Language of document : ECLI:EU:T:2023:437

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção)

26 de julho de 2023 (*)

«Cláusula compromissória — Programa‑Quadro de Investigação e Inovação “Horizonte 2020” (2014‑2020) — Projeto “aDvanced sOcial enGineering And vulNerability Assessment Framework (Dogana)” — Convenção de subvenção — Recurso de anulação — Relatório final de auditoria — Nota de débito — Atos insuscetíveis de recurso — Atos que se inserem num âmbito puramente contratual do qual são indissociáveis — Inadmissibilidade — Identificação da recorrida — Incompetência — Custos de pessoal — Prémios calculados em função de objetivos comerciais — Inelegibilidade — Confiança legítima»

No processo T‑222/22,

Engineering — Ingegneria Informatica SpA, com sede em Roma (Itália), representada por S. Villata, L. Montevecchi e C. Oncia, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por M. Ilkova e S. Romoli, na qualidade de agentes,

e

Agência de Execução Europeia para a Investigação (REA), representada por S. Payan‑Lagrou e V. Canetti, na qualidade de agentes, assistidas por D. Gullo, advogado,

recorridas,

O TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção),

composto por: K. Kowalik‑Bańczyk (relatora), presidente, E. Buttigieg e B. Ricziová, juízes,

secretário: V. Di Bucci,

vistos os autos, designadamente:

—        a exceção deduzida ao abrigo do artigo 130.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral pela Comissão por requerimento separado apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 6 de julho de 2022,

—        as observações sobre esta exceção apresentadas pela recorrente na Secretaria do Tribunal Geral em 22 de agosto de 2022,

visto a recorrente e a REA não terem apresentado um pedido de marcação de audiência no prazo de três semanas a contar da notificação do encerramento da fase escrita do processo e tendo decidido, em aplicação do artigo 106.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, julgar o recurso sem fase oral do processo,

profere o presente

Acórdão

1        Com o seu recurso fundado nos artigos 263.o e 272.o TFUE, a recorrente, Engineering — Ingegneria Informatica SpA pede, em substância, por um lado, a anulação de vários atos da Comissão Europeia e da Agência de Execução Europeia da Investigação (REA) relativos à execução da Convenção de Subvenção n.o 653618 (a seguir «Convenção de Subvenção») relativa ao projeto intitulado «aDvanced sOcial enGineering And vulNerability Assessment Framework (Dogana)» (Quadro de avaliação da engenharia social de ponta e da vulnerabilidade) (a seguir «projeto») e, por outro lado, a declaração do caráter elegível de certos custos para financiamento com base nesta convenção e, por conseguinte, da inexistência de direito da Comissão e da REA de exigirem o reembolso dos montantes correspondentes a esses custos.

 Antecedentes do litígio

2        A recorrente é uma sociedade que exerce atividades de investigação e desenvolvimento no setor das tecnologias.

3        A REA é uma agência de execução instituída para a gestão da ação da União Europeia no domínio da investigação. Por força do artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento (CE) n.o 58/2003 do Conselho, de 19 de dezembro de 2002, que define o estatuto das agências de execução encarregadas de determinadas funções de gestão de programas comunitários (JO 2003, L 11, p. 1), tem personalidade jurídica, goza, em qualquer Estado‑Membro, da mais ampla capacidade jurídica e pode, designadamente, estar em juízo.

 Convenção de Subvenção

4        No contexto do Programa‑Quadro de Investigação e Inovação «Horizonte 2020» (2014‑2020) (a seguir «Programa‑Quadro Horizonte 2020»), a Engineering International Belgium SA, agindo na qualidade de coordenadora, e outros beneficiários, por um lado, e a REA, por outro, celebraram, em 28 de abril de 2015, a Convenção de Subvenção. Por força de dois aditamentos assinados em dezembro de 2017 e em março de 2018, a recorrente tornou‑se beneficiária a partir de 5 de julho de 2017 e substituiu a Engineering International Belgium como coordenadora a partir de 15 de dezembro de 2017.

5        O artigo 2.o da Convenção de Subvenção prevê a concessão de uma subvenção para o projeto (a seguir «subvenção»). Em conformidade com o artigo 3.o desta convenção, a execução desse projeto devia ter início em 1 de setembro de 2015 e durar 36 meses.

6        Nos termos do artigo 5.2. da Convenção de Subvenção, a subvenção reembolsa, nomeadamente, 70 % dos custos elegíveis dos beneficiários que sejam entidades jurídicas com fins lucrativos. Estes custos elegíveis incluem, em especial, em primeiro lugar, os «custos diretos de pessoal» e, em segundo lugar, os «custos indiretos» calculados numa base fixa. Os «custos diretos de pessoal» dividem‑se eles próprios em duas categorias, a saber, por um lado, os «custos efetivamente incorridos» ou «custos reais» e, por outro, os «custos unitários», determinados com base num montante por unidade calculado em conformidade com as práticas habituais de contabilização dos custos do beneficiário.

7        Nos termos do artigo 6.1., alínea a), iv), da Convenção de Subvenção, os custos reais são elegíveis na condição, nomeadamente, de serem «incorridos em relação com [o projeto] e necessários à sua execução».

8        Nos termos do artigo 6.2., alínea A.1, da Convenção de Subvenção, «os custos de pessoal são elegíveis se estiverem ligados a pessoal que trabalha para o beneficiário ao abrigo de um contrato de trabalho (ou de um ato de contratação equivalente) e afetado [ao projeto]». Este mesmo artigo precisa que os custos de pessoal «devem limitar‑se aos salários, às contribuições para a segurança social, aos encargos e outros custos incluídos na remuneração, se decorrerem da legislação nacional ou do contrato de trabalho (ou de um ato de contratação equivalente)».

9        O artigo 6.5. da Convenção de Subvenção define e enumera os custos inelegíveis. Este artigo menciona, nomeadamente, na alínea a), os «custos que não preenchem as condições enunciadas nos artigos 6.1. a 6.4. [da mesma convenção]» e, em especial, alínea a), i), os «custos relativos ao rendimento do capital investido».

10      O artigo 6.6. da Convenção de Subvenção prevê que os custos declarados inelegíveis são rejeitados.

11      Nos termos do artigo 22.1.3. da Convenção de Subvenção, a REA ou a Comissão podem efetuar auditorias sobre a execução correta do projeto e o cumprimento das obrigações fixadas nesta convenção. Um projeto de relatório de auditoria e, em seguida, um relatório de auditoria são então redigidos e notificados ao coordenador ou ao beneficiário em causa.

12      O artigo 22.5.1. da Convenção de Subvenção prevê que as verificações feitas no âmbito de auditorias podem conduzir, nomeadamente, à rejeição de custos inelegíveis. Nos termos do mesmo artigo, sempre que as auditorias revelem erros sistemáticos ou recorrentes, podem ter consequências para outras subvenções concedidas em condições semelhantes, por aplicação das verificações feitas para a subvenção a essas outras subvenções.

13      O artigo 42.1. da Convenção de Subvenção dispõe que a REA rejeita todos os custos inelegíveis, nomeadamente na sequência de auditorias.

14      O artigo 44.1. da Convenção de Subvenção prevê que a REA exige qualquer montante que tenha sido pago mas que não seja devido por força dessa convenção. O artigo 44.1.3. desta mesma convenção, aplicável à recuperação de montantes após o pagamento do saldo, dispõe, em substância, que a REA envia ao beneficiário uma carta de pré‑informação e, em seguida, uma carta de confirmação e uma nota de débito. Na falta de pagamento, a REA pode então proceder a uma compensação, instaurar processos judiciais ou adotar uma decisão que constitua título executivo com base no artigo 299.o TFUE.

15      O artigo 57.1. da Convenção de Subvenção prevê que este é regido pelo direito da União aplicável, completado, se necessário, pelo direito belga.

16      O artigo 57.2. da Convenção de Subvenção dispõe que o Tribunal Geral ou, em sede de recurso, o Tribunal de Justiça, têm competência exclusiva para dirimir os litígios relativos à interpretação, aplicação ou validade dessa convenção, em conformidade com o artigo 272.o TFUE.

17      Em execução da Convenção de Subvenção, a recorrente recebeu da REA uma subvenção no montante de 240 171,21 euros, com base num montante declarado de custos elegíveis de 343 101,72 euros e numa taxa de reembolso de 70 %.

 Procedimento de auditoria

18      Durante o ano de 2021, a Comissão realizou uma auditoria sobre a execução de três convenções de subvenção celebradas pela recorrente no contexto do Programa‑Quadro Horizonte 2020, entre as quais a Convenção de Subvenção em causa no presente processo. Quanto a esta última convenção, a auditoria tinha por objeto o período compreendido entre 1 de setembro de 2015 e 31 de agosto de 2018.

19      Em 30 de junho de 2021, a Comissão comunicou à recorrente um projeto de relatório de auditoria.

20      Por carta de 21 de dezembro de 2021 (a seguir «carta de encerramento») e por um relatório final de auditoria datado do mesmo dia, a Comissão informou a recorrente dos resultados definitivos da auditoria.

21      Durante a auditoria, a Comissão procedeu a vários ajustamentos relativos aos custos elegíveis ao abrigo da Convenção de Subvenção.

22      Em especial, a Comissão considerou que certos prémios ou comissões (a seguir «prémios controvertidos»), pagos a dois trabalhadores da recorrente (a seguir «dois trabalhadores em causa») e declarados por esta última como custos de pessoal, estavam relacionados com a realização de diferentes objetivos de natureza comercial. Daí deduziu que os custos correspondentes a esses prémios não tinham sido suportados no âmbito do projeto e não eram necessários para a execução desse projeto, pelo que não preenchiam as condições de elegibilidade previstas no artigo 6.1., alínea a), iv), da Convenção de Subvenção e explicitadas pelo modelo anotado de convenção de subvenção para o Programa‑Quadro Horizonte 2020 (a seguir «modelo anotado de convenção de subvenção»). Considerou, portanto, que os prémios controvertidos, no montante de 14 758,03 euros, não eram elegíveis e procedeu, então, a um ajustamento.

23      Consequentemente, tendo em conta os diferentes ajustamentos efetuados a favor quer da REA quer da recorrente, a Comissão reduziu em 12 927,34 euros o montante total dos custos elegíveis ao abrigo da Convenção de Subvenção.

24      Além disso, a Comissão considerou que alguns erros detetados durante a auditoria apresentavam potencialmente um caráter sistemático ou recorrente. Por conseguinte, a Comissão deu início a um procedimento de alargamento das conclusões da auditoria a outras subvenções, em conformidade com o artigo 22.5.1. da Convenção de Subvenção.

25      No entanto, por carta de 21 de fevereiro de 2022 (a seguir «carta de esclarecimento»), a Comissão informou a recorrente de que só tinha estendido as conclusões da auditoria às subvenções em curso, com exclusão dos períodos ou subvenções não auditados. Precisou que esta limitação do procedimento de alargamento das verificações da auditoria tinha sido autorizada a título excecional porque as auditorias anteriores não tinham detetado a inelegibilidade dos prémios controvertidos baseados em objetivos comerciais.

 Procedimento de recuperação

26      Por carta de 17 de janeiro de 2022, intitulada «carta de pré‑informação», a REA informou a recorrente de que, em aplicação da auditoria realizada pela Comissão e tendo em conta a taxa de reembolso de 70 %, tinha a intenção de proceder à recuperação de um montante de 9 049,14 euros.

27      Por carta de 23 de fevereiro de 2022 dirigida à recorrente (a seguir «carta de confirmação»), a REA confirmou o reembolso do montante de 9 049,14 euros. Esta carta vinha acompanhada de uma nota de débito do mesmo montante emitida no mesmo dia pela REA (a seguir «nota de débito»).

 Pedidos das partes

28      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

—        declarar «nulos, ilegítimos, anulados e desprovidos de efeitos» os atos adotados pela Comissão e pela REA e, em especial, a carta de encerramento, o relatório final de auditoria, a carta de confirmação e a nota de débito;

—        declarar elegíveis os montantes excluídos dos custos elegíveis, declarar o seu direito a que essas quantias sejam tidas em conta no cálculo do montante da subvenção e declarar que a Comissão não tem o direito de recuperar as referidas quantias;

—        condenar a Comissão e a REA nas despesas.

29      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

—        julgar o recurso inadmissível na parte que lhe diz respeito;

—        condenar a recorrente nas despesas.

30      A REA conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

—        julgar o recurso total ou parcialmente inadmissível ou, subsidiariamente, negar‑lhe integralmente provimento;

—        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

 Quanto ao objeto e ao alcance do recurso

31      Resulta da redação e do conteúdo de todos os articulados da recorrente, nomeadamente do título da petição e das precisões feitas na réplica, bem como da circunstância segundo a qual a Comissão se encarregou do processo de auditoria ao passo que a REA se encarregou do processo de recuperação, que a recorrente pede, em substância, ao Tribunal Geral:

—        por um lado, com o seu primeiro pedido, baseado no artigo 263.o TFUE, anular os atos adotados a seu respeito pela Comissão e pela REA e, em especial, a carta de encerramento, o relatório final de auditoria, a carta de confirmação e a nota de débito, na medida em que estes atos dizem respeito à execução da Convenção de Subvenção;

—        por outro lado, com o seu segundo pedido, baseado no artigo 272.o TFUE, declarar o caráter elegível dos prémios controvertidos e, por conseguinte, a inexistência de direito da Comissão e, consequentemente, da REA de exigir o reembolso dos montantes correspondentes a esses prémios.

 Quanto à competência do Tribunal Geral e quanto à admissibilidade do recurso

 Quanto aos pedidos apresentados nos termos do artigo 263.o TFUE

32      A Comissão deduz uma exceção ao abrigo do artigo 130.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, no âmbito da qual sustenta, nomeadamente, que os pedidos de anulação da recorrente são inadmissíveis. Alega, em substância, primeiro, que esses pedidos são dirigidos contra atos que se inserem num contexto contratual e que não produzem efeitos jurídicos vinculativos nem implicam o exercício de prerrogativas de poder público. De resto, alguns desses atos, a saber, a carta de confirmação e a nota de débito, foram adotados pela REA, pelo que a Comissão não tem legitimidade passiva no que lhes diz respeito. Segundo, a petição não cumpre os requisitos do artigo 76.o, alíneas d) e e), do Regulamento de Processo, na medida em que não expõe claramente o fundamento jurídico do recurso e não desenvolve, de facto e de direito, o pedido de que sejam declarados «nulos, ilegítimos, anulados e desprovidos de efeitos» os atos impugnados.

33      Sem deduzir formalmente uma exceção na aceção do artigo 130.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a REA conclui igualmente pela inadmissibilidade dos pedidos de anulação por razões semelhantes às invocadas pela Comissão. Alega nomeadamente, em substância, por um lado, que a recorrente pede a anulação de atos de natureza contratual, e não administrativa, e, por outro, que, por não precisar os fundamentos invocados em apoio do pedido de anulação, a petição não está em conformidade com as exigências do artigo 76.o, alínea d), do Regulamento de Processo.

34      A recorrente contesta a argumentação da Comissão e a da REA e sustenta que os seus pedidos de anulação são admissíveis.

35      Há que recordar que, segundo jurisprudência constante, podem ser objeto de recurso de anulação, nos termos do artigo 263.o TFUE, todos os atos adotados pelas instituições da União, independentemente da sua natureza ou forma, que se destinem a produzir efeitos jurídicos vinculativos suscetíveis de afetar os interesses do recorrente, modificando de forma caracterizada a sua situação jurídica (Acórdão de 11 de novembro de 1981, IBM/Comissão, 60/81, EU:C:1981:264, n.o 9; v., igualmente, Acórdão de 16 de julho de 2020, ADR Center/Comissão, C‑584/17 P, EU:C:2020:576, n.o 62 e jurisprudência referida).

36      A este respeito, só constituem, em princípio, atos impugnáveis as medidas que fixam definitivamente a posição de uma instituição, de um órgão ou de um organismo da União no termo de um procedimento administrativo e que visam produzir efeitos jurídicos vinculativos, com exclusão, nomeadamente, das medidas intermédias cujo objetivo é preparar a decisão final, que não produzem tais efeitos (Acórdãos de 11 de novembro de 1981, IBM/Comissão, 60/81, EU:C:1981:264, n.o 10, e de 17 de julho de 2008, Athinaïki Techniki/Comissão, C‑521/06 P, EU:C:2008:422, n.o 42).

37      Decorre dessa jurisprudência que, perante um contrato que vincula o recorrente a uma das instituições da União, o juiz da União só pode apreciar um recurso com fundamento no artigo 263.o TFUE se o ato impugnado se destinar a produzir efeitos jurídicos vinculativos fora da relação contratual que une as partes e que impliquem o exercício de prerrogativas de poder público conferidas à instituição contratante na sua qualidade de autoridade administrativa (Acórdãos de 9 de setembro de 2015, Lito Maieftiko Gynaikologiko kai Cheirourgiko Kentro/Comissão, C‑506/13 P, EU:C:2015:562, n.o 20; de 28 de fevereiro de 2019, Alfamicro/Comissão, C‑14/18 P, EU:C:2019:159, n.o 50; e de 16 de julho de 2020, ADR Center/Comissão, C‑584/17 P, EU:C:2020:576, n.o 65).

38      No caso em apreço, em primeiro lugar, há que salientar que os diferentes atos impugnados se inserem todos no contexto da Convenção de Subvenção, da qual não são dissociáveis.

39      Com efeito, por um lado, os atos adotados pela Comissão, nomeadamente a carta de encerramento e o relatório final de auditoria, baseiam‑se nas estipulações dos artigos 22.1.3. e 22.5.1. da Convenção de Subvenção, das quais resulta que esta instituição pode efetuar auditorias suscetíveis de conduzir à rejeição dos custos não elegíveis (v. n.os 11 e 12, supra).

40      Por outro lado, os atos adotados pela REA, nomeadamente a carta de confirmação e a nota de débito, baseiam‑se nos artigos 42.1. e 44. da Convenção de Subvenção, dos quais resulta que, na sequência de uma auditoria, esta agência rejeita os custos que não são elegíveis e exige ao beneficiário qualquer montante pago mas não devido (v. n.os 13 e 14, supra).

41      Em segundo lugar, nenhum elemento dos autos permite concluir que a Comissão e a REA agiram no uso das suas prerrogativas de poder público.

42      Com efeito, por um lado, os atos adotados pela Comissão, nomeadamente a carta de encerramento e o relatório final de auditoria, não obrigam nem sequer convidam a recorrente a reembolsar qualquer quantia e, portanto, não alteram a sua situação jurídica.

43      Além disso, contrariamente ao que sustenta a recorrente, não resulta nem da redação dos atos adotados pela Comissão nem do seu contexto que esta instituição tenha pretendido obrigar a REA a seguir as conclusões do relatório final de auditoria e impedi‑la de se afastar delas. Assim, o relatório final de auditoria precisa que tem por objeto exprimir uma «opinião independente» a propósito do caráter real e elegível dos custos que deram origem à subvenção. Quanto à carta de encerramento, precisa que se limita a informar a recorrente dos resultados da auditoria e que não exprime uma posição definitiva sobre as repercussões financeiras da auditoria, devendo a REA ainda analisar essas repercussões e disso informar a recorrente.

44      Daqui resulta que os atos adotados pela Comissão, nomeadamente a carta de encerramento e o relatório final de auditoria, são atos preparatórios e não produzem, por si sós, nenhum efeito jurídico vinculativo para a recorrente ou a REA (v., por analogia, Despachos de 8 de fevereiro de 2010, Alisei/Comissão, T‑481/08, EU:T:2010:32, n.os 67 e 75, e de 9 de junho de 2016, IREPA/Comissão e Tribunal de Contas, T‑825/14, não publicado, EU:T:2016:345, n.o 30). A fortiori, a adoção destes atos não traduz o exercício de prerrogativas de poder público.

45      Por outro lado, os atos adotados pela REA, nomeadamente a carta de confirmação e a nota de débito, limitam‑se a convidar a recorrente a pagar a quantia de 9 049,14 euros e a informá‑la de que, na falta de pagamento, esta agência procederá à recuperação dessa quantia, por exemplo efetuando uma compensação ou adotando uma decisão executória com base no artigo 299.o TFUE.

46      Ora, o Tribunal de Justiça precisou que uma nota de débito ou uma interpelação, que incluem a indicação de uma data de vencimento e as condições de pagamento de um crédito contratual, não podem ser equiparadas a um título executivo enquanto tal, mesmo quando mencionam a via executiva do artigo 299.o TFUE como uma possível via de cobrança, entre outras, em caso de incumprimento pelo devedor na data de vencimento fixada. Por conseguinte, uma nota de débito ou uma interpelação não se destinam a produzir efeitos jurídicos com origem no exercício de prerrogativas de poder público (v., neste sentido, Acórdãos de 9 de setembro de 2015, Lito Maieftiko Gynaikologiko kai Cheirourgiko Kentro/Comissão, C‑506/13 P, EU:C:2015:562, n.os 23 e 24; de 28 de fevereiro de 2019, Alfamicro/Comissão, C‑14/18 P, EU:C:2019:159, n.o 52; e de 16 de julho de 2020, ADR Center/Comissão, C‑584/17 P, EU:C:2020:576, n.o 66).

47      Daqui resulta que os atos adotados pela REA, nomeadamente a carta de confirmação e a nota de débito, também não traduzem o exercício de prerrogativas de poder público.

48      Nestas condições, os atos impugnados não podem ser objeto de um recurso de anulação com base no artigo 263.o TFUE.

49      Por conseguinte, os pedidos de anulação da recorrente devem ser julgados inadmissíveis, em conformidade com a exceção de inadmissibilidade e com o fundamento de inadmissibilidade suscitados neste sentido, respetivamente, pela Comissão e pela REA. Nestas circunstâncias, não é necessário examinar a argumentação destas últimas segundo a qual estes pedidos não satisfazem, aliás, as exigências do artigo 76.o, alíneas d) e e), do Regulamento de Processo.

 Quanto aos pedidos apresentados contra a Comissão ao abrigo do artigo 272.o TFUE

50      Na sua exceção apresentada ao abrigo do artigo 130.o do Regulamento de Processo, a Comissão alega que os pedidos formulados a seu respeito com base no artigo 272.o TFUE são «inadmissíveis». Com efeito, não sendo parte na Convenção de Subvenção, não tem legitimidade passiva.

51      A recorrente contesta a argumentação da Comissão e sustenta que a Comissão pode ser demandada com base no artigo 272.o TFUE.

52      Segundo jurisprudência constante, só as partes num contrato que contenha uma cláusula compromissória podem ser partes na ação intentada com fundamento no artigo 272.o TFUE (v., neste sentido, Acórdão de 7 de dezembro de 1976, Pellegrini/Comissão e Flexon‑Italia, 23/76, EU:C:1976:174, n.o 31, e Despacho de 16 de junho de 2021, Green Power Technologies/Comissão e Entreprise commune ECSEL, T‑533/20, não publicado, EU:T:2021:375, n.o 43 e jurisprudência referida).

53      No caso em apreço, é pacífico que a Convenção de Subvenção contém uma cláusula compromissória que atribui competência ao Tribunal Geral (v. artigo 57.2. desta convenção mencionado no n.o 16, supra).

54      Todavia, a Convenção de Subvenção só foi assinada pela recorrente e pela REA, que dispõe de personalidade jurídica distinta da da União (v. n.o 3, supra). Por conseguinte, a REA é a única cocontratante da recorrente e a Comissão não pode ser qualificada de parte nesta convenção.

55      Esta conclusão não pode ser posta em causa pelo facto de os atos adotados pela REA, nomeadamente a carta de confirmação e a nota de débito, terem origem nos atos adotados pela Comissão, nomeadamente na carta de encerramento e no relatório final de auditoria. Com efeito, as cláusulas da Convenção de Subvenção preveem que a Comissão pode realizar uma auditoria (v. artigo 22.1.3. da Convenção de Subvenção mencionado no n.o 11, supra) e que a REA pode em seguida retirar as consequências desta auditoria, nomeadamente rejeitando os custos não elegíveis (v. artigos 22.5.1. e 42.1. da Convenção de Subvenção, mencionados nos n.os 12 e 13, supra), são cláusulas‑tipo, correntemente inseridas em convenções de subvenção, e não têm por objeto nem por efeito conferir à Comissão a qualidade de parte na Convenção de Subvenção (v., neste sentido, Despacho de 16 de junho de 2021, Green Power Technologies/Comissão e Entreprise commune ECSEL, T‑533/20, não publicado, EU:T:2021:375, n.os 44 e 45).

56      Daqui resulta que, na medida em que a Comissão não é parte na Convenção de Subvenção, o Tribunal Geral não é competente para se pronunciar sobre os pedidos da recorrente apresentados ao abrigo do artigo 272.o TFUE e dirigidos contra essa instituição (v., neste sentido, Acórdão de 7 de dezembro de 1976, Pellegrini/Comissão e Flexon‑Italia, 23/76, EU:C:1976:174, n.o 31, e Despacho de 16 de junho de 2021, Green Power Technologies/Comissão e Entreprise commune ECSEL, T‑533/20, não publicado, EU:T:2021:375, n.o 47 e jurisprudência referida).

57      Por conseguinte, os pedidos da recorrente apresentados contra a Comissão ao abrigo do artigo 272.o TFUE devem ser julgados improcedentes por terem sido apresentados num órgão jurisdicional incompetente para deles conhecer.

58      Resulta do exposto que o recurso só pode ser apreciado quanto ao mérito na parte em que é interposto ao abrigo do artigo 272.o TFUE e dirigido contra a REA.

 Quanto à procedência dos pedidos apresentados contra a REA nos termos do artigo 272.o TFUE

59      Em apoio dos seus pedidos apresentados contra a REA ao abrigo do artigo 272.o TFUE, a recorrente invoca formalmente três fundamentos, relativos, respetivamente, o primeiro, ao facto de os prémios controvertidos não terem caráter comercial, o segundo, à violação do princípio da proteção da confiança legítima e, o terceiro, a uma interpretação errada da Convenção de Subvenção.

60      Tendo em conta o conteúdo destes três fundamentos, há que examinar, num primeiro momento e conjuntamente, o primeiro e terceiro fundamentos, ambos relativos, em substância, à violação da Convenção de Subvenção, e depois, num segundo momento, o segundo fundamento, relativo à violação do princípio da proteção da confiança legítima.

 Quanto ao primeiro e terceiro fundamentos, relativos à violação da Convenção de Subvenção

61      Com o seu primeiro e terceiro fundamentos, a recorrente alega, em substância, que os prémios controvertidos foram pagos no âmbito do projeto e que eram necessários à sua execução, pelo que preenchiam as condições de elegibilidade previstas no artigo 6.1., alínea a), iv), da Convenção de Subvenção, interpretadas à luz do modelo anotado de convenção de subvenção.

62      A Comissão contesta a argumentação da recorrente.

–       Considerações gerais

63      Em primeiro lugar, resulta das disposições conjugadas do artigo 6.1., alínea a), iv), e do artigo 6.2., alínea A.1, da Convenção de Subvenção, referidas nos n.os 7 e 8, supra, que os custos de pessoal reais e indiretos são elegíveis desde que, nomeadamente, sejam «incorridos em relação com [o projeto]» e sejam «necessários à sua execução».

64      Em segundo lugar, a recorrente e a REA referem‑se igualmente às explicações que figuram no modelo anotado de convenção de subvenção no que respeita às condições de elegibilidade dos custos de pessoal. Na sua versão de 30 de março de 2015, aplicável aos factos do presente processo (v. página 46 do referido modelo), este documento, que comenta o artigo 6.o do modelo geral de convenção de subvenção elaborado pela Comissão (a seguir «modelo geral de convenção de subvenção»), precisa o seguinte:

«[…] Os pagamentos de dividendos aos trabalhadores (distribuição de lucros) são inelegíveis na aceção do artigo 6.5., alíneas (a) (i)[, do modelo de convenção de subvenção]. (No entanto, os complementos [de remuneração] baseados no desempenho financeiro global da organização (por exemplo, rendibilidade ou excedente) podem ser aceites como complementos variáveis se preencherem as condições a seguir enunciadas.)

Exemplos (aceitáveis):

Se o lucro da empresa no final do ano for superior a X [euros] (ou mais de X %), cada trabalhador receberá um complemento de z % da sua remuneração de base (ou um complemento fixo de x [euros] como parte do seu salário bruto).

Exemplos (inaceitáveis):

Se os lucros da sociedade no final do ano forem superiores a X [euros] (ou mais de X %), z % desse lucro será distribuído aos trabalhadores através de uma remuneração suplementar.

Qualquer parte de remuneração calculada em função de objetivos comerciais (por exemplo, x [euros] para a realização de um objetivo de venda, x % sobre as vendas) ou de objetivos de angariação de fundos (por exemplo, prémio de x [euros] por projeto de financiamento externo obtido, x % do financiamento externo obtido) não é elegível. A razão disso é que [esses custos] não são incorridos em relação ao [projeto em causa] nem necessários à sua execução.

Exemplo (inelegível por estar relacionado com um objetivo de angariação de fundos): [u]m prémio pago em recompensa por ter obtido uma subvenção específica não é elegível […]»

65      Há que salientar que, como precisado na sua nota introdutória, o modelo anotado de convenção de subvenção visa explicar o modelo geral de convenção de subvenção e permitir aos utilizadores compreender e interpretar as convenções de subvenção redigidas com base nesse modelo. Embora não tenha valor vinculativo, este documento, publicado e acessível a todos os contratantes, insere‑se no contexto em que a Convenção de Subvenção foi celebrada e deve, por conseguinte, ser tido em conta pelo Tribunal Geral para efeitos da interpretação desse acordo (v., neste sentido e por analogia, Acórdãos de 14 de novembro de 2017, Alfamicro/Comissão, T‑831/14, não publicado, EU:T:2017:804, n.os 68 e 104, e de 13 de julho de 2022, VeriGraft/Eismea, T‑457/20, EU:T:2022:457, n.o 109).

66      Em terceiro lugar, a repartição do ónus da prova quanto ao caráter elegível dos custos suportados pela recorrente rege‑se pelo direito material aplicável à Convenção de Subvenção, a saber, o direito da União, completado, se necessário, pelo direito belga (v. n.o 15, supra). Na falta de disposição do direito da União que regule a execução dos contratos, há que aplicar o artigo 1315.o do anterior Código Civil belga, aplicável ratione temporis aos factos do caso em apreço. Este artigo estabelece que quem exigir o cumprimento de uma obrigação deve provar a existência da mesma e que, reciprocamente, aquele que pretende liberar‑se deve justificar o pagamento ou o facto que tenha produzido a extinção da sua obrigação. Daqui resulta que incumbe à recorrente, que declarou custos para a atribuição de uma contribuição financeira da União, fazer prova de que esses custos preenchem os requisitos de elegibilidade previstos na Convenção de Subvenção (v., neste sentido, Acórdãos de 16 de julho de 2014, Isotis/Comissão, T‑59/11, EU:T:2014:679, n.o 83 e jurisprudência referida, e de 27 de abril de 2022, Sieć Badawcza Łukasiewicz — Port Polski Ośrodek Rozwoju Technologii/Comissão, T‑4/20, EU:T:2022:242, n.os 113 e 114 e jurisprudência referida).

–       Descrição do sistema de prémios instituído pela recorrente

67      A recorrente instituiu um sistema de prémios pagos aos seus trabalhadores.

68      Resulta da documentação interna da recorrente que, de um modo geral, o montante desses prémios tem em conta diferentes objetivos ou metas, tais como i) a margem de uma dada encomenda, ii) a margem de contribuição, iii) a obtenção de novas encomendas, iv) o tempo médio de cobrança, v) o número de dias despendidos por um trabalhador numa determinada encomenda, vi) as faturas a emitir, vii) os rendimentos retirados de uma dada encomenda e viii) o excedente bruto de exploração [a seguir, respetivamente, «objetivo i)», «objetivo ii)», «objetivo iii)», «objetivo iv)», «objetivo v)», «objetivo vi)», «objetivo vii)» e «objetivo viii)»].

69      Na prática, estes objetivos estão ligados quer a uma encomenda específica [objetivos i), v) e vii)], quer à atividade de uma divisão da recorrente para uma zona de referência durante o ano [objetivos ii) a iv) e vi)], quer ao desempenho financeiro global da recorrente ou do seu grupo [objetivo viii)]. Considera‑se que são atingidos quando é atingido um valor‑limite (mínimo ou máximo).

70      O princípio e o montante dos prémios são determinados segundo regras de atribuição e de cálculo que figuram nos planos de incentivo individuais negociados entre a recorrente e os seus trabalhadores. Estes planos de incentivo preveem geralmente que seja atribuído um prémio quando um dos objetivos i) a vii) seja alcançado e o montante bruto desse prémio seja calculado em função dos resultados obtidos a título do objetivo em causa. Se for caso disso, os prémios resultantes dos diferentes objetivos tidos em conta são então somados para obter um prémio global. Em caso de «atraso no encerramento do incumprimento», é aplicada uma penalidade. Por último, é aplicado um coeficiente multiplicador ligado ao objetivo viii) para modular o prémio global e obter o prémio devido ao trabalhador, que não pode, no entanto, exceder um montante máximo.

71      Em especial, no que respeita ao projeto objeto da Convenção de Subvenção, os planos de incentivo subscritos pelos dois trabalhadores em causa foram juntos aos autos. Resulta desses planos de incentivo que o montante dos prémios pagos a estes dois trabalhadores é calculado em função, primeiro, da margem sobre uma determinada encomenda [objetivo i), unicamente para um dos dois trabalhadores], segundo, da margem de contribuição [objetivo ii)] e, terceiro, do excedente bruto de exploração [objetivo viii)]. Por outro lado, os prémios concedidos a esses dois trabalhadores estão limitados, respetivamente, a 9 450 euros e a 20 250 euros por ano.

–       Caráter elegível ou não dos prémios controvertidos

72      Durante os procedimentos de auditoria e de recuperação, a Comissão e a REA consideraram, em substância, que os prémios controvertidos estavam ligados à realização de objetivos de natureza comercial e que, por esta razão, não constituíam custos elegíveis (v. n.o 22, supra).

73      No Tribunal Geral, a REA precisa a sua posição e explica, nomeadamente, que os objetivos enumerados no n.o 68, supra, nomeadamente os relativos à margem sobre uma dada encomenda [objetivo i)] e à margem de contribuição [objetivo ii)], correspondem à realização de atividades que apresentam, manifestamente, caráter comercial. Observa igualmente que o montante dos prémios controvertidos é fixado diretamente na proporção dos objetivos comerciais. Assim, por exemplo, os prémios relacionados com as margens realizadas seriam atribuídos caso fosse excedido um valor de margem de referência e multiplicando as margens realizadas por um coeficiente multiplicador. Baseando‑se nas explicações que figuram no modelo anotado de convenção de subvenção, a REA deduz daí que, tendo em conta as suas características, os prémios controvertidos têm caráter comercial e que, por conseguinte, não correspondem a custos suportados em relação com o projeto e não são necessários à sua execução, pelo que não preenchem as condições de elegibilidade previstas no artigo 6.1., alínea a), iv), da Convenção de Subvenção.

74      A recorrente reconhece que, em conformidade com as explicações que figuram no modelo anotado de convenção de subvenção, não é elegível qualquer remuneração calculada em função de objetivos comerciais. Também não contesta a conclusão da REA segundo a qual os prémios controvertidos são condicionados e proporcionados à realização de certos objetivos (v. n.o 73, supra).

75      Todavia, a recorrente contesta o caráter comercial dos prémios controvertidos. Sustenta, no essencial, que, não obstante a sua qualificação errada de «comissões», os prémios controvertidos estão ligados à realização de objetivos económicos globais e coletivos definidos ao nível da empresa ou, pelo menos, de uma divisão desta, e não à realização de objetivos comerciais (e nomeadamente de venda) individuais definidos ao nível de cada empregado. Por conseguinte, esses prémios constituem «complementos baseados no desempenho financeiro global da organização» e, por conseguinte, são elegíveis em conformidade com as explicações que figuram no modelo anotado de convenção de subvenção.

76      Por outro lado, a recorrente alega que o montante dos prémios controvertidos está limitado, pelo que esses prémios não podem ser equiparados a «dividendos» inelegíveis na aceção do modelo anotado de convenção de subvenção.

77      Antes de examinar concretamente se os prémios controvertidos eram elegíveis e de examinar a argumentação da recorrente, há que proceder à interpretação do artigo 6.1., alínea a), iv), da Convenção de Subvenção, tendo em conta as explicações que figuram no modelo anotado de convenção de subvenção.

78      Antes de mais, importa salientar que o excerto do modelo anotado de convenção de subvenção invocado pelas partes e reproduzido no n.o 64, supra, exclui, como inelegíveis, duas categorias de custos distintos, a saber, por um lado, os dividendos e lucros pagos aos trabalhadores e, por outro, os complementos de remuneração calculados em função de objetivos comerciais ou de objetivos de angariação de fundos. Com efeito, estas duas categorias de custos não podem ser qualificadas de «custos incorridos relacionados com [o projeto em causa] e necessários à sua execução» na aceção do artigo 6.1., alínea a), iv), do modelo geral de convenção de subvenção.

79      Além disso, há que fazer as seguintes precisões.

80      Primeiro, no que respeita aos dividendos e lucros pagos aos trabalhadores, o modelo anotado de convenção de subvenção indica que complementos de remuneração variáveis ou fixos baseados no desempenho financeiro global da organização podem, não obstante, ser elegíveis, desde que preencham determinadas condições.

81      A este respeito, uma primeira condição diz respeito ao modo de cálculo do complemento de remuneração. Resulta dos exemplos dados no modelo anotado de convenção de subvenção que o complemento de remuneração pode assumir a forma de um montante fixo ou de uma determinada percentagem da remuneração de base. Em contrapartida, o referido complemento não deve assumir a forma de uma determinada percentagem do lucro da sociedade, uma vez que, nesse caso, se assemelha a uma distribuição de dividendos.

82      Uma segunda condição diz respeito à exclusão dos complementos remuneratórios calculados em função de objetivos comerciais ou de angariação de fundos (v. n.o 83, infra). Daqui resulta que, como salienta, em substância e com razão, a REA, um complemento de remuneração baseado no desempenho financeiro global da organização é inelegível se se basear igualmente, de forma indissociável, em objetivos comerciais ou em objetivos de angariação de fundos.

83      Segundo, quanto aos complementos de remuneração calculados em função de objetivos comerciais ou de objetivos de angariação de fundos, o modelo anotado de convenção de subvenção precisa, em substância, que os prémios fixos ou variáveis concedidos como contrapartida da realização desses objetivos não são elegíveis. É o caso, nomeadamente, dos prémios sob a forma de um montante fixo subordinado à realização de um objetivo de venda ou de angariação de fundos ou de uma determinada percentagem das vendas ou dos fundos angariados.

84      A este respeito, não resulta do modelo anotado de convenção de subvenção que apenas os objetivos fixados ao nível de um trabalhador possam ser qualificados de objetivos comerciais ou de angariação de fundos, pelo que objetivos fixados ao nível da organização no seu conjunto ou ao nível de uma divisão desta não podem, por definição, ter esse caráter comercial ou de angariação de fundos. Daqui resulta que, contrariamente ao que sugere a recorrente, os complementos de remuneração baseados em objetivos fixados ao nível da organização no seu conjunto (ou, a fortiori, ao nível de uma divisão desta) não são necessariamente elegíveis. Assim, os complementos de remuneração elegíveis previstos no modelo anotado de convenção de subvenção devem, antes de mais, ser fixados ao nível da organização no seu conjunto, em seguida, basear‑se no desempenho financeiro global dessa organização e, por último, não fazer referência a objetivos comerciais ou a objetivos de angariação de fundos.

85      É à luz destas considerações que devem ser interpretadas as disposições da Convenção de Subvenção e que há que apreciar se os prémios controvertidos eram ou não elegíveis.

86      A este respeito, há que observar que o sistema de prémios instituído pela recorrente assenta em dois tipos de objetivos.

87      Em primeiro lugar, os sete primeiros objetivos enumerados no n.o 68, supra, são definidos à luz de uma encomenda específica ou da atividade de uma divisão da recorrente durante o ano. É o caso, em especial, da margem numa determinada encomenda [objetivo i)] e da margem de contribuição [objetivo ii)], mencionadas nos planos de incentivo dos dois trabalhadores em causa, estando a primeira dessas margens ligada a uma encomenda específica e a segunda à atividade de uma divisão da recorrente durante o ano (v. n.o 69, supra). Afigura‑se, portanto, que estes diferentes objetivos têm caráter comercial e não estão relacionados com o desempenho financeiro global da recorrente.

88      Além disso, os prémios concedidos em razão dos sete primeiros objetivos são condicionados e proporcionais à realização dos referidos objetivos. Em especial, os prémios associados à margem sobre uma determinada encomenda e à margem de contribuição, mencionados nos planos de incentivo dos dois trabalhadores em causa, são diretamente proporcionais às margens realizadas. (v. n.os 73 e 74, supra).

89      Daqui resulta que os prémios concedidos em razão dos sete primeiros objetivos têm natureza comercial em razão tanto do seu objeto como do seu modo de cálculo.

90      Em segundo lugar, o oitavo e último objetivo mencionado no n.o 68, supra, a saber, o excedente bruto de exploração, também ele expressamente mencionado nos planos de incentivo dos dois trabalhadores em causa, está, é certo, ligado aos resultados financeiros globais da recorrente e das outras sociedades do seu grupo.

91      Todavia, mesmo independentemente da questão de saber se a tomada em consideração do desempenho financeiro de outras sociedades do grupo da recorrente é admissível, cumpre referir que o excedente bruto de exploração não é tido em conta para calcular um prémio autónomo, sob a forma de um montante fixo ou de uma determinada percentagem da remuneração de base, em conformidade com o modelo anotado de convenção de subvenção. Com efeito, este objetivo é utilizado unicamente para modular o montante dos prémios concedidos em função dos sete primeiros objetivos (v. n.o 70, supra). Ora, o princípio e o montante destas últimas dependem da realização de objetivos comerciais (v. n.o 89, supra).

92      Nestas condições, verifica‑se que os prémios pagos pela recorrente aos seus trabalhadores se baseiam essencialmente em objetivos comerciais e que, por conseguinte, os custos correspondentes a esses prémios não são suportados relativamente ao projeto nem necessários à execução desse projeto. Por conseguinte, esses prémios não preenchem as condições previstas no artigo 6.1., alínea a), iv), da Convenção de Subvenção.

93      Esta conclusão não é posta em causa pela argumentação da recorrente resumida nos n.os 75 e 76, supra.

94      Primeiro, a recorrente invoca o facto de os objetivos enumerados no n.o 68, supra, não estarem relacionados com a atividade individual do trabalhador, mas com resultados coletivos alcançados pela empresa ou por uma das suas divisões.

95      A este respeito, mesmo admitindo que os objetivos acima enumerados no n.o 68 não estejam ligados à atividade individual do trabalhador, resulta, no entanto, dos princípios enunciados no n.o 84, supra, que os objetivos fixados ao nível de uma organização ou de uma divisão desta podem ter caráter comercial. Ora, é esse o caso dos sete primeiros objetivos (v. n.o 87, supra).

96      Segundo, a recorrente considera que, por não implicarem atividades de «venda» de bens ou serviços, os objetivos acima enumerados no n.o 68 não constituem objetivos «comerciais», mas objetivos «económicos».

97      No entanto, a recorrente não fornece nenhuma explicação convincente que permita limitar o conceito de «objetivo comercial» apenas às atividades de «venda», definir um conceito distinto de «objetivo económico» e admitir a elegibilidade de prémios baseados em «objetivos económicos» não relacionados com os resultados financeiros globais da organização. Em especial, há que observar que o modelo anotado de convenção de subvenção não refere tais «objetivos económicos». Este documento menciona unicamente, por um lado, uma categoria de prémios elegíveis, sob certas condições, a saber, os prémios baseados no desempenho financeiro global da organização, e, por outro, duas categorias de prémios inelegíveis em quaisquer circunstâncias, a saber, os prémios calculados em função de objetivos comerciais e os calculados em função de objetivos de angariação de fundos.

98      Terceiro, a recorrente invoca o facto de o montante do prémio pago a um trabalhador estar limitado.

99      Todavia, como salienta acertadamente a REA, este limite máximo não tem incidência na elegibilidade do prémio. Com efeito, um complemento de remuneração calculado em função de objetivos comerciais é, por definição, inelegível, independentemente do seu modo de cálculo, do seu caráter fixo ou variável, bem como do seu caráter limitado ou não.

100    Quarto, a recorrente alega que os prémios controvertidos não podem ser equiparados a dividendos pelos quais os trabalhadores recebem os lucros da organização.

101    Este argumento é inoperante. Com efeito, um complemento de remuneração calculado em função de objetivos comerciais, como o pago pela recorrente aos seus trabalhadores, é, por definição, inelegível, mesmo que não apresente as características de um dividendo.

102    Quinto, a recorrente refere uma nota elaborada por uma sociedade de auditoria independente que conclui pela elegibilidade dos prémios pagos pela recorrente aos seus trabalhadores.

103    No entanto, por um lado, esta nota não pode ser considerada uma peritagem neutra e independente, na medida em que foi elaborada a pedido da recorrente. Daqui resulta que não dispõe de um valor probatório incontestável (v., por analogia, Acórdão de 3 de março de 2011, Siemens/Comissão, T‑110/07, EU:T:2011:68, n.o 137). Por outro lado, a referida nota limita‑se a analisar brevemente o sistema de prémios instituído pela recorrente e não refere nenhum elemento de direito ou de facto suplementar à luz dos já analisados no presente acórdão.

104    Nestas condições, a recorrente não prova a elegibilidade dos prémios controvertidos.

105    Por conseguinte, o primeiro e terceiro fundamentos devem ser julgados improcedentes.

106    Nestas circunstâncias, não é necessário examinar os fundamentos de inadmissibilidade invocados pela REA e relativos, por um lado, ao facto de a petição não cumprir as exigências do artigo 76.o, alínea d), do Regulamento de Processo no que respeita ao terceiro fundamento e, por outro, ao facto de o argumento da recorrente resumido no n.o 96, supra, conter um fundamento novo suscitado pela primeira vez na fase da réplica.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do princípio da proteção da confiança legítima

107    Com o seu segundo fundamento, a recorrente sustenta, em substância, que o facto de a Comissão e a REA porem em causa a elegibilidade dos prémios controvertidos constitui uma violação do princípio da proteção da confiança legítima. Com efeito, a Comissão reconheceu várias vezes a justeza do método de determinação dos custos elegíveis e aceitou a tomada em consideração dos prémios controvertidos como custos elegíveis.

108    A REA contesta a argumentação da recorrente.

109    A título preliminar, há que recordar que, quando as instituições, órgãos ou organismos da União executam um contrato, continuam sujeitos às obrigações que lhes incumbem por força da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e dos princípios gerais do direito da União (v., neste sentido, Acórdão de 16 de julho de 2020, ADR Center/Comissão, C‑584/17 P, EU:C:2020:576, n.o 86). O Tribunal de Justiça sublinhou igualmente que, se as partes decidirem, no contrato, através de uma cláusula compromissória, atribuir ao juiz da União competência para conhecer dos litígios relativos a esse contrato, este juiz será competente, independentemente do direito aplicável estipulado no referido contrato, para apreciar as eventuais violações da Carta e dos princípios gerais do direito da União (Acórdão de 16 de julho de 2020, Inclusion Alliance for Europe/Comissão, C‑378/16 P, EU:C:2020:575, n.o 81).

110    Daqui resulta que, ao invocar, em apoio dos seus pedidos apresentados ao abrigo do artigo 272.o TFUE, a violação do princípio da proteção da confiança legítima, a recorrente invoca efetivamente uma regra que a administração da União está obrigada a respeitar num quadro contratual.

111    Além disso, no direito belga, aplicável a título subsidiário ao caso em apreço (v., n.os 15 e 66, supra), uma forma de confiança legítima é suscetível de ser invocada em direito dos contratos, uma vez que a mesma participa na obrigação das partes num contrato de o cumprir de boa‑fé. (v., neste sentido, Acórdãos de 18 de novembro de 2015, Synergy Hellas/Comissão, T‑106/13, EU:T:2015:860, n.os 72 e 73, e de 4 de maio de 2017, Meta Group/Comissão, T‑744/14, não publicado, EU:T:2017:304, n.os 193 e 194).

112    Há que recordar que, segundo jurisprudência constante, o direito de invocar o princípio da proteção da confiança legítima pressupõe que tenham sido fornecidas ao interessado garantias precisas, incondicionais e concordantes, provenientes de fontes autorizadas e fiáveis, pelas autoridades competentes da União. Em contrapartida, ninguém pode invocar uma violação deste princípio na falta dessas garantias (v. Acórdãos de 17 de março de 2011, AJD Tuna, C‑221/09, EU:C:2011:153, n.o 72 e jurisprudência referida, e de 16 de julho de 2020, ADR Center/Comissão, C‑584/17 P, EU:C:2020:576, n.o 75 e jurisprudência referida).

113    No caso em apreço, para provar a violação do princípio da proteção da confiança legítima, a recorrente invoca três tomadas de posição da Comissão, que há que examinar sucessiva e cronologicamente.

114    Em primeiro lugar, a recorrente explica que, no contexto do Sétimo Programa‑Quadro de atividades em matéria de investigação, desenvolvimento tecnológico e demonstração (2007‑2013) (a seguir «Sétimo Programa‑Quadro»), a Comissão tinha aprovado a metodologia utilizada para calcular as suas despesas de pessoal e pediu‑lhe que notificasse qualquer alteração introduzida nesta metodologia.

115    A este respeito, é pacífico que, em 17 de março de 2011, a recorrente apresentou à Comissão um formulário de certificação que descrevia a metodologia utilizada para calcular as suas despesas de pessoal (a seguir «certificado de metodologia»). Este documento referia um regime de prémios variáveis atribuídos através de «cartas de incentivo» e determinadas em função, por um lado, dos desempenhos individuais do trabalhador e, por outro, do desempenho da empresa e da divisão desta à qual o referido trabalhador estava afetado.

116    Por carta de 1 de julho de 2011, a Comissão aprovou o certificado de metodologia (a seguir «carta que aprova o certificado de metodologia»). Esta carta precisava, nomeadamente, que, caso a metodologia certificada fosse alterada, a recorrente devia declarar à Comissão as alterações ocorridas e apresentar um novo certificado de metodologia.

117    Todavia, à semelhança da REA, em primeiro lugar, há que salientar que o certificado de metodologia diz respeito ao Sétimo Programa‑Quadro. Não obstante a existência de elementos semelhantes e de continuidade, este Sétimo Programa‑Quadro é distinto do Programa‑Quadro Horizonte 2020, que o substituiu e no qual se insere o projeto. Aliás, a carta que aprova o certificado de metodologia indica que este certificado é válido para o período de vigência do Sétimo Programa‑Quadro e não prevê uma eventual prorrogação dessa validade no âmbito de um programa‑quadro posterior. Além disso, o modelo anotado de convenção de subvenção (v. página 155 do referido modelo) especifica expressamente que um certificado de metodologia aprovado no âmbito do Sétimo Programa‑Quadro não é válido no contexto do Programa‑Quadro Horizonte 2020.

118    Em segundo lugar, a carta que aprova o certificado de metodologia tem um alcance limitado mesmo no próprio Sétimo Programa‑Quadro. Com efeito, por um lado, essa carta limita‑se a indicar que dispensa a recorrente de apresentar certificados intermédios relativos às demonstrações financeiras nos seus pedidos de pagamentos intermédios. Por outro lado, o modelo anotado de convenção de subvenção indica que a aprovação diz respeito às práticas habituais de contabilização dos custos e que, em consequência dessa aprovação, a Comissão não põe em causa os custos unitários declarados. Ora, resulta das estipulações do artigo 5.2. da Convenção de Subvenção, resumidas no n.o 6, supra, que os «custos unitários» constituem uma categoria de custos com pessoal distintos dos «custos reais» a que pertencem os prémios controvertidos. De resto, são os «custos reais», e não os «custos unitários», que estão sujeitos à condição prevista no artigo 6.1., alínea a), i), dessa convenção.

119    Terceiro, contrariamente ao que sustenta a recorrente, a carta que aprova o certificado de metodologia não a obrigava a manter a estrutura dos seus custos para garantir a respetiva elegibilidade. Com efeito, resulta tanto dos termos dessa carta como das explicações que figuram no modelo anotado de convenção de subvenção que a referida carta impunha apenas à recorrente que declarasse à Comissão as alterações introduzidas na sua metodologia e, sendo caso disso, apresentasse um novo certificado de metodologia.

120    Por conseguinte, a carta que aprova o certificado de metodologia não continha nenhuma garantia precisa e incondicional de que os prémios pagos pela recorrente aos seus trabalhadores, como os prémios controvertidos, eram elegíveis no contexto do Programa‑Quadro Horizonte 2020 e, nomeadamente, no âmbito da Convenção de Subvenção.

121    Em segundo lugar, a demandante alega que, durante uma auditoria anterior relativa aos projetos Festival, PATHway e WeLive (a seguir «auditoria FPW»), a Comissão aceitou tomar em consideração, como custos elegíveis, prémios pagos aos seus trabalhadores.

122    A este respeito, é verdade que, no relatório final de auditoria que encerrou a auditoria FPW (a seguir «relatório de auditoria FPW»), datado de 18 de março de 2018, a Comissão indicou, antes de mais, que os complementos previstos pelos planos de incentivo dos trabalhadores da recorrente «[se baseavam] no desempenho financeiro global da organização, [correspondiam] às práticas habituais de remuneração para projetos nacionais e [eram], portanto, elegíveis como remuneração de base», em seguida, que «pôde validar a exatidão, a objetividade e a existência dos suplementos variáveis» e, por último, que «existiam elementos de prova suficientes para validar a elegibilidade dos custos [correspondentes a esses complementos]».

123    Todavia, primeiro, há que salientar, à semelhança da REA que a auditoria FPW dizia respeito a projetos diferentes do projeto objeto da Convenção de Subvenção.

124    Segundo, não resulta dos autos que, no âmbito da auditoria FPW, a Comissão tenha procedido a uma análise aprofundada e exaustiva do sistema de prémios instituído pela recorrente à luz de todas as condições de elegibilidade previstas pela Convenção de Subvenção aplicável aos projetos em causa. Pelo contrário, o relatório de auditoria FPW limita‑se a confirmar, em termos muito gerais, a elegibilidade dos prémios então em causa e a lamentar que os planos de incentivo negociados entre a recorrente e os seus trabalhadores não tenham sido assinados pelos referidos trabalhadores.

125    Terceiro, no relatório de auditoria FPW, a Comissão indicou expressamente que se tratava de um «relatório por exceção» e que, «enquanto tal, não podia normalmente criar expectativas legítimas quanto à conformidade dos custos declarados e dos métodos de cálculo utilizados». Explicou igualmente que «qualquer auditoria consiste, por definição, numa verificação que não é exaustiva e que se baseia em elementos representativos e exemplos», que «um certo risco de não deteção é inerente a todas as auditorias» e que, por conseguinte, os «relatórios de auditoria não podem criar expectativas quanto à conformidade dos custos declarados e dos métodos de cálculo utilizados». Ora, tais reservas sobre o alcance do relatório de auditoria FPW bastam para criar uma incerteza que impede o surgimento de qualquer confiança legítima baseada no conteúdo desse relatório (v., por analogia, Acórdão de 27 de abril de 2022, Sieć Badawcza Łukasiewicz — Port Polski Ośrodek Rozwoju Technologii/Comissão, T‑4/20, EU:T:2022:242, n.o 141).

126    Por conseguinte, o relatório de auditoria FPW não continha uma garantia precisa e incondicional quanto à elegibilidade dos prémios pagos pela recorrente aos seus trabalhadores, como os prémios controvertidos.

127    Em terceiro lugar, a recorrente observa que, na carta de esclarecimento, a Comissão renunciou a estender as conclusões da auditoria a todos as convenções de subvenção, pelo facto de as auditorias anteriores não terem detetado a inelegibilidade dos prémios controvertidos baseados em objetivos comerciais (v. n.o 25, supra). Segundo a recorrente, esta limitação da extensão das conclusões da auditoria, por um lado, é insuficiente e, por outro, demonstra que a Comissão estava consciente de que prejudicava manifestamente os seus interesses e as suas expectativas legítimas.

128    A este respeito, por um lado, há que salientar que o argumento da recorrente relativo ao caráter alegadamente insuficiente da limitação da extensão das conclusões da auditoria é desprovido de pertinência no âmbito do presente litígio. Com efeito, a inelegibilidade dos prémios controvertidos foi observada durante a auditoria, e não aquando da extensão das conclusões dessa auditoria.

129    Por outro lado, a REA alega, com razão, que a decisão da Comissão, favorável à recorrente, de limitar a extensão das conclusões da auditoria, estava abrangida pelo poder de apreciação desta instituição ao abrigo do artigo 22.5.1. da Convenção de Subvenção, pelo que não se pode retirar nenhuma conclusão desta decisão no âmbito do presente fundamento. Deve acrescentar‑se que, sendo posterior ao período de execução do projeto, a carta de esclarecimento não pode, de qualquer modo, constituir uma garantia dada em tempo útil quanto à elegibilidade dos prémios controvertidos.

130    Nestas condições, a recorrente não justifica que a Comissão lhe tenha fornecido garantias precisas, incondicionais e concordantes quanto à elegibilidade dos prémios controvertidos. Por conseguinte, em conformidade com a jurisprudência acima recordada no n.o 112, a recorrente não pode invocar o princípio da proteção da confiança legítima.

131    Por conseguinte, o segundo fundamento deve ser julgado improcedente.

132    Daqui resulta que os pedidos da recorrente apresentados contra a REA nos termos do artigo 272.o TFUE devem ser julgados improcedentes.

133    Resulta do que precede que deve ser negado provimento ao recurso na totalidade.

 Quanto às despesas

134    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

135    Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la a suportar as suas próprias despesas, bem como as da Comissão e da REA, em conformidade com os pedidos destas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A Engineering — Ingegneria Informatica SpA é condenada nas despesas.

Kowalik‑Bańczyk

Buttigieg

Ricziová

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 26 de julho de 2023.

Assinaturas


*      Língua do processo: italiano.