Language of document : ECLI:EU:T:2007:179

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

14 de Junho de 2007 (*)

«Marca comunitária – Pedido de registo da marca comunitária nominativa EUROPIG – Motivos absolutos de recusa – Carácter descritivo – Inexistência de carácter distintivo – Artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), e artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento (CE) n.° 40/94»

No processo T‑207/06,

Europig SA, com sede em Josselin (França), representada por D. Masson, advogado,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por A. Folliard‑Monguiral, na qualidade de agente,

recorrido,

que tem por objecto um recurso da decisão da Quarta Câmara de Recurso do IHMI de 31 de Maio de 2006 (processo R 1425/2005‑4), relativa a um pedido de registo da marca nominativa EUROPIG como marca comunitária,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quarta Secção),

composto por: H. Legal, presidente, V. Vadapalas e N. Wahl, juízes,

secretário: K. Pocheć, administradora,

vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 4 de Agosto de 2006,

vista a contestação entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 21 de Setembro de 2006,

após a audiência de 1 de Março de 2007,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Em 4 de Maio de 2004, a recorrente, anteriormente denominada Olympig SA, apresentou um pedido de registo de marca comunitária no Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), ao abrigo do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), na versão alterada.

2        A marca cujo registo foi pedido é o sinal nominativo EUROPIG.

3        Os produtos para os quais o registo da marca foi pedido pertencem às classes 29 e 30, na acepção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, conforme revisto e alterado, e correspondem, em relação a cada uma dessas classes, à seguinte descrição:

–        «Carne; aves (carne), (não vivas); caça; extractos de carne; pratos cozinhados em conserva à base de carne e/ou de legumes; Carne em conserva; salsichas; Enchidos; enchidos; salsicharia; presunto; toucinho; ‘rilletes’», pertencentes à classe 29;

–        «Pastéis de carne; pastéis (pastelaria)», pertencentes à classe 30.

4        Por decisão de 28 de Setembro de 2005, o examinador recusou, nos termos do artigo 38.° do Regulamento n.° 40/94, o pedido de registo de marca comunitária.

5        Em 25 de Novembro de 2005, a recorrente interpôs recurso da decisão do examinador, nos termos dos artigos 57.° a 62.° do Regulamento n.° 40/94.

6        Por decisão de 31 de Maio de 2006 (a seguir «decisão impugnada»), notificada à recorrente em 8 de Junho de 2006, a Quarta Câmara de Recurso negou provimento ao recurso pelo facto de o sinal EUROPIG ser descritivo dos produtos para os quais era pedido o registo e desprovido de carácter distintivo, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento n.° 40/94. Além disso, os documentos produzidos pela recorrente não permitiam concluir que a marca cujo registo foi pedido tivesse adquirido carácter distintivo pela utilização, na acepção do artigo 7.°, n.° 3, do mesmo regulamento.

 Pedidos das partes

7        A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        anular a decisão impugnada;

–        condenar o IHMI nas despesas.

8        O IHMI conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

9        Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca três fundamentos, relativos, respectivamente, à violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), e do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94

 Argumentos das partes

10      A recorrente sustenta que a marca cujo registo foi pedido, vista no seu todo e considerada em si mesma, não é de forma alguma descritiva dos produtos designados no pedido de registo.

11      Contesta, em primeiro lugar, a afirmação da Câmara de Recurso segundo a qual o termo «euro» remete para a proveniência geográfica ou para as normas de produção dos produtos visados pelo pedido de registo.

12      Com efeito, o elemento «euro» não pode, em caso algum, descrever uma proveniência geográfica, uma vez que a Europa não pode constituir, como tal, para os consumidores e ainda menos para os profissionais do sector, uma indicação de proveniência geográfica. A recorrente sublinha igualmente que, devido à menção «porc français» que figura nas embalagens dos produtos que ela comercializa, ninguém pode enganar‑se quanto ao significado do elemento «euro».

13      Esta abreviatura também não pode ser percebida pelo público anglófono como uma indicação segundo a qual a elaboração dos produtos em causa é conforme com as normas europeias em vigor. Não só uma norma de certificação não pode ser apreendida pelo direito das marcas como também a conformidade de um produto com tais normas é identificada pelos consumidores e, a fortiori, pelos profissionais do sector, pela menção «CE» ou «EC». Portanto, o elemento «euro» faz referência à moeda única europeia e constitui, no máximo, uma evocação da Europa em sentido amplo.

14      A recorrente sustenta, finalmente, que, se o raciocínio da Câmara de Recurso devesse ser seguido, tal conduziria a proibir a quem quer que fosse a utilização da menção «euro» como elemento constitutivo de uma a marca. Ora, o IHMI aceitou registar a marca Euro Ice Cream para produtos incluídos nas classes 30 e 35, bem como a marca euro‑tea para produtos incluídos nas classes 5 e 30. Na audiência, a recorrente indicou, além disso, que, em 23 de Janeiro de 2007, o IHMI aceitou registar sob o número 4 818 043 a marca figurativa Europig. Esse registo fora solicitado pela recorrente e visa produtos idênticos aos visados pela marca cujo registo foi pedido.

15      A recorrente alega, em segundo lugar, que a marca cujo registo é pedido não pode ser descritiva na medida em que a menção «euro» é associada ao termo «pig».

16      Com efeito, o público anglófono utiliza o termo «pork» para designar a carne de porco e não o termo «pig». Portanto, só pode considerar‑se como descritiva dos produtos em causa a denominação «european pork». A utilização do termo «pig» pode, quando muito, constituir um termo evocador, e em caso algum descritivo, dos produtos em causa. Isso é comprovado pelo facto de a marca EUROPIG ter sido registada sob o número 2 380 867, no Reino Unido, em 21 de Dezembro de 2004, para produtos e serviços idênticos aos visados pelo pedido de marca. Da mesma forma e por analogia, a marca EUROVEAU foi registada em 1988 em França, ainda que o termo «veau» seja imediatamente compreendido pelo consumidor francês. Na verdade, embora o IHMI não esteja vinculado pelas decisões tomadas pelos serviços nacionais, elas constituem indício sério de que a marca pedida é desprovida de carácter descritivo.

17      A recorrente conclui daí que a marca EUROPIG, vista no seu todo, não possui significado preciso, constante e imediato para o público anglófono e não pode, por consequência, ser considerada descritiva, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94. Essa marca é, pelo contrário, susceptível de diversas interpretações. Ora, resulta da jurisprudência que só pode ser recusado o registo, nos termos dessa disposição, dos sinais que permitem ao público detectar imediatamente e sem qualquer reflexão a descrição de uma das características dos produtos em causa [acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 31 de Janeiro de 2001, Wrigley/IHMI (DOUBLEMINT), T‑193/99, Colect., p. II‑417; de 7 de Junho de 2001, DKV/IHMI (EuroHealth), T‑359/99, Colect., p. II‑1645; e de 12 de Janeiro de 2005, Deutsche Post EURO EXPRESS/IHMI (EUROPREMIUM), T‑334/03, Colect., p. II‑65]. O Tribunal de Justiça também precisou que um eventual carácter descritivo deve ser reconhecido não só em relação a cada um dos termos que compõem a marca mas também em relação ao conjunto por eles formado (acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de Setembro de 2001, Procter & Gamble/IHMI, C‑383/99 P, Colect., p. I‑6251, n.° 40).

18      O IHMI considera que, tendo em conta a percepção dos elementos «euro» e «pig» pelo público em causa, isto é, o consumidor médio anglófono, foi com razão que a Câmara de Recurso concluiu que a marca pedida era descritiva dos produtos em causa.

19      Em primeiro lugar, quanto ao elemento «euro», o IHMI alega que designa, pelo menos num dos seus potenciais significados, uma característica pertinente dos produtos alimentares em causa, isto é, a sua origem geográfica. Por outro lado, esse elemento pode ser compreendido como uma referência à regulamentação aplicável à produção dos produtos provenientes da suinicultura na Comunidade Europeia.

20      Em segundo lugar, quanto ao elemento nominativo «pig», o IHMI considera que o facto de a palavra inglesa «pork» poder parecer mais adequada para designar os produtos alimentares é irrelevante, pois não exclui que o termo «pig» descreva, para o consumidor médio de língua inglesa, a matéria‑prima de que são provenientes esses produtos alimentares.

21      Finalmente, quanto à palavra composta «europig», o IHMI observa que o facto de ser um neologismo, como a própria Câmara de Recurso o reconheceu, não implica que corresponda a uma invenção lexical invulgar na sua estrutura.

22      Por isso, a marca cujo registo é pedido é uma simples combinação de dois elementos descritivos que não cria uma impressão suficientemente afastada da produzida pela simples reunião dos elementos que a compõem. Por outro lado, a recorrente não demonstrou que a palavra composta «europig» tenha entrado na linguagem corrente e adquirido significado próprio.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

23      Nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, será recusado o registo «de marcas compostas exclusivamente por sinais ou indicações que possam servir, no comércio, para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica ou a época de fabrico do produto ou da prestação do serviço, ou outras características destes». Além disso, o artigo 7.°, n.° 2, do mesmo regulamento estabelece que o «n.° 1 é aplicável mesmo que os motivos de recusa apenas existam numa parte da Comunidade».

24      Segundo jurisprudência constante, o artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 prossegue um objectivo de interesse geral, que exige que os sinais ou indicações descritivas das características dos produtos ou serviços em relação aos quais é pedido o registo possam ser livremente utilizados por todos [acórdão do Tribunal de Justiça de 23 de Outubro de 2003, IHMI/Wrigley, C‑191/01 P, Colect., p. I‑2447, n.° 31; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Fevereiro de 2002, Ellos/IHMI (ELLOS), T‑219/00, Colect., p. II‑753, n.° 27; de 27 de Novembro de 2003, Quick/IHMI (Quick), T‑348/02, Colect., p. II‑5071, n.° 27; e de 7 de Junho de 2005, Münchener Rückversicherungs‑Gesellschaft/IHMI (MunichFinancialServices), T‑316/03, Colect., p. II‑1951, n.° 25; v., também, por analogia, acórdãos do Tribunal de Justiça de 4 de Maio de 1999, Windsurfing Chiemsee, C‑108/97 e C‑109/97, Colect., p. I‑2779, n.° 25; de 12 de Fevereiro de 2004, Koninklijke KPN Nederland, C‑363/99, Colect., p. I‑1619, n.os 54 e 95; e Campina Melkunie, C‑265/00, Colect., p. I‑1699, n.° 35].

25      Além disso, são abrangidos pelo artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 os sinais incapazes de exercer a função essencial da marca, isto é, a de identificar a origem comercial do produto ou do serviço, a fim de permitir, assim, ao consumidor que adquire o produto ou o serviço que a marca designa, na altura de uma aquisição posterior, fazer a mesma escolha, se a experiência se afigurar positiva, ou de fazer outra escolha, se ela se afigurar negativa (acórdão ELLOS, já referido, n.° 28).

26      Com efeito, os sinais e as indicações a que se refere o artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 são os que podem servir, numa utilização normal do ponto de vista do público visado, para designar, seja directamente, seja pela menção de uma das suas características essenciais, o produto ou o serviço para o qual é pedido o registo (v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 22 de Junho de 2005, Metso Paper Automation/IHMI (PAPERLAB), T‑19/04, Colect., p. II‑2383, n.° 24 e jurisprudência referida].

27      Daqui resulta que, para que um sinal seja abrangido pela proibição prevista nessa disposição, é necessário que apresente com os produtos ou serviços em causa uma relação suficientemente directa e concreta de molde a permitir ao público em causa perceber imediatamente, e sem outra reflexão, uma descrição dos produtos e serviços em questão ou de uma das suas características (v. acórdão PAPERLAB, já referido, n.° 25 e jurisprudência referida).

28      Para que uma marca constituída por um neologismo ou por uma palavra resultante da combinação de elementos seja considerada descritiva, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, não basta que se apure um eventual carácter descritivo relativamente a cada um desses elementos. Tal carácter também deve ser apurado em relação ao neologismo ou à própria palavra (v. acórdão PAPERLAB, já referido, n.° 26 e jurisprudência referida).

29      Uma marca constituída por um neologismo ou por uma palavra composta por elementos, cada um dos quais é descritivo das características dos produtos ou serviços em relação aos quais o registo é pedido, é ela própria descritiva das características desses produtos ou serviços, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, salvo se existir uma diferença perceptível entre o neologismo ou a palavra e a simples adição dos elementos que o constituem. Isso pressupõe que, devido ao carácter invulgar da combinação em relação aos referidos produtos ou serviços, o neologismo ou a palavra crie uma impressão suficientemente afastada da que é produzida pela simples reunião das indicações dadas pelos elementos que o constituem, de modo a prevalecer sobre a soma dos referidos elementos. A este respeito, a análise do termo em causa tendo presentes as regras lexicais e gramaticais apropriadas é igualmente pertinente (v. acórdão PAPERLAB, já referido, n.° 27 e jurisprudência referida).

30      Importa igualmente recordar que a apreciação do carácter descritivo de um sinal só pode ser feita, por um lado, em relação à compreensão que dele tem o público em causa e, por outro, em relação aos produtos ou aos serviços em causa (v. acórdão MunichFinancialServices, já referido, n.° 26 e jurisprudência referida).

31      No caso em apreço, os produtos em relação aos quais foi pedido o registo são: «carne; aves (carne), (não vivas); caça; extractos de carne; pratos cozinhados em conserva à base de carne e/ou de legumes; Carne em conserva; salsichas; Enchidos; enchidos; salsicharia; presunto; toucinho; ‘rilletes’», pertencentes à classe 29, e «pastéis de carne; pastéis (pastelaria)», pertencentes à classe 30.

32      Quanto ao público em relação ao qual se deve apreciar o motivo absoluto de recusa em causa, é constituído, como referiu a Câmara de Recurso no ponto 10 da decisão impugnada, sem que a recorrente o tenha contestado, pelo consumidor médio anglófono. Com efeito, por um lado, os produtos visados pelo pedido de registo da marca, que são dirigidos tanto a profissionais do sector como a consumidores finais, são destinados ao consumo geral e, por outro, o sinal em causa é composto por termos provenientes da língua inglesa.

33      Portanto, há que examinar se existe, do ponto de vista desse público, uma relação suficientemente directa e concreta entre o sinal EUROPIG e os produtos para os quais é pedido o registo.

34      A esse propósito, há que reconhecer que, como referiu com razão a Câmara de Recurso, o sinal EUROPIG consiste na combinação da abreviatura «euro», que remete, num dos seus potenciais significados, para o adjectivo «europeu», e do termo «pig», que designa o porco. Esse sinal é assim composto exclusivamente de indicações que podem servir para designar certas características dos produtos em causa. Associado a estes últimos, esse sinal pode, com efeito, ser percebido pelo público em causa como a indicação de que se trata de produtos retirados de porcos e de proveniência europeia. Essa conclusão não é posta em causa pelo facto de, como alega a recorrente, os elementos «euro» ou «pig» poderem ter outros significados.

35      Além disso, o neologismo «europig» não tem uma estrutura invulgar, mas corrente tendo presentes as regras lexicais da língua inglesa. A marca cujo registo é pedido não cria, portanto, ao público visado, uma impressão suficientemente afastada da produzida pela simples justaposição dos elementos nominativos que a compõem de molde a modificar o seu sentido ou alcance.

36      Conclui‑se que, considerado no seu todo, o sinal EUROPIG tem uma relação suficientemente directa e concreta com os produtos visados pelo pedido de registo.

37      Nenhum dos argumentos invocados pela recorrente é de molde a pôr em causa esta conclusão.

38      Deve, em primeiro lugar, ser rejeitado o argumento relativo ao facto de a carne de porco ser designada, em inglês, pela palavra «pork» e não pelo termo «pig», uma vez que a espécie animal de que provém a carne de porco é realmente designada por este último vocábulo e de o artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 qualificar de descritivas as indicações relativas às características do produto, tal como a matéria‑prima de que este é proveniente.

39      Em seguida, é inoperante o argumento segundo o qual o termo «euro» não pode ser compreendido como uma origem geográfica dos produtos, devido à aposição nas embalagens da menção «porc français». Ao avançar esse argumento, a recorrente refere‑se às condições em que ela projecta comercializar os seus produtos. Ora, o carácter descritivo de um sinal, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, deve ser apreciado individualmente em relação a cada uma das categorias de produtos e/ou serviços visados no pedido de registo. Por conseguinte é desprovida de pertinência, para efeitos da apreciação do carácter descritivo de um sinal em relação a uma determinada categoria de produtos ou serviços, a questão de saber se o requerente da marca em causa projecta ou aplica um determinado conceito de comercialização [v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 20 de Março de 2002, DaimlerChrysler/IHMI (TELE AID), T‑355/00, Colect., p. II‑1939, n.° 42; DaimlerChrysler/IHMI (CARCARD), T‑356/00, Colect., p. II‑1963, n.° 46; e DaimlerChrysler/IHMI (TRUCKCARD), T‑358/00, Colect., p. II‑1993, n.° 47].

40      Em seguida, quanto ao argumento da recorrente segundo o qual o IHMI aceitara registar, por um lado, várias marcas que contêm o elemento nominativo «euro» e, por outro, a marca figurativa Europig, basta recordar que, segundo jurisprudência constante, as decisões que as Câmaras de Recurso são levadas a tomar, por força do Regulamento n.° 40/94, relativas ao registo de um sinal como marca comunitária, fazem parte do exercício de uma competência vinculada e não de um poder discricionário. Por isso, a legalidade das decisões das Câmaras de Recurso deve ser apreciada unicamente com base nesse regulamento, tal como interpretado pelo juiz comunitário, e não com base numa prática decisória dessas Câmaras [acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Setembro de 2005, BioID/IHMI, C‑37/03 P, Colect., p. I‑7975, n.° 47, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 9 de Outubro de 2002, Glaverbel/IHMI (Superfície de uma placa de vidro), T‑36/01, Colect., p. II‑3887, n.° 35].

41      De qualquer forma, é um facto que os registos referidos pela recorrente dizem respeito a marcas figurativas, circunstância que pode alterar a apreciação do carácter registável de um sinal. Com efeito, a existência de um elemento figurativo adicional é susceptível de alterar a percepção da marca vista no seu todo.

42      Finalmente, quanto ao argumento relativo ao registo, por um lado, da marca EUROPIG no Reino Unido e, por outro, da marca EUROVEAU em França, basta recordar que o regime das marcas é um sistema autónomo, constituído por um conjunto de regras e que prossegue objectivos que lhe são específicos, sendo a sua aplicação independente de qualquer sistema nacional [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Dezembro de 2000, Messe München/IHMI (electronica), T‑32/00, Colect., p. II‑3829, n.° 47]. Por consequência, o carácter registável de um sinal como marca comunitária deve ser apreciado apenas com fundamento na regulamentação pertinente. O IHMI e, sendo esse o caso, o juiz comunitário não estão vinculados, mesmo que possam tomá‑las em consideração, por decisões ocorridas ao nível dos Estados‑Membros, em particular por decisões que concluam pelo carácter registável do referido sinal, e isto mesmo na hipótese de essas decisões serem tomadas em aplicação de uma legislação nacional harmonizada por força da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1), ou ainda num país pertencente à zona linguística em que o sinal nominativo em causa encontra a sua origem [v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 16 de Março de 2006, Telefon & Buch/IHMI – Herold Business Data (WEISSE SEITEN), T‑322/03, Colect., p. II‑835, n.° 30 e jurisprudência referida].

43      Resulta de tudo o que precede que o primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, deve ser rejeitado.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94

44      Segundo a recorrente, a marca cujo registo é pedido tem carácter distintivo, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. Com efeito, não só a denominação «europig» não é usual no sector dos salgados de carne mas também nenhum concorrente da recorrente utiliza essa denominação para designar produtos idênticos ou semelhantes aos designados pelo pedido de registo da marca.

45      A esse respeito, o Tribunal lembra que, como resulta muito claramente do artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94, basta que um dos motivos absolutos de recusa enumerados se aplique para que o sinal não possa ser registado como marca comunitária (acórdão do Tribunal de Justiça de 19 de Setembro de 2002, DKV/IHMI, C‑104/00 P, Colect., p. I‑7561, n.° 29).

46      Por isso, no caso em apreço, não há que examinar o presente fundamento, dado que o primeiro foi rejeitado.

47      De resto, segundo jurisprudência constante, uma marca nominativa que seja descritiva das características de produtos ou serviços, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, é, por esse facto, necessariamente desprovida de carácter distintivo relativamente a esses mesmos produtos ou serviços, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do mesmo regulamento [v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Janeiro de 2005, Wieland‑Werke/IHMI (SnTEM, SnPUR, SnMIX), T‑367/02 a T‑369/02, Colect., p. II‑47, n.° 46 e jurisprudência referida].

48      Nestas circunstâncias, o segundo fundamento, relativo à violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, não pode, de qualquer forma, ser acolhido.

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94

 Argumentos das partes

49      A recorrente sustenta que, contrariamente ao que decidiu a Câmara de Recurso, a marca cujo registo é pedido adquiriu carácter distintivo devido à utilização que dela foi feita, em conformidade com o artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94.

50      Essa utilização é comprovada pelos documentos que apresentou no decurso do procedimento no IHMI. O facto de a marca mencionada nesses documentos ser, contrariamente à marca cujo registo é pedido, de natureza figurativa não é determinante, uma vez que a denominação «europig» é utilizada oralmente no comércio, o que lhe fez adquirir um carácter distintivo autónomo da sua representação gráfica.

51      O IHMI alega que uma marca só pode ser registada ao abrigo dessa disposição em certas condições. Com efeito, a aquisição por uma marca de um carácter distintivo pela utilização exige que uma fracção significativa do público possa identificar, graças a essa marca, os produtos provenientes de uma determinada empresa. Esse carácter distintivo deve, além disso, ser demonstrado na parte substancial da Comunidade em que a referida marca, nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) a d), do Regulamento n.° 40/94, era desprovida desse carácter distintivo.

52      Ora, os documentos produzidos pela recorrente não permitiram demonstrar que a marca cujo registo é pedido tivesse adquirido carácter distintivo pela utilização. Esses documentos, em primeiro lugar, não são datados ou são posteriores ao pedido de registo, em segundo lugar, dizem respeito a vendas de produtos em zonas geográficas em que o inglês não é a língua oficial e, em terceiro lugar, referem‑se unicamente a um sinal figurativo diferente da marca cujo registo é pedido ou a uma denominação social. De qualquer modo, esses documentos, que não permitem determinar a parte de mercado dos produtos vendidos sob essa marca, não provam que o público anglófono perceberá o sinal como um indicador de origem.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

53      Por força do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, os motivos absolutos de recusa de registo referidos no artigo 7.°, n.° 1, alíneas b), c) e d), do referido regulamento não se opõem ao registo de uma marca se, na sequência da utilização da marca, esta tiver adquirido um carácter distintivo para os produtos e serviços para os quais foi pedido o registo.

54      Deduz‑se dessa disposição que os sinais ou as marcas podem adquirir carácter distintivo pela utilização apesar de serem desprovidos de carácter distintivo intrínseco.

55      Resulta da jurisprudência relativa à interpretação do artigo 3.°, n.° 3, da Directiva 89/104, cujo conteúdo normativo é, no essencial, idêntico ao do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, que a aquisição de carácter distintivo após uso da marca exige que, pelo menos, uma fracção significativa do público pertinente identifique, graças à marca, os produtos ou serviços em causa como provenientes de uma determinada empresa. Todavia, as circunstâncias em que a condição da aquisição de carácter distintivo pela utilização pode ser considerada preenchida não poderão ser provadas somente com base em dados gerais e abstractos, como determinadas percentagens [v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça Windsurfing Chiemsee, já referido, n.° 52, e de 18 de Junho de 2002, Philips, C‑299/99, Colect., p. I‑5475, n.os 61 e 62; v., igualmente, quanto ao Regulamento n.° 40/94, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 29 de Abril de 2004, Eurocermex/IHMI (Forma de uma garrafa de cerveja), T‑399/02, Colect., p. II‑1391, n.° 42].

56      Segundo jurisprudência constante, para a apreciação da aquisição de carácter distintivo pela utilização, devem ter‑se em conta factores como, nomeadamente, a parte de mercado detida pela marca, a intensidade, a extensão geográfica e a duração da utilização dessa marca, a importância dos investimentos feitos pela empresa para a promover e a proporção dos meios interessados que identifica o produto como proveniente de uma determinada empresa, graças à marca. Meios de prova adequados para esse efeito são, nomeadamente, as declarações de câmaras de comércio e de indústria ou de outras associações profissionais (acórdão Forma de uma garrafa de cerveja, já referido, n.° 44; v., igualmente, neste sentido e por analogia, acórdãos Windsurfing Chiemsee, já referido, n.° 51, e Philips, já referido, n.° 60).

57      É em consideração destes factores que se deve examinar se, no caso em apreço, a Câmara de Recurso infringiu o artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94 ao considerar que a marca cujo registo é pedido não podia ser registada ao abrigo desta disposição.

58      A esse propósito, deve‑se reconhecer que todos os documentos apresentados pela recorrente, que consistem essencialmente em facturas e brochuras comerciais, são ou desprovidos de data ou posteriores à data do pedido de registo da marca EUROPIG, isto é, 4 de Maio de 2004. Além disso, esses documentos, que dizem respeito às vendas efectuadas em zonas não anglófonas, não permitem concluir que, pelo menos, uma fracção significativa do público pertinente identifica, graças à marca cujo registo é pedido, os produtos ou serviços em causa como provenientes de uma determinada empresa.

59      Por isso, foi com razão que a Câmara de Recurso concluiu que os documentos apresentados eram insuficientes para provar que a marca cujo registo é pedido tinha adquirido carácter distintivo.

60      Daqui resulta que o fundamento relativo à violação do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94 deve também ser rejeitado.

61      Por conseguinte, deve negar‑se provimento ao recurso na sua totalidade.

 Quanto às despesas

62      Por força do disposto no artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, em conformidade com os pedidos do IHMI.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A recorrente é condenada nas despesas.

Legal

Vadapalas

Wahl

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 14 de Junho de 2007.

O secretário

 

      O presidente

E. Coulon

 

      H. Legal


* Língua do processo: francês.