ser rejeitado por inoperante.

100   Nestas condições, não há que examinar o fundamento assente na violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. Com efeito, segundo uma jurisprudência bem estabelecida, basta que um dos motivos absolutos de recusa se aplique para que um sinal não possa ser registado como marca comunitária [acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 31 de Janeiro de 2001, Sunrider/IHMI (VITALITE), T‑24/00, Colect., p. II‑449, n.° 28, e BioID, já referido, n.° 50].

101   Em consequência, há que negar provimento ao recurso.

 Quanto às despesas

102   Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida deve ser condenada nas despesas, se tiver sido requerido nesse sentido. Todavia, por força do artigo 87.°, n.° 3, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, o Tribunal de Primeira Instância pode determinar que, perante circunstâncias excepcionais, as despesas sejam repartidas.

103   No caso vertente, há que declarar que, por um lado, a recorrente ficou vencida e que, por outro, a decisão impugnada está inquinada por um vício de fundamentação. Assim, há que ordenar que a recorrente suporte três quartos das suas próprias despesas e três quartos das do Instituto e que o Instituto suporte um quarto das suas próprias despesas e um quarto das da recorrente.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A recorrente suportará três quartos das suas próprias despesas e três quartos das despesas efectuadas pelo Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos).

3)      O Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) suportará um quarto das suas próprias despesas e um quarto das despesas efectuadas pela recorrente.

Forwood

Pirrung

Meij

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 3 de Dezembro de 2003.

O secretário

 

      O presidente

H. Jung

 

      J. Pirrung


* Língua do processo: alemão.