Language of document : ECLI:EU:T:2014:983

Processo T‑450/09

Simba Toys GmbH & Co. KG

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI)

«Marca comunitária — Processo de declaração de nulidade — Marca tridimensional comunitária — Cubo com faces que contêm uma estrutura quadriculada — Motivos absolutos de recusa — Artigo 76.°, n.° 1, primeiro período, do Regulamento (CE) n.° 207/2009 — Inexistência de sinal exclusivamente composto pela forma do produto necessária à obtenção de um resultado técnico — Artigo 7.°, n.° 1, alínea e), ii), do Regulamento n.° 40/94 [atual artigo 7.°, n.° 1, alínea e), ii), do Regulamento n.° 207/2009] — Inexistência de sinal exclusivamente composto pela forma imposta pela própria natureza do produto — Artigo 7.°, n.° 1, alínea e), i), do Regulamento n.° 40/94 [atual artigo 7.°, n.° 1, alínea e), i), do Regulamento n.° 207/2009] — Inexistência de sinal exclusivamente composto pela forma que confere um valor substancial ao produto — Artigo 7.°, n.° 1, alínea e), iii), do Regulamento n.° 40/94 [atual artigo 7.°, n.° 1, alínea e), iii), do Regulamento n.° 207/2009] — Caráter distintivo — Artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 [atual artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009] — Inexistência de caráter descritivo — Artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 [atual artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009] — Aquisição de caráter distintivo pela utilização — Artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94 (atual artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 207/2009) — Dever de fundamentação — Artigo 75.°, primeiro período, do Regulamento n.° 207/2009»

Sumário — Acórdão do Tribunal Geral (Sexta Secção) de 25 de novembro de 2014

1.      Marca comunitária — Definição e aquisição da marca comunitária — Motivos absolutos de recusa — Sinais constituídos exclusivamente pela forma do produto necessária à obtenção de um resultado técnico — Conceito — Interpretação a luz do interesse geral e relativo

[Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigo 7.°, n.° 1, alínea e), ii)]

2.      Marca comunitária — Definição e aquisição da marca comunitária — Motivos absolutos de recusa — Sinais constituídos exclusivamente pela forma do produto necessária à obtenção de um resultado técnico — Identificação das características essenciais de um sinal tridimensional

[Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigo 7.°, n.° 1, alínea e), ii)]

3.      Marca comunitária — Definição e aquisição da marca comunitária — Motivos absolutos de recusa — Sinais constituídos exclusivamente pela forma do produto necessária à obtenção de um resultado técnico — Cubo com faces que têm uma estrutura quadriculada

[Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigo 7.°, n.° 1, alínea e), ii)]

4.      Marca comunitária — Definição e aquisição da marca comunitária — Motivos absolutos de recusa — Sinais constituídos exclusivamente pela forma que confere um valor substancial ao produto — Requisitos

[Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigo 7.°, n.° 1, alínea e), iii)]

5.      Marca comunitária — Definição e aquisição da marca comunitária — Motivos absolutos de recusa — Marcas desprovidas de caráter distintivo — Marcas tridimensionais constituídas pela forma do produto — Caráter distintivo — Critérios de apreciação

[Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigo 7.°, n.° 1, alínea b)]

6.      Marca comunitária — Definição e aquisição da marca comunitária — Motivos absolutos de recusa — Marcas desprovidas de caráter distintivo — Marcas tridimensionais constituídas pela forma do produto — Cubo com faces que têm uma estrutura quadriculada

[Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigo 7.°, n.° 1, alínea b)]

7.      Marca comunitária — Definição e aquisição da marca comunitária — Motivos absolutos de recusa — Marcas compostas exclusivamente por sinais ou indicações que podem servir para designar as características de um produto — Critérios

[Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigo 7.°, n.° 1, alínea c)]

8.      Marca comunitária — Definição e aquisição da marca comunitária — Motivos absolutos de recusa — Marcas compostas exclusivamente por sinais ou indicações que podem servir para designar as características de um produto — Marca tridimensional — Cubo com faces que têm uma estrutura quadriculada

[Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigo 7.°, n.° 1, alínea c)]

9.      Marca comunitária — Disposições processuais — Fundamentação das decisões — Artigo 75.°, primeiro período, Regulamento n.° 207/2009 — Alcance idêntico ao do artigo 235.° CE

(Artigo 253.° CE; Regulamento n.° 207/2009 do Conselho, artigo 75.°, primeiro período)

1.      Cada um dos motivos de recusa de registo enumerados no artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94 deve ser interpretado à luz do interesse geral subjacente. O interesse geral subjacente ao artigo 7.°, n.° 1, alínea e), ii), do mesmo regulamento consiste em evitar que o direito das marcas acabe por conceder a uma empresa um monopólio de soluções técnicas ou de características utilitárias de um produto.

As regras fixadas pelo legislador refletem, a este respeito, a ponderação de duas considerações que podem, cada uma delas, contribuir para a concretização de um sistema de concorrência equitativo e eficaz.

Por um lado, a introdução, no artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94, da proibição de registar como marca qualquer sinal composto pela forma do produto necessária para obter um resultado técnico garante que as empresas não podem utilizar o direito das marcas para perpetuar, indefinidamente, direitos exclusivos sobre soluções técnicas.

Com efeito, quando a forma de um produto se limita a incorporar a solução técnica desenvolvida pelo fabricante desse produto e patenteada a seu pedido, a proteção dessa forma como marca, após o termo da validade da patente, reduziria consideravelmente e para sempre a possibilidade de as outras empresas utilizarem a referida solução técnica. Ora, no sistema dos direitos de propriedade intelectual, tal como foi desenvolvido pela União, as soluções técnicas só podem ser objeto de uma proteção de duração limitada, de modo a, subsequentemente, poderem ser livremente utilizadas por todos os operadores económicos.

Além disso, o registo como marca de uma forma exclusivamente funcional de um produto pode permitir ao titular dessa marca proibir às outras empresas não só a utilização da mesma forma mas também a utilização de formas semelhantes.

Por outro lado, ao limitar o motivo de recusa estabelecido no artigo 7.°, n.° 1, alínea e), ii), do Regulamento n.° 40/94 aos sinais compostos «exclusivamente» pela forma do produto «necessária» para obter um resultado técnico, o legislador considerou devidamente que toda a forma de produto é, em certa medida, funcional e que, por conseguinte, seria inadequado recusar o registo de uma forma de produto como marca, pela simples razão de apresentar características utilitárias. Com os termos «exclusivamente» e «necessária», a referida disposição garante que só é recusado o registo das formas de produto que se limitam a incorporar uma solução técnica e cujo registo como marca impediria, portanto, realmente, a utilização dessa solução técnica por outras empresas.

(cf. n.os 32‑37)

2.      A aplicação correta do artigo 7.°, n.° 1, alínea e), ii), do Regulamento n.° 40/94 no que respeita à marca comunitária implica que as características essenciais do sinal tridimensional em causa sejam devidamente identificadas pela autoridade que decide do pedido de registo deste sinal como marca. A expressão «características essenciais» deve ser entendida no sentido de que se refere aos elementos mais importantes do sinal.

A identificação das referidas características essenciais deve ser feita caso a caso, sem que exista nenhuma hierarquia sistemática entre os diferentes tipos de elementos que podem compor um sinal. Na determinação das características essenciais de um sinal, a autoridade competente pode basear‑se diretamente na impressão geral suscitada pelo sinal, ou, primeiro, examinar sucessivamente cada um dos elementos constitutivos do sinal.

Em especial, a identificação das características essenciais de um sinal com vista a uma eventual aplicação do motivo de recusa enunciado no artigo 7.°, n.° 1, alínea e), ii), do Regulamento n.° 40/94 pode, consoante o caso, e em particular atendendo ao seu grau de dificuldade, ser feita através de um simples exame visual desse sinal ou, pelo contrário, basear‑se numa análise aprofundada no âmbito da qual sejam tidos em conta elementos úteis à apreciação, como inquéritos e peritagens, ou ainda dados relativos a direitos de propriedade intelectual conferidos anteriormente em relação ao produto em causa.

Uma vez identificadas as características essenciais do sinal, incumbe ainda ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) verificar se todas essas características desempenham a função técnica do produto em causa. Com efeito, o artigo 7.°, n.° 1, alínea e), ii), do Regulamento n.° 40/94 não pode ser aplicado quando o pedido de registo como marca tem por objeto uma forma de produto na qual um elemento não funcional, como um elemento ornamental ou de fantasia, desempenha um papel importante. Nesse caso, as empresas concorrentes têm facilmente acesso a formas alternativas de funcionalidade equivalente, de modo que não existe risco de restrição da disponibilidade da solução técnica. Nesse caso, esta solução poderá ser incorporada sem dificuldade, pelos concorrentes do titular da marca, em formas de produto que não tenham o mesmo elemento não funcional que aquele de que dispõe a forma do produto do referido titular e que, em relação a esta, não sejam, portanto, nem idênticos nem semelhantes.

(cf. n.os 38‑41)

3.      V. texto da decisão.

(cf. n.os 44‑77)

4.      Nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea e), iii), do Regulamento n.° 40/94sobre a marca comunitária «[s]erá recusado o registo […] de sinais exclusivamente compostos […] pela forma que confere um valor substancial ao produto». Para que este motivo de recusa possa ser aplicado, é preciso que o sinal em causa seja exclusivamente composto por uma forma e que as respetivas características estéticas, a saber, a sua aparência exterior, determinem em grande medida a escolha do consumidor e, consequentemente, o valor comercial do produto em causa. Quando a forma confere assim um valor substancial ao produto em causa, é irrelevante que outras características do produto, tais como as qualidades técnicas no caso concreto, lhe possam igualmente conferir um valor importante.

(cf. n.os 86, 87)

5.      Nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, será recusado o registo de «marcas desprovidas de caráter distintivo». O caráter distintivo de uma marca, na aceção desta disposição, significa que essa marca permite identificar o produto para o qual foi pedido o registo como proveniente de uma empresa determinada e, portanto, distinguir esse produto dos das outras empresas. Esse caráter distintivo deve ser apreciado, por um lado, relativamente aos produtos ou aos serviços para os quais o registo foi pedido e, por outro, em relação à perceção que deles tem o público interessado.

Os critérios de apreciação do caráter distintivo das marcas tridimensionais constituídas pela forma do próprio produto não são diferentes dos critérios aplicáveis às outras categorias de marcas.

No entanto, no âmbito da aplicação desses critérios, a perceção do público relevante não é necessariamente a mesma no caso de uma marca tridimensional, constituída pela forma do próprio produto, e no caso de uma marca nominativa ou figurativa, que consiste num sinal independente do aspeto dos produtos que designa. Com efeito, os consumidores médios não têm por hábito presumir a origem dos produtos baseando‑se na sua forma ou no seu acondicionamento, na falta de qualquer elemento gráfico ou textual, e, por isso, pode tornar‑se mais difícil provar o caráter distintivo quando se trata de uma marca tridimensional do que quando se trata de uma marca nominativa ou figurativa.

Por outro lado, quanto mais a forma cujo registo foi pedido se aproxima da forma mais provável que terá o produto em causa mais verosimilmente a referida forma será desprovida de caráter distintivo nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. Nestas condições, apenas uma marca que, de forma significativa, diverge da norma ou dos hábitos do setor e, por esta razão, cumpre a sua função essencial de origem tem caráter distintivo na aceção da referida disposição.

Por último, para se apurar se a combinação dos elementos que compõem uma forma pode ser apreendida pelo público relevante como uma indicação de origem, há que analisar a impressão de conjunto produzida por essa combinação, o que não é incompatível com um exame posterior dos diferentes elementos de apresentação utilizados.

(cf. n.os 92‑94, 96‑99)

6.      V. texto da decisão.

(cf. n.os 103, 104, 106‑110)

7.      O artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 sobre a marca comunitária impede que os sinais, ou as indicações por ele visadas, sejam reservados a uma única empresa com base no seu registo como marca. Esta disposição prossegue um fim de interesse geral, que exige que esses sinais ou indicações possam ser livremente utilizados por todos. Os sinais e as indicações são os que podem servir, numa utilização normal do ponto de vista do público em causa, para designar seja diretamente, seja por referência a uma das suas características essenciais, o produto ou o serviço para o qual é pedido o registo. Daí resulta que, para que um sinal seja abrangido pela proibição enunciada pela referida disposição, é necessário que apresente com os produtos ou os serviços em causa um nexo suficientemente direto e concreto, suscetível de permitir ao público em causa perceber imediatamente e sem refletir uma descrição da categoria de produtos ou serviços em causa ou de uma das suas características.

Por último, a apreciação do caráter descritivo de um sinal só pode ser feita, por um lado, em relação à compreensão que dele tem o público em causa e, por outro, em relação aos produtos ou aos serviços em causa. Com efeito, o caráter descritivo de uma marca deve ser apreciado relativamente aos produtos ou serviços para os quais a marca foi registada e tendo em conta a perceção que se presume que um consumidor médio normalmente informado e razoavelmente atento e avisado tem da categoria de produtos ou de serviços em causa.

(cf. n.os 116‑120)

8.      V. texto da decisão.

(cf. n.os 123‑125)

9.      Nos termos do artigo 75.°, primeiro período, do Regulamento n.° 207/2009 sobre a marca comunitária, as decisões do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) devem ser fundamentadas. Este dever tem o mesmo alcance que o consagrado no artigo 253.° CE.

O dever de fundamentar as decisões individuais tem o duplo objetivo de permitir, por um lado, ao interessado conhecer as justificações da medida adotada para defender os seus direitos e, por outro, ao juiz da União exercer a sua fiscalização da legalidade da decisão.

Não se pode exigir das Câmaras de Recurso que apresentem uma exposição que acompanhe exaustiva e individualmente todos os passos do raciocínio articulado pelas partes no litígio. A fundamentação pode, portanto, ser implícita, na condição de permitir aos interessados conhecerem as razões por que a decisão da Câmara de Recurso foi tomada e ao órgão jurisdicional competente dispor dos elementos suficientes para exercer a sua fiscalização.

(cf. n.os 135‑137)