Language of document : ECLI:EU:T:1998:127

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção Alargada)

17 de Junho de 1998 (1)

«Acesso à informação — Decisão 93/731/CE do Conselho — Indeferimento de um pedido de acesso a documentos do Conselho — Recurso de anulação — Admissibilidade — Título VI do Tratado da União Europeia — Alcance da excepção relativa à protecção da segurança pública — Sigilo das deliberações do Conselho — Fundamentação — Publicação da contestação na Internet — Utilização abusiva do processo»

No processo T-174/95,

Svenska Journalistförbundet, associação de direito sueco, com sede em Estocolmo, representada por Onno W. Brouwer, advogado no foro de Amsterdão, e Frédéric P. Louis, advogado no foro de Bruxelas, assistidos por Deirdre Curtin, professora na Universidade de Utrecht, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório dos advogados Loesch e Wolter, 11, Rue Goethe,

recorrente,

apoiada por

Reino da Suécia, representado por Lotty Nordling, director-geral do Serviço Jurídico do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente,

Reino da Dinamarca, representado por Peter Biering, chefe de serviço no Ministério dos Negócios Estrangeiros, e Lauridis Mikaelsen, embaixador, na

qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada da Dinamarca, 4, boulevard Royal,

Reino dos Países Baixos, representado por Marc Fierstra e Johannes Steven van den Oosterkamp, consultores jurídicos, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada dos Países Baixos, 5, rue C.M. Spoo,

intervenientes,

contra

Conselho da União Europeia, representado por Giorgio Maganza e Diego Canga Fano, consultores jurídicos, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Alessandro Morbilli, director-geral da Direcção dos Assuntos Jurídicos do Banco Europeu de Investimento, 100, boulevard Konrad Adenauer,

recorrido,

apoiado por

República Francesa, representada por Catherine de Salins, subdirectora na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e Denys Wibaux, secretário dos Negócios Estrangeiros no mesmo ministério, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada de França, 8B, boulevard du Prince Henri,

Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, representado por John Collins, do Treasury Solicitor's Department, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada do Reino Unido, 14, boulevard Roosevelt,

intervenientes,

que tem por objecto um pedido de anulação da Decisão do Conselho, de 6 de Julho de 1995, que recusa à recorrente o acesso a determinados documentos relativos à Unidade Europeia de Polícia (Europol), solicitados no âmbito da Decisão 93/731/CE do Conselho, relativa ao acesso do público a documentos do Conselho (JO L 340 p. 43),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quarta Secção Alargada),

composto por: K. Lenaerts, presidente, P. Lindh, J. Azizi, J. D. Cooke e M. Jaeger, juízes,

secretário: H. Jung,

vistos os autos e após a audiência de 17 de Setembro de 1997,

profere o presente

Acórdão

Enquadramento jurídico

1.
    Na acta final do Tratado da União Europeia, assinado em Maastricht em 7 de Fevereiro de 1992, os Estados-Membros incorporaram, nos termos seguintes, uma declaração (n.° 17) relativa ao direito de acesso à informação:

«A Conferência considera que a transparência do processo decisório reforça o carácter democrático das instituições e a confiança do público na administração. Por conseguinte, a Conferência recomenda que a Comissão apresente ao Conselho, o mais tardar até 1993, um relatório sobre medidas destinadas a facilitar o acesso do público à informação de que dispõem as instituições.»

2.
    Em 8 de Junho de 1993, a Comissão publicou a comunicação 93/C 156/05, relativa ao acesso do público aos documentos das instituições (JO C 156, p. 5), apresentada em 5 de Maio de 1993 ao Conselho, ao Parlamento e ao Comité Económico e Social. Em 17 de Junho de 1993, publicou a comunicação 93/C 166/04, relativa à transparência na Comunidade (JO C 166, p. 4), apresentada em 2 de Junho de 1993 igualmente ao Conselho, ao Parlamento e ao Comité Económico e Social.

3.
    Em 6 de Dezembro de 1993, o Conselho e a Comissão aprovaram um código de conduta em matéria de acesso do público aos documentos do Conselho e da Comissão (JO 1993, L 340, p. 41, a seguir «código de conduta») e comprometeram-se, respectivamente, a tomar as medidas necessárias para dar execução aos princípios enunciados no código de conduta antes de 1 de Janeiro de 1994.

4.
    Para garantir a execução deste compromisso, o Conselho adoptou, em 20 de Dezembro de 1993, a Decisão 93/731/CE, relativa ao acesso do público aos documentos do Conselho (JO L 340, p. 43, a seguir «Decisão 93/731»), destinada

a dar aplicação aos princípios consagrados no código de conduta. Adoptou a decisão com base no artigo 151.°, n.° 3, do Tratado CE, nos termos do qual «o Conselho estabelece o seu regulamento interno».

5.
    O artigo 1.° da Decisão 93/731 prevê:

«1.    O público terá acesso aos documentos do Conselho nas condições previstas na presente decisão.

2.    Sob reserva do n.° 2 do artigo 2.°, entende-se por documento do Conselho qualquer documento escrito, que contenha dados e se encontre na posse desta instituição, seja qual for o suporte em que esteja registado».

6.
    O artigo 2.°, n.° 2, prevê que os pedidos relativos a documentos cujo autor não seja o Conselho devem ser dirigidos directamente ao seu autor.

7.
    O artigo 4.°, n.° 1, dispõe:

«O acesso a um documento do Conselho não poderá ser autorizado nos casos em que a sua divulgação possa prejudicar:

—    a protecção do interesse público (segurança pública, relações internacionais, estabilidade monetária, processos judiciais, inspecções e inquéritos),

—    a protecção do indivíduo e da vida privada,

—    a protecção do sigilo comercial e industrial,

—    a protecção dos interesses financeiros da Comunidade,

—    a protecção da confidencialidade solicitada por uma pessoa singular ou colectiva que tenha fornecido qualquer informação contida no documento ou exigida pela legislação do Estado-Membro que tenha fornecido qualquer dessas informações.»

8.
    O artigo 4.°, n.° 2, acrescenta que «o acesso a um documento do Conselho poderá igualmente ser recusado por motivo de protecção do sigilo das deliberações do Conselho».

9.
    Os artigos 2.°, n.os 1, 3, 5 e 6 descrevem, designadamente, o processo a seguir no que respeita à apresentação de pedidos de acesso a documentos e à resposta do Conselho a esses pedidos.

10.
    O artigo 7.° dispõe:

«1.    O requerente será informado por escrito, no prazo de um mês, pelos serviços competentes do Secretariado-Geral, do deferimento do seu pedido ou da intenção de o indeferir. Neste último caso, o interessado será igualmente informado dos motivos dessa intenção e de que dispõe do prazo de um mês para apresentar um pedido de confirmação tendente à revisão dessa posição, na falta do qual se considerará que desistiu do seu pedido inicial.

2.    A falta de resposta no prazo de um mês a contar da data de apresentação de um pedido significa que este foi indeferido, salvo nos casos em que o requerente apresente, no mês que se segue, o pedido de confirmação acima mencionado.

3.    O indeferimento de um pedido de confirmação, que deverá ser comunicado no mês que se segue à apresentação do pedido, será devidamente justificado e comunicado por escrito ao requerente no mais breve prazo, o qual será simultaneamente informado das disposições dos artigos 138.°E e 173.° do Tratado que institui a Comunidade Europeia, relativas, respectivamente, às condições de recurso das pessoas singulares ao provedor de Justiça e à fiscalização da legalidade dos actos do Conselho pelo Tribunal de Justiça.

4.    A falta de resposta a um pedido de confirmação no mês seguinte à sua apresentação significará que o pedido foi indeferido.»

Matéria de facto na origem do recurso

11.
    Após a adesão do Reino da Suécia à União Europeia em 1 de Janeiro de 1995, a recorrente decidiu examinar de que modo as autoridades suecas aplicavam o direito de acesso à informação dos cidadãos suecos no que respeita aos documentos relacionados com a actividade da União Europeia. Para tanto, contactou 46 autoridades suecas, entre as quais o Ministro da Justiça sueco e a Direcção nacional da polícia (Rikspolisstyrelsen). Requereu o acesso a um certo número de documentos do Conselho relativos à instituição da Unidade Europeia de Polícia (a seguir «Europol»), entre os quais 8 documentos na posse da Direcção nacional da polícia e 12 do Ministério da Justiça. Em resposta, foi concedido à recorrente o acesso a 18 dos 20 documentos solicitados. O acesso a dois documentos foi-lhe recusado pelo Ministério da Justiça pelo facto de estarem relacionados com a posição adoptada durante as negociações, respectivamente, pelos Governos neerlandês e alemão. Além disso, certas passagens dos documentos aos quais foi concedido acesso tinham sido eliminadas. Em relação a alguns documentos, era difícil saber se determinadas passagens tinham ou não sido eliminadas.

12.
    Em 2 de Maio de 1995, a recorrente requereu igualmente ao Conselho acesso aos mesmos 20 documentos acima referidos.

13.
    Por carta de 1 de Junho de 1995, o Secretariado-geral do Conselho acolheu favoravelmente o pedido de acesso em relação apenas a dois documentos, que

continham comunicações sobre as prioridades de uma futura presidência francesa do Conselho em matéria de asilo e de imigração e em matéria de justiça. Recusou o acesso aos outros 18 documentos, com o fundamento «de que os documentos 1 a 15 e 18 a 20 [estavam] sujeitos ao princípio da confidencialidade consagrado no artigo 4.°, n.° 1, da Decisão [93/731]».

14.
    Em 8 de Junho de 1995, a recorrente apresentou ao Conselho um pedido de confirmação requerendo a reapreciação da decisão que recusou o acesso.

15.
    O serviço competente do Secretariado-geral, em conjugação com o serviço jurídico do Conselho, preparou então uma nota para o grupo «informação» do Comité dos Representantes Permanentes (a seguir «Coreper») e do Conselho. Foi difundido um projecto de resposta acompanhado da correspondência trocada anteriormente entre a recorrente e o Secretariado-geral do Conselho, bem como uma nota de 15 de Maio de 1995 do Sr. Elsen, director-geral da Direcção-geral Justiça e Assuntos Internos (DG H) do Conselho, preparada por ocasião da análise do primeiro pedido (a seguir «nota do Sr. Elsen»). Esta nota dava uma breve indicação sobre o conteúdo dos documentos, bem como uma apreciação preliminar quanto à possibilidade de os divulgar. Foi comunicada à recorrente pela primeira vez no quadro do presente processo, em anexo à contestação do Conselho. Em 3 de Julho de 1995, o grupo «informação» decidiu divulgar 2 outros documentos mas recusar o acesso aos 16 restantes. Numa reunião realizada em 5 de Julho de 1995, o Coreper aprovou os termos do projecto de resposta proposto pelo referido grupo.

16.
    O Conselho sublinha que todos os documentos em causa estavam na posse dosmembros do Conselho e que cópias dos documentos tinham igualmente sido examinadas na reunião do grupo «informação» de 3 de Julho.

17.
    Após a reunião do Coreper, o Conselho respondeu ao pedido de confirmação por carta de 6 de Julho de 1995 (a seguir «decisão impugnada»), na qual o Conselho facultou o acesso a 2 documentos suplementares, mas indeferiu o pedido relativo aos 16 documentos restantes.

18.
    Deu a seguinte explicação:

«No entender do Conselho, o acesso a estes documentos não pode ser concedido, uma vez que a sua divulgação poderia pôr em causa o interesse público (segurança pública) e porque tais documentos dizem respeito a deliberações do Conselho, incluindo as opiniões defendidas por membros do Conselho, e estão abrangidos pela obrigação de confidencialidade.

Finalmente, gostaria de chamar a vossa atenção para o disposto nos artigos 138.°-E e 173.° do Tratado CE, que estabelecem, respectivamente, as condições para que uma pessoa singular possa apresentar uma queixa ao Provedor de Justiça ou um recurso para o Tribunal de Justiça contra actos do Conselho.»

Tramitação processual

19.
    Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 22 de Setembro de 1995, a recorrente interpôs o presente recurso.

20.
    Por requerimento apresentado em 9 de Fevereiro de 1996, o Parlamento Europeu pediu para intervir em apoio da posição da recorrente. Veio mais tarde a desistir da intervenção.

21.
    Por despacho do presidente da Quarta Secção do Tribunal de Primeira Instância de 23 de Abril de 1996, o Reino da Dinamarca, o Reino dos Países Baixos e o Reino da Suécia foram autorizados a intervir em apoio da posição da recorrente, ao passo que a República Francesa e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte foram autorizados a intervir em apoio da posição do recorrido.

22.
    Por carta recebida em 3 de Abril de 1996, o Conselho chamou a atenção do Tribunal para o facto de certos documentos pertinentes, em especial a contestação que apresentou no presente processo, terem sido divulgados na Internet. Em seu entender, o comportamento da recorrente constituía uma violação do andamento normal do processo. Pediu ao Tribunal para tomar as medidas adequadas a fim de evitar outras acções semelhantes da recorrente.

23.
    O Tribunal decidiu tratar esta questão como um incidente processual na acepção do artigo 114.°, n.° 1, do Regulamento de Processo e pediu às partes para apresentarem as suas observações sobre este incidente. Enquanto aguardava pelas respostas, suspendeu a instância. A recorrente, os Governos dinamarquês, francês, neerlandês, sueco e do Reino Unido apresentaram observações.

24.
    À luz destas observações, o Tribunal decidiu pôr termo à suspensão, sem prejuízo da sequência que contava dar a tal incidente (v., infra, n.os 135 a 139).

25.
    Por decisão de 4 de Junho de 1996, o Tribunal decidiu remeter o processo à Quarta Secção alargada. Indeferiu um pedido do Conselho de 20 de Junho de 1996 requerendo a remessa do processo à Sessão Plenária.

26.
    A fase escrita do processo terminou em 7 de Abril de 1997.

Pedidos das partes

27.
    A recorrente, apoiada pelo Reino da Dinamarca e pelo Reino da Suécia, conclui pedindo que o Tribunal se digne:

—    anular a decisão impugnada;

—    condenar o Conselho nas despesas.

28.
    O Reino da Suécia conclui pedindo que o Tribunal se digne anular a decisão impugnada.

29.
    O Conselho conclui pedindo que o Tribunal se digne:

—    julgar o recurso globalmente inadmissível;

—    a título subsidiário, julgá-lo inadmissível na medida em que respeita aos documentos já obtidos pela recorrente e que não contêm passagens eliminadas;

—    mais subsidiariamente, julgá-lo improcedente;

—    condenar a recorrente nas despesas.

30.
    A República Francesa conclui pedindo que o Tribunal se digne:

—    negar provimento ao recurso;

—    condenar a recorrente nas despesas.

31.
    O Reino Unido conclui pedindo que o Tribunal se digne julgar o recurso inadmissível e, subsidiariamente, improcedente.

Quanto à admissibilidade

32.
    O Conselho invoca diversos fundamentos de inadmissibilidade, baseados, respectivamente, na identidade da recorrente, no desrespeito do prazo de interposição do recurso, na falta de interesse em agir da recorrente e na incompetência do Tribunal de Primeira Instância. Estes fundamentos serão analisados sucessivamente.

Identidade da recorrente

33.
    A Svenska Journalistförbundet é uma união de jornalistas sueca. Detém e publica um jornal chamado Tidningen Journalisten. O cabeçalho da petição menciona «Svenska Journalistförbundets tidning» e «Tidningen Journalisten». A petição indica que a recorrente é o jornal da Svenska Journalistförbundet, mas a ligação entre as duas entidades não é claramente explicada. Ao longo da fase escrita do processo, Tidningen Journalisten foi portanto chamado a «recorrente».

Argumentos das partes

34.
    Em resposta a uma pergunta escrita do Tribunal, os representantes da recorrente indicaram, por fax de 4 de Agosto de 1997, que o recurso devia ser considerado interposto pela Svenska Journalistförbundet, na sua qualidade de proprietária do jornal, uma vez que era a única das duas entidades com capacidade judiciária em aplicação do direito sueco.

35.
    Na audiência, acrescentaram que qualquer distinção entre a Svenska Journalistförbundet e Tidningen Journalisten seria artificial. Tanto o pedido como o pedido de confirmação enviados ao Conselho foram apresentados em papel com cabeçalho da Svenska Journalistförbundet e do Tidningen Journalisten e o Conselho respondeu à Svenska Journalistförbundets tidningen. Consequentemente, a Svenska Journalistförbundet foi parte no processo desde o início.

36.
    O Governo neerlandês considera que seria fazer prova de excesso de formalismo considerar que um recurso interposto por uma divisão independente de uma pessoa colectiva não pode ser imputado a essa pessoa colectiva, uma vez que é hoje claro que foi conferido um mandato adequado para a interposição do recurso e que os interesses das partes no processo de modo nenhum são lesados.

37.
    Por carta de 9 de Setembro de 1997, o Conselho alega que o Tidningen Journalisten, que considerara recorrente no presente processo, não tinha, atendendo à resposta dos representantes da recorrente, capacidade judiciária para agir nos termos do direito sueco.

38.
    Alega, além disso, que, mesmo que a Svenska Journalistförbundet pudesse substituir o Tidningen Journalisten, não pode ser considerada destinatária da resposta do Conselho de 6 de Julho de 1995 e não é directa e individualmente afectada por esta decisão.

39.
    Em consequência, pede ao Tribunal que julgue o recurso inadmissível.

Apreciação do Tribunal

40.
    A primeira página da petição faz referência a Tidningen Journalisten e a «Svenska Journalistförbundets tidningen».

41.
    O mandato aos representantes da recorrente, conferido nos termos do artigo 44.°, n.° 5, alínea b), do Regulamento de Processo, foi assinado por Lennart Lund, chefe de redacção do jornal Tidningen Journalisten, em nome de Svenska Journalistförbundet. A este respeito, foi junta aos autos, em anexo ao fax de 4 de Agosto de 1997 (v., supra, n.° 34), uma certidão que confirma que a Svenska Journalistförbundet encarregou efectivamente Lennart Lund de interpor o presente recurso.

42.
    Nestas circunstâncias, o recurso foi, na realidade, interposto pela Svenska Journalistförbundet, na sua qualidade de proprietária do Tidningen Journalisten.

43.
    Sendo a Svenska Journalistförbundet uma pessoa colectiva à qual o direito sueco reconheceu capacidade judiciária, o Conselho não pode invocar a inadmissibilidade do recurso.

44.
    De resto, tendo enviado as suas duas respostas negativas de 1 de Junho e de 6 de Julho de 1995 a «Christoph Andersson, Svenska Journalistförbundets tidning», não pode invocar que a Svenska Journalistförbundet não era a destinatária da decisão impugnada.

Prazo de interposição do recurso

Argumentos das partes

45.
    O Conselho duvida que o recurso tenha sido interposto dentro do prazo. Alega que a recorrente recebeu a decisão impugnada em 10 de Julho de 1995. Dispunha, a partir dessa data, de um prazo de dois meses para interpor o recurso de anulação.

46.
    O Conselho sublinha que, na sua versão então aplicável, o artigo 1.° do Anexo II do Regulamento de Processo previa, para as partes que não residissem habitualmente no Grão-Ducado do Luxemburgo, que os prazos processuais fossem acrescidos:

—    no Reino da Bélgica: de dois dias,

—     na República Federal da Alemanha, no território europeu da República Francesa e no território europeu do Reino dos Países Baixos: de seis dias,

—     no território europeu do Reino da Dinamarca, no Reino de Espanha, na Irlanda, na República Helénica, na República Italiana, na República Portuguesa (à excepção dos Açores e da Madeira) e no Reino Unido: de dez dias,

—     nos outros países e territórios da Europa: de duas semanas.

47.
    O Conselho, apoiado pelo Governo francês, duvida que a regra aplicável aos outros países seja igualmente de aplicar aos Estados-Membros da União Europeia e considera que a recorrente deveria ter interposto o recurso respeitando uma dilação em razão da distância de dez dias, a fim de evitar qualquer discriminação entre os recorrentes dos países mais afastados do Luxemburgo do que a Suécia, que beneficiavam apenas de uma dilação de dez dias.

48.
    A recorrente invoca os termos do artigo 1.° do Anexo II, na sua versão acima referida, que considera que não corroboram a afirmação do Conselho. Não existe

nenhuma referência a «Estados-Membros» e «Estados não membros». Na falta de dilações específicas fixadas para a Suécia, esta beneficiava do prazo de duas semanas aplicável a todos os Estados europeus não especificamente citados. O argumento do Conselho quanto à discriminação não convence, uma vez que numerosas localidades da Bélgica estão mais afastadas do Luxemburgo do que certas localidades dos Países Baixos, embora todos os habitantes da Bélgica beneficiem de uma dilação de dois dias, ao passo que todos os habitantes dos Países Baixos beneficiam de uma dilação de seis dias. Só a interpretação da recorrente pode satisfazer as exigências da segurança jurídica.

49.
    Os Governos sueco e neerlandês apoiam esta interpretação. Na audiência, o agente do Governo sueco sublinhou que este beneficiava anteriormente de uma dilação de duas semanas.

Apreciação do Tribunal

50.
    Segundo jurisprudência assente, a regulamentação comunitária relativa aos prazos processuais deve ser rigorosamente respeitada por razões de segurança jurídica e em razão da necessidade de se evitar qualquer discriminação ou tratamento arbitrário na administração da justiça (despacho do Tribunal de Justiça de 5 de Fevereiro de 1992, França/Comissão, C-59/91, Colect., p. I-525, n.° 8).

51.
    Os termos do artigo 1.° do Anexo II do Regulamento de Processo, na sua versão aplicável no momento da interposição do recurso, não permitem considerar que a dilação em razão da distância aplicável à Suécia fosse de dez dias e não de duas semanas. Efectivamente, o prazo de dez dias aplicava-se apenas a certos países expressamente designados, entre os quais não figurava a Suécia. A dilação de duas semanas aplicava-se, portanto, aos países e territórios da Europa para os quais uma dilação mais curta não tivesse sido fixada, portanto, também para a Suécia.

52.
    Daqui resulta que o recurso foi interposto dentro do prazo

Interesse em agir da recorrente: interposição do recurso de anulação

Argumentos das partes

53.
    O Conselho duvida igualmente da admissibilidade do recurso na parte em que tem por objecto documentos que a recorrente já tinha recebido das autoridades suecas, pelo menos na medida em que não contêm passagens eliminadas. O Conselho não foi informado de que o objectivo do pedido da recorrente fosse inventariar as eventuais passagens eliminadas desses documentos. O interesse da recorrente tem uma natureza genérica e política, sendo sua intenção assegurar que o Conselho aplique correctamente o seu próprio código de conduta e a Decisão 93/731.

54.
    Nestas condições, embora o Conselho esteja consciente de que a recorrente é a destinatária da decisão impugnada, duvida que ela tenha realmente sido afectada por ela, na acepção do artigo 173.° do Tratado CE, que não autoriza acções individuais no interesse do público, permitindo unicamente aos indivíduos contestar actos que lhes dizem respeito de uma forma especial relativamente a outros.

55.
    No caso vertente, a recorrente não podia tirar quaisquer benefícios da obtenção de acesso a documentos que já estavam na sua posse. A insuficiência de interesse em obter esse resultado constitui um desvio de procedimento.

56.
    Apoiado pelo Governo francês, o Conselho alega igualmente que a comunicação dos documentos em questão pelas autoridades suecas à recorrente constitui uma infracção à legislação comunitária, uma vez que o Conselho não tinha anteriormente decidido nem mesmo sido convidado a decidir autorizar essa divulgação. É contrário ao sistema das vias de recurso previsto pela legislação comunitária colher benefícios de uma infracção ao direito comunitário para pedir em seguida ao Tribunal de Primeira Instância a anulação de uma decisão cujos efeitos foram contornados através dessa infracção. O facto de os documentos em questão terem caído no domínio público na sequência de um acto contrário ao direito comunitário deveria, portanto, obstar a que a recorrente pudesse interpor um recurso em tal processo.

57.
    A recorrente responde que o Conselho confunde, entre as regras em matéria de admissibilidade, as que se aplicam aos recursos de anulação de decisões, interpostos pelos seus destinatários, e as relativas aos recursos de anulação de regulamentos, interpostos por determinados particulares. Os destinatários de decisões têm que provar um interesse na interposição de um recurso, mas não são obrigados a provar que são individualmente afectados.

58.
    No caso vertente, a recorrente tem um interesse suficiente em agir e esse interesse não tem carácter político nem genérico. Sublinha que o Tidningen Journalisten publica artigos sobre assuntos específicos de interesse geral, bem como sobre o funcionamento das administrações públicas e sobre outras questões relativas ao modo como os jornalistas suecos podem exercer as suas actividades. Por esta razão, a recorrente considera ter um interesse directo em obter acesso aos documentos do Conselho e, em caso de recusa por motivos que demonstrem uma aplicação errada das regras pertinentes, em obter a anulação da decisão em questão, para assegurar que a instituição alterará a sua posição no futuro. O facto de ter recebido documentos de outra proveniência não significa, portanto, falta de interesse em agir por parte da recorrente.

59.
    Na medida em que o Conselho considera que os documentos obtidos junto das autoridades suecas sem a sua prévia autorização foram obtidos ilegalmente, a recorrente tinha um fundamento adicional para justificar que o seu recurso fosse julgado admissível, mesmo no que respeita aos documentos integralmente

comunicados pelas autoridades suecas. De contrário, a utilização que a recorrente poderia fazer desses documentos seria posta em causa.

60.
    A recorrente rejeita igualmente o argumento do Conselho segundo o qual o interesse insuficiente que tem no presente processo constitui uma utilização abusiva do processo. Explica que, no momento em que requereu acesso aos documentos do Conselho, apenas tinha pedido e recebido da direcção nacional da polícia 8 dos 20 documentos em causa. Os outros 12 documentos foram pedidos ao Ministério da Justiça sueco no próprio dia em que foi apresentado o pedido ao Conselho requerendo o acesso aos 20 documentos. Além disso, parecia-lhe que numa parte importante dos documentos recebidos algumas passagens tinham sido eliminadas. A recorrente não tinha portanto a garantia de ter recebido todos os documentos em versão integral. O próprio Conselho não indicou ao Tribunal quais os documentos que contêm passagens eliminadas, embora tenha sugerido ao Tribunal para julgar o recurso inadmissível na parte em que respeitava a documentos comunicados que não continham tais passagens. Assim, a recorrente não pode saber quais os documentos que não contêm nenhuma passagem eliminada.

61.
    O Governo sueco apoia os argumentos da recorrente sobre a admissibilidade. Não partilha o entendimento do Conselho quanto à ilegalidade da comunicação dos documentos na Suécia à luz do direito comunitário. Não existe uma regra comunitária implícita, assente numa tradição jurídica comum, segundo a qual só o autor de um documento tem competência para decidir a comunicação desse documento.

62.
    O Governo neerlandês rejeita o argumento do Conselho quanto à falta de interesse em agir da recorrente. A Decisão 93/731 foi expressamente adoptada no interesse público. A recorrente não é, assim, obrigada a justificar um interesse especial para a invocar. O recurso tem por objectivo, neste caso, preservar os seus direitos de destinatária da decisão impugnada. Não se trata de um recurso interposto no interesse geral. A recorrente tem interesse em evitar a aplicação futura pelo Conselho de uma política restritiva em relação aos seus pedidos de acesso a documentos. Além disso, a alegação do Conselho segundo a qual a recorrente dispõe dos documentos em violação do direito comunitário já implica a existência de um interesse legítimo em agir. É evidente que o interesse reconhecido pela Decisão 93/731 diz respeito ao acesso legal a um documento.

63.
    O Governo do Reino Unido alega que o recurso é inadmissível porque a recorrente não tem um interesse suficiente na solução do litígio. O recurso constitui, portanto, um desvio de procedimento. Nenhuma das razões avançadas pela recorrente basta para justificar um interesse na interposição de um recurso nos termos do artigos 173.° do Tratado CE.

Apreciação do Tribunal

64.
    A recorrente é a destinatária da decisão impugnada. Enquanto tal, não é obrigada a demonstrar que a referida decisão lhe diz directa e individualmente respeito. Basta que demonstre ter interesse na anulação da decisão.

65.
    No que respeita à Decisão 94/90/CECA, CE, Euratom da Comissão, de 8 de Fevereiro de 1994, relativa ao acesso do público aos documentos da Comissão (JO L 46, p. 58, a seguir «Decisão 94/90»), o Tribunal de Primeira Instância já decidiu que resulta da sua estrutura que a mesma se destina a aplicar-se de uma forma geral aos pedidos de acesso aos documentos e que, nos termos dessa decisão, qualquer pessoa pode pedir o acesso a qualquer documento não publicado da Comissão, sem que tenha de fundamentar o pedido (ver o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Fevereiro de 1998, Interporc/Comissão, T-124/96, ainda não publicado na Colectânea, n.° 4).

66.
    A Decisão 93/731 tem como objectivo consagrar o princípio de um acesso tão amplo quanto possível dos cidadãos à informação, a fim de reforçar o carácter democrático das instituições e a confiança do público na administração. Tal como a Decisão 94/90, a Decisão 93/731 tão-pouco sujeita o acesso do público aos documentos solicitados a uma justificação específica.

67.
    Consequentemente, uma pessoa a quem tenha sido recusado o acesso a um documento ou a uma parte de um documento tem, apenas por esse facto, interesse em obter a anulação da decisão de indeferimento.

68.
    No caso vertente, a decisão impugnada recusou o acesso a 16 dos 20 documentos solicitados. Por conseguinte, a recorrente tem interesse na anulação desta decisão.

69.
    O facto de os documentos pedidos terem caído no domínio público não tem, nesta discussão, qualquer pertinência.

Competência do Tribunal de Primeira Instância

Argumentos das partes

70.
    O Governo francês alega que a decisão impugnada é relativa ao regime de acesso a documentos adoptados com base nas disposições do Título VI do Tratado UE. Ora, nenhuma disposição deste Título regulamenta as condições de acesso aos documentos adoptados com base nestas disposições. Na falta de disposição expressa, a Decisão 93/731, adoptada com base no artigo 151.°, n.° 3, do Tratado CE, não é aplicável aos actos adoptados com base no Título VI do Tratado UE.

71.
    O Governo do Reino Unido alega que a competência do Tribunal de Primeira Instância não é extensiva à matéria regulada pelo Título VI do Tratado UE e, portanto, à questão, colocada no presente processo, do acesso a documentos relativos a essas matérias. A justiça e os assuntos internos não fazem parte do domínio de aplicação do Tratado CE, mas da cooperação intergovernamental.

Resulta claramente do artigo E do Tratado UE que, no que respeita à justiça e aos assuntos internos, as instituições em questão exercem as suas atribuições nas condições e para os fins previstos no Título VI do Tratado UE. Quando exercem essas atribuições, a sua actuação enquadra-se no domínio de aplicação deste último título e não do Tratado CE. Resulta do artigo L do Tratado UE que as disposições do Tratado CE relativas à competência não são aplicáveis ao Título VI do Tratado UE. A competência do Tribunal de Primeira Instância está portanto excluída tanto para as questões processuais como para as questão substantivas. Em qualquer hipótese, é frequentemente impossível distinguir estes dois tipos de questões.

72.
    O Governo do Reino Unido admite que a Decisão 93/731 se aplica a documentos em que se abordem questões do âmbito do Título VI, mas considera que daí não resulta que o Tribunal de Primeira Instância possa conhecer de um processo em que se discute a recusa em facultar o acesso a tais documentos. Em especial, o Tribunal de Primeira Instância não pode exercer a sua jurisdição com o fundamento de que a Decisão 93/731 foi adoptada com base no artigo 151.° do Tratado CE. O artigo 7.°, n.° 3, desta decisão não tem pertinência nesta discussão, uma vez que a referência à possibilidade de um recurso nos termos do artigo 173.° do Tratado CE não pode ter por efeito alargar a competência do Tribunal de Primeira Instância.

73.
    Segundo a recorrente, resulta expressamente da Decisão 93/731 que o Tribunal de Primeira Instância é competente para julgar os litígios resultantes da aplicação desta decisão, uma vez que esta estabelece que as suas disposições são aplicáveis a qualquer documento na posse do Conselho. O critério de aplicação da Decisão93/731 é portanto o facto de o documento estar na posse do Conselho, independentemente da matéria em causa, com excepção dos documentos elaborados por pessoas estranhas ao Conselho. No seu acórdão de 19 de Outubro de 1995, Carvel e Guardian Newspapers/Conselho (T-194/94, Colect., p. II-2765), o Tribunal de Primeira Instância anulou uma decisão em que o Conselho tinha recusado aos recorrentes o acesso a decisões adoptadas pelo Conselho «assuntos internos e justiça», sem que o Conselho tenha contestado, nesse processo, a competência do Tribunal de Primeira Instância para analisar uma recusa de acesso a documentos do domínio de aplicação do Título VI do Tratado UE.

74.
    Este argumento é apoiado pelos Governos sueco, dinamarquês e neerlandês. Embora seja incompetente para apreciar a legalidade dos documentos relativos a matéria do Título VI do Tratado UE, o Tribunal de Primeira Instância é competente para se pronunciar em matéria de acesso do público aos referidos documentos.

75.
    O Governo neerlandês acrescenta que a decisão impugnada não foi tomada com base no Título VI do Tratado UE e que este título tão-pouco é o fundamento jurídico da Decisão 93/731. O Tribunal de Primeira Instância não foi portanto

chamado a conhecer de um litígio em matéria de cooperação nos domínios da justiça e dos assuntos internos enquanto tal.

Apreciação do Tribunal

76.
    Antes da analisar o fundamento de inadmissibilidade suscitado pelos Governos francês e do Reino Unido, há que apreciar a admissibilidade de tal fundamento à luz do Regulamento de Processo.

77.
    O Conselho não suscitou este fundamento de inadmissibilidade na fase escrita do processo. Ora, as conclusões do pedido de intervenção devem limitar-se a sustentar as conclusões de uma das partes [artigo 37.°, último parágrafo, do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça, aplicável ao Tribunal de Primeira Instância por força do seu artigo 46.°].

78.
    Daqui resulta que os Governos francês e do Reino Unido não têm legitimidade para suscitar a questão prévia de admissibilidade e que o Tribunal de Primeira Instância não é obrigado a examinar os fundamentos invocados por estes (ver acórdão do Tribunal de Justiça de 24 de Março de 1993, CIRFS e o./Comissão, C-313/90, Colect., p. I-1125, n.° 22).

79.
    Todavia, ao abrigo do artigo 113.° do Regulamento de Processo, o Tribunal pode, a todo o tempo e oficiosamente, verificar se estão preenchidos os pressupostos processuais de ordem pública, incluindo os invocados pelos intervenientes (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 24 de Outubro de 1997, EISA/Comissão, T-239/94, Colect., p. II-1839, n.° 26).

80.
    O fundamento de inadmissibilidade suscitado pelos Governos francês e do Reino Unido suscita uma questão de ordem pública, na medida em que diz respeito à competência do Tribunal de Primeira Instância. Consequentemente, pode ser oficiosamente apreciado pelo Tribunal.

81.
    A este propósito, resulta expressamente dos artigos 1.°, n.° 2, e 2.°, n.° 2, da Decisão 93/731, que esta é aplicável a qualquer documento do Conselho. A aplicação da Decisão 93/731 é, portanto, independente do assunto tratado no referido documento.

82.
    Além disso, em conformidade com o artigo K.8, n.° 1, do Tratado UE, os actos adoptados em aplicação do artigo 151.°, n.° 3, do Tratado CE, que constitui o fundamento jurídico da Decisão 93/731, são aplicáveis às disposições relativas aos domínios a que se refere o Título VI do Tratado UE.

83.
    Assim, a Decisão 93/662/CE do Conselho, de 6 de Dezembro de 1993, que adopta o seu Regulamento Interno (JO L 304, p. 1), adoptada com base, nomeadamente,

no artigo 151.°, n.° 3, do Tratado CE, aplica-se igualmente às reuniões do Conselho em que se discute matéria do âmbito do Título VI do Tratado UE.

84.
    Do mesmo modo, na falta de disposição em contrário da Decisão 93/731, esta deve aplicar-se aos documentos que tratem questões do âmbito do Título VI do Tratado UE.

85.
    A circunstância de o Tribunal de Primeira Instância não ser, nos termos do artigo L do Tratado UE, competente para apreciar a legalidade dos actos adoptados no âmbito do Título VI deste Tratado, não significa que não tenha competência para se pronunciar em matéria de acesso do público aos referidos actos. A apreciação da legalidade da decisão impugnada faz parte da sua competência para fiscalizar, em aplicação do artigo 173.° do Tratado CE, a legalidade das decisões adoptadas pelo Conselho em aplicação da Decisão 93/731. Tal competência não invade o âmbito da cooperação intergovernamental nos domínios da justiça e dos assuntos internos enquanto tal. Aliás, o próprio Conselho chamou a atenção da recorrente para a possibilidade de impugnar a sua decisão através de um recurso com base no artigo 173.° do Tratado CE (ver, supra, n.° 18).

86.
    A circunstância de os documentos tratarem de matéria do âmbito do Título VI do Tratado UE deve ser tida em conta apenas na medida em que o seu conteúdo possa eventualmente dar lugar à aplicação de uma ou de várias das excepções previstas na Decisão 93/731. Nesse caso, trata-se de uma apreciação de mérito da legalidade da decisão de recusa do acesso tomada pelo Conselho e não da admissibilidade do recurso enquanto tal.

87.
    De tudo quanto precede resulta que o recurso é admissível.

Quanto ao mérito

88.
    A recorrente suscita cinco fundamentos de anulação da decisão impugnada, baseados, respectivamente, na violação do princípio fundamental de direito comunitário que reconhece aos cidadãos da União Europeia um acesso tão vasto e completo quanto possível aos documentos das instituições comunitárias, na violação do princípio da protecção da confiança legítima, na violação do artigo 4.°, n.° 1, da Decisão 93/731, na violação do artigo 4.°, n.° 2, da mesma decisão e na violação do artigo 190.° do Tratado CE.

89.
    O Tribunal começará por analisar conjuntamente os terceiro e quinto fundamentos.

Terceiro e quinto fundamentos, baseados na violação do artigo 4.°, n.° 1, da Decisão 93/731 e na violação do artigo 190.° do Tratado CE

Argumentos das partes

Sobre a violação do artigo 4.°, n.° 1, da Decisão 93/731

90.
    A recorrente alega que o Conselho não procedeu a uma avaliação concreta do impacto provável que o acesso aos documentos solicitados podia ter sobre a segurança pública na União Europeia. Pelo contrário, o facto de um pedido de confirmação ter sido necessário para que o Conselho aceitasse divulgar um dos documentos, que já tinha sido transmitido ao Parlamento Europeu e, por conseguinte, estava totalmente no domínio público, é particularmente chocante.

91.
    Na falta de definição, na Decisão 93/731, do conceito de segurança pública, a recorrente sugere a seguinte definição:

«documentos ou excertos de documentos cujo acesso ao público seria susceptível de expor os cidadãos da Comunidade, as instituições da Comunidade ou as autoridades dos Estados-Membros ao terrorismo, à criminalidade, à espionagem, às insurreições, à subversão e à revolução, ou colocaria directamente obstáculos aos esforços das autoridades destinados a evitar tais actividades; tais documentos ou excertos serão declarados inacessíveis com base na excepção relativa à segurança pública».

92.
    Seguidamente, apresenta uma descrição precisa do conteúdo de todos os documentos requeridos que se encontram na sua posse, em apoio da sua tese segundo de que a excepção baseada na protecção da segurança pública foi aplicada de maneira ilegal pelo Conselho.

93.
    Rejeita a afirmação do Conselho segundo a qual não é do interesse da segurança pública permitir às pessoas que participam em actividades ilícitas obter um conhecimento preciso das estruturas e dos meios de que dispõe a cooperação policial na União Europeia. Este afirmação não tem absolutamente nenhuma relação com o conteúdo efectivo dos documentos em questão. A recorrente recorda que os dois documentos cujo acesso foi recusado pelas autoridades suecas tinham por objecto, não a segurança pública, mas as posições adoptadas no decurso das negociações pelo Reino dos Países Baixos e pela República Federal da Alemanha.

94.
    O Conselho nega ter considerado que todos os documentos que tratam de questões ligadas à Europol estão abrangidos pela excepção da segurança pública. O facto de quatro documentos terem sido divulgados demonstra que se procedeu de facto a uma avaliação concreta, da qual resultou que certos documentos solicitados foram comunicados e outros não.

95.
    O Conselho, apoiado pelos Governos francês e do Reino Unido, alega que não é necessário adoptar uma definição restritiva do conceito de segurança pública para efeitos de aplicação da Decisão 93/731. O conceito de segurança pública deveria ser definido em termos flexíveis, a fim de ter em conta as alterações de circunstâncias. De qualquer forma, só o próprio Conselho está em condições de

apreciar se a divulgação de um dado documento pode ou não pôr em causa a protecção do interesse público (segurança pública).

96.
    Isso ainda mais se justifica no que respeita aos documentos que tratam exclusivamente de questões do âmbito dos Títulos V e VI do Tratado UE. O Conselho não tem dúvidas de que, se o Tribunal de Primeira Instância se considerasse competente para conhecer de questões relativas ao acesso a documentos que abordam exclusivamente questões do âmbito do Título VI do Tratado UE, este órgão jurisdicional se absteria de fazer prevalecer a sua apreciação sobre este ponto em detrimento da apreciação do Conselho.

97.
    O Conselho considera que o resumo dos documentos em questão feito pela recorrente não é objectivo nem preciso.

98.
    O Governo sueco contesta a descrição feita pelo Conselho do modo como o grupo «Informação» e o Coreper trataram o pedido de acesso aos documentos em causa no presente processo.

99.
    Em especial, os documentos solicitados não foram colocados à disposição do representante sueco no grupo «informação» antes da reunião deste. A questão não pôde ser preparada satisfatoriamente no reduzido prazo concedido.

100.
    Quanto ao Coreper, a única questão sobre a qual tomou posição foi saber se a decisão sobre o pedido de comunicação podia ser tomada segundo o sistema do processo escrito. Na votação que teve lugar no Coreper em 5 de Julho de 1995, o Governo sueco e quatro outros Estados-Membros abstiveram-se. O Governo sueco fez, de resto, uma declaração em que exprimiu o seu descontentamento quanto ao modo como a questão foi tratada.

101.
    O Governo dinamarquês partilha uma grande parte das críticas formuladas pelo Governo sueco relativamente a este modo de tratamento. A apreciação dos diferentes documentos a que o Conselho procedeu teve um mero carácter formal. No Secretariado do Conselho começaram por ser analisadas as possibilidade de derrogação inscritas no artigo 4.°, n.° 1, da Decisão 93/731. Ter-se-á então considerado que a excepção baseada na protecção da segurança pública podia motivar de maneira geral o sigilo de documentos relativos à Europol. A análise dopedido de confirmação suscitou uma dúvida sobre a questão de saber se esta excepção podia verdadeiramente ser utilizada genericamente para fundamentar a recusa de acesso aos referidos documentos. Foi então decidido, numa atitude de ordem estratégica, basear a fundamentação nas considerações muito genéricas do artigo 4.°, n.° 2, da Decisão 93/731. Os debates no Secretariado do Conselho não se concentraram sobre a questão de saber se a publicação dos documentos provocaria um risco de consequências concretas prejudiciais para a segurança pública ou a confidencialidade.

102.
    O Governo neerlandês, após analisar os documentos em causa, considera que o interesse da segurança pública em caso algum pode justificar a recusa de acesso aos referidos documentos. No entanto, reserva a sua opinião no que respeita a um documento que não tem na sua posse. Em seu entender, para apreciar se o Conselho tinha razões para recusar o acesso aos documentos em causa por razões de segurança pública, há que apreciar em relação a cada documento se a sua divulgação afectaria os interesses fundamentais da Comunidade ou dos Estados-Membros a ponto de pôr em causa a sua existência. Sublinha que, no que respeita, pelo menos, a quatro documentos, o Conselho aceitou fornecê-los posteriormente a um jornalista, Sr. T. A recusa de acesso da recorrente a estes documentos constitui, portanto, uma discriminação arbitrária.

103.
    O Conselho insiste no facto de o teor dos documentos ter efectivamente sido analisado. Nada prova que a abstenção de outros membros do Conselho se tenha baseado nas mesmas razões que as do Governo sueco. Nenhum Estado-Membro votou contra a decisão de confirmação nem se associou à declaração do Governo sueco.

Sobre a violação do artigo 190.° do Tratado CE

104.
    A recorrente alega que a recusa, formulada numa única frase, de conceder o acesso a 16 dos 20 documentos, não respeita o disposto no artigo 190.° do Tratado CE nem o artigo 7.°, n.° 3, da Decisão 93/731. Efectivamente, não lhe foi possível determinar se esta recusa devia ser impugnada para o Tribunal de Primeira Instância. Este Tribunal tão-pouco tem a possibilidade de determinar se o Conselho aplicou correctamente as excepções acima mencionadas. A recorrente só conseguiu demonstrar que o Conselho aplicou as referidas excepções de maneira ilegal no presente processo porque tinha em sua posse, total ou parcialmente, o essencial dos documentos solicitados. A recorrente pede ao Tribunal que analise os documentos em causa para apreciar a razão de ser da decisão do Conselho de invocar as excepções que suscitou.

105.
    O Conselho, apoiado pelos Governos francês e do Reino Unido, alega que a fundamentação constante da decisão impugnada revela o essencial dos objectivos do Conselho. Assim, considera que a sua decisão está devidamente fundamentada. É excessivo exigir uma fundamentação específica para cada uma das escolhas técnicas que efectuou. Se fosse necessário fornecer uma fundamentação muito detalhada no caso das respostas negativas aos pedidos de acesso, os objectivos subjacentes ao artigo 4.°, n.° 1, da Decisão 93/731 seria postos em causa. A Decisão 93/731 prevê prazos muito curtos para a resposta aos pedidos. Consequentemente, quando os pedidos se referem a diversos documentos com um grande número de páginas, a fundamentação susceptível de ser fornecida é forçosamente mais breve do que a fundamentação dada em resposta a um pedido de alcance mais limitado. Além disso, os documentos pedidos contêm um elemento comum essencial muito claro.

106.
    O Governo sueco considera que a ponderação do interesse do Conselho em preservar o sigilo das suas deliberações e do interesse do público em ter acesso aos documentos deve ser operada especificamente em relação a cada documento e que a decisão impugnada está insuficientemente fundamentada. O Conselho não indica se os dois fundamentos que avança são aplicáveis ao conjunto dos documentos ou, se tal não for o caso, qual ou quais fundamentos são aplicáveis aos diferentes documentos. O público tem o direito, a partir de circunstâncias específicas a cada questão ou processo, de saber por que razão o acesso a determinado documento é recusado.

107.
    O Governo dinamarquês alega que não basta remeter genericamente para as possibilidades de derrogação e reproduzir os termos da Decisão 93/731. Não se pode validamente fundamentar uma recusa nos termos do artigo 4.°, n.° 1, desta decisão invocando, genericamente, que um certo interesse referido no n.° 1 é afectado. Do mesmo modo, a faculdade de derrogação relativa ao sigilo, enunciada no artigo 4.°, n.° 2, não pode justificar uma recusa genérica. O princípio da apreciação concreta é aplicável. Em certos casos, o Conselho pode ser obrigado a fornecer documentos que ocultem informações cuja protecção seria necessária nos termos do artigo 4.°.

108.
    O Governo neerlandês alega igualmente que a razão pela qual o Conselho recusou o acesso aos diversos documentos é obscura. A decisão impugnada limita-se a repetir os critérios do artigo 4.° da Decisão 93/731, sem precisar os documentos que foram recusados com base no artigo 4.°, n.° 1, e os que o foram com base no artigo 4.°, n.° 2. Além disso, no que respeita aos documentos recusados para preservar o sigilo das deliberações do Conselho, a decisão impugnada não permite determinar se os interesses foram devidamente ponderados.

Apreciação do Tribunal

109.
    A Decisão 93/731 é um acto que confere aos cidadãos um direito de acesso aos documentos na posse do Conselho. Resulta da sua economia que esta decisão se aplica de uma forma geral aos pedidos de acesso aos documentos e que, nos termos dessa decisão, qualquer pessoa pode pedir o acesso a qualquer documento não publicado da Comissão, sem que tenha de fundamentar o pedido (ver, supra, n.° 65).

110.
    Duas categorias de excepções ao princípio geral de acesso dos cidadãos aos documentos do Conselho figuram no artigo 4.° desta decisão. Tais excepções devem ser interpretadas e aplicadas de forma restritiva, a fim de não pôr em causa a aplicação do princípio geral consagrado nesta decisão (ver, no que respeita às disposições correspondentes da Decisão 94/90, o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Março de 1997, WWF UK/Comissão, T-105/95, Colect., p. II-313, n.° 56).

111.
    Os termos da primeira categoria de excepções, de cariz imperativo, prevêm que o acesso a um documento do Conselho não pode ser concedido quando a sua divulgação possa prejudicar a protecção do interesse público (segurança pública, relações internacionais, estabilidade monetária, processos judiciais, inspecções e inquéritos) (ver, supra, n.° 7). Daqui resulta que o Conselho é obrigado a recusar o acesso aos documentos abrangidos por uma das excepções que figuram nesta primeira categoria no caso de se provar esta última circunstância (ver acórdão Carvel e Guardian Newspapers/Conselho, já referido, n.° 64).

112.
    No entanto, resulta da utilização do verbo poder no presente do conjuntivo [em francês «pourrait», condicional] que, para provar as situações em que a divulgação de certos documentos «possa» prejudicar a protecção do interesse público, o Conselho está obrigado a apreciar, relativamente a cada documento solicitado, se, à luz das informações de que dispõe, a sua divulgação é efectivamente susceptível de prejudicar um dos aspectos do interesse protegido pela primeira categoria de excepções. Se for esse o caso, o Conselho é obrigado a recusar o acesso ao documento em questão (acórdão Interporc/Comissão, já referido, n.° 52 e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 19 de Março de 1998, van der Wal/Comissão, T-83/96, ainda não publicado na Colectânea, n.° 43).

113.
    Em contrapartida, a redacção da segunda categoria, em termos que concedem uma faculdade, prevê que o Conselho pode recusar o acesso para proteger o sigilo das suas deliberações (ver, supra, n.° 8). Daqui resulta que o Conselho dispõe de um poder de apreciação que lhe permite indeferir, em certos casos, um pedido de acesso a documentos respeitantes às suas deliberações. No entanto, deve exercer esse poder de apreciação ponderando realmente, por um lado, o interesse do cidadão em ter acesso a esses documentos e, por outro, o seu interesse eventual em preservar o sigilo das suas deliberações (ver acórdão Carvel e Guardian Newspapers/Conselho, já referido, n.os 64 e 65).

114.
    Tem também o direito de invocar conjuntamente uma excepção da primeira categoria e uma excepção da segunda categoria para recusar o acesso aos documentos em seu poder, já que nenhuma disposição da Decisão 93/731 lho proíbe. Com efeito, não pode excluir-se que a divulgação de determinados documentos pelo Conselho prejudique simultaneamente o interesse protegido pela primeira categoria de excepções e o interesse do Conselho em preservar o sigilo das suas deliberações (acórdão WWF UK/Comissão, já referido, n.° 61).

115.
    À luz destes elementos, importa analisar se a decisão impugnada responde às exigências de fundamentação resultantes do artigo 190.° do Tratado CE.

116.
    A obrigação de fundamentar as decisões individuais tem como duplo objectivo permitir, por um lado, que os interessados conheçam as razões da medida adoptada, a fim de poderem defender os seus direitos e, por outro, que o Tribunal exerça o seu controlo (ver, nomeadamente, acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Fevereiro de 1990, Delacre e o./Comissão, C-350/88, Colect., p. I-395, n.° 15 e

acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Janeiro de 1995, Branco/Comissão, T-85/94, Colect., p. II-45, n.° 32).

117.
    A fundamentação de uma decisão que recusa o acesso a documentos deve conter, no mínimo por categoria de documentos, as razões concretas pelas quais o Conselho considera que os documentos solicitados se enquadram numa das excepções previstas pela Decisão 93/731 (acórdãos WWF UK/Comissão, já referido, n.os 64 e 74, e Interporc/Comissão, já referido, n.° 54).

118.
    Na decisão impugnada (ver, supra, n.° 18), o Conselho indica simplesmente que a divulgação dos 16 documentos em questão poderia pôr em causa o interesse público (segurança pública) e que esses documentos dizem respeito a deliberações do Conselho, incluindo as opiniões defendidas por membros do Conselho, estando, por essa razão, abrangidos pela obrigação de confidencialidade.

119.
    Embora o Conselho invoque simultaneamente a excepção imperativa, baseada na protecção do interesse público (segurança pública), e a excepção facultativa, baseada na protecção do sigilo das suas deliberações, não esclarece se invoca cumulativamente as duas excepções no que respeita à totalidade dos documentos recusados ou se considera que alguns documentos estavam abrangidos pela primeira excepção e outros pela segunda.

120.
    Importa observar que a recusa inicial contida na carta de 1 de Junho de 1995 se baseava unicamente no «princípio da confidencialidade consagrado no artigo 4.°, n.° 1, da Decisão 93/731», mas que, no entanto, o Conselho facultou o acesso a dois documentos suplementares quando analisou o pedido de confirmação, isto é, um relatório sobre as actividades da unidade das drogas da Europol (documento n.° 4533/95) e uma ordem de trabalhos provisória de uma reunião do comité K.4 (documento n.° 4135/95), documentos que se enquadram evidentemente no âmbito das actividades do Conselho no quadro do Título VI do Tratado UE. A este propósito, se o facto de tais documentos se enquadrarem no âmbito do Título VI do Tratado UE já implicasse que estivessem abrangidos pela excepção baseada na protecção do interesse público (a segurança pública), o Conselho não poderia ter facultado o acesso a esses documentos. Além disso, ao considerar que tinha a faculdade de conceder o acesso a esses dois documentos, após ter ponderado os interesses em causa, o Conselho considerou necessariamente que nem todos osdocumentos que se enquadram no âmbito do Título VI são automaticamente abrangidos pela primeira excepção baseada na protecção do interesse público (segurança pública). O próprio Conselho admite, de resto, que não considerava que todos os documentos relativos à Europol estivessem abrangidos pela excepção baseada na segurança pública.

121.
    A jurisprudência do Tribunal de Justiça mostra que o conceito de segurança pública não tem um único significado. Este conceito abrange tanto a segurança interna de um Estado-Membro como a sua segurança externa (acórdão do Tribunal

de Justiça de 17 de Outubro de 1995, Werner, C-70/94, Colect., p. I-3189, n.° 25), bem como uma interrupção de fornecimento em produtos essenciais, como os produtos petrolíferos, e os riscos daí decorrentes para a existência de um Estado (acórdão do Tribunal de Justiça de 10 de Julho de 1984, Campus Oil, e o., 72/83, Recueil, p. 2727, n.° 34). Pode igualmente cobrir as situações em que o acesso do público a certos documentos poderia colocar obstáculos aos esforços das autoridades destinados a evitar acções criminosas, como sustenta a recorrente.

122.
    Ora, a nota do Sr. Elsen (ver, supra, n.° 15) mostra que a maior parte dos documentos aos quais foi recusado o acesso apenas diziam respeito às negociações com vista à adopção da Convenção Europol, em especial as propostas da presidência e de outras delegações, feitas no quadro dessas negociações, e não as actividades operacionais da Europol. Por conseguinte, na falta de indicação pelo Conselho das razões pelas quais a divulgação dos documentos poderia efectivamente pôr em causa um aspecto da segurança pública, não foi dada à recorrente a possibilidade de conhecer as justificações da medida tomada a fim de defender os seus direitos. Daqui resulta que o próprio Tribunal não está em condições de apreciar as razões pelas quais os documentos poderiam ser abrangidos pela excepção baseada na protecção do interesse público (segurança pública) e não pela excepção baseada no sigilo das deliberações do Conselho.

123.
    O Conselho não pode pretender que, no caso vertente, não podia explicar por que razão essa excepção era aplicável sem comprometer a função essencial da excepção em causa, conforme resulta da própria natureza do interesse público que deve ser protegido e do carácter obrigatório da excepção. Efectivamente, a nota do Sr. Elsen demonstra claramente que era possível dar uma indicação quanto às razões pelas quais certos documentos não deviam ser divulgados à recorrente sem divulgar o respectivo conteúdo.

124.
    Finalmente, no que respeita à excepção baseada na protecção do sigilo das deliberações, o Conselho não indicou especificamente na decisão impugnada que todos os documentos objecto do pedido de acesso estavam abrangidos pela excepção baseada na protecção do interesse público (ver, supra, n.° 119). Consequentemente, a recorrente não podia excluir que o acesso a uma parte dos documentos em causa lhe era recusado pelo facto de estarem abrangidos unicamente pela excepção baseada no sigilo das deliberações.

125.
    No entanto, o conteúdo da decisão impugnada não permite à recorrente, e consequentemente, ao Tribunal, verificar se o Conselho respeitou a sua obrigação de ponderar realmente os interesses em causa, resultante do artigo 4.°, n.° 2, da Decisão 93/731. Efectivamente, a decisão impugnada refere-se unicamente ao facto de os documentos pedidos dizerem respeito às deliberações do Conselho, incluindo as opiniões defendidas por membros do Conselho, sem indicar se este fez uma análise comparativa em que tenha ponderado, por um lado, os interesses dos cidadãos que solicitam informações e, por outro, os critérios de confidencialidade

das deliberações do Conselho (acórdão Carvel e Guardian Newspapers/Conselho, já referido, n.° 74).

126.
    Além disso, a primeira resposta do Conselho, de resto enviada à recorrente em francês apesar de esta ter redigido o seu primeiro pedido em alemão, limita-se a referir o disposto no artigo 4.°, n.° 1, da Decisão 93/731, em apoio da tese segundo a qual os documentos estavam sujeitos ao «princípio da confidencialidade». Por conseguinte, também não permite à recorrente nem ao Tribunal verificar se, na fase de apreciação do primeiro pedido da recorrente, o Conselho ponderou realmente os interesses em causa.

127.
    De tudo quanto precede resulta que a decisão impugnada não responde às exigências de fundamentação do artigo 190.° do Tratado CE e deve ser anulada, não havendo necessidade de analisar os outros fundamentos invocados pela recorrente nem o conteúdo dos próprios documentos.

Pedido do Governo neerlandês no sentido de o Tribunal de Primeira Instância convidar o Tribunal de Justiça a apresentar uma nota elaborada pelos seus serviços

128.
    O Governo neerlandês pede ao Tribunal de Primeira Instância que convide o Tribunal de Justiça a apresentar a nota elaborada pelo seu Serviço de Investigação e Documentação no âmbito do acórdão do Tribunal de Justiça de 30 de Abril de 1996, Países Baixos/Conselho (C-58/94, Colect., p. I-2169).

129.
    Uma vez que o presente acórdão não se baseia nessa nota, não há que se pronunciar sobre tal pedido.

Divulgação da contestação na Internet

Argumentos das partes

130.
    Como foi indicado no n.° 22, supra, por carta recebida em 3 de Abril de 1996, o Conselho chamou a atenção do Tribunal para o facto de certos documentos relevantes, em especial a sua contestação no presente processo, terem sido divulgados na Internet. Em sua opinião, o comportamento da recorrente constituiu uma violação do regular andamento do processo. Insistiu especialmente no facto de o texto da contestação ter sido alterado pela recorrente antes de ser introduzido na Internet. Além disso, os nomes e os dados dos agentes responsáveis do Conselho foram indicados, sendo o público convidado a enviar-lhes eventuais comentários sobre o processo. O Conselho pediu ao Tribunal para tomar as medidas apropriadas a fim de evitar outras acções semelhantes da recorrente.

131.
    Por carta recebida em 3 de Maio de 1996, os representantes da recorrente explicaram não ter tido qualquer responsabilidade na divulgação da contestação e

de outros documentos relativos ao processo na Internet. Não tinham conhecimento de tais factos antes da recepção da carta da Secretaria do Tribunal de Primeira Instância. Pediram imediatamente à recorrente para retirar todos os documentos da rede informática em causa e informaram-na de que deixariam de se sentir em condições de a representar se isso não fosse feito.

132.
    Por observações recebidas em 24 de Maio de 1996, a recorrente confirmou que tinha publicado os documentos na Internet sem informar os seus representantes. Explicou que a alteração da contestação se ficou a dever a razões puramente práticas e que o seu objectivo não era alterar o conteúdo da contestação nem enfraquecer a defesa do Conselho. Procurou apenas encurtar a contestação, omitindo reproduzir certas passagens, tendo em consideração o tempo exigido para introduzir o articulado na Internet. Não teve minimamente a intenção de pressionar o Conselho. Os nomes e os dados dos agentes do Conselho foram incluídos unicamente porque tais pessoas tinham conhecimento do processo e não para encorajar o público a entrar directamente em contacto com eles como indivíduos.

133.
    A recorrente comprometeu-se a abster-se de introduzir na Internet ou de tornar públicos sob outra forma os novos documentos trocados entre as partes no processo ou a limitar-se a dar conta do processo nas condições jornalísticas habituais. Acrescentou que tinha decidido retirar a contestação da Internet. No entanto, a introdução do referido documento na Internet foi realizada por uma associação independente, Grävande Journalister (associação de jornalistas e chefes de redacção suecos de investigação), que recusou retirá-lo. Dado que o direito sueco não confere à recorrente um meio legal de obrigar esta associação a retirar a contestação, é a esta que incumbe a responsabilidade pela sua manutenção na Internet.

134.
    Por carta recebida em 28 de Maio de 1996, o Governo sueco explicou que o chefe do Serviço Jurídico do Ministério da Justiça tinha recebido da recorrente a contestação e que, posteriormente, tinha fornecido uma cópia a uma jornalista, sem que a recorrente tenha levantado objecções. Procedeu deste modo tendo em conta que uma exposição detalhada do essencial da contestação já tinha sido publicada pela recorrente, com indicação dos nomes dos agentes envolvidos. Outro factor lavado em conta para a comunicação do documento a uma jornalista foi o facto de não se tratar de um documento entregue ao Governo sueco por uma instituição comunitária, mas por um particular que a tinha em seu poder e que já tinha demonstrado estar pronto a divulgá-la. Consequentemente, o ministério de modo nenhum esteve envolvido na publicação de tal documento na Internet. Esta iniciativa foi considerada uma provocação.

Apreciação do Tribunal

135.
    Em aplicação das regras que regulam o tratamento dos processo no Tribunal de Primeira Instância, as partes beneficiam de protecção contra a utilização

inadequada das peças processuais. Assim, nos termos do artigo 5.°, n.° 3, terceiro parágrafo, das Instruções ao Secretário de 3 de Março de 1994 (JO L 78, p. 32), os terceiros, quer de natureza privada quer pública, só podem ter acesso o processo ou às peças processuais com autorização expressa do presidente, após as partes terem sido ouvidas. Além disso, em aplicação do artigo 116.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, o presidente pode excluir os documentos secretos ou confidenciais da comunicação de um processo a um interveniente.

136.
    Estas disposições reflectem um princípio geral de boa administração da justiça segundo o qual as partes têm o direito de defender os seus interesses independentemente de qualquer influência externa, designadamente por parte do público.

137.
    Daqui resulta que uma parte à qual é facultado o acesso aos actos processuais das outras partes só pode utilizar esse direito para efeitos de defesa da sua própria causa, com exclusão de qualquer outro objectivo, como suscitar críticas do público em relação aos argumentos apresentados pelas outras partes no processo.

138.
    No caso vertente, é evidente que as acções da recorrente, que consistiram na introdução na Internet de uma versão alterada da contestação, associada a um convite ao público para enviar comentários aos agentes do Conselho, com indicação dos números de telefone de fax destes, tinham por objectivo pressionar o Conselho e incitar o público a criticar os agentes da instituição no exercício das suas funções.

139.
    Estas acções constituem uma utilização abusiva do processo, que será tida em conta ao proceder à repartição das despesas (ver, infra, n.° 140), uma vez que este incidente, que provocou uma suspensão da instância, tornou necessária a apresentação de observações específicas e complementares por todas as partes no processo.

Quanto às despesas

140.
    Por força do disposto no n.° 2 do artigo 87.° do Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. No caso vertente, a recorrente pediu a condenação do Conselho nas despesas. No entanto, nos termos do artigo 87.°, n.° 3, do mesmo regulamento, perante circunstâncias excepcionais, o Tribunal pode determinar que as despesas sejam repartidas entre as partes ou que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas. Tendo em conta a utilização abusiva do processo pela recorrente, há que decidir que o Conselho apenas deve suportar dois terços das despesas da recorrente.

141.
    Em conformidade com o artigo 87.°, n.° 4, do Regulamento de Processo, os intervenientes suportarão as respectivas despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção Alargada),

decide:

1.
    A Decisão do Conselho, de 6 de Julho de 1995, que recusa à recorrente o acesso a determinados documentos relativos à Unidade Europeia de Polícia (Europol), é anulada.

2.
    O Conselho suportará, além das suas próprias despesas, dois terços das despesas da recorrente.

3.
    O Reino da Dinamarca, a República Francesa, o Reino dos Países Baixos, o Reino da Suécia e Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte suportarão as respectivas despesas.

Lenaerts
Lindh
Azizi

Cooke

Jaeger

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 17 de Junho de 1998.

O secretário

O presidente

H. Jung

Lindh


1: Língua do processo: inglês.