Language of document : ECLI:EU:T:2020:1

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção)

16 de janeiro de 2020 (*)

«Auxílios de Estado — Setor mineiro — Medida que consiste, por um lado, na redução das garantias financeiras para a reabilitação de minas e, por outro, no investimento estatal para a reabilitação de minas que assegura um nível mais elevado de proteção ambiental — Decisão que declara o auxílio parcialmente incompatível com o mercado interno e ordena a sua recuperação — Conceito de auxílio — Vantagem — Transferência de recursos estatais — Caráter seletivo — Confiança legítima — Segurança jurídica — Cálculo do montante do auxílio»

No processo T‑257/18,

Iberpotash, SA, com sede em Súria (Espanha), representada por N. Niejahr e B. Hoorelbeke, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por G. Luengo e D. Recchia, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto um pedido baseado no artigo 263.o TFUE e destinado à anulação da Decisão (UE) 2018/118 da Comissão, de 31 de agosto de 2017, relativa ao auxílio estatal SA.35818 (2016/C) (ex 2015/NN) (ex 2012/CP) concedido por Espanha a favor da Iberpotash (JO 2018, L 28, p. 25),

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção),

composto por: E. Buttigieg, exercendo funções de presidente, B. Berke (relator) e M. J. Costeira, juízes,

secretário: P. Cullen, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 12 de julho de 2019,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        A recorrente, Iberpotash, SA, é uma sociedade anónima de direito espanhol que detém e explora duas minas de potassa em atividade na Catalunha (Espanha), uma no município de Súria e outra nos municípios de Sallent e de Balsareny (a seguir, denominadas conjuntamente, «minas da recorrente»). Além disto, a recorrente também é proprietária da escombreira de sal de Vilafruns (a seguir «escombreira de Vilafruns»), onde as atividades mineiras encerraram em 1973.

2        A recorrente é uma filial da multinacional israelita ICL Fertilities, o maior produtor mundial de fertilizantes. Adquiriu as minas junto do Estado espanhol por meio de um contrato de compra e venda celebrado em 21 de outubro de 1998 com a Sociedad Estatal de Participaciones Industriales (SEPI), um grupo de empresas pertencente ao Estado espanhol.

3        Em 9 de novembro de 2006, a recorrente obteve uma autorização ambiental para proceder à extração de potassa na mina de Súria e o montante da garantia financeira para esta exploração foi fixado em 773 682,28 euros (montante atualizado para 828 013,24 euros em 2008). Em 28 de abril de 2008, a recorrente obteve uma autorização ambiental para proceder à extração de potassa na mina de Balsareny/Sallent, tendo o montante da garantia financeira correspondente sido fixado em 1 130 128 euros. Essas autorizações constituem decisões administrativas autónomas e específicas tomadas pela Generalidad de Cataluña (Governo Autónomo da Catalunha, Espanha).

4        Por Sentença de 11 de outubro de 2011, o Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha, Espanha) considerou que o plano de reabilitação da exploração de Sallent/Balsareny estava incompleto e, consequentemente, que o montante da garantia financeira relativa a esse plano era demasiado baixo. Essa decisão foi confirmada em sede de recurso pelo Tribunal Supremo (Supremo Tribunal, Espanha).

5        O montante das garantias financeiras, mencionadas no n.o 3, supra, não foi revisto até 2015, quando as autoridades espanholas propuseram montantes sensivelmente mais elevados, de 6 979 471,83 euros para a exploração de Sallent/Balsareny [montante aplicável apenas após a aprovação pelo Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha) em dezembro de 2016] e de 6 160 872,35 euros para a exploração de Súria.

6        Em 17 de dezembro de 2007, o Ministerio de Medio Ambiente (Ministério do Ambiente, Espanha) e a Agencia Catalana del Agua (Agência Catalã da Água, Espanha) assinaram um acordo no qual decidiram proceder à cobertura da antiga escombreira de Vilafruns. Com base nesse acordo, os trabalhos de cobertura iniciaram‑se em agosto de 2008 e prosseguiram ao longo de 18 meses. Esses trabalhos foram integralmente financiados pelo Ministerio de Hacienda (Ministério das Finanças, Espanha) e pela Agência Catalã da Água.

 Disposições legislativas nacionais pertinentes

7        As obrigações ambientais dos operadores mineiros no que respeita às minas em atividade na comunidade autónoma espanhola da Catalunha encontram‑se definidas na Ley 12/1981 por la que se establecen normas adicionales de protección de los espacios de especial interés natural afetados por atividades extrativas (Lei n.o 12/1981 que Estabelece Normas Adicionais de Proteção das Zonas Naturais de Especial Interesse Afetadas por Atividades Extrativas), de 24 de dezembro de 1981 (BOE n.o 30, de 4 de fevereiro de 1982, p. 2874, a seguir «Lei catalã n.o 12/1981») e no Decreto n.o 202/1994 por el que se establecen los criterios para la determinación de las fianzas relativas a los programas de restauración de atividades extrativas (Decreto n.o 202/1994 que Estabelece Critérios para Determinar as Garantias relativas aos Programas de Reabilitação de Atividades Extrativas), de 14 de junho de 1994 (a seguir «Decreto n.o 202/1994»).

8        O Decreto n.o 202/1994 foi substituído pelo Real Decreto 975/2009 sobre gestión de los residuos de las industrias extrativas y de protección y rehabilitación del espacio afetado por atividades mineras (Real Decreto 975/2009 relativo à Gestão dos Resíduos das Indústrias Extrativas e à Proteção e Reabilitação do Espaço Afetado por Atividades Mineiras), de 12 de junho de 2009 (BOE n.o 143, de 13 de junho de 2009, p. 49948, a seguir «Real Decreto 975/2009»), que transpôs a Diretiva 2006/21/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março de 2006, relativa à gestão dos resíduos de indústrias extrativas e que altera a Diretiva 2004/35/CE (JO 2006, L 102, p. 15), e que se aplica desde 1 de maio de 2014 aos depósitos minerais que já estavam a ser explorados em 1 de maio de 2008, como é o caso das minas da recorrente.

9        O artigo 4.o da Lei catalã n.o 12/1981 determina que os pedidos de licenciamento de atividades extrativas devem incluir um programa de reabilitação. Nos termos do artigo 5.o da referida lei, o programa de reabilitação deve definir as medidas destinadas a prevenir e compensar os efeitos nocivos para o ambiente das atividades extrativas previstas. Deve incluir as medidas de reabilitação a executar no final das diferentes fases da exploração e no termo das atividades extrativas.

10      O artigo 8.o, n.os 1, 1 bis e 2, da Lei catalã n.o 12/1981 estabelece que, para garantir a aplicabilidade do programa de reabilitação, o operador mineiro é obrigado a constituir uma garantia financeira. O montante da garantia é função da área a reabilitar ou do custo global da reabilitação.

11      O artigo 9.o da Lei catalã n.o 12/1981 prevê que as autoridades competentes podem proceder à execução coerciva do programa de reabilitação se o proprietário da exploração for incapaz de o executar ou se recusar a fazê‑lo. Os custos da execução coerciva ficam a cargo do operador mineiro e as autoridades competentes podem aplicar uma sanção pecuniária compulsória ao operador.

12      O artigo 2.o do Decreto n.o 202/1994 define critérios adicionais para determinar o montante da garantia financeira. Todos esses critérios estão relacionados com os custos das medidas e dos trabalhos especiais incluídos no programa de reabilitação. No que toca às minas que não estão localizadas em zonas naturais de especial interesse, como as minas da recorrente, o artigo 3.o do decreto prevê que o montante da garantia financeira determinado com base no artigo 2.o desse mesmo decreto seja reduzido para metade.

13      No que respeita às minas que já não se encontram em atividade, o artigo 121.o da Ley 22/1973 de Minas (Lei 22/1973 relativa às Minas), de 21 de julho de 1973 (BOE n.o 176, de 24 de julho de 1973, p. 15056, a seguir «Lei espanhola relativa às Minas»), determina que os proprietários de minas que já não se encontram em atividade devem dar cumprimento aos planos de reabilitação aprovados pelas autoridades responsáveis pelas atividades mineiras.

 Procedimento administrativo

14      Em 30 de novembro de 2012, a Comissão Europeia recebeu uma denúncia anónima segundo a qual o Reino de Espanha tinha dado execução a uma série de alegadas medidas de auxílio a favor da recorrente.

15      Em 10 de janeiro de 2013, a Comissão enviou um primeiro pedido de informações. O Reino de Espanha respondeu em 8 de março de 2013. Em 14 de maio de 2013, 16 de janeiro e 26 de março de 2014 foram enviados outros pedidos de informações, a que o Reino de Espanha respondeu por ofícios de 13 de junho de 2013 e 14 de fevereiro e 15 de abril de 2014.

16      Em 30 de janeiro de 2015, a Comissão enviou uma carta de avaliação preliminar ao autor da denúncia, que, em 5 de março e 21 de abril de 2015, forneceu informações adicionais. Além disso, em 9 de março de 2015, teve lugar uma reunião com o autor da denúncia, que forneceu informações suplementares em 4 de junho de 2015.

17      Em 9 de junho de 2015, a Comissão enviou ao Reino de Espanha a resposta definitiva do autor da denúncia à carta de avaliação preliminar, juntamente com um pedido de informações adicionais. O Reino de Espanha respondeu em 8 de julho de 2015. A pedido do Reino de Espanha, foi‑lhe transmitida, em 31 de julho de 2015, uma versão não confidencial da carta de avaliação preliminar.

18      Em 26 de janeiro de 2016, a Comissão deu início a um procedimento formal de investigação relativamente a duas alegadas medidas de auxílio, a saber, a concessão à recorrente, pelo Reino de Espanha, por um lado, de uma vantagem sob a forma comissões de garantia mais baixas e, por outro, de um auxílio ao investimento para a cobertura da escombreira de Vilafruns. Esta decisão foi publicada no Jornal Oficial (JO 2016, C 142, p. 18). A Comissão solicitou às autoridades espanholas que lhe apresentassem as suas observações e fornecessem informações adicionais, as quais foram apresentadas em 28 de novembro de 2016.

19      A Comissão recebeu as observações das partes interessadas e da recorrente e transmitiu‑as ao Reino de Espanha, que apresentou as suas observações em 27 de julho de 2016 e 6 de abril de 2017.

 Decisão impugnada

20      Em 31 de agosto de 2017, a Comissão adotou a Decisão (UE) 2018/118 relativa ao auxílio estatal SA.35818 (2016/C) (ex 2015/NN) (ex 2012/CP) concedido por Espanha a favor da Iberpotash (JO 2018, L 28, p. 25, a seguir «decisão impugnada»), que declara as duas medidas de auxílio em causa incompatíveis com o mercado interno (artigo 1.o, n.os 1 e 3) e ordena a sua recuperação (artigos 2.o e 3.o).

21      O dispositivo da decisão impugnada tem o seguinte teor:

«Artigo 1.o

1.      O auxílio estatal à Iberpotash sob a forma de comissões de garantia indevidamente baixas resultantes do baixo nível indevido das garantias para o período de 2006 a 2016, no montante de 1 864 622 EUR, concedido ilegalmente por Espanha em violação do artigo 108.o, n.o 3, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, é incompatível com o mercado interno.

2.      O auxílio estatal para a cobertura da escombreira de Vilafruns, concedido ilegalmente por Espanha em violação do artigo 108.o, n.o 3, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia a favor da Iberpotash é, relativamente ao montante de 3 902 461,30 EUR, compatível com o mercado interno nos termos do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

3.      A parte restante do auxílio estatal destinado à cobertura da escombreira de Vilafruns, relativamente ao montante de 3 985 109,70 EUR, concedido ilegalmente por Espanha em violação do artigo 108.o, n.o 3, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, a favor da Iberpotash, é incompatível com o mercado interno.

Artigo 2.o

1.      A Espanha deve recuperar os auxílios referidos no artigo 1.o, n.os 1 e 3, junto do beneficiário.

2.      Os montantes a recuperar devem ser acrescidos de juros, desde a data em que foram colocados à disposição do beneficiário até à data da sua recuperação efetiva.

3.      Os juros devem ser calculados numa base composta, nos termos do capítulo V do Regulamento (CE) n.o 794/2004 da Comissão e do Regulamento (CE) n.o 271/2008 da Comissão que altera o Regulamento (CE) n.o 794/2004.

4.      A Espanha deve cancelar todos os pagamentos pendentes do auxílio referido no artigo 1.o, n.os 1 e 3, a partir da data de adoção da presente decisão.

Artigo 3.o

1.      A recuperação do auxílio referido no artigo 1.o, n.os 1 e 3, deve ser imediata e efetiva.

2.      A Espanha deve certificar‑se de que a presente decisão é aplicada no prazo de quatro meses a contar da data da sua notificação.

[…]»

22      A decisão impugnada identifica duas medidas de auxílio.

23      Por um lado, um auxílio de Estado sob a forma de comissões bancárias mais baixas na sequência da redução das garantias no período de 2006‑2016, cujo montante ascende a 1 864 622 euros (a seguir «medida 1»).

24      Por outro lado, uma medida relativa ao investimento na cobertura da escombreira de Vilafruns (a seguir «medida 4»), que constitui, por um lado, na parte equivalente a 3 902 461,30 euros, uma medida compatível com o mercado interno na aceção do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, uma vez que é conforme com o Enquadramento comunitário dos auxílios estatais em favor do ambiente (2008/C 82/01) (JO 2008, C 82, p. 1, a seguir «Enquadramento de 2008»), e, por outro, um auxílio incompatível com o mercado interno, designadamente na parte que excede a intensidade máxima do auxílio ao investimento que permite melhorar o nível de proteção do ambiente, que é de 3 985 109,70 euros.

25      Na sua apreciação da existência de um auxílio de Estado em relação à «medida 1», a Comissão esclarece, designadamente no que respeita à existência de uma vantagem, no considerando 54 da decisão impugnada, que importa, em primeiro lugar, avaliar se os níveis das garantias financeiras estabelecidas pelas autoridades espanholas eram inferiores ao exigido pela regulamentação aplicável, avaliação a que procede nos considerandos 56 a 59 de a decisão impugnada.

26      No considerando 60 da decisão impugnada, a Comissão recorda que os montantes das garantias financeiras foram fixados pelo Governo Autónomo da Catalunha, em duas decisões autónomas e específicas adotadas em relação à recorrente: a primeira licença, concedida em 9 de novembro de 2006, que permitiu à recorrente exercer as atividades de exploração na mina de Súria, fixou o montante da garantia financeira em 773 682,28 euros (que passou para 828 013,24 euros em 2008); a segunda, concedida em 28 de abril de 2008, para a mina de Sallent/Balsareny, fixou o montante da garantia financeira em 1 130 128 euros. Esses montantes foram revistos em 2015, quando as autoridades espanholas propuseram montantes significativamente mais elevados, de 6 979 471,83 euros para a exploração de Sallent/Balsareny [montante aplicável apenas após a aprovação pelo Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha) em dezembro de 2016] e de 6 160 872,35 euros para a exploração de Súria (montante aplicável a partir de maio de 2015).

27      No que respeita ao nível das garantias financeiras prestadas pela recorrente, a Comissão sublinha o seguinte:

«(61)      [I]ncumbe em primeiro lugar às autoridades competentes em matéria ambiental determinar e aprovar os montantes das garantias financeiras no quadro nas normas nacionais ou regionais aplicáveis ao caso em apreço. Embora a Comissão seja responsável por assegurar a correta transposição e aplicação da Diretiva [2006/21] relativa à gestão dos resíduos de indústrias extrativas, que é aplicável às garantias financeiras da [recorrente] a partir de 1 de maio de 2014, a referida Diretiva deixa uma ampla margem de apreciação aos Estados‑Membros para determinar o montante exato das garantias. Assim, a Comissão não efetuou a sua própria avaliação dos níveis corretos das garantias financeiras por força da Diretiva relativa à gestão dos resíduos de indústrias extrativas, mas limita a sua avaliação à análise das provas existentes da insuficiência das garantias financeiras, uma vez que existe um conjunto de indícios que sugerem que o montante das garantias financeiras estabelecidas pelas autoridades públicas em 2006 e 2008 foi efetivamente inferior ao exigido ao abrigo da legislação aplicável.

(62)      É da maior importância que o Tribunal Superior de Justicia de Cataluña tenha estabelecido, em 11 de outubro de 2011, que o montante da garantia financeira para a escombreira de Cogulló da [recorrente] nas suas instalações de Balsareny/Sallent, no montante de 585 153 EUR, era inferior ao requerido. A decisão refere que o montante da garantia não respeita os parâmetros jurídicos e regulamentares estabelecidos pela legislação nacional, referindo, nomeadamente, o artigo 8.o, n.o 2, da Lei [catalã n.o 12/1981] e o Decreto n.o 202/1994. […] Esta decisão foi confirmada em sede de recurso por decisão do Tribunal Supremo de 9 de julho de 2014. Por último, como assinalado pelas autoridades espanholas, na sua decisão de 14 de dezembro de 2016, o Tribunal Superior de Justicia de Cataluña confirmou ser adequado o novo montante proposto de 6 979 471,83 EUR para a totalidade da exploração de Balsareny/Sallent.

(63)      À luz da decisão do Tribunal Superior de Justicia de Cataluña de 11 de outubro de 2011, que interpreta com autoridade as disposições nacionais relevantes, a Comissão considera demonstrado que o montante inicial da garantia financeira da [recorrente] em Balsareny/Sallent, fixado em 2006, em 1 130 128 [euros], era claramente insuficiente […]

(64)      Embora não exista qualquer outra decisão judicial relativamente à garantia para o depósito mineral de Súria, existem provas convincentes de que a constatação da clara insuficiência do nível da garantia teria sido igualmente provável no caso de ter sido intentada qualquer ação judicial. O montante da garantia inicial de 773 682,28 [euros] (aumentado para 828 013,24 [euros] em 2008) reflete proporcionalmente o facto de o depósito mineral de Súria possuir uma dimensão inferior à do de Balsareny/Sallent no que se refere à massa de resíduos acumulados e à superfície total das escombreiras. Além disso, a garantia, no caso de Súria, aumentou substancialmente, até 6 160 872,35 [euros], ao mesmo tempo que para Balsareny/Sallent (ou seja, só após a decisão do Tribunal e a sua confirmação em sede de recurso), e inclusive numa proporção superior (mais de sete vezes). Assim, na ausência de qualquer outro fator que explique a diferença entre os montantes das garantias relativos a Súria e a Balsareny/Sallent, o montante da garantia no caso de Súria pode também ser considerado insuficiente.

[…]

(66)      Para além da decisão vinculativa de um órgão jurisdicional nacional, o inquérito revelou a existência de vários outros elementos de prova que corrobo[ra]ram a conclusão de que o nível inicial das garantias financeiras era demasiado baixo.

(67)      [A]tas integrais oficiais da audição realizada na Comissão do Ambiente do Parlamento da Catalunha, em 2 de outubro de 2013, [continham] a declaração explícita da Diretora‑Geral do Ambiente da Generalitat de Cataluña, de acordo com a qual as garantias eram claramente insuficientes […] Embora as transcrições do debate político no Parlamento não contenham qualquer justificação pertinente desse montante e, por conseguinte, devam ser tratadas com prudência, as ordens de grandeza e a diferença relativamente ao montante real confirmam as conclusões dos peritos do setor, que já consideraram os montantes efetivos das garantias estabelecidas em 2006 e 2008 como claramente insuficientes.

(68)      Em segundo lugar, o autor da denúncia apresentou um estudo de agosto de 2012, encomendado a especialistas em matéria de ambiente (a seguir designado “estudo FER”), que continha uma análise realizada por especialistas que recolhia e abrangia uma considerável quantidade de informação existente (jurídica, académica ou proveniente de estudos de mercado) sobre esta matéria. O estudo FER analisava a situação existente no que diz respeito ao impacto ambiental dos depósitos minerais da [recorrente] e previa a evolução futura no que se refere à quantidade total de material acumulado nas escombreiras, concluindo que o impacto ambiental das escombreiras era significativo e que deveria aumentar no futuro.

[…]

(72)      Nesta base, o estudo FER considera que o montante da garantia financeira, ao abrigo das novas normas do Real Decreto 975/2009, não deveria, sem dúvida, ser inferior aos custos de reabilitação em 2012 num montante de 71 milhões de [euros] para ambas as explorações e que o seu montante adequado, tendo em conta a totalidade dos custos futuros, deveria rondar os 100 milhões de [euros].

[…]

(75)      [Relativamente às críticas da recorrente segundo as quais o estudo FER não pode servir de base para o cálculo do montante das garantias, a] Comissão reconhece que o estudo não segue as disposições pertinentes do Decreto n.o 202/1994 e se centra mais nas condições estabelecidas no Real Decreto 975/2009, que transpõe a Diretiva [2006/21,] relativa à gestão dos resíduos de indústrias extrativas, com ênfase nos custos esperados da reabilitação. No entanto, os resultados indicam que os custos estimados da reabilitação de cada um dos depósitos minerais da [recorrente] têm por base uma metodologia coerente e hipóteses razoáveis, tal como se descreve nos considerandos 68 a 73, e, por conseguinte, são relevantes para o cálculo das garantias, também nos termos do Decreto n.o 202/1994, como o demonstra, em particular, o seu artigo 2.o, n.o 4, alínea h), que faz referência aos custos de quaisquer outras medidas de reabilitação que possam ser necessárias, não limitando, assim, o cálculo às medidas referidas nos números anteriores do artigo 2.o»

28      Com base nestes elementos, a Comissão chegou à conclusão, nos considerandos 82 e 83 da decisão impugnada, de que os elementos de prova recolhidos e os relatórios elaborados pelos peritos corroboravam a afirmação do órgão jurisdicional nacional de que os montantes iniciais da garantia financeira eram claramente insuficientes para assegurar uma reabilitação adequada e que, por conseguinte, esses montantes eram efetivamente inferiores ao nível normalmente exigido por força da legislação nacional aplicável. A recorrente obteve, portanto, uma vantagem económica que consiste na redução das comissões bancárias pagas anualmente pela garantia financeira. A recorrente beneficiou de uma vantagem seletiva sob a forma de comissões bancárias mais baixas que resultaram de garantias menos significativas que teve de apresentar quando comparadas com as de outros operadores que se encontram em situação semelhante.

29      No que respeita ao critério relativo à utilização de recursos estatais, a Comissão observa o seguinte:

«(88)      A Comissão observa que as garantias em causa no presente processo não são examinadas ao abrigo das regras relativas aos auxílios estatais no que respeita ao montante das comissões não pagas em função do risco ou da exposição do garante (isto é, um banco privado, e não o Estado), mas sim em função do risco para o Estado, no caso de o montante garantido ser inferior ao custo real dos danos ambientais e no caso de a entidade garantida não pagar ou não conseguir pagar a totalidade dos custos de reabilitação.

[…]

(90)      A garantia financeira da [recorrente] reveste a forma de garantia bancária que não é livre de encargos para o Estado. Pode ser utilizada apenas para medidas estritamente definidas pela lei, em particular para o financiamento da remoção de resíduos, reabilitação dos depósitos minerais e outras medidas ambientais, caso a [recorrente] não cumpra as suas obrigações nesta matéria. O Estado não recebe quaisquer juros sobre os fundos de garantia ou qualquer outra vantagem financeira, cujo valor diminuiria em caso de uma redução do montante da garantia. Além disso, até agora, o Estado não teve de recorrer, em circunstância alguma, à garantia para qualquer dos fins acima mencionados. Contudo, mesmo que, até agora, a diminuição do montante da garantia não tenha produzido qualquer efeito real sobre os recursos estatais, este facto, por si só, não exclui a existência de um potencial impacto nos recursos estatais devido ao risco acrescido de o Estado ser obrigado a gastar os seus recursos no futuro.

(91)      De facto, a criação de um risco concreto que imponha um encargo suplementar para o Estado no futuro é suficiente para efeitos do cumprimento da noção de auxílio estatal prevista no artigo 107.o, n.o 1, do Tratado. O Tribunal de Justiça [da União Europeia] declarou igualmente que, para que este critério seja satisfeito, não é necessário que a relação estreita ou as repercussões de uma medida de auxílio estatal nos recursos estatais sejam diretos.

(92)      O objetivo final destas garantias financeiras é assegurar que as empresas mineiras disponham de recursos suficientes para cobrir os futuros custos de reabilitação, independentemente da sua situação financeira no (frequentemente muito longínquo) futuro. É claro, por isso, que, sempre que o montante da garantia seja significativamente inferior aos custos de reabilitação previstos, existe pelo menos um risco maior de os recursos estatais poderem ser afetados no futuro. Este risco de custos potenciais para o orçamento público é claramente mais elevado do que no caso de o montante garantido ter sido fixado de forma adequada em conformidade com a legislação aplicável, levando devidamente em conta os custos de reabilitação previstos. Se estes recursos forem significativamente inferiores aos necessários, em última análise, os recursos estatais terão de cobrir uma grande maioria desses custos, no caso de [a recorrente], por qualquer razão, não estar na disposição ou em condições de o fazer. Além disso, no caso de [a recorrente] não ter capacidade, no futuro, para pagar os custos de reabilitação, é pouco provável que uma eventual penhora, pelas autoridades espanholas, de ativos da [recorrente] proporcione recursos adicionais significativos, dado que os únicos ativos espanhóis da [recorrente] (e de todo o grupo ICL) são as instalações de exploração de potassa. No entanto, uma vez que as minas de potassa estão encerradas, o valor desses ativos afigura‑se duvidoso.

(93)      Está bem estabelecido na legislação aplicável que o Estado seria obrigado a agir por sua conta caso [a recorrente] não pretendesse ou não pudesse adotar as necessárias medidas de reabilitação relativamente às suas escombreiras.

(94)      Em primeiro lugar, nos termos do artigo 102.o da Lei 39/2015, o Estado pode proceder à execução subsidiária em vez do sujeito legalmente obrigado a adotar essas medidas. A Espanha deveria: i) instar a [recorrente] a tomar medidas especificamente definidas; ii) informar a [recorrente] de que, caso contrário, a administração adotará tais medidas, bem como do respetivo custo; iii) executar essas medidas; e iv) tentar recuperar o custo da [recorrente], o que, por definição, não é possível se a Espanha tiver de executar uma garantia financeira insuficiente. Embora esta decisão seja formalmente opcional, caso a [recorrente] não cumprisse a obrigação de reabilitar os seus depósitos minerais, a Espanha não teria alternativa senão pagar antecipadamente essa reabilitação, uma vez que de outro modo não poderia cumprir as suas obrigações.

(95)      Em segundo lugar, tal como referido no considerando 13, a Espanha poderá estar a violar as suas obrigações no âmbito da Diretiva relativa à gestão dos resíduos de indústrias extrativas e da Diretiva que estabelece um quadro de ação comunitária no domínio da água. Por conseguinte, no caso de a [recorrente] abandonar as suas instalações depois de esgotar os recursos minerais e não reabilitar as instalações, e dada a garantia insuficiente, a única forma de Espanha cumprir as obrigações que lhe incumbem por força dessas diretivas e, em última análise, evitar o pagamento das sanções pecuniárias compulsórias diárias impostas pelo Tribunal de Justiça da União Europeia seria arcar com os custos de eliminação das escombreiras ou proceder a uma reabilitação igualmente eficaz.

(96)      Em terceiro lugar, nos termos do disposto na Lei 27/2006 espanhola, de 18 de julho de 2006, as autoridades espanholas podem ser obrigadas a cumprir as suas obrigações ao abrigo da legislação ambiental. Qualquer organização não governamental que satisfaça os critérios enunciados na Lei 27/2006 pode, no caso de uma infração ambiental entre as enumeradas no artigo 18.o, n.o 1, da Lei 27/2006 (incluindo, por exemplo, as infrações relativas às obrigações no domínio da proteção das águas), recorrer aos tribunais para obrigar a administração a cumprir as suas obrigações ambientais.

[…]

(98)      Por último, as próprias autoridades espanholas indicam que, em conformidade com o artigo 9.o da Lei [catalã n.o 12/1981], no caso de o operador não cumprir as suas obrigações, a Generalitat [da Catalunha] pode executar coercivamente estas medidas, sendo os custos suportados pelo operador. Observam que, na prática, a administração aplica as medidas pertinentes que, posteriormente, são financiadas a título da garantia financeira, ou, no caso de a garantia não ser suficiente, da venda dos ativos do operador. Por conseguinte, se a garantia financeira for significativamente inferior à exigida, a administração corre o risco de os ativos do operador não serem suficientes para cobrir as medidas pertinentes executadas. Isto confirma que uma garantia financeira demasiado baixa aumenta o risco de as medidas de reabilitação tomadas pela administração não estarem suficientemente cobertas pelos ativos do operador (nomeadamente se não tiver outras atividades em Espanha, como é o caso da [recorrente]), tendo essas medidas de ser pagas a partir de recursos públicos.

(99)      Por conseguinte, um nível de garantias substancialmente inferior ao necessário, conforme exigido pela legislação, expõe o Estado a um risco concreto de encargos adicionais sobre os seus recursos. O risco acrescido de encargos suplementares para o Estado é suficientemente concreto para ter um efeito, pelo menos, potencial sobre os recursos estatais, devido a um nível excessivamente baixo da garantia financeira.»

30      Quanto à existência de uma distorção da concorrência e de efeitos nas trocas comerciais entre Estados‑Membros, a Comissão considera que:

«(102)      [A] redução dos custos da [recorrente] devido a um nível de garantias financeiras inferior ao exigido pela legislação aplicável é suscetível de distorcer a concorrência nos mercados em que opera a [recorrente] (principalmente os mercados da potassa e do sal). Tal como explicado adiante (ver considerando 110 e seguintes), esta redução de custos durante o período pertinente representou cerca de 1,8 milhões de [euros] e, por conseguinte, contrariamente às alegações das autoridades espanholas, não era negligenciável.

(103)      Além disso, o facto de a [recorrente] ser o único produtor espanhol de potassa não exclui uma possível distorção da concorrência, uma vez que o mercado geográfico relevante é mais vasto do que o mercado nacional espanhol.

[…]

(106)      Como foi acima indicado, os mercados da potassa e do sal são claramente transfronteiriços, destinando‑se 50 % da produção da [recorrente] a exportação para outros países europeus. Por conseguinte, o baixo nível das garantias financeiras é suscetível de afetar as trocas comerciais entre os Estados‑Membros da UE.»

31      Quanto à quantificação do auxílio, a Comissão entende o seguinte:

«(109)      Determinar o montante efetivo do auxílio exige, em primeiro lugar, que se estabeleça um montante «correto» das garantias financeiras no âmbito das disposições legislativas aplicáveis no período de referência. Em seguida, o montante do auxílio corresponderia à diferença entre o montante previsto das comissões bancárias que a [recorrente] deveria ter pago para constituir o montante de garantia fixado corretamente e o montante efetivo das comissões bancárias que a empresa pagou.

[…]

(111)      Uma vez que, segundo as autoridades espanholas, em dezembro de 2016 o Tribunal Superior de Justicia de Cataluña constatou que o montante acrescido de 6 979 471,83 [euros] para Balsareny/Sallent estava em conformidade com a legislação em vigor, a Comissão considera que, presentemente, o montante «correto» das garantias para Balsareny/Sallent corresponde a este montante atualmente aplicável aprovado pelo Tribunal.

(112)      Por analogia, a Comissão entende, além disso (ver também o considerando 64) que o montante acrescido de 6 160 872,35 [euros] para a garantia de Súria aplicável desde 2015 também pode ser considerado consentâneo com a legislação aplicável. Apesar de não existir uma conclusão judicial vinculativa relativamente a este depósito mineral, o aumento do montante da garantia para uma pequena exploração como Súria é, de facto, quase equivalente ao montante autorizado para Balsareny/Sallent. Isto confirma que o montante pode ser considerado adequado e em conformidade com a legislação aplicável.

[…]

(123)      [O] montante total do auxílio concedido à [recorrente] sob a forma de menores comissões bancárias pela redução das garantias para a totalidade do período 2006‑2016 ascende a 1 864 622 [euros].»

32      Na sua apreciação da existência de um auxílio de Estado em relação à medida 4, a Comissão esclarece, designadamente, no que respeita à existência de uma vantagem, o seguinte:

«(125)      Em 17 de dezembro de 2007, o Ministério do Ambiente de Espanha e a Generalitat de Cataluña assinaram um acordo nos termos do qual acordaram em cooperar e partilhar os custos do projeto destinado a cobrir a escombreira de Vilafruns e reduzir assim o seu impacto negativo no ambiente […] Os custos totais do investimento elevavam‑se a 7 887 571 [euros] e foram inteiramente suportados pelas autoridades públicas, tal como estabelecido no acordo de 2007.

[…]

(131)      [A responsabilidade da recorrente de gerir os resíduos mineiros com origem na escombreira de Vilafruns] funda‑se na Lei 6/1993 espanhola, de 15 de julho de 1993, relativa aos resíduos, bem como no Real Decreto 1/2001, de 20 de julho de 2001, que aprova o texto reformulado da Lei da Água espanhola. A terceira parte interessada alega que o facto de Vilafruns já não estar em atividade no momento da sua aquisição pela [recorrente] é irrelevante, uma vez que qualquer titular de uma concessão mineira deve gerir os resíduos no seu conjunto, isto é, incluindo todos os resíduos produzidos antes da aquisição da concessão pelo titular.

[…]

(138)      A Comissão considera que, independentemente da dimensão das obrigações da [recorrente] em relação a Vilafruns, não é aceitável que o investimento público de 7,9 milhões de [euros] numa proteção ambiental significativamente melhor, equivalente, em princípio, à reabilitação da exploração sem custos de investimento para a [recorrente], não tenha, na realidade, proporcionado qualquer vantagem económica para a [recorrente]. A instalação da cobertura da escombreira tinha por objetivo reduzir significativamente a poluição causada pelas fugas provenientes da escombreira de Vilafruns. As medidas alternativas na ausência de auxílio não teriam proporcionado uma proteção tão boa e duradoura e teriam exposto a [recorrente] ao risco de ter que suportar as consequências da poluição (como demonstram as decisões penais de 18 de dezembro de 2014 e 25 de fevereiro de 2015 relativas a outros depósitos minerais de que é proprietária; ver considerandos 27 e 94 da Decisão de início do procedimento). Significa isto que a construção da instalação paga com recursos públicos permitiu à [recorrente] uma melhor prevenção da poluição, reduziu os seus riscos ambientais para o futuro e proporcionou uma reabilitação duradoura da escombreira (em consonância com os projetos de reabilitação de escombreiras de resíduos de sal semelhantes em França ou na Alemanha, tal como explicado nos considerandos 26 e 32). A [recorrente] teria sido obrigada, em última análise, a assegurar a adequada reabilitação da escombreira de Vilafruns.

(139)      Por último, a Comissão considera que a medida é seletiva, uma vez que se destinava especificamente ao financiamento público da cobertura da escombreira de Vilafruns, propriedade da [recorrente].

[…]

(148)      À luz do que precede, a Comissão considera que a [m]edida 4 constitui um auxílio estatal no valor de 7 887 571 [euros] e, por conseguinte, apreciará a sua legalidade e compatibilidade com o mercado interno.»

33      No que respeita à análise da compatibilidade do auxílio, a Comissão esclareceu, no considerando 152 da decisão impugnada, que a medida 1 constituía um auxílio ao funcionamento da recorrente, pois tinha permitido que os custos das comissões de garantia fossem inferiores aos que normalmente se aplicavam no período compreendido entre 2006 e 2016, o que era incompatível com o mercado interno porquanto não encontrou nenhum elemento que apoiasse uma possível compatibilidade de tais auxílios, que foram concedidos sem visar um objetivo de interesse comum aparente.

34      Em contrapartida, no que respeita à medida 4, a Comissão observou, nos considerandos 156 a 164 da decisão impugnada, que a cobertura da escombreira de Vilafruns constituía um auxílio compatível, ao abrigo da secção 3.1.1 do Enquadramento de 2008, relativa aos auxílios às empresas que superem as normas da União Europeia ou que, na sua ausência, melhorem o nível de proteção do ambiente.

35      Com efeito, a Comissão considerou que, na ausência de normas da União, a cobertura da escombreira de Vilafruns tinha permitido à recorrente aumentar o nível de proteção do ambiente decorrente das suas atividades. Para além disso, a Comissão, em primeiro lugar, calculou o montante total dos custos elegíveis, que ascendiam a 7 804 922,60 euros, em segundo lugar, determinou a intensidade máxima do auxílio autorizada para a recorrente, enquanto grande empresa, que correspondia a 50% dos custos elegíveis, e, em terceiro lugar, fixou a parte restante do montante total do auxílio incompatível em 3 985 109,70 euros.

 Tramitação processual e pedidos das partes

36      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 24 de abril de 2018, a recorrente interpôs o presente recurso.

37      A Comissão apresentou a sua contestação em 23 de julho de 2018.

38      A recorrente apresentou a sua réplica em 27 de setembro de 2018. A Comissão apresentou a sua tréplica em 12 de novembro de 2018.

39      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão impugnada;

–        a título subsidiário, anular a decisão impugnada na parte em que declara que a medida 1 contém um auxílio de Estado e ordena a sua recuperação;

–        anular a decisão impugnada na medida em que estabelece o montante de auxílio ilegal, mas compatível, e o montante de auxílio ilegal a ser recuperado no âmbito da medida 4;

–        condenar a Comissão nas despesas.

40      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

41      A recorrente apresenta cinco fundamentos de recurso. O primeiro é relativo à violação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, na medida em que a Comissão tinha erradamente chegado à conclusão de que a medida 1 implicava uma transferência de recursos do Estado. O segundo é relativo à violação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, na medida em que a Comissão tinha erradamente chegado à conclusão de que a medida 1 conferia uma vantagem ou, a título subsidiário, não tinha demonstrado que os montantes iniciais das garantias financeiras eram demasiado baixos. O terceiro é relativo à violação dos princípios da proteção da confiança legítima e da segurança jurídica. O quarto é relativo à violação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, na medida em que a Comissão considerou que a medida 4 conferia uma vantagem seletiva. O quinto fundamento, apresentado a título subsidiário, é relativo à violação do artigo 16.o, n.o 1, do Regulamento (UE) 2015/1589 do Conselho, de 13 de julho de 2015, que estabelece as regras de execução do artigo 108.o TFUE (JO 2015, L 248, p. 9), na medida em que a Comissão não determinou corretamente o montante do eventual auxílio resultante da medida 4.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, na medida em que a Comissão tinha erradamente concluído que a medida 1 implicava uma transferência de recursos do Estado

42      A recorrente alega que a medida 1 não cumpre o critério da transferência de recursos do Estado, pois não implicou qualquer redução do Orçamento do Estado.

43      Em primeiro lugar, as garantias financeiras que a recorrente tinha de constituir para a reabilitação das minas não foram prestadas pelo Estado, mas por bancos privados, aos quais a recorrente teria de pagar os prémios em caso de necessidade de mobilização. Daqui se conclui que o Estado não sofreu uma perda de receitas por as garantias terem sido fixadas a um nível alegadamente inferior ao exigido e que não existe, no presente caso, um nexo suficientemente direto entre a vantagem concedida e a redução do Orçamento do Estado.

44      Em segundo lugar, de acordo com a recorrente, não existia um risco económico suficientemente concreto para o Orçamento do Estado. Isso só teria acontecido se os custos de reabilitação se tivessem revelado irrecuperáveis junto da recorrente. Essa potencial obrigação de o Estado ter de suportar uma parte dos custos e o eventual encargo que daí adviria para o Orçamento do Estado eram, assim, demasiado longínquos e hipotéticos.  Segundo a recorrente, os princípios em matéria de garantias de Estado podem não se aplicar no presente caso. Por um lado, os argumentos da Comissão que mencionam esses princípios são inadmissíveis, porquanto essa instituição não se lhes referiu na decisão impugnada, e, por outro, a analogia com esses princípios era errónea. Em primeiro lugar, no caso das garantias de Estado, há uma transferência de recursos, pois o Estado renuncia a uma parte das receitas ao aceitar um prémio inferior ao que seria exigido por um garante privado. Porém, no presente caso, a recorrente tinha pagado um prémio conforme com o mercado. Em segundo lugar, no contexto das garantias de Estado, a vantagem para o beneficiário é clara, pois paga pela garantia do Estado um prémio menor do que por uma garantia similar prestada por um banco e a sua solvabilidade é aumentada, com a consequência de pagar menos juros. No caso em análise, nenhuma destas duas condições se encontra preenchida. Em terceiro lugar, nas garantias de Estado, este compromete‑se a pagar a um terceiro o montante garantido quando o beneficiário da garantia não cumpre a sua obrigação de reembolso do mútuo garantido, enquanto, no presente caso, o Estado não se comprometeu a pagar nenhum montante caso a garantia fosse insuficiente. Daqui se infere que a jurisprudência relativa às garantias de Estado não é aplicável no caso vertente.

45      Segundo a jurisprudência aplicável, esse risco hipotético de um encargo para o Orçamento do Estado só pode efetivar‑se caso o Estado seja um dos principais credores da empresa em dificuldades e se a empresa estiver insolvente. No presente caso, a recorrente pode garantir o respeito das suas obrigações, pois faz parte de um grupo multinacional de empresas (não apenas o grupo em Espanha), que dispõe de ativos consideráveis, que não se desvalorizarão após o fecho das minas de potassa, e que já no passado demonstrou dispor da capacidade financeira necessária para cobrir todas as medidas de reabilitação necessárias, independentemente do nível das garantias fixado. Como a responsabilidade ambiental de uma empresa abrange as sociedades do grupo controlado, o risco de o Estado ter de suportar uma eventual insolvência da recorrente não é suficientemente concreto.  Segundo a jurisprudência (Acórdão de 1 de dezembro de 1998, Ecotrade, C‑200/97, EU:C:1998:579), é necessária a presença de circunstâncias específicas que tornem mais do que provável uma redução dos recursos do Estado, não podendo a existência de um risco absolutamente mínimo ou hipotético bastar para se concluir que houve transferência de recursos do Estado.

46      Em terceiro lugar, a recorrente explica que, uma vez que, por força da legislação nacional e da União, as garantias financeiras só podem ser mobilizadas após cessação das atividades mineiras e que, durante a exploração, o montante da garantia deve ser periodicamente adaptado em função dos trabalhos de reabilitação necessários, o montante dessas garantias não é fixo, antes evoluindo com o decurso do tempo. Por conseguinte, só existe um risco para o Orçamento do Estado uma vez terminada a exploração mineira. No presente caso, visto o montante das garantias ter sido alterado para um nível adequado, em 2015 para a exploração de Súria e em 2016 para a exploração de Sallent/Balsareny, antes da cessação de uma qualquer atividade mineira, isso significa que, antes da decisão impugnada, o Estado espanhol não sofreu, em momento algum, um risco económico. A recorrente esclarece, designadamente, em resposta à Comissão, por um lado, que dispõe de outros ativos importantes em Espanha, para além das minas de potassa, a que o Estado poderia recorrer para executar a obrigação de pagar as medidas de reabilitação obrigatórias e, por outro, que a legislação espanhola permite obrigar os gerentes e administradores da empresa a porem em prática medidas que assegurem o respeito das obrigações ambientais.

47      Em quarto lugar, a recorrente invoca uma decisão anterior da Comissão [Comunicação da Comissão, SNIACE; Auxílio de Estado C 68/97 (NN 118/97) Espanha, JO 1998, C 49, p. 2, a seguir «Decisão SNIACE»], num processo similar ao presente. Nesse processo, não se considerou que o não cumprimento das obrigações ambientais implicava uma transferência de recursos do Estado e, portanto, que constituía um auxílio de Estado.

48      A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

49      Nos termos do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, «são incompatíveis com o mercado interno, na medida em que afetem as trocas comerciais entre os Estados‑Membros, os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções».

50      Importa igualmente recordar que, para uma vantagem poder ser qualificada de «auxílios», na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, deve, por um lado, ser concedida direta ou indiretamente através de recursos estatais e, por outro, ser imputável ao Estado (v. Acórdão de 15 de maio de 2019, Achema e o., C‑706/17, EU:C:2019:407, n.o 47 e jurisprudência referida). Estes dois requisitos são distintos e cumulativos (v. Acórdão de 30 de junho de 2015, Países Baixos e o./Comissão, T‑186/13, T‑190/13 e T‑193/13, não publicado, EU:T:2015:447, n.o 63 e jurisprudência referida).

51      No que toca ao requisito da utilização de recursos estatais, resulta da jurisprudência que não é necessário provar, em todos os casos, ter havido uma transferência de recursos estatais para que a vantagem concedida a uma ou a mais empresas possa ser considerada um auxílio de Estado na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. Assim, são considerados auxílios, nomeadamente, as intervenções que, de formas diversas, aliviam os encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa e que, por essa razão, não sendo subvenções na aceção estrita da palavra, têm a mesma natureza e efeitos idênticos (v. Acórdão de 19 de março de 2013, Bouygues e Bouygues Télécom/Comissão e o. e Comissão/França e o., C‑399/10 P e C‑401/10 P, EU:C:2013:175, n.os 100, 101 e jurisprudência referida).

52      Com efeito, é jurisprudência constante que o artigo 107.o, n.o 1, TFUE define as intervenções estatais em função dos seus efeitos (v. Acórdãos de 5 de junho de 2012, Comissão/EDF, C‑124/10 P, EU:C:2012:318, n.o 77 e jurisprudência referida, e de 19 de março de 2013, Bouygues e Bouygues Télécom/Comissão e o. e Comissão/França e o., C‑399/10 P e C‑401/10 P, EU:C:2013:175, n.o 102).

53      Assim, uma intervenção estatal, suscetível ao mesmo tempo de colocar as empresas a que se aplica numa situação mais favorável do que outras e de criar um risco suficientemente concreto da constituição, no futuro, de um encargo suplementar para o Estado, pode onerar os recursos estatais (v. Acórdão de 19 de março de 2013, Bouygues e Bouygues Télécom/Comissão e o. e Comissão/França e o., C‑399/10 P e C‑401/10 P, EU:C:2013:175, n.o 106 e jurisprudência referida).

54      Além disso, o Tribunal de Justiça esclareceu que as vantagens concedidas sob a forma de garantia de Estado podem implicar um encargo suplementar para o Estado (Acórdão de 19 de março de 2013, Bouygues e Bouygues Télécom/Comissão e o. e Comissão/França e o., C‑399/10 P e C‑401/10 P, EU:C:2013:175, n.o 107; v., igualmente, neste sentido, Acórdãos de 1 de dezembro de 1998, Ecotrade, C‑200/97, EU:C:1998:579, n.o 43, e de 8 de dezembro de 2011, Residex Capital IV, C‑275/10, EU:C:2011:814, n.os 39 a 42).

55      Além disso, resulta da jurisprudência que, na medida em que, em termos económicos, a alteração das condições de mercado, que cria uma vantagem indiretamente concedida a certas empresas, é o resultado de uma perda de recursos por parte dos poderes públicos, a própria interposição de uma decisão autónoma por parte dos investidores não tem por efeito suprimir o nexo existente entre a referida perda de recursos e a vantagem de que gozam as empresas em causa (Acórdão de 19 de março de 2013, Bouygues e Bouygues Télécom/Comissão e o. e Comissão/França e o., C‑399/10 P e C‑401/10 P, EU:C:2013:175, n.o 108).

56      Consequentemente, para efeitos da declaração da existência de um auxílio de Estado, a Comissão deve estabelecer um nexo suficientemente direto entre, por um lado, a vantagem concedida ao beneficiário e, por outro, uma diminuição do Orçamento do Estado, ou mesmo um risco económico suficientemente concreto de encargos que o onerem (Acórdão de 19 de março de 2013, Bouygues e Bouygues Télécom/Comissão e o. e Comissão/França e o., C‑399/10 P e C‑401/10 P, EU:C:2013:175, n.o 109).

57      No presente caso, no que toca, por um lado, à imputabilidade da medida 1 ao Estado, resulta do considerando 60 da decisão impugnada, e as partes não o contestam, que os montantes das garantias financeiras devidos pela recorrente foram definidos pelo Governo Autónomo da Catalunha em duas decisões administrativas autónomas, a saber, as licenças atribuídas à recorrente em 9 de novembro de 2006 e 28 de abril de 2008, para a exploração, respetivamente, das minas de Súria e de Sallent/Balsareny.

58      No que toca, por outro lado, ao critério dos recursos estatais, a Comissão considerou, no considerando 88 da decisão impugnada, relativamente à medida 1, que as garantias financeiras em causa não eram examinadas à luz das regras aplicáveis aos auxílios estatais no que respeita ao montante das comissões não pagas em função do risco ou da exposição do garante (isto é, um banco privado, e não o Estado), mas sim em função do risco para o Estado no caso de o montante garantido ser inferior ao custo real dos danos ambientais e no caso de a entidade garantida não pagar ou não conseguir pagar a totalidade dos custos de reabilitação. No considerando 90 da decisão impugnada, a Comissão reitera que existe um risco concreto de um efeito potencial nos recursos estatais devido ao risco acrescido de o Estado ser obrigado a mobilizar os seus recursos no futuro. Além disso, no considerando 91 da referida decisão, considera que a criação de um risco concreto que imponha um encargo suplementar para o Estado no futuro é suficiente para efeitos do cumprimento da noção de auxílio estatal e que para que este critério seja satisfeito não é necessário que a relação estreita ou as repercussões de uma medida de auxílio estatal nos recursos estatais sejam diretas.

59      Nos considerandos 92 a 99 da decisão impugnada, a Comissão precisa que o risco acrescido de os recursos estatais poderem ser afetados no futuro decorre do facto de o montante da garantia ser significativamente inferior aos eventuais custos de reabilitação previstos, na medida em que, caso a recorrente não queira ou não possa pagar essa reabilitação, os recursos estatais terão de cobrir uma parte maior desses custos, porquanto a obrigação de o Estado agir por conta própria caso a recorrente não queira ou não possa adotar as medidas de reabilitação necessárias está consagrada nas legislações nacional e da União aplicáveis. Daqui a Comissão conclui que um nível de garantias substancialmente inferior ao necessário exigido pela legislação expõe o Estado a um risco de encargos adicionais sobre os seus recursos. O risco acrescido é, portanto, suficientemente concreto para, pelo menos, ter um efeito potencial sobre os recursos estatais. A Comissão sublinha, além disso, que os ativos da recorrente que o Estado poderia penhorar, em caso de execução forçada, poderiam revelar‑se insuficientes.

60      Ora, em primeiro lugar, a recorrente não contesta que o montante das garantias financeiras conforme fixado nas decisões administrativas do Governo Autónomo da Catalunha era demasiado baixo. É verdade que a recorrente contesta, no âmbito do seu segundo fundamento, o método de análise e os elementos de prova em que a Comissão se baseou para concluir que o montante dessas garantias era efetivamente demasiado baixo e que estas lhe conferiam uma vantagem económica. Todavia, não afirma que o nível das garantias inicialmente fixado nas decisões administrativas do Governo Autónomo da Catalunha era correto ou suficiente.

61      Em segundo lugar, importa observar que, conforme foi claramente salientado nos considerandos 93 a 98 da decisão impugnada, o Estado espanhol tinha uma obrigação de intervenção subsidiária em caso de incumprimento das obrigações de proteção ambientais que impendem sobre as empresas que exercem a atividade mineira. Com efeito, por um lado, de acordo com o direito nacional, designadamente as disposições da Ley 27/2006 por la que se regulan los derechos de acceso a la información, de participación pública y de acceso a la justicia en materia de medio ambiente (incorpora las Diretivas 2003/4/CE y 2003/35/CE) [Lei 27/2006 que Regulamenta os Direitos de Acesso à Informação, à Participação do Público e ao Acesso à Justiça em Matéria de Ambiente (transposição das Diretivas 2003/4/CE e 2003/35/CE)], de 18 de julho de 2006 (BOE n.o 171, de 19 de julho de 2006, p. 27109), as autoridades podem ser obrigadas a cumprir as suas obrigações decorrentes da legislação ambiental. Além disso, por força do artigo 102.o de la Ley 39/2015 del Procedimiento Administrativo Común de las Administraciones Públicas (Lei 39/2015 relativa ao Procedimento Administrativo Comum das Administrações Públicas), de 1 de outubro de 2015 (BOE n.o 236, de 2 de outubro de 2015, p. 89343), o Estado pode proceder à execução subsidiária em substituição do sujeito que por força da lei é obrigado a adotar as medidas. Por outro lado, por força do direito da União, designadamente do artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva 2004/35/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de abril de 2004, relativa à responsabilidade ambiental em termos de prevenção e reparação de danos ambientais (JO 2004, L 143, p. 156), se um operador que deva tomar medidas de reparação na sequência de danos ambientais não cumprir as suas obrigações, pode ser a própria autoridade competente a tomar essas medidas, como último recurso. Além disso, se o Estado não interviesse em substituição das empresas, caso estas não respeitem as respetivas obrigações ambientais, poderia entrar em incumprimento das obrigações que lhe incumbem por força da Diretiva 2006/21 e correr o risco de ser objeto de um processo por incumprimento e condenado no pagamento de sanções pecuniárias compulsórias até cumprir as referidas obrigações.

62      Em terceiro lugar, a finalidade da obrigação legal prevista no artigo 14.o da Diretiva 2006/21 de exigir às empresas que exploram minas a constituição de garantias para a reabilitação dos locais e para cobrir os custos dos eventuais danos ambientais provocados pela exploração mineira, cujo montante deve ser calculado com base nos elementos indicados no n.o 2 da mesma disposição, é garantir que as sociedades mineiras dispõem de recursos suficientes para cobrir os futuros custos da reabilitação das minas, independentemente da sua futura situação financeira, e evitar designadamente que o Estado tenha de intervir para os assumir em sua substituição.

63      Ora, em virtude da obrigação, que incumbe ao Estado, de execução subsidiária em substituição da empresa que por lei é obrigada a tomar as medidas de reabilitação necessárias devido à exploração mineira, o nível das garantias definido para a referida empresa pode afetar os recursos estatais, na medida em que o risco económico da sua intervenção subsidiária, quando o nível das garantias é fixado num patamar demasiado baixo, é quantitativamente agravado em caso, nomeadamente, de insolvência dessa empresa.

64      Em quarto lugar, resulta da jurisprudência evocada no n.o 53, supra, que também se pode considerar que os recursos estatais são onerados se existir um «risco suficientemente concreto» da constituição, no futuro, de um encargo suplementar para o Estado.

65      A este propósito, primeiro, a recorrente alega que o risco de os recursos estatais serem onerados não é no presente caso suficientemente concreto devido à capacidade financeira que possui para cobrir os eventuais danos ambientais resultantes da sua exploração mineira. Interrogada a este respeito pelo Tribunal no âmbito de uma medida de organização do processo, a recorrente forneceu uma lista dos ativos (bens imóveis corpóreos) de que dispôs nos anos de 2012 a 2016, igualmente ao nível do grupo de sociedades a que pertence, bem como a parte dos seus balanços anuais respeitante a esses ativos. Na audiência, a Comissão chamou a atenção para o facto de os documentos apresentados pela recorrente não registarem os passivos e as dívidas da sociedade e só apresentarem os ativos que essa sociedade e o seu grupo possuíam unicamente no período compreendido entre 2012 e 2015‑2017 e também para o facto de essa sociedade não ter fornecido dados relativamente ao resto do período relevante compreendido entre 2006 e 2012.

66      Importa observar que os elementos fornecidos pela recorrente com vista a determinar a sua capacidade financeira para suportar os custos de eventuais danos ambientais ligados à exploração das suas minas são parciais e não permitem concluir com segurança que, no momento da eventual concretização dos riscos ambientais, a recorrente possuiria a capacidade necessária para os cobrir.

67      De qualquer modo, admitindo que a recorrente possua capacidade financeira suficiente a ponto de reduzir o risco de o Estado ter de intervir, há que considerar que, visto a situação financeira de uma empresa poder evoluir a qualquer momento devido a diferentes contingências económicas, e na medida em que, de um modo geral, a obrigação de constituição de uma garantia financeira se destina, precisamente, a que, independentemente da capacidade financeira da entidade obrigada à constituição da referida garantia, a capacidade financeira desta não influencia a determinação do montante adequado dessas garantias nem, em definitivo, a apreciação da existência de um risco suficientemente concreto de encargos que onerem o Orçamento do Estado.

68      Além disso, por um lado, o artigo 14.o, n.o 2, da Diretiva 2006/21 precisa que o cálculo da garantia referida no n.o 1 será efetuado com base no potencial impacto ambiental da instalação de gestão de resíduos, atendendo, em especial, à categoria da instalação, às características dos resíduos e à futura utilização dos terrenos reabilitados, bem como no pressuposto de que os trabalhos de reabilitação eventualmente necessários serão avaliados e efetuados por terceiros independentes e devidamente qualificados. A capacidade financeira da sociedade gestora da instalação não é, portanto, um critério pertinente para a fixação do montante das garantias.

69      Por outro lado, resulta da jurisprudência, evocada no n.o 55, supra, que o que importa são as alterações das condições normais de mercado suscetíveis de afetar o Orçamento do Estado, independentemente do comportamento provável dos operadores privados, e, no presente caso, da possibilidade de a própria recorrente cobrir in concreto os custos de eventuais danos ambientais associados a essas explorações mineiras.

70      Segundo, a recorrente contesta a admissibilidade e a procedência dos argumentos da Comissão relativos à aplicabilidade por analogia a este caso da jurisprudência relativa às garantias estatais. No que respeita à admissibilidade dos referidos argumentos, observe‑se que a Comissão invocou perante o Tribunal, nomeadamente, os Acórdãos de 1 de dezembro de 1998, Ecotrade (C‑200/97, EU:C:1998:579), e de 19 de março de 2013, Bouygues e Bouygues Télécom/Comissão e o. e Comissão/França e o. (C‑399/10 P e C‑401/10 P, EU:C:2013:175), para defender a tese segundo a qual a não mobilização imediata e efetiva de recursos estatais não exclui a existência de um encargo adicional para o Orçamento do Estado. Ora, esta tese da Comissão encontra‑se exposta, sem qualquer ambiguidade, no considerando 91 da decisão impugnada. Por conseguinte, contrariamente ao alegado pela recorrente, a Comissão não apresentou ao Tribunal uma fundamentação de substituição ou uma fundamentação complementar à constante da decisão impugnada. Os argumentos da Comissão são, portanto, admissíveis. No que respeita à procedência desses argumentos, sublinhe‑se que, embora no caso das garantias estatais o Orçamento do Estado seja onerado, designadamente em virtude da redução dos prémios que revertem para esse instrumento e, portanto, de uma redução imediata das suas receitas, numa situação como a em apreço, por um lado, existe igualmente uma vantagem em benefício da recorrente decorrente da redução dos prémios que terá de pagar sobre um montante das garantias inferior àquele que deveria ter estabelecido, alterando as condições normais de mercado. A circunstância de a perda de receitas afetar o orçamento da instituição bancária privada não obsta à identificação da existência de uma vantagem para a recorrente que decorre da fixação das garantias financeiras que ela tinha de constituir a um nível mais baixo do que era necessário.

71      Por outro lado, das considerações expostas nos n.os 61 a 63, supra, decorre que o risco de um encargo suplementar para o Orçamento do Estado também está presente numa situação como a presente, em que as disposições aplicáveis exigem que as garantias possam cobrir os riscos ambientais, certamente constituídas junto de um estabelecimento bancário privado, e em que existe uma obrigação de intervenção subsidiária do Estado no que toca à cobertura dos referidos riscos, pois o facto de uma empresa mineira constituir uma garantia a um nível demasiado baixo aumenta o risco de o Estado ter de intervir. Esse risco acrescido onera o Orçamento do Estado e o aumento desse risco é a consequência direta da fixação das garantias devidas a um nível demasiado baixo.

72      Com efeito, a fixação a um nível demasiado baixo das garantias destinadas a cobrir os riscos ambientais que oneram, a título principal, a recorrente e, a título subsidiário, o Estado aumenta o risco de um encargo suplementar para os dois titulares das obrigações de proteção ambientais. Este aumento do risco é um encargo suplementar concreto que onera os orçamentos dos dois titulares, a recorrente e, a título subsidiário, o Estado.

73      Terceiro, contrariamente ao que a recorrente defende, a incerteza ou o grau de probabilidade da concretização do risco para o Estado não é um elemento suscetível de conferir natureza puramente hipotética ao nexo entre a vantagem conferida à recorrente e o encargo suplementar para o Orçamento do Estado, antes representando apenas uma característica intrínseca ao conceito de «risco».

74      Quarto, a recorrente afirma, no essencial, que o Orçamento do Estado não tinha suportado qualquer risco económico antes da adoção da decisão impugnada, uma vez que as garantias financeiras só podem ser mobilizadas após a cessação das atividades mineiras e que, durante a exploração, em 2015 e 2016, foram alteradas e passaram a ter um valor adequado.

75      Todavia, cabe observar, como de resto a Comissão sublinha acertadamente, que o facto de o risco não se concretizar não elimina o risco adicional gerado pela medida 1, que é apreciado no momento da constituição da garantia e que perdurou ao longo do período em que o valor dessa garantia era demasiado baixo.

76      Quinto, na medida em que a recorrente invoca a Decisão SNIACE, referida no n.o 47, supra, cabe recordar que, nesse processo, entre as supostas medidas de auxílio que tinham sido analisadas pela Comissão figurava a alegada vantagem de que a SNIACE beneficiara devido ao facto de as autoridades espanholas não a terem obrigado a dar cumprimento à legislação em matéria de proteção do ambiente, designadamente construindo uma unidade de tratamento de efluentes e reparando os danos ecológicos causados. Segundo o autor da denúncia, nesse processo, tinham sido implicados recursos estatais devido ao facto de o Estado ter permitido a violação da legislação ambiental por essa empresa, uma vez que o referido Estado teve de suportar os custos decorrentes desses danos.

77      Segundo a Comissão, os dois processos diferem na medida em que, no processo que esteve na origem da Decisão SNIACE, o Estado limitou‑se a não exigir o cumprimento das obrigações ambientais à empresa, sem ter ele próprio a obrigação de construir a unidade em lugar dela, enquanto no presente processo o Estado estava obrigado, por força das legislações nacional e da União, a intervir em substituição da recorrente se esta não cumprisse as obrigações de reabilitação das suas minas.

78      Ora, admitindo que, conforme sustenta a recorrente, o processo que esteve na origem da Decisão SNIACE seja similar ao presente processo, na medida em que também dizia respeito a um risco futuro e hipotético de o Estado ter de suportar os custos dos danos ambientais decorrentes do facto de as empresas terem violado as suas obrigações, basta observar que, segundo jurisprudência bem assente, a Comissão não está vinculada pela sua prática anterior.

79      Com efeito, é apenas no contexto do artigo 107.o TFUE que se deve apreciar a legalidade de uma decisão da Comissão que declara que uma medida constitui um auxílio, e não à luz de uma alegada prática anterior (v., neste sentido, no que respeita à apreciação da compatibilidade de um auxílio com o mercado interno, Acórdão de 21 de julho de 2011, Freistaat Sachsen e Land Sachsen‑Anhalt/Comissão, C‑459/10 P, não publicado, EU:C:2011:515, n.o 38 e jurisprudência referida).

80      De todas as considerações anteriores resulta que a Comissão não cometeu nenhum erro de apreciação ao concluir, no considerando 90 da decisão impugnada, que existia um impacto potencial da medida 1 nos recursos estatais devido ao risco acrescido de o Estado vir a ser obrigado a mobilizar os seus recursos e, no considerando 91 da mesma decisão, que a criação de um risco concreto que no futuro venha a ser um encargo suplementar para o Estado é suficiente para efeitos do cumprimento da noção de auxílio estatal prevista no artigo 107.o, n.o 1, TFUE, em virtude da jurisprudência evocada no n.o 56, supra.

81      Por conseguinte, o primeiro fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, na medida em que a Comissão concluiu erradamente que a medida 1 conferia uma vantagem ou, a título subsidiário, na medida em que não demonstrou que os montantes iniciais das garantias financeiras eram demasiado baixos

82      A recorrente alega, em primeiro lugar, que a Comissão não demonstrou de forma positiva que a medida 1 lhe tinha conferido uma vantagem seletiva, dado que apenas se baseou na sentença do Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha), confirmada pelo Tribunal Supremo (Supremo Tribunal), nem determinou de forma autónoma o montante alegadamente correto das garantias que a recorrente prestou. Todavia, uma decisão judicial nacional não pode vincular a Comissão e esta instituição não pode cumprir a sua obrigação de demonstrar a existência de uma vantagem por remissão para uma decisão dessa natureza.

83      A Comissão cumpriu ainda menos as suas obrigações de análise em relação à exploração de Súria, a respeito da qual não havia sido tomada nenhuma decisão judicial a nível nacional, e alargou simplesmente a conclusão dos órgãos jurisdicionais nacionais mencionados no n.o 82, supra, acerca das garantias excessivamente baixas para o depósito mineral de Sallent/Balsareny à jazida de Súria, limitando‑se a afirmar, no considerando 64 da decisão impugnada, que o montante da garantia relativa a esse depósito também devia ser considerado insuficiente, pois também tinha sido aumentado e nenhum outro fator explicava a diferença entre o montante inicialmente fixado e o montante alterado em 2015. A Comissão cometeu um erro de apreciação, porquanto a atualização desse montante se deveu à atualização periódica dos planos de reabilitação.

84      Em segundo lugar, no considerando 75 da decisão impugnada, a Comissão cometeu um erro, por um lado, ao apoiar‑se, para corroborar a sua conclusão, em estudos efetuados por peritos, designadamente um estudo de agosto de 2012 encomendado a peritos ambientais (a seguir «estudo FER»), que não tinham respeitado as disposições pertinentes aplicáveis e que se tinham baseado em hipóteses irrealistas, em informações não oficiais e numa metodologia duvidosa, sem rigor científico e técnico, e, por outro, ao ignorar o relatório pericial apresentado pela recorrente (a seguir «relatório pericial Amphos»), que demonstrava a falta de fiabilidade do estudo FER. O facto de a Comissão não ter disposto desse relatório durante o procedimento administrativo não era relevante, pois a recorrente já tinha posto em causa a fiabilidade do estudo FER durante esse procedimento e a Comissão dispunha de indícios que demonstravam que não podia basear‑se nesse estudo.

85      Em terceiro lugar, no considerando 67 da decisão impugnada, a Comissão apoiou‑se erradamente nos debates parlamentares, quando ela própria já tinha afirmado que deviam ser tratados com prudência.

86      Em quarto lugar, no considerando 84 da decisão impugnada, a Comissão não demonstrou que a interpretação das disposições legislativas relativas à fixação dos montantes da garantia relativa às minas tinha sido seletiva no que respeita à recorrente.

87      A título subsidiário, no caso de o Tribunal considerar que a medida 1 confere uma vantagem seletiva, a recorrente afirma que, nos considerandos 109 a 122 da decisão impugnada, a Comissão estabeleceu o montante do auxílio em violação do artigo 16.o, n.o 1, do Regulamento 2015/1589, ao apoiar‑se no estudo FER, quando o relatório pericial Amphos demonstrava que o primeiro estudo não era fiável, e com base na sentença do Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha), ao considerar que o montante indicado nessa sentença era «correto» e ao fazer uma estimativa especulativa. Além disso, a Comissão não estabeleceu o método que o Reino de Espanha devia utilizar para calcular o montante do auxílio a recuperar.

88      A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

89      A título preliminar, recorde‑se que o artigo 14.o, n.o 1, da Diretiva 2006/21 estabelece que, «[a]ntes do início de qualquer operação que envolva a acumulação ou deposição de resíduos da extração numa instalação de resíduos, a autoridade competente exigirá a constituição de uma garantia financeira (por exemplo, sob a forma de um depósito financeiro, incluindo fundos de garantia mútua setoriais) ou equivalente, em termos a definir pelos Estados‑Membros».

90      O artigo 14.o, n.o 2, da Diretiva 2006/21 especifica o seguinte:

«O cálculo da garantia referida no n.o 1 será efetuado com base:

–        No impacto ambiental potencial da instalação de resíduos, atendendo, em especial, à categoria da instalação, às características dos resíduos e à futura utilização dos terrenos reabilitados;

–        No pressuposto de que os trabalhos de reabilitação eventualmente necessários serão avaliados e efetuados por terceiros independentes e devidamente qualificados.»

91      O artigo 16.o, n.o 1, do Regulamento 2015/1589 determina o seguinte:

«Nas decisões negativas relativas a auxílios ilegais, a Comissão decidirá que o Estado‑Membro em causa deve tomar todas as medidas necessárias para recuperar o auxílio do beneficiário […]. A Comissão não deve exigir a recuperação do auxílio se tal for contrário a um princípio geral de direito da União.»

92      Resulta de jurisprudência bem assente que a questão de saber se um auxílio é um auxílio de Estado na aceção do Tratado FUE deve ser resolvida com base em elementos objetivos a apreciar na data em que a Comissão toma a sua decisão. Consequentemente, é sobre a apreciação da situação efetuada pela Comissão nessa data que a fiscalização do juiz da União deve incidir (v. Acórdão de 11 de dezembro de 2008, Comissão/Freistaat Sachsen, C‑334/07 P, EU:C:2008:709, n.o 50 e jurisprudência referida).

93      Além disso, resulta da jurisprudência que a legalidade de uma decisão em matéria de auxílios de Estado deve ser apreciada em função das informações de que a Comissão dispunha no momento em que a tomou (v. Acórdão de 20 de março de 2013, Rousse Industry/Comissão, T‑489/11, não publicado, EU:T:2013:144, n.o 33 e jurisprudência referida). A Comissão também não pode ser criticada por não ter tido em conta eventuais elementos de facto ou de direito que lhe poderiam ter sido apresentados durante o procedimento administrativo, mas que não foram, uma vez que a Comissão não está obrigada a examinar oficiosamente e com base numa suposição os elementos que lhe poderiam ter sido fornecidos (v., neste sentido, Acórdão de 27 de setembro de 2012, Wam Industriale/Comissão, T‑303/10, não publicado, EU:T:2012:505, n.o 119 e jurisprudência referida).

94      No presente caso, para poder considerar que a fixação do montante das garantias financeiras constituía uma medida de auxílio que integra o âmbito de aplicação do artigo 107.o TFUE, a Comissão tinha de demonstrar que o nível dessas garantias era efetivamente inadequado e claramente inferior ao que tinha sido necessário para cobrir os custos da reabilitação das minas exploradas pela recorrente.

95      Resulta de jurisprudência constante que o conceito de auxílio de Estado, tal como definido no Tratado FUE, tem caráter jurídico e deve ser interpretado com base em elementos objetivos. Por essa razão, o juiz da União deve, em princípio, tendo em conta tanto os elementos concretos do litígio que lhe está submetido como o caráter técnico ou complexo das apreciações feitas pela Comissão, exercer uma fiscalização integral no que respeita à questão de saber se uma medida está abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE (v. Acórdão de 22 de dezembro de 2008, British Aggregates/Comissão, C‑487/06 P, EU:C:2008:757, n.o 111 e jurisprudência referida).

96      No entanto, no âmbito desta fiscalização, não compete ao juiz da União substituir pela sua própria apreciação económica a da Comissão. A fiscalização que os órgãos jurisdicionais da União exercem sobre as apreciações económicas complexas feitas pela Comissão é uma fiscalização restrita que se limita necessariamente à verificação do respeito das regras processuais e de fundamentação, da exatidão material dos factos, bem como da inexistência de um erro manifesto de apreciação e de um desvio de poder (v. Acórdão de 12 de outubro de 2016, Land Hessen/Pollmeier Massivholz, C‑242/15 P, não publicado, EU:C:2016:765, n.o 28 e jurisprudência referida).

97      Em primeiro lugar, cabe sublinhar que a Comissão precisou, no considerando 61 da decisão impugnada, em jeito de premissa ao exame que ia efetuar, que não procedeu à sua própria avaliação dos níveis corretos das garantias financeiras nos termos da Diretiva 2006/21, mas que tinha limitado a sua avaliação à análise das provas existentes da insuficiência de certas garantias financeiras, uma vez que existia um conjunto de indícios que sugeriam que o montante das garantias financeiras estabelecidas pelas autoridades públicas em 2006 e 2008 era efetivamente inferior ao exigido pela legislação aplicável.

98      Esta perspetiva justifica‑se em virtude da margem de apreciação que é reconhecida aos Estados‑Membros quanto à fixação dos montantes das garantias, para a qual o artigo 14.o da Diretiva 2006/21 apenas fornece linhas de orientação ou critérios que os Estados‑Membros devem ter em consideração no cálculo das referidas garantias. Assim, neste caso, a Comissão não podia ter fixado autonomamente o montante da garantia adequada sem exceder os limites da sua competência. Por conseguinte, o argumento da recorrente em que esta alega que a Comissão violou o seu dever de diligência na medida em que não procedeu a uma determinação autónoma do montante da garantia não pode ser acolhido.

99      Em segundo lugar, de acordo com a jurisprudência evocada nos n.os 92 e 93, supra, na medida em que lhe haviam sido submetidos indícios da fixação da garantia num valor excessivamente baixo, a Comissão estava no direito de apreciar a medida nacional em causa à luz das normas sobre os auxílios de Estado, e isto com base nas informações colocadas à sua disposição durante o procedimento administrativo.

100    Primeiro, a Comissão tomou em consideração a Sentença do Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha) de 11 de outubro de 2011, na qual se concluiu que o plano de reabilitação da exploração de Sallent/Balsareny estava incompleto e que o montante da garantia financeira fixado para esse plano era insuficiente.

101    A este respeito, a recorrente não logra demonstrar através dos seus argumentos que a Comissão cometeu um erro ao ter em conta aquela sentença na sua apreciação. Com efeito, como corretamente sublinha a Comissão, o órgão jurisdicional nacional, encarregado da interpretação e da aplicação do direito nacional, era quem estava mais bem colocado para avaliar se o plano de reabilitação previsto para a mina em questão bastava à luz da legislação nacional aplicável. Na decisão impugnada, a Comissão analisa detalhadamente a referida sentença. No considerando 62 da referida decisão, a Comissão sublinha que o órgão jurisdicional nacional entendeu que o montante da garantia não respeitava os parâmetros jurídicos e regulamentares estabelecidos no artigo 8.o, n.o 2, da Lei catalã n.o 12/1981 e no Decreto n.o 202/1994 e que, mesmo na falta de uma prova conclusiva para determinar o montante exato, podia concluir‑se que o montante que tinha sido fixado era claramente insuficiente e contrário a essas disposições e que tinha ordenado às autoridades nacionais que estabelecessem um novo nível da garantia financeira.

102    Por conseguinte, o órgão jurisdicional nacional também não determinou o montante das garantias que teria sido correto. Foram as autoridades nacionais competentes que modificaram e voltaram a fixar o montante das garantias, baseando‑se nas observações do referido órgão jurisdicional. Com efeito, no considerando 62 da decisão impugnada foi precisado que as autoridades nacionais, competentes para a fixação do montante das garantias, se basearam na Sentença Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha) de 11 de outubro de 2011 para proceder à revisão desses montantes, o que confirma a pertinência da referida sentença no âmbito da apreciação que a Comissão estava obrigada a fazer. Além disso, a referida sentença também tinha sido confirmada por Sentença do Tribunal Supremo (Supremo Tribunal) de 9 de julho de 2014.

103    Além disso, embora a Comissão não esteja vinculada pelas decisões dos órgãos jurisdicionais nacionais (Conclusões do advogado‑geral L. A. Geelhoed no processo Lucchini, C‑119/05, EU:C:2006:576, n.o 24), é‑lhe decerto lícito tomá‑las em consideração se considerar que são pertinentes para a sua apreciação.

104    De qualquer modo, importa sublinhar que a Comissão não se limitou a seguir a Sentença do Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha) de 11 de outubro de 2011, mas teve‑a em consideração no contexto de um conjunto de indícios que estavam na sua posse e que demonstravam a insuficiência dos montantes das garantias financeiras constituídas pela recorrente.

105    No que respeita ao argumento da recorrente relativo ao alegado erro que a Comissão cometeu, no considerando 64 da decisão impugnada, ao aplicar por analogia as conclusões da sentença do Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha) ao cálculo do montante da garantia financeira relativa à exploração de Súria, quando a sentença apenas dizia respeito à exploração de Sallent/Balsareny, conforme a Comissão sublinha sem ser contestada pela recorrente, esta última não forneceu, mesmo no âmbito do presente recurso, indícios de natureza a demonstrar que a fixação do montante para esta segunda exploração se devia basear em critérios de cálculo diferentes dos identificados na mencionada sentença. Na falta de outros elementos que pudessem ter feito a Comissão duvidar da possibilidade de aplicar os referidos critérios também à exploração de Súria, ou que pusessem em evidência as diferenças entre os planos de reabilitação necessários para as duas jazidas, a recorrente não podia pôr em causa a aplicação analógica dos critérios de cálculo enunciados na sentença do Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha) à exploração de Súria.

106    Em especial, a crítica da recorrente destinada a pôr em causa a conclusão da Comissão, segundo a qual a revisão pelas autoridades competentes, do montante da garantia relativa à exploração de Súria, em 2015, não era um indício de que o seu montante também tinha sido fixado num nível demasiado baixo, como a Comissão considerou, mas correspondia a uma revisão periódica normal desse montante, não pode ser acolhida. Com efeito, a recorrente não sustenta essa afirmação com nenhuma explicação do método de revisão periódica das garantias, dos intervalos em que essas revisões ocorrem ou no facto de a revisão de 2015 fazer efetivamente parte de uma dessas revisões periódicas, nem em qualquer elemento suscetível de comprovar essa afirmação.

107    Por força da jurisprudência evocada no n.o 93, supra, a Comissão não pode ser criticada por não ter tido em conta eventuais elementos de facto ou de direito que lhe poderiam ter sido apresentados durante o procedimento administrativo, mas que não foram, uma vez que a Comissão não está obrigada a examinar oficiosamente e com base numa suposição os elementos que lhe poderiam ter sido fornecidos.

108    Segundo, conforme referido no considerando 66 da decisão impugnada, a Comissão tomou em consideração outros elementos de prova que corroboravam a conclusão de que o nível inicial das garantias financeiras era demasiado baixo. A Comissão examinou, nomeadamente, as atas oficiais da audiência da Comissão do Ambiente do Parlamento da Catalunha de 2 de outubro de 2013, nas quais figurava uma declaração da diretora‑geral do Ambiente do Governo Autónomo da Catalunha segundo a qual as referidas garantias eram claramente insuficientes.

109    A recorrente contesta que se tomem em consideração esses debates, na medida em que a própria Comissão tinha considerado que deviam ser tratados com prudência. Porém, cabe observar que, embora não tenha entendido oportuno tomar em consideração os referidos debates no que respeita à fixação do montante exato das garantias, a Comissão podia ter em conta a declaração mencionada no n.o 108, supra, enquanto indício que corroborava a conclusão de que o montante das garantias era demasiado baixo.

110    Terceiro, a Comissão teve em conta um estudo de agosto de 2012 elaborado por peritos ambientais, concretamente o estudo FER, apresentado pelo autor da denúncia, que analisava o atual impacto ambiental das jazidas da zona de Bages (Espanha), onde se encontram situadas as jazidas da recorrente, e as medidas adotadas pelas autoridades públicas para reduzir esse impacto. Além disso, esse estudo apresentava previsões sobre a evolução futura do volume total de materiais acumulados nas escombreiras e concluía que o impacto ambiental dessas escombreiras era significativo e devia aumentar no futuro. O referido estudo também apresentava uma análise sobre as diferentes opções de reabilitação de outras explorações de potassa e os respetivos custos e concluía que o método mais adequado para as explorações da recorrente era a cobertura das escombreiras.

111    A recorrente contesta a tomada em consideração desse estudo, cujas fiabilidade, completude, rigor científico e método de análise adotado põe em causa, e apresenta, pela primeira vez no Tribunal Geral, outro estudo, que ela própria solicitou, a saber, o relatório pericial Amphos, que punha em evidência as lacunas do estudo FER.

112    A este propósito, por um lado, recorde‑se que, antes de mais, por força da jurisprudência referida no n.o 92, supra, a recorrente não pode acusar a Comissão de não ter tido em consideração as lacunas do estudo FER conforme identificadas no relatório pericial Amphos, porquanto este não fazia parte dos elementos que estavam na sua posse no momento em que adotou a decisão impugnada. Além disso, há que reconhecer, à semelhança da Comissão, que esse relatório apenas tinha por objeto a análise técnica do estudo FER, conforme indica o seu título, e não propunha outros conteúdos autónomos. Por último, o relatório pericial Amphos não sugeria um valor para as garantias diferente daquele que acabou por ser definido pela Comissão após ter em consideração o estudo FER. Por conseguinte, a recorrente não demonstrou de que forma os alegados erros contidos no estudo FER afetavam a determinação do montante correto das garantias controvertidas.

113    Por outro lado, na medida em que a recorrente afirma que a Comissão já dispunha, durante o procedimento pré‑contencioso, das suas observações que punham em evidência as alegadas lacunas do estudo FER, cabe observar, à semelhança da Comissão, em aplicação da jurisprudência evocada nos n.os 95 e 96, supra, que a apreciação da Comissão relativa ao método em que se baseou o estudo FER, que consistiu em identificar as diferentes opções de reabilitação e, de entre estas, a mais adequada para as explorações em questão, para em seguida calcular os custos prováveis que esse método comportaria, não é manifestamente incorreta. Com efeito, como refere acertadamente a Comissão, o Real Decreto 975/2009, em que se baseou o estudo FER, bem como o Decreto n.o 202/1994, que, segundo a recorrente, deveria ter servido de base ao referido estudo, estabelecem ambos um vínculo entre o cálculo do montante das garantias e os custos previstos com a reabilitação das jazidas. Além disso, o cálculo dos custos previstos efetuado pelo estudo FER baseia‑se na análise dos custos unitários dos diversos componentes necessários à cobertura da escombreira, no final de um estudo de mercado realizado pelos peritos junto dos empresários e fornecedores interessados. Os resultados desse cálculo foram também comparados com os custos totais das diferentes opções de reabilitação, conforme calculados noutro estudo realizado pela Direção‑Geral (DG) «Ambiente» da Comissão. Nestas circunstâncias, a recorrente não pode acusar a Comissão de, no considerando 75 da decisão impugnada, ter considerado que o estudo FER era fiável e se baseava numa metodologia coerente e em hipóteses razoáveis, fornecendo uma base adequada para formular uma estimativa dos custos da reabilitação previstos, tanto mais que a Comissão também comparou os resultados desse estudo com os obtidos para instalações similares noutras partes do mundo.

114    Por conseguinte, não se pode concluir que o considerando 75 da decisão impugnada padece de um erro manifesto de apreciação.

115    Quarto, a recorrente alega que a Comissão não logrou demonstrar que a medida era seletiva, a saber, que as disposições nacionais que fixam o montante das garantias controvertidas tinham sido interpretadas seletivamente em relação a si.

116    A este propósito, basta observar, conforme indicado no considerando 60 da decisão impugnada, que a medida 1 em causa foi concedida por meio de decisões autónomas de atribuição de licenças de exploração que tinham por destinatário a recorrente. Por conseguinte, a recorrente não podia pôr em causa o facto de ser a única empresa visada por essa medida.

117    Ora, decorre da jurisprudência que a exigência de seletividade diverge consoante a medida em causa seja considerada como um regime geral de auxílio ou como um auxílio individual. Neste último caso, a identificação da vantagem económica permite, em princípio, presumir a sua seletividade (Acórdão de 4 de junho de 2015, Comissão/MOL, C‑15/14 P, EU:C:2015:362, n.o 60; v., igualmente, neste sentido, Acórdão de 26 de outubro de 2016, Orange/Comissão, C‑211/15 P, EU:C:2016:798, n.os 53 e 54).

118    Daqui resulta que a Comissão não cometeu qualquer erro de apreciação ao concluir, nos considerandos 82 a 85 da decisão impugnada, que a medida 1 conferia uma vantagem seletiva à recorrente.

119    Quinto, relativamente ao argumento suscitado a título subsidiário pela recorrente a propósito de um alegado erro no cálculo do montante do auxílio, em violação do artigo 16.o, n.o 1, do Regulamento 2015/1589, há que observar que a recorrente reitera nesse contexto a maior parte das críticas formuladas no âmbito do presente fundamento e já rejeitadas nos n.os 100 a 113, supra.

120    Em especial, sublinhe‑se que a Comissão entendeu que o montante das garantias conforme revisto pelas autoridades nacionais em 2015 e em 2016, de acordo com as sentenças do Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha), podia ser considerado adequado com base nos resultados do estudo FER.

121    Ora, como foi explicado nos n.os 99 a 113, supra, a Comissão não cometeu nem um erro manifesto de apreciação ao ter em conta o estudo FER, nem um erro de apreciação ao apoiar‑se nas sentenças do Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha).

122    Além disso, a Comissão observa, sem ser contestada pela recorrente a esse respeito, que o montante dos custos de reabilitação considerado era o menor de entre todas as estimativas disponíveis e que esse montante ainda tinha sofrido uma redução em aplicação do artigo 3.o do Decreto n.o 202/1994, que previa uma redução de 50 % para as atividades mineiras que não fossem levadas a cabo em zonas de especial interesse natural.

123    Atendendo a todas as considerações anteriores, o argumento que a recorrente apresentou a título subsidiário não pode ser acolhido e, por conseguinte, o segundo fundamento deve ser julgado improcedente na íntegra.

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação dos princípios da proteção da confiança legítima e da segurança jurídica

124    A recorrente sustenta que, admitindo que o Tribunal Geral devesse considerar que a medida 1 constituía um auxílio de Estado incompatível com o mercado interno, teria de anular a decisão impugnada na medida em que esta obriga à recuperação desse auxílio.

125    Com efeito, em primeiro lugar, a decisão de recuperação põe em causa a confiança legítima da recorrente quanto à legalidade dos montantes das garantias financeiras inicialmente fixados. Embora a jurisprudência tenha esclarecido que as empresas não podem invocar a confiança legítima para contestar a recuperação de um auxílio ilegal, o presente processo apresenta circunstâncias excecionais que podem justificar essa confiança. Primeiro, a recorrente tinha alimentado uma confiança legítima no facto de não estar a beneficiar de um auxílio ilegal, dada a decisão anterior da Comissão no processo que esteve na origem da Decisão SNIACE, mencionada no n.o 47, supra, e um processo por incumprimento instaurado contra Estado espanhol por violação das obrigações decorrentes da Diretiva 2006/21. Esse processo não tinha por objeto o montante das garantias financeiras previstas no artigo 14.o da referida diretiva. No caso de o Tribunal considerar que esses elementos não são suficientes para justificar essa confiança, a recorrente alega que teve, porém, razões para a alimentar, pois as condições que permitem determinar se uma medida pode ser considerada um auxílio que deve ser objeto de uma notificação eram no presente caso complexas e difíceis de aplicar, o que a colocou numa situação de incerteza.

126    Segundo, a recorrente alega que, enquanto operador económico razoável e diligente, não podia prever que a Comissão viria a considerar que a fixação dos montantes das garantias financeiras destinadas a cobrir os custos associados às obrigações ambientais constituía um auxílio ilegal, dadas as circunstâncias excecionais referidas no n.o 125, supra. Em especial, a recorrente considera que a natureza inédita do presente processo não está relacionada com a questão de saber se foi atribuída uma vantagem, mas reside na constatação da Comissão de que houve transferência de recursos estatais. Além disso, decorre da prática decisória anterior da Comissão, nomeadamente da Decisão 2006/621/CE, de 2 de agosto de 2014, relativa ao auxílio Estatal concedido pela França a favor da France Télécom (JO 2006, L 257, p. 11), que a recuperação dos auxílios Estatais ilegais não era adequada, pois punha em causa a confiança legítima do beneficiário.

127    Terceiro, no presente caso, a confiança legitima prima sobre qualquer outro interesse de ordem pública que a recuperação possa prosseguir. Com efeito, o montante demasiado baixo das garantias tinha tido, na pior das hipóteses, um impacto insignificante no mercado, pelo que a recuperação do auxílio no presente caso não se justifica para corrigir distorções da concorrência.

128    Em segundo lugar, a recorrente alega que a decisão impugnada também viola o princípio da segurança jurídica, porquanto a conclusão de que a fixação de um montante das garantias financeiras insuficiente para garantir o respeito das obrigações ambientais constitui um auxílio de Estado ilegal não assenta numa base suficientemente clara e precisa à luz das normas em matéria de auxílios de Estado e viola igualmente o artigo 16.o do Regulamento 2015/1589. A recorrente invoca além disso a Decisão 2009/174/CE da Comissão, de 21 de outubro de 2008, relativa ao auxílio estatal C 35/04 concedido pela Hungria a favor do Postabank és Takarékpénztár Rt./Erste Bank Hungary Nyrt (JO 2009, L 62, p. 14), na qual a Comissão tinha preferido não proceder à recuperação do auxílio ilegal com o fundamento de que essa recuperação poria em causa o princípio da segurança jurídica.

129    A Comissão conteste os argumentos da recorrente.

130    Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a consequência lógica da declaração da ilegalidade de um auxílio é a sua supressão por via de recuperação a fim de restabelecer a situação anterior. Com efeito, o principal objetivo visado pela recuperação de um auxílio de Estado pago ilegalmente é eliminar a distorção da concorrência provocada pela vantagem concorrencial proporcionada por esse auxílio. Ora, com o reembolso do auxílio, o beneficiário perde a vantagem de que dispunha no mercado face aos seus concorrentes e a situação anterior à concessão do auxílio é reposta (Acórdão de 5 de março de 2019, Eesti Pagar, C‑349/17, EU:C:2019:172, n.o 131).

131    Resulta também desta função da recuperação que, regra geral, salvo circunstâncias excecionais, a Comissão não pode ignorar o seu poder discricionário quando pede ao Estado‑Membro que recupere os montantes concedidos a título de auxílios ilegais, uma vez que apenas restabelece a situação anterior (Acórdão de 9 de setembro de 2009, Diputación Foral de Álava e o./Comissão, T‑227/01 a T‑229/01, T‑265/01, T‑266/01 e T‑270/01, EU:T:2009:315, n.o 373).

132    No que respeita à alegação de que houve violação do princípio da proteção da confiança legítima, por força de jurisprudência constante, o direito de invocar esse princípio é extensivo a qualquer pessoa em quem uma instituição da União tenha suscitado esperanças fundadas, devido a garantias precisas que essa instituição lhe terá fornecido (v. Acórdão de 21 de julho de 2011, Alcoa Trasformazioni/Comissão, C‑194/09 P, EU:C:2011:497, n.o 71 e jurisprudência referida). Constituem garantias dessa natureza, independentemente da forma com que sejam comunicadas, informações precisas, incondicionais e concordantes, que emanem de fontes autorizadas e fiáveis. Em contrapartida, ninguém pode alegar violação deste princípio se não houver garantias precisas fornecidas pela Administração (v. Acórdão de 14 de fevereiro de 2006, TEA‑CEGOS e o./Comissão, T‑376/05 e T‑383/05, EU:T:2006:47, n.o 88 e jurisprudência referida).

133    Decorre deste princípio, especialmente aplicável em matéria de controlo dos auxílios de Estado por força do artigo 16.o do Regulamento 2015/1589, que a proteção da confiança legítima do beneficiário do auxílio pode ser invocada na condição de este dispor de garantias suficientemente precisas, resultantes de uma ação positiva da Comissão, que lhe permitam concluir que uma medida não constitui um auxílio de Estado na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE (v., por analogia, Acórdão de 30 de novembro de 2009, França e France Télécom/Comissão, T‑427/04 e T‑17/05, EU:T:2009:474, n.o 261).

134    Além disso, há que recordar que a obrigação de notificação constitui um dos elementos fundamentais do sistema de controlo instituído pelo Tratado FUE no domínio dos auxílios de Estado. No âmbito deste sistema, os Estados‑Membros têm a obrigação, por um lado, de notificar a Comissão de cada medida destinada a instituir ou a alterar um auxílio na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE e, por outro, de não pôr em execução tal medida, nos termos do artigo 108.o, n.o 3, TFUE, enquanto a referida instituição não tiver adotado uma decisão final sobre a mesma.

135    Por conseguinte, tendo em conta o caráter imperativo do controlo dos auxílios de Estado efetuado pela Comissão, as empresas beneficiárias de um auxílio só podem, em princípio, ter confiança legítima na regularidade de um auxílio se este tiver sido concedido no respeito do procedimento previsto no artigo 108.o TFUE, e um operador económico diligente deve normalmente poder assegurar‑se de que este procedimento foi respeitado. Em particular, quando um auxílio é executado sem notificação prévia à Comissão, sendo assim ilegal nos termos do artigo 108.o, n.o 3, TFUE, o beneficiário do auxílio não pode ter nesse momento confiança legítima na regularidade da sua concessão (Acórdãos de 11 de novembro de 2004, Demesa e Territorio Histórico de Álava/Comissão, C‑183/02 P e C‑187/02 P, EU:C:2004:701, n.os 44 e 45, e de 8 de dezembro de 2011, France Télécom/Comissão, C‑81/10 P, EU:C:2011:811, n.o 59).

136    No entanto, a jurisprudência não exclui a possibilidade de os beneficiários de um auxílio ilegal invocarem circunstâncias excecionais, que tenham podido legitimamente fundar a sua confiança legítima na regularidade desse auxílio, e, consequentemente, se oporem ao seu reembolso (v., neste sentido, Acórdão de 9 de setembro de 2009, Diputación Foral de Álava e o./Comissão, T‑30/01 a T‑32/01 e T‑86/02 a T‑88/02, EU:T:2009:314, n.o 282 e jurisprudência referida).

137    Também já foi declarado que um operador económico diligente devia normalmente poder assegurar‑se de que o procedimento de notificação foi respeitado (v., neste sentido, Acórdãos de 20 de setembro de 1990, Comissão/Alemanha, C‑5/89, EU:C:1990:320, n.o 14, e de 14 de janeiro de 1997, Espanha/Comissão, C‑169/95, EU:C:1997:10, n.o 51).

138    Além disso, segundo jurisprudência constante, o princípio da segurança jurídica implica que a legislação da União seja certa e que a sua aplicação seja previsível para os particulares (v. Acórdão de 21 de julho de 2011, Alcoa Trasformazioni/Comissão, C‑194/09 P, EU:C:2011:497, n.o 71 e jurisprudência referida).

139    Em primeiro lugar, no que respeita à alegada violação do princípio da proteção da confiança legítima, resulta da jurisprudência evocada nos n.os 132 à 136, supra, que para poder invocar utilmente esse princípio a recorrente deve demonstrar ter recebido garantias suficientemente precisas, incondicionais e concordantes, resultantes de uma ação positiva da Comissão, que lhe permitam concluir que uma medida não constitui um auxílio de Estado, ou que existiam circunstâncias excecionais que puderam legitimamente fundar a sua confiança legítima na regularidade desse auxílio.

140    No presente caso, a recorrente invoca, no essencial, por um lado, a Decisão SNIACE mencionada no n.o 47, supra, dado que, nesse processo, a Comissão tinha alegadamente chegado à conclusão de que o facto de o Estado espanhol não ter garantido o respeito das obrigações legais em matéria de ambiente não constituía um auxílio de Estado, pois não implicava qualquer transferência de recursos, e, por outro, o processo por incumprimento que a Comissão instaurou ao Estado espanhol devido ao não respeito das obrigações decorrentes da Diretiva 2006/21 e da Diretiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2000, que estabelece um quadro de ação comunitária no domínio da política da água (JO 2000, L 327, p.1), na medida em que esse processo não tinha por objeto a fixação de garantias financeiras de montantes demasiado baixos à luz do artigo 14.o da Diretiva 2006/21. Segundo a recorrente, nada deixava, portanto, presumir que a Comissão considerasse que a aplicação dessa diretiva pelas autoridades espanholas conferia uma vantagem na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

141    Todavia, primeiro, um precedente não pode constituir uma garantia precisa, incondicional e concordante, dado que não visava analisar a situação específica da recorrente.

142    De qualquer modo, no que toca à prática anterior, já foi recordado, no n.o 79, supra, que esta não vincula a Comissão, que apenas deve basear a sua apreciação nas disposições do Tratado FUE e de direito derivado aplicáveis.

143    Atendendo às considerações anteriores, a recorrente não pode invocar a anterior decisão no processo SNIACE, nem a título de garantias precisas, incondicionais e concordantes, nem a título de circunstâncias excecionais.

144    Segundo, relativamente ao processo por incumprimento, instaurado contra o Estado espanhol por violação da Diretiva 2006/21 e da Diretiva 2000/60, cabe sublinhar, à semelhança da Comissão, que o facto de esta não ter invocado uma violação do artigo 107.o TFUE no âmbito desse processo, que tinha outro objeto, a saber, a violação da legislação ambiental da União, não podia criar na recorrente uma confiança legítima de que a Comissão já não iria proceder à análise de outros aspetos passíveis de se traduzir numa violação do artigo 107.o TFUE.

145    Por conseguinte, o facto de a Comissão não ter invocado, no processo por incumprimento mencionado no n.o 144, supra, uma violação das normas em matéria de auxílios de Estado em relação às garantias financeiras demasiado baixas fornecidas pelo beneficiário da medida não pode constituir nem uma garantia precisa, incondicional ou concordante nem uma circunstância excecional suscetível de justificar uma qualquer confiança legítima da recorrente na legalidade da medida 1.

146    Terceiro, no que respeita à alegação da recorrente segundo a qual, no presente caso, atendendo ao baixo valor do auxílio, a confiança legítima prima sobre qualquer outro interesse de ordem pública na recuperação, basta recordar, por um lado, que, nos termos do artigo 16.o, n.o 1, do Regulamento 2015/1589, a Comissão está, em princípio, obrigada a decidir que o Estado‑Membro recupere o auxílio se concluir pela sua ilegalidade e que essa disposição não define um limite abaixo do qual a Comissão disponha de uma margem de apreciação no que respeita à decisão de recuperação.

147    Por outro lado, como se observou no n.o 130, supra, o auxílio deve ser recuperado para restabelecer as condições de concorrência no mercado interno. Uma vez que a importância relativamente modesta do auxílio não exclui que possa existir distorção da concorrência (v., neste sentido, Acórdão de 24 de julho de 2003, Altmark Trans e Regierungspräsidium Magdeburg, C‑280/00, EU:C:2003:415, n.o 81 e jurisprudência referida), também não pode justificar uma decisão de não recuperar o referido auxílio.

148    Consequentemente, o argumento da recorrente não pode ser acolhido.

149    Em segundo lugar, quanto à alegada violação do princípio da segurança jurídica, a qualificação como auxílio da redução dos encargos que oneram o orçamento da recorrente, decorrente da fixação do montante das garantias financeiras a um nível demasiado baixo, não pode ser considerada, pelas mesmas razões que foram apresentadas nos n.os 141 a 145 e 147, supra, imprevisível para a recorrente, de acordo com a jurisprudência evocada no n.o 138, supra, e, portanto, contrária ao princípio da segurança jurídica.

150    Na medida em que a recorrente precisa que o caráter alegadamente inédito e imprevisível da qualificação efetuada pela Comissão reside na conclusão de que a medida 1 implicava uma transferência de recursos estatais, deve considerar‑se que, apesar da inexistência de precedentes idênticos na prática decisória da Comissão, a conclusão de que a medida 1 implicou um aumento do risco para o Orçamento do Estado dada a obrigação de intervenção subsidiária, que impendia sobre o Estado espanhol, no cumprimento das obrigações ambientais da recorrente também não era imprevisível para um operador económico atento e avisado. Com efeito, a medida 1 implicava necessariamente um aumento do risco que impendia sobre o Estado, nos termos da legislação aplicável conhecida pela recorrente, de ter de intervir em caso de insolvência desta última.

151    Além disso, na medida em que a recorrente invoca a anterior decisão da Comissão no processo Postabank, mencionada no n.o 128, supra, na qual a Comissão decidiu não recuperar o auxílio em causa com o fundamento de que recuperação violaria o princípio da segurança jurídica, o argumento deve ser julgado improcedente, por um lado, por analogia com a jurisprudência evocada no n.o 79, supra, e, por outro, dadas as importantes diferenças factuais entre o presente processo e o processo Postabank. Com efeito, basta observar, à semelhança da Comissão, que este último processo se inscrevia no contexto muito especial da adesão da Hungria à União e da incerteza dos operadores económicos relativamente às obrigações que essa adesão implicava. Em contrapartida, no presente caso, a recorrente estava consciente, desde a Sentença do Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha) de 11 de outubro de 2011, de que o nível das garantias financeiras prestadas era demasiado baixo para uma adequada reabilitação das suas jazidas.

152    Atendendo a todas as considerações anteriores, o terceiro fundamento deve ser julgado improcedente na íntegra.

 Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, na medida em que a Comissão considerou que a medida 4 conferia uma vantagem seletiva

153    A recorrente alega que a Comissão não demonstrou nem que a cobertura da escombreira de Vilafruns fazia parte das obrigações ambientais a que estava sujeita, nem que os custos suportados pelos poderes públicos espanhóis eram custos que deveria ter suportado caso a escombreira não fosse coberta pelos poderes públicos e contesta, no essencial, o considerando 138 da decisão impugnada. Segundo a recorrente, a Comissão deveria ter demonstrado que a sua situação financeira teria melhorado graças à medida 4 comparativamente à que teria tido na inexistência dessa medida. Essa análise deveria ter sido efetuada com base numa avaliação da extensão e do alcance exatos das obrigações legais da recorrente e dos custos necessários para lhes fazer face. A única obrigação que incumbia à recorrente por força do artigo 121.o da Lei espanhola relativa às Minas era adotar as medidas de reabilitação. A recorrente tinha tomado essas medidas. Como a decisão das autoridades espanholas de cobrir a escombreira de Vilafruns implicou custos muito superiores aos que tinha estimado no plano de reabilitação, a recorrente encontrava‑se numa situação menos favorável (e não mais favorável) comparativamente à que teria se não se tivesse procedido à cobertura da escombreira de Vilafruns. Por conseguinte, não lhe foi conferida nenhuma vantagem.

154    A recorrente esclarece que a Comissão não demonstrou que o financiamento da cobertura da escombreira de Vilafruns tinha de facto melhorado a sua situação financeira ou reduzido um encargo que normalmente oneraria o seu orçamento. A recorrente recorda, além disso, que as minas da escombreira de Vilafruns já não estavam em atividade e que, portanto, a referida escombreira já não gerava resíduos nem implicava riscos adicionais de poluição. Além disso, a Comissão não tinha justificado a sua afirmação segundo a qual a recorrente corria o risco de ser responsabilizada, tanto a nível civil como penal, por uma mina que, diferentemente das outras que possuía, já não estava em atividade. Por conseguinte, as decisões judiciais a que o considerando 138 da decisão impugnada faz referência eram irrelevantes para servir de fundamento a um qualquer risco de responsabilidade no que respeita às minas de Vilafruns, que continua a ser, portanto, puramente hipotético. Além disso, o facto de a cobertura das escombreiras ser uma prática corrente noutros Estados‑Membros era um elemento irrelevante para justificar a conclusão de que a recorrente deveria ter tomado medidas adicionais às previstas no seu plano de reabilitação de 2008.

155    A Comissão também não tinha fundamentado a afirmação segundo a qual a proteção acrescida tinha em qualquer caso beneficiado a recorrente, em virtude da diminuição do risco de poluição e de ter de pagar indemnizações por eventuais danos ambientais. Além disso, também não tinha fundamentado a conclusão a que chegou no considerando 159 da decisão impugnada, segundo a qual as medidas previstas pela recorrente no âmbito do seu plano de reabilitação não garantiam um nível de proteção ambiental adequado. A isso acresce que a cobertura da escombreira de Vilafruns tinha reduzido o valor económico da referida escombreira, pois nenhum operador económico potencialmente interessado na sua aquisição podia explorar o sal aí existente. Conclui‑se de todas as considerações anteriores que a Comissão não tinha feito prova bastante de que a medida 4 tinha conferido uma vantagem económica à recorrente.

156    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

157    Segundo jurisprudência constante, o conceito de «auxílio» abrange não apenas prestações positivas, como as subvenções, mas também as intervenções que, de diversas formas, aliviem os encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa e que, por esse motivo, não sendo subvenções na aceção estrita da palavra, têm a mesma natureza e efeitos idênticos (v. Acórdão de 20 de setembro de 2017, Comissão/Frucona Košice, C‑300/16 P, EU:C:2017:706, n.o 20 e jurisprudência referida). São, portanto, considerados auxílios de Estado as intervenções que, independentemente da forma que assumam, sejam suscetíveis de favorecer direta ou indiretamente empresas ou que devam ser consideradas uma vantagem económica que a empresa beneficiária não teria obtido em condições normais de mercado (Acórdãos de 24 de julho de 2003, Altmark Trans e Regierungspräsidium Magdeburg, C‑280/00, EU:C:2003:415, n.o 84, e de 8 de setembro de 2011, Comissão/Países Baixos, C‑279/08 P, EU:C:2011:551, n.o 87).

158    Nessa apreciação do que constitui uma vantagem, a Comissão deve, portanto, avaliar se a recorrente foi direta ou indiretamente favorecida ou se obteve uma vantagem que não poderia ter obtido em condições normais de mercado.

159    No presente caso, no considerando 138 da decisão impugnada, a Comissão considerou que, independentemente da dimensão das obrigações da recorrente em relação a Vilafruns, não era aceitável que o investimento público de 7,9 milhões de euros numa proteção ambiental significativamente melhor, equivalente, em princípio, à reabilitação da exploração sem custos de investimento para a recorrente, não tenha proporcionado qualquer vantagem económica à recorrente.

160    A Comissão esclareceu também que, sem esse auxílio, as medidas alternativas não teriam proporcionado uma proteção tão boa e duradoura e teriam exposto a recorrente ao risco de ter de suportar as consequências da poluição e que, por conseguinte, a construção da instalação paga com recursos públicos permitiu à recorrente uma melhor prevenção da poluição, reduziu os seus riscos ambientais para o futuro e proporcionou uma reabilitação duradoura da escombreira.

161    A recorrente contesta esta apreciação considerando, no essencial, que a medida de cobertura da escombreira de Vilafruns era uma decisão independente dos poderes públicos, que ia para além das suas obrigações ambientais e não estava obrigada a adotar, e que, portanto, não se podia considerar que tenha retirado daí uma vantagem.

162    Ora, em primeiro lugar, ninguém contesta que a cobertura da escombreira de Vilafruns constituía uma medida de proteção eficaz e duradoura contra a poluição. A recorrente confirmou na audiência que não contestava essa conclusão e limitou‑se a afirmar que as medidas de reabilitação previstas no seu plano de 2008 teriam garantido uma proteção igualmente eficaz. Por conseguinte, também não alegou que a medida de cobertura da escombreira era desproporcionada.

163    Em segundo lugar, o facto de a cobertura da escombreira constituir uma medida eficaz, duradoura e não desproporcionada para combater a poluição implica, em si mesma, que essa medida contribuiu para resolver o problema da poluição, cujas consequências teriam recaído sobre a recorrente. Independentemente das obrigações específicas e, nomeadamente, das medidas tecnicamente bastantes ou mais adequadas para garantir a reabilitação da exploração de Vilafruns, cabe referir que, por força das legislações nacional e da União aplicáveis, bem como do contrato de venda da instalação à recorrente, mencionados nos 131 à 136 da decisão impugnada, pesava sobre a recorrente uma responsabilidade de caráter geral de reparar continuadamente as eventuais consequências nefastas da poluição e da gestão da referida instalação.

164    Decorre das considerações anteriores que os argumentos da recorrente, relativos ao facto de não ter obrigação de cobrir a escombreira ou de tomar medidas de reabilitação mais onerosas do que as simples medidas de isolamento previstas no seu plano de reabilitação de 2008, as quais, em sua opinião, bastariam para cumprir as suas obrigações legais em matéria de ambiente, dado que a exploração de Vilafruns já não estava em atividade, são irrelevantes no contexto da apreciação da existência de uma vantagem a seu favor devida à medida 4, dado que a cobertura da escombreira constituiu uma medida eficaz e duradoura que permitia à recorrente não ter de adotar outras medidas de proteção ambiental durante um período muito longo.

165    Em terceiro lugar, a intervenção estatal, representada pelo investimento de 7,9 milhões de euros na cobertura da escombreira de Vilafruns, decidida e inteiramente financiada pelos poderes públicos, constitui uma prestação positiva, do mesmo modo que uma subvenção, que implica necessariamente uma vantagem para a recorrente, a qual, graças à cobertura da escombreira, não terá durante um longo período de adotar mais nenhuma medida de reabilitação. Além disso, mesmo admitindo, conforme sustenta a recorrente, que as medidas de isolamento previstas no plano de reabilitação de 2008 tenham podido garantir a curto prazo o controlo das fugas da escombreira, a verdade é que, se a recorrente tivesse de empreender ações mais importantes a médio ou a longo prazo, teria de suportar os custos no futuro. Por conseguinte, é inegável que a medida 4 favoreceu a recorrente, pois reduziu os riscos ambientais para o futuro, associados à exploração de Vilafruns.

166    Na medida em que a recorrente alega que a Comissão não fez prova desses riscos futuros, importa sublinhar, por um lado, que a importância desses riscos não era previsível ou quantificável para a Comissão. No considerando 158 da decisão impugnada, esta reconheceu que não existem normas específicas da União que definam o nível que a escombreira de Vilafruns deve atingir em termos ambientais. Por outro lado, por essa razão, a Comissão baseou‑se em duas decisões judiciais nacionais em que a recorrente tinha sido considerada responsável por danos ambientais, tanto a nível cível como penal, relativamente a outras minas, devido a fugas provenientes de minas para as quais só haviam sido adotadas medidas «ligeiras», para daí concluir que, efetivamente, esses riscos futuros também podiam existir para a exploração de Vilafruns. Além disso, a Comissão considerou que, também noutros países, a medida de cobertura da escombreira tinha sido adotada para resolver problemas persistentes de fugas das minas de potassa. Contrariamente ao que a recorrente sustenta, a Comissão podia tomar em consideração essas informações para determinar se era provável que existissem riscos futuros para a escombreira de Vilafruns, embora não os tenha podido quantificar com precisão.

167    Em quarto lugar, importa sublinhar que, de qualquer modo, admitindo que a Comissão não tenha demonstrado a existência de riscos futuros na decisão impugnada, resulta dos considerandos 159 e 162 dessa decisão que a Comissão reconheceu que a recorrente se encontrava numa situação absolutamente legal no que respeitava às suas obrigações ambientais e que, com a medida 4, o Estado tinha decidido adotar um nível de proteção ambiental mais elevado do que o que era necessário quando foi adotada a decisão impugnada. Com efeito, a referida medida fazia parte de um projeto‑piloto cujo objetivo era verificar a capacidade do método de reabilitação para resolver os problemas ambientais da região do Llobregat (Espanha) e prosseguia, portanto, um interesse público geral.

168    Ora, primeiro, o Estado pode decidir aplicar um nível de proteção ambiental superior ao mínimo exigido e, por maioria de razão, pode decidir adotar medidas que em dado momento ainda não são necessárias, mas que podem vir a sê‑lo no futuro, por motivos de interesse público geral. Mas não é por isso que a recorrente, enquanto empresa proprietária de uma das explorações objeto da medida estatal, fica dispensada de suportar os respetivos custos.

169    Com efeito, conforme é recordado no n.o 9 do Enquadramento de 2008, os Estados‑Membros podem impor condições em termos de proteção do ambiente que superem as obrigações da União, a fim de reduzirem ao máximo as externalidades negativas decorrentes das atividades económicas que podem ser prejudiciais para o ambiente, devido à poluição que causam.

170    Por força do «princípio do poluidor‑pagador», a que fazem referência os n.os 7 e 8 do Enquadramento de 2008, é possível eliminar essas externalidades negativas assegurando que o poluidor paga o custo da respetiva poluição, o que implica uma internalização plena dos custos ambientais pelo poluidor, com o objetivo de garantir que os custos privados (suportados pela empresa) refletem os verdadeiros custos sociais reais da atividade económica. O princípio do poluidor‑pagador pode ser aplicado quer através do estabelecimento de normas ambientais obrigatórias quer através de instrumentos baseados nos mecanismos do mercado. Alguns dos instrumentos baseados no mercado poderão implicar a concessão de auxílios estatais à totalidade ou a parte das empresas a eles sujeitas. É precisamente com o objetivo de criar incentivos a nível individual para alcançar um grau de proteção do ambiente superior ao requerido pelas normas da União ou para aumentar a proteção ambiental na ausência de tais normas que, segundo o n.o 10 do Enquadramento de 2008, os Estados‑Membros podem pretender utilizar os auxílios estatais.

171    Em segundo lugar, por força da legislação nacional aplicável, em especial do artigo 121.o da Lei espanhola relativa às Minas, o proprietário de uma mina que já não esteja ativa é obrigado a executar os planos de reabilitação aprovados pelas autoridades responsáveis pelas atividades mineiras. No presente caso, as autoridades competentes aprovaram a medida de cobertura da escombreira de Vilafruns.

172    A este propósito, importa observar que a Comissão teve em conta a circunstância de o Estado espanhol ter optado por um nível de proteção do ambiente mais elevado e retirou daí as consequências no âmbito do exame da compatibilidade do auxílio, concluindo precisamente que, em aplicação do Enquadramento de 2008, só devia ser recuperado junto da empresa o montante de 3 985 109,70 euros, e não a totalidade do investimento estatal no valor de 7 887 571 euros.

173    Em quinto lugar, na medida em que a recorrente alega que a cobertura da escombreira de Vilafruns tinha piorado a sua situação económica, dado que, na sequência dessa medida, a escombreira tinha perdido o seu valor económico pois tinha deixado de poder ser explorada para efeitos da extração e da venda de sal, basta referir que a recorrente não demonstrou nem justificou o valor das receitas que tinha perdido nem se essas eventuais receitas deveriam ser ponderadas com os custos da reabilitação que deveria ter assegurado durante a exploração.

174    De qualquer modo, a alegada desvalorização da escombreira de Vilafruns não pode afetar a constatação da existência de uma vantagem, a menos que se considere que essa diminuição de valor é economicamente mais importante do que a vantagem resultante da sua reabilitação duradoira, o que de forma alguma foi demonstrado pela recorrente.

175    Resulta das considerações anteriores que o quarto fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao quinto fundamento, relativo à violação do artigo 16.o, n.o 1, do Regulamento 2015/1589, na medida em que a Comissão não determinou corretamente o montante do eventual auxílio resultante da medida 4

176    A recorrente alega que, caso o Tribunal conclua que a medida 4 constitui um auxílio, então a decisão impugnada violou o artigo 16.o do Regulamento 2015/1589, pois não determinou corretamente o montante desse alegado auxílio de Estado. Com efeito, a Comissão tinha erradamente contabilizado os custos de investimento assumidos pelas autoridades públicas com a cobertura da escombreira, aos quais somou os lucros de exploração decorrentes desse investimento e deduziu os custos de manutenção e de exploração suportados pelo beneficiário devido ao investimento. Ora, a Comissão deveria ter tido em consideração, quando muito, o montante resultante da vantagem económica correspondente aos montantes que ela tinha despendido com as medidas de reabilitação que estava obrigada a executar no âmbito do seu plano de 2008, na medida em que tinham ultrapassado os custos de manutenção e exploração associados à medida 4. Esse montante tinha sido nulo e, portanto, a Comissão deveria ter concluído pela inexistência de uma vantagem. A recorrente reitera que, pelo contrário, a cobertura da escombreira de Vilafruns lhe causou perda de receitas e custos de oportunidade devido à impossibilidade de explorar a jazida de sal existente nessa escombreira.

177    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

178    O presente fundamento está estreitamente relacionado com o quarto fundamento e foi suscitado a título subsidiário relativamente a este.

179    A título preliminar, sublinhe‑se, conforme mencionado no n.o 172, supra, que a Comissão teve em conta o facto de a medida 4 ser uma medida destinada a melhorar a proteção ambiental, que tinha sido decidida pelas autoridades públicas para garantir um nível de proteção mais elevado do que o exigido pelas normas da União e que, portanto, excedia as necessidades existentes no momento da adoção da decisão impugnada, o que a própria reconhece, em substância, no considerando 162 da decisão impugnada.

180    Assim sendo, a Comissão começou por entender, no considerando 157 da decisão impugnada, que podia aplicar a secção 3.1.1 do Enquadramento de 2008, segundo a qual os auxílios ao investimento que permitam às empresas superar as normas da União relativas à proteção do ambiente ou, na sua ausência, melhorar o nível de proteção do ambiente são considerados compatíveis com o mercado interno.

181    Em seguida, em conformidade com o n.o 80 do Enquadramento de 2008, a fim de determinar o montante dos custos elegíveis, a Comissão teve em conta, nos considerandos 161 e 162 da decisão impugnada, os custos de investimento suplementares que tinham sido necessários para alcançar um grau de proteção do ambiente superior ao que a empresa teria alcançado na ausência de qualquer auxílio (ou seja, a diferença entre o montante do investimento estatal e os custos previstos para as medidas de isolamento definidas no plano de reabilitação de 2008). No considerando 165 da decisão impugnada, a Comissão inferiu desse montante os benefícios de exploração, que para uma exploração não ativa como a de Vilafruns eram igual a zero, e adicionou os custos de exploração dos primeiros cinco anos. A Comissão chegou, assim, à conclusão de que o montante total dos custos elegíveis era de 7 804 922,60 euros.

182    Por último, aplicando a intensidade máxima permitida para as grandes empresas, a Comissão entendeu, nos considerandos 171 e 172 da decisão impugnada, que 50 % dos custos elegíveis, a saber, 3 902 461,30 euros, podiam ser considerados compatíveis com o mercado interno, reduzindo assim o montante do auxílio a recuperar para 3 985 109,70 euros.

183    Assim, a Comissão ordenou a recuperação junto da recorrente do auxílio constituído pela medida 4 apenas no montante de 3 985 109,70 euros.

184    Em primeiro lugar, a recorrente alega um erro no cálculo do montante do auxílio constituído pela medida 4, na medida em que a Comissão não tomou em consideração, como ponto de referência para esse cálculo, o seu plano de reabilitação de 2008, mas o investimento de 7,9 milhões de euros realizado pelo Estado espanhol.

185    Ora, na medida em que se chegou à conclusão, nos n.os 162 a 171, supra, que, por um lado, a medida de cobertura da escombreira de Vilafruns constituía uma prestação positiva e uma medida eficaz, duradoura e não desproporcionada para pôr termo às fugas e aos riscos de poluição associados à referida escombreira, que, por força de uma obrigação geral de reabilitação da escombreira que recaía sobre a recorrente, deveriam, em qualquer caso, ter sido suportados por esta e, portanto, lhe proporcionava uma vantagem a médio ou longo prazo, e, por outro, que o Estado podia impor um nível mais elevado de proteção ambiental às empresas encarregadas da gestão das minas, há que concluir que a Comissão tomou corretamente em conta, no considerando 165 da decisão impugnada, o montante do investimento realizado pelo Estado como ponto de partida para o cálculo do montante do auxílio.

186    Em segundo lugar, na medida em que a recorrente acusa a Comissão de não ter tido em consideração os prejuízos e os custos que teve de suportar devido à impossibilidade de explorar a jazida de sal, importa referir que esta simples alegação não sustentada em elementos de prova não pode ser acolhida. Resulta do considerando 137 da decisão impugnada que, durante o procedimento administrativo, o Reino de Espanha tinha mencionado os custos de oportunidade que a recorrente sofrera por já não poder explorar a jazida para efeitos da extração de sal. Contudo, dessas observações não resulta que essas perdas tenham sido quantificadas ou justificadas durante o procedimento administrativo. Na falta desses elementos, os alegados custos e perdas devem, portanto, ser considerados hipotéticos.

187    Por conseguinte, essas perdas hipotéticas não tinham de ser contabilizadas pela Comissão no cálculo do montante do auxílio, conforme resulta da jurisprudência segundo a qual a recuperação do auxílio implica a restituição da vantagem por este concedida ao seu beneficiário e não a restituição do eventual benefício económico por este realizado através da exploração dessa vantagem (Acórdão de 21 de dezembro de 2016, Comissão/Aer Lingus e Ryanair Designated Activity, C‑164/15 P e C‑165/15 P, EU:C:2016:990, n.o 100).

188    Decorre das considerações anteriores que o quinto fundamento deve, também, ser julgado improcedente e, por conseguinte, o recurso na sua totalidade.

 Quanto às despesas

189    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, nos termos do pedido da Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A Iberpotash, SA, é condenada nas despesas.

Buttigieg

Berke

Costeira

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 16 de janeiro de 2020.

Assinaturas


*      Língua do processo: inglês.