Language of document : ECLI:EU:T:2023:315

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção alargada)

7 de junho de 2023 (*)

«Direito institucional — Regulamentação referente às despesas e subsídios dos deputados ao Parlamento — Subsídio de assistência parlamentar — Recuperação dos montantes indevidamente pagos — Prazo razoável — Ónus da prova — Direito de audiência — Proteção de dados pessoais — Artigo 9.o do Regulamento (UE) 2018/1725 — Artigo 26.o do Estatuto»

No processo T‑309/21,

TC, representado por D. Aukštuolytė, advogado,

recorrente,

contra

Parlamento Europeu, representado por M. Ecker e S. Toliušis, na qualidade de agentes,

recorrido,

O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção alargada),

composto, durante as deliberações, por: S. Gervasoni, presidente, L. Madise, P. Nihoul (relator), R. Frendo e J. Martín y Pérez de Nanclares, juízes,

secretário: R. Ūkelytė, administradora,

vistos os autos,

após a audiência de 30 de novembro de 2022,

profere o presente

Acórdão

1        Por petição de 24 de maio de 2021, o recorrente, TC, pediu, com base no artigo 263.o TFUE, a anulação, por um lado, da Decisão do secretário‑geral do Parlamento Europeu, de 16 de março de 2021, que declarou que existia um crédito sobre TC no montante de 78 838,21 euros indevidamente pago a título de despesas de assistência parlamentar e que ordenou a sua recuperação (a seguir «decisão recorrida») e, por outro, da nota de débito n.o 7010000523, de 31 de março de 2021 (a seguir «nota de débito»).

I.      Antecedentes do litígio e factos posteriores à interposição do recurso

A.      Antecedentes do litígio

2        O recorrente é deputado no Parlamento desde [confidencial] (1).

3        Em 22 de maio de 2015, o Parlamento, ao abrigo do artigo 5.o‑A do Regime Aplicável aos Outros Agentes da União Europeia (a seguir «ROA»), celebrou com A (a seguir «APA») um contrato de assistente parlamentar acreditado a tempo inteiro em Bruxelas (Bélgica) para efeitos da assistência do recorrente até ao fim da sétima legislatura.

4        Tendo‑se degradado a qualidade do trabalho do APA a partir de dezembro de 2015, o recorrente pediu, em 25 de fevereiro de 2016, à Autoridade Habilitada a Celebrar Contratos de Admissão no Parlamento (a seguir «AHCC») a resolução do contrato do APA por diferentes motivos que implicavam a perda de confiança, entre os quais ausências sem motivo válido e o incumprimento das regras relativas às autorizações de exercício de atividades externas.

5        Em conformidade com o artigo 139.o, n.o 3‑A, do ROA, realizou‑se uma reunião de conciliação com o APA em 31 de maio de 2016.

6        Em 15 de junho de 2016, constatou‑se que o procedimento de conciliação tinha falhado.

7        Por carta de 24 de junho de 2016, a AHCC notificou o APA da sua decisão de rescindir o contrato de assistência parlamentar em aplicação do artigo 139.o, n.o 1, alínea d), do ROA, por quebra da relação de confiança por não ter respeitado as regras relativas às autorizações de exercício de atividades externas. Em virtude, designadamente, de licenças por doença, o período de pré‑aviso foi prorrogado várias vezes, pelo que o contrato do APA só terminou em 22 de novembro de 2016.

8        Em 14 de abril de 2017, o APA interpôs recurso de anulação da Decisão de 24 de junho de 2016 no Tribunal Geral.

9        Por Acórdão de 7 de março de 2019, L/Parlamento (T‑59/17, EU:T:2019:140, n.os 35 a 45), o Tribunal Geral anulou a Decisão do Parlamento de 24 de junho de 2016. Com efeito, o Tribunal Geral constatou que resultava dos autos que, não só o recorrente tinha conhecimento das atividades externas do APA, como, além disso, estas ocorreram por sua iniciativa direta. Por conseguinte, o Tribunal Geral considerou que o fundamento apresentado pela AHCC para justificar a decisão de rescisão, a saber, a quebra da relação de confiança, não se afigurava plausível. Segundo o Tribunal Geral, a AHCC tinha, portanto, cometido um erro manifesto de apreciação ao dar seguimento ao pedido de rescisão do contrato do APA formulado pelo recorrente com esse fundamento. Este não era parte na instância nesse processo.

10      Segundo o n.o 32 do referido acórdão, as atividades externas irregularmente exercidas pelo APA eram, segundo as afirmações deste último, não impugnadas pelo Parlamento, as seguintes:

–        «em primeiro lugar, a apresentação de pedidos de asilo político às autoridades russas, francesas, suíças e de Andorra, para permitir ao deputado europeu evitar uma pena de quatro anos de prisão aplicada em [confidencial], destacando‑se um recurso de uma decisão de recusa de asilo político relativa a este último para o qual o recorrente afirma, nomeadamente, ter sido mandatado pelo referido deputado;

–        em segundo lugar, a intermediação e a representação como advogado de nacionais [confidencial] na reforma ou a receber [confidencial] na reforma ou a receber o salário mínimo, no âmbito de litígios instaurados perante os órgãos jurisdicionais [confidencial], a fim de apresentar este deputado como um “defensor dos direitos humanos” e tornar assim mais difícil a sua prisão;

–        em terceiro lugar, a representação do mesmo deputado perante o Provedor de Justiça Europeu, o Comité dos Direitos do Homem das Nações Unidas e o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, nos processos respeitantes a esse deputado, relativos, em primeiro lugar, nomeadamente, à contestação do pedido de levantamento de imunidade parlamentar apresentado pelas autoridades [confidencial], na sequência da pena de prisão aplicada ao deputado em questão em [confidencial] e, em segundo lugar, à contestação de uma prisão domiciliária decretada pelas autoridades judiciais [confidencial] na sequência de um processo penal por corrupção instaurado contra o deputado em questão.»

11      Por carta de 8 de junho de 2020, redigida em inglês e enviada por mensagem de correio eletrónico de 30 de julho de 2020, na sequência de uma primeira notificação infrutífera em 22 de junho de 2020, e por carta de 3 de setembro de 2020, redigida em lituano e enviada por mensagem de correio eletrónico de 4 de setembro de 2020, o secretário‑geral do Parlamento informou o recorrente da abertura de um processo de recuperação de montantes indevidamente pagos, nos termos do artigo 68.o da Decisão da Mesa do Parlamento de 19 de maio e 9 de julho de 2008, que define as medidas de aplicação do Estatuto dos Deputados ao Parlamento Europeu (JO 2009, C 159, p. 1, a seguir «MAE»), no montante total de 78 838,21 euros, relativo à assistência parlamentar prestada ao recorrente pelo APA. Nessa mesma carta, o recorrente foi convidado, em conformidade com o artigo 68.o, n.o 2, das MAE, a apresentar, no prazo de dois meses, observações e elementos de prova destinados a refutar as conclusões preliminares do Parlamento sobre as atividades externas que o APA tinha exercido tanto quanto era do seu conhecimento e sob a sua direção de 22 de maio de 2015 a 22 de novembro de 2016 e a provar que, durante esse mesmo período, o APA tinha efetivamente exercido funções de assistente parlamentar acreditado.

12      Em anexo à carta de 3 de setembro de 2020 figuravam uma cópia do Acórdão de 7 de março de 2019, L/Parlamento (T‑59/17, EU:T:2019:140), e o cômputo dos montantes pagos pelo Parlamento ao APA. Esse cômputo era feito do seguinte modo: relativamente ao ano de 2015, 35 003,84 euros a título de remunerações e encargos sociais e 1 369,60 euros a título de despesas de viagem e, relativamente ao ano de 2016, 42 025,57 euros a título de remunerações e encargos sociais e 439,20 euros a título de despesas de viagem.

13      Por mensagem de correio eletrónico de 4 de agosto de 2020, o recorrente pediu ao Parlamento que lhe transmitisse:

–        o processo individual do APA no Parlamento (todos os documentos relacionados com o seu recrutamento e trabalho), incluindo as informações relativas ao número de vezes que a proteção do Parlamento tinha sido solicitada por esse APA e os dados relativos à presença deste (dados do seu cartão de acesso ao Parlamento);

–        cópias da correspondência trocada com os representantes do Parlamento sobre o trabalho do APA;

–        os autos completos do processo que deu origem ao Acórdão de 7 de março de 2019, L/Parlamento (T‑59/17, EU:T:2019:140).

14      Em 22 de setembro de 2020, o recorrente recordou esse pedido ao Parlamento e, além disso, reclamou‑lhe o protocolo do procedimento de conciliação entre ele próprio e o APA em lituano, bem como a cópia de «todas as mensagens de correio eletrónico de 2015, 2016 e 2019».

15      Por mensagem de correio eletrónico de 27 de outubro de 2020, o Parlamento transmitiu ao recorrente diversos documentos relativos ao fim do contrato do APA.

16      Por mensagem de correio eletrónico de 29 de outubro de 2020, o recorrente enviou ao Parlamento as suas observações preliminares, bem como um determinado número de documentos, sublinhando que ainda não tinha recebido do Parlamento as informações e os documentos detalhados relativos ao período de emprego do APA e que ainda não tinha podido examinar as poucas informações que lhe tinham sido fornecidas por mensagem de correio eletrónico de 27 de outubro de 2020. Por conseguinte, pediu para comunicar posteriormente outras informações e elementos de prova.

17      Por mensagem de correio eletrónico de 20 de novembro de 2020, o recorrente solicitou novamente ao Parlamento as informações que tinha pedido através dos seus correios eletrónicos de 4 de agosto e de 22 de setembro de 2020, em especial os dados relativos ao acesso do APA ao Parlamento e a cópia das mensagens de correio eletrónico de 2015, 2016 e 2019.

18      Por mensagem de correio eletrónico de 24 de novembro de 2020, o recorrente transmitiu ao Parlamento observações e elementos de prova complementares aos que lhe tinha enviado em 29 de outubro.

19      Por mensagem de correio eletrónico de 27 de novembro de 2020, o diretor‑geral das Finanças do Parlamento (a seguir «diretor‑geral das Finanças») informou o recorrente de que o prazo que lhe tinha sido fixado para apresentar as suas observações e os seus elementos de prova no âmbito do procedimento de recuperação regulado pelo artigo 68.o das MAE tinha expirado em 4 de novembro, mas que, se pretendesse tomar conhecimento de informações relativas ao APA, podia dirigir‑se a duas pessoas cujo endereço eletrónico fornecia, sem que esses pedidos pudessem ter incidência no referido procedimento.

20      Por carta enviada ao Parlamento em 1 de dezembro de 2020, o recorrente contestou as afirmações constantes da mensagem de correio eletrónico de 27 de novembro de 2020. Por outro lado, enviou os seus pedidos de documentos às pessoas mencionadas nessa mensagem de correio eletrónico.

21      Por carta de 8 de janeiro de 2021, o diretor‑geral das Finanças transmitiu ao recorrente o protocolo relativo ao procedimento de conciliação em lituano, mas recusou‑lhe o acesso aos outros documentos pedidos.

22      Além disso, observando que o prazo concedido ao recorrente para apresentar as suas observações tinha expirado em 4 de novembro de 2020, sem que este tivesse pedido uma prorrogação desse prazo, o diretor‑geral das Finanças concedeu‑lhe um prazo de 15 dias para apresentar observações complementares.

23      Em 21 de janeiro de 2021, o recorrente apresentou observações complementares ao Parlamento.

24      Na decisão recorrida, o secretário‑geral do Parlamento considerou que o montante de 78 838,21 euros tinha sido indevidamente assumido por esta instituição no âmbito da relação de emprego do APA no período compreendido entre 22 de maio de 2015 e 22 de novembro de 2016 e que devia ser recuperado junto do recorrente em aplicação do artigo 68.o, n.o 1, das MAE.

25      Em 31 de março de 2021, o diretor‑geral das Finanças emitiu, na sua qualidade de gestor orçamental delegado, a nota de débito, ordenando a recuperação do montante de 78 838,21 euros ao recorrente e solicitando o pagamento desse montante até 30 de maio de 2021.

26      Na mesma data, o diretor‑geral das Finanças comunicou ao recorrente a decisão recorrida e a nota de débito.

B.      Factos posteriores à interposição do presente recurso

27      Na sequência de uma fiscalização efetuada no contexto do presente processo, verificou‑se que, em março de 2016, o Parlamento tinha decidido suspender o pagamento das remunerações e das despesas de viagem do APA a partir de 1 de abril de 2016.

28      Consequentemente, em 8 de novembro de 2022, o secretário‑geral do Parlamento decidiu revogar a decisão recorrida ex tunc na medida em que ordenava, relativamente ao período compreendido entre 1 de abril e 22 de novembro de 2016, a recuperação do montante de 27 644,47 euros a título de remunerações e encargos sociais e do montante de 439,20 euros a título de despesas de viagem, ou seja, um montante total de 28 083,67 euros (a seguir «Decisão de 8 de novembro de 2022»). Em 15 de novembro de 2022, foi emitida uma nota de crédito com o número 7120000068 pelo mesmo montante.

29      Em 15 de novembro de 2022, a Decisão de 8 de novembro de 2022 e a nota de crédito n.o 7120000068 foram notificadas ao recorrente pelo diretor‑geral das Finanças.

II.    Tramitação do processo e pedidos das partes

30      O recorrente pede que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão recorrida;

–        anular a nota de débito;

–        condenar o Parlamento nas despesas.

–        ouvir B e C na qualidade de testemunhas.

31      O Parlamento pede que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao presente recurso por improcedente;

–        condenar o recorrente nas despesas;

–        indeferir o pedido de diligência de instrução, e

32      Por requerimento separado de 16 de novembro de 2022, o Parlamento conclui pedindo, com base no artigo 130.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, que o Tribunal Geral se digne:

–        declarar que uma parte do objeto do recurso deixou de existir e que já não há que decidir sobre a parte da decisão recorrida que foi revogada, na medida em que, relativamente ao período compreendido entre 1 de abril e 22 de novembro de 2016, um montante de 27 644,47 euros para as remunerações e os encargos sociais e um montante de 439,20 euros para as despesas de viagem foram considerados indevidamente pagos pelo Parlamento a favor do APA e em que foi ordenada a recuperação desses montantes;

–        decidir que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas no que respeita à parte do objeto do litígio que deixou de existir.

33      A pedido do Tribunal Geral, o recorrente apresentou as suas observações sobre este requerimento na audiência de 30 de novembro de 2022.

34      Em 22 de novembro de 2022, o recorrente transmitiu ao Tribunal Geral o depoimento escrito de B, recolhido em 18 de novembro.

35      Na audiência, o Parlamento sustentou que esta nova prova era inadmissível pelo facto de, contrariamente às exigências do artigo 85.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, ter sido apresentada após a troca de articulados, sem que o recorrente tivesse justificado esse atraso na apresentação.

III. Questão de direito

A.      Quanto ao não conhecimento parcial do mérito

36      Como acima resulta do n.o 32, o Parlamento pede ao Tribunal Geral que declare que o recurso ficou sem objeto e que já não há que conhecer da legalidade da decisão recorrida, na medida em que diz respeito às remunerações, aos encargos sociais e às despesas de viagem que foram pagos ao APA no período compreendido entre 1 de abril e 22 de novembro de 2016 num montante global de 28 083,67 euros.

37      Na audiência, o recorrente observou que os montantes indicados na Decisão de 8 de novembro de 2022 não tinham qualquer justificação e pediu ao Tribunal que se pronunciasse sobre a legalidade da decisão recorrida, na íntegra.

38      A este respeito, há que recordar que, segundo jurisprudência assente, o objeto do litígio deve perdurar, tal como o interesse em agir, até à prolação da decisão jurisdicional, sob pena de não conhecimento do mérito, o que pressupõe que o recurso possa, pelo seu resultado, conferir um benefício à parte que o interpôs (v. Acórdão de 7 de junho de 2007, Wunenburger/Comissão, C‑362/05 P, EU:C:2007:322, n.o 42 e jurisprudência referida).

39      O desaparecimento do objeto do litígio pode resultar designadamente da revogação ou da substituição do ato recorrido no decurso da instância (v. Despacho de 12 de janeiro de 2011, Terezakis/Comissão, T‑411/09, EU:T:2011:4, n.o 15 e jurisprudência referida).

40      No caso em apreço, em virtude da Decisão de 8 de novembro de 2022, há que considerar que o objeto do recurso se extinguiu na medida em que visava a anulação da decisão recorrida e da nota de débito na parte em que ordenavam o reembolso pela recorrente de um montante de 28 083,67 euros por remunerações, encargos sociais e despesas de viagem pagos ao APA no período compreendido entre 1 de abril e 22 de novembro de 2016.

41      A este respeito, é indiferente o facto de os montantes indicados na Decisão de 8 de novembro de 2022 não se apoiarem em nenhum documento justificativo.

42      Por conseguinte, importa constatar que, como descrito, o recurso de anulação ficou sem objeto e que não há que decidir sobre a legalidade da decisão recorrida e da nota de débito.

B.      Quanto ao mérito do recurso de anulação

43      O recorrente invoca cinco fundamentos, relativos, respetivamente:

–        à violação do princípio do prazo razoável, consagrado no artigo 41.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;

–        ao direito de audiência, ao direito de acesso ao processo e ao dever de fundamentação, conforme previsto no artigo 41.o, n.o 2, da Carta dos Direitos Fundamentais;

–        ao erro de apreciação e incumprimento do dever de fundamentação, dado que o Parlamento não tomou em consideração os elementos que forneceu em resposta à carta de 3 de setembro de 2020 nas suas observações de 29 de outubro, de 24 de novembro de 2020 e de 21 de janeiro de 2021;

–        à violação do dever de fundamentação no que respeita à determinação do montante a recuperar;

–        o facto de os anexos A.3 a A.21, que apresentou, demonstrarem que, contrariamente ao que resulta da decisão recorrida, o APA exerceu as suas funções de assistente parlamentar pelo menos até 15 de dezembro de 2015.

44      Antes de examinar estes fundamentos, há que expor as regras relativas à assunção das despesas de assistência parlamentar e à recuperação dos montantes indevidamente pagos a esse título.

1.      Quanto às regras relativas à assunção das despesas de assistência parlamentar e à recuperação dos montantes indevidamente pagos a esse título

45      O artigo 33.o das MAE prevê que os deputados têm direito a ser assistidos por colaboradores pessoais da sua livre escolha.

46      Segundo a mesma disposição, o Parlamento assume as despesas efetivamente contraídas que decorram, integral e exclusivamente, da admissão de um ou mais assistentes em conformidade com as MAE, entendendo‑se que apenas poderão ser assumidas as despesas que correspondam à assistência necessária e diretamente associada ao exercício do mandato parlamentar dos deputados.

47      O artigo 62.o das MAE precisa que os pagamentos cobertos por estas são reservados exclusivamente ao financiamento de atividades ligadas ao exercício do mandato dos deputados e não podem cobrir despesas pessoais nem financiar subvenções ou donativos de caráter político.

48      O artigo 68.o das MAE dispõe que qualquer montante indevidamente pago em aplicação destas dá lugar a repetição e que o secretário‑geral do Parlamento dá instruções para a recuperação desses montantes junto do deputado em questão, tendo este sido previamente ouvido pelo secretário‑geral.

49      Do artigo 33.o das MAE, cujo conteúdo foi acima descrito nos n.os 45 e 46, o Tribunal Geral deduziu que a definição do conceito de assistência parlamentar não era da discricionariedade dos deputados (v., neste sentido, Acórdãos de 14 de julho de 2021, Rochefort/Parlamento, T‑171/20, não publicado, EU:T:2021:438, n.o 45, e de 8 de setembro de 2021, Griesbeck/Parlamento, T‑10/21, não publicado, EU:T:2021:542, n.o 39).

50      Segundo o Tribunal Geral, daqui resulta que a realidade das prestações fornecidas pelos assistentes ao Parlamento deve ser demonstrada pelo deputado em questão (v., neste sentido, Acórdão de 8 de setembro de 2021, Griesbeck/Parlamento, T‑10/21, não publicado, EU:T:2021:542, n.o 40 e jurisprudência referida).

51      Em caso de fiscalização da utilização das despesas de assistência parlamentar, o deputado em questão deve, portanto, poder provar que os montantes recebidos foram utilizados para cobrir as despesas efetivamente contraídas que decorram, integral e exclusivamente, da admissão de um ou mais assistentes, como prevê o artigo 33.o das MAE (Acórdão de 14 de julho de 2021, Rochefort/Parlamento, T‑171/20, não publicado, EU:T:2021:438, n.o 47; v., igualmente, Acórdão de 8 de setembro de 2021, Griesbeck/Parlamento, T‑10/21, não publicado, EU:T:2021:542, n.o 41 e jurisprudência referida).

52      Neste contexto, o deputado deve, designadamente, apresentar os documentos comprovativos referentes às atividades do APA e, por conseguinte, conservá‑los, mesmo na falta de uma obrigação expressa nesse sentido decorrente do direito da União Europeia (v., neste sentido, Acórdãos de 14 de julho de 2021, Rochefort/Parlamento, T‑171/20, não publicado, EU:T:2021:438, n.o 47, e de 8 de setembro de 2021, Griesbeck/Parlamento, T‑10/21, não publicado, EU:T:2021:542, n.o 41 e jurisprudência referida).

53      Esta jurisprudência do Tribunal Geral foi confirmada pelo Tribunal de Justiça, segundo o qual compete aos deputados que pedem o pagamento financeiro, pelo Parlamento, das despesas relativas à assistência de colaboradores pessoais provar que essas despesas foram efetivamente efetuadas e correspondem à assistência necessária e diretamente ligada ao exercício do mandato. Assim, esse deputado deve, em resposta a um pedido nesse sentido da autoridade competente do Parlamento, apresentar todos os elementos de prova de que dispõe, suscetíveis de demonstrar a realidade do trabalho efetuado pelo seu assistente, bem como a relação desse trabalho com o exercício do seu mandato. (v., neste sentido, Despachos de 21 de março de 2019, Gollnisch/Parlamento, C‑330/18 P, não publicado, EU:C:2019:240, n.os 63, 64 e 88, e de 21 de maio de 2019, Le Pen/Parlamento, C‑525/18 P, não publicado, EU:C:2019:435, n.os 37 e 82 e jurisprudência referida).

2.      Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do princípio do prazo razoável

54      Com o primeiro fundamento, o recorrente sustenta, nomeadamente, que, ao adotar a decisão recorrida, o Parlamento violou o princípio do respeito do prazo razoável enunciado no artigo 41.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais e consagrado no artigo 98.o, n.o 2, do Regulamento (UE, Euratom) 2018/1046 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de julho de 2018, relativo às disposições financeiras aplicáveis ao orçamento geral da União, que altera os Regulamentos (UE) n.o 1296/2013 (UE) n.o 1301/2013 (UE) n.o 1303/2013, UE n.o 1304/2013 (UE) n.o 1309/2013 (UE) n.o 1316/2013 (UE) n.o 223/2014 e (UE) n.o 283/2014, e a Decisão n.o 541/2014/UE, e revoga o Regulamento (UE, Euratom) n.o 966/2012 (JO 2018, L 193, p. 1, a seguir «Regulamento Financeiro»).

55      No caso em apreço, a ultrapassagem do prazo razoável decorre do facto de o Parlamento ter baseado a decisão recorrida em dados do processo que deu origem ao Acórdão de 7 de março de 2019, L/Parlamento (T‑59/17, EU:T:2019:140), relativamente ao qual a petição tinha sido apresentada em 14 de abril de 2017. Ora, só em 30 de julho ou 3 de setembro de 2020, ou seja, mais de três anos mais tarde, é que o Parlamento lhe pediu as suas observações sobre a recuperação prevista.

56      O Parlamento contesta esta argumentação.

57      A este respeito, importa recordar que o artigo 41.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais prevê que todas as pessoas têm direito a que os seus assuntos sejam tratados pelas instituições, órgãos e organismos da União de forma imparcial, equitativa e num prazo razoável. Esta disposição enuncia assim o princípio do respeito do prazo razoável, que faz parte integrante do direito a uma boa administração.

58      Segundo jurisprudência constante, o respeito de um prazo razoável é exigido em todos os casos nos quais, no silêncio dos textos legais, os princípios da segurança jurídica ou da proteção da confiança legítima obstem a que as instituições da União e as pessoas singulares ou coletivas atuem sem qualquer limite temporal, podendo assim, nomeadamente, pôr em perigo a estabilidade de situações jurídicas adquiridas (Acórdão de 5 de outubro de 2004, Eagle e o./Comissão, T‑144/02, EU:T:2004:290, n.o 57; v., igualmente, Acórdão de 12 de julho de 2012, Comissão/Nanopoulos, T‑308/10 P, EU:T:2012:370, n.o 76 e jurisprudência referida). Quando a administração atua no prazo que lhe é especificamente fixado por um diploma, ninguém pode alegar validamente que não foram respeitadas as exigências que decorrem do direito a que os seus assuntos sejam tratados num prazo razoável, consagrado no artigo 41.o da Carta.

59      Recorde‑se que, na regulamentação anterior à que é aplicável no caso em apreço, a saber, o Regulamento (UE, Euratom) n.o 966/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2012, relativo às disposições financeiras aplicáveis ao orçamento geral da União e que revoga o Regulamento (CE, Euratom) n.o 1605/2002 do Conselho (JO 2012, L 298, p. 1), e o Regulamento Delegado (UE) n.o 1268/2012 da Comissão, de 29 de outubro de 2012, sobre as normas de execução do Regulamento n.o 966/2012 (JO 2012, L 362, p. 1), não havia nenhuma disposição que previsse um prazo para o envio da nota de débito ao devedor.

60      Foi por esta razão que o Tribunal de Justiça aplicou, no Acórdão de 14 de junho de 2016, Marchiani/Parlamento (C‑566/14 P, EU:C:2016:437), o princípio do respeito do prazo razoável para apreciar o tempo que foi necessário para enviar a nota de débito ao devedor.

61      Todavia, a regulamentação foi alterada na sequência deste último acórdão através da introdução das disposições constantes do artigo 98.o, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento Financeiro, que passou a prever:

«O gestor orçamental envia a nota de débito imediatamente após ter apurado o crédito e, o mais tardar, no prazo de cinco anos a contar da data em que a instituição da União ficou, em circunstâncias normais, em condições de exigir o seu crédito. Esse prazo não é aplicável quando o gestor orçamental competente estabelece que, apesar dos esforços que a instituição da União fez, a demora de atuação foi causada pela conduta do devedor.»

62      Uma vez que esta disposição foi adotada, ao contrário daquilo que o recorrente sustenta erradamente, já não há que recorrer ao princípio do respeito do prazo razoável para apreciar o tempo que foi necessário para lhe enviar a nota de débito. Em contrapartida, há que perguntar se, em conformidade com esta disposição, o Parlamento enviou a nota de débito ao recorrente, por um lado, imediatamente após o apuramento do crédito e, por outro, nos cinco anos que se seguiram ao momento em que passou a estar em condições de exigir o seu crédito.

63      Quanto ao primeiro período de tempo, há que salientar que a nota de débito foi enviada ao recorrente em 31 de março de 2021, embora o crédito do Parlamento tivesse sido apurado no dia 16 de março, na decisão recorrida. Nestas condições, pode considerar‑se que a nota de débito foi enviada ao recorrente imediatamente após o apuramento do crédito em conformidade com o artigo 98.o, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento Financeiro.

64      Quanto ao segundo período de tempo, há que observar que as partes não estão de acordo quanto ao momento em que o Parlamento passou a estar em condições de exigir o seu crédito na aceção do artigo 98.o, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento Financeiro. Enquanto o recorrente considera que esse momento coincide com a apresentação da petição pelo APA no processo que deu origem ao Acórdão de 7 de março de 2019, L/Parlamento (T‑59/17, EU:T:2019:140), ou seja, em 14 de abril de 2017, o Parlamento considera que só pôde invocar o seu crédito a partir da data da prolação do acórdão naquele processo, ou seja, em 7 de março de 2019.

65      Tendo a nota de débito sido enviada ao recorrente em 31 de março de 2021, não se pode deixar de observar que, independentemente de qual seja o início do decurso do prazo previsto no artigo 98.o, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento Financeiro, seja a apresentação da petição no processo que deu origem ao Acórdão de 7 de março de 2019, L/Parlamento (T‑59/17, EU:T:2019:140), que ocorreu no 14 de abril de 2017, ou a prolação desse acórdão, o Parlamento respeitou o período de tempo previsto nesta disposição.

66      O argumento do recorrente e, portanto, o primeiro fundamento devem ser julgados improcedentes.

3.      Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do direito de audiência, do direito de acesso ao processo e do dever de fundamentação, conforme previstos no artigo 41.o, n.o 2, da Carta dos Direitos Fundamentais

67      O recorrente sustenta que o Parlamento violou o seu direito de audiência e o seu direito de acesso ao processo, previstos no artigo 41.o, n.o 2, da Carta dos Direitos Fundamentais, pelo facto de se ter referido, na decisão recorrida, às conclusões do Acórdão de 7 de março de 2019, L/Parlamento (T‑59/17, EU:T:2019:140), sem lhe comunicar os elementos de prova, em especial uma nota do APA de 9 de maio de 2016, que sustentavam essas conclusões.

68      A este respeito, o recorrente sublinha que não interveio no processo que deu origem ao Acórdão de 7 de março de 2019, L/Parlamento (T‑59/17, EU:T:2019:140), quer como parte quer como testemunha, que o Parlamento não impugnou os referidos elementos de prova no Tribunal Geral e que não lhe pediu as suas observações quanto a estes.

69      Por outro lado, o recorrente considera que, na sua carta de 8 de janeiro de 2021, o Parlamento invocou erradamente o artigo 9.o do Regulamento (UE) 2018/1725 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2018, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais pelas instituições e pelos órgãos e organismos da União e à livre circulação desses dados, e que revoga o Regulamento (CE) n.o 45/2001 e a Decisão 1247/2002/CE (JO 2018, L 295, p. 39), para lhe recusar o acesso aos elementos de prova que tinha pedido. O direito à proteção dos dados pessoais não é absoluto e deve ser ponderado com outros direitos fundamentais, em conformidade com o princípio da proporcionalidade. No caso em apreço, o seu direito à informação baseia‑se nos considerandos 21 e 28, bem como no artigo 9.o, n.os 1 e 3, do Regulamento 2018/1725. Uma vez que a recuperação dos montantes pagos a título de despesas de assistência parlamentar constitui uma questão de interesse público, o recorrente pode ter acesso a dados pessoais, a fim de apreciar a justeza da recuperação dos montantes em causa e de apresentar observações ao Parlamento.

70      No mesmo sentido, o recorrente indica, no âmbito do primeiro fundamento, que foi privado da possibilidade de apresentar elementos de prova contra as alegações do Parlamento. As mensagens de correio eletrónico trocadas com o APA no período compreendido entre 22 de maio de 2015 e 25 de fevereiro de 2016, que teriam permitido apresentar o essencial das provas do trabalho fornecido por este ao Parlamento, em relação com a sua função de deputado, foram apagados devido à política aplicada pelo Parlamento, que, em princípio, limita a conservação das referidas mensagens de correio eletrónico a 90 dias. Além de esta política ter mudado em maio de 2019 e de não ter sido disso informado, o recorrente considera que não lhe podia ser pedido que guardasse as suas próprias mensagens de correio eletrónico, porque não era seu proprietário, como resulta do artigo 17.o e do artigo 18.o, n.o 1, do Estatuto dos Funcionários da União Europeia (a seguir «Estatuto») e das regras que regem o acesso do Secretariado do Parlamento ao sistema de correio eletrónico e à sua utilização, aprovadas pelo secretário‑geral do Parlamento em 19 de fevereiro de 2018. Considera igualmente que tal conservação constitui uma violação das obrigações de confidencialidade e uma violação da segurança das informações.

71      Além disso, ainda no âmbito do primeiro fundamento, o recorrente põe em causa, à luz do considerando 22 do Regulamento 2018/1725, a política de conservação das mensagens de correio eletrónico em vigor no Parlamento, uma vez que esta instituição não teve em conta, na execução dessa política, a necessidade de os deputados se defenderem das acusações que eventualmente lhes sejam dirigidas.

72      O Parlamento contesta a admissibilidade e a procedência desta argumentação.

a)      Quanto à admissibilidade da argumentação do recorrente na parte em que se refere à carta de 8 de janeiro de 2021

73      O Parlamento alega que, na medida em que se refere à carta de 8 de janeiro de 2021, a argumentação do recorrente é extemporânea. O recorrente não pode, através do seu recurso de anulação da decisão recorrida e da nota de débito, pôr em causa a resposta que lhe foi dada pelo diretor‑geral das Finanças na sua carta de 8 de janeiro de 2021, uma vez que o prazo de dois meses previsto no artigo 263.o, sexto parágrafo, TFUE já tinha expirado.

74      A este respeito, importa recordar que, segundo jurisprudência constante, só as medidas que produzem efeitos jurídicos vinculativos suscetíveis de afetar os interesses do recorrente, alterando de forma caracterizada a sua situação jurídica, constituem atos suscetíveis de recurso de anulação na aceção do artigo 263.o TFUE (Acórdão de 11 de novembro de 1981, IBM/Comissão, 60/81, EU:C:1981:264, n.o 9; v., igualmente, Despacho de 16 de junho de 2021, Green Power Technologies/Comissão e Entreprise commune ECSEL, T‑533/20, não publicado, EU:T:2021:375, n.o 26 e jurisprudência referida).

75      Quando se trata de atos ou de decisões cuja elaboração se efetua em várias fases, nomeadamente no termo de um procedimento interno, só constituem atos lesivos e, como tais, impugnáveis as medidas que fixam definitivamente a posição da instituição no termo desse procedimento, com exclusão dos atos preparatórios da decisão final. Só no âmbito de um recurso dirigido contra a decisão tomada no termo desse procedimento é que um recorrente pode alegar, a título incidental, a irregularidade de tais atos preparatórios (Acórdão de 11 de novembro de 1981, IBM/Comissão, 60/81, EU:C:1981:264, n.o 10; v., igualmente, Despacho de 20 de janeiro de 2021, ZU/SEAE, C‑266/20 P, não publicado, EU:C:2021:42, n.o 12 e jurisprudência referida).

76      No caso em apreço, o recurso de anulação é interposto, tendo em conta o não conhecimento parcial do mérito, acima declarado no n.o 42, da decisão do secretário‑geral do Parlamento que ordenou a recuperação do montante de 50 754,54 euros junto do recorrente e da nota de débito que lhe deu seguimento, que constituem o termo do processo de recuperação e, portanto, os atos lesivos contra os quais o recurso foi interposto.

77      Ora, no âmbito do procedimento que devia conduzir à adoção da decisão recorrida e da nota de débito, o recorrente pediu ao Parlamento, como foi acima indicado nos n.os 13, 14 e 17, a apresentação de documentos que considerava necessários para demonstrar que o APA tinha efetivamente exercido funções de assistente parlamentar acreditado durante o período compreendido entre 22 de maio de 2015 e 22 de novembro de 2016.

78      Nestas condições, a resposta a esse pedido, que figura na carta de 8 de janeiro de 2021, inscreve‑se no âmbito do procedimento de recuperação dos montantes indevidamente pagos e pode ter influenciado o desfecho do referido procedimento.

79      Consequentemente, em conformidade com a jurisprudência acima referida no n.o 75, o recorrente pode invocar no âmbito do presente recurso as irregularidades que, em seu entender, afetam a carta de 8 de janeiro de 2021.

80      Por conseguinte, há que considerar que a argumentação do recorrente relativa à carta de 8 de janeiro de 2021 é admissível.

b)      Quanto ao mérito da argumentação do recorrente

81      Nos termos do artigo 41.o, n.o 2, alínea a), da Carta dos Direitos Fundamentais, o direito a uma boa administração compreende, nomeadamente, o direito de qualquer pessoa ser ouvida antes de a seu respeito ser tomada qualquer medida individual que a afete desfavoravelmente.

82      No contexto dos procedimentos de recuperação de montantes indevidamente pagos em aplicação das MAE, o direito de audiência é garantido, de forma especial, pelo artigo 68.o, n.o 2, das referidas medidas, que dispõe que o deputado interessado deve ser ouvido antes da adoção de qualquer decisão nesta matéria.

83      Em conformidade com jurisprudência constante, o direito de audiência garante a qualquer pessoa a possibilidade de dar a conhecer, de maneira útil e efetiva, o seu ponto de vista ao longo do procedimento administrativo e antes da adoção de qualquer decisão suscetível de afetar desfavoravelmente os seus interesses (v. Acórdão de 4 de abril de 2019, OZ/BEI, C‑558/17 P, EU:C:2019:289, n.o 53 e jurisprudência referida).

84      Para determinar se essas regras foram respeitadas no caso em apreço, há que examinar as diligências efetuadas pelas partes durante o procedimento que conduziu à adoção da decisão recorrida e da nota de débito.

85      No caso em apreço, por carta de 3 de setembro de 2020, o secretário‑geral do Parlamento, após ter exposto os elementos que justificavam a abertura do procedimento de recuperação em causa, convidou o recorrente a demonstrar que o APA tinha exercido funções de assistente parlamentar acreditado no período compreendido entre 22 de maio de 2015 e 22 de novembro de 2016.

86      Nessa data, o recorrente já não dispunha, porém, das mensagens de correio eletrónico trocadas com o APA durante o período compreendido entre 22 de maio de 2015 e 25 de fevereiro de 2016, que eram suscetíveis de fornecer o essencial da prova pedida pelo secretário‑geral do Parlamento. Com efeito, essas mensagens tinham sido apagadas devido à política de conservação das mensagens de correio eletrónico do Parlamento. De acordo com esta política, as mensagens de correio eletrónico contidas nas pastas «Inbox», «Sent Items», «Deleted Items», «Junk E‑mail» e «Drafts» são, em princípio, eliminadas ao fim de 90 dias.

87      Para estar em condições de apresentar as provas reclamadas, o recorrente, por mensagens de correio eletrónico de 4 de agosto, 22 de setembro e 20 de novembro de 2020, pediu ao Parlamento que lhe comunicasse diversos documentos:

–        a ata, em lituano, do procedimento de conciliação entre ele próprio e o APA;

–        uma cópia de «todas as mensagens de correio eletrónico de 2015, 2016 e 2019»;

–        uma cópia da correspondência que trocou com os representantes do Parlamento relativamente ao trabalho do APA;

–        os autos completos do processo que deu origem ao Acórdão de 7 de março de 2019, L/Parlamento (T‑59/17, EU:T:2019:140);

–        o processo individual do APA no Parlamento (todos os documentos relacionados com o seu recrutamento e o seu trabalho), incluindo as informações relativas ao número de vezes que a proteção do Parlamento tinha sido solicitada por este APA e os dados relativos à sua presença que podiam ser extraídos do seu cartão de acesso ao Parlamento (v. n.os 13, 14 e 17, supra).

88      O primeiro pedido foi aceite pelo Parlamento e foi transmitida ao recorrente uma cópia da ata em questão. Em contrapartida, os pedidos relativos às outras categorias de documentos foram indeferidos, sem prejuízo dos documentos relativos ao fim do contrato do APA, transmitidos por mensagem de correio eletrónico de 27 de outubro de 2020 (v. n.o 15, supra). Como resulta dos autos, o indeferimento ocorreu em 8 de janeiro de 2021, ou seja, cinco meses após o primeiro pedido do recorrente.

89      A este respeito, importa recordar que, por força das regras sobre produção de prova acima recordadas nos n.os 49 a 53, em caso de dúvida sobre o caráter regular da utilização das despesas de assistência parlamentar pagas a favor de um APA, é ao parlamentar que incumbe demonstrar que esse APA trabalhou para si, no âmbito do seu mandato parlamentar, durante todo o período durante o qual que essas despesas foram pagas.

90      Quando é convidado a apresentar essa prova, o parlamentar tem de comunicar ao Parlamento, no prazo concedido, os elementos que se encontram na sua posse. Se outros elementos parecerem pertinentes, o parlamentar pode pedir a respetiva comunicação às instituições, aos organismos e às agências da União que deles disponham, com fundamento no direito de audiência, desde que digam respeito aos dados de que necessita para poder formular as suas observações de forma útil e efetiva sobre a medida de recuperação prevista. Se o Parlamento receber semelhante pedido, não pode deixar de fornecer os dados reclamados sob pena de violar o direito de audiência, salvo se invocar, em apoio dessa recusa, motivos que podem ser considerados justificados à luz, por um lado, das circunstâncias do caso concreto e, por outro, das regras aplicáveis.

91      Importa, portanto, perguntar se, no caso em apreço, os fundamentos invocados pelo Parlamento na sua carta de 8 de janeiro de 2021 para não comunicar os dados solicitados pelo recorrente são justificados.

1)      Quanto aos fundamentos invocados pelo Parlamento para indeferir o pedido do recorrente relativo à comunicação de «todas as mensagens de correio eletrónico de 2015, 2016 e 2019» e à correspondência trocada por este com os serviços competentes do Parlamento relativamente ao trabalho do APA

92      Como acima resulta do n.o 88, o Parlamento indeferiu o pedido formulado pelo recorrente para obter a comunicação de «todas as mensagens de correio eletrónico de 2015, 2016 e 2019», bem como a correspondência que este tinha trocado com os seus serviços relativamente ao trabalho do APA, com o fundamento de que, de acordo com a sua política, a conservação das mensagens de correio eletrónico estava limitada a 90 dias e, excecionalmente, a um ano. O Parlamento acrescentou que as mensagens posteriores a 2019 podiam ser comunicadas, mas que não eram pertinentes porque não diziam respeito ao período durante o qual o APA teria trabalhado para o recorrente.

93      A este propósito, importa recordar que cada instituição organiza os seus trabalhos no respeito das regras que lhe são aplicáveis e que pode adotar. No caso em apreço, o Parlamento, ao contrário daquilo que o recorrente sustenta, podia limitar o período de conservação das mensagens de correio eletrónico dos deputados, permitindo‑lhes guardá‑las nos seus processos individuais. Todavia, cabe determinar se, neste caso, esta política foi aplicada de forma que garanta o respeito do direito de audiência que, conforme foi acima definido no n.o 83, é imposto às instituições da União, em todas as situações em que preveem adotar um ato lesivo, quando estejam reunidas as condições previstas para a sua aplicação, por força do artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais.

94      A este respeito, há que recordar que, no caso:

–        o APA foi contratado em 22 de maio de 2015;

–        em dezembro desse mesmo ano, o recorrente constatou uma degradação da qualidade do trabalho do APA;

–        em 25 de fevereiro de 2016, o recorrente pediu ao Parlamento que iniciasse um procedimento de despedimento do APA com o fundamento, designadamente, de que este não tinha respeitado as regras relativas às autorizações de exercício de atividades externas e de que se tinha ausentado sem motivo válido;

–        em 24 de junho de 2016, o Parlamento notificou o APA da sua decisão de pôr termo ao seu contrato por quebra da relação de confiança por não ter respeitado as regras relativas às autorizações de exercício de atividades externas;

–        em 14 de abril de 2017, o APA interpôs um recurso de anulação da decisão de despedimento no Tribunal Geral;

–        em 8 de junho e, posteriormente, em 3 de setembro de 2020, o Parlamento informou o recorrente da abertura de um procedimento de recuperação dos montantes pagos ao APA.

95      Resulta desta cronologia que, desde o início de 2016, o Parlamento teve conhecimento de uma situação conflituosa entre o recorrente e o APA quanto ao facto de este exercer ou não as suas atividades para o recorrente no respeito das regras que regulam a assistência parlamentar. Por conseguinte, a partir desse momento, nessa situação, tanto mais que estavam em causa fundos públicos da União, era necessário que o Parlamento assegurasse a conservação das mensagens de correio eletrónico suscetíveis de demonstrar a natureza exata das atividades do APA durante o processo de despedimento e, no caso de este dar origem a outros processos, judiciais ou administrativos, como um procedimento de recuperação, enquanto esses outros processos permanecessem abertos.

96      A este respeito, há que salientar que, na carta de 8 de janeiro de 2021, o diretor‑geral das Finanças indicou ao recorrente que o Parlamento tinha a possibilidade de recuperar, a título excecional, mensagens de correio eletrónico durante um período de um ano.

97      Por outro lado, o artigo 5.o das regras que regem o acesso ao sistema de correio eletrónico e a sua utilização pelo Secretariado do Parlamento, aprovadas em 19 de fevereiro de 2018, prevê que, em caso de cessação de funções de um funcionário ou de um agente do Parlamento, o período de conservação das mensagens de correio eletrónico destes pode ser superior a três meses quando sejam objeto «de um inquérito administrativo, de uma queixa ou de um processo judicial».

98      Segundo o Parlamento, cabe aos parlamentares conservar as suas mensagens de correio eletrónico para além desse período. Para o efeito, os parlamentares são convidados a criar, eles próprios, pastas pessoais que permitam arquivar as suas mensagens de correio eletrónico por tempo indeterminado. Segundo o Parlamento, este convite foi objeto de três comunicações dirigidas aos parlamentares, a primeira de 14 de junho de 2014, a segunda de 13 de outubro de 2014 e a terceira de 30 de março de 2015. Apesar destas comunicações, o recorrente não organizou um arquivo pessoal das suas mensagens de correio eletrónico.

99      Este argumento do Parlamento não pode ser acolhido.

100    A possibilidade de organizar um arquivo pessoal não pode ter por efeito dispensar o Parlamento da obrigação de assegurar a conservação de qualquer mensagem de correio eletrónico que seja pertinente para demonstrar que, em conformidade com as regras instituídas pela Instituição, um APA exerceu as suas atividades, de forma efetiva e exclusiva, para o parlamentar ao qual estava afetado, em ligação direta com o mandato deste.

101    Esta possibilidade também não pode dispensar o Parlamento da obrigação de comunicar as mensagens de correio eletrónico assim conservadas, quando, em aplicação do direito de audiência, que apresenta um caráter fundamental na ordem jurídica da União, lhe é feito esse pedido pelo parlamentar em questão que, como no caso em apreço, é objeto de um procedimento de recuperação por utilização irregular das despesas de assistência parlamentar.

102    Acresce que, em resposta ao recorrente que alega, em substância, que apenas foi informado da política de conservação das mensagens de correio eletrónico do Parlamento em 8 de janeiro de 2021, o Parlamento não conseguiu demonstrar que as comunicações acima mencionadas no n.o 98, tinham sido levadas ao conhecimento do recorrente. Assim, a comunicação da Direção‑Geral (DG) da Inovação e do Apoio Tecnológico de 14 de junho de 2014 foi enviada aos «recém‑chegados», de que não fazia parte o recorrente nessa data, uma vez que, como acima resulta do n.o 2, era deputado desde [confidencial].A comunicação de 13 de outubro de 2014 foi enviada pela DG «Inovação e apoio tecnológico» a si própria, sem que o Parlamento, interrogado sobre este ponto no âmbito de uma medida de organização do procedimento, tenha podido fornecer a lista dos seus destinatários. O mesmo se aplica à comunicação de 30 de março de 2015 proveniente, por seu turno, do «ITEC Service Desk» para os deputados.

103    Quanto à correspondência trocada pelo recorrente com os serviços competentes do Parlamento sobre o trabalho do APA ‑ que não constaria de mensagens de correio eletrónico — verifica‑se que, na carta de 8 de janeiro de 2021, o Parlamento não indicou nenhuma razão que permitisse justificar, de forma específica, a sua recusa de a transmitir ao recorrente.

104    Por estas razões, não se podem considerar procedentes os fundamentos invocados pelo Parlamento para indeferir o pedido do recorrente relativo à comunicação de «todas as mensagens de correio eletrónico de 2015, 2016 e 2019» e à correspondência trocada entre este e os serviços competentes do Parlamento relativamente ao trabalho do APA.

2)      Quanto aos fundamentos invocados pelo Parlamento para indeferir o pedido do recorrente referente ao «processo individual» do APA (todos os documentos relacionados com o seu recrutamento e o seu trabalho), incluindo as informações relativas ao número de vezes em que a proteção do Parlamento foi solicitada por este APA, e os dados relativos à sua presença que podem ser extraídos do seu cartão de acesso ao Parlamento

105    Na sua carta de 8 de janeiro de 2021, o Parlamento recusou comunicar ao recorrente o «processo individual» do APA (todos os documentos relacionados com o seu recrutamento e o seu trabalho), incluindo as informações relativas ao número de vezes em que a proteção do Parlamento foi solicitada por este APA, e os dados relativos à sua presença que podiam ser extraídos do seu cartão de acesso ao Parlamento, com o fundamento de que a transmissão desses dados era contrária, por um lado, ao Regulamento 2018/1725 e, por outro, ao artigo 26.o do Estatuto.

106    Quanto às informações relativas à Direção‑Geral (DG) da Segurança e da Proteção, o diretor‑geral das Finanças indicou, além disso, ao recorrente que as intervenções dos agentes de segurança do Parlamento não eram objeto de registo oficial e que os dados relativos aos cartões de acesso eram conservados durante um período máximo de quatro meses.

i)      Quanto ao fundamento relativo ao Regulamento 2018/1725

107    Na carta de 8 de janeiro de 2021, o Parlamento indicou que os dados pedidos pelo recorrente tinham caráter pessoal na aceção do Regulamento 2018/1725 e que o recorrente não tinha alegado que eram necessários para o desempenho de funções de interesse público ou inerentes ao exercício da autoridade pública, nem para a realização de uma finalidade de interesse público, como permite o artigo 9.o do referido regulamento.

108    Na contestação, o Parlamento acrescenta que, se o recorrente pediu acesso ao «processo individual» do APA, era para evitar restituir‑lhe as despesas de assistência parlamentar que corriam o risco de lhe ser reclamadas no termo do procedimento de recuperação e, portanto, para servir o seu interesse pessoal. Nestas condições, o Parlamento considera que o recorrente não pode invocar um interesse público na aceção do artigo 9.o do Regulamento 2018/1725.

109    A este respeito, refira‑se que, nos termos do artigo 9.o, n.o 1, do Regulamento 2018/1725

«1.      Sem prejuízo dos artigos 4.o a 6.o e 10.o, os dados pessoais só podem ser transferidos para destinatários estabelecidos na União que não sejam instituições ou órgãos da União se o destinatário demonstrar que:

a)      Os dados são necessários para o desempenho de funções de interesse público ou inerentes ao exercício da autoridade pública de que o destinatário se encontra investido; ou

b)      É necessário transmitir os dados para uma finalidade específica no interesse público, e o responsável pelo tratamento estabelecer, caso haja motivos para pressupor que os interesses legítimos do titular dos dados possam vir a ser prejudicados, que a transmissão dos dados pessoais para essa finalidade específica é proporcionada, após ter comprovadamente ponderado os diferentes interesses em jogo.

[…]».

110    É certo que, uma vez que deviam servir para a sua defesa no âmbito do procedimento de recuperação, os dados reclamados pelo recorrente não podiam ser considerados «necessários para o desempenho de funções de interesse público ou inerentes ao exercício da autoridade pública de que o destinatário se encontra investido» na aceção do artigo 9.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento 2018/1725.

111    Pela mesma razão, não se pode considerar que a transmissão dos referidos dados ao recorrente respondia a uma «finalidade específica no interesse público» na aceção do artigo 9.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento 2018/1725.

112    Todavia, resulta dos autos que o pedido de observações que o Parlamento dirigiu, em 3 de setembro de 2020, ao recorrente para lhe permitir que exercesse o seu direito de audiência se baseia, no caso em apreço, em elementos detidos por esta instituição que, eventualmente, o recorrente não conhecia pelo recorrente ou em elementos de que o recorrente tinha conhecimento quando era o superior hierárquico do APA, mas de que já não dispõe.

113    Tendo em conta a importância reconhecida ao direito de audiência na ordem jurídica da União, o facto de esses elementos poderem encontrar‑se no «processo individual» do APA não pode, enquanto tal, obstar a que esses elementos sejam comunicados ao recorrente para lhe permitir formular as suas observações, como exigido pela jurisprudência, de forma útil e efetiva, no âmbito do exercício do referido direito.

114    Com efeito, o direito à proteção dos dados pessoais não é um direito absoluto, devendo ser considerado à luz da sua função na sociedade e devendo ser ponderado, a este título, com outros direitos fundamentais, no âmbito de uma iniciativa que atribui a cada um dos direitos envolvidos o lugar que lhe cabe, à luz dos factos do caso concreto, na ordem jurídica da União, em conformidade com o princípio da proporcionalidade.

115    A necessidade de assegurar essa ponderação entre o direito à proteção dos dados pessoais e os outros direitos fundamentais reconhecidos nesta ordem jurídica é sublinhada pelo legislador da União no considerando 4 do Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de abril de 2016, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados e que revoga a Diretiva 95/46/CE (Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados) (JO 2016, L 119, p. 1).

116    Ora, o Regulamento 2018/1725 é «o equivalente» do Regulamento 2016/679 no que respeita à proteção de dados pessoais pelas instituições, órgãos e organismos da União (v. considerando 5 do Regulamento 2018/1725).

117    Neste contexto, não se pode admitir que o Parlamento possa convidar o recorrente a pronunciar‑se de forma útil e efetiva sobre elementos que figuram, sendo caso disso, no processo do APA, sem lhe dar acesso a esses elementos, depois de ter ponderado, por um lado, o interesse desse APA em que os dados que lhe dizem respeito não sejam transmitidos a terceiros e, por outro, o interesse do recorrente em apresentar as suas observações de forma útil e efetiva no âmbito do procedimento de recuperação instaurado contra si.

118    Ora, verifica‑se que, no caso, o Parlamento não efetuou tal diligência.

ii)    Quanto ao fundamento relativo ao artigo 26.o do Estatuto

119    Na sua carta de 8 de janeiro de 2021, o Parlamento sustentou que o «processo individual» do APA era confidencial e não podia ser transmitido nos termos do artigo 26.o do Estatuto.

120    A este respeito, refira‑se que esta disposição, que é aplicável por analogia aos assistentes parlamentares por força do disposto no artigo 127.o do ROA, só diz respeito, segundo os seus termos, aos «processos individuais» dos funcionários e agentes, que reúnem «todos os documentos relativos à sua situação administrativa e todos os relatórios referentes à sua competência, rendimento ou comportamento», bem como «às observações feitas [pelos funcionários ou agentes] relativamente aos referidos documentos».

121    Contudo, não se pode deixar de observar que a confidencialidade dos documentos em causa não pode ser oposta ao recorrente, que é, de resto, o autor de alguns dos documentos em questão na qualidade de superior hierárquico do APA, na medida necessária ao exercício pelo recorrente do seu direito de audiência.

122    Ora, no caso em apreço, ao basear‑se no artigo 26.o do Estatuto, o Parlamento, erradamente, não tomou em consideração o interesse do recorrente em ter acesso a certos documentos do processo individual do APA para apresentar as suas observações de forma útil no âmbito do procedimento de recuperação instaurado contra ele.

iii) Quanto ao fundamento especial ligado às informações na posse da DG «Segurança e Proteção»

123    Quanto ao fundamento respeitante aos dados relativos ao cartão de acesso do APA, acima indicado no n.o 106, há que acrescentar ao que precede que, por razões semelhantes às acima expostas nos n.os 100 e 101, o Parlamento devia tomar as medidas necessárias para que a DG «Segurança e Proteção» conservasse esses dados durante um período superior a quatro meses, uma vez que o despedimento do APA tinha dado origem a um processo judicial e tinha sido instaurado um procedimento de recuperação das despesas de assistência parlamentar contra o deputado pelo qual o Parlamento tinha contratado esse APA.

124    Por estas razões, não se podem considerar procedentes os fundamentos invocados pelo Parlamento para indeferir o pedido do recorrente relativo ao «processo individual» do APA (todos os documentos relacionados com o seu recrutamento e o seu trabalho), incluindo as informações relativas ao número de vezes em que a proteção do Parlamento foi solicitada por esse APA, e os dados relativos à sua presença que podem ser extraídos do seu cartão de acesso ao Parlamento.

3)      Quanto aos fundamentos invocados pelo Parlamento para indeferir o pedido do recorrente respeitante aos autos do processo que deu origem ao Acórdão de 7 de março de 2019, L/Parlamento (T59/17)

125    Na sua carta de 8 de janeiro de 2021, o Parlamento indeferiu o pedido do recorrente relativo aos autos do processo que deu origem ao Acórdão de 7 de março de 2019, L/Parlamento (T‑59/17, EU:T:2019:140), por ser contrário ao artigo 9.o do Regulamento 2018/1725 e por, no âmbito do processo no Tribunal Geral, o APA ter obtido o anonimato.

126    Quanto ao fundamento relativo ao artigo 9.o do Regulamento 2018/1725, remete‑se para os n.os 112 a 118, supra.

127    No que se refere ao facto de o Tribunal Geral ter concedido o anonimato ao APA no processo que deu origem ao Acórdão de 7 de março de 2019, L/Parlamento (T‑59/17, EU:T:2019:140), importa recordar que, por força do disposto no artigo 66.o do Regulamento de Processo, o anonimato visa omitir o nome de uma parte no litígio ou o de outras pessoas mencionadas no âmbito do processo em questão, ou ainda outros dados nos documentos relativos ao processo a que o público tem acesso.

128    Em contrapartida, o anonimato concedido pelo Tribunal Geral não abrange a confidencialidade dos elementos juntos aos autos  do referido processo fora deste, no âmbito das relações entre as partes e terceiros.

129    Por conseguinte, a decisão do Tribunal Geral relativa ao anonimato não proibia o Parlamento, ao contrário do que este alegou na sua carta de 8 de janeiro de 2021, de comunicar ao recorrente os documentos processuais trocados no Acórdão de 7 de março de 2019, L/Parlamento (T‑59/17, EU:T:2019:140), que eram suscetíveis de ser pertinentes para efeitos do exercício pelo recorrente do seu direito de audiência.

c)      Conclusão

130    Em conclusão, há que considerar que, pelas razões que acabam de ser expostas, os fundamentos invocados pelo Parlamento na sua carta de 8 de janeiro de 2021 não são procedentes ou são insuficientes.

131    Não tendo o Parlamento justificado corretamente a sua recusa de comunicar ao recorrente os documentos que, por ele pedidos, eram suscetíveis de lhe permitir exercer de forma útil e efetiva o seu direito de audiência, garantido pelo artigo 41.o, n.o 2, alínea a), da Carta dos Direitos Fundamentais, no âmbito do procedimento de recuperação dos montantes pagos a título de despesas de assistência parlamentar que lhe foi instaurado em 3 de setembro de 2020, não se pode excluir a possibilidade de o recorrente ter sido privado de uma oportunidade de melhor assegurar a sua defesa, o que afetou, de forma inevitável, o conteúdo da decisão recorrida (v., neste sentido, Acórdãos de 16 de janeiro de 2019, Comissão/United Parcel Service, C‑265/17 P, EU:C:2019:23, n.o 56; de 4 de abril de 2019, OZ/BEI, C‑558/17 P, EU:C:2019:289, n.os 77 e 78, e de 25 de junho de 2020, HF/Parlamento, C‑570/18 P, EU:C:2020:490, n.o 73).

132    Nestas condições, é necessário acolher o segundo fundamento, na medida em que é relativo à violação do direito de audiência.

133    Consequentemente, há que anular a decisão recorrida e a nota de débito na medida em que dizem respeito às remunerações, encargos sociais e despesas de viagem referentes ao emprego do assistente parlamentar durante o período compreendido entre 22 de maio de 2015 e 31 de março de 2016, sem que seja necessário examinar os outros argumentos apresentados no âmbito do segundo fundamento, os terceiro a quinto fundamentos, bem como a admissibilidade da prova que o recorrente apresentou em 22 de novembro de 2022 e o seu requerimento de diligências de instrução.

IV.    Quanto às despesas

134    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Por outro lado, nos termos do artigo 137.o do Regulamento de Processo, se não houver lugar a decisão de mérito, o Tribunal decide livremente sobre as despesas.

135    No caso em apreço, há que decidir que, em conformidade com o pedido do recorrente e tendo em conta as considerações que levaram o Tribunal Geral a não conhecer parcialmente de mérito, o Parlamento suportará a totalidade das despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção alargada)

decide:

1)      Não há que conhecer do recurso de anulação, na parte em que este tem por objeto, por um lado, a Decisão do secretáriogeral do Parlamento Europeu, de 16 de março de 2021, que declarou um crédito sobre TC, relativo a um montante indevidamente pago a título de despesas de assistência parlamentar e que ordena a recuperação desse montante e, por outro, a nota de débito n.o 7010000523, de 31 de março de 2021, na medida em que dizem respeito a remunerações, encargos sociais e despesas de deslocação relativos ao emprego de A durante o período compreendido entre 1 de abril e 22 de novembro de 2016, no montante de 28 083,67 euros.

2)      A Decisão do secretáriogeral do Parlamento Europeu, de 16 de março de 2021, acima referida, e a nota de débito n.o 7010000523, de 31 de março de 2021, são anuladas na parte em que ordenam a recuperação junto de TC das remunerações, dos encargos sociais e das despesas de viagem relativos ao emprego de A durante o período compreendido entre 22 de maio de 2015 e 31 de março de 2016, no montante de 50 754,54 euros.

3)      O Parlamento Europeu é condenado nas despesas.

Gervasoni

Madise

Nihoul

Frendo

 

      Martín y Pérez de Nanclares

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 7 de junho de 2023.

Assinaturas


*      Língua do processo: lituano.


1      Dados confidenciais ocultados.