Language of document : ECLI:EU:T:2021:153

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção alargada)

24 de março de 2021 (*)

[Texto retificado por Despacho de 16 de abril de 2021]

«Função pública — Agentes contratuais — Reforma do Estatuto de 2014 — Medidas transitórias relativas a certas modalidades de cálculo dos direitos a pensão — Alteração do regime na sequência da assinatura de um novo contrato de agente contratual — Conceito de “ter contrato”»

No processo T‑769/16,

Maxime Picard, residente em Hettange‑Grande (França), representado por M.‑A. Lucas e M. Bertha, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por B. Mongin e G. Gattinara, na qualidade de agentes,

recorrida,

[Conforme retificado por Despacho de 16 de abril de 2021] que tem por objeto um pedido apresentado nos termos do artigo 270.o TFUE e destinado à anulação, por um lado, da resposta do gestor do Setor «Pensões» do Serviço «Gestão e Liquidação dos Direitos Individuais» (PMO) da Comissão de 4 de janeiro de 2016 e, por outro, na medida em que tal seja necessário, da Decisão de 25 de julho de 2016 do Diretor da Direção E da Direção‑Geral dos Recursos Humanos da Comissão que indeferiu a reclamação de 1 de abril de 2016 contra a decisão ou a falta de decisão que resulta da resposta de 4 de janeiro de 2016,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção alargada),

composto por: H. Kanninen, presidente, M. Jaeger, N. Półtorak, O. Porchia (relatora) e M. Stancu, juízes,

secretário: M. Marescaux, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 14 de setembro de 2020,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        O recorrente, Maxime Picard, é um agente contratual da Comissão Europeia.

2        Entre abril de 2004 e junho de 2008, o recorrente foi contratado sucessivamente por duas sociedades como agente de vigilância, a saber, em primeiro lugar, pela sociedade Brinks até 31 de março de 2006, em seguida pela sociedade Group 4 Securicor (a seguir «G 4S») a partir de 1 de abril de 2006. Durante este período, foi posto à disposição quer do Centro de Tradução dos Organismos da União Europeia (CdT), para desempenhar tarefas de natureza administrativa relacionadas com a segurança, quer da Comissão, como formador.

3        Depois de ter sido aprovado, em 2005, no processo de seleção EPSO/CAST/25/05 aberto pelo Serviço Europeu de Seleção do Pessoal (EPSO) com vista à constituição de uma lista de reserva para o recrutamento de agentes contratuais para o primeiro grupo de funções (a seguir «GF I»), o recorrente participou, em 2007, no processo EPSO/CAST/27/07 que dava acesso ao segundo grupo de funções (a seguir «GF II»).

4        Em 14 de abril de 2008, o recorrente foi chamado para uma prova oral de seleção para prover um lugar de agente contratual GF II na unidade 5 do Serviço «Gestão e Liquidação dos Direitos Individuais» (PMO) da Comissão. Foi aprovado nessa prova.

5        Em 10 de junho de 2008, o recorrente foi recrutado pela Comissão, com efeitos a partir de 1 de julho de 2008, como agente contratual na unidade 5 do PMO (a seguir «contrato de 2008»). Com este recrutamento, efetuado nos termos do processo de seleção EPSO/CAST/25/05, o recorrente foi classificado no GF I, grau 1, escalão 1, ao abrigo do artigo 80.o do Regime aplicável aos outros agentes (a seguir «ROA»).

6        No âmbito do processo de seleção EPSO/CAST/27/07, a Direção‑Geral (DG) dos Recursos Humanos da Comissão considerou que não tinha sido demonstrado que o recorrente preenchia o requisito de três anos de experiência profissional adequada à data‑limite de apresentação das candidaturas previsto no convite à manifestação de interesse, uma vez que as suas funções como empregado das sociedades Brinks e G 4S exercidas no CdT tinham sido, aparentemente, as de agente de vigilância, do GF I.

7        O contrato de 2008 foi renovado três vezes por um período determinado e, por decisão de 3 de maio de 2011, por tempo indeterminado.

8        Em 15 de junho de 2011, o recorrente participou num comité de reclassificação constituído pela unidade 5 do PMO para lhe propor uma reclassificação para o GF II. Foi considerado elegível sob reserva de confirmação da DG «Recursos humanos» da Comissão. A unidade 7 do PMO encarregada dos recursos humanos apresentou, portanto, um pedido de reclassificação a essa direção‑geral.

9        Por correio eletrónico de 9 de dezembro de 2011 da DG «Recursos humanos», o recorrente foi informado do indeferimento do pedido de reclassificação por não preencher os requisitos de elegibilidade em 27 de abril de 2007, data‑limite de inscrição no processo EPSO/CAST/27/07, a saber, uma experiência profissional adequada de pelo menos três anos.

10      No ano seguinte, em junho de 2012, o recorrente enviou à unidade 7 do PMO uma declaração de experiência profissional, datada de 1 de junho de 2012, emitida pelo CdT. Esta declaração abrangia o período compreendido entre o mês de abril de 2004 e o mês de julho de 2007 durante o qual o recorrente esteve empregado nas sociedades Brinks e G 4S (v. n.o 2, supra). A referida declaração visava certificar que o recorrente tinha efetivamente desempenhado tarefas do GF II e não do GF I.

11      Com base nessa mesma declaração, a unidade 7 do PMO, no final do mês de junho 2012, pediu informalmente à DG «Recursos humanos» que analisasse novamente o pedido de reclassificação indeferido em 2011 (v. n.os 8 e 9, supra).

12      Contudo, a DG «Recursos humanos» manifestou dúvidas quanto à possibilidade de alterar a sua posição, uma vez que a declaração do CdT foi emitida cinco anos após os factos, não provinha dos empregadores do recorrente (sociedades Brinks e G 4S), mas sim do respetivo cliente, o CdT, e parecia contradizer uma declaração mais antiga emitida pela G 4S em 2008. Na sequência desta tomada de posição informal, a unidade 7 do PMO absteve‑se de apresentar um pedido oficial de reclassificação em benefício do recorrente.

13      Em 2014, a unidade 7 do PMO dirigiu à DG «Recursos humanos» um pedido de recrutamento para um lugar GF II, com fundamento numa nova declaração diretamente emitida pela sociedade Brinks, datada de 31 de março de 2014, a qual confirmava as informações fornecidas em 2012 pelo CdT, sem, no entanto, especificar a natureza das tarefas desempenhadas pelo recorrente, contratado como agente de vigilância.

14      Tendo em consideração esse novo elemento e na medida em que essa declaração era pouco pormenorizada, a DG «Recursos humanos» entrou em contacto com a sociedade Brinks no sentido de confirmar o conteúdo da mesma. Isto levou finalmente, em 25 de abril de 2014, à confirmação das declarações de 31 de março de 2014 da sociedade Brinks e de 1 de junho de 2012 do CdT pelo chefe dos recursos humanos da sociedade Brinks, apresentando elementos comprovativos de que o recorrente tinha efetivamente desempenhado tarefas «adequadas» do GF II durante todo o período do seu contrato com essa sociedade, a saber, de 1 de abril de 2004 a 31 de março de 2006.

15      Atendendo a essa declaração e na sequência de um novo ato de candidatura que o recorrente pôde apresentar na medida em que constava da base de dados constituída no termo do procedimento EPSO/CAST/27/07, cuja validade tinha sido prorrogada até ao final de dezembro de 2016, em 16 de maio de 2014 a DG «Recursos humanos» propôs ao recorrente um novo contrato como agente contratual, que este assinou no mesmo dia, com base no artigo 3.o‑A do ROA (a seguir «contrato de 16 de maio de 2014»). Este contrato, por tempo indeterminado, entrou em vigor em 1 de junho de 2014, com a classificação do recorrente no GF II, grau 5, escalão 1.

16      Em 20 de agosto de 2014, o recorrente apresentou uma reclamação nos termos do artigo 90.o, n.o 2, do Estatuto dos Funcionários da União Europeia (a seguir «Estatuto») contra o contrato de 16 de maio de 2014. Alegava, em substância, que o contrato de 16 de maio de 2014, que o classifica no GF II, devia ter entrado em vigor a partir de 1 de julho de 2008, data em que ele tinha sido inicialmente recrutado como agente contratual no GF I.

17      Por decisão de 10 de dezembro de 2014, comunicada ao recorrente em 11 de dezembro de 2014, o diretor da Direção B da DG «Recursos humanos», na qualidade de autoridade habilitada a celebrar contratos de admissão indeferiu a referida reclamação, a título principal, por ser inadmissível por intempestiva, e a título subsidiário, por ser improcedente.

18      O recorrente não interpôs recurso no Tribunal da União desta decisão de 10 de dezembro de 2014, pelo que a mesma transitou, portanto, em julgado.

19      Entretanto, o Estatuto e o ROA foram alterados pelo Regulamento (UE, Euratom) n.o 1023/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2013, que altera Estatuto dos Funcionários da União Europeia e o Regime aplicável aos outros agentes da União Europeia (JO 2013, L 287, p. 15), o qual entrou em vigor em 1 de novembro de 2013, e é aplicável, no que respeita às disposições relevantes no presente processo, a partir de 1 de janeiro de 2014 (a seguir «reforma de 2014»).

20      Na sequência da reforma de 2014, o artigo 77.o, segundo parágrafo, do Estatuto, também aplicável aos agentes contratuais por remissão do artigo 109.o, n.o 1, do ROA, define uma nova taxa anual de aquisição dos direitos a pensão de 1,8 %, menos favorável do que a taxa anterior de 1,9 %. Além disso, o artigo 77.o, quinto parágrafo, do Estatuto fixa a idade de aposentação em 66 anos, anteriormente fixada em 63 anos.

21      Todavia, foi previsto um regime transitório. Assim, o artigo 21.o, segundo parágrafo, do anexo XIII do Estatuto relativo às «[d]isposições transitórias aplicáveis aos funcionários da União» prevê que o funcionário «que tiver iniciado funções no período entre 1 de maio de 2004 e 31 de dezembro de 2013», não obstante a entrada em vigor do novo artigo 77.o, continua a adquirir direitos a pensão à taxa anual de aquisição de 1,9 %. Além disso, de acordo com o quadro constante do artigo 22.o, n.o 1, segundo parágrafo, do anexo XIII do Estatuto, «os funcionários com idade igual […] a 35 anos em 1 de maio de 2014 e que tenham iniciado funções antes de 1 de janeiro de 2014 adquirem o direito à pensão de aposentação [aos] 64 anos e 8 meses» (a seguir «artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto», bem como as «disposições transitórias relativas à taxa anual de aquisição dos direitos a pensão e à idade de aposentação»). Por último, o artigo 1.o, n.o 1, do anexo do ROA prevê que, excetuando o artigo 22.o, n.o 4, do anexo XIII do Estatuto, essas disposições transitórias relativas à taxa anual de aquisição dos direitos a pensão e à idade de aposentação «são aplicáveis por analogia a outros agentes que tenham contrato em 31 de dezembro de 2013».

22      Por correio eletrónico de 4 de janeiro de 2016, o recorrente, tendo dúvidas quanto às implicações que a reforma de 2014 poderia ter sobre a sua situação na sequência da assinatura do contrato de 16 de maio de 2014, solicitou explicações (a seguir «correio eletrónico de 4 de janeiro de 2016») ao gestor do Setor «Pensões» da unidade 4 do PMO (a seguir «gestor do Setor “Pensões”»).

23      Por correio eletrónico do mesmo dia, o gestor do Setor «Pensões» confirmou ao recorrente que os seus direitos a pensão tinham sido alterados devido à mudança do contrato e que, por conseguinte, no que lhe dizia respeito, a idade normal de aposentação e a taxa anual de aquisição dos direitos a pensão tinham passado, respetivamente, para 66 anos e 1,8 % a partir de 1 de junho de 2014 (a seguir «resposta de 4 de janeiro de 2016»).

24      Em 4 de abril de 2016, o recorrente apresentou uma reclamação nos termos do artigo 90.o, n.o 2, do Estatuto, contra a resposta de 4 de janeiro de 2016.

25      Por decisão de 25 de julho de 2016, comunicada ao recorrente em 26 de julho de 2016, o Diretor da Direção E da DG «Recursos humanos», na qualidade de autoridade habilitada a celebrar contratos de admissão, indeferiu essa reclamação, a título principal, por ser inadmissível dada a inexistência de ato lesivo, e a título subsidiário, por ser improcedente (a seguir «decisão de indeferimento de 25 de julho de 2016»).

 Tramitação processual e pedidos das partes

26      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 7 de novembro de 2016, o recorrente interpôs o presente recurso.

27      Por requerimento separado apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 6 de fevereiro de 2017, a Comissão suscitou uma exceção de inadmissibilidade nos termos do artigo 130.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral. A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        declarar o recurso manifestamente inadmissível;

–        condenar o recorrente nas despesas.

28      Em 24 de abril de 2017, o recorrente apresentou as suas observações sobre a exceção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão nas quais conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        julgar improcedente a exceção de inadmissibilidade ou, pelo menos, reservar para final a sua apreciação;

–        julgar procedentes os pedidos constantes da sua petição.

29      Por decisão de 12 de outubro de 2017, o presidente da Terceira Secção do Tribunal Geral, após ter ouvido as partes, decidiu suspender o processo com base no artigo 69.o, alínea d), do Regulamento de Processo, até ao trânsito em julgado da decisão que põe termo à instância no processo T‑128/17, Torné/Comissão.

30      Na sequência da prolação do Acórdão de 14 de dezembro de 2018, Torné/Comissão (T‑128/17, EU:T:2018:969), e não tendo sido interposto recurso deste último, no prazo fixado as partes apresentaram as respetivas observações sobre as consequências do referido acórdão para o presente processo.

31      Por Despacho de 13 de maio de 2019, em conformidade com o artigo 130.o, n.o 7, do Regulamento de Processo, o Tribunal Geral (Terceira Secção) decidiu reservar para final a decisão sobre a exceção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão, assim como a decisão quanto às despesas.

32      Por carta de 16 de maio de 2019, o juiz‑relator propôs às partes analisarem as possibilidades de uma resolução amigável do litígio. Não foi conseguido acordo entre as partes para analisarem essas possibilidades.

33      Em 27 de junho de 2019, a Comissão apresentou a contestação. A réplica e a tréplica foram apresentadas, respetivamente, em 15 de outubro e em 26 de novembro de 2019.

34      Tendo a composição das secções do Tribunal Geral sido alterada, em aplicação do artigo 27.o, n.o 5, do Regulamento de Processo, o presidente do Tribunal Geral reatribuiu o processo a outro juiz‑relator, que foi afetado à Primeira Secção na sua nova formação, à qual o presente processo foi, por conseguinte, atribuído.

35      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 18 de dezembro de 2019, o recorrente requereu a realização de audiência de alegações.

36      Em 28 de abril de 2020, o Tribunal Geral (Primeira Secção), no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o, n.o 3, do seu Regulamento de Processo, colocou, por escrito, questões às partes. Estas responderam no prazo fixado.

37      No mesmo dia, o Tribunal Geral, através de uma medida de organização do processo prevista no artigo 89.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, interrogou as partes sobre a questão de saber se pretendiam ser ouvidas numa audiência de alegações apesar da crise sanitária ligada à COVID‑19.

38      A Comissão e o recorrente responderam, respetivamente, em 30 de abril e em 29 de julho de 2020, que pretendiam ser ouvidos.

39      Sob proposta da Primeira Secção, o Tribunal Geral, em 3 de junho de 2020, decidiu, em aplicação do artigo 28.o do Regulamento de Processo, remeter o processo a uma formação de julgamento alargada.

40      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões orais do Tribunal Geral na audiência de 14 de setembro de 2020.

41      O recorrente conclui pedindo ao Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão que fixou antecipadamente certos elementos dos seus direitos a pensão ou a não adoção dessa decisão imposta pelo Estatuto que resulta da mensagem que lhe foi dirigida em 4 de janeiro de 2016 pelo gestor do Setor «Pensões», em resposta à sua questão do mesmo dia, indicando‑lhe que o cálculo dos seus direitos a pensão tinha sido alterado na sequência da sua nova contratação no GF II com efeitos a 1 de junho de 2014, passando a idade de acesso à reforma para os 66 anos e a taxa anual de aquisição dos seus direitos a pensão para 1,8 % a partir de 1 de junho de 2014;

–        anular, na medida em que tal seja necessário, a decisão de 25 de julho de 2016 do Diretor da Direção E da DG «Recursos humanos» da Comissão, na medida em que indefere por inadmissível devido à inexistência de ato lesivo e, a título subsidiário, por improcedente a reclamação de 1 de abril de 2016, apresentada pelo recorrente contra a decisão ou a falta de decisão que resulta da resposta de 4 de janeiro de 2016;

–        condenar a Comissão nas despesas.

42      A Comissão concluiu pedindo ao Tribunal Geral se digne:

–        declarar o recurso manifestamente inadmissível ou, a título subsidiário, improcedente;

–        condenar o recorrente nas despesas.

 Questão de direito

 Quanto à admissibilidade

43      No âmbito da sua exceção de inadmissibilidade, a Comissão suscita‑a com base na inexistência de ato lesivo na aceção do artigo 91.o do Estatuto. A Comissão reitera e desenvolve os seus argumentos quanto à admissibilidade do recurso na contestação.

44      O recorrente, por um lado, contesta a exceção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão e, por outro, alega que os argumentos da mesma constantes da contestação relativos à admissibilidade do recurso não devem ser tomados em consideração.

45      A este respeito, importa recordar que o juiz da União pode apreciar, consoante as circunstâncias de cada caso específico, se uma boa administração da justiça justifica negar provimento ao presente recurso, sem decidir previamente da exceção de inadmissibilidade suscitada pelo recorrente (Acórdãos de 26 de fevereiro de 2002, Conselho/Boehringer, C‑23/00 P, EU:C:2002:118, n.os 50 a 52, e de 13 de janeiro de 2017, Deza/ECHA, T‑189/14, EU:T:2017:4, n.o 26).

46      Nas circunstâncias do caso em apreço, o Tribunal Geral considera que, por razões de economia processual, importa examinar de imediato os fundamentos invocados pelo recorrente, sem se pronunciar previamente sobre a exceção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão e, consequentemente, sobre a respetiva inadmissibilidade oposta pelo recorrente, sendo o recurso, em todo o caso e pelos fundamentos a seguir expostos, improcedente.

 Quanto ao mérito

47      Com o seu recurso, o recorrente pede a anulação, por um lado, da resposta de 4 de janeiro de 2016 e, por outro, na medida em que tal seja necessário, da decisão de indeferimento de 25 de julho de 2016.

48      O recorrente invoca um único fundamento de recurso, relativo a um erro de direito e à violação do artigo 77.o, segundo e quinto parágrafos, do Estatuto, aplicável aos agentes contratuais por força do artigo 109.o do ROA, bem como dos artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto, na medida em que decorre da resposta de 4 de janeiro de 2016 que a data de início de funções tomada em consideração para a aplicação das referidas disposições estatutárias foi a de 1 de junho de 2014, data de início do contrato de 16 de maio de 2014, quando devia ter sido considerada a data de 1 de julho de 2008, na qual inicialmente entrou em funções na Comissão, como agente contratual do GF I.

49      Este fundamento está dividido em duas partes, ambas relativas a um erro de direito, a primeira porque a data de início de funções prevista pelos artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto deve ser a do primeiro recrutamento, a segunda porque o contrato de 16 de maio de 2014, que tinha por objeto e por efeito reclassificar o recorrente sem alteração substancial de funções, não constituía uma rutura da continuidade na sua carreira.

50      Mais especificamente, em apoio da primeira parte, o recorrente observa, a título preliminar, que a resposta de 4 de janeiro de 2016 o excluiu do âmbito de aplicação dos artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto pelo mero facto de ele ter acedido em 1 de junho de 2014 ao GF II através de um novo contrato que, como teria sido especificado na decisão de indeferimento de 25 de julho de 2016, pôs termo ao contrato anterior e era constitutivo de um novo recrutamento.

51      A este respeito, o recorrente alega que, mesmo admitindo que o contrato de 16 de maio de 2014 tenha sido constitutivo de um novo recrutamento em 1 de junho de 2014, a data de início de funções prevista pelos artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto seria manifestamente a data do recrutamento inicial dos funcionários e, por analogia, dos outros agentes, incluindo os agentes contratuais, e não a data em que um funcionário está em condições de aceder, após ter sido selecionado num concurso geral, a um lugar pertencente a um grau ou a um grupo de funções superior ao do lugar para o qual tinha sido contratado inicialmente, ou, por analogia, a data em que um agente contratual acede, após ter sido selecionado num processo geral de seleção, a um lugar de um grupo de funções superior, em conformidade com o artigo 87.o, n.o 4, do ROA.

52      Por conseguinte, segundo o recorrente, partindo do princípio de que, para os agentes contratuais, qualquer alteração de estatuto ou de tipo de contrato no âmbito do ROA deve ser considerada uma interrupção na continuidade das funções que desencadeia a aplicação das regras estatutárias aplicáveis à data de início do novo contrato, o PMO e a DG «Recursos humanos» cometeram um erro de direito e violaram o conceito de início de funções constante dos artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto. Por outro lado, para fundamentar esta conclusão, o recorrente remete, por um lado, para o Acórdão de 14 de dezembro de 2011, De Luca/Comissão (T‑563/10 P, EU:T:2011:746, n.os 46 e 48 a 52), e, por outro, para os Acórdãos de 16 de setembro de 2015, EMA/Drakeford (T‑231/14 P, EU:T:2015:639, n.o 40), e de 5 de fevereiro de 2014, Drakeford/EMA (F‑29/13, EU:F:2014:10, n.os 46 a 48).

53      Na réplica, o recorrente especifica que os artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto lhe eram aplicáveis por força do artigo 1, n.o 1, do anexo do ROA, pelo que existia uma condição específica de aplicabilidade das referidas disposições.

54      A este respeito, em primeiro lugar, alega que o argumento da Comissão segundo o qual, para que os artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto se apliquem ao recorrente, este, além de estar em funções em 31 de dezembro de 2013, devia também permanecer em funções na mesma qualidade depois dessa data, constitui uma argumentação que carece simultaneamente de base factual, uma vez que continuava a ser agente contratual GF I em 1 de janeiro de 2014, e jurídica, porque, em substância, a Comissão acrescenta ao texto do artigo 1.o, n.o 1, do anexo do ROA o requisito de ter contrato na mesma qualidade depois dessa data. O mesmo é válido quanto ao argumento da Comissão relativo à expressão «recrutado antes da entrada em vigor [das alterações operadas no Estatuto pelo Regulamento n.o 1023/2013]» constante do considerando 29 do Regulamento n.o 1023/2013.

55      Em segundo lugar, o recorrente alega que a Comissão procede a uma interpretação abusiva do seu correio eletrónico de 4 de janeiro de 2016 como se se baseasse apenas no contrato de 16 de maio de 2014 e ignora a sua argumentação destinada a defender que, em 31 de dezembro de 2013, estava em funções, na aceção do artigo 1.o, n.o 1, do ROA, devido ao seu contrato de 10 de junho de 2008 e não ao de 16 de maio de 2014. Alega igualmente que o contrato de 16 de maio de 2014 não constituía um novo início de funções ou uma descontinuidade no seu contrato que tivesse como resultado que os artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto deixassem de lhe ser aplicáveis. Defender, como faz a Comissão, que a aplicabilidade inicial dos artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto não só exige que se tenha iniciado ou se esteja em funções na véspera da entrada em vigor das novas regras mas também permanecer nessa situação depois dessa data, ou que essa aplicabilidade deve ser apreciada em função da categoria administrativa ou do contrato do interessado quando há uma evolução na sua situação, daria lugar a erros de direito. Seria igualmente errado, em termos jurídicos, considerar que qualquer alteração de estatuto ou de contrato põe termo ao facto de estar em atividade ou em funções ou, ainda, que acarreta uma descontinuidade do serviço ou das funções.

56      Em terceiro lugar, refere o recorrente que decorre dos n.os 90 a 93 do Acórdão de 14 de dezembro de 2018, Torné/Comissão (T‑128/17, EU:T:2018:969), que a necessidade de conciliar os objetivos de preservação dos direitos adquiridos e de controlo dos custos orçamentais impõe que se considere que o critério que permite apreciar o conceito de «pessoal recrutado antes da entrada em vigor da reforma» é a inscrição e contribuição para o regime de pensões da União antes dessa data, que as expressões «recrutado antes da entrada em vigor da reforma» e «início de funções entre 1 de maio de 2004 e 31 de dezembro de 2013» são equivalentes, e que, se o benefício das disposições transitórias pressupõe que o interessado permaneça em funções depois de 31 de dezembro de 2013, tal não é prejudicado por um novo contrato com um novo empregador, desde que não implique uma rutura da continuidade na inscrição e contribuição para aquele regime. Quanto ao recorrente, uma vez que a sua inscrição e a sua contribuição para o regime de pensões da União não foram interrompidas pelo facto de o seu contrato de 16 de maio de 2014 ter sucedido ao de 1 de julho de 2008, tinha, portanto, contrato em 1 de junho de 2014, na aceção do artigo 1.o, n.o 1, do anexo do ROA e estava em funções na aceção dos artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto.

57      Em quarto lugar, o recorrente alega que a celebração de um novo tipo de contrato não põe termo à aplicação dos artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto, mas permite uma evolução da carreira dos agentes que não poderia ocorrer de outro modo sem prejuízo dos seus direitos a pensão.

58      Em apoio da segunda parte, o recorrente alega, em primeiro lugar, que, apesar de, após ter sido selecionado num processo geral de seleção e, através do contrato de 16 de maio de 2014, ter efetivamente acedido a um grupo de funções mais elevado do que aquele para o qual tinha sido inicialmente recrutado, esse novo contrato, todavia, não se inscrevia no âmbito de um regime de emprego previsto pelo ROA diferente do de agente contratual e não implicava uma rutura na sua carreira que se traduzisse numa alteração substancial das suas funções.

59      A este respeito, o recorrente alega, desde logo, que nem a natureza nem o nível das suas funções se alteraram na sequência desse contrato. Em seguida, embora o lugar de agente contratual do GF I fosse denominado de forma diferente do de agente contratual do GF II, ao qual acedeu com o novo contrato, a finalidade geral desses dois lugares, bem como as responsabilidades concretas que lhe incumbiam, tinham sido definidas em termos estritamente idênticos nas duas descrições de lugar. Além disso, como resulta da carta de 16 de maio de 2014, o contrato dessa data incluía uma classificação no grau 5, escalão 1, que implica, por um lado, a tomada em consideração de uma parte da experiência que tinha adquirido na Comissão no GF I e, por outro, que esta experiência era do nível do GF II.

60      Em segundo lugar, o recorrente alega, em substância, que o contrato de 16 de maio de 2014 não afetou a sua inscrição nem a sua contribuição para o regime de pensões da União.

61      A Comissão contesta os argumentos apresentados pelo recorrente tanto em apoio da primeira como da segunda parte.

62      Uma vez que as duas partes do fundamento único estão estritamente relacionadas, devem ser analisadas em conjunto.

63      O presente litígio coloca, em substância, a questão de saber se a assinatura, por um agente contratual como o recorrente, de um novo contrato após a entrada em vigor da reforma de 2014, representa uma alteração do vínculo laboral com a administração da União, que exclui a possibilidade de o referido agente poder beneficiar das disposições transitórias relativas à taxa anual de aquisição dos direitos a pensão e à idade da aposentação.

64      A título preliminar, importa interpretar o artigo 1.o, n.o 1, do anexo do ROA e, assim, especificar quais são os requisitos que determinam, por força do referido artigo, a aplicação aos agentes contratuais dos artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto.

 Quanto ao artigo 1.o, n.o 1, do anexo do ROA e aos requisitos de aplicação dos artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto aos outros agentes sujeitos ao ROA

65      Em primeiro lugar, como se recordou acima no n.o 21, nos termos do artigo 1.o, n.o 1, do anexo do ROA, conforme alterado pelo Regulamento n.o 1023/2013, «[o] artigo 21.o, o artigo 22.o, com exceção do n.o 4, […] do […] anexo [XIII do Estatuto] são aplicáveis por analogia a outros agentes que tenham contrato em 31 de dezembro de 2013».

66      Em segundo lugar, importa referir que os artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto preveem, respetivamente, que o funcionário que tiver iniciado funções no período entre 1 de maio de 2004 e 31 de dezembro de 2013 tem direito a uma taxa anual de aquisição dos direitos a pensão de 1,9 % e que se tiver 35 anos em 1 de maio de 2014 e tiver iniciado as suas funções antes de 1 de janeiro de 2014 adquire o direito à pensão de aposentação aos 64 anos e 8 meses.

67      Como se especificou no considerando 29 do Regulamento n.o 1023/2013, o legislador da União previu, nomeadamente nos artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto e no artigo 1.o, n.o 1, do anexo do ROA, «disposições transitórias para permitir uma aplicação gradual das novas regras e medidas, embora respeitando os direitos adquiridos e as legítimas expectativas do pessoal recrutado antes da entrada em vigor das [referidas] alterações do Estatuto».

68      Enquanto disposições transitórias, são, segundo jurisprudência constante, objeto de uma interpretação estrita, devido ao seu caráter derrogatório (v. Acórdãos de 2 de setembro de 2010, Kirin Amgen, C‑66/09, EU:C:2010:484, n.o 33, e de 17 de janeiro de 2013, Comissão/Espanha, C‑360/11, EU:C:2013:17, n.o 18 e jurisprudência referida) e às suas implicações orçamentais (v., neste sentido, Acórdão de 30 de junho de 2005, Olesen/Comissão, T‑190/03, EU:T:2005:264, n.o 48 e jurisprudência referida), não podendo essa interpretação, no entanto, contrariar os objetivos prosseguidos pelo legislador da União e o sistema estabelecido pelo Estatuto e pelo ROA (v. Acórdão de 14 de dezembro de 2018, Torné/Comissão, T‑128/17, EU:T:2018:969, n.o 80 e jurisprudência referida).

69      Em terceiro lugar, decorre da redação do artigo 1.o, n.o 1, do anexo do ROA que o legislador da União previu uma aplicação por analogia do anexo XIII do Estatuto aos agentes sujeitos ao ROA, pelo que os artigos 21.o e 22.o deste último anexo são aplicáveis aos referidos agentes na medida em que seja possível estabelecer uma analogia entre estes e os funcionários, tendo em consideração as características próprias de cada uma dessas categorias de pessoal.

70      Para este efeito, importa recordar, a título preliminar, de que modo a categoria dos agentes se distingue da dos funcionários.

71      A este respeito, em primeiro lugar, refira‑se que a definição de cada uma das diferentes categorias de pessoas ao serviço da União, quer enquanto funcionários propriamente ditos, quer a título das diferentes categorias de agentes sujeitos ao ROA, corresponde às necessidades legítimas da administração da União e à natureza das tarefas, permanentes ou temporárias, que tem por missão desempenhar (v. Acórdão de 19 de outubro de 2006, De Smedt/Comissão, F‑59/05, EU:F:2006:105, n.o 76 e jurisprudência referida).

72      Em particular, na aceção do artigo 3.o‑A do ROA, o agente contratual, para efeitos do ROA, é o agente não afetado a um lugar previsto no quadro de efetivos anexo à secção do orçamento correspondente à instituição em causa e contratado para exercer funções a tempo parcial ou a tempo inteiro.

73      Além disso, resulta do considerando 36 do Regulamento (CE, Euratom) n.o 723/2004 do Conselho, de 22 de março de 2004, que altera o Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias e o Regime aplicável aos outros agentes das Comunidades Europeias (JO 2004, L 124, p. 1), o qual estabeleceu a categoria dos agentes contratuais, que esta última é, em geral, incumbida de trabalhar enquadrada por funcionários ou pessoal temporário. Por outro lado, importa referir que, segundo o mesmo considerando desse regulamento, os direitos e deveres destes agentes contratuais, particularmente no que respeita à segurança social, às prestações e às condições de trabalho, eram definidos por analogia com os dos agentes temporários.

74      Em contrapartida, os funcionários que, nos termos do artigo 1.o‑A do Estatuto, «[são] […] [quaisquer] pessoa[s] que [tenham] sido nomeada[s], nas condições previstas neste Estatuto, para um lugar permanente de uma das instituições da União, por meio de instrumento emitido pela entidade competente para proceder a nomeações nessa instituição», são os únicos que podem exercer permanentemente tarefas de serviço público.

75      Em segundo lugar, importa sublinhar que, como é especificado na jurisprudência, a diferença entre funcionários e agentes não reside apenas na natureza das tarefas que devem desempenhar mas também, nomeadamente, no facto de, enquanto o vínculo jurídico entre um funcionário e a administração é de natureza estatutária, pelo que os direitos e os deveres dos funcionários podem ser alterados a todo o momento pelo legislador (v., neste sentido, Acórdão de 8 de setembro de 2020, Comissão e Conselho/Carreras Sequeros e o., C‑119/19 P e C‑126/19 P, EU:C:2020:676, n.o 143 e jurisprudência referida), a situação dos agentes sujeitos ao ROA é caracterizada pelo caráter contratual do vínculo laboral (v., neste sentido, Acórdão de 19 de outubro de 2006, De Smedt/Comissão, F‑59/05, EU:F:2006:105, n.o 76 e jurisprudência referida).

76      Daqui resulta que, como acertadamente referiu a Comissão na audiência, se o funcionário entra e permanece ao serviço da administração da União em virtude de um ato de nomeação que permanece inalterado durante toda a sua carreira, um agente contratual entra e permanece em funções ao abrigo de um contrato nos termos do artigo 3.o‑A do ROA enquanto esse contrato vigorar. É, portanto, em virtude de um contrato em vigor que se encontra vinculado à administração da União e que pode exercer as suas funções.

77      Atentas as considerações anteriores, é premente interpretar o artigo 1.o, n.o 1, do anexo do ROA, na medida em que precisa que, para poderem beneficiar das regras transitórias previstas para os funcionários nos artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto, os outros agentes devem «[ter] contrato em 31 de dezembro de 2013», a saber, devem encontrar‑se contratados na aceção do artigo 3.o‑A do ROA nessa data.

78      No caso em apreço, as partes opõem‑se, nomeadamente quanto ao que se deve entender por «[ter] contrato em 31 de dezembro de 2013» na aceção do artigo 1.o, n.o 1, do anexo do ROA.

79      Com efeito, a este respeito, a Comissão alega que, para que os artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto sejam aplicáveis aos outros agentes, não só o agente deve ter contrato numa determinada data, a saber, em 31 de dezembro de 2013, como deve «permanecer em funções/permanecer no ativo», a saber, deve ter mantido a sua situação laboral tanto em 31 de dezembro de 2013 como depois desta data. Por conseguinte, segundo a Comissão, qualquer mudança de contrato implica uma rutura do vínculo laboral com a administração da União pelo que o agente não pode beneficiar da aplicação dos artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto.

80      Em contrapartida, o recorrente alega, em substância, que, para que os artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto sejam aplicáveis a um agente sujeito ao ROA, basta que este último se encontre recrutado mediante contrato em 31 de dezembro de 2013, independentemente de qualquer mudança de contrato posterior. Por conseguinte, acusa a Comissão de acrescentar ao requisito «ter contrato em 31 de dezembro de 2013», previsto pelo artigo 1.o, n.o 1, do anexo do ROA, um requisito adicional, a saber, o requisito de permanecer ininterruptamente em funções depois dessa data.

81      A este título, importa referir que, contrariamente ao que alega o recorrente, a Comissão não acrescenta um requisito, mas limita‑se a interpretar o conceito de «por analogia» constante do artigo 1.o, n.o 1, do anexo do ROA, que pressupõe que os agentes se encontram numa situação análoga à dos funcionários. Com efeito, esta situação só pode ser demonstrada no caso de o agente não ter assinado um novo contrato que implique o início de uma nova relação de trabalho com a administração da União. A este respeito, importa recordar que, segundo a jurisprudência, o contrato corresponde ao instrumento jurídico que concretiza a relação de trabalho entre um agente, por um lado, e a administração da União, por outro. Mais precisamente, o Tribunal Geral declarou que essa relação de trabalho se pode manter inalterada, mesmo na sequência da assinatura de um novo contrato formalmente distinto do contrato inicial, desde que o último contrato não implique uma alteração substancial das funções do agente, designadamente do grupo de funções, suscetível de pôr em causa a continuidade funcional da sua relação de trabalho com a administração da União (v., neste sentido, Acórdão de 16 de setembro de 2015, EMA/Drakeford, T‑231/14 P, EU:T:2015:639, n.o 40).

82      Por conseguinte, resulta de todas as considerações anteriores que os artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto são disposições transitórias aplicáveis, em conformidade com o artigo 1.o, n.o 1, do anexo do ROA, por analogia aos outros agentes em funções em 31 de dezembro de 2013 e que as mantenham, depois dessa data, mediante um contrato, como acima se definiu no n.o 81, até que a sua posição seja analisada para efeitos do cálculo dos direitos a pensão.

83      Esta interpretação permite, por um lado, reconhecer, adotando uma abordagem funcional, o valor jurídico da assinatura de um novo contrato no âmbito do ROA e, por outro, respeitar os direitos adquiridos e as legítimas expectativas do pessoal, em conformidade com o considerando 29 do Regulamento n.o 1023/2013.

84      É à luz das observações anteriores que importa verificar se a assinatura de um novo contrato após a entrada em vigor da reforma de 2014 exclui a aplicação dos artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto à situação do recorrente.

 Quanto à situação do recorrente

85      No caso em apreço, em primeiro lugar, importa recordar que o recorrente foi recrutado como agente contratual pela primeira vez em 2008 mediante um contrato a termo que foi renovado três vezes, e posteriormente, por tempo indeterminado, a partir de 3 de maio de 2011. Este contrato vigorou até à data em que o contrato de 16 de maio de 2014 começou a produzir efeitos, a saber, em 1 de junho de 2014. Assim, em 31 de dezembro de 2013, o recorrente estava em funções ao abrigo do contrato assinado em 2008, a saber, o contrato de recrutamento inicial. Nessa data, exercia as funções, do GF I, de agente responsável por tarefas manuais ou administrativas de apoio, desempenhadas sob a supervisão de funcionários ou agentes temporários, conforme previsto no quadro do artigo 80.o, n.o 2, do ROA.

86      Em segundo lugar, importa referir que, em 16 de maio de 2014, o recorrente assinou o que ele próprio admite ser «indubitavelmente um novo contrato». Trata‑se, nomeadamente, e como confirmado pelo recorrente, de um contrato de trabalho como agente contratual por tempo indeterminado com classificação no GF II, grau 5, escalão 1, nos termos do artigo 87.o, n.o 4, do ROA. Em particular, decorre do artigo 2.o deste novo contrato que, nos seus termos, o recorrente foi recrutado para exercer as funções de agente responsável por tarefas de escritório, de secretariado ou tarefas equivalentes, conforme previsto no quadro do artigo 80, n.o 2, do ROA. Efetuou igualmente um estágio por um período de seis meses que culminou num relatório de estágio. Por conseguinte, como especificado acima no n.o 81, a mudança de grupo de funções pôs em causa a continuidade funcional da relação de trabalho do recorrente com a administração da União.

87      Por outro lado, nenhum dos argumentos apresentados pelo recorrente no âmbito da segunda parte é suscetível de fazer prova da existência, no caso em apreço, de uma qualquer continuidade substancial das funções por ele exercidas.

88      Em primeiro lugar, como se recordou acima no n.o 86, é dado assente que, em consequência do contrato de 16 de maio de 2014, acedeu a um lugar abrangido por um grupo de funções mais elevado do que aquele para o qual tinha sido inicialmente recrutado. Em segundo lugar, como reconhece o recorrente, a denominação do lugar de agente contratual do GF I era diferente da do lugar de agente contratual do GF II, sendo a primeira «assistente administrativo‑despesas de peritagem», ao passo que a segunda é «gestor administrativo‑despesas de peritagem». Além disso, como observa a Comissão, com o contrato de 16 de maio de 2014, o recorrente foi afetado a outro lugar identificado por outro número. Em terceiro lugar, o facto de a descrição das funções e das responsabilidades constante do perfil dos dois lugares ter sido formulada de forma idêntica, não prova que o recorrente exerceu substancialmente as mesmas tarefas/funções enquanto agente contratual primeiramente do GF I e em seguida do GF II.

89      Por último, o recorrente alega que a sua classificação no grau 5, escalão 1, do GF II, prevista no contrato de 16 de maio de 2014, implicou a tomada em consideração de uma parte da experiência adquirida no GF I, o que demonstra que a referida experiência era do nível do GF II. No entanto, importa referir que, admitindo‑se que a classificação prevista no contrato de 16 de maio de 2014 tinha implicado a tomada em consideração de uma parte da experiência do recorrente no GF I, esta circunstância não dá lugar a um reconhecimento, com efeitos ex tunc, do facto de as funções exercidas pelo recorrente enquanto agente contratual do GF I, sob a égide de um contrato diferente, serem na realidade do GF II. Assim, aquando da proposta de um novo contrato, a experiência profissional é tomada em consideração, pela instituição, apenas para efeitos da classificação, e ex nunc. Além disso, não pode deixar de se constatar que a eventual tomada em consideração de uma parte da experiência adquirida pelo recorrente no âmbito do seu lugar no GF I como sendo na realidade do GF II não prova que exerceu, de 1 de julho de 2008 até à assinatura do contrato de 16 de maio de 2014, e, portanto, sem descontinuidade, apenas funções do GF II. O recorrente não junta efetivamente nenhum elemento de prova destinado a demonstrar a existência desta continuidade.

90      Assim, o novo contrato, pelo qual o recorrente acedeu a um novo grupo de funções, implicou, como se especificou acima no n.o 81, a cessação de todos os efeitos do contrato de 2008 com base no qual ele tinha «contrato em 31 de dezembro de 2013» segundo o artigo 1.o, n.o 1, do anexo do ROA, e, por conseguinte, uma rutura da relação de trabalho com a administração da União.

91      Em terceiro lugar, importa sublinhar que a entrada em funções devido ao novo contrato não afeta os direitos adquiridos pelo recorrente sob a égide do contrato de 2008 até à data da entrada em vigor do contrato de 16 de maio de 2014 no que respeita à taxa anual de aquisição dos direitos a pensão. Com efeito, resulta dos artigos 2.o e 3.o do anexo VIII do Estatuto, aplicáveis aos agentes em virtude do artigo 109.o do ROA, que a pensão de um agente contratual, como o recorrente, depende da soma das diferentes taxas anuais de aquisição por este confirmadas em cada ano de serviço.

92      No caso em apreço, uma vez que o contrato assinado em 16 de maio de 2014 entrou em vigor em 1 de junho de 2014, o recorrente beneficiou, até essa data, do regime de pensão em vigor antes da reforma, ao passo que, entre 1 de janeiro de 2014 e 1 de junho de 2014, beneficiou do mesmo regime por força das disposições transitórias. Por conseguinte, no momento do cálculo dos seus direitos a pensão, o recorrente poderá beneficiar da taxa de aquisição de 1,9 % para os anos de serviço cumpridos sob o contrato de 2008, constituindo esta taxa um direito adquirido do recorrente, mas beneficiará da taxa de aquisição de 1,8 % a partir da entrada em vigor do contrato de 16 de maio de 2014.

93      Resulta de tudo o exposto que o PMO e a DG «Recursos humanos» não cometeram qualquer erro de direito ao considerarem que o contrato de 16 de maio de 2014, pelo qual o recorrente acedeu a um grupo de funções superior, dava lugar a uma nova entrada em funções para efeitos da aplicação do artigo 1.o, n.o 1, do anexo do ROA, não permitindo ao recorrente beneficiar da aplicação das disposições transitórias no que respeita à taxa anual de aquisição dos direitos a pensão e à idade de aposentação.

94      Esta conclusão não pode ser posta em causa pelos outros argumentos apresentados pelo recorrente.

95      Em primeiro lugar, quanto ao argumento baseado numa pretensa analogia com o Acórdão de 14 de dezembro de 2011, De Luca/Comissão (T‑563/10 P, EU:T:2011:746), importa sublinhar, à semelhança da Comissão, que este acórdão diz respeito à aplicação de uma disposição em matéria de recrutamento como o artigo 12.o, n.o 3, do anexo XIII do Estatuto, que rege a classificação em escalão dos funcionários inscritos numa lista de candidatos aprovados antes de 1 de maio de 2006 e recrutados entre 1 de maio de 2004 e 30 de abril de 2006, a um funcionário no ativo nomeado para outro lugar por ter sido aprovado num concurso geral e para o qual o Estatuto não prevê disposições específicas. Ora, não pode deixar de se constatar que o processo que deu origem ao referido acórdão não apresenta nenhuma analogia com o processo em causa, que diz respeito à aplicação a um agente contratual de disposições transitórias no domínio dos direitos a pensão.

96      Em segundo lugar, quanto ao argumento baseado na pretensa analogia com os Acórdãos de 16 de setembro de 2015, EMA/Drakeford (T‑231/14 P, EU:T:2015:639), e de 5 de fevereiro de 2014, Drakeford/EMA (F‑29/13, EU:F:2014:10), importa precisar, como resulta do n.o 81, supra, que esse argumento é inoperante no caso em apreço, na medida em que o contrato de 16 de maio de 2014 é um novo contrato que dá ao recorrente acesso a novas funções e, portanto, implica a rutura da sua relação de trabalho com a administração da União.

97      Em terceiro lugar, quanto ao argumento do recorrente de que um novo contrato não se opõe ao benefício dos artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto, desde que não implique descontinuidade na inscrição e na contribuição para o regime de pensões da União, é premente referir que a aplicação aos agentes dos referidos artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto não pode depender da inscrição pretensamente ininterrupta no regime de pensões da União, mas sim da continuidade funcional da relação de trabalho (v. n.o 81, supra).

98      Em quarto e último lugar, quanto ao argumento do recorrente em que, em substância, alega que a celebração de um novo tipo de contrato não põe termo à aplicação dos artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto, mas permite uma evolução da carreira dos agentes que não poderia de outro modo ocorrer sem prejuízo dos seus direitos a pensão, não pode deixar de se recordar que a celebração de um novo contrato não implica uma perda dos direitos a pensão já adquiridos. Por outro lado, a este respeito, importa especificar que os requisitos de inscrição no regime de pensões são, pela sua natureza e sob reserva do respeito dos direitos adquiridos, requisitos suscetíveis de serem alterados no futuro por vontade do legislador da União.

99      Tendo consideração o exposto, há que julgar improcedente o fundamento único e, portanto, o recurso na íntegra.

 Quanto às despesas

100    Por força do disposto no artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo o recorrente sido vencido, há que o condenar nas despesas, em conformidade com os pedidos da Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção alargada)

decide:

1)      Negar provimento ao recurso.

2)      Maxime Picard é condenado nas despesas.

Kanninen

Jaeger

Półtorak

Porchia

 

      Stancu

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 24 de março de 2021.

Assinaturas


Índice


Antecedentes do litígio

Tramitação processual e pedidos das partes

Questão de direito

Quanto à admissibilidade

Quanto ao mérito

Quanto ao artigo 1. o, n.o 1, do anexo do ROA e aos requisitos de aplicação dos artigos 21.o e 22.o do anexo XIII do Estatuto aos outros agentes sujeitos ao ROA

Quanto à situação do recorrente

Quanto às despesas


*      Língua do processo: francês.