Language of document : ECLI:EU:T:2022:28

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Nona Secção alargada)

26 de janeiro de 2022 (*)

«Contratos públicos de serviços — Processo de concurso — Serviços de vigilância aérea — Recurso de anulação — Inexistência de interesse em agir — Inadmissibilidade — Responsabilidade extracontratual»

No processo T‑849/19,

Leonardo SpA, com sede em Roma (Itália), representada por M. Esposito, F. Caccioppoli e G. Calamo, advogados,

recorrente,

contra

Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira (Frontex), representada por H. Caniard, C. Georgiadis, A. Gras e S. Drew, na qualidade de agentes, assistidos por M. Umbach, F. Biebuyck, V. Ost e M. Clarich, advogados,

recorrida,

que tem por objeto, por um lado, um pedido baseado no artigo 263.o TFUE e destinado à anulação do anúncio de concurso FRONTEX/OP/888/2019/JL/CG, de 18 de outubro de 2019, intitulado «Sistemas de Aeronave Telepilotadas (RPAS) para vigilância aérea marítima de média altitude e grande autonomia para fins marítimos», conforme retificado, dos atos a ele anexados, das perguntas‑respostas publicadas pela Frontex, da ata da reunião de informação organizada nas instalações da Frontex em 28 de outubro de 2019, da decisão de adjudicação desse contrato, bem como de qualquer outro ato prévio, conexo ou consecutivo, e, por outro, um pedido baseado no artigo 268.o TFUE e destinado a obter a reparação do prejuízo sofrido pela recorrente devido a esse facto,

O TRIBUNAL GERAL (Nona Secção alargada),

composto por: S. Papasavvas, presidente, M. J. Costeira, J. Schwarcz, M. Kancheva e T. Perišin (relatora), juízes,

secretário: J. Palacio González, administrador principal,

vistos os autos e após a audiência de 11 de junho de 2021,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio e factos posteriores à interposição do recurso

1        Em 18 de outubro de 2019, por anúncio de concurso publicado no suplemento do Jornal Oficial da União Europeia (JO 2019/S 0202‑ 490010), a Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira (Frontex) lançou o procedimento de concurso FRONTEX/OP/888/2019/JL/CG intitulado «Sistemas de Aeronave Telepilotadas (RPAS) para vigilância aérea marítima de média altitude e grande autonomia para fins marítimos» (a seguir «anúncio de concurso impugnado»), a fim de adquirir serviços de vigilância aérea do domínio marítimo através do sistema aeronave remotamente pilotada de média altitude e de grande autonomia europeu («MALE RPAS»). Este anúncio foi objeto de duas retificações, em 8 e 22 de novembro de 2019, que adiaram a data‑limite para a apresentação de propostas e a data de abertura das propostas.

2        O termo do prazo para apresentação das propostas foi fixado, em conformidade com as retificações do anúncio de concurso que tiveram lugar ao longo do processo, para 13 de dezembro de 2019, e a data de abertura das propostas, para 20 de dezembro de 2019. Três empresas apresentaram propostas.

3        A recorrente, a Leonardo SpA, sociedade ativa no setor aeroespacial, não participou no concurso lançado pelo anúncio de concurso impugnado.

4        Em 31 de maio de 2020, o comité de avaliação das propostas apresentou o seu relatório de avaliação ao gestor competente.

5        Em 12 de junho de 2020, o gestor competente aprovou o relatório de avaliação das propostas e assinou a decisão de adjudicação do contrato (a seguir «decisão de adjudicação impugnada»), bem como as cartas dirigidas aos três proponentes para os informar do estado do processo. Uma vez que não participou no processo, a recorrente não recebeu qualquer carta.

6        Por pedido de acesso aos documentos registado em 30 de junho de 2020, a recorrente pediu que lhe fosse facultada cópia de todos os documentos relativos ao procedimento de adjudicação do contrato em causa, nomeadamente da decisão de adjudicação impugnada, das atas do processo de concurso, dos documentos apresentados pelo proponente que obteve o contrato e de todos os outros documentos juntos aos autos do processo (a seguir «pedido de acesso»). Por carta de 10 de agosto de 2020, a Frontex recusou o acesso aos documentos pedidos.

 Tramitação processual e pedidos das partes

7        Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 16 de dezembro de 2019, a recorrente interpôs o presente recurso.

8        Por requerimento separado apresentado na Secretaria do Tribunal Geral no mesmo dia, a recorrente apresentou um pedido de medidas provisórias no qual pede, em substância, que o presidente do Tribunal Geral se digne suspender a execução do anúncio de concurso impugnado, conforme retificado, dos atos a ele anexados, das perguntas‑respostas publicadas pela Frontex (a seguir «perguntas‑respostas»), da ata da reunião de informação que se realizou em Varsóvia em 28 de outubro de 2019 (a seguir «reunião de informação»), bem como de qualquer outro ato prévio conexo ou consecutivo. O presidente do Tribunal Geral, por Despacho de 20 de abril de 2020, Leonardo/Frontex (T‑849/19 R, não publicado, EU:T:2020:154), indeferiu esse pedido e reservou para final a decisão quanto às despesas.

9        Em 18 de fevereiro de 2020, a Frontex apresentou a contestação.

10      Por requerimento separado, apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 11 de agosto de 2020, a recorrente apresentou um novo articulado em que pediu, em substância, que o Tribunal Geral se digne anular igualmente a decisão de adjudicação impugnada, bem como qualquer outro ato prévio, conexo ou consecutivo, e ordenar à Frontex que apresente os documentos solicitados no pedido de acesso aos documentos, em conformidade com o artigo 91.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral.

11      Por requerimento separado, apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 12 de agosto de 2020, a recorrente apresentou um pedido de medidas provisórias, no qual pediu, em substância, ao presidente do Tribunal Geral que se dignasse suspender a execução dos atos impugnados visados na petição e dos visados no articulado de 11 de agosto de 2020. Na mesma data, a recorrente apresentou um complemento ao pedido de medidas provisórias. O presidente do Tribunal Geral, por Despacho de 11 de novembro de 2020, Leonardo/Frontex (T‑849/19 RII, não publicado, EU:T:2020:539), indeferiu esse pedido e reservou para final a decisão quanto às despesas.

12      Por requerimento separado, apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 1 de setembro de 2020, a recorrente apresentou fundamentos novos, ao abrigo do artigo 84.o do Regulamento de Processo.

13      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 4 de outubro de 2020, a Frontex apresentou observações sobre os articulados de 11 de agosto e 1 de setembro de 2020.

14      Em 27 de janeiro de 2021, no âmbito de uma medida de organização do processo, o Tribunal Geral convidou as partes a responder por escrito a várias perguntas relativas à admissibilidade do recurso. As partes deram cumprimento a esta medida no prazo fixado.

15      Sob proposta da Nona Secção, o Tribunal Geral decidiu, em aplicação do artigo 28.o do Regulamento de Processo, remeter o processo a uma formação de julgamento alargada.

16      Por impedimento de um membro da Terceira Secção de participar na formação, o presidente do Tribunal Geral designou outro juiz para completar a Secção.

17      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às perguntas feitas pelo Tribunal na audiência de 11 de junho de 2021.

18      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

—        anular o anúncio de concurso impugnado, conforme retificado, os atos a ele anexados, as perguntas‑respostas, a ata da reunião de informação, bem como qualquer outro ato prévio, conexo ou consecutivo (a seguir, conjuntamente, «atos impugnados visados na petição»);

—        anular a decisão de adjudicação impugnada, bem como qualquer outro ato prévio, conexo ou consecutivo, referido no articulado de 11 de agosto de 2020;

—        condenar a Frontex na reparação de todos os danos, sofridos e futuros, diretos e indiretos, decorrentes, seja a que título for, do caráter ilegal do concurso em causa;

—        ordenar uma peritagem para demonstrar que as cláusulas contestadas do anúncio de concurso impugnado são desrazoáveis, inúteis e não conformes com a legislação aplicável na matéria, que essas cláusulas a impediram de formular uma proposta e que existiam razões adequadas em termos de custos e de viabilidade técnica para dividir o concurso em dois ou vários lotes;

—        ordenar à Frontex que apresente os documentos solicitados no pedido de acesso aos documentos relativo ao procedimento de adjudicação do contrato em causa;

—        condenar a Frontex nas despesas.

19      A Frontex conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

—        negar provimento ao recurso;

—        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

 Quanto aos pedidos de anulação

20      Importa começar por examinar a admissibilidade dos pedidos de anulação dos atos impugnados visados na petição e no articulado de 11 de agosto de 2020.

21      Nas suas respostas às perguntas escritas do Tribunal Geral, referidas no n.o 14, supra, a Frontex alega que o pedido de anulação dos atos impugnados visados na petição é inadmissível na medida em que não satisfaz as exigências visadas pelo artigo 263.o TFUE. Afirma que o anúncio de concurso impugnado não constitui um ato impugnável, que os atos impugnados visados na petição não dizem diretamente e individualmente respeito à recorrente e que esta não pode invocar nenhum interesse em agir.

22      A recorrente considera que o seu recurso preenche os requisitos de admissibilidade fixados pelo artigo 263.o TFUE.

23      A este propósito, em primeiro lugar, importa recordar que, segundo jurisprudência constante, um recurso de anulação interposto por uma pessoa singular ou coletiva só é admissível na medida em que esta última tenha interesse em que ato impugnado seja anulado. Tal interesse pressupõe que a anulação desse ato seja suscetível de ter, por si própria, consequências jurídicas e que o recurso possa, desse modo, em razão do seu resultado, proporcionar um benefício à parte que o interpôs (v. Acórdão de 20 de dezembro de 2017, Binca Seafoods/Comissão, C‑268/16 P, EU:C:2017:1001, n.o 44 e jurisprudência referida).

24      No caso em apreço, a recorrente sustenta que não participou no processo de concurso em causa, uma vez que as prescrições do caderno de encargos a impediram de apresentar uma proposta. A questão que se coloca é, portanto, a de saber se, nessas condições, a recorrente demonstra um interesse em agir na aceção do artigo 263.o TFUE contra o referido concurso.

25      A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou, em resposta a uma questão prejudicial que tem por objeto a interpretação do artigo 1.o, n.o 3, da Diretiva 89/665/CEE do Conselho, de 21 de dezembro de 1989, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos processos de recurso em matéria de adjudicação dos contratos de direito público de obras de fornecimentos (JO 1989, L 395, p. 33), conforme alterada pela Diretiva 2007/66/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2007 (JO 2007, L 335, p. 31), que a participação num processo de adjudicação de um contrato pode, em princípio, constituir validamente uma condição cuja satisfação é exigida para demonstrar que a pessoa em causa tem interesse em obter o contrato em causa ou corre o risco de sofrer um prejuízo devido ao caráter pretensamente ilegal da decisão de adjudicação do referido contrato (v. Acórdão de 28 de novembro de 2018, Amt Azienda Trasporti e Mobilità e o., C‑328/17, EU:C:2018:958, n.o 46 e jurisprudência referida).

26      Todavia, o Tribunal de Justiça declarou que, na hipótese de uma empresa não ter apresentado uma proposta em razão da presença de especificações pretensamente discriminatórias nos documentos relativos ao concurso ou no caderno de encargos, as quais teriam precisamente impedido de poder fornecer todos os serviços pedidos, seria excessivo exigir‑lhe que apresente, antes de poder utilizar os processos de recurso previstos pela Diretiva 89/665 contra tais especificações, uma proposta no âmbito do processo de adjudicação do contrato em causa, quando as suas possibilidades de lhe ser adjudicado esse contrato seriam nulas em razão da existência das referidas especificações (v. Acórdão de 28 de novembro de 2018, Amt Azienda Trasporti e Mobilità e o., C‑328/17, EU:C:2018:958, n.o 47 e jurisprudência referida).

27      Além disso, o Tribunal de Justiça precisou que, na medida em que só a título excecional um direito de recurso pode ser reconhecido a um operador que não apresentou uma proposta, não se pode considerar como excessivo exigir‑lhe que demonstre que as cláusulas do concurso tornam impossível a própria formulação de uma proposta (Acórdão de 28 de novembro de 2018, Amt Azienda Trasporti e Mobilità e o., C‑328/17, EU:C:2018:958, n.o 53).

28      Embora este acórdão tenha sido proferido na sequência de uma questão prejudicial relativa à interpretação de disposições da Diretiva 89/665, a qual vincula apenas os Estados‑Membros, a solução que dele emerge pode ser, mutatis mutandis, aplicada num caso como o vertente, no qual a recorrente afirma ter sido impedida de apresentar uma proposta em razão das especificações técnicas dos documentos do concurso lançado por uma agência da União Europeia, especificações técnicas que ela contesta.

29      Por conseguinte, há que determinar se a recorrente provou ter sido impedida de apresentar uma proposta e, portanto, se demonstra ter interesse em agir.

30      Para demonstrar que foi impedida de apresentar uma proposta, a recorrente alega que o anúncio de concurso impugnado, conforme retificado, os atos a ele anexados, as perguntas‑respostas e a ata da reunião de informação, visadas na petição, continham cláusulas discriminatórias que o impossibilitavam de fornecimento, por diligência própria, de todas as prestações pedidas.

31      A este respeito, como o Tribunal de Justiça já declarou, os princípios da igualdade de tratamento, da não discriminação e da transparência revestem importância crucial no que respeita às especificações técnicas, tendo em conta os riscos de discriminação associados quer à escolha destas quer à maneira de as formular [v., quanto à Diretiva 2004/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos de empreitada de obras públicas, dos contratos públicos de fornecimento e dos contratos públicos de serviços (JO 2004, L 134, p. 114), Acórdão de 10 de maio de 2012, Comissão/Países Baixos, C‑368/10, EU:C:2012:284, n.o 62].

32      Primeiramente, importa recordar que a fase de avaliação e de definição das necessidades, regra geral, é unilateral no âmbito da adjudicação de um contrato público comum. Com efeito, a entidade adjudicante limita‑se a lançar um concurso que mencione as especificações que ela própria fixou (Acórdão de 4 de junho de 2020, Remondis, C‑429/19, EU:C:2020:436, n.o 33).

33      Ora, no caso em apreço, o processo de concurso em causa foi precedido pelo processo de concurso FRONTEX/OP/800/2017/JL, lançado em 2017, que visava a realização de ensaios de dois tipos de sistemas RPAS. O objetivo prosseguido por este procedimento era, segundo os termos do anúncio de concurso, «permitir à Frontex continuar a sua análise e a sua avaliação dos RPAS capazes de proceder à vigilância de longa duração das fronteiras marítimas». Além disso, indicava‑se que «esta análise concentra[r‑se‑ia] nomeadamente na capacidade dessa plataforma para prestar serviços de vigilância de forma regular, fiável e rentável». Este contrato estava dividido em dois lotes, o primeiro dos quais tinha por objeto o ensaio de um MALE RPAS de dimensão padrão para a vigilância aérea de longa duração da fronteira marítima, para um máximo de 600 horas de voo nas zonas indicadas do Mediterrâneo entre o segundo e o quarto trimestre de 2018, e o segundo tinha por objeto o ensaio de um MALE RPAS de pequena dimensão para a vigilância aérea de longa duração da fronteira marítima, para um máximo de 300 horas de voo nas zonas indicadas do Mediterrâneo entre o segundo e o quarto trimestre. A este respeito, em 29 de dezembro de 2017, a recorrente obteve o contrato para o segundo lote.

34      Uma vez executados esses contratos, a Frontex efetuou avaliações detalhadas. A execução do primeiro lote foi objeto de uma avaliação positiva, o que levou a Frontex a recomendar a organização de um processo de adjudicação de contratos a fim de adquirir serviços de vigilância aérea através do MALE RPAS de dimensão padrão. Em contrapartida, a avaliação do segundo lote só era positiva em certa medida, o que levou a Frontex a considerar que eram necessárias avaliações adicionais a fim de confirmar a fiabilidade dos RPAS de pequena dimensão e a sua capacidade para voar para além da linha de visibilidade. Foi em seguida, com fundamento nesses relatórios de avaliação que a Frontex definiu as exigências contidas no anúncio de concurso impugnado, conforme retificado, nos atos a ele anexados, nas perguntas‑respostas e na ata da reunião de informação, visadas na petição, entre as quais figuram as que a recorrente considera discriminatórias. A definição destas exigências foi, portanto, formulada no termo de um processo por etapas, caracterizado por uma aquisição de experiência que permitiu à Frontex avaliar de forma detalhada e diligente a sua necessidade.

35      Seguidamente, embora a recorrente afirme que «as regras do concurso contêm cláusulas contra legem e injustificadas que expõem os concorrentes potenciais a pretensões irrealizáveis do ponto de vista técnico», há que constatar que três empresas apresentaram uma proposta e que duas delas, pelo menos, cumpriam todas as especificações técnicas, dado que o contrato lhes foi adjudicado.

36      Depois, a recorrente não demonstra que as especificações técnicas lhe tenham sido aplicadas de maneira diferente em relação aos outros candidatos nem, de um modo mais geral, que tenha sido objeto de um tratamento diferente quando se encontrava numa situação análoga à dos outros candidatos.

37      Por último, a recorrente afirma que a sua participação se tornou «impossível» ou que foi sujeita «a encargos económicos excessivos a ponto de comprometer a formulação de uma oferta concorrencial». Ora, esta afirmação não pode demonstrar uma discriminação a seu respeito. Pelo contrário, como acertadamente a Frontex refere, tal afirmação sugere que a impossibilidade de a recorrente apresentar uma proposta se devia mais a uma causa que lhe era própria do que a prescrições técnicas discriminatórias. A título exaustivo, importa salientar que, como aliás anunciou publicamente, a recorrente trabalha atualmente num modelo de RPAS que se aproxima da maior parte das exigências emitidas pela Frontex no concurso em causa.

38      Nestas condições, a recorrente não demonstrou que as exigências do concurso em causa podiam ser discriminatórias a seu respeito.

39      Por conseguinte, a recorrente não demonstrou ter sido impedida de apresentar uma proposta e, portanto, não justifica um interesse em pedir a anulação do anúncio de concurso impugnado, conforme retificado, dos atos a ele anexados, das perguntas‑respostas e das atas da reunião de informação, visadas na petição. Os pedidos de anulação destes atos devem, portanto, ser julgados inadmissíveis, assim como, em consequência, os dirigidos contra a decisão de adjudicação.

40      Em segundo lugar, importa recordar que a petição inicial deve indicar o objeto do litígio e conter uma exposição sumária dos fundamentos e que essa indicação deve ser suficientemente clara e precisa para permitir ao recorrido preparar a sua defesa e ao juiz da União exercer a sua fiscalização. Do mesmo modo, os pedidos da petição inicial devem ser formulados de modo inequívoco a fim de evitar que o juiz da União se pronuncie ultra petita ou não se pronuncie sobre uma acusação (v. Acórdão de 14 de setembro de 2017, Università del Salento/Comissão, T‑393/15, não publicado, EU:T:2017:604, n.o 75 e jurisprudência referida).

41      Daqui decorre que pedidos de anulação de atos prévios, conexos ou consecutivos aos outros atos visados pelo recurso de anulação, sem que esses atos prévios, conexos ou consecutivos tenham sido identificados, devem ser considerados não conformes com essas exigências por carecerem de precisão quanto ao seu objeto (v. Acórdão de 14 de setembro de 2017, Università del Salento/Comissão, T‑393/15, não publicado, EU:T:2017:604, n.o 76 e jurisprudência referida).

42      Daqui decorre que os pedidos de anulação dos atos impugnados visados na petição e no articulado de 11 de agosto de 2020 são inadmissíveis na medida em que visam qualquer ato prévio, conexo ou consecutivo aos outros atos neles referidos.

43      Tendo em conta o que precede, os pedidos de anulação dos atos impugnados devem ser julgados inadmissíveis, sem que seja necessário pronunciar‑se sobre as exigências relativas à existência de um ato impugnável e à legitimidade para agir da recorrente, e sem que seja necessário pronunciar‑se sobre o caráter útil das medidas de instrução solicitadas nem sobre a admissibilidade dos articulados de 11 de agosto e 1 de setembro de 2020.

 Quanto ao pedido de indemnização

44      A recorrente pede a reparação de todos os danos sofridos e futuros, diretos e indiretos, decorrentes, seja a que título for, do caráter ilegal do concurso em causa. Os danos invocados resultam da perda do contrato em causa e o montante do prejuízo corresponde, portanto, ao valor desse contrato.

45      A Frontex contesta estes argumentos.

46      Segundo jurisprudência constante, para que a Comunidade incorra em responsabilidade extracontratual, por força do artigo 340.o, segundo parágrafo, TFUE, pressupõe‑se que esteja reunido um conjunto de condições relativas ao caráter ilegal do comportamento imputado à instituição, à realidade do dano e a existência de um nexo de causalidade entre o comportamento e o prejuízo invocado. Além disso, recorde‑se que, quando uma das condições não está preenchida, a ação deve ser julgada integralmente improcedente, sem que seja necessário examinar as outras condições da referida responsabilidade (v. Acórdão de 14 de outubro de 1999, Atlanta/Comunidade Europeia, C‑104/97 P, EU:C:1999:498, n.o 65 e jurisprudência referida).

47      A este respeito, quanto à condição relativa à realidade do dano, a União só pode incorrer em responsabilidade se o recorrente tiver efetivamente sofrido um prejuízo «real e certo». Cabe ao recorrente apresentar elementos de prova ao juiz da União a fim de demonstrar a existência e o alcance desse prejuízo (v. Acórdão de 8 de novembro de 2011, Idromacchine e o./Comissão, T‑88/09, EU:T:2011:641, n.o 25 e jurisprudência referida).

48      No caso em apreço, há que constatar que a recorrente se limita a pedir a reparação de todos os danos sofridos e futuros resultantes do caráter ilegal do concurso em causa, sem apresentar elementos de prova para demonstrar a existência e o alcance desses danos.

49      A recorrente limita‑se a sustentar que o valor dos danos invocados resulta da perda do contrato em causa e que o montante do prejuízo corresponde, portanto, ao valor desse contrato.

50      Ora, quanto aos pretensos danos sofridos pela recorrente resultantes de uma perda de oportunidade de o contrato lhe ser adjudicado, há que recordar que a perda da oportunidade de lhe ser adjudicado um contrato só constitui um prejuízo real e certo se não houvesse qualquer dúvida de que, na falta de comportamento culposo da instituição, a recorrente teria obtido a adjudicação do referido contrato (v., neste sentido, Despacho de 22 de junho de 2011, Evropaïki Dynamiki/Comissão, T‑409/09, EU:T:2011:299, n.o 85 e jurisprudência referida). Não é o que sucede no caso vertente. Com efeito, mesmo admitindo que os documentos do concurso contivessem cláusulas ilegais, é pacífico que três empresas participaram no processo de concurso lançado pelo anúncio de concurso impugnado e que a recorrente não demonstrou que, na hipótese de os documentos impugnados não conterem as cláusulas pretensamente ilegais, sem dúvida alguma, o contrato lhe teria sido adjudicado, e não a uma das referidas três empresas.

51      Daqui resulta que a condição relativa à realidade do dano não está preenchida para que a União incorra em responsabilidade extracontratual por força do artigo 340.o, segundo parágrafo, TFUE.

52      Por outro lado, tendo em conta o caráter cumulativo das condições para que a União incorra em responsabilidade extracontratual por força do artigo 340.o, segundo parágrafo, TFUE, não há que examinar as restantes condições exigidas pela jurisprudência a este respeito.

53      Nestas condições, o pedido de indemnização deve ser julgado improcedente.

54      À luz das considerações que precedem, deve ser negado provimento na íntegra ao presente recurso.

 Quanto às despesas

55      Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, incluindo as efetuadas nos processos de medidas provisórias, em conformidade com os pedidos da Frontex.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Nona Secção alargada)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A Leonardo SpA suportará, além das suas próprias despesas, as efetuadas pela Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira (Frontex), incluindo as dos processos de medidas provisórias.

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 26 de janeiro de 2022.

Assinaturas


*      Língua do processo: italiano.