Language of document : ECLI:EU:T:2020:119

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

26 de março de 2020 (*)

«Função pública — Pessoal do BCE — Programa de ajuda à transição profissional fora do BCE — Indeferimento de um pedido de participação — Condições de elegibilidade — Antiguidade exigida diferente consoante um membro do pessoal esteja classificado numa categoria de salário simples ou dupla — Classificação numa categoria de salário em função do tipo de trabalho — Igualdade de tratamento — Proporcionalidade — Erro manifesto de apreciação»

No processo T‑547/18,

Raivo Teeäär, residente em Taline (Estónia), representado por L. Levi, advogada,

recorrente,

contra

Banco Central Europeu (BCE), representado por D. Camilleri Podestà e F. Malfrère, na qualidade de agentes, assistidos por B. Wägenbaur, advogado,

recorrido,

que tem por objeto um pedido baseado no artigo 270.o TFUE e no artigo 50.o‑A do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, e destinado, por um lado, à anulação da Decisão do BCE de 27 de fevereiro de 2018 que rejeitou a candidatura do recorrente ao programa‑piloto de ajuda à transição profissional fora do BCE e, na medida do necessário, da Decisão do BCE de 3 de julho de 2018 que negou provimento ao recurso especial do recorrente contra a Decisão acima referida de 27 de fevereiro de 2018 e, por outro, à obtenção da reparação do prejuízo que alegadamente sofreu devido a essa decisão,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção),

composto por: P. Nihoul, exercendo funções de presidente, J. Svenningsen (relator) e U. Öberg, juízes,

secretário: P. Cullen, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 9 de julho de 2019,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Em 1 de julho de 2004, o recorrente, Raivo Teeäär, entrou em funções no Banco Central Europeu (BCE), começando a sua carreira nesta instituição enquanto perito em produção confirmado na Direção «Notas de Banco». Aquando do seu recrutamento, o recorrente tinha 50 anos. Em conformidade com o anúncio de vaga, foi classificado na categoria de salário F/G da estrutura salarial do BCE, onde se enquadrava a referida função. Nesta categoria de salário, foi colocado no escalão 136, tendo em conta a duração, o nível e a importância da sua experiência profissional.

2        Desde o seu recrutamento, o recorrente progrediu regularmente dentro da sua categoria de salário. Em janeiro de 2011, após sete anos e seis meses, atingiu o respetivo limite máximo, correspondente ao escalão 169. Em seguida, já não era possível nenhuma progressão nesta categoria de salário.

3        A estrutura salarial do BCE consiste em 12 categorias de salário simples, designadas pelas letras A a L, e em duas categorias de salário duplas, designadas pelas letras E/F e F/G. Cada categoria de salário integra vários escalões que vão de um valor mínimo a um valor máximo de salário. As categorias de salário duplas, como a F/G, correspondem à junção de duas categorias de salário simples, no caso em apreço, a categoria de salário F e a categoria de salário G, de modo que, em termos de rendimento anual, o início da categoria de salário F/G coincide com o da categoria de salário F e o seu limite máximo coincide com o da categoria de salário G.

4        Concretamente, a categoria de salário F abrange os escalões 1 a 98, a categoria de salário G abrange os escalões 1 a 99 e a categoria de salário F/G abrange os escalões 1 a 169, verificando‑se uma sobreposição parcial da categoria de salário F e da categoria de salário G. Com efeito, os escalões 71 a 98 da categoria de salário F correspondem aos escalões 1 a 28 da categoria de salário G.

5        Por conseguinte, os salários dos escalões 1 a 98 da categoria de salário F correspondem aos salários dos escalões 1 a 98 da categoria de salário F/G e os salários dos escalões 1 a 99 da categoria de salário G correspondem aos salários dos escalões 71 a 169 da categoria de salário F/G.

6        A classificação dos membros do pessoal numa determinada categoria de salário, simples ou dupla, é determinada pelo tipo de posto de trabalho como resulta de um documento do BCE intitulado «Alocação de posições às categorias de salário — Lista de postos de trabalho genéricos» (Allocation of Positions to Bands — List of Generic Job Titles). Para um mesmo tipo de posto de trabalho, a progressão só é possível dentro da categoria de salário assim determinada, ou seja, de um escalão para outro escalão superior da mesma categoria de salário. A mudança de categoria de salário só é possível na sequência de um processo de recrutamento propriamente dito para um posto de trabalho diferente abrangido por essa outra categoria de salário (promoção interna), salvo uma promoção excecional «ad personam» ou uma revalorização do posto de trabalho ocupado.

7        Com base no artigo 36.o‑1 do Protocolo Relativo aos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do BCE (SEBC) e do Regulamento Interno do BCE, a Comissão Executiva do BCE aprovou o Regime Aplicável ao Pessoal do BCE (a seguir «regime aplicável») por Decisão de 9 de junho de 1998, alterada em 31 de março de 1999 (JO 1999, L 125, p. 32). Na sua versão aplicável ao presente litígio, o artigo 11.o, alínea e), do regime aplicável diz respeito a uma ajuda destinada à transição profissional para fora do BCE (a seguir «ATP»), a favor dos membros do pessoal do BCE que renunciem ao seu posto de trabalho nas condições e segundo o procedimento previsto nas regras aplicáveis ao pessoal do BCE (a seguir «regras aplicáveis ao pessoal»).

8        Com vista a dar execução, pela primeira vez, ao artigo 11.o, alínea e), do regime aplicável, a Comissão Executiva do BCE emitiu a Decisão ECB/2012/NP18, de 24 de agosto de 2012, que altera as regras aplicáveis ao pessoal no que respeita à ajuda à transição voluntária para uma carreira fora do BCE, e que aditou o artigo 2.3 das regras aplicáveis ao pessoal, que instituía um programa‑piloto da ATP, limitado a um máximo de 50 pessoas e acessível durante os anos de 2013 e 2014. O artigo 2.3.1 das regras aplicáveis ao pessoal dispunha que os membros do pessoal com contrato sem termo que tivessem permanecido pelo menos oito anos consecutivos na mesma categoria de salário simples ou pelo menos doze anos consecutivos na mesma categoria de salário dupla preenchiam os requisitos para beneficiar do programa‑piloto da ATP.

9        Em 12 de agosto de 2014, o recorrente candidatou‑se ao programa‑piloto da ATP (a seguir «candidatura à ATP»). Em conformidade com o procedimento, a candidatura à ATP continha uma declaração de renúncia ao seu posto de trabalho com efeitos a partir de 13 de dezembro de 2014, sob reserva da aceitação dessa candidatura. Em complemento da referida candidatura, o recorrente enviou uma nota expondo as razões pelas quais pedia que a sua candidatura fosse tomada em consideração apesar de não preencher o requisito de doze anos de antiguidade, previsto no artigo 2.3.1 das regras aplicáveis ao pessoal, para os membros do pessoal classificados numa categoria de salário dupla.

10      A candidatura à ATP foi rejeitada por Decisão de 18 de agosto de 2014, com o fundamento de que o recorrente não preenchia o requisito de tempo de serviço, uma vez que tinha permanecido na categoria de salário dupla F/G menos de doze anos.

11      Em 8 de setembro de 2014, o recorrente informou os serviços do BCE pertinentes da sua decisão de se reformar, com efeitos a partir de 18 de dezembro de 2014.

12      O pedido de reexame pré‑contencioso da decisão de rejeição da candidatura à ATP, apresentado pelo recorrente em 14 de outubro de 2014, foi indeferido por Decisão de 9 de dezembro de 2014.

13      Foi autorizada a reforma do recorrente a partir de 18 de dezembro de 2014.

14      A reclamação apresentada pelo recorrente em 9 de fevereiro de 2015 contra a Decisão de 9 de dezembro de 2014 foi indeferida por Decisão de 2 de abril de 2015.

15      Na sequência do recurso interposto pelo recorrente em 9 de junho de 2015 contra a Decisão de 18 de agosto de 2014, esta foi anulada pelo Acórdão de 17 de novembro de 2017, Teeäär/BCE (T‑555/16, não publicado, EU:T:2017:817), por incompetência ratione materiae do autor dessa decisão.

16      O artigo 2.3 das regras aplicáveis ao pessoal conforme resultava da Decisão ECB/2012/NP18, que instituiu o programa‑piloto da ATP, foi revogado pela Decisão ECB/2017/NP19, de 17 de maio de 2017, que altera as regras aplicáveis ao pessoal do BCE no que respeita à ajuda à transição voluntária para uma carreira fora do BCE. Esta última decisão instituiu um novo programa para a ATP, acessível entre 1 de julho a 31 de outubro de 2017, que estabelecia um requisito de antiguidade uniforme de oito anos na mesma categoria de salário.

17      Em execução do Acórdão de 17 de novembro de 2017, Teeäär/BCE (T‑555/16, não publicado, EU:T:2017:817), a Comissão Executiva do BCE adotou, em 27 de fevereiro de 2018, uma nova decisão com base no artigo 2.3 das regras aplicáveis ao pessoal na sua versão inicial, pela qual rejeitou a candidatura à ATP (a seguir «decisão impugnada»).

18      Por Decisão da Comissão Executiva do BCE de 3 de julho de 2018, foi negado provimento ao recurso especial da decisão impugnada interposto pelo recorrente em 3 de maio de 2018.

 Tramitação processual e pedidos das partes

19      O recorrente interpôs o presente recurso por petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 14 de setembro de 2018.

20      O recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão impugnada;

–        se for caso disso, anular a Decisão da Comissão Executiva do BCE de 3 de julho de 2018;

–        condenar o BCE a reparar o dano material que lhe causou, estimado em 101 447 euros, acrescido de juros de mora calculados à taxa anual das operações de refinanciamento do BCE, acrescida de três pontos percentuais;

–        condenar o BCE nas despesas.

21      O BCE conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar o recorrente nas despesas.

 Questão de direito

 Quanto à admissibilidade do elemento de prova apresentado pelo recorrente na audiência

22      Na audiência, o recorrente submeteu um documento complementar que apresentou como sendo uma carta enviada pelo BCE ao respetivo Comité de Pessoal antes da implementação, no seu âmbito, de categorias de salário duplas, e que era suscetível de completar a resposta dada pelo BCE à questão escrita que o Tribunal Geral lhe tinha colocado a respeito do histórico e das origens da criação das referidas categorias de salário. Convidado a precisar o alcance útil desse documento, o recorrente afirmou que o mesmo demonstraria que a implementação de categorias de salário duplas não devia ter efeitos negativos para os membros do pessoal que se encontrassem no escalão mais elevado da categoria de salário simples G ou da categoria de salário dupla F/G, sendo que a criação da ATP comportava tais efeitos para os membros do pessoal que se encontravam numa categoria de salário dupla.

23      Importa observar que não resulta destas explicações que o documento em causa tenha uma relação direta com a questão escrita do Tribunal Geral relativa à implementação de categorias de salário duplas. Uma vez que o recorrente pretende evocar esse documento para apoiar a sua argumentação relativa às consequências desfavoráveis que, em seu entender, a ATP acarreta para os membros do pessoal que se encontram numa situação idêntica à sua e que não alega que o referido documento não poderia ter sido apresentado junto com a petição, há que considerar que o mesmo é inadmissível, em conformidade com o artigo 85.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral.

 Quanto ao objeto do recurso

24      Segundo jurisprudência constante, os pedidos de anulação formalmente dirigidos contra a decisão de indeferimento de uma reclamação têm por efeito submeter à apreciação do Tribunal Geral o ato contra o qual a reclamação foi apresentada quando não tenham, enquanto tais, conteúdo autónomo (v., neste sentido, Acórdão de 24 de abril de 2017, HF/Parlamento, T‑584/16, EU:T:2017:282, n.o 72 e jurisprudência referida).

25      No caso em apreço, dado que a decisão de indeferimento da reclamação se limita a confirmar a decisão impugnada, há que concluir que os pedidos de anulação da decisão de indeferimento não têm conteúdo autónomo e que, por conseguinte, não há que decidir especificamente sobre eles, mesmo que, no exame da legalidade da decisão impugnada, se deva ter em consideração a fundamentação que figura na decisão de indeferimento da reclamação, uma vez que essa fundamentação deve coincidir com a da decisão impugnada (v., neste sentido, Acórdão de 16 de janeiro de 2018, SE/Conselho, T‑231/17, não publicado, EU:T:2018:3, n.o 22 e jurisprudência referida).

 Quanto à admissibilidade

26      Em apoio dos pedidos de anulação, o recorrente apresenta quatro fundamentos.

27      Com os dois primeiros fundamentos, o recorrente suscita uma exceção de ilegalidade do artigo 2.3.1 das regras aplicáveis ao pessoal, disposição que lhe é aplicada pela decisão impugnada. O primeiro fundamento é relativo à violação do princípio da igualdade de tratamento e do princípio da proporcionalidade, bem como a um erro manifesto de apreciação e o segundo, à violação do artigo 21.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») e da Diretiva 2000/78/CE do Conselho, de 27 de novembro de 2000, que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na atividade profissional (JO 2000, L 303, p. 16), em razão de uma discriminação baseada na idade.

28      Caso o artigo 2.3.1 das regras aplicáveis ao pessoal não deva ser considerado ilegal, o recorrente apresenta, a título subsidiário, dois outros fundamentos relativos, o terceiro, a um erro manifesto de apreciação e a uma violação do dever de solicitude e, o quarto, à violação do artigo 2.3.1. das regras aplicáveis ao pessoal.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à ilegalidade do artigo 2.3.1 das regras aplicáveis ao pessoal em razão da violação do princípio da igualdade de tratamento e do princípio da proporcionalidade, bem como a um erro manifesto de apreciação

29      O recorrente sustenta que o duplo requisito de antiguidade previsto no artigo 2.3.1 das regras aplicáveis ao pessoal constitui uma diferença de tratamento e que esta diferença de tratamento é genericamente arbitrária, uma vez que distingue entre os membros do pessoal classificados numa categoria de salário simples e os classificados numa categoria de salário dupla, e, em todo o caso, em relação aos membros do pessoal que, como ele, atingiram o limite de uma categoria de salário dupla antes de terem completado doze anos de antiguidade nessa categoria de salário. Eventualmente, mesmo que a previsão de requisitos de antiguidade diferentes seja formalmente justificada pela existência de dois tipos diferentes de categorias de salário, a discriminação decorre conjuntamente do artigo 2.3.1 das regras aplicáveis ao pessoal e da lista dos postos de trabalho genéricos, que determina, para cada tipo de trabalho, a categoria salarial, simples ou dupla, a que este pertence.

30      A distinção controvertida é genericamente arbitrária, uma vez que o facto de uma categoria de salário dupla comportar mais escalões do que uma categoria de salário simples, com a consequência de as pessoas recrutadas numa categoria de salário simples atingirem mais frequentemente o limite da sua categoria de salário, não tem nenhuma relação com os objetivos da ATP, que são facilitar a transição para uma carreira fora do BCE, incentivar uma rotação acrescida do pessoal permanente e favorecer a mobilidade interna.

31      A distinção é especialmente arbitrária em relação aos membros do pessoal que, como o recorrente, pertencem a uma categoria de salário dupla, mas que foram classificados, quando do seu recrutamento, num escalão situado na parte desta categoria de salário dupla que corresponde à segunda das duas categorias de salário simples que foram combinadas para formar a categoria de salário dupla (ou seja, a categoria de salário G no caso da categoria de salário dupla F/G). Com efeito, tendo em conta o número de escalões que separam esses membros do pessoal do limite da categoria de salário dupla em causa, a sua situação é idêntica, em termos de possibilidades de progressão, à situação daqueles que pertencem a uma categoria de salário simples. Consequentemente, a distinção controvertida é inadequada à luz dos objetivos da ATP. O caso em apreço não é excecional, uma vez que abrange 18 % dos membros do pessoal recrutados entre 2010 e 2012.

32      Além disso, a distinção controvertida é contrária ao princípio da proporcionalidade, porquanto o BCE não escolheu a via menos restritiva para alcançar os objetivos da ATP. Com efeito, poderia ter previsto, para todos os membros do pessoal, um requisito de antiguidade relacionado com o facto de terem atingido o limite da sua categoria de salário há um mesmo número de anos.

33      Por último, a distinção controvertida resulta igualmente de um erro manifesto de apreciação, uma vez que não responde ao objetivo de compensar as oportunidades de carreira pretensamente reduzidas dos membros do pessoal classificados numa categoria de salário simples.

34      O BCE afirma que o objeto do programa‑piloto da ATP era propor uma ajuda com vista a uma reorientação de carreira aos membros do pessoal que trabalhavam há muito tempo no BCE e que tinham permanecido na mesma categoria de salário, independentemente do número de escalões progredidos, e não aos membros do pessoal que estavam bloqueados no limite superior da sua categoria de salário. A distinção controvertida baseia‑se no facto de as categorias de salário duplas terem mais cerca de 50 % de escalões do que as categorias de salário simples. Daqui resulta que a situação de uma pessoa que se encontre numa categoria de salário dupla só pode ser comparada à das pessoas que se encontram no mesmo tipo de categoria de salário.

35      O BCE admite que a correlação entre a classificação numa categoria de salário dupla e a existência de possibilidades de uma maior progressão corresponde a uma situação normal padrão, mas sustenta que um legislador se pode basear nessa situação sem estar obrigado a prever também regimes de exceção para ter em conta situações atípicas. Por outro lado, sublinha que dispunha de um amplo poder de apreciação no âmbito das opções de natureza política que fez na qualidade de «legislador» para elaborar o quadro desse programa‑piloto.

36      No âmbito de uma análise in concreto, o BCE sublinha, por um lado, que, no momento da entrada em vigor do programa‑piloto da ATP, 794 pessoas estavam classificadas na categoria de salário dupla F/G, 5 pessoas estavam classificadas na categoria de salário simples F e 7 pessoas estavam classificadas na categoria de salário simples G, sendo que nenhuma destas 7 pessoas beneficiou do programa‑piloto da ATP. Por outro lado, era impossível que uma pessoa recrutada na categoria de salário G pudesse ser tratada mais favoravelmente do que o recorrente em razão do requisito de antiguidade de oito anos aplicável aos membros do pessoal classificados nessa categoria de salário simples, uma vez que, no dia em que o referido programa‑piloto começou a ser aplicado, as 7 pessoas que se encontravam na categoria de salário G tinham sido promovidas a essa categoria de salário, e não recrutadas na mesma.

37      A título preliminar, importa recordar que o princípio da igualdade de tratamento, que é um princípio geral de direito da União consagrado nos artigos 20.o e 21.o da Carta e é aplicável ao direito da função pública da União, exige nomeadamente que situações comparáveis não sejam tratadas de modo diferente, exceto se esse tratamento for objetivamente justificado (v., neste sentido, Acórdãos de 12 de novembro de 2014, Guardian Industries e Guardian Europe/Comissão, C‑580/12 P, EU:C:2014:2363, n.o 51 e jurisprudência referida, e de 16 de julho de 2015, EJ e o./Comissão, F‑112/14, EU:F:2015:90, n.o 65 e jurisprudência referida).

38      Os elementos que distinguem situações diferentes e, eventualmente, o seu caráter comparável devem ser determinados e apreciados à luz do objeto e do objetivo prosseguido pelas disposições em questão, entendendo‑se que devem ser tidos em consideração, para este efeito, os princípios e os objetivos do domínio em causa (v. Acórdão de 7 de março de 2017, RPO, C‑390/15, EU:C:2017:174, n.o 42 e jurisprudência referida).

39      Quando é constatada uma diferença de tratamento entre duas situações comparáveis, o princípio da igualdade de tratamento não é, porém, violado se essa diferença for devidamente justificada (v. Acórdão de 7 de março de 2017, RPO, C‑390/15, EU:C:2017:174, n.o 52 e jurisprudência referida).

40      É esse o caso quando a diferença de tratamento está relacionada com um objetivo legalmente admissível prosseguido pela medida que tem por efeito instituir essa diferença, e seja proporcionada a esse objetivo. Quando a autoridade reguladora dispõe de um amplo poder de apreciação, a fiscalização jurisdicional do respeito destas condições deve limitar‑se ao erro manifesto (v., neste sentido, Acórdão de 7 de março de 2017, RPO, C‑390/15, EU:C:2017:174, n.os 53 e 54 e jurisprudência referida).

41      A este propósito, importa sublinhar que, quando estabelece regras relativas a questões sobre o regime aplicável ao pessoal que emprega, o BCE dispõe de uma ampla autonomia devido à sua independência funcional (v., neste sentido, Acórdão de 22 de outubro de 2002, Pflugradt/BCE, T‑178/00 e T‑341/00, EU:T:2002:253, n.o 48). Além disso, as instituições dispõem de um amplo poder de apreciação para determinar o interesse do serviço, seja qual for o exame no âmbito do qual ou a decisão para a qual esse interesse deve ser tido em conta (v. Acórdão de 16 de maio de 2018, Barnett/CESE, T‑23/17, não publicado, EU:T:2018:271, n.o 36 e jurisprudência referida). Nesse caso, os princípios da não discriminação ou da igualdade de tratamento só são violados se a medida em causa comportar uma diferenciação arbitrária ou manifestamente inadequada à luz do objetivo dessa medida (v., neste sentido, Acórdão de 15 de abril de 2010, Gualtieri/Comissão, C‑485/08 P, EU:C:2010:188, n.o 72).

42      Há igualmente que precisar que, mesmo que, em situações marginais, resultem eventuais contratempos da instauração de uma regulamentação geral e abstrata, não se pode criticar uma autoridade investida de poder normativo por ter recorrido, na organização dos seus serviços, a uma categorização, na medida em que não seja materialmente discriminatória à luz do objetivo que prossegue (v., neste sentido, Acórdão de 15 de abril de 2010, Gualtieri/Comissão, C‑485/08 P, EU:C:2010:188, n.o 81 e jurisprudência referida).

43      No caso em apreço, o artigo 2.3.1 das regras aplicáveis ao pessoal estabeleceu uma diferença de tratamento entre os membros do pessoal do BCE consoante pertençam a uma categoria de salário dupla ou a uma categoria de salário simples, ao dispor que os primeiros, que representam uma grande parte do pessoal, eram elegíveis para o programa‑piloto da ATP a partir dos doze anos de antiguidade na sua categoria de salário, enquanto a antiguidade exigida para os segundos era de apenas oito anos.

44      Por conseguinte, em conformidade com a jurisprudência recordada nos n.os 38 a 42, supra, há que identificar o objeto e o objetivo do programa‑piloto da ATP, a fim de determinar se as situações das pessoas classificadas numa ou na outra categoria de salário são comparáveis e, em caso afirmativo, se a diferença de tratamento constatada é ou não justificada.

45      Quanto à comparabilidade das situações, há que salientar que, na resposta do BCE à questão escrita que lhe foi colocada pelo Tribunal Geral a respeito dos objetivos da ATP, essa instituição indicou que a ATP tinha resultado de uma reflexão subsequente à constatação de um «desafio demográfico» com o qual se confrontava. Referiu que, por razões ligadas aos critérios de recrutamento que tinham sido aplicados quando da sua criação, uma grande parte do seu pessoal permaneceria estável durante um período relativamente longo, depois reformar‑se‑ia num período relativamente curto.

46      Esta situação tinha como consequência, nomeadamente, limitar as possibilidades de promoção interna, numa categoria de salário superior, e, por isso, era suscetível de desmotivar os membros do pessoal que desejassem ocupar novas funções.

47      Na sequência da reflexão iniciada devido a esta constatação, o BCE decidiu adotar uma medida específica destinada a incentivar a saída antecipada de uma parte do pessoal, a saber, os membros do pessoal com maior probabilidade de terem trabalhado durante muito tempo no BCE na mesma categoria de salário, sem centrar esta medida nos membros do pessoal que se situavam na faixa etária afetada pelo «desafio demográfico».

48      Por conseguinte, afigura‑se que o objetivo da implementação do programa‑piloto da ATP consistia em fazer preventivamente face a vários riscos suscetíveis de prejudicar o bom funcionamento do BCE num futuro mais ou menos próximo, criando antecipadamente vagas de postos de trabalho a fim de permitir o recrutamento de novas pessoas e aumentar as possibilidades de promoção interna para o pessoal no ativo. Uma vez que esta medida correspondia a uma vontade de manter, ou mesmo de melhorar, a qualidade dos serviços prestados no âmbito do cumprimento das funções do BCE, estava relacionada com o interesse do serviço.

49      Neste contexto, o objeto do programa‑piloto da ATP era provocar a saída voluntária e antecipada de uma parte dos membros do pessoal que trabalharam um certo número de anos no BCE e que tinham permanecido numa mesma categoria de salário, ao mesmo tempo que distinguia os membros do pessoal classificados numa categoria de salário simples dos classificados numa categoria de salário dupla, favorecendo esta saída mediante um acompanhamento numa transição de carreira fora do BCE, nomeadamente no plano financeiro. Embora este objetivo pudesse ser considerado, do ponto de vista dos membros do pessoal potencialmente interessados numa reorientação profissional, uma medida favorável, não é menos verdade que estava, antes de mais, relacionado com o interesse do serviço tendo em conta os objetivos que se destinava a servir.

50      Paralelamente, na sua resposta às questões escritas colocadas pelo Tribunal Geral, o BCE referiu igualmente que a criação de categorias de salário duplas visava principalmente permitir uma evolução na carreia ao longo de vários anos para os tipos de postos de trabalho em que era possível melhorar os níveis de desempenho em função da experiência adquirida. Estes elementos não foram contestados pelo recorrente, que se limitou a alegar na audiência que o BCE tinha assegurado que a implementação das categorias de salário duplas não prejudicava os membros do pessoal então em funções.

51      Assim, deve salientar‑se que, por comparação com as categorias de salário simples, as duas categorias de salário duplas (E/F e F/G) correspondem objetivamente a um percurso de carreira potencialmente longo, que é suscetível de favorecer a estabilidade do pessoal que ocupa postos de trabalho para os quais a experiência adquirida no próprio exercício das funções em causa na instituição é suscetível de constituir um benefício para o cumprimento das funções desta, nomeadamente em termos de experiência e, portanto, de eficácia e responsabilidades assumidas. A lista dos postos de trabalho em causa revela que correspondem essencialmente a funções técnicas de responsabilidade («peritos» para a categoria de salário F/G, «especialistas» ou «analistas» para a categoria de salário E/F), sem serem funções de gestão, a maioria das quais estão ligadas ao cumprimento das funções específicas do BCE. Tal era, nomeadamente, o caso do recorrente, contratado como perito em produção na Direção «Notas de Banco».

52      Consequentemente, as situações das duas categorias de pessoas em causa distinguem‑se por um elemento essencial do ponto de vista do interesse do serviço, a saber, correspondem a tipos de funções diferentes, algumas das quais o BCE quis que fossem exercidas por um pessoal mais estável. Assim, uma vez que um membro do pessoal classificado numa categoria de salário dupla dispõe, geralmente, de uma maior margem de progressão na sua categoria de salário do que um membro do pessoal classificado numa categoria de salário simples, as situações respetivas das pessoas que se encontram numa ou noutra categoria de salário não podem ser consideradas comparáveis à luz do objeto e do objetivo do programa‑piloto da ATP, conforme identificados nos n.os 48 e 49. Com efeito, quando uma instituição pretende conservar durante um período bastante longo os membros do pessoal que exercem determinados tipos de funções, é coerente que o incentivo para que as pessoas abrangidas saíam de forma prematura seja menor que o previsto para os membros do pessoal que exercem tipos de funções para os quais não existe o mesmo objetivo. Esta precaução é suscetível de contribuir para a manutenção ou mesmo para a melhoria da qualidade dos serviços prestados no âmbito do cumprimento das funções desta instituição e é, por conseguinte, do interesse do serviço.

53      Em todo o caso, há que considerar que, mesmo admitindo que as situações dos membros do pessoal que se encontram numa ou na outra categoria de salário sejam comparáveis, a diferença de tratamento que constitui a fixação de um critério de elegibilidade de doze anos para os que exercem um tipo de funções que se enquadra numa categoria de salário dupla e de um critério de elegibilidade reduzido de oito anos para os que exercem funções que se enquadram numa categoria de salário simples é objetivamente justificada, pelas mesmas razões expostas nos n.os 51 e 52, supra.

54      Por outro lado, a forma como foi tomada em consideração a característica das funções abrangidas nas duas categorias de salário duplas identificadas no n.o 51, supra, é proporcionada, na medida em que a diferença de quatro anos no que respeita ao critério de elegibilidade para o programa‑piloto da ATP, existente entre as duas categorias de membros do pessoal, corresponde aproximadamente à diferença da margem de progressão salarial existente entre uma categoria de salário simples e uma categoria de salário dupla. Com efeito, resulta dos dados que figuram no n.o 4, supra, que uma relação matemática entre a antiguidade de oito anos para os membros do pessoal classificados numa categoria de salário simples e o número de escalões que essa categoria de salário contém, a saber, 99 escalões, corresponde a um pouco menos de 14 anos de antiguidade para os membros do pessoal classificados numa categoria de salário dupla, que contém 169 escalões.

55      Por último, como resulta da jurisprudência referida no n.o 42, supra, há que admitir que, uma vez que tinha de instituir uma regulamentação de aplicação geral num domínio em que dispõe de uma ampla margem de apreciação e de uma ampla autonomia, o BCE podia, como sustenta, sem cometer um erro manifesto de apreciação, basear‑se em situações padrão, não estando obrigado a prever também um regime de exceções para ter em conta situações atípicas, como a do recorrente.

56      Quanto ao critério de elegibilidade alternativo cuja tomada em consideração o recorrente invoca, baseado no facto de ter atingido o limite máximo de uma categoria de salário há vários anos, sem distinguir consoante o tipo de categoria de salário, há que observar que o mesmo correspondia a outra opção do BCE no âmbito da sua política de gestão do pessoal.

57      Ora, como exposto nos n.os 40 e 41, supra, por um lado, quando estabelece regras relativas a questões sobre o regime aplicável ao pessoal que emprega, o BCE dispõe de uma ampla autonomia em razão da sua independência funcional. Por outro lado, as instituições dispõem de um amplo poder de apreciação para determinar o interesse do serviço, limitando‑se a fiscalização jurisdicional a verificar se as opções tomadas não resultam de um erro manifesto.

58      Neste contexto, há que tomar em consideração o facto de que, como resulta nomeadamente dos n.os 51 a 54, supra, o critério de antiguidade adotado para o programa‑piloto da ATP assentava numa base objetiva e era coerente com a estrutura de carreiras do BCE baseada no tipo de trabalho realizado.

59      Além disso, como o BCE sublinhou, um critério baseado no facto de ter sido alcançado o limite máximo de uma categoria de salário seria suscetível tornar elegíveis para a ATP membros do pessoal recentemente recrutados, mas num nível muito elevado de uma categoria de salário.

60      Além disso, tal critério poderia criar outra diferença de tratamento. Com efeito, resulta das respostas dadas pelo BCE às questões escritas colocadas pelo Tribunal Geral que, dos 987 membros do pessoal classificados numa categoria de salário dupla em 1 de janeiro de 2013, apenas 161 tinham sido classificados quando do seu recrutamento num escalão correspondente a um escalão da categoria de salário simples superior. Por conseguinte, o referido critério favoreceu uma minoria de membros do pessoal, a saber, os que, de entre essas 161 pessoas, tinham sido classificados, quando do seu recrutamento, num escalão relativamente próximo do limite máximo da sua categoria de salário dupla. Pelo contrário, admitindo que uma progressão anual de quatro a cinco escalões possa ser considerada normal por referência à progressão do recorrente na sua categoria de salário (passagem do escalão 136 para o escalão 169 em 7 anos e meio), a probabilidade de os membros do pessoal classificados inicialmente na parte inferior de uma categoria de salário dupla serem elegíveis era reduzida ou mesmo nula.

61      Por outro lado, as dificuldades salientadas nos n.os 58 e 59, supra, que teriam exigido a previsão de disposições suplementares para evitar situações pouco razoáveis ou evitar importantes diferenças de tratamento, corroboram a afirmação do BCE segundo a qual a medida controvertida respondia ao objetivo de conceber regras simples e fáceis de aplicar.

62      Do mesmo modo, há que salientar que a afirmação segundo a qual os membros do pessoal que atingiram o limite máximo da categoria de salário a que pertencem já não tinham perspetivas de carreira — que o recorrente destaca para demonstrar o caráter adequado do critério alternativo que preconiza — não tem em conta todas as perspetivas de carreira no BCE. Com efeito, há que salientar que estas perspetivas resultam não só da progressão de escalão numa determinada categoria de salário mas também da evolução do desempenho em certos tipos de funções e, geralmente, das possibilidades de promoção interna, numa categoria de salário superior. Ora, estas possibilidades são importantes para os membros do pessoal que têm uma grande experiência profissional, como é necessariamente o caso dos que se encontram no topo da sua categoria de salário. Além disso, um dos objetivos prosseguidos pela ATP é precisamente favorecer a promoção interna através da libertação de postos de trabalho devido à saída antecipada de certos membros do pessoal que ocupam postos de trabalho nas categorias de salário superiores, de modo que a própria ATP contém uma resposta ao tipo de preocupações evidenciadas pelo recorrente.

63      Por último, não é desprovido de interesse para a apreciação do caráter proporcionado do critério de antiguidade em causa salientar que este estava integrado num programa‑piloto que devia ser objeto de uma avaliação a posteriori, como resulta do considerando 2 da Decisão ECB/2012/NP18 (v., por analogia, Acórdão de 7 de março de 2017, RPO, C‑390/15, EU:C:2017:174, n.o 69).

64      Por conseguinte, mesmo admitindo que a situação dos membros do pessoal classificados numa categoria de salário dupla seja comparável à situação dos membros do pessoal classificados numa categoria de salário simples à luz do objeto e dos objetivos da ATP, não se pode considerar que constituía um erro manifesto o facto de se adotar, para o programa‑piloto da ATP, o critério de antiguidade controvertido, que se afigura, assim, justificado.

65      Resulta do conjunto das considerações precedentes que o artigo 2.3.1 das regras aplicáveis ao pessoal não era contrário ao princípio da igualdade de tratamento nem, na medida em que essas questões possam ser objeto de um exame distinto, enferma de uma violação do princípio da proporcionalidade ou de um erro manifesto de apreciação, na parte em que fixava um limiar de elegibilidade para o programa‑piloto da ATP correspondente a doze anos de antiguidade para os membros do pessoal classificados nas categorias de salário duplas, enquanto esse limiar era de oito anos de antiguidade para os classificados nas categorias de salário simples.

66      Por conseguinte, o primeiro fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo à ilegalidade do artigo 2.3.1 das regras aplicáveis ao pessoal em razão da violação do artigo 21.o da Carta e da Diretiva 2000/78, devido a uma discriminação baseada na idade

67      Segundo o recorrente, as pessoas que se encontrem ao mesmo nível nas categorias de salário estão aproximadamente na mesma faixa etária. Ora, dado que os membros do pessoal classificados numa categoria de salário dupla deviam esperar mais quatro anos para serem elegíveis para o programa‑piloto da ATP do que os classificados numa categoria de salário simples, o recorrente sustenta que deviam ser mais velhos do que estes últimos para poderem beneficiar desse programa. Por conseguinte, o artigo 2.3.1 das regras aplicáveis ao pessoal contém um requisito de idade implícito. Este requisito traduz‑se numa discriminação baseada diretamente na idade dos membros do pessoal classificados numa categoria de salário dupla e esta discriminação não é objetivamente justificada, pelas mesmas razões que as expostas no âmbito do primeiro fundamento.

68      O BCE alega que não existe correlação entre a idade e a classificação numa categoria de salário simples ou a classificação numa categoria de salário dupla, nem entre a idade e a antiguidade numa categoria de salário, nem entre a idade e o nível da classificação numa categoria de salário. Por conseguinte, não há nenhuma diferença de tratamento direta ou indiretamente relacionada com a idade.

69      Importa recordar que o princípio da não discriminação em razão da idade, que constitui um princípio geral do direito da União, foi concretizado pela Diretiva 2000/78 no domínio do emprego e da atividade profissional (Acórdão de 19 de janeiro de 2010, Kücükdeveci, C‑555/07, EU:C:2010:21, n.o 21) e que a proibição de qualquer discriminação baseada, nomeadamente, na idade consta do artigo 21.o da Carta. Por outro lado, a Diretiva 2000/78 não só constitui uma fonte de inspiração admitida no âmbito do contencioso relativo ao pessoal das instituições da União, tratando‑se de determinar as obrigações da autoridade reguladora competente no que respeita ao princípio da não discriminação em razão da idade (v., neste sentido, Acórdão de 7 de fevereiro de 2019, RK/Conselho, T‑11/17, EU:T:2019:65, n.os 68 a 70 e jurisprudência referida), mas, além disso, no que respeita ao BCE, vincula este último por força do artigo 9.o, alínea c), do regime aplicável.

70      No caso em apreço, há que declarar que os requisitos de elegibilidade para o programa‑piloto da ATP não continham nenhuma referência direta à idade dos membros do pessoal.

71      Por outro lado, a distinção efetuada entre os membros do pessoal consoante o tipo de categoria de salário a que pertencem não tem implicação no que respeita à sua idade.

72      A este propósito, importa sublinhar que a antiguidade numa categoria de salário, seja ela qual for, é determinada unicamente em função do momento em que uma pessoa foi recrutada ou, eventualmente, foi promovida a uma categoria de salário.

73      Quanto à situação do recorrente na qual este baseia o seu recurso, a saber, o recrutamento numa categoria de salário dupla, há que observar que esse recrutamento é possível em qualquer fase da carreira, nomeadamente na segunda parte desta, como o exemplo do recorrente demonstra, mas também mais cedo na carreira, ou mesmo no início da carreira.

74      Este segundo caso é, aliás, o mais frequente, uma vez que, como resulta de dados emanados do BCE e reproduzidos nos articulados do recorrente, das 458 pessoas recrutadas por esta instituição entre 2010 e 2012, 82 % foram classificadas na primeira parte de uma categoria de salário dupla.

75      Consequentemente, é possível que a entrada em funções no BCE, e, portanto, a classificação numa categoria de salário, ocorra quase em qualquer fase da vida profissional e, portanto, quase em qualquer idade correspondente a esse período da existência.

76      Decorre do exposto que não se pode excluir que um membro do pessoal, por ter sido recrutado no início da carreira, tenha doze anos de antiguidade numa categoria de salário dupla antes de ter completado 40 anos, de modo que seria elegível para o programa‑piloto da ATP, nem que um membro do pessoal, porque foi recrutado ou promovido em fim de carreira, não tenha adquirido oito anos de antiguidade numa categoria de salário simples aos 55 anos, de modo que não seria elegível para esse programa.

77      É certo que seria possível que, no caso de duas pessoas recrutadas no mesmo momento e com a mesma idade, mas uma numa categoria de salário simples e a outra numa categoria de salário dupla, uma fosse elegível para o programa‑piloto da ATP e a outra não. Todavia, esta situação resultaria não de uma discriminação em razão da idade, mas do momento do recrutamento e do tipo de categoria de salário a que pertenciam, que é determinado pelo tipo de função exercida, ou seja, parâmetros independentes da idade cujo segundo foi considerado coerente com os objetivos e o objeto da ATP no âmbito da resposta ao primeiro fundamento.

78      Acresce que, embora o recorrente conclua o seu raciocínio quanto à existência de uma diferença de tratamento baseada na idade, no n.o 80 da petição, enunciando que a ATP «prevê uma diferença de tratamento diretamente baseada na idade», invoca, no n.o 72 da petição, a existência de uma discriminação indireta baseada na idade, pelo que há que examinar esta última eventualidade.

79      De acordo com a definição que figura no artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 2000/78, considera‑se que existe discriminação indireta sempre que uma disposição, critério ou prática aparentemente neutra seja suscetível de colocar numa situação de desvantagem pessoas de uma determinada classe etária, comparativamente com outras pessoas, a não ser que essa disposição, critério ou prática seja objetivamente justificada por um objetivo legítimo e que os meios utilizados para o alcançar sejam adequados e necessários. Por outro lado, decorre do artigo 10.o, n.o 1, desta diretiva que o reconhecimento de uma discriminação deve assentar em elementos de facto constitutivos da presunção de discriminação direta ou indireta.

80      No caso em apreço, resulta dos dados quantitativos que figuram no balanço elaborado após o termo da ATP (anexo A.14) que a implementação desta medida resultou na saída antecipada de 7 pessoas com menos de 45 anos, 15 pessoas com idades compreendidas entre os 45 e os 54 anos e 23 pessoas com mais de 54 anos. Estes números demonstram que, concretamente, o critério de antiguidade controvertido não favoreceu nem desfavoreceu, de entre os membros do pessoal, os de uma determinada faixa etária.

81      Além disso, mesmo admitindo que possa existir, no caso em apreço, um nexo entre o critério de antiguidade e a idade, importa salientar que, em todo o caso, uma eventual diferença de tratamento parece ser justificada pelas mesmas razões de interesse do serviço que as expostas nos n.os 48 e 50 a 54, supra, no âmbito da resposta ao primeiro fundamento, dado que o princípio da não discriminação, nomeadamente baseada na idade, enunciado no artigo 21.o da Carta, é apenas uma expressão particular do princípio da igualdade de tratamento, consagrado no artigo 20.o da Carta (v., neste sentido, Acórdão de 7 de fevereiro de 2019, RK/Conselho, T‑11/17, EU:T:2019:65, n.o 60 e jurisprudência referida).

82      Consequentemente, há que declarar que o artigo 2.3.1 das regras aplicáveis ao pessoal não continha uma discriminação em razão da idade em detrimento dos membros do pessoal classificados numa categoria de salário dupla, uma vez que fixava um limiar de elegibilidade para o programa‑piloto da ATP correspondente a doze anos de antiguidade para os membros do pessoal classificados nas categorias de salário duplas, enquanto esse limiar era de oito anos de antiguidade para os membros do pessoal classificados nas categorias de salário simples.

83      Por conseguinte, o segundo fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo a um erro manifesto de apreciação e a uma violação do dever de solicitude

84      O recorrente sustenta que o BCE cometeu simultaneamente um erro manifesto de apreciação e um incumprimento do dever de solicitude ao não proceder a um exame suficientemente aprofundado das implicações do requisito de antiguidade controvertido, quando este implicava uma distorção à luz do próprio princípio da transição profissional e uma discriminação ou injustiça em certos casos, e ao não interpretar o artigo 2.3.1 das regras aplicáveis ao pessoal a fim de evitar essas consequências. No que respeita ao recorrente, tal poderia ser nomeadamente o caso, em aplicação da nova regulamentação, que já não faz distinção consoante as categorias de salário simples ou duplas, no âmbito das medidas para execução do Acórdão de 17 de novembro de 2017, Teeäär/BCE (T‑555/16, não publicado, EU:T:2017:817).

85      O BCE contesta a procedência deste fundamento. Alega, nomeadamente, que o dever de solicitude está limitado pelo respeito das normas, pelo que não podia aplicar derrogações não previstas no artigo 2.3.1 das regras aplicáveis ao pessoal nem violar o âmbito de aplicação ratione temporis desta disposição e da que a substituiu.

86      A título preliminar, importa salientar que decorre da resposta ao primeiro fundamento que o presente fundamento não pode ser acolhido, uma vez que se baseia no pressuposto de que o requisito de antiguidade controvertido provocava uma distorção à luz do próprio princípio da transição profissional. Por conseguinte, há que examinar se o dever de solicitude impunha que o BCE aceitasse a candidatura à ATP do recorrente pelo motivo de que, no seu caso, o requisito de elegibilidade previsto no artigo 2.3.1 das regras aplicáveis ao pessoal conduziu a um resultado desfavorável e inadequado.

87      A este respeito, basta observar que a disposição em causa não previa nenhuma exceção nem possibilidade de derrogação ao requisito de antiguidade, pelo que o BCE estava obrigado a aplicar este requisito.

88      Com efeito, o dever de solicitude da administração relativamente aos seus agentes reflete o equilíbrio dos direitos e das obrigações recíprocas nas relações entre a autoridade pública e os agentes do serviço público. Este dever implica nomeadamente que, quando decide sobre a situação de um membro do seu pessoal, a autoridade tome em consideração todos os elementos suscetíveis de determinar a sua decisão e que, ao fazê‑lo, tenha em conta não só o interesse do serviço mas também o interesse do membro do pessoal em causa. Todavia, a proteção dos direitos e dos interesses dos membros do pessoal deve ser sempre limitada no respeito das normas em vigor (v., por analogia, Acórdão de 5 de dezembro de 2006, Angelidis/Parlamento, T‑416/03, EU:T:2006:375, n.o 117 e jurisprudência referida).

89      Consequentemente, o BCE não pode ser criticado por ter aplicado o artigo 2.3.1 das regras aplicáveis ao pessoal na versão em vigor à data da apresentação da candidatura do recorrente ao programa‑piloto da ATP.

90      Por conseguinte, o terceiro fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação do artigo 2.3.1 das regras aplicáveis ao pessoal

91      O recorrente sustenta que o conceito de «categoria de salário dupla» não está claramente definido no Regulamento aplicável ao pessoal do BCE e sublinha que o seu contrato não mencionava que a «categoria de salário F/G» (F/G — Band) na qual foi classificado era uma «categoria de salário dupla» (broadband). Tendo em conta estas imprecisões, há que considerar que o recorrente estava classificado numa categoria de salário simples na aceção do artigo 2.3.1 das regras aplicáveis ao pessoal e, portanto, que só devia justificar oito anos de antiguidade, pelo que a sua candidatura ao programa‑piloto da ATP era admissível.

92      O BCE alega que o anexo 1, ponto 4, do regime aplicável contém uma definição do conceito de categoria de salário dupla. Salienta igualmente que o regime aplicável é expressamente parte integrante do contrato do demandante e que este último estava contratualmente classificado nas categorias de salário adjacentes F e G. Portanto, é irrelevante que o contrato do recorrente mencionasse «categoria de salário F/G», sem precisar que se tratava de uma categoria de salário dupla.

93      Importa observar que o conceito de categoria de salário dupla está efetivamente definido no anexo 1, ponto 4, do regime aplicável como «um conjunto de duas categorias de salário adjacentes». Esta definição deve ser relacionada com a estrutura dos salários que figura no ponto 1 desse anexo, que inclui as categorias A, B, C, D, E, F, E/F, G, F/G, H, I, J, K e L, de que resulta que só as categorias de salário E/F e F/G são um conjunto de duas categorias de salário adjacentes.

94      Ora, como sustenta o BCE, o regime aplicável fazia parte do contrato de trabalho do recorrente, uma vez que figurava no anexo à carta do BCE de 9 de fevereiro de 2004 que continha as condições de contratação deste, enquanto parte integrante desse contrato.

95      Consequentemente, a expressão «F/G — Band» que figura na referida carta deve ser interpretada no sentido de que prevê a classificação do recorrente na categoria de salário dupla F/G, na qualidade de perito de produção, independentemente do facto de o termo «dupla» (broad) não estar mencionado.

96      Além disso, resulta da nota incluída pelo recorrente anexada à sua candidatura ao programa‑piloto da ATP que este tinha interpretado dessa forma a carta do BCE de 9 de fevereiro de 2004 que contém as condições da sua contratação.

97      Consequentemente, há igualmente que julgar improcedente o quarto fundamento apresentado pelo recorrente em apoio das suas alegações de anulação e, portanto, o pedido de anulação.

 Quanto aos pedidos de indemnização

98      O recorrente pede a condenação do BCE a pagar‑lhe uma quantia correspondente à ajuda que teria recebido caso a sua candidatura ao programa‑piloto da ATP tivesse sido aceite, estimada em 101 447 euros, acrescida de juros.

99      O BCE pede que os pedidos de indemnização sejam julgados improcedentes uma vez que, em seu entender, os pedidos de anulação que estão estreitamente relacionados devem igualmente ser julgados improcedentes.

100    A este respeito, basta recordar que os pedidos de indemnização de danos materiais ou morais devem ser julgados improcedentes quando apresentem uma estreita relação com os pedidos de anulação que devam, eles próprios, ser julgados improcedentes (Acórdão de 24 de abril de 2017, HF/Parlamento, T‑570/16, EU:T:2017:283, n.o 69; v. também, neste sentido, Acórdãos de 6 de março de 2001, Connolly/Comissão, C‑274/99 P, EU:C:2001:127, n.o 129; e de 14 de setembro de 2006, Comissão/Fernández Gómez, C‑417/05 P, EU:C:2006:582, n.o 51).

101    Uma vez que o pedido de anulação da decisão impugnada deve ser julgado improcedente, há que julgar os pedidos de indemnização improcedentes e, por conseguinte, negar provimento ao recurso na sua totalidade.

 Quanto às despesas

102    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo o recorrente sido vencido, há que condená‑lo nas despesas, nos termos do pedido do BCE.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      Raivo Teeäär é condenado nas despesas.

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 26 de março de 2020.

Assinaturas


*      Língua do processo: inglês.