Language of document : ECLI:EU:C:2022:427

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção)

2 de junho de 2022 (*)

«Reenvio prejudicial — Cooperação judiciária em matéria civil — Citação e notificação dos atos judiciais e extrajudiciais — Regulamento (CE) n.o 1393/2007 — Artigo 5.o — Tradução do ato — Despesas de tradução suportadas pelo requerente — Conceito de “requerente” — Notificação, por iniciativa do órgão jurisdicional chamado a decidir, de atos judiciais a intervenientes no processo»

No processo C‑196/21,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Tribunalul Ilfov (Tribunal Regional de Ilfov, Roménia), por Decisão de 4 de fevereiro de 2021, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 26 de março de 2021, no processo

SR

contra

EW,

sendo intervenientes:

FB,

CX,

IK,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção),

composto por: J. Passer, presidente de secção, N. Wahl e M. L. Arastey Sahún (relatora), juízes,

advogado‑geral: M. Szpunar,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

considerando as observações apresentadas:

—        em representação de EW, por S. Dumitrescu, avocată,

—        em representação do Governo romeno, por E. Gane, L.‑E. Baţagoi e A. Wellman, na qualidade de agentes,

—        em representação do Governo francês, por A.‑L. Desjonquères e N. Vincent, na qualidade de agentes,

—        em representação do Governo húngaro, por Z. Biró‑Tóth e M. Z. Fehér, na qualidade de agentes,

—        em representação da Comissão Europeia, por A. Biolan e S. Noë, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 5.o do Regulamento (CE) n.o 1393/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de novembro de 2007, relativo à citação e à notificação dos atos judiciais e extrajudiciais em matérias civil e comercial nos Estados‑Membros («citação e notificação de atos») e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1348/2000 do Conselho (JO 2007, L 324, p. 79).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe SR a EW relativo à dissolução do seu casamento por mútuo consentimento, bem como à atribuição e ao exercício da responsabilidade parental respeitante ao seu filho menor.

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        Nos termos dos considerandos 2 a 4 do Regulamento n.o 1393/2007:

«(2)      O bom funcionamento do mercado interno exige que se melhore e torne mais rápida a transmissão entre os Estados‑Membros de atos judiciais e extrajudiciais em matéria civil ou comercial para efeitos de citação e notificação.

(3)      O Conselho, por Ato de 26 de maio de 1997, estabeleceu uma Convenção Relativa à Citação e Notificação dos Atos Judiciais e Extrajudiciais em Matérias Civil e Comercial nos Estados‑Membros da União Europeia e recomendou a sua aprovação pelos Estados‑Membros de acordo com as respetivas formalidades constitucionais. Esta convenção não entrou em vigor. Há que assegurar a continuidade dos resultados das negociações subjacentes à celebração da convenção.

(4)      Em 29 de maio de 2000, o Conselho aprovou o Regulamento (CE) n.o 1348/2000 relativo à citação e à notificação dos atos judiciais e extrajudiciais em matérias civil e comercial nos Estados‑Membros [JO 2000, L 160, p. 37]. O conteúdo desse regulamento baseia‑se amplamente na convenção.»

4        O artigo 2.o do referido regulamento enuncia:

«1.      Cada Estado‑Membro designa os funcionários, autoridades ou outras pessoas, adiante denominados “entidades de origem”, que terão competência para transmitir atos judiciais ou extrajudiciais para efeitos de citação ou notificação noutro Estado‑Membro.

2.      Cada Estado‑Membro designa os funcionários, autoridades ou outras pessoas, adiante denominados “entidades requeridas”, que terão competência para receber atos judiciais ou extrajudiciais provenientes de outro Estado‑Membro.

[…]»

5        O artigo 5.o do referido regulamento dispõe:

«1.      O requerente é avisado, pela entidade de origem competente para a transmissão, de que o destinatário pode recusar a receção do ato se este não estiver redigido numa das línguas previstas no artigo 8.o

2.      Cabe ao requerente suportar as despesas de tradução que possam ter lugar previamente à transmissão do ato, sem prejuízo de eventual decisão posterior do tribunal ou autoridade competente em matéria de imputação dessas despesas.»

6        O artigo 8.o, n.o 1, do mesmo regulamento prevê:

«A entidade requerida avisa o destinatário, mediante o formulário constante do anexo II, de que pode recusar a receção do ato quer no momento da citação ou notificação, quer devolvendo o ato à entidade requerida no prazo de uma semana, se este não estiver redigido ou não for acompanhado de uma tradução numa das seguintes línguas:

a)      Uma língua que o destinatário compreenda; ou

b)      A língua oficial do Estado‑Membro requerido ou, existindo várias línguas oficiais nesse Estado‑Membro, a língua oficial ou uma das línguas oficiais do local onde deva ser efetuada a citação ou notificação.»

 Direito romeno

7        O artigo 61.o da Legea nr. 134/2010 privind Codul de procedură civilă (Lei n.o 134/2010, que Aprova o Código de Processo Civil), de 1 de julho de 2010 (Monitorul Oficial al României, parte I, n.o 247, de 10 de abril de 2015), dispõe:

«1.      Qualquer pessoa que tenha interesse pode intervir num processo pendente entre as partes iniciais.

[…]

3.      A intervenção é acessória quando apoia unicamente a defesa de uma das partes.»

8        O artigo 64.o dessa lei prevê:

«1.      O órgão jurisdicional notifica às partes o pedido de intervenção e as cópias dos documentos anexos.

2.      Depois de ouvir o interveniente e as partes, o órgão jurisdicional pronuncia‑se sobre a admissibilidade da intervenção, por despacho fundamentado.

[…]»

 Litígio no processo principal e questão prejudicial

9        SR e EW são, respetivamente, a mãe e o pai de um menor.

10      Em data não especificada na decisão de reenvio, SR e EW apresentaram, cada um, no Judecătoria Buftea (Tribunal de Primeira Instância de Buftea, Roménia), um pedido de dissolução do seu casamento, bem como a atribuição da responsabilidade parental relativa ao seu filho e a definição das modalidades de exercício da mesma.

11      Por Sentença de 4 de julho de 2016, este órgão jurisdicional decretou a dissolução do casamento de SR e de EW por mútuo consentimento. Fixou igualmente a residência da criança no domicílio da mãe e decidiu que a autoridade parental seria exercida conjuntamente pelos dois progenitores, assegurando a manutenção dos laços pessoais entre o pai e a criança em conformidade com um programa de visitas. Além disso, o referido órgão jurisdicional condenou EW a pagar uma pensão de alimentos a favor do filho.

12      EW e a SR interpuseram, cada um, recurso dessa sentença no órgão jurisdicional de reenvio, o Tribunalul Ilfov (Tribunal Regional de Ilfov, Roménia).

13      EW pede, a título principal, a anulação da referida sentença por incompetência do órgão jurisdicional e, a título subsidiário, a sua reforma parcial no que respeita ao lugar de residência do menor e ao pagamento de uma pensão de alimentos para este último.

14      SR pede a obtenção do exercício exclusivo da autoridade parental, a supressão do programa de visitas estabelecido a favor de EW, a alteração do montante da pensão de alimentos fixada a cargo deste último, bem como uma nova repartição das despesas.

15      Em 5 de julho de 2018, FB, CX, e IK, que são, respetivamente, irmão, irmã e o avô paterno da criança, pediram para intervir em apoio de EW. Estes intervenientes residem em França.

16      Por Despacho de 15 de setembro de 2020, o órgão jurisdicional de reenvio decidiu, a fim de se pronunciar sobre a admissibilidade destes pedidos de intervenção, que SR e EW eram obrigados a assegurar a tradução em língua francesa das citações emitidas por esse órgão jurisdicional com vista à sua notificação a FB, CX e IK, em conformidade com as disposições do Regulamento n.o 1393/2007.

17      SR e EW recusaram‑se a adiantar as despesas relacionadas com a tradução em língua francesa desses atos processuais, considerando que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio suportar o respetivo encargo. Estas partes sustentam que o órgão jurisdicional de reenvio deve ser considerado o «requerente», para efeitos da aplicação do artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1393/2007.

18      A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que o conceito de «requerente», na aceção do artigo 5.o do Regulamento n.o 1393/2007, não pode referir‑se a um órgão jurisdicional. Com efeito, um órgão jurisdicional de reenvio só pode agir na qualidade de entidade de origem, na aceção do artigo 2.o, n.o 1, deste regulamento, ou na qualidade de entidade requerida, na aceção do artigo 2.o, n.o 2, deste diploma. No caso em apreço, o órgão jurisdicional de reenvio age como entidade de origem competente para transmitir os atos judiciais em causa para efeitos de citação ou notificação noutro Estado‑Membro, a saber, a França.

19      Resulta do artigo 5.o, n.o 1, do referido regulamento que o conceito de «requerente», bem como o de «destinatário», estão manifestamente excluídos dos âmbitos de aplicação respetivos dos conceitos de «entidade de origem» e de «entidade requerida». Sendo o órgão jurisdicional de reenvio, no processo principal, a entidade de origem, não pode, por conseguinte, ser considerado requerente.

20      Segundo este órgão jurisdicional, o requerente, na aceção do Regulamento n.o 1393/2007, é a pessoa que apresentou o pedido e que tem interesse em que seja efetuada uma citação em conformidade com este regulamento, para que o processo judicial possa ser concluído. No caso em apreço, trata‑se de SR e de EW, na medida em que cada uma dessas partes interpôs recurso para o órgão jurisdicional de reenvio e, por conseguinte, em princípio, tem interesse na conclusão do processo de recurso.

21      Nestas circunstâncias, o Tribunalul Ilfov (Tribunal Regional de Ilfov) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«No caso de um órgão jurisdicional ordenar a citação de intervenientes numa ação cível, o “requerente”, na aceção do artigo 5.o do [Regulamento n.o 1393/2007], é o órgão jurisdicional do Estado‑Membro que decide citar os intervenientes ou é a parte em causa no processo pendente nesse órgão jurisdicional?»

 Quanto à questão prejudicial

 Quanto à admissibilidade

22      O Governo romeno considera que o pedido de decisão prejudicial é inadmissível, na medida em que a descrição do quadro factual efetuada pelo órgão jurisdicional de reenvio não permite saber se a questão da necessidade de traduzir o ato processual e, por conseguinte, a de suportar as respetivas despesas, se põe concretamente no processo principal.

23      Mais precisamente, o órgão jurisdicional de reenvio não indica se as citações aos intervenientes já tiveram lugar e se estes se recusaram a recebê‑las por não estarem redigidas numa língua que compreendam ou devam compreender. Ora, se assim não for, a questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio é hipotética e, por conseguinte, inadmissível.

24      Este Governo observa que o Tribunal de Justiça já teve ocasião de precisar que, em conformidade com o artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1393/2007, cabe à entidade de origem chamar a atenção do requerente para o risco de uma eventual recusa do destinatário de aceitar um ato que não está redigido numa das línguas indicadas no artigo 8.o deste regulamento. No entanto, em virtude do Acórdão de 16 de setembro de 2015, Alpha Bank Cyprus (C‑519/13, EU:C:2015:603, n.o 35), compete ao requerente decidir se há que traduzir o ato em causa, cujo custo deve, de resto, suportar, em conformidade com o artigo 5.o, n.o 2, do mesmo regulamento.

25      A este propósito, importa recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, as questões relativas à interpretação do direito da União submetidas pelo juiz nacional no quadro regulamentar e factual que define sob a sua responsabilidade, e cuja exatidão não cabe ao Tribunal de Justiça verificar, gozam de uma presunção de pertinência. O Tribunal de Justiça só pode recusar pronunciar‑se sobre um pedido apresentado por um órgão jurisdicional nacional se for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal de Justiça não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas (Acórdão de 21 de dezembro de 2021, Euro Box Promotion e o., C‑357/19, C‑379/19, C‑547/19, C‑811/19 e C‑840/19, EU:C:2021:1034, n.o 139 e jurisprudência referida).

26      Por outro lado, em virtude do espírito de cooperação que rege as relações entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o Tribunal de Justiça no âmbito do processo prejudicial, a falta de certas constatações prévias da parte do órgão jurisdicional de reenvio não leva necessariamente à inadmissibilidade do pedido de decisão prejudicial, se, apesar dessas deficiências, o Tribunal de Justiça considerar, face aos elementos que resultam dos autos, estar em condições de dar uma resposta útil ao órgão jurisdicional de reenvio (Acórdão de 2 de abril de 2020, Reliantco Investments e Reliantco Investments Limassol Sucursala Bucureşti, C‑500/18, EU:C:2020:264, n.o 42 e jurisprudência referida).

27      No caso em apreço, há que constatar que o Tribunal de Justiça dispõe de elementos suficientes para fornecer uma resposta útil ao órgão jurisdicional de reenvio. Com efeito, há que salientar que resulta das observações escritas apresentadas ao Tribunal de Justiça por EW que o órgão jurisdicional de reenvio já notificou os atos processuais aos intervenientes, em 2019, que estes, em conformidade com o Regulamento n.o 1393/2007, recusaram receber com o fundamento de que estes atos eram redigidos em língua romena. Não dominando esta língua, pediram para receber os referidos atos processuais traduzidos em língua francesa.

28      Estes elementos de facto expostos por EW permitem assim completar, na medida do necessário, o quadro factual apresentado pelo órgão jurisdicional de reenvio e, deste modo, apoiam a presunção de pertinência de que beneficia a questão submetida, excluindo que esta possa ser considerada hipotética.

29      Nestas condições, o pedido de decisão prejudicial é admissível.

 Quanto ao mérito

30      Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1393/2007 deve ser interpretado no sentido de que um órgão jurisdicional que ordena a transmissão de atos judiciais a terceiros que pediram para intervir no processo deve ser considerado «requerente», na aceção desta disposição.

31      Antes de mais, importa recordar que, nos termos desta disposição, o requerente suporta as despesas de tradução que possam ter lugar previamente à transmissão do ato, sem prejuízo de eventual decisão posterior do tribunal ou autoridade competente em matéria de imputação dessas despesas.

32      A este respeito, é de notar que o Regulamento 1393/2007 não contém uma definição do conceito de «requerente».

33      Na falta de tal definição, importa interpretar o artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1393/2007 à luz do seu contexto, bem como dos objetivos prosseguidos pelo Regulamento n.o 1393/2007 (v., neste sentido, Acórdão de 16 de setembro de 2015, Alpha Bank Cyprus, C‑519/13, EU:C:2015:603, n.o 28, bem como, por analogia, quanto ao Regulamento n.o 1348/2000, Acórdão de 8 de maio de 2008, Weiss und Partner, C‑14/07, EU:C:2008:264, n.o 45). A génese de uma disposição do direito da União pode igualmente revelar elementos pertinentes para a sua interpretação (Acórdão de 10 de dezembro de 2018, Wightman e o. C‑621/18, EU:C:2018:999, n.o 47 e jurisprudência referida).

34      No que respeita, em primeiro lugar, à interpretação contextual e histórica do artigo 5.o, n.o 2, deste regulamento, importa observar que o próprio teor desta norma distingue entre o requerente, que assume as eventuais despesas de tradução prévias à transmissão do ato, e o tribunal ou a autoridade competente no Estado‑Membro de origem, que pode adotar uma eventual decisão posterior sobre a imputação dessas despesas.

35      Esta distinção entre o requerente e o órgão jurisdicional nacional chamado a decidir resulta igualmente da jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa ao Regulamento n.o 1393/2007, especialmente do Acórdão de 16 de setembro de 2015, Alpha Bank Cyprus (C‑519/13, EU:C:2015:603, n.os 41 a 43), no qual o Tribunal de Justiça sublinhou, por um lado, que incumbe ao órgão jurisdicional chamado a pronunciar‑se no Estado‑Membro de origem decidir sobre questões de natureza substancial, uma vez que opõem o requerente ao destinatário do ato e, por outro, que esse órgão jurisdicional deve assegurar que os respetivos direitos das partes interessadas, a saber o requerente e o destinatário, sejam protegidos de maneira equilibrada.

36      Uma distinção semelhante decorre do Despacho de 28 de abril de 2016, Alta Realitat (C‑384/14, EU:C:2016:316, n.o 75), no qual o Tribunal de Justiça considerou a possibilidade de, antes de iniciar o processo de citação ou de notificação do ato, o órgão jurisdicional chamado a decidir ser levado a efetuar uma primeira apreciação provisória sobre os conhecimentos linguísticos do destinatário para determinar, de acordo com o requerente, se se impõe ou não uma tradução do ato.

37      Importa igualmente salientar que o artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1393/2007 faz uma distinção equivalente à referida no n.o 34 do presente acórdão, quando dispõe que o requerente é avisado, pela entidade de origem, de que o destinatário pode recusar a receção do ato se este não estiver redigido numa das línguas previstas no artigo 8.o deste regulamento. Com efeito, as entidades de origem são, nos termos do artigo 2.o, n.o 1, do referido regulamento, os funcionários, autoridades ou outras pessoas competentes para transmitir atos judiciais ou extrajudiciais para efeitos de citação ou notificação noutro Estado‑Membro. Resulta da decisão de reenvio que, no caso em apreço, o órgão jurisdicional de reenvio age como entidade de origem.

38      Por outro lado, resulta do considerando 4 do Regulamento n.o 1393/2007 que o Regulamento n.o 1348/2000, que revogou, se baseava, essencialmente, na Convenção estabelecida com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, relativa à citação e à notificação dos atos judiciais e extrajudiciais em matérias civil e comercial nos Estados‑Membros da União Europeia, adotada por ato do Conselho da União Europeia de 26 de maio de 1997 (JO 1997, C 261, p. 1).

39      O relatório explicativo sobre esta convenção (JO 1997, C 261, p. 26), que é pertinente para fins de interpretação do Regulamento n.o 1393/2007 (v., neste sentido, Acórdão de 11 de novembro de 2015, Tecom Mican e Arias Domínguez, C‑223/14, EU:C:2015:744, n.o 40, bem como, por analogia, no que concerne o Regulamento n.o 1348/2000, Acórdão de 8 de maio de 2008, Weiss und Partner, C‑14/07, EU:C:2008:264, n.o 53), corrobora a interpretação do artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1393/2007 segundo a qual as despesas de tradução de um ato não devem ser suportadas pelo órgão jurisdicional chamado a decidir.

40      Com efeito, o comentário relativo ao artigo 5.o, n.o 2, da referida convenção, cujo teor é, em substância, idêntico ao do artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1393/2007, que figura no referido relatório explicativo, assinala que «por “requerente” se entende, em todos os casos, a parte interessada na transmissão do ato e não, pois, o tribunal».

41      Nestas circunstâncias, decorre da interpretação contextual e histórica do artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1393/2007 que, quando um órgão jurisdicional ordena a transmissão de atos judiciais a terceiros que pedem para intervir no processo, não se pode considerar que esse órgão jurisdicional seja o «requerente», na aceção desta disposição, para efeitos da assunção das eventuais despesas de tradução anteriores à transmissão desses atos.

42      Em segundo lugar, esta conclusão é corroborada pela interpretação teleológica do Regulamento n.o 1393/2007.

43      Com efeito, o Tribunal de Justiça já teve oportunidade de precisar, no que respeita aos objetivos do Regulamento n.o 1393/2007, que este visa estabelecer, como resulta do seu considerando 2, um mecanismo de citação e de notificação na União dos atos judiciais e extrajudiciais em matéria civil e comercial, na ótica do bom funcionamento do mercado interno. Assim, com o objetivo de melhorar a eficácia e a celeridade dos processos judiciais e de assegurar uma boa administração da justiça, o referido regulamento estabelece o princípio da transmissão direta dos atos judiciais e extrajudiciais entre os Estados‑Membros, o que tem por efeito simplificar e acelerar os processos (Acórdão de 16 de setembro de 2015, Alpha Bank Cyprus, C‑519/13, EU:C:2015:603, n.os 29 e 30, bem como jurisprudência referida, e Despacho de 28 de abril de 2016, Alta Realitat, C‑384/14, EU:C:2016:316, n.os 47 e 48).

44      Não obstante, o Tribunal de Justiça declarou igualmente que há que interpretar o Regulamento n.o 1393/2007 de modo a garantir, em cada caso concreto, um justo equilíbrio entre os interesses do requerente e os do destinatário do ato, através de uma conciliação dos objetivos de eficácia e de celeridade da transmissão dos atos processuais com a exigência de assegurar uma proteção adequada dos direitos de defesa do destinatário desses atos (Acórdão de 16 de setembro de 2015, Alpha Bank Cyprus, C‑519/13, EU:C:2015:603, n.o 33 bem como jurisprudência referida, e Despacho de 28 de abril de 2016, Alta Realitat, C‑384/14, EU:C:2016:316, n.o 51).

45      Além disso, o Tribunal de Justiça salientou que, embora seja essencial, por um lado, que, para que o destinatário do ato possa efetivamente exercer o seu direito de se defender, o documento em causa seja redigido numa língua que compreende, por outro, o requerente não deve sofrer as consequências negativas de uma recusa puramente dilatória e manifestamente abusiva de receção de um ato não traduzido, quando se demonstre que o seu destinatário compreende a língua em que esse ato está redigido. Assim, cabe ao órgão jurisdicional no qual o processo está pendente no Estado‑Membro de origem salvaguardar da melhor forma os interesses de cada uma das partes, em especial analisando todos os elementos de facto e de prova concludentes que demonstrem concretamente os conhecimentos linguísticos do destinatário (v., neste sentido, Despacho de 28 de abril de 2016, Alta Realitat, C‑384/14, EU:C:2016:316, n.os 78 e 79).

46      Ora, uma interpretação segundo a qual o órgão jurisdicional chamado a pronunciar‑se no Estado‑Membro de origem deve ser considerado requerente, na aceção do artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1393/2007, seria contrária à obrigação desse órgão jurisdicional de garantir um justo equilíbrio entre os interesses do requerente e os do destinatário do ato. Com efeito, o cumprimento de tal obrigação implica necessariamente que a autoridade à qual incumbe se situe numa posição de imparcialidade em relação aos interesses do requerente e aos do destinatário. Daqui resulta que esta autoridade não pode confundir‑se com um dos interessados, a saber, o requerente.

47      Tendo em conta todas as considerações precedentes, há que responder à questão submetida que o artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1393/2007 deve ser interpretado no sentido de que, quando um órgão jurisdicional ordena a transmissão de atos judiciais a terceiros que pedem para intervir no processo, esse órgão jurisdicional não pode ser considerado o «requerente», na aceção desta disposição.

 Quanto às despesas

48      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Sétima Secção) declara:

O artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1393/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de novembro de 2007, relativo à citação e à notificação dos atos judiciais e extrajudiciais em matérias civil e comercial nos EstadosMembros («citação e notificação de atos») e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1348/2000 do Conselho, deve ser interpretado no sentido de que, quando um órgão jurisdicional ordena a transmissão de atos judiciais a terceiros que pedem para intervir no processo, esse órgão jurisdicional não pode ser considerado o «requerente», na aceção desta disposição.

Assinaturas


*      Língua do processo: romeno.