Language of document : ECLI:EU:T:2005:340

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Primeira Secção)

27 de Setembro de 2005 (*)

«Marca comunitária – Sinal nominativo CARGO PARTNER – Motivo absoluto de recusa – Artigo 7.º, n.° 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.° 40/94 – Falta de carácter distintivo»

No processo T‑123/04,

Cargo Partner AG, com sede em Fischamend (Áustria), representada por M. Wolner, advogado,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por G. Schneider, na qualidade de agente,

recorrido,

que tem por objecto um recurso interposto da decisão da Primeira Câmara de Recurso do IHMI, de 26 de Janeiro de 2004 (processo R 346/2003‑1), relativo ao pedido de registo do sinal nominativo CARGO PARTNER como marca comunitária,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Primeira Secção),

composto por: J. D. Cooke, presidente, R. Garcia‑Valdecasas e V. Trstenjak, juízes,

secretário: J. Plingers, administradora,

vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 31 de Março de 2004,

vista a resposta do IHMI entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 9 de Julho de 2004,

após a audiência de 9 de Março de 2005,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Em 14 de Maio de 2002, a Cargo Partner AG apresentou um pedido de marca comunitária ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), nos termos do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), na versão alterada.

2        A marca cujo registo é pedido é o sinal nominativo CARGO PARTNER.

3        Os serviços para os quais foi pedido o registo enquadram‑se nas classes 36 e 39 na acepção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, como revisto e alterado, e correspondem à seguinte descrição:

–        classe 36: «Seguros»;

–        classe 39: «Transporte; embalagem e entreposto de mercadorias; organização de viagens».

4        Por decisão de 19 de Março de 2003, o examinador, nos termos do artigo 7.º, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento n.° 40/94, rejeitou o pedido de registo para os serviços de transporte, embalagem e entreposto de mercadorias, incluídos na classe 39, por falta de carácter distintivo e em razão do carácter descritivo do sinal nominativo em questão.

5        Em 19 de Maio de 2003, a requerente interpôs recurso no IHMI, nos termos dos artigos 57.º a 62.º do Regulamento n.° 40/94, da decisão do examinador no que diz respeito à recusa do registo da marca para os serviços acima mencionados no n.° 3.

6        Por decisão de 26 de Janeiro de 2004, proferida no processo R 346/2003‑1 (a seguir «decisão impugnada»), a Primeira Câmara de Recurso do IHMI negou provimento ao recurso pelo facto de a marca pedida ser desprovida de carácter distintivo na acepção do artigo 7.º, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 e confirmou assim a decisão do examinador de 19 de Março de 2003.

7        No âmbito da apreciação do carácter distintivo do sinal nominativo CARGO PARTNER, a Câmara de Recurso referiu que o público‑alvo era o público anglófono na sua totalidade.

8        Considerou, essencialmente, que, à luz do seu significado em inglês, os termos «cargo» e «partner» são desprovidos de carácter distintivo relativamente à lista dos serviços em questão, que consistem em serviços de transporte bem como em serviços conexos, como a embalagem e entreposto de mercadorias. Considerou que a expressão inglesa «cargo partner» podia ser traduzida para alemão como «Frachtpartner» ou «Transportpartner» e que a sua formação era conforme às regras gramaticais da língua inglesa.

9        Em seguida, a Câmara de Recurso salientou, referindo‑se a um sítio Internet, que o sinal CARGO PARTNER já era utilizado para designar os parceiros de transporte. Acrescenta que não é importante o facto de que nenhum dicionário especializado tenha ainda incluído essa expressão.

10      A Câmara de Recurso considerou que nenhum elemento permitia afirmar que, na sua totalidade e considerado em relação aos serviços em questão, o sinal CARGO PARTNER representava mais do que a soma dos elementos de que é composto. Daqui concluiu que o referido sinal era desprovido de um grau mínimo de carácter distintivo necessário para efeitos de registo e, portanto, que estava excluído do registo por força do artigo 7.º, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

 Pedidos das partes

11      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        reformar a decisão impugnada de forma a que o registo do sinal pedido seja admitido;

–        subsidiariamente, remeter o processo para o IHMI;

–        em qualquer caso, conceder à recorrente o reembolso das suas despesas.

12      O IHMI conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Quanto à admissibilidade

13      O IHMI alega, em primeiro lugar, três questões prévias de inadmissibilidade, duas relativas à admissibilidade do próprio recurso e a terceira relativa à admissibilidade da primeira parte dos pedidos do recurso. Ao invés, a recorrente considera que o seu recurso é admissível.

 Quanto à primeira questão prévia de inadmissibilidade

 Argumentos das partes

14      O IHMI invoca a inadmissibilidade do recurso pelo facto de a representação da recorrente não estar em conformidade com o artigo 19.º do Estatuto do Tribunal de Justiça. Recorda que, por força desta disposição, as partes, com excepção das instituições e dos Estados‑Membros, devem ser representadas por um advogado autorizado a exercer nos órgãos jurisdicionais de um Estado‑Membro. De acordo com a petição, a recorrente é representada pela sociedade de responsabilidade limitada Gassauer‑Fleissner Rechtsanwälte. Ora, esta menção é acompanhada na petição por uma assinatura que não é possível identificar como correspondendo aos nomes Gassauer ou Fleissner.

15      Na sua resposta, o IHMI reconhece que uma pessoa colectiva pode igualmente estar habilitada a exercer advocacia por intermédio dos seus sócios habilitados a representá‑la. No entanto, o IHMI defende que a representação de uma parte por uma pessoa colectiva, nas condições do presente processo, não está em conformidade com o artigo 19.º do Estatuto do Tribunal de Justiça. Na audiência, o IHMI referiu que a representação no Tribunal de Primeira Instância deve ser efectuada por uma pessoa singular, ao passo que a recorrente mandatou uma pessoa colectiva para a representar.

16      Além disso, o IHMI pretende que o processo não contém nenhuma lista dos sócios habilitados a representar a Gassauer‑Fleissner Rechtsanwälte. Alega que, mesmo se um documento confirma a habilitação de um certo Michael Wolner, este não é mencionado como representante nem na procuração emitida pela recorrente nem na própria petição. Além disso, não foi apresentada nenhuma certidão do registo comercial relativa à Gassauer‑Fleissner Rechtsanwälte.

17      Daí o IHMI conclui que, no momento da apresentação da petição, não estava provada a habilitação dos advogados da recorrente para a representar nos órgãos jurisdicionais comunitários, o que constitui uma violação das formalidades essenciais e implica a inadmissibilidade do presente recurso.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

18      Como resulta do artigo 19.º, terceiro e quarto parágrafos, do Estatuto do Tribunal de Justiça, aplicável ao processo no Tribunal de Primeira Instância por força do artigo 53.º, primeiro parágrafo, do mesmo estatuto, só um advogado autorizado a exercer nos órgãos jurisdicionais de um Estado‑Membro ou de outro Estado parte no Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (EEE) pode realizar validamente actos processuais no Tribunal de Primeira Instância por conta das partes que não sejam os Estados e as instituições [despachos do Tribunal de Primeira Instância de 24 de Fevereiro de 2000, FTA e o./Conselho, T‑37/98, Colect., p. II‑373, n.° 20, e de 9 de Setembro de 2004, Alto de Casablanca/IHMI – Bodegas Chivite (VERAMONTE), T‑14/04, Colect., p. I‑0000, n.° 9].

19      Resulta do artigo 21.º, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, também aplicável ao processo no Tribunal de Primeira Instância por força do artigo 53.º, já referido, que a petição deve ser assinada por uma pessoa habilitada a representar a recorrente nos termos do artigo 19.º do Estatuto do Tribunal de Justiça (despacho FTA e o./Conselho, já referido, n.os 21 e 22). Além disso, o artigo 43.º, n.° 1, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância exige que a assinatura do agente ou do advogado mandatado pela parte em questão figure no original de todo e qualquer acto processual. Com efeito, a assinatura manuscrita do advogado ou do agente que representa uma parte, no original de qualquer acto processual, é o único meio que permite assegurar que a responsabilidade de tal acto é assumida por uma pessoa autorizada a representar a parte nos órgãos jurisdicionais comunitários, em conformidade com o artigo 19.º do Estatuto do Tribunal de Justiça (despacho FTA e o./Conselho, já referido, n.os 23 e 26).

20      Como resulta dos anexos da petição, o foro de Viena certificou que a Gassauer‑Fleissner Rechtsanwälte estava registada na lista das sociedades que exercem advocacia e que estava habilitada, por intermédio dos seus sócios autorizados a representá‑la, a exercer advocacia na Áustria e a pleitear em todos os órgãos jurisdicionais austríacos.

21      Além disso, contrariamente ao que alega o IHMI, no cabeçalho da petição está uma lista dos sócios da Gassauer‑Fleissner Rechtsanwälte, entre os quais figura Michael Wolner. Este último, como resulta do processo, está inscrito como advogado no foro de Viena.

22      Daqui resulta que a Gassauer‑Fleissner Rechtsanwälte pode, designadamente por intermédio de Michael Wolner, exercer advocacia e a pleitear nos órgãos jurisdicionais austríacos.

23      Por outro lado, em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal de Primeira Instância, M. Wolner confirmou, por fax recebido pelo Tribunal de Primeira Instância em 27 de Outubro de 2004, que a assinatura que estava nos documentos apresentados pela recorrente era a sua.

24      Nestas circunstâncias, a primeira questão prévia de inadmissibilidade invocada pelo IHMI deve ser julgada improcedente.

 Quanto à segunda questão prévia de inadmissibilidade

 Argumentos das partes

25      O IHMI salienta que a petição não preenche os requisitos do artigo 44.º do Regulamento de Processo devido à brevidade da exposição dos fundamentos invocados pela recorrente, que se limita a alegar o contrário do que a Câmara de Recurso concluiu. O IHMI recorda que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Primeira Instância, não basta alegar a violação do direito. Com efeito, é necessário fundar tal alegação com argumentos jurídicos e de facto (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 7 de Julho de 1994, Dunlop Slazenger/Comissão, T‑43/92, Colect., p. II‑441, n.° 184, e de 14 de Julho de 1994, Parker Pen/Comissão, T‑77/92, Colect., p. II‑549, n.os 99 e 100). Além disso, na audiência, o IHMI alegou que a recorrente expôs, em apoio do seu recurso, os mesmos argumentos invocados no IHMI.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

26      Por força do artigo 21.º do Estatuto do Tribunal de Justiça, e do artigo 44.º, n.º 1, alínea c), do Regulamento de Processo, a petição deve conter a exposição sumária dos fundamentos invocados, e essa indicação deve ser suficientemente clara e precisa para permitir ao demandado preparar a sua defesa e ao Tribunal pronunciar‑se sobre a fundamentação do pedido. O mesmo deve acontecer em relação a qualquer pedido, que deve ser acompanhado dos fundamentos e argumentos que permitam, tanto ao demandado como ao juiz, apreciar a sua procedência (acórdão Dunlop Slazenger/Comissão, já referido, n.° 183).

27      A fim de garantir a segurança jurídica e uma boa administração da justiça, é necessário, para que a acção seja admissível, que os elementos essenciais de facto e de direito em que assenta resultem, pelo menos sumariamente, mas de maneira coerente e compreensível, do texto da própria petição (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 18 de Setembro de 1996, Asia Motor France e o./Comissão, T‑387/94, Colect., p. II‑961, n.° 106, e despacho do Tribunal de Primeira Instância de 29 de Novembro de 1993, Koelman/Comissão, T‑56/92, Colect., p. II‑1267, n.° 21).

28      No presente processo, a petição cumpre os requisitos do artigo 21.º do Estatuto do Tribunal de Justiça, aplicável ao processo no Tribunal de Primeira Instância por força do artigo 53.º, primeiro parágrafo, do mesmo, e do artigo 44.º, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo. Com efeito, a recorrente pretende contestar a consideração da Câmara de Recurso segundo a qual o sinal nominativo proposto a registo é desprovido de carácter distintivo na acepção do artigo 7.º, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. Embora a exposição dos elementos em apoio da petição seja sucinta, basta para permitir ao Tribunal de Primeira Instância identificar os argumentos que constituem o fundamento jurídico e factual do recurso.

29      O facto de reiterar, totalmente ou em parte, os argumentos já invocados no IHMI, e de não remeter simplesmente para os mesmos, não pode constituir violação do artigo 21.º do Estatuto do Tribunal de Justiça e do artigo 44.º do Regulamento de Processo. Com efeito, uma vez que um recorrente contesta a interpretação ou a aplicação do direito comunitário efectuada pelo IHMI, as questões de direito examinadas por este último podem ser de novo discutidas num recurso para o Tribunal de Primeira Instância. Isso está abrangido pela fiscalização jurisdicional a que estão sujeitas as decisões do IHMI por força do artigo 63.º do Regulamento n.° 40/94, segundo o qual as decisões das Câmaras de Recurso são susceptíveis de recurso para o Tribunal de Justiça, designadamente por violação do Tratado, do referido regulamento ou de qualquer norma jurídica relativa à sua aplicação.

30      Por conseguinte, a segunda questão prévia de inadmissibilidade invocada pelo IHMI deve ser julgada improcedente.

 Quanto à terceira questão prévia de inadmissibilidade

 Argumentos das partes

31      O IHMI considera que o recurso é inadmissível na medida em que a recorrente pede a reforma da decisão impugnada para efeitos do registo como marca comunitária do sinal CARGO PARTNER. Com efeito, o Tribunal de Primeira Instância não pode admitir a registo uma marca pedida. Por um lado, resulta dos artigos 233.° CE e 63.º, n.° 6, do Regulamento n.° 40/94, bem como da jurisprudência, que é o próprio IHMI que tem de adoptar as medidas para a execução dos acórdãos dos órgãos jurisdicionais comunitários [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Julho de 1999, Procter & Gamble/IHMI (BABY‑DRY), T‑163/98, Colect., p. II‑2383, n.° 53]. Por outro, a etapa subsequente no procedimento de registo como marca comunitária não é o registo da marca pedida, mas a publicação do pedido nos termos do artigo 40.º do Regulamento n.° 40/94.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

32      Nos termos do artigo 63.º, n.° 6, do Regulamento n.° 40/94, o IHMI deve tomar as medidas necessárias à execução do acórdão do juiz comunitário. Por isso, não cabe ao Tribunal de Primeira Instância dirigir ao IHMI injunções. Com efeito, incumbe a este tirar as consequências do dispositivo e dos fundamentos do acórdão do Tribunal de Primeira Instância quando este último considerar que os fundamentos da recorrente são procedentes. Um pedido com vista a obter do Tribunal de Primeira Instância uma injunção para prosseguir o procedimento de registo é, portanto, inadmissível [acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 31 de Janeiro de 2001, Mitsubishi HiTec Paper Bielfeld/IHMI (Giroform), T‑331/99, Colect., p. II‑433, n.° 33, e de 27 de Fevereiro de 2002, Eurocool Logistik/IHMI (EUROCOOL), T‑34/00, Colect., p. II‑683, n.° 12].

33      No entanto, a recorrente, na medida em que pede, na segunda parte dos seus pedidos, a título subsidiário, para remeter o processo para o IHMI, pede implicitamente a anulação da decisão impugnada.

34      Além disso, se, apesar da redacção dos pedidos do recurso, resultar claramente deste último que a recorrente pede, essencialmente, a anulação da decisão impugnada, o recurso deve ser considerado admissível (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Junho de 1995, PIA HiFi/Comissão, T‑169/94, Colect., p. II‑1735, n.° 17, e despacho do Tribunal de Primeira Instância de 19 de Junho de 1995, Kik/Conselho e Comissão, T‑107/94, Colect., p. II‑1717, n.os 30 e 32).

35      No caso vertente, há que considerar que, tendo em conta o conteúdo da argumentação que a recorrente desenvolve em apoio das suas conclusões, estas têm na realidade por objectivo a anulação da decisão impugnada. Efectivamente, a recorrente apresenta no seu recurso argumentos susceptíveis de demonstrar a ilegalidade da recusa de registo do sinal nominativo CARGO PARTNER.

36      Por conseguinte, na medida em que o recurso deva ser interpretado neste sentido, ele é admissível.

 Quanto ao mérito

37      A recorrente baseia o recurso em dois fundamentos, o primeiro relativo à violação do artigo 7.º, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 e o segundo à violação do princípio da não discriminação.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 7.º, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94

 Argumentos das partes

38      A recorrente recorda que, segundo o acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de Setembro de 2001, Procter & Gamble/IHMI (C‑383/99 P, Colect., p. I‑6251), qualquer afastamento perceptível na formulação de um sinal nominativo proposto a registo relativamente à terminologia empregue, na linguagem corrente da categoria de consumidores em causa, para designar o produto ou o serviço ou as respectivas características essenciais, é adequado para conferir a esse sinal um carácter distintivo que lhe permite ser registado como marca comunitária. A recorrente acrescenta que, quando uma combinação de dois vocábulos dá por ela própria, pelo menos por associação ou alusão, nascimento a vários significados, o sinal encontra‑se privado de qualquer função descritiva [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 31 de Janeiro de 2001, Wrigley/IHMI (DOUBLEMINT), T‑193/99, Colect., p. II‑417]. Quando, por outro lado, uma combinação de vocábulos consegue criar espaço para um efeito sugestivo do sinal, isto basta para conferir a este último carácter distintivo. A este respeito, a recorrente invoca o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Abril de 2001, Bank für Arbeit und Wirtschaft/IHMI (EASYBANK) (T‑87/00, Colect., p. II‑1259).

39      A recorrente recorda também que, quando uma palavra pode ser fácil e imediatamente memorizada pelo público‑alvo, ela é, considerada no seu conjunto, dotada de capacidade intrínseca para ser apreendida por esse público enquanto sinal distintivo. Não é necessário que a palavra apresente um acréscimo de fantasia, seja especialmente original ou vistoso. Uma marca baseia‑se apenas na capacidade de individualizar os produtos ou serviços no mercado relativamente aos produtos ou serviços do mesmo género oferecidos pelos concorrentes (acórdão EUROCOOL, já referido).

40      A recorrente alega que, no caso vertente, a denominação «cargo partner» é completamente inabitual e portanto apta a individualizar os serviços por ela prestados. Baseia esta afirmação essencialmente nos três argumentos seguintes. Em primeiro lugar, para descrever os serviços em causa não é o sinal CARGO PARTNER que seria usual mas «your partner for cargo» ou expressões semelhantes. Por esta razão, a denominação em questão já é apreendida pelo público no sentido de individualizar os serviços prestados pela recorrente. Em segundo lugar, quando o vocábulo «partner» é utilizado a propósito de uma empresa, o público espera a sua utilização no plural. Além disso, como a recorrente afirmou na audiência, no caso vertente, o vocábulo «partner» não indica uma forma de organizar a empresa, mas uma relação especial com a clientela. Em terceiro lugar, a denominação «cargo partner» consta da firma da recorrente e é, há vários anos, apta a distingui‑la dos seus concorrentes.

41      O IHMI recorda que uma marca é desprovida de carácter distintivo, na acepção do artigo 7.º, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, quando não é apta a individualizar os produtos ou serviços segundo a sua origem comercial. É normalmente o caso quando uma marca se limita a especificar o tipo de produtos ou de serviços ou a descrever as suas características.

42      O IHMI salienta que a recorrente não contesta a conclusão da Câmara de Recurso, no n.° 19 da decisão impugnada, segundo a qual o sinal CARGO PARTNER é utilizado pelas empresas para designar o seu parceiro comercial em matéria de transporte. Segundo o IHMI, esta afirmação foi fundada através da referência a um sítio Internet na decisão impugnada e poderia ser corroborada por outros exemplos, como uma comunicação da Air France em que se apresenta como «cargo partner» para duas exposições de Picasso na Índia, e uma comunicação da Cargo Counts, uma filial da Lufthansa, segundo a qual será o novo «cargo partner» do aeroporto de Francoforte.

43      Segundo o IHMI, a alegação da recorrente segundo a qual não é «partner» no singular, mas «partners» no plural que é utilizado no comércio, não é de forma alguma provada e é manifestamente errada.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

44      Nos termos do artigo 7.º, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, será recusado o registo de «marcas desprovidas de carácter distintivo». Além disso, o artigo 7.º, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94 dispõe que o «n.° 1 é aplicável mesmo que os motivos de recusa apenas existam numa parte da Comunidade».

45      Resulta dos termos do artigo 7.º, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 que basta um mínimo de carácter distintivo para que o motivo de recusa definido nesse artigo não seja aplicável (acórdão EUROCOOL, já referido, n.° 39).

46      A inexistência de carácter distintivo não pode resultar da mera verificação de que o sinal em causa carece de acréscimo de fantasia ou não possui um aspecto inabitual ou surpreendente (acórdão EASYBANK, já referido, n.° 39).

47      O carácter distintivo de uma marca na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 significa que esta marca permite identificar o produto ou o serviço para o qual o registo é pedido como proveniente de uma empresa determinada e, portanto, distinguir este produto ou este serviço dos de outras empresas e, assim, está em condições de preencher a função essencial da marca (acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de Outubro de 2004 IHMI/Erpo Möbelwerk, C‑64/02 P, Colect., p. I‑0000, n.° 42, e jurisprudência aí referida).

48      O carácter distintivo de uma marca apenas pode ser apreciado, por um lado, por referência aos produtos ou aos serviços relativamente aos quais o registo foi solicitado e, por outro, por referência à percepção que dele tem o público pertinente [acórdão do Tribunal de Justiça, IHMI/Erpo Möbelwerk, já referido, n.° 43; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 3 de Julho de 2003, Best Buy Concepts/IHMI (BEST BUY), T‑122/01, Colect., p. II‑2235, n.° 22; de 3 de Dezembro de 2003, Nestlé Waters France/IHMI (Forma de uma garrafa), T‑305/02, Colect., p. II‑5207, n.° 29, e de 10 de Novembro de 2004, Storck/IHMI (Embalagem de rebuçado), T‑402/02, Colect., p. I‑0000, n.° 48].

49      Para apreciar a aptidão de um sinal nominativo para ter carácter distintivo, há que adoptar o ponto de vista de um consumidor da língua do referido sinal (acórdão Procter & Gamble/IHMI, já referido, n.° 42).

50      No caso vertente, há que referir que, sendo os serviços em causa o transporte, a embalagem e o entreposto de mercadorias, o público‑alvo é constituído pelo público anglófono na sua totalidade, como considerou com razão a Câmara de Recurso na decisão impugnada.

51      Do ponto de vista da língua inglesa, o sinal CARGO PARTNER não se afasta das regras gramaticais dessa língua e, portanto, não é inabitual na sua estrutura.

52      O termo «partner» é utilizado em contextos diferentes, inclusive no domínio das prestações de serviços, para descrever relações de associação ou de parceria evocando conotações positivas de fiabilidade e de continuidade a este respeito [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Julho de 2004, MLP Finanzdienstleistungen/IHMI (bestpartner), T‑270/02, Colect., p. I‑0000, n.° 23].

53      O termo «cargo» indica que os serviços em causa são o transporte, a embalagem e o entreposto de mercadorias.

54      Assim, há que concluir que os termos «cargo» e «partner» são termos genéricos, que não são portanto aptos a distinguir os serviços da recorrente dos das outras empresas.

55      Quanto às marcas compostas por palavras, como a que constitui o objecto do presente litígio, deve verificar‑se a sua falta de carácter distintivo não só em relação a cada um dos termos considerado separadamente, mas também em relação ao todo que aqueles compõem. Com efeito, todo o afastamento perceptível na formulação do sinal proposto a registo relativamente à terminologia empregue, na linguagem corrente da categoria de consumidores em causa, para designar o produto ou o serviço ou as respectivas características essenciais é adequado para conferir a esse sinal um carácter distintivo que lhe permite ser registado como marca (acórdão Procter & Gamble/IHMI, já referido, n.° 40).

56      No caso vertente, não há elementos que indiquem que em inglês a expressão «cargo partner» tem, na linguagem corrente, um significado adicional ao de apresentar o parceiro que presta serviços de transporte, de embalagem e de entreposto de produtos. No que respeita aos termos que o compõem, o sinal CARGO PARTNER não apresenta nenhuma característica adicional susceptível de tornar o sinal na sua totalidade apto a distinguir os serviços da recorrente dos das outras empresas no espírito do público‑alvo.

57      É verdade que a recorrente tem sede na Áustria, país germanófono. No entanto, uma vez que basta para que o registo de uma marca seja recusado que os motivos de recusa existam numa parte da Comunidade, verifica‑se que, caso se demonstre que existe um motivo de recusa para a sua parte anglófona, a eventual existência de tal motivo também noutras partes da Comunidade é irrelevante para a resolução do presente litígio (acórdão bestpartner, já referido, n.° 21).

58      Além disso, há que referir a título superabundante que os dois termos «cargo» e «partner» podem também ser utilizados em alemão com, essencialmente, o mesmo significado que em inglês.

59      Daqui resulta que o sinal CARGO PARTNER é, do ponto de vista do público‑alvo, desprovido de carácter distintivo na acepção do artigo 7.º, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 no que respeita aos serviços de transporte, de embalagem e de entreposto de mercadorias.

60      Relativamente à circunstância invocada pela recorrente de a denominação CARGO PARTNER constar da sua firma, não pode pôr em causa a apreciação efectuada até este momento.

61      Resulta das considerações expostas que o fundamento relativo à violação do artigo 7.º, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 não pode ser acolhido.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do princípio da não discriminação

 Argumentos das partes

62      Através do seu segundo fundamento, a recorrente alega, essencialmente, que a Câmara de Recurso violou a prática decisória do IHMI, ao aplicar ao seu pedido de registo um critério consideravelmente mais severo do que no caso de outros requerentes, em violação do princípio da não discriminação. A este respeito, invoca o registo como marcas dos sinais Finishing Partner, Partner Marketing, Partner Store, YOUR CULINARY PARTNER, INHOUSE‑OUTSOURCING, TRANSEUROPA, alltravel, MEGATOURS, Data Intelligence Group. Segundo a recorrente, essas marcas, e, em especial, a Finishing Partner, não apresentam diferenças relativamente ao sinal CARGO PARTNER. Assim, a prática do IHMI em matéria de registo joga a favor do registo do sinal CARGO PARTNER como marca comunitária.

63      Na audiência, a recorrente alega que o presente caso se distingue do processo que originou o acórdão bestpartner, já referido, em três aspectos. Em primeiro lugar, neste processo, o alvo era um público especializado, ao passo que no caso vertente o público‑alvo é constituído pelos consumidores médios. Em segundo lugar, best partner é mais um slogan do que CARGO PARTNER. Em terceiro lugar, se o termo «best» é uma indicação da qualidade da empresa em causa, tal não é o caso do termo «cargo».

64      O IHMI admite que as partes nos processos que lhe são submetidos esperam legitimamente que factos comparáveis resultem em decisões comparáveis. No entanto, considera que há que distinguir esta expectativa da questão de saber se as partes no processo podem invocar utilmente a decisão de processos paralelos quando o examinador do IHMI e a Câmara de Recurso, tendo em conta as circunstâncias em questão, chegam, num outro caso, a um resultado que não se alinha, ou não se alinha totalmente, com a primeira decisão.

65      Ora, segundo o IHMI, a recorrente não explica de forma alguma de que forma as decisões precedentes do IHMI que refere seriam comparáveis à situação do caso vertente.

66      Além disso, o IHMI refere que, mesmo supondo que se trata de casos comparáveis, as suas decisões anteriores não produzem efeitos jurídicos obrigatórios. A este respeito, refere o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Fevereiro de 2002, Streamserve/IHMI (STREAMSERVE) (T‑106/00, Colect., p. II‑723, n.° 66), segundo o qual a legalidade das decisões das Câmaras de Recurso deve ser apreciada unicamente com base no Regulamento n.° 40/94, como interpretado pelo juiz comunitário, e não com base na prática decisória anterior das Câmaras de Recurso.

67      Daí o IHMI deduz que se as decisões anteriores eram contrárias ao direito, não podem de forma alguma justificar uma nova decisão contrária ao direito. Se eram, contudo, conformes ao direito e diziam efectivamente respeito a casos comparáveis ao em causa na decisão impugnada, esta só pode ser anulada devido a uma aplicação errada do Regulamento n.° 40/94 e não por causa da violação do princípio da não discriminação.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

68      Basta recordar que, mesmo se os fundamentos de facto ou de direito constantes de uma decisão anterior podem constituir argumentos em apoio de um fundamento relativo a violação de uma disposição do Regulamento n.° 40/94, também é verdade que a legalidade das decisões das Câmaras de Recurso deve ser apreciada unicamente com base nesse regulamento, como interpretado pelo juiz comunitário, e não com base na prática decisória anterior das Câmaras de Recurso (acórdão STREAMSERVE, já referido, n.os 66 e 69).

69      Existem, com efeito, duas hipóteses. Se, ao admitir, num processo anterior, a possibilidade de registo de um sinal enquanto marca comunitária, a Câmara de Recurso tiver aplicado correctamente as disposições pertinentes do Regulamento n.° 40/94 e se, num processo posterior, comparável ao primeiro, a Câmara de Recurso tiver adoptado uma decisão contrária, o juiz comunitário será conduzido a anular esta última decisão, por violação das disposições pertinentes do Regulamento n.° 40/94. Nesta primeira hipótese, o fundamento relativo a violação do princípio da não discriminação seria, assim, inoperante (acórdão STRAMSERVE, já referido, n.° 67).

70      Pelo contrário, se, ao admitir, num processo anterior, a possibilidade de registo de um sinal enquanto marca comunitária, a Câmara de Recurso tiver cometido um erro de direito e se, num processo posterior, comparável ao primeiro, a Câmara de Recurso tiver adoptado uma decisão contrária, a primeira decisão não pode ser utilmente invocada em apoio de um pedido de anulação desta última decisão. Com efeito, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o princípio da igualdade de tratamento só pode ser invocado no âmbito do respeito da legalidade (acórdãos do Tribunal de Justiça de 13 de Julho de 1972, Besnard e o./Comissão, 55/71 a 76/71, 86/71, 87/71 e 95/71, Recueil, p. 543, n.° 39, Colect. 1972, p. 193, e do Tribunal de Primeira Instância de 28 de Setembro de 1993, Magdalena Fernández/Comissão, T‑90/92, Colect., p. II‑971, n.° 38) e que ninguém pode invocar em seu proveito uma ilegalidade cometida a favor de outrem (acórdãos do Tribunal de Justiça de 9 de Outubro de 1984, Witte/Parlamento, 188/83, Recueil, p. 3465, n.° 15, e do Tribunal de Primeira Instância de 22 de Fevereiro de 2000, Rose/Comissão, T‑22/99, ColectFP, pp. I‑A‑27 e II‑115, n.° 39). Assim, nesta segunda hipótese, o fundamento relativo à violação do princípio da não discriminação é igualmente inoperante (acórdão STREAMSERVE, já referido, n.° 67).

71      Daqui resulta que o fundamento relativo à alegada violação da prática decisória do IHMI é inoperante.

72      Resulta do exposto que não tendo sido acolhido nenhum dos fundamento invocados, deve ser negado provimento ao presente recurso de anulação da decisão impugnada.

 Quanto às despesas

73      Por força do disposto no n.° 2 do artigo 87.º do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas do IHMI.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Primeira Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A recorrente é condenada nas despesas.

Cooke

García‑Valdecasas

Trstenjak

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 27 de Setembro de 2005.

O secretário

 

      O presidente

H. Jung

 

      J. D. Cooke


* Língua do processo: alemão.