Language of document : ECLI:EU:T:2023:376

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção alargada)

5 de julho de 2023 (*)

«Dumping — Importações de nitrato de amónio originário da Rússia — Direitos antidumping definitivos — Pedido de reexame da caducidade das medidas — Artigo 11.o, n.o 2, do Regulamento (UE) 2016/1036 — Artigo 5.o, n.os 3 e 9, do Regulamento 2016/1036 — Prazo legal — Caráter suficiente dos elementos de prova — Processo de informações adicionais — Informações apresentadas fora do prazo legal»

No processo T‑126/21,

AO Nevinnomysskiy Azot, com sede em Nevinnomyssk (Rússia),

AO Novomoskovskaya Aktsionernaya Kompania NAK «Azot», com sede em Novomoskovsk (Rússia),

representadas por P. Vander Schueren e T. Martin‑Brieu, advogados,

recorrentes,

contra

Comissão Europeia, representada por G. Luengo e P. Němečková, na qualidade de agentes,

recorrida,

apoiada por:

Fertilizers Europe, representada por B. O’Connor e M. Hommé, advogados,

interveniente,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção alargada),

composto, na deliberação, por: D. Spielmann, presidente, U. Öberg (relator), R. Mastroianni, M. Brkan e I. Gâlea, juízes,

secretário: I. Kurme, administradora,

vistos os autos,

após a audiência de 30 de novembro de 2022,

profere o presente

Acórdão

1        Com o seu recurso baseado no artigo 263.o TFUE, as recorrentes, AO Nevinnomysskiy Azot e AO Novomoskovskaya Aktsionernaya Kompania NAK «Azot», pedem a anulação do Regulamento de Execução (UE) 2020/2100 da Comissão, de 15 de dezembro de 2020, que institui um direito antidumping definitivo sobre as importações de nitrato de amónio originário da Rússia na sequência de um reexame da caducidade nos termos do artigo 11.o, n.o 2, do Regulamento (UE) 2016/1036 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO 2020, L 425, p. 21, a seguir «regulamento impugnado»).

 Antecedentes do litígio

2        As recorrentes são produtoras e exportadoras de nitrato de amónio estabelecidas na Rússia.

3        Pelo Regulamento (CE) n.o 2022/95 do Conselho, de 16 de agosto de 1995, que cria um direito antidumping definitivo sobre as importações de nitrato de amónio originário da Rússia (JO 1995, L 198, p. 1), o Conselho instituiu um direito antidumping definitivo sobre as importações de nitrato de amónio originário da Rússia, classificado nos códigos NC 3102 30 90 e 3102 40 90.

4        Na sequência de um primeiro reexame da caducidade das medidas, previsto no artigo 11.o, n.o 2, do Regulamento (CE) n.o 384/96 do Conselho, de 22 de dezembro de 1995, relativo à defesa contra as importações objetivo de dumping de países não membros da Comunidade Europeia (JO 1996, L 56, p. 1), e de um primeiro reexame intercalar em nos termos do artigo 11.o, n.o 3, do mesmo regulamento, foi mantido um direito antidumping definitivo sobre as exportações da Rússia pelo Regulamento (CE) n.o 658/2002 do Conselho, de 15 de abril de 2002, que cria um direito antidumping definitivo sobre as importações de nitrato de amónio originário da Rússia (JO 2002, L 102, p. 1).

5        Na sequência de um segundo reexame da caducidade das medidas e de um segundo reexame intercalar parcial nos termos do artigo 11.o, n.os 2 e 3, do Regulamento n.o 384/96, o Conselho, manteve as medidas em vigor, através do Regulamento (CE) n.o 661/2008 do Conselho, de 8 de julho de 2008, que institui um direito antidumping definitivo sobre as importações de nitrato de amónio originário da Rússia na sequência de um reexame da caducidade em conformidade com o n.o 2 do artigo 11.o e de um reexame intercalar parcial em conformidade com o n.o 3 do artigo 11.o do Regulamento (CE) n.o 384/96 (JO 2008, L 185, p. 1)].

6        Após um terceiro reexame da caducidade das medidas, a Comissão Europeia manteve as medidas em vigor através do Regulamento de Execução (UE) n.o 999/2014 da Comissão, de 23 de setembro de 2014, que institui um direito antidumping definitivo sobre as importações de nitrato de amónio originário da Rússia na sequência de um reexame da caducidade ao abrigo do n.o 2 do artigo 11.o do Regulamento (CE) n.o 1225/2009 do Conselho (JO 2014, L 280, p. 19).

7        Na sequência de um reexame intercalar e em conformidade com o artigo 11.o, n.o 3, do Regulamento (UE) 2016/1036 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de junho de 2016, relativo à defesa contra as importações objeto de dumping dos países não membros da União Europeia (codificação) (JO 2016, L 176, p. 21, a seguir «regulamento de base»), a Comissão adotou o Regulamento de Execução (UE) 2018/1722 da Comissão, de 14 de novembro de 2018, que altera o Regulamento de Execução (UE) n.o 999/2014 que institui um direito antidumping definitivo sobre as importações de nitrato de amónio originário da Rússia, na sequência de um reexame intercalar parcial nos termos do artigo 11.o, n.o 3, do Regulamento (UE) 2016/1036 (JO 2018, L 287, p. 3).

8        As recorrentes continuavam, portanto, sujeitas a um direito antidumping compreendido entre 28,78 e 32,71 euros por tonelada em função do tipo de produto, aplicável a todo o território russo.

9        Em 21 de junho de 2019, a interveniente, Fertilizers Europe, uma associação europeia de fabricantes de adubos, apresentou à Comissão um pedido de início de um reexame da caducidade desses direitos, com base no artigo 11.o, n.o 2, do regulamento de base (a seguir «pedido inicial»). Essa consulta seguiu‑se à publicação no Jornal Oficial da União Europeia do aviso de caducidade iminente de certas medidas antidumping (JO 2019, C 53, p. 3), entre as quais figurava o direito acima mencionado no n.o 8.

10      O pedido inicial alegou que existiam elementos de prova da continuação do dumping caso as medidas viessem a caducar com base numa comparação entre os preços de exportação e o valor normal calculado. A este respeito, a interveniente invocou a existência de uma situação especial do mercado na Rússia, devido a um acordo concertado de limitação dos preços e à estratégia do Governo russo de fixar preços artificialmente baixos para o gás natural, que constitui o principal fator de produção do nitrato de amónio.

11      Na sequência de um pedido da Comissão, a interveniente apresentou, em 20 de agosto de 2019, informações adicionais (a seguir «informações adicionais»), que foram integradas numa versão consolidada do pedido de reexame da caducidade das medidas (a seguir «pedido consolidado»). As informações adicionais assim adicionadas à procura consolidada basearam‑se num valor normal baseado nos preços reais no mercado interno russo.

12      Em 23 de setembro de 2019, a Comissão publicou o Aviso de início de um reexame da caducidade das medidas antidumping aplicáveis às importações de nitrato de amónio originário da Rússia (JO 2019, C 318, p. 6, a seguir «aviso de início»), considerando que existiam elementos de prova suficientes para dar início a um reexame da caducidade das medidas e para proceder a um inquérito.

13      No termo do inquérito, a Comissão concluiu que existia uma probabilidade de reincidência do dumping e do prejuízo, se as medidas antidumping em vigor sobre o nitrato de amónio originário da Rússia viessem a caducar. Assim, através da adoção do regulamento impugnado, decidiu prorrogar essas medidas por um período de cinco anos.

 Pedidos das partes

14      As recorrentes concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular o regulamento impugnado;

–        condenar a Comissão nas despesas.

15      A Comissão, apoiada pela interveniente, conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar as recorrentes nas despesas.

 Questão de direito

 Quanto à admissibilidade de prova suplementar

16      Na sequência do encerramento da fase escrita do processo, na audiência de 30 de novembro de 2022, as recorrentes juntaram prova adicional, que consiste num quadro fornecido pela Agência de Informação e Análise Chem‑courier, que indicava os preços médios mensais do nitrato de amónio da fábrica Acron Novgorod no ano de 2018 (a seguir «anexo G.1»).

17      Na audiência, a Comissão e a interveniente alegaram que essa prova devia ser julgada inadmissível. Alegaram que era intempestiva, na aceção do artigo 85.o, n.o 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, e que as recorrentes não tinham justificado o atraso na apresentação dessa nova prova.

18      O Tribunal recorda que a contraprova e a ampliação da prova oferecidas na sequência de uma contraprova da parte contrária não são abrangidas pela norma de preclusão do artigo 85.o, n.o 3, do Regulamento de Processo. Efetivamente, esta disposição diz respeito ao oferecimento de novas provas e deve ser interpretada à luz do artigo 92.o, n.o 7, que prevê expressamente que a contraprova e a ampliação das provas dependem da decisão do Tribunal (v., neste sentido, Acórdão de 17 de dezembro de 1998, Baustahlgewebe/Comissão, C‑185/95 P, EU:C:1998:608, n.os 71 e 72).

19      No caso, o quadro de preços médios mensais do nitrato de amónio da fábrica Acron Novgorod no ano de 2018, que figura no anexo G.1, não pode ser declarado inadmissível por ter sido apresentado na audiência, em violação do artigo 85.o, n.o 3, do Regulamento de Processo.

20      Este elemento de prova visa responder aos argumentos da Comissão contidos nos n.os 30 e 32 das suas respostas às questões escritas colocadas pelo Tribunal Geral a título de medidas de organização do processo, em 25 de julho de 2022.

21      Com efeito, através de medidas de organização do processo de 25 de julho de 2022, o Tribunal Geral pediu à Comissão que indicasse as razões pelas quais, no âmbito dos cálculos da margem de dumping que figuram no pedido consolidado, se justificava que a interveniente tivesse em conta pontos de partida e pontos de chegada diferentes, e, portanto, ajustamentos diferentes dos custos de transporte, a saber, a fábrica Novomoskovsk Eurochem para a comparação dos preços realmente praticados no mercado interno russo com os preços das exportações para a Estónia, para o resto da União Europeia e para o Brasil, e a fábrica Acron Novgorod para a comparação do valor normal calculado com os preços de exportação para a Estónia, para o resto da União e para o Brasil.

22      Na sua resposta à quinta questão escrita do Tribunal Geral, a Comissão indicou que não se podia razoavelmente esperar que a interveniente pudesse obter dados tanto sobre os custos como sobre os preços da mesma fábrica na Rússia, caso em que o mesmo ponto de partida poderia ter sido utilizado nos dois métodos. Após ter indicado que a fábrica Acron Novgorod estava relativamente mais próxima da fronteira com a Estónia do que a fábrica Novomoskovsk Eurochem, pelo que se confrontava com custos de transporte mais baixos, a Comissão acrescentou, nomeadamente, que os ajustamentos tinham sido efetuados com base em elementos de prova que estavam razoavelmente à disposição da interveniente.

23      Esta posição expressa pela Comissão não resulta do aviso de início de processo, do regulamento impugnado, da contestação, nem da tréplica, pelo que as recorrentes só tomaram conhecimento do mesmo com as respostas da Comissão às questões escritas colocadas pelo Tribunal Geral a título de medidas de organização do processo.

24      Ora, com a apresentação do anexo G.1, as recorrentes pretendem contradizer a Comissão e demonstrar que é errado afirmar que a interveniente não podia obter dados sobre os custos e sobre os preços da mesma fábrica na Rússia, incluindo da Acron Novgorod. Alegam que a Chem‑courier, considerada pela Comissão e pela interveniente como uma fonte especializada independente, estabelece essas listas de preços para cada fábrica de nitrato de amónio e, a esse título, apresentam o quadro dos preços médios mensais do nitrato de amónio da fábrica Acron Novgorod no ano de 2018.

25      Por conseguinte, o anexo G.1, apresentado pelas recorrentes na audiência, deve ser considerado contraprova, não sendo aplicável a regra de preclusão prevista no artigo 85.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, pelo que é admissível.

 Quanto ao mérito

26      Em apoio do seu recurso, as recorrentes invocam um único fundamento, relativo, em substância, à violação do artigo 11.o, n.os 2 e 5, do regulamento de base e do artigo 5.o, n.o 3, do mesmo regulamento, na medida em que a Comissão iniciou erradamente o processo de reexame da caducidade das medidas, apesar da falta de elementos de prova suficientes para o fazer.

27      Em primeiro lugar, segundo as recorrentes, a Comissão devia ter tido unicamente em conta o pedido inicial para fundamentar a sua apreciação do caráter suficiente dos elementos de prova apresentados para dar início ao reexame da caducidade das medidas e não das informações adicionais, que alteraram a substância do referido pedido. Devia igualmente ter examinado a exatidão e a adequação dos elementos de prova apresentados pela interveniente no pedido inicial. Em segundo lugar, alegam que o pedido inicial não continha elementos de prova suficientes da probabilidade de continuação do dumping em caso de caducidade das medidas. Em terceiro lugar, sustentam que, em todo o caso, a Comissão considerou erradamente que o pedido consolidado continha elementos de prova suficientes dessa probabilidade.

28      O Tribunal Geral considera oportuno começar por examinar a argumentação das recorrentes relativa ao caráter suficiente dos elementos de prova contidos no pedido inicial à luz dos critérios jurídicos aplicáveis aos pedidos de reexame da caducidade das medidas apresentados por produtores da União ou em seu nome, com fundamento no artigo 11.o, n.o 2, do regulamento de base.

 Observações preliminares sobre a fiscalização do Tribunal Geral e os princípios que regem a interpretação do regulamento de base

29      No domínio da política comercial comum, particularmente em matéria de medidas de defesa comercial, resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que as instituições da União dispõem de um amplo poder de apreciação em razão da complexidade das situações económicas e políticas que devem examinar, pelo que a fiscalização jurisdicional desse amplo poder de apreciação deve ser limitada à verificação da observância das regras processuais, da exatidão material dos factos tidos em conta, da inexistência de erro manifesto de apreciação desses factos ou da inexistência de desvio de poder (v., neste sentido, Acórdãos de 20 de janeiro de 2022, Comissão/Hubei Xinyegang Special Tube, C‑891/19 P, EU:C:2022:38, n.os 35 e 36 e jurisprudência referida).

30      Neste contexto, a fiscalização do Tribunal Geral quanto às provas em que as instituições da União baseiam as suas constatações não constitui uma nova apreciação dos factos que substitua a dessas instituições. Essa fiscalização não prejudica o amplo poder de apreciação dessas instituições no domínio da política comercial, limitando‑se a verificar se essas provas são suscetíveis de sustentar as conclusões a que elas chegaram. Cabe, portanto, ao Tribunal Geral não só verificar a exatidão material das provas invocadas, a sua fiabilidade e a sua coerência, mas também fiscalizar se essas provas constituem todos os dados relevantes a ter em conta para apreciar uma situação complexa e se são suscetíveis de servir de base às conclusões delas extraídas [v. Acórdãos de 14 de dezembro de 2017, EBMA/Giant (China), C‑61/16 P, EU:C:2017:968, n.o 69 e jurisprudência referida, e de 20 de janeiro de 2022, Comissão/Hubei Xinyegang Special Tube, C‑891/19 P, EU:C:2022:38, n.o 37 e jurisprudência referida].

31      Em contrapartida, no que respeita às questões de direito, o Tribunal Geral exerce uma fiscalização integral, o que inclui a interpretação a fazer de disposições jurídicas com base em elementos objetivos e a verificação de que estão ou não reunidas as condições de aplicação dessa disposição (v., neste sentido, Acórdãos de 11 de julho de 1985, Remia e o./Comissão, 42/84, EU:C:1985:327, n.o 34, e de 9 de novembro de 2022, Cambodge e CRF/Comissão, T‑246/19, EU:T:2022:694, n.o 45).

32      A esse respeito, é certo que o primado dos acordos internacionais celebrados pela União sobre textos de direito derivado da União exige que estes últimos sejam interpretados, na medida do possível, em conformidade com esses acordos (v. Acórdãos de 20 de janeiro de 2022, Comissão/Hubei Xinyegang Special Tube, C‑891/19 P, EU:C:2022:38, n.o 31 e jurisprudência referida), e de 12 de maio de 2022, Comissão/Hansol Paper, C‑260/20 P, EU:C:2022:370, n.o 82 e jurisprudência referida).

33      Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, no caso de a União ter decidido dar execução a uma obrigação particular assumida no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC) ou no caso de o ato da União remeter expressamente para disposições precisas dos acordos da OMC, compete ao juiz da União fiscalizar a legalidade do ato da União em causa à luz das regras da OMC (Acórdãos de 23 de novembro de 1999, Portugal/Conselho, C‑149/96, EU:C:1999:574, n.o 49; de 9 de janeiro de 2003, Petrotub e Republica/Conselho, C‑76/00 P, EU:C:2003:4, n.o 54, e de 27 de setembro de 2007, Ikea Wholesale, C‑351/04, EU:C:2007:547, n.o 30), o que implica ter em conta a interpretação das diferentes disposições desse acordo que o Órgão de Resolução de Litígios da OMC adotou (v., neste sentido, Acórdãos de 20 de janeiro de 2022, Comissão/Hubei Xinyegang Special Tube, C‑891/19 P, EU:C:2022:38, n.os 32 e 33 e jurisprudência referida, e de 28 de abril de 2022, Yieh United Steel/Comissão, C‑79/20 P, EU:C:2022:305, n.o 102 e jurisprudência referida).

34      Resulta assim dos seus considerandos 2 e 3 que o regulamento de base tem nomeadamente por objeto transpor para o direito da União, na medida do possível, as regras do Acordo sobre a aplicação do artigo VI do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio de 1994 (JO 1994, L 336, p. 103, a seguir «acordo antidumping»), entre as quais figuram, especialmente, as relativas à duração e ao reexame das medidas antidumping, a fim de assegurar uma aplicação correta e transparente das referidas regras. O considerando 4 do regulamento de base acrescenta que, para manter o equilíbrio entre os direitos e as obrigações que o Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio (GATT) de 1994 estabeleceu, é essencial que a União tenha em conta a interpretação dessas regras pelos seus principais parceiros comerciais.

35      Mais especificamente, através do artigo 11.o, n.o 2, do regulamento de base, a União tencionava tornar efetivas as obrigações específicas previstas no artigo 11.o, n.o 3, do Acordo Antidumping (v. Acórdão de 24 de setembro de 2008, Reliance Industries/Conselho e Comissão, T‑45/06, EU:T:2008:398, n.o 90 e jurisprudência referida).

36      Por sua vez, o artigo 5.o do regulamento de base constitui, em substância, a transposição para o direito da União dos artigos 5.1 a 5.9. e do artigo 6.1.3. do acordo antidumping, à luz dos quais deve ser interpretado na medida do possível, bem como da interpretação que dele foi feita pelo Órgão de Resolução de Litígios da OMC (v., neste sentido, Acórdãos de 11 de julho de 2017, Viraj Profiles/Conselho, T‑67/14, não publicado, EU:T:2017:481, n.o 90, e de 15 de dezembro de 2016, Gul Ahmed Textile Mills/Conselho, T‑199/04 RENV, não publicado, EU:T:2016:740, n.o 90).

37      É à luz destes princípios que se deve verificar se a Comissão deu início ao reexame em conformidade com os critérios jurídicos aplicáveis aos pedidos de reexame da caducidade das medidas apresentados por produtores da União ou em seu nome, com base no artigo 11.o, n.o 2, do regulamento de base.

 Quanto ao caráter suficiente dos elementos de prova contidos no pedido inicial à luz dos critérios jurídicos aplicáveis aos pedidos de reexame da caducidade das medidas

38      Segundo as recorrentes, nos termos do artigo 11.o, n.o 2, quarto parágrafo, do regulamento de base, conjugado com o segundo parágrafo do mesmo artigo, a suficiência dos elementos de prova que permitam estabelecer que a caducidade das medidas poderia conduzir a uma continuação ou reincidência do dumping e do prejuízo deve ser apreciada com base nos elementos de prova constantes do pedido de reexame apresentado «o mais tardar três meses antes do final do período de cinco anos» no termo do qual as medidas antidumping caducam (a seguir «prazo legal»).

39      Uma versão consolidada do pedido de reexame da caducidade das medidas apresentado após o prazo legal e nos três meses anteriores ao final do período de cinco anos não constituiria uma base válida, uma vez que nenhuma disposição do regulamento de base permite apresentar novos elementos de prova após o prazo legal, a fim de colmatar ou corrigir a falta de elementos de prova suficientes no momento da apresentação do pedido de reexame dentro desse prazo.

40      A decisão de dar início a um reexame da caducidade das medidas não pode, portanto, ser justificada por novos argumentos ou elementos de prova que não existiam no momento da apresentação do pedido de reexame dentro do prazo legal. Só os esclarecimentos e clarificações que permitam compreender ou corrigir os elementos de prova já apresentados dentro desse prazo, ou confirmar o seu caráter suficiente, poderão ser pedidos ou apresentados nos três meses anteriores ao final do período de cinco anos.

41      Segundo as recorrentes, importa, a este respeito, distinguir a abertura de um inquérito inicial, regido designadamente pelo artigo 5.o, n.o 9, do regulamento de base, que não está subordinada a nenhum prazo dentro do qual deve ser apresentada uma denúncia que contenha elementos de prova suficientes, e a abertura de um reexame da caducidade das medidas, com base no artigo 11.o, n.o 2, do referido regulamento, que exige que um pedido de reexame que contenha elementos de prova suficientes seja apresentado no prazo legal. A aplicação do artigo 5.o, n.o 9, do referido regulamento aos processos de reexame da caducidade das medidas estaria, além disso, excluída pelo artigo 11.o, n.o 5, do mesmo regulamento.

42      As recorrentes acrescentam que, por força do artigo 11.o, n.o 5, do regulamento de base, o artigo 5.o, n.o 3, do referido regulamento é aplicável aos reexames da caducidade das medidas, pelo que a Comissão tem a obrigação de examinar a exatidão e a adequação dos elementos de prova constantes do pedido inicial.

43      Em contrapartida, as recorrentes alegam igualmente que resulta da jurisprudência da OMC que a Comissão não pode invocar o critério da abertura de um inquérito inicial enunciado no artigo 5.3. do acordo antidumping para ter em conta informações adicionais apresentadas fora do prazo legal, uma vez que este não é aplicável a um reexame da caducidade das medidas.

44      Tal interpretação do artigo 11.o, n.o 2, do regulamento de base é confirmada pela decisão do Provedor de Justiça Europeu de 17 de março de 2016 que encerra o inquérito sobre a queixa 577/2014/MDC relativa à recusa da Comissão de conceder acesso, em conformidade com o Regulamento n.o 1225/2009, a um pedido de reexame da caducidade das medidas antidumping aplicáveis às importações de nitrato de amónio originário da Rússia (a seguir «decisão do Provedor de Justiça sobre a queixa 577/2014/MDC»).

45      Ora, no caso presente, só o pedido inicial foi apresentado no prazo legal e os únicos elementos de prova relativos a uma probabilidade de continuação do dumping em caso de caducidade das medidas apresentados no referido pedido diziam respeito aos cálculos da margem de dumping baseados num valor normal calculado.

46      Em contrapartida, as informações adicionais, apresentadas em 20 de agosto de 2019, ou seja, cerca de dois meses após o termo do prazo legal, contidas no pedido consolidado, estabelecem uma margem de dumping baseada em preços internos reais na Rússia. Trata‑se, portanto, de novos elementos de prova, regidos por disposições jurídicas distintas e baseados numa metodologia de cálculo diferente, que alteraram a substância dos elementos de prova contidos no pedido inicial, pelo que a Comissão não os podia ter em conta.

47      A falta de elementos de prova suficientes no pedido inicial resulta, por outro lado, do considerando 23 do regulamento impugnado, que indica, em substância, que, sem os esclarecimentos apresentados pela interveniente fora do prazo legal, não teria havido elementos de prova suficientes que permitissem justificar a abertura do reexame da caducidade das medidas.

48      Entendem, portanto, que a Comissão cometeu um erro de direito e um erro manifesto de apreciação, ao indicar, como resulta nomeadamente do considerando 20 do regulamento impugnado, que era irrelevante que o pedido inicial tivesse sido completado por valores normais estimados a partir de informações disponíveis sobre os preços internos reais na Rússia, e ao decidir dar início ao reexame da caducidade das medidas «com base no pedido de reexame consolidado», uma vez que este continha elementos de prova novos, apresentados fora do prazo legal. Assim, violou o artigo 11.o, n.o 2, do regulamento de base ao decidir dar início ao referido processo de reexame apesar da falta de elementos de prova suficientes de uma probabilidade de continuação do dumping.

49      A Comissão alega que nenhuma disposição do regulamento de base limita a sua análise às informações constantes do pedido de reexame conforme apresentado dentro do prazo legal. A condição da suficiência dos elementos de prova só tem que estar preenchida no momento em que é tomada a decisão de dar início ao reexame da caducidade das medidas. Além disso, não é necessário que já tenha sido feita a prova da continuação do dumping.

50      O processo estabelecido pelo artigo 11.o, n.o 2, do regulamento de base é um processo dinâmico. Se for caso disso, uma versão consolidada do pedido de reexame apresentado nos três meses anteriores ao final do período de cinco anos, findo o qual as medidas antidumping caducam, poderá vir completar ou clarificar o pedido de reexame apresentado dentro do prazo legal com informações adicionais e esclarecimentos apresentados pelos produtores da União por sua própria iniciativa ou na sequência de contactos com a Comissão. Esta versão consolidada não pode substituir o pedido de reexame apresentado dentro do prazo legal, nem alterar a sua substância, e não pode constituir uma nova apresentação.

51      A este respeito, os n.os 3 e 9 do artigo 5.o do regulamento de base, que regulam o início do processo de inquérito antidumping inicial, são, por força do artigo 11.o, n.o 5, do referido regulamento, aplicáveis à abertura dos reexames por caducidade das medidas e confirmam a interpretação no sentido de que é no momento em que a Comissão toma a decisão de dar início a tais reexames que deve justificar a existência de elementos de prova suficientes de que a caducidade das medidas poderia conduzir à continuação ou à reincidência do dumping prejudicial, e que pode recolher informações adicionais para esse efeito.

52      Em contrapartida, embora a verificação da exatidão e da adequação dos elementos de prova contidos num pedido de reexame, na aceção do artigo 5.o, n.o 3, do regulamento de base, seja um meio de determinar o seu caráter suficiente, o critério jurídico a aplicar, quando se trata decidir da oportunidade de abrir um inquérito de reexame, está unicamente abrangido pelo «caráter suficiente» dos elementos de prova no momento do início do referido reexame, e não pela sua adequação e exatidão.

53      Segundo a Comissão, qualquer interpretação diferente limita a sua possibilidade de examinar o caráter suficiente dos elementos de prova, o que é confirmado pela decisão do Provedor de Justiça sobre a queixa 577/2014/MDC, referida pelas recorrentes.

54      A Comissão acrescenta, nas suas observações escritas, que as diferenças entre as disposições aplicáveis aos inquéritos iniciais e as aplicáveis aos reexames da caducidade das medidas, incluindo os prazos, não pressupõem que, no contexto dos referidos reexames, a falta de elementos de prova suficientes no pedido inicial não possa ser retificada através de pedidos subsequentes da Comissão.

55      No caso, o pedido inicial não foi examinado isoladamente, mas sim em conjunto com as informações adicionais apresentadas ao longo dos três meses anteriores ao fim do período de cinco anos e que figuram no pedido consolidado.

56      Os cálculos da margem de dumping realizados com base nos preços reais no mercado interno russo, que figuram no pedido consolidado, confirmaram e completaram os elementos essenciais de prova relativos a uma comparação entre o valor normal calculado e os preços de exportação constantes do pedido inicial, sem alterar o mérito das alegações nele contidas.

57      As recorrentes fazem, além disso, uma leitura errada do considerando 23 do regulamento impugnado, que dispõe claramente que o reexame foi iniciado com fundamento tanto no pedido inicial como em informações adicionais e não aborda a questão de saber se as informações fornecidas no pedido inicial eram suficientes para dar início ao reexame da caducidade das medidas.

58      A Comissão não cometeu, portanto, nenhum erro ao basear‑se, no momento de tomar a decisão de dar início ao reexame da caducidade das medidas, no pedido consolidado para considerar que dispunha de elementos de prova suficientes a esse respeito.

59      A interveniente remete, no essencial, para os argumentos da Comissão.

60      Para efeitos do presente processo, o Tribunal Geral examinará as alegações das recorrentes relativas, em primeiro lugar, à violação dos critérios jurídicos aplicáveis ao conteúdo de um pedido de reexame por caducidade das medidas apresentado dentro do prazo legal e, em segundo lugar, ao caráter suficiente dos elementos de prova no pedido inicial e à natureza das informações adicionais.

–       Quanto aos critérios jurídicos aplicáveis ao conteúdo de um pedido de reexame

61      Nos termos do artigo 11.o, n.o 1, do regulamento de base, um direito antidumping só é aplicável durante o tempo e na medida do necessário para neutralizar o dumping que causa prejuízo.

62      O artigo 11.o, n.o 2, primeiro parágrafo, do regulamento de base dispõe que uma medida antidumping definitiva caducará cinco anos após a sua criação ou cinco anos a contar da data da conclusão do reexame mais recente que tenha abrangido simultaneamente o dumping e o prejuízo, a menos que se determine num reexame que a caducidade da medida poderia conduzir a uma continuação ou reincidência do dumping e do prejuízo. Um reexame da caducidade das medidas tem lugar por iniciativa da Comissão ou a pedido dos produtores da União, ou em seu nome, mantendo‑se a medida em vigor até serem conhecidos os resultados desse reexame.

63      O artigo 11.o, n.o 2, segundo parágrafo, do regulamento de base precisa, nomeadamente, que será iniciado um reexame da caducidade das medidas sempre que o pedido contenha elementos de prova suficientes de que a caducidade das medidas poderia dar origem a uma continuação ou reincidência do dumping e do prejuízo. Por força do quarto parágrafo do referido artigo, os produtores da União têm o direito, o mais tardar três meses antes do final do período de cinco anos, de apresentar um pedido de reexame nos termos do disposto no segundo parágrafo.

64      Como resulta da jurisprudência acima referida no n.o 31, o Tribunal Geral exerce uma fiscalização integral quanto à interpretação a fazer das disposições contidas nos segundo e quarto parágrafos do artigo 11.o, n.o 2, do regulamento de base e quanto à verificação de que estão reunidos os pressupostos da sua aplicação.

65      Em primeiro lugar, resulta de uma leitura literal do artigo 11.o, n.o 2, do regulamento de base que o pedido de reexame que deve ser apresentado por produtores da União ou em seu nome, o mais tardar três meses antes do final do período de cinco anos no termo do qual as medidas antidumping caducam, deve já conter elementos de prova suficientes de que a caducidade das medidas poderia conduzir a uma continuação ou reincidência do dumping e do prejuízo.

66      Com efeito, o quarto parágrafo do artigo 11.o, n.o 2, do regulamento de base, que estabelece o prazo legal em que os produtores da União ou em seu nome devem apresentar o pedido de reexame, remete expressamente para o segundo parágrafo, que precisa as condições relativas ao conteúdo do referido pedido que permitem proceder a um reexame.

67      Uma vez que resulta da redação do artigo 11.o, n.o 2, quarto parágrafo, do regulamento de base que um pedido de reexame apresentado pelos produtores da União ou em seu nome o mais tardar três meses antes do final do período de cinco anos deve estar em conformidade com o segundo parágrafo, deve, portanto, até essa data, conter elementos de prova suficientes de que a caducidade das medidas poderia conduzir a uma continuação ou reincidência do dumping e do prejuízo, a fim de justificar o início do reexame.

68      Tal interpretação do artigo 11.o, n.o 2, segundo e quarto parágrafos, do regulamento de base foi igualmente adotada pelo Provedor de Justiça na sua decisão sobre a queixa 577/2014/MDC, que tinha por objeto o direito de acesso de uma parte interessada à versão inicial de um pedido de reexame apresentado dentro do prazo legal, como acertadamente alegam as recorrentes. Nessa decisão, o Provedor de Justiça referiu acertadamente que a apresentação, no prazo legal, de um pedido que continha elementos de prova suficientes de que a caducidade das medidas poderia dar origem a uma continuação ou reincidência do dumping e do prejuízo eram as duas condições cumulativas que permitiam proceder a um reexame da caducidade das medidas. O acesso à versão de um pedido de reexame apresentado no prazo legal permite, assim, às partes interessadas verificar se, nessa fase do procedimento, estavam preenchidos os requisitos previstos nesse artigo.

69      O objetivo visado pelo artigo 11.o, n.o 2, segundo e quarto parágrafos, do regulamento de base, de garantir que os elementos de prova apresentados à Comissão no prazo legal são suficientes para demonstrar a probabilidade de continuação ou reincidência do dumping e do prejuízo, caso as medidas venham a caducar, não pode ser alcançado se estas disposições forem interpretadas no sentido de que os produtores da União dispõem de três meses suplementares, após o termo do prazo legal, para preencher essa condição.

70      A instituição do prazo de três meses que antecede o termo do período de cinco anos no termo do qual as medidas antidumping caducam contribui, assim, para garantir a segurança das situações jurídicas, permitindo aos operadores no mercado saber, em tempo útil, se as medidas antidumping são suscetíveis de ser mantidas, o que a Comissão confirmou na audiência, bem como a esta última dispor de um prazo útil para avaliar os elementos de prova contidos num pedido de reexame apresentado no prazo legal pelos produtores da União ou em seu nome e assegurar‑se do seu caráter suficiente e pertinente, a fim de evitar que uma medida antidumping não seja indevidamente mantida além do tempo previsto.

71      Em segundo lugar, como concordam as partes, os produtores da União têm a possibilidade, após o prazo legal e durante o prazo de três meses anterior ao final do período de cinco anos, de apresentar informações adicionais com fundamento no artigo 11.o, n.o 2, do regulamento de base. Importa igualmente considerar, como reconhecem as partes, que tais elementos de prova não podem constituir novos argumentos nem substituir o pedido de reexame apresentado dentro do prazo legal ou suprir o caráter insuficiente dos elementos de prova nele contidos. Com efeito, embora, na tréplica, a Comissão tenha sustentado que as diferenças entre as disposições aplicáveis aos inquéritos iniciais e as aplicáveis aos reexames da caducidade das medidas não pressupõem que, no contexto dos referidos reexames, a falta de elementos de prova suficientes no pedido inicial não possa ser retificada através de pedidos posteriores da Comissão, no entanto, retirou essa alegação na audiência.

72      Como resulta do acima exposto no n.o 70, o prazo de três meses anterior à caducidade das medidas antidumping permite à Comissão avaliar os elementos de prova contidos no pedido de reexame, conforme foi apresentado no prazo legal, e verificar o seu caráter suficiente e pertinente, antes de decidir se deve ou não dar início ao reexame. Para o efeito, é‑lhe permitido receber ou pedir esclarecimentos adicionais durante os três meses anteriores ao final do período de cinco anos, conduzindo a uma versão consolidada do pedido.

73      Embora a Comissão possa ter em conta as informações adicionais assim apresentadas por um produtor da União para justificar o início de um reexame na sequência de um pedido de reexame apresentado por produtores da União ou em seu nome, essas informações só podem complementar ou corroborar elementos de prova suficientes apresentados dentro do prazo legal. Em contrapartida, não podem constituir novos argumentos ou elementos de prova nem sanar o caráter insuficiente dos elementos de prova neles contidos, o qual deve ser avaliado em relação aos elementos de prova transmitidos no prazo legal.

74      Assim, e como a Comissão admitiu na audiência, a falta de elementos de prova suficientes apresentados no prazo legal pelos produtores da União não pode ser retificada oficiosamente pela Comissão no âmbito de um processo complementar de informação junto dos referidos produtores durante o período de três meses anterior ao final do período de cinco anos.

75      Por conseguinte, a questão determinante diz respeito tanto às informações utilizadas pela Comissão no início de um inquérito de reexame com base num pedido apresentado pelos produtores da União ou em seu nome como ao momento em que a Comissão recebeu essas informações e à medida em que as informações recebidas no prazo legal constituem elementos de prova suficientes de que a caducidade das medidas poderia conduzir à continuação ou à reincidência do dumping e do prejuízo.

76      Por conseguinte, foi erradamente que a Comissão considerou que os três meses diretamente anteriores ao fim do período de cinco anos estavam incluídos no prazo dentro do qual podia ser apresentado um pedido de reexame que contivesse elementos de prova suficientes e que a condição relativa ao caráter suficiente dos elementos de prova só tinha que estar preenchida no momento em que foi tomada a decisão de dar início ao reexame da caducidade das medidas.

77      Tal interpretação contrária esvaziaria de sentido o artigo 11.o, n.o 2, do regulamento de base ao deixar sem objeto a obrigação jurídica aí prevista e colidiria com a finalidade do processo de reexame, que consiste em exigir que o pedido apresentado por produtores da União ou em seu nome, o mais tardar três meses antes do termo do período de cinco anos, cumpra a exigência de prova exigida, prevista no segundo parágrafo dessa disposição, por força da qual deve conter elementos de prova suficientes da probabilidade de continuação ou de reincidência do dumping e do prejuízo em caso de caducidade das medidas.

78      A remissão que a Comissão faz para o artigo 11.o, n.o 5, do regulamento de base não é suscetível de pôr em causa esta conclusão.

79      Com efeito, o artigo 11.o, n.o 5, primeiro parágrafo, do regulamento de base prevê que as disposições relevantes do referido regulamento relativas aos processos e à condução dos inquéritos, com exceção das que dizem respeito aos prazos, se aplicam a qualquer reexame, nomeadamente realizado nos termos do n.o 2 do mesmo artigo.

80      Embora este artigo não remeta expressamente para as disposições relevantes aqui em causa, já foi decidido que o artigo 11.o, n.o 5, do regulamento de base não alargava aos processos de reexame todas as disposições relativas aos procedimentos e à condução dos inquéritos aplicáveis no âmbito do inquérito inicial. O artigo 11.o, n.o 5, do referido regulamento condiciona a aplicação destas disposições aos procedimentos de reapreciação ao seu caráter pertinente (Acórdão de 11 de setembro de 2018, Foshan Lihua Ceramic/Comissão, T‑654/16, EU:T:2018:525, n.o 37).

81      Assim, o processo de reexame distingue‑se do processo de inquérito inicial, que se rege por outras disposições do regulamento de base. Foi por isso que o Tribunal de Justiça já considerou que certas disposições que regulam o inquérito inicial não são aplicáveis ao procedimento de reexame, atendendo à sistemática geral e aos objetivos do sistema instituído pelo regulamento de base (v., neste sentido, Acórdão de 11 de fevereiro de 2010, Hoesch Metals and Alloys, C‑373/08, EU:C:2010:68, n.o 77).

82      Por um lado, o Tribunal Geral lembra que o artigo 5.o, n.o 9, do regulamento de base prevê que, quando se verificar que existem elementos de prova suficientes para justificar o início de um processo, a Comissão dá início a esse processo no prazo de 45 dias a contar da data de apresentação da denúncia e anuncia o seu início no Jornal Oficial da União Europeia. Quando tiverem sido apresentados elementos de prova insuficientes, o denunciante será disso informado no prazo de 45 dias contados da data da denúncia à Comissão. A Comissão fornecerá aos Estados‑Membros informações sobre o seu exame da denúncia normalmente no prazo de 21 dias a contar da data de apresentação da denúncia à Comissão.

83      A expressão «[s]e se afigurar que existem elementos de prova suficientes para justificar o início de um processo», com a qual se inicia o artigo 5.o, n.o 9, do regulamento de base, não pode ser lida independentemente do resto desta disposição, de cuja redação resulta claramente que tem por objetivo precisar os prazos dentro dos quais a Comissão deve dar início ao processo de inquérito inicial a contar da data da apresentação de uma denúncia, prevenir o autor da denúncia da ausência de inquérito ou fornecer aos Estados‑Membros informações relativas ao exame da denúncia.

84      Ora, resulta expressamente da redação do artigo 11.o, n.o 5, primeiro parágrafo, do regulamento de base que as outras disposições do referido regulamento que dizem respeito aos prazos não são aplicáveis aos reexames da caducidade das medidas.

85      Por conseguinte, sendo o artigo 5.o, n.o 9, do regulamento de base uma disposição que diz respeito aos prazos relativos aos inquéritos antidumping iniciais, não se pode aplicar aos processos de reexame da caducidade das medidas, em conformidade com o artigo 11.o, n.o 5, do referido regulamento, como sustentam com razão as recorrentes.

86      Por outro lado, nos termos do artigo 5.o, n.o 3, do regulamento de base, «[a] Comissão examina, na medida do possível, a exatidão e a pertinência dos elementos de prova apresentados na denúncia para determinar se existem ou não elementos de prova suficientes que justifiquem o início de um inquérito».

87      A este respeito, o Tribunal Geral refere que o artigo 5.o, n.o 3, do regulamento de base visa apenas o exame, pela Comissão, da exatidão e da adequação dos elementos de prova contidos numa denúncia a fim de determinar se existem elementos de prova suficientes para justificar a abertura de um inquérito inicial, e não pode justificar a abertura oficiosa de um processo de informação complementar quando os elementos de prova apresentados no prazo legal previsto para os pedidos de reexame da caducidade das medidas apresentados por produtores da União ou em seu nome não são suficientes para demonstrar que a caducidade das medidas poderia conduzir a uma continuação ou reincidência do dumping e do prejuízo.

88      É verdade que, como alega acertadamente a Comissão, o Tribunal de Justiça já teve a ocasião de indicar que a abertura de um inquérito, quer no início de um processo antidumping quer no âmbito do reexame de um regulamento que institui direitos antidumping, está sempre sujeita à existência de elementos de prova suficientes da existência de dumping e do prejuízo que daí resulta (Acórdão de 7 de dezembro de 1993, Rima Eletrometalurgia/Conselho, C‑216/91, EU:C:1993:912, n.o 16).

89      No entanto, esta jurisprudência foi desenvolvida com base no Regulamento (CEE) n.o 2423/88 do Conselho de 11 de julho de 1988 relativo à defesa contra as importações que são objeto de dumping ou de subvenções por parte de países não membros da Comunidade Económica Europeia (JO 1988, L 209, p. 1), no qual a disposição relativa à abertura de um reexame remetia expressamente para o artigo relativo à abertura de um inquérito inicial.

90      Do mesmo modo, o artigo 14.o, n.o 2, do regulamento de base, que é inteiramente dedicado ao processo de reexame, remete, no que toca ao regime do inquérito, para o artigo 7.o do referido regulamento, aplicável no âmbito de um processo inicial. Através desta remissão expressa, o legislador comunitário tinha expressado que deviam ser seguidas as mesmas regras em matéria de inquérito «inicial» ou «de reexame» (Conclusões do advogado‑geral P. Léger no processo Comissão/NTN e Koyo Seiko, C‑245/95 P, EU:C:1997:400, n.o 81).

91      Ora, o Regulamento n.o 2423/88 foi substituído pelo Regulamento (CE) n.o 3283/94 do Conselho, de 22 de dezembro de 1994, relativo à defesa contra as importações objeto de dumping de países não membros da Comunidade Europeia (JO 1994, L 349, p. 1), no qual a formulação das disposições em causa mudou, para ser seguidamente mantida na fase atual até à versão atual dos artigos 5.o e 11.o do regulamento de base, que já não contêm essa remissão expressa.

92      Nada no artigo 5.o, n.o 3, do regulamento de base indica que os critérios de prova nele enunciados se aplicam a outros processos além do início de inquéritos antidumping iniciais nem que os critérios neles estabelecidos também podem ser aplicáveis aos inquéritos de reexame da caducidade das medidas na sequência de um pedido de reexame apresentado por produtores da União ou em seu nome.

93      A Comissão faz igualmente uma interpretação errada dos relatórios dos órgãos da OMC que interpretam o artigo 5.3. do acordo antidumping, cuja redação coincide com a do artigo 5.o, n.o 3, do regulamento de base, quando sustenta que daí resulta que o caráter suficiente dos elementos de prova deve ser apreciado no momento em que se pronuncia sobre a oportunidade de abrir um inquérito de reexame da caducidade das medidas e que pode ter em conta informações adicionais apresentadas fora do prazo legal para esse efeito.

94      Com efeito, a análise efetuada no relatório do grupo especial intitulado «Paquistão — Medidas antidumping relativas às películas de polipropileno orientado biaxialmente provenientes dos Emirados Árabes Unidos», adotado em 18 de janeiro de 2021 (WT/DS 538/R, n.o 7.30), incidia sobre a interpretação a fazer do artigo 5.3. do acordo antidumping relativo à abertura de um inquérito antidumping inicial com base numa denúncia. Quanto à análise efetuada no relatório do grupo especial intitulado «Estados Unidos — Reexame da caducidade relativa ao aço tratado contra a corrosão», adotado em 14 de agosto de 2003 (WT/DS 244/R, n.os 7.27 a 7.39 e 7.45), incidia sobre os critérios em matéria de prova enunciados nos artigos 5.6. e 11.2. do acordo antidumping, relativos, respetivamente, à abertura de um inquérito antidumping inicial por iniciativa das autoridades, sem terem recebido um pedido apresentado por escrito para esse efeito por um ramo de produção nacional ou em seu nome, e ao reexame das medidas antidumping por iniciativa das autoridades ou a pedido de qualquer parte interessada. Ora, estas questões não são objeto do presente litígio, pelo que os argumentos da Comissão e da interveniente a este respeito são inoperantes.

95      Por outro lado, no relatório do grupo especial intitulado «União Europeia — Métodos de ajustamento dos custos II (Rússia)», adotado em 24 de julho de 2020 (WT/DS 494/R, n.os 7.332 e 7.333), foi expressamente indicado que, no artigo 11.3. do acordo antidumping, a inexistência de qualquer remissão para o artigo 5.3. do referido acordo devia ser entendida no sentido de que implicava que o critério para a abertura de um reexame da caducidade das medidas seria diferente do critério exigido para a abertura de um inquérito inicial, e que o critério enunciado no artigo 5.3. do referido acordo não se aplicaria a um reexame da caducidade das medidas.

96      É certo que, quanto ao relatório do grupo especial WT/DS 494/R, a Comissão indicou ter interposto recurso em 28 de agosto de 2020, seguida da Federação da Rússia, que interpôs recurso em 2 de setembro de 2020. Uma vez que, atualmente, o órgão de recurso não está em condições de examinar esses recursos, por permanecerem vagos os lugares, a Comissão alegou na audiência que este relatório não tem valor enquanto precedente e que este diferendo não pode, num futuro próximo, encontrar solução jurídica.

97      A este respeito, na audiência, a interveniente sustentou que não era desejável que o juiz da União transpusesse, enquanto tal, um excerto de uma decisão de um órgão da OMC e o impusesse como uma interpretação do direito da União, nomeadamente quando as disposições tinham uma formulação e uma finalidade diferentes.

98      No entanto, na falta de uma interpretação das disposições do acordo antidumping pelo órgão de recurso, na qual o juiz da União poderia, sendo caso disso, inspirar‑se para a interpretação de disposições cuja redação coincide no direito da União, a autoridade de uma decisão de um grupo especial objeto de recurso «no vazio» para o órgão de recurso só pode, em todo o caso, basear‑se na força probatória do raciocínio subjacente à interpretação destas disposições pelos órgãos de resolução de litígios da OMC.

99      Ora, contrariamente ao que alega a Comissão, não é possível dar início a um «processo dinâmico» que consista em pedir os novos esclarecimentos necessários aos produtores da União para preencher a condição relativa à exigência de provas de um «caráter suficiente» no momento do início do reexame da caducidade das medidas.

100    Com efeito, as disposições do direito da União que correspondem às disposições pertinentes do acordo antidumping, a saber, os n.os 3 e 9 do artigo 5.o do regulamento de base, não são aplicáveis aos reexames da caducidade das medidas na sequência de um pedido de reexame apresentado por produtores da União ou em seu nome, com base no artigo 11.o, n.o 2, do referido regulamento. A sistemática geral e os objetivos do sistema instituído pelo referido regulamento opõem‑se a que a Comissão se baseie no artigo 11.o, n.o 5, do referido regulamento para atenuar a obrigação de assegurar que esse pedido de reexame apresentado no prazo legal contenha elementos de prova suficientes de que a caducidade das medidas poderia conduzir a uma continuação ou reincidência do dumping e do prejuízo.

101    O Tribunal observa que a diferença objetiva entre um procedimento de reexame e um processo de inquérito inicial reside no facto de as importações sujeitas a um procedimento de reexame serem aquelas que já foram objeto da criação de medidas antidumping definitivas e em relação às quais, em princípio, foram apresentados nesse procedimento elementos de prova suficientes para demonstrar que a caducidade destas medidas poderia conduzir a uma continuação ou reincidência do dumping e do prejuízo. Em contrapartida, quando as importações estão sujeitas a um inquérito inicial, o objeto deste é precisamente determinar a existência, a amplitude e os efeitos de uma alegada prática de dumping [Acórdãos de 27 de janeiro de 2005, Europe Chemi‑Con (Deutschland)/Conselho, C‑422/02 P, EU:C:2005:56, n.o 50, e de 28 de abril de 2015, CHEMK e KF/Conselho, T‑169/12, EU:T:2015:231, n.o 60].

102    Assim, num inquérito de reexame da caducidade das medidas na sequência de um pedido de reexame apresentado por produtores da União ou em seu nome, se os elementos de prova apresentados no prazo legal forem insuficientes para demonstrar a probabilidade de que a caducidade das medidas poderia conduzir a uma continuação ou reincidência do dumping e do prejuízo, a medida antidumping existente caduca automaticamente. Em contrapartida, se tais elementos forem suficientes e a Comissão iniciar o referido reexame, os direitos antidumping são automaticamente mantidos durante o período de inquérito.

103    Resulta do exposto que está preenchido o requisito do caráter suficiente dos elementos de prova contidos num pedido de reexame apresentado por produtores da União ou em seu nome, na aceção do artigo 11.o, n.o 2, segundo parágrafo, do regulamento de base, sempre que tais elementos sejam apresentados o mais tardar três meses antes do final do período de cinco anos, em conformidade com o quarto parágrafo dessa disposição.

104    Por conseguinte, a Comissão cometeu um erro de direito quando afirmou, no considerando 20 do regulamento impugnado, que era irrelevante que o pedido inicial tivesse sido completado por informações adicionais e que o início do reexame podia ser justificado com base no pedido consolidado.

–       Quanto ao caráter suficiente dos elementos de prova no pedido inicial e à natureza das informações adicionais

105    Resulta da análise acima efetuada que, no caso, a Comissão tinha que demonstrar o caráter suficiente dos elementos de prova contidos no pedido inicial, apresentado em 21 de junho de 2019. Dispunha do prazo de três meses, a saber, até 25 de setembro de 2019, data em que as medidas antidumping deviam ter caducado, para o fazer. Quanto às informações adicionais apresentadas pela interveniente em 20 de agosto de 2019, fora do prazo legal, só podia tê‑las em conta na medida em que completassem ou corroborassem elementos de prova suficientes incluídos no pedido inicial e que não se tratasse de novos elementos de prova ou de novos argumentos.

106    A este respeito, é pacífico que os elementos de prova contidos no pedido inicial, que serviram de base às alegações de continuação do dumping em caso de caducidade das medidas, se baseavam num valor normal calculado, tendo a interveniente invocado a existência de uma situação especial do mercado na Rússia, devido a um acordo concertado de limitação dos preços, e à estratégia do Governo russo de fixar preços artificialmente baixos para o gás natural, que constitui o principal fator de produção do nitrato de amónio.

107    Além disso, é pacífico que os elementos de prova que figuram nas informações adicionais, contidas no pedido consolidado, diziam respeito a um valor normal determinado com base nos preços internos reais no mercado russo.

108    Ora, o Tribunal Geral refere que existem diferenças substanciais entre os elementos de prova apresentados no pedido inicial para o cálculo das margens de dumping e os apresentados nas informações adicionais.

109    Com efeito, no que respeita ao pedido inicial, a interveniente recorreu ao valor normal calculado. Invocou a existência de uma situação especial do mercado na Rússia, devido aos preços regulamentados no mercado interno russo, pelo que não existiam dados fiáveis sobre os preços internos para a Rússia no decurso de operações comerciais normais. Em apoio desta alegação, apresentou uma lista dos preços máximos declarados para os adubos minerais para uso dos produtores agrícolas, publicada em 18 de abril de 2017, que abrangia um período de quatro meses em 2017.

110    A interveniente calculou então o valor normal com base nos custos de produção do nitrato de amónio na Rússia e estimou o seu custo real, antes do ajustamento do preço do gás, em 104,88 dólares dos Estados Unidos (USD) por tonelada, ou em 6387,19 rublos russos (RUB) por tonelada. Devido aos preços artificialmente baixos do gás na Rússia, teve em conta os preços do gás fornecido em Waidhaus, na Alemanha. Estes custos foram ainda ajustados para ter em conta os custos de transporte no montante de 6 euros por tonelada, os encargos de venda, as despesas administrativas e outros encargos gerais, bem como uma margem de lucro média de 8 % e uma margem de lucro americana de 29 %. Após ajustamentos dos custos do gás, dos encargos de venda, das despesas administrativas e de outros encargos gerais, bem como das margens de lucro, o valor normal calculado que teve em conta era, para a Estónia e o resto da União, 191 euros por tonelada, aplicando a margem de lucro de 8 %, e 247 euros por tonelada, aplicando a margem de lucro de 29 %.

111    As margens de dumping foram calculadas comparando os valores normais calculados com os preços de exportação para a Estónia, para o resto da União e para o Brasil, tendo em conta os preços médios de exportação no montante de 139 euros por tonelada para a Estónia, 152 euros por tonelada para o resto da União e 142 euros ou 143 euros por tonelada para o Brasil. Para a União, com exceção da Estónia, a interveniente chegou a uma margem de dumping de 39 euros por tonelada, aplicando a margem de lucro de 8 %, e de 95 euros por tonelada, aplicando a margem de lucro de 29 %. Para a Estónia, o resultado foi, respetivamente, de 52 euros por tonelada e de 108 euros por tonelada.

112    Em contrapartida, nas informações adicionais, a interveniente baseou‑se num valor normal baseado nos preços reais praticados no mercado interno russo. Teve em conta uma lista dos preços comerciais para o ano civil de 2018 e a média anual dos preços comerciais provenientes do perito independente Chem‑courier. Utilizou um preço interno do nitrato de amónio russo no montante de 142 euros por tonelada, ou 10 501 RUB por tonelada, que foi ajustado para ter em conta os custos de transporte no montante de 25 euros por tonelada.

113    A margem de dumping foi então calculada comparando os preços efetivamente praticados no mercado interno russo com os preços de exportação para a União, tendo em conta o preço médio de exportação no montante de 133 euros por tonelada. A interveniente chegou a uma margem de dumping de 9 euros por tonelada.

114    Os elementos de prova contidos nas informações adicionais baseiam‑se, portanto, num método de cálculo diferente para a determinação da margem de dumping e em dados diferentes dos contidos no pedido inicial.

115    Estes elementos de prova baseiam‑se, além disso, numa base legal distinta e visam circunstâncias diferentes.

116    A este respeito, é jurisprudência constante que a determinação do valor normal de um produto constitui uma das etapas essenciais que devem permitir demonstrar a existência de um eventual dumping (Acórdão de 1 de outubro de 2014, Conselho/Alumina, C‑393/13 P, EU:C:2014:2245, n.o 20; v., igualmente, Acórdão de 12 de maio de 2022, Comissão/Hansol Paper, C‑260/20 P, EU:C:2022:370, n.o 76 e jurisprudência referida).

117    Para determinar esse valor normal, o artigo 2.o, n.o 1, primeiro parágrafo, do regulamento de base prevê que o mesmo se baseia habitualmente nos preços pagos ou a pagar, no decurso de operações comerciais normais, por clientes independentes no país de exportação. O segundo parágrafo desta disposição precisa que, quando o exportador no país de exportação não produzir nem vender um produto similar, o valor normal será estabelecido com base nos preços de outros vendedores ou produtores (Acórdão de 12 de maio de 2022, Comissão/Hansol Paper, C‑260/20 P, EU:C:2022:370, n.o 77; v., igualmente, Acórdão de 14 de julho de 2021, Interpipe Niko Tube e Interpipe Nizhnedneprovsky Tube Rolling Plant/Comissão, T‑716/19, EU:T:2021:457, n.o 56 e jurisprudência referida).

118    Este princípio geral aplica‑se prioritariamente na determinação do valor normal. Conforme já referiu o Tribunal de Justiça, decorre tanto da redação como da sistemática do artigo 2.o, n.o 1, primeiro parágrafo, do regulamento de base que, na determinação do valor normal, é o preço realmente pago ou a pagar no decurso de operações comerciais normais que, em princípio, se deve prioritariamente tomar em consideração para determinar o valor normal (v. Acórdão de 12 de maio de 2022, Comissão/Hansol Paper, C‑260/20 P, EU:C:2022:370, n.o 79 e jurisprudência referida).

119    Nos termos do artigo 2.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do regulamento de base, só é possível derrogar a aplicação do princípio geral enunciado no artigo 2.o, n.o 1, do referido regulamento no caso de não ter sido efetuada nenhuma venda de produto similar no decurso de operações comerciais normais, quando essas vendas forem insuficientes, ou quando, por causa de uma situação especial do mercado, essas vendas não permitam uma comparação adequada, calculando o valor normal quer com base no custo de produção no país de origem, acrescido de um montante para encargos e lucros razoáveis, ou seja, um valor normal calculado, quer com base em preços de exportação representativos. Essas exceções ao método de fixação do valor normal em função dos preços reais são taxativas (v. Acórdão de 1 de outubro de 2014, Conselho/Alumina, C‑393/13 P, EU:C:2014:2245, n.os 20 e 21 e jurisprudência referida; v. ainda, neste sentido, Acórdão de 12 de maio de 2022, Comissão/Hansol Paper, C‑260/20 P, EU:C:2022:370, n.o 80 e jurisprudência referida).

120    O artigo 2.o, n.o 1, primeiro e segundo parágrafos, e o artigo 2.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do regulamento de base estabelecem, portanto, uma hierarquia entre os métodos de determinação do valor normal aí enunciados. Daí resulta que as situações visadas por cada um dos referidos métodos não se sobrepõem (Acórdão de 12 de maio de 2022, Comissão/Hansol Paper, C‑260/20 P, EU:C:2022:370, n.o 81).

121    Ora, no caso, os elementos de prova que figuram no pedido inicial, relativos a um valor normal calculado, baseiam‑se no artigo 2.o, n.o 3, do regulamento de base, que precisa os critérios do afastamento do método de determinação do valor normal e os métodos subsidiários de cálculo desse valor. Essas exceções ao método de fixação do valor normal em função dos preços reais são taxativas. Visam, além disso, uma situação especial, tendo a interveniente considerado que os cálculos da margem de dumping não se podiam basear nos preços comerciais realmente praticados na Rússia.

122    Em contrapartida, os elementos de prova constantes das informações adicionais baseiam‑se no valor normal que respeita o princípio estabelecido no artigo 2.o, n.o 1, do regulamento de base.

123    Sendo os conceitos de valor normal e de valor normal calculado regulados por disposições jurídicas diferentes e baseados numa metodologia comercial distinta, não se pode sustentar que o recurso a outro método de cálculo do valor normal nas informações adicionais, substancialmente diferente do apresentado no pedido inicial e baseado numa disposição legal e num princípio distintos, pode ser qualificado de informação que visa completar ou corroborar os elementos de prova contidos no pedido inicial.

124    Por outro lado, contrariamente ao que a Comissão alegou na audiência, não se pode considerar que a lista dos preços reais no mercado interno russo, fornecida entre as informações adicionais, se destina a completar os preços mencionados no pedido inicial. Com efeito, o pedido inicial não continha uma lista dos preços efetivamente praticados no mercado interno russo para os quatro primeiros meses de 2017, mas sim uma lista dos preços máximos declarados para os adubos minerais para uso dos produtores agrícolas na Rússia, conforme publicada em 18 de abril de 2017. Esta lista dos preços máximos não visava, além disso, estabelecer um valor normal baseado em preços reais, antes servia de fundamento às alegações da interveniente relativas a uma situação especial do mercado, devido à estratégia do Governo russo de fixar preços artificialmente baixos.

125    Por conseguinte, a inclusão, no pedido consolidado, dos cálculos de margens de dumping baseados nos preços internos russos no mercado interno não consiste num simples esclarecimento dos elementos de prova contidos no pedido inicial, baseando‑se no valor normal calculado. Trata‑se de novos elementos de prova, que alteraram substancialmente a determinação das margens de dumping estabelecidas no pedido inicial e alteraram o conteúdo essencial deste último. Tendo sido apresentados após o termo do prazo legal, a Comissão não podia invocá‑lo para decidir dar início ao reexame da caducidade das medidas na sequência do pedido de reexame apresentado pela interveniente.

126    Por conseguinte, a Comissão cometeu um erro de direito e um manifesto erro de apreciação dos factos ao considerar, como resulta dos considerandos 20, 23, 25, 26 e 29 do regulamento impugnado, que se podia basear no pedido consolidado, incluindo os elementos de prova contidos nas informações adicionais, para demonstrar o caráter suficiente dos elementos de prova para justificar a abertura do reexame da caducidade das medidas.

127    Na audiência, a Comissão sustentou pela primeira vez que resulta das secções 1 e 4.1 do aviso de início e do considerando 23 do regulamento impugnado que só o pedido inicial continha elementos de prova suficientes de que a caducidade das medidas poderia conduzir à continuação do dumping. Acrescentou que poderia ter dado início ao reexame da caducidade das medidas apenas com base no pedido inicial.

128    No entanto, de modo nenhum resulta do aviso de início e do regulamento impugnado que a Comissão tivesse considerado que o pedido inicial continha elementos de prova suficientes de que a caducidade das medidas poderia conduzir à continuação do dumping.

129    Com efeito, o considerando 23 do regulamento impugnado indica expressamente que o reexame da caducidade das medidas foi iniciado com base no pedido consolidado e precisa que a Comissão considerou que o pedido inicial «continha elementos de prova suficientes que, sob reserva dos esclarecimentos prestados pela [interveniente] na sequência do processo de pedido de esclarecimentos para complementar o pedido inicial», justificavam o início do reexame da caducidade das medidas.

130    A redação do considerando 23 do regulamento impugnado noutras versões linguísticas diferentes da versão francesa, como a versão inglesa, que utiliza a expressão «subject to the clarifications provided by the applicants following the deficiency process to suplement its original request», ou a versão alemã, que indica «nach Anforderung noch fehlender Informationen», confirma que as informações adicionais foram pedidas pela Comissão para corrigir as informações em falta ou deficientes do pedido inicial.

131    Além disso, o considerando 25 do regulamento impugnado precisa que «[n]ão existe qualquer ambiguidade quanto ao facto de o reexame da caducidade ter sido iniciado com base [no] pedido [consolidado]» e que «[t]al pode ser confirmado pela leitura da secção 4.1 do aviso de início, que se referia claramente aos elementos de prova do pedido de reexame consolidado». Do mesmo modo, no considerando 29 do referido regulamento, se reafirma que «o início do presente reexame da caducidade não se baseia exclusivamente nas informações constantes do pedido de reexame apresentado inicialmente em 21 de junho de 2019, mas também em elementos de prova complementares facultados [pela interveniente] antes do início e incluídos no pedido de reexame consolidado».

132    Por outro lado, na contestação e na tréplica, a Comissão sustentou continuamente ter concluído pela existência de elementos de prova suficientes da probabilidade de dumping e de prejuízo com base no pedido consolidado, e que o pedido inicial, enquanto tal, não tinha sido examinado isoladamente, mas sim em conjugação com os outros eventuais elementos de prova de que a Comissão dispunha, incluindo os esclarecimentos adicionais apresentados pela interveniente, pelo que «o regulamento impugnado não [abordava] em primeiro lugar a questão de saber se as informações fornecidas no pedido inicial eram suficientes para dar início ao reexame da caducidade».

133    Na audiência, a Comissão confirmou ter efetivamente dado início ao reexame com base no pedido consolidado. Acrescentou que, noutros inquéritos, o reexame tinha sido iniciado com base num pedido apresentado dentro do prazo legal e num valor normal calculado.

134    A secção 1 do aviso de início menciona igualmente tanto o pedido inicial como o pedido consolidado, tendo a Comissão precisado que este último era aí designado como «versão pública do pedido». Quanto à secção 4.1 do aviso de início, menciona que a interveniente apresentou «elementos de prova suficientes de que não existiam dados fiáveis sobre os preços internos na Rússia […] no decurso de operações comerciais normais», pelo que calculou o valor normal. O caráter suficiente dos elementos de prova referidos incide, portanto, sobre a justificação do recurso a um valor normal calculado no pedido inicial, mas de modo nenhum significa que o referido pedido continha elementos de prova suficientes de que a caducidade das medidas poderia dar origem a uma continuação do dumping, na aceção do artigo 11.o, n.o 2, do regulamento de base.

135    Por conseguinte, resulta expressamente destas considerações que o regulamento impugnado não pode ser lido no sentido de que demonstra que o pedido inicial continha elementos de prova suficientes de que a caducidade das medidas poderia conduzir à continuação do dumping. Em contrapartida, resulta do regulamento impugnado que, sem os esclarecimentos constantes das informações adicionais, apresentadas pela interveniente em 20 de agosto de 2019, a Comissão não teria necessariamente procedido ao início do reexame da caducidade das medidas.

136    O Tribunal considera, portanto, que o pedido que a Comissão fez à interveniente para obter os preços reais no mercado interno russo em todo o ano de 2018 não pode ser entendido no sentido de que tinha por objetivo completar os elementos de prova que figuravam no pedido inicial, que se baseavam unicamente em cálculos de margens de dumping estabelecidos com o valor normal calculado, antes se destinava a sanar uma falta de informação.

137    Ora, como resulta das análises acima efetuadas, não cabe à Comissão pedir aos produtores da União, que apresentaram um pedido de reexame da caducidade das medidas no prazo legal, que corrijam o eventual caráter insuficiente dos elementos de prova que aí figuram.

138    Com efeito, a Comissão dispõe do prazo de três meses anterior à caducidade das medidas para se certificar do caráter suficiente desses elementos de prova e pode obter informações adicionais a esse respeito, sem com isso poder colmatar ou sanar a falta de elementos de prova suficientes no pedido apresentado no prazo legal, nem substituir elementos em falta ou defeituosos do referido pedido por novas informações.

139    Em todo o caso, não cabe ao Tribunal Geral substituir a apreciação da Comissão, tal como resulta do aviso de início e do regulamento impugnado, pela sua própria apreciação do caráter suficiente dos elementos de prova contidos no pedido inicial.

140    Com efeito, segundo a jurisprudência, o Tribunal Geral não pode substituir os fundamentos invocados no processo de inquérito e no regulamento impugnado por outros fundamentos invocados pela primeira vez perante ele (v., neste sentido, Acórdãos de 3 de setembro de 2015, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Comissão, C‑398/13 P, EU:C:2015:535, n.o 22 e jurisprudência referida, e de 1 de junho de 2017, Changmao Biochemical Engineering/Conselho, T‑442/12, EU:T:2017:372, n.o 153 e jurisprudência referida). Constituem tais fundamentos invocados pela primeira vez no Tribunal Geral as apreciações formuladas pela Comissão relativas ao facto de o pedido inicial conter elementos de prova suficientes de uma probabilidade de continuação do dumping em caso de caducidade das medidas e que, por isso, poderia ter decidido dar início ao reexame da caducidade das medidas só com base neles.

141    Por conseguinte, são procedentes as alegações das recorrentes relativas à violação do artigo 11.o, n.o 2, do regulamento de base.

142    Resulta do exposto que o regulamento impugnado deve ser anulado, sem que seja necessário conhecer dos outros fundamentos invocados pelas recorrentes.

 Quanto às despesas

143    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão sido vencida, há que condená‑la a suportar as suas próprias despesas e as despesas das recorrentes, em conformidade com os pedidos destas.

144    Por força do artigo 138.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, a interveniente suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção alargada)

decide:

1)      É anulado o Regulamento de Execução (UE) 2020/2100, de 15 de dezembro de 2020, que institui um direito antidumping definitivo sobre as importações de nitrato de amónio originário da Rússia na sequência de um reexame da caducidade nos termos do artigo 11.o, n.o 2, do Regulamento (UE) 2016/1036 do Parlamento Europeu e do Conselho.

2)      A Comissão Europeia é condenada a suportar as suas próprias despesas, bem como as despesas efetuadas pela AO Nevinnomysskiy Azot e pela AO Novomoskovskaya Aktsionernaya Kompania NAK «Azot».

3)      A Fertilizers Europe suportará as suas próprias despesas.

Spielmann

Öberg

Mastroianni

Brkan

 

      Gâlea

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 5 de julho de 2023.

Assinaturas


*      Língua do processo: inglês.