Language of document : ECLI:EU:C:2024:409

Edição provisória

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

JEAN RICHARD DE LA TOUR

apresentadas em 16 de maio de 2024 (1)

Processo C185/23

protectus s.r.o., anteriormente BONUL s.r.o.,

contra

Výbor Národnej rady Slovenskej republiky na preskúmavanie rozhodnutí Národného bezpečnostného úradu

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Najvyšší správny súd Slovenskej republiky (Supremo Tribunal Administrativo da República Eslovaca)]

«Reenvio prejudicial — Decisão 2013/488/UE — Informações classificadas da União Europeia — Credenciação de segurança de empresa — Revogação da credenciação — Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Artigo 47.° — Acesso ao processo — Artigo 51.°— Aplicação do direito da União»






I.      Introdução

1.        O presente pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação da Decisão 2013/488/UE do Conselho, de 23 de setembro de 2013, relativa às regras de segurança aplicáveis à proteção das informações classificadas da UE (2), bem como do artigo 47.° e do artigo 51.°, n.os 1 e 2, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (3).

2.        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a protectus s.r.o., anteriormente BONUL s.r.o. (a seguir «protectus» ou «recorrente»), à Výbor Národnej rady Slovenskej republiky na preskúmavanie rozhodnutí Národného bezpečnostného úradu (Comissão do Parlamento Nacional da República Eslovaca para a fiscalização das decisões da Autoridade Nacional de Segurança) (a seguir «Comissão do Parlamento Nacional»), por esta ter negado provimento ao recurso intentado pela protectus contra a decisão da Národný bezpečnostný úrad (Autoridade Nacional de Segurança, Eslováquia) (a seguir «ANS») de revogar a sua credenciação de segurança industrial e, em consequência dessa revogação, de revogar o seu certificado de segurança industrial.

3.        No direito eslovaco, a credenciação de segurança industrial tem por objeto autorizar uma pessoa a aceder a informações classificadas nos termos do direito nacional. O certificado de segurança industrial, por seu turno, permite a uma pessoa aceder a informações classificadas da União Europeia (a seguir «ICUE»).

4.        A decisão que revoga a credenciação de segurança industrial de que a protectus beneficiava foi adotada por se ter concluído, com base, em parte, em informações classificadas, que essa empresa representava um risco de segurança. Além disso, a ANS considerou, nessa decisão, que a revogação dessa credenciação implicava, necessariamente, a revogação do seu certificado de segurança industrial, na medida em que o direito nacional estabelece um nexo entre estes dois tipos de credenciações de segurança.

5.        O domínio das ICUE ainda não é objeto de legislação de alcance horizontal no direito da União, mas de decisões próprias de cada instituição da União (4). Acresce que o direito da União apenas regula a proteção das ICUE de forma parcial e limitada. Nesta matéria, o direito da União apoia‑se nos sistemas nacionais já existentes de proteção das informações classificadas com base num nível de proteção equivalente.

6.        O Tribunal de Justiça já foi chamado a pronunciar‑se, em várias ocasiões, sobre a ponderação a efetuar entre o direito a um recurso efetivo e os interesses invocados para justificar a não divulgação de certas informações, em especial quando esses interesses dizem respeito à segurança nacional. Contudo, é a primeira vez que o Tribunal de Justiça é chamado a clarificar esta ponderação a propósito de ICUE.

7.        Em resposta às questões submetidas pelo Najvyšší správny súd Slovenskej republiky (Supremo Tribunal Administrativo da República Eslovaca) para traçar os contornos de tal ponderação, defenderei a posição a seguir apresentada.

8.        Em primeiro lugar, exporei as razões pelas quais considero que, quando um órgão jurisdicional nacional é chamado a fiscalizar a legalidade de uma decisão que revoga uma credenciação de segurança de uma pessoa que lhe permite ter conhecimento de ICUE, em aplicação da Decisão 2013/488, tal situação constitui uma aplicação do direito da União, em conformidade com o previsto no artigo 51.°, n.° 1, da Carta. Daqui decorre que, na minha opinião, esta é aplicável no âmbito do presente processo.

9.        Em segundo lugar, explicarei por que razão se deve, na minha opinião, afastar os argumentos apresentados pela maioria dos participantes no presente processo para sustentar que o artigo 47.° da Carta não é aplicável nas circunstâncias em causa no processo principal. Quanto ao mérito, indicarei os motivos pelos quais considero que, tendo em conta as características específicas do domínio relativo à proteção das ICUE, a regulamentação eslovaca prevê garantias suficientes para proteger os direitos de defesa das pessoas cuja credenciação de segurança foi revogada.

10.      Em terceiro lugar, esclarecerei que as garantias que decorrem do artigo 47.° da Carta não podem, em todo o caso, levar a impor que um órgão jurisdicional, ao qual incumbe fiscalizar a legalidade de uma decisão de revogação de uma credenciação de segurança parcialmente baseada em informações classificadas, disponha do poder de autorizar o acesso da pessoa objeto dessa decisão ao processo da Autoridade Nacional de Segurança que contém essas informações.

II.    Factos do litígio no processo principal e questões prejudiciais

11.      Em 6 de setembro de 2018, a ANS emitiu à recorrente no processo principal uma credenciação de segurança industrial que a autorizava a aceder a informações classificadas de nível «Muito Secreto», a transmitir informações classificadas de nível «Secreto» em formato papel e eletrónico e a produzir informações classificadas de nível «Secreto». Além disso, a pedido da recorrente no processo principal, a ANS emitiu‑lhe, em 15 de novembro de 2018, um certificado de segurança industrial para o nível SECRET UE/EU SECRET.

12.      Em seguida, a ANS tomou conhecimento de informações não classificadas segundo as quais, nomeadamente, a recorrente no processo principal ou membros do seu órgão de administração eram objeto de um inquérito penal, a recorrente tinha celebrado contratos com sociedades que eram objeto desse inquérito, tinha pagado a essas sociedades quantias em dinheiro fora do habitual e existiam suspeitas de ligações entre o seu pessoal e uma outra sociedade com a qual tinha participado em concursos públicos, tendo assim as duas sociedades apresentado propostas sob controlo comum.

13.      A ANS obteve igualmente outras informações contidas em documentos que foram qualificados de provas documentais classificadas.

14.      A ANS permitiu que a recorrente no processo principal se pronunciasse sobre algumas das informações obtidas, mas não sobre as várias provas documentais classificadas nem sobre as informações nelas contidas.

15.      Por Decisão de 25 de agosto de 2020, a ANS revogou a credenciação de segurança industrial e o certificado de segurança industrial da recorrente no processo principal. A revogação dessa credenciação baseou‑se na conclusão de que a recorrente representava um risco de segurança devido à existência de uma relação comercial suscetível de prejudicar os interesses da República Eslovaca em matéria de segurança e de atos contrários aos interesses económicos deste Estado‑Membro. Na fundamentação desta decisão, a ANS remeteu, por um lado, para informações não classificadas que apresentou pormenorizadamente e, por outro, para informações classificadas cujo conteúdo não revelou. Na referida decisão, a ANS especificou igualmente que a revogação da credenciação de segurança industrial implicava a revogação do certificado de segurança industrial, na medida em que a validade deste certificado dependia da validade dessa credenciação.

16.      A recorrente no processo principal interpôs recurso da decisão da ANS para a Comissão do Parlamento Nacional. Em apoio desse recurso, alegou, fundamentalmente, que não tinha tido a possibilidade de consultar o processo da ANS nem de tomar conhecimento do conteúdo das provas documentais classificadas. A recorrente contestou também as conclusões da ANS, na medida em que estas se baseavam em informações não classificadas.

17.      Por Decisão de 4 de novembro de 2020, a Comissão do Parlamento Nacional negou provimento a esse recurso.

18.      A recorrente no processo principal interpôs recurso dessa decisão para o Najvyšší súd Slovenskej republiky (Supremo Tribunal da República Eslovaca).

19.      Neste recurso, a recorrente no processo principal alega que os seus direitos processuais em matéria de acesso ao conteúdo do processo não podiam ser objeto de uma limitação absoluta apenas com o fundamento genérico de que se tratava de informações classificadas. Critica igualmente o facto de o diretor da ANS ter recusado ao seu advogado, com base em fundamentos muito genéricos, o acesso a tais informações. Põe também em causa as diferentes considerações factuais e jurídicas nas quais a ANS e a Comissão do Parlamento Nacional basearam a sua conclusão de que a recorrente no processo principal representava um risco de segurança.

20.      Posteriormente à interposição do referido recurso, a competência para o apreciar foi transferida para o Najvyšší správny súd Slovenskej republiky (Supremo Tribunal Administrativo da República Eslovaca). Em 28 de setembro de 2022, a ANS remeteu para este último todo o processo, incluindo as provas documentais classificadas. Por Decisão de 4 de outubro de 2022, o presidente da secção chamada a conhecer do recurso excluiu da consulta essas partes classificadas do processo.

21.      No mesmo dia, o advogado da recorrente no processo principal pediu a esse órgão jurisdicional para consultar as provas documentais classificadas transmitidas pela ANS. Por carta de 5 de outubro de 2022, o presidente da secção competente para apreciar o recurso indeferiu esse pedido, mas pediu à ANS que considerasse a possibilidade de autorizar a comunicação dessas provas a esse advogado. Por carta de 25 de novembro de 2022, a ANS autorizou apenas a comunicação de duas provas documentais classificadas. Em contrapartida, recusou dar o seu consentimento para a comunicação das outras provas documentais classificadas em causa, com o fundamento de que essa comunicação poderia implicar a divulgação de fontes de informação e comprometer as investigações em curso relativas à recorrente no processo principal. Por carta de 16 de janeiro de 2023, o advogado da recorrente no processo principal voltou a pedir para consultar todas as provas documentais classificadas, invocando, entre outros, o artigo 47.° da Carta, conforme interpretado pelo Tribunal de Justiça no seu Acórdão de 22 de setembro de 2022, Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság e o. (5).

22.      Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre a aplicabilidade da Carta no processo principal.

23.      A este respeito, sublinha, em especial, que as condições de validade do certificado de segurança industrial são determinadas pelo direito eslovaco, o qual liga a validade de tal certificado à validade de uma credenciação de segurança industrial, sem regulamentar de forma mais pormenorizada o tratamento das ICUE nem o acesso a estas. Todavia, salienta que a Decisão 2013/488 impõe aos Estados‑Membros certas obrigações concretas em matéria de credenciação dos contratantes, os quais são definidos, no apêndice A desta decisão, como quaisquer pessoas singulares ou coletivas com capacidade jurídica para celebrar contratos. É por este motivo que as autoridades nacionais devem ter em conta as obrigações decorrentes da referida decisão quando emitem ou revogam os certificados de segurança industrial. O facto de determinadas disposições da Decisão 2013/488 remeterem para a regulamentação nacional que essas autoridades devem respeitar não afeta esta conclusão, uma vez que os Estados‑Membros devem aplicar esta decisão utilizando os meios e os procedimentos do direito nacional.

24.      Além disso, o órgão jurisdicional de reenvio considera que o facto de a regulamentação eslovaca aplicável não ter sido adotada com vista a assegurar a aplicação de um determinado ato de direito da União e de estabelecer uma ligação entre a validade do certificado de segurança industrial e uma credenciação nacional de segurança industrial não significa que a aplicação desta regulamentação não possa constituir uma aplicação do direito da União. O referido órgão jurisdicional salienta ainda que a fiscalização da decisão impugnada que é chamado a efetuar pode constituir uma situação em que um Estado‑Membro aplica o direito da União e que nem a base jurídica da Decisão 2013/488 nem o artigo 346.°, n.° 1, alínea a), TFUE são suscetíveis de afastar a aplicação da Carta.

25.      Na hipótese de a Carta ser aplicável ao processo principal, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre a compatibilidade da regulamentação e da prática eslovacas relativas às informações classificadas com o artigo 47.° da Carta.

26.      Esse órgão jurisdicional precisa que, por força desta regulamentação, tais informações estão acessíveis, sem restrições, aos juízes chamados a apreciar recursos de decisões baseadas nas mesmas. O advogado de uma parte recorrente, por seu turno, só pode aceder a essas informações depois de obter autorização da autoridade que identificou a informação classificada em causa, sem que a recusa em conceder essa autorização possa ser fiscalizada por um órgão jurisdicional. Além disso, esse advogado fica vinculado a um dever de confidencialidade e, portanto, não pode divulgar ao seu cliente o teor das informações classificadas às quais teve acesso.

27.      Atendendo a estes elementos, o órgão jurisdicional de reenvio refere que se pode admitir que a questão de saber se a referida regulamentação é compatível com o artigo 47.° da Carta é suscetível de ser deduzida do Acórdão Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság e o. Neste acórdão, o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 23.°, n.° 1, da Diretiva 2013/32/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa a procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de proteção internacional (6), lido em conjugação com o artigo 45.o, n.o 4, desta diretiva e à luz do princípio geral do direito da União relativo ao direito a uma boa administração e do artigo 47.o da Carta, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que prevê que, quando uma decisão de indeferimento de um pedido de proteção internacional ou de retirada dessa proteção assente em informações cuja divulgação pode pôr em risco a segurança nacional do Estado‑Membro em causa, a pessoa em questão ou o seu advogado só podem aceder a essas informações depois de obtida uma autorização para esse efeito, não lhes sendo sequer comunicada a substância dos fundamentos em que se baseiam essas decisões e não podendo, em todo o caso, utilizar, para efeitos dos procedimentos administrativo ou judicial, as informações a que possam ter tido acesso (7). Além disso, o Tribunal de Justiça especificou, no referido acórdão, que, para garantir os direitos de defesa da pessoa em questão, a faculdade de o órgão jurisdicional competente aceder ao processo não pode substituir o acesso às informações constantes do processo pela pessoa em questão ou pelo seu advogado (8).

28.      Segundo o órgão jurisdicional de reenvio é, contudo, necessário determinar se a solução que decorre do Acórdão Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság e o., que diz respeito ao domínio dos procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de proteção internacional, é plenamente transponível para o caso em apreço. Com efeito, contrariamente ao que sucedia no processo que deu origem a este acórdão, não é óbvio que as regras previstas na Decisão 2013/488, em especial no artigo 11.° e no anexo V para efeitos de concessão, pela Autoridade Nacional de Segurança, de uma credenciação de segurança de empresa (CSE), possam fundamentar, em benefício do contratante em causa, um direito garantido pelo direito da União, cuja proteção esse contratante possa invocar com base no artigo 47.° da Carta. Se for o caso, o órgão jurisdicional de reenvio pretende igualmente obter esclarecimentos sobre o conteúdo da proteção jurisdicional que decorre deste artigo e sobre os poderes de que deve dispor para garantir os direitos decorrentes do referido artigo numa situação como a que está em causa no processo principal.

29.      Nestas condições, o Najvyšší správny súd Slovenskej republiky (Supremo Tribunal Administrativo da República Eslovaca) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Deve o artigo 51.°, n.° 1, da [Carta] ser interpretado no sentido de que um Estado‑Membro aplica o direito na União quando um órgão jurisdicional desse Estado‑Membro é chamado a apreciar a legalidade de uma decisão de uma comissão especial do parlamento desse Estado que, enquanto órgão de segunda instância, confirmou uma decisão administrativa da autoridade nacional de segurança por força da qual foi revogada (retirada) a uma pessoa coletiva:

–        em primeiro lugar, a credenciação de segurança industrial que dá acesso a informações classificadas em conformidade com o direito nacional,

–        e ao mesmo tempo, exclusivamente devido à revogação dessa certificação, também o certificado de segurança industrial emitido a essa pessoa coletiva para efeitos de acesso a informações classificadas «SECRET UE/EU SECRET» na aceção do artigo 11.° e do [a]nexo V da Decisão [2013/488]?

2)      Em caso de resposta afirmativa à primeira questão[, d]eve o artigo 47.°, primeiro e segundo parágrafos, da Carta ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação e a uma prática nacionais, segundo as quais

a)      a decisão de uma autoridade de segurança nacional de revogar (retirar) a referida credenciação e certificado não menciona as informações classificadas que a levaram a considerar que as condições para a sua revogação (retirada) estão preenchidas, mas limita‑se a fazer referência ao documento correspondente do processo dessa autoridade que contém essas informações classificadas,

b)      a pessoa coletiva em causa não tem acesso ao processo da autoridade nacional de segurança nem aos documentos individuais que contêm as informações classificadas que levaram essa autoridade a concluir que a revogação (retirada) da referida credenciação e do certificado é legítima,

c)      o acesso a este processo e documentos pode ser obtido pelo advogado da pessoa coletiva em causa, mas unicamente com o consentimento do diretor da autoridade nacional de segurança, ou eventualmente com o consentimento de outra autoridade que tenha transmitido esses documentos à autoridade nacional de segurança, mas, mesmo depois de ter obtido esse acesso, aquele é obrigado a respeitar a confidencialidade do conteúdo do processo e [dos] documentos,

d)      o órgão jurisdicional que aprecia a legalidade da decisão referida na primeira questão tem, porém, pleno acesso a esse processo e a esses documentos?

3)      Em caso de resposta afirmativa à segunda questão[, d]eve o artigo 47.°, primeiro e segundo parágrafos, da Carta ser interpretado no sentido de que permite (ou eventualmente impõe) ao órgão jurisdicional que aprecia a legalidade da decisão referida na primeira questão que não aplique a regulamentação e a prática descritas na segunda questão e faculte à pessoa coletiva em causa ou ao seu advogado o acesso ao processo da autoridade nacional de segurança ou, se for caso disso, aos documentos que contenham informações classificadas, se esse órgão jurisdicional o considerar necessário para garantir o direito à ação e a um processo contraditório?

4)      Em caso de resposta afirmativa à terceira questão[, d]eve o artigo 51.°, n.os 1 e 2, da Carta ser interpretado no sentido de que a habilitação do órgão jurisdicional de conceder acesso ao processo, e eventualmente a documentos, na aceção da terceira questão, [se aplica]

–        unicamente às partes do processo ou [aos] documentos que contêm informações pertinentes para a avaliação da segurança industrial, na aceção do artigo 11.° e do [a]nexo V da Decisão [2013/488], ou

–        também às partes do processo e aos documentos que contêm informações exclusivamente pertinentes para a avaliação da segurança industrial na aceção do direito nacional, ou seja, além das condições previstas na Decisão [2013/488]?»

30.      A Comissão do Parlamento Nacional, os Governos Eslovaco e Estónio, o Conselho da União Europeia e a Comissão Europeia apresentaram observações escritas.

31.      Em 30 de janeiro de 2022, realizou‑se uma audiência na qual estiveram presentes a protectus, a Comissão do Parlamento Nacional, os Governos Eslovaco e Francês, o Conselho e a Comissão.

III. Análise

32.      No presente processo, o órgão jurisdicional de reenvio pretende obter esclarecimentos do Tribunal de Justiça sobre a ponderação que deve ser efetuada entre o direito a um recurso efetivo e a proteção da segurança nacional, no âmbito de um recurso de uma decisão baseada, nomeadamente, em informações classificadas que revoga, por um lado, uma credenciação de segurança industrial que permite aceder a informações classificadas por um Estado‑Membro e, por outro, um certificado de segurança industrial que autoriza o acesso a ICUE.

33.      Para se pronunciar sobre o recurso interposto dessa decisão, o órgão jurisdicional de reenvio interroga, em substância, o Tribunal de Justiça sobre a compatibilidade da regulamentação eslovaca com o direito da União, na parte em que essa regulamentação limita o acesso da pessoa em causa às informações classificadas que fundamentam a decisão adotada a seu respeito, e sobre os poderes de que o órgão jurisdicional competente deve dispor para garantir os direitos dessa pessoa.

A.      Quanto à competência do Tribunal de Justiça

34.      A Comissão do Parlamento Nacional sustenta que o Tribunal de Justiça não tem competência para responder ao pedido de decisão prejudicial, porquanto a situação em causa no processo principal não é abrangida pelo âmbito de aplicação do direito da União.

35.      Na medida em que os argumentos apresentados a este respeito visam demonstrar que a Carta não é aplicável no processo principal, devem ser analisados no âmbito da resposta à primeira questão prejudicial, que incide sobre este assunto. Em apoio desta conclusão, importa referir que a objeção relativa à inaplicabilidade de uma disposição do direito da União ao processo principal diz respeito ao mérito desta questão (9).

B.      Quanto à primeira questão prejudicial

36.      Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 51.°, n.° 1, da Carta deve ser interpretado no sentido de que um Estado‑Membro aplica o direito na União quando um dos seus órgãos jurisdicionais fiscaliza a legalidade de uma decisão que revoga, por um lado, uma credenciação de segurança industrial que permite aceder a informações classificadas por um Estado‑Membro e, por outro, um certificado de segurança industrial que autoriza o acesso a ICUE, na aceção do artigo 11.° e do anexo V da Decisão 2013/488.

37.      As informações classificadas, as condições para poder tomar conhecimento dessas informações, as condições de emissão e de revogação da credenciação de segurança industrial, bem como o procedimento para esse efeito são regulados, no direito eslovaco, pela Zákon č. 215/2004 Z. z. o ochrane utajovaných skutočností (Lei n.° 215/2004 relativa à Proteção das Informações Classificadas (10)).

38.      Decorre do § 50, n.° 1, da Lei n.° 215/2004 que, «[s]e o procedimento de credenciação de segurança demonstrar que o profissional preenche as condições previstas no § 46[ (11)], a ANS emite‑lhe uma credenciação de segurança industrial». Nos termos do § 50, n.° 5, «[s]e a ANS constatar que o profissional deixou de satisfazer uma das condições da segurança industrial previstas no § 46, ou que violou de maneira flagrante ou repetida as suas obrigações de proteção das informações classificadas, revogará a validade da credenciação». Foi com base nesta última disposição que a ANS decidiu revogar a credenciação de segurança industrial atribuída à protectus.

39.      As condições de emissão do certificado de segurança industrial, por seu turno, estão previstas no § 5, n.° 6, do vyhláška č. 134/2016 Z. z. o personálnej bezpečnosti (Decreto n.° 134/2016 da ANS, relativo à Segurança do Pessoal) (12), que remete para as condições de emissão do certificado de credenciação de segurança de uma pessoa singular referido no § 5, n.os 1 a 5. Resulta, nomeadamente, da conjugação destas disposições que, por um lado, o certificado de segurança industrial indica o nível mais elevado de classificação das ICUE a que uma pessoa pode ter acesso e as disposições correspondentes da regulamentação da União nos termos da qual é autorizado o acesso dessa pessoa a informações classificadas (13). Por outro lado, a validade desse certificado está ligada à da credenciação de segurança industrial (14).

40.      Para determinar se a situação na qual um órgão jurisdicional nacional fiscaliza a legalidade de uma decisão de revogação dessas credenciações de segurança no quadro jurídico nacional assim descrito constitui uma aplicação do direito da União, importa recordar qual o âmbito de aplicação da Carta no que respeita à ação dos Estados‑Membros. Este é definido no artigo 51.°, n.° 1, da Carta, nos termos do qual as disposições desta têm por destinatários os Estados‑Membros apenas quando apliquem o direito da União. Este artigo da Carta confirma a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça segundo a qual os direitos fundamentais garantidos pela ordem jurídica da União se destinam a ser aplicáveis em todas as situações reguladas pelo direito da União, mas não fora dessas situações (15). Assim, quando uma regulamentação nacional se enquadra no âmbito de aplicação do direito da União, o Tribunal de Justiça, chamado a pronunciar‑se a título prejudicial, deve fornecer todos os elementos de interpretação necessários à apreciação, pelo órgão jurisdicional nacional, da conformidade desta regulamentação com os direitos fundamentais cujo respeito assegura (16). Em contrapartida, quando uma situação jurídica não é abrangida pelo âmbito de aplicação do direito da União, o Tribunal de Justiça não tem competência para dela conhecer e as disposições da Carta eventualmente invocadas não podem, por si só, servir de base a essa competência (17).

41.      Segundo jurisprudência constante, o conceito de «aplicação do direito da União», na aceção do artigo 51.°, n.° 1, da Carta, pressupõe a existência de um nexo entre um ato do direito da União e a medida nacional em causa que ultrapasse a proximidade das matérias visadas ou as incidências indiretas de uma matéria na outra, tendo em conta os critérios de apreciação definidos pelo Tribunal de Justiça (18).

42.      Por conseguinte, para determinar se uma medida nacional se insere no âmbito de «aplicação do direito da União», na aceção do artigo 51.°, n.° 1, da Carta, há que verificar, entre outros elementos, se a regulamentação nacional em causa no processo principal tem por objetivo aplicar uma disposição do direito da União, o caráter dessa regulamentação e se a mesma prossegue objetivos diferentes dos abrangidos pelo direito da União, ainda que seja suscetível de o afetar indiretamente, bem como se existe uma regulamentação do direito da União específica na matéria ou suscetível de o afetar (19).

43.      Referi anteriormente que a proteção das ICUE ainda não é objeto, no direito da União, de uma norma de alcance horizontal que abranja todas as instituições e órgãos da União. Assim, o regime desta proteção decorre de vários atos distintos, que são específicos de cada instituição ou órgão da União.

44.      No caso em apreço, o órgão jurisdicional de reenvio refere que a Decisão 2013/488 é a norma do direito da União aplicável no âmbito do litígio no processo principal. Na falta de especificações por parte desse órgão jurisdicional quanto à sua opção de solicitar a interpretação desta decisão e não de outra, há que, na minha opinião, partir da premissa em que assenta a cooperação jurisdicional instaurada pelo processo previsto no artigo 267.° TFUE, ou seja, que o juiz nacional tem a responsabilidade de definir o quadro regulamentar e factual do reenvio prejudicial, cuja exatidão não cabe ao Tribunal de Justiça verificar, e que as questões relativas à interpretação do direito da União submetidas pelo juiz nacional nesse quadro gozam de uma presunção de pertinência (20). Por conseguinte, considero que a apreciação da existência de uma aplicação do direito da União no processo principal deve ser efetuada à luz da referida decisão.

45.      Para determinar se a situação em causa no processo principal constitui uma aplicação do direito da União, importa referir as várias obrigações que a Decisão 2013/488, que foi adotada pelo Conselho no âmbito da sua competência de organização interna, impõe aos Estados‑Membros.

46.      Como refere o considerando 1 da Decisão 2013/488, esta visa «desenvolver atividades do Conselho em todas as áreas que exijam o manuseamento de informações classificadas, [criando] um sistema geral de segurança para proteção dessas informações que abranja o Conselho, o seu Secretariado‑Geral e os Estados‑Membros». Nesta perspetiva, decorre do considerando 3 da referida decisão que, «[n]os termos das disposições legislativas e regulamentares nacionais e na medida do necessário para assegurar o funcionamento do Conselho, os Estados‑Membros deverão respeitar a presente decisão sempre que as autoridades competentes, o pessoal ou os contratantes respetivos manuseiem ICUE, de forma a que cada um possa estar certo de que é concedido um nível de proteção equivalente às mesmas».

47.      Assim, como prevê o artigo 1.°, n.° 1, da Decisão 2013/488, esta «estabelece os princípios básicos e as normas mínimas de segurança aplicáveis à proteção das ICUE». De acordo com o n.° 2 deste artigo, «[e]sses princípios básicos e normas mínimas são aplicáveis ao Conselho e ao [Secretariado‑Geral do Conselho (a seguir «SGC»)] e devem ser respeitados pelos Estados‑Membros, nos termos das respetivas disposições legislativas e regulamentares nacionais, de forma a que cada um possa estar certo de que é concedido um nível de proteção equivalente às ICUE».

48.      Nos termos do artigo 2.°, n.° 1, desta decisão, «[e]ntende‑se por [“ICUE”] quaisquer informações ou material designado por uma classificação de segurança da [União Europeia] cuja divulgação não autorizada possa causar prejuízos de vária ordem aos interesses da União Europeia ou de um ou mais Estados‑Membros».

49.      A proteção das ICUE exige a adoção de medidas pelos Estados‑Membros sempre que seja permitido aos agentes económicos ter acesso a tais informações.

50.      Nesta perspetiva, o artigo 11, n.° 1, da Decisão 2013/488 define «segurança industrial» como «a aplicação de medidas destinadas a garantir a proteção das ICUE pelos contratantes ou subcontratantes no âmbito das negociações pré‑contratuais e durante a vigência dos contratos classificados. Estes contratos não devem envolver o acesso a informações com classificação TRÈS SECRET UE/EU TOP SECRET».

51.      A aplicação de tais medidas é exigida, porquanto em conformidade com o artigo 11.°, n.° 2, da Decisão 2013/488, «[o] SGC pode confiar tarefas que envolvam ou impliquem o acesso a ICUE ou o seu manuseamento ou armazenamento a entidades industriais ou outras registadas num Estado‑Membro […]».

52.      Neste contexto, a proteção das ICUE implica, nomeadamente, que:

–        ao adjudicar contratos classificados a entidades industriais ou outras, o SGC, na qualidade de entidade adjudicante, garanta o cumprimento das normas mínimas de segurança industrial estabelecidas na Decisão 2013/488, às quais o contrato fará referência (artigo 11.°, n.° 3);

–        as Autoridades Nacionais de Segurança, as Autoridades de Segurança Designadas ou quaisquer outras autoridades competentes dos Estados‑Membros garantam, na medida em que as disposições legislativas e regulamentares nacionais o permitirem, que os contratantes e subcontratantes registados nos respetivos territórios tomem todas as medidas adequadas para proteger as ICUE no âmbito das negociações pré‑contratuais ou da execução dos contratos classificados (artigo 11.°, n.° 4); e

–        as Autoridades Nacionais de Segurança, as Autoridades de Segurança Designadas ou quaisquer outras autoridades competentes dos Estados‑Membros garantam, nos termos das disposições legislativas e regulamentares nacionais, que os contratantes ou subcontratantes registados nos respetivos Estados‑Membros que participem na execução de contratos ou subcontratos que exijam acesso a informações com classificação CONFIDENTIEL UE/EU CONFIDENTIAL ou SECRET UE/EU SECRET dentro das suas próprias instalações, seja na execução do contrato, seja na fase pré‑contratual, possuam uma CSE para o nível de classificação adequado (artigo 11.°, n.° 5).

53.      No apêndice A da Decisão 2013/488, o contrato classificado é definido como um «contrato celebrado pelo SGC com um contratante para o fornecimento de bens, a execução de obras ou a prestação de serviços cuja execução exija ou implique o acesso ou a produção de ICUE». A CSE, por seu turno, é definida como uma «certificação administrativa, emitida por uma [Autoridade Nacional de Segurança] ou [Autoridade de Segurança Designada], de que, do ponto de vista da segurança, determinada empresa está apta a garantir um nível adequado de proteção das ICUE com determinado nível de classificação de segurança».

54.      Como decorre do artigo 15.°, n.° 3, da Decisão 2013/488, a responsabilidade pela execução dos princípios básicos e das normas mínimas de segurança aplicáveis à proteção das ICUE recai, nomeadamente, sobre os Estados‑Membros.

55.      Assim, estes devem tomar «todas as medidas necessárias, nos termos das respetivas disposições legislativas e regulamentares nacionais, para assegurar que, quando forem manuseadas ou armazenadas ICUE, a [Decisão 2013/488 seja] respeitada» por uma série de pessoas, entre as quais as que, «em virtude das funções que exercem, estejam devidamente autorizadas a aceder às ICUE» [artigo 15.°, n.° 3, alínea c)] e «[as] entidades a que os Estados‑Membros tenham adjudicado contratos, quer no território dos Estados‑Membros, quer no estrangeiro» [artigo 15.°, n.° 3, alínea d)].

56.      Por outro lado, para efeitos da execução do artigo 15.°, n.° 3, da Decisão 2013/488, o artigo 16.°, n.° 3, alínea a), desta decisão prevê que cabe aos Estados‑Membros designar uma Autoridade Nacional de Segurança como responsável pelos mecanismos de segurança destinados a proteger as ICUE, de modo que, nomeadamente:

–        «as ICUE detidas por qualquer serviço, organismo ou agência nacional, público ou privado, quer dentro, quer fora do país, sejam protegidas nos termos da presente decisão» [artigo 16.°, n.° 3, alínea a), i)];

–        «os mecanismos de segurança destinados a proteger as ICUE sejam periodicamente inspecionados ou avaliad[o]s» [artigo 16.°, n.° 3, alínea a), ii)]; e

–        «todas as pessoas empregadas pelas Administrações Nacionais ou por um contratante a quem seja facultado o acesso a informações com classificação CONFIDENTIEL UE/EU CONFIDENTIAL, ou superior, possuam a credenciação de segurança adequada ou outra autorização devidamente emitida, em virtude das funções que exercem, nos termos das disposições legislativas e regulamentares nacionais» [artigo 16.°, n.° 3, alínea a), iii)].

57.      Decorre destas disposições que a Decisão 2013/488 impõe uma série de obrigações concretas aos Estados‑Membros em matéria de proteção das ICUE. Entre essas obrigações consta a de os Estados‑Membros assegurarem que as pessoas a quem seja facultado, no âmbito das suas atividades, o acesso a ICUE, obtenham da Autoridade Nacional de Segurança uma credenciação de segurança.

58.      Em suma, a Decisão 2013/488 prevê que os Estados‑Membros têm a responsabilidade geral de assegurar que esta decisão seja respeitada por determinadas pessoas (artigo 15.°, n.° 3), que as disposições destinadas a assegurar a proteção das ICUE sejam aplicadas (artigo 16.°, n.° 3) ou que os contratantes ou subcontratantes que participem em contratos classificados possuam uma CSE (artigo 11.°, n.° 5).

59.      Observo que a Decisão 2013/488 não se limita a impor, genericamente, a obrigação de as pessoas a quem seja facultado, no âmbito das suas atividades, o acesso a ICUE obtenham da Autoridade Nacional de Segurança uma credenciação de segurança. Com efeito, esta decisão introduz igualmente algumas regras para enquadrar o procedimento de credenciação e as respetivas condições.

60.      Assim, o anexo V da referida decisão contém, no título III, os seguintes n.os 8 a 13:

«8.      A CSE será concedida pela [Autoridade Nacional de Segurança] ou [Autoridade de Segurança Designada] ou por qualquer outra autoridade de segurança competente de um Estado‑Membro, a fim de certificar, nos termos das disposições legislativas e regulamentares nacionais, que determinada entidade industrial ou outra está em condições de proteger as ICUE ao nível de classificação adequado (CONFIDENTIEL UE/EU CONFIDENTIAL ou SECRET UE/EU SECRET) dentro das respetivas instalações. A CSE será apresentada ao SGC, enquanto entidade adjudicante, antes de as ICUE serem fornecidas ao contratante ou subcontratante ou potencial contratante ou subcontratante ou de lhe ser concedido acesso a essas informações.

9.      Ao emitir uma CSE, a [Autoridade Nacional de Segurança] ou [Autoridade de Segurança Designada] competente deverá, no mínimo:

a)      Avaliar a integridade da entidade industrial ou outra;

b)      Avaliar em que medida a propriedade, o controlo ou a potencial exposição a influências indevidas podem ser considerados um risco para a segurança;

c)      Certificar‑se de que a entidade industrial ou outra instalou um sistema de segurança que abranja todas as medidas de segurança necessárias à proteção das informações ou material com classificação CONFIDENTIEL UE/EU CONFIDENTIAL ou SECRET UE/EU SECRET, nos termos dos requisitos da presente decisão;

d)      Certificar‑se de que o estatuto de segurança da administração, dos proprietários e dos empregados que precisem de aceder a informações com classificação CONFIDENTIEL UE/EU CONFIDENTIAL ou SECRET UE/EU SECRET foi estabelecido nos termos dos requisitos da presente decisão; e

e)      Certificar‑se de que a entidade industrial ou outra nomeou um Oficial de Segurança da Empresa, responsável perante a respetiva administração pelo cumprimento das obrigações em matéria de segurança na referida entidade.

10.      Se necessário, o SGC, enquanto entidade adjudicante, informará a [Autoridade Nacional de Segurança]/[Autoridade de Segurança Designada] competente, ou qualquer outra autoridade de segurança competente, de que é necessária uma CSE para a fase pré‑contratual ou para a execução do contrato. Será exigida uma CSE ou uma CSP para a fase pré‑contratual quando haja que fornecer ICUE com classificação CONFIDENTIEL UE/EU CONFIDENTIAL ou SECRET UE/EU SECRET durante o processo de apresentação de propostas.

11.      A entidade adjudicante não adjudicará nenhum contrato classificado ao proponente preferido antes de ter recebido, da [Autoridade Nacional de Segurança]/[Autoridade de Segurança Designada] ou de qualquer outra autoridade de segurança competente do Estado‑Membro em que o contratante ou subcontratante esteja registado, confirmação de que, sendo exigível, foi emitida a CSE adequada.

12.      A [Autoridade Nacional de Segurança]/[Autoridade de Segurança Designada] ou qualquer outra autoridade de segurança competente que tenha emitido a CSE informará o SGC, enquanto entidade adjudicante, de qualquer alteração que afete a CSE. No caso da subcontratação, será informada em conformidade a [Autoridade Nacional de Segurança]/[Autoridade de Segurança Designada] ou qualquer outra autoridade de segurança competente.

13.      A retirada da CSE por parte da [Autoridade Nacional de Segurança]/[Autoridade de Segurança Designada] ou de qualquer outra autoridade de segurança competente constituirá motivo suficiente para que o SGC, enquanto entidade adjudicante, ponha termo a um contrato classificado ou exclua um dos proponentes do concurso.»

61.      Para determinar se, atendendo às regras do direito da União assim descritas, a situação em causa no processo principal constitui uma aplicação deste direito, há que, na minha opinião, distinguir entre a credenciação de que a protectus beneficiava para aceder a informações classificadas nos termos do direito nacional e a que lhe permitia ter conhecimento de ICUE.

62.      Deste modo, a situação que levou a ANS, por um lado, a emitir à protectus uma credenciação de segurança industrial que a autorizava a tomar conhecimento de informações classificadas nos termos do direito nacional e, por outro, a revogar essa credenciação não constitui, na minha opinião, uma aplicação do direito da União. Com efeito, a Decisão 2013/488 não contém disposições destinadas a regular as decisões tomadas pelas autoridades nacionais em matéria de acesso, para os efeitos previstos no direito nacional, às informações classificadas nos termos deste direito. Além disso, não decorre dos autos de que o Tribunal de Justiça dispõe que outros atos da União procedam a qualquer forma de harmonização das regras nacionais que regulam o estatuto de tais informações. De resto, o Tribunal de Justiça concluiu recentemente, no seu Acórdão NW e PQ (Informações classificadas), que as regras relativas à classificação e à desclassificação de informações a título de regulamentações nacionais não são objeto de regras harmonizadas por um ato da União (21).

63.      Daqui decorre que se deve considerar que a regulamentação eslovaca relativa à credenciação de segurança industrial, bem como as medidas relativas a esta credenciação adotadas pelas autoridades eslovacas estão abrangidas apenas pelo direito nacional e, por conseguinte, não entram no âmbito de aplicação do direito da União. Consequentemente, a apreciação da legalidade de uma decisão que revoga uma credenciação de segurança industrial não constitui, diretamente, uma forma de «aplicação do direito da União», na aceção artigo 51.°, n.° 1, da Carta.

64.      Em contrapartida, a situação que levou a ANS, por um lado, a emitir à protectus um certificado de segurança industrial que a autorizava a ter acesso a ICUE para o nível SECRET UE/EU SECRET e, por outro, a revogar esse certificado parece constituir, por seu turno, uma aplicação do direito da União.

65.      De facto, pode considerar‑se que o certificado de segurança industrial que, recordo, indica, por força da regulamentação eslovaca, o nível mais elevado de classificação das ICUE a que uma pessoa pode ter acesso e as disposições correspondentes da regulamentação da União ao abrigo da qual é autorizado o acesso dessa pessoa a informações classificadas, tem um objeto e efeitos que abrangem os da CSE prevista na Decisão 2013/488. Acresce que, em conformidade com o que resulta desta decisão, uma Autoridade Nacional de Segurança, no caso em apreço, a ANS, é responsável pela condução do procedimento de credenciação. Decorre igualmente da regulamentação eslovaca que o procedimento de credenciação de segurança visa permitir à pessoa que possui tal credenciação tomar conhecimento de informações classificadas no âmbito do exercício de funções ao abrigo de um acordo internacional a que a República Eslovaca esteja vinculada (22), o que permite deduzir que esta regulamentação não prossegue um objetivo puramente nacional, que se distinguiria, assim, do prosseguido pela Decisão 2013/488.

66.      Acrescento que se pode considerar que os motivos pelos quais a ANS revogou o certificado de segurança industrial da recorrente no processo principal, que dizem respeito, em substância, ao facto de esta representar um risco de segurança devido à existência de uma relação comercial suscetível de prejudicar os interesses da República Eslovaca em matéria de segurança e de atos contrários aos interesses económicos deste Estado‑Membro, implicam que as condições mínimas de concessão da CSE constantes do anexo V da Decisão 2013/488 (23) deixaram de ser respeitadas pela recorrente.

67.      O facto de, nos termos da regulamentação eslovaca, a validade do certificado de segurança industrial estar ligada à da credenciação de segurança industrial (24) não pode, na minha opinião, levar a excluir a situação em causa no processo principal do âmbito de aplicação do direito da União. Com efeito, foi precisamente devido a um risco de segurança identificado que as duas credenciações de segurança foram revogadas.

68.      Além disso, a ligação entre a validade do certificado de segurança industrial e a validade da credenciação de segurança industrial afigura‑se lógica, uma vez que, como reconhece a Comissão do Parlamento Nacional nas suas observações escritas, se foi identificado um risco de segurança relacionado com a entidade em causa nos termos do direito nacional, esse risco não pode ser limitado apenas ao território da República Eslovaca, mas deve, necessariamente, abranger todos os domínios das relações externas deste Estado‑Membro. Nesta matéria, os interesses dos Estados‑Membros e os interesses da União estão estreitamente ligados, pelo que é normal que um risco de segurança identificado a nível nacional, com base, nomeadamente, em informações classificadas nos termos do direito nacional, tenha uma repercussão direta na credenciação para ter acesso a ICUE. Essa ligação entre os interesses dos Estados‑Membros e os interesses da União está, de resto, expressa na própria definição do conceito de ICUE constante do artigo 2.°, n.° 1, da Decisão 2013/488, que coloca a ênfase no facto de tais informações serem aquelas «cuja divulgação não autorizada possa causar prejuízos de vária ordem aos interesses da União Europeia ou de um ou mais EstadosMembros» (25).

69.      Acresce que a vulnerabilidade da empresa em causa pode provir de informações classificadas nos termos do direito nacional, sem que tal exclua a existência de uma aplicação do direito da União no que respeita à revogação do ato que habilita uma pessoa a aceder a ICUE. Importa igualmente esclarecer que o facto de, como refere o órgão jurisdicional de reenvio nos n.os 35 e 37 da sua decisão de reenvio, a revogação da credenciação nacional de segurança industrial se basear exclusivamente no critério da fiabilidade em termos de segurança, tal como definido na regulamentação nacional, não se opõe a que a situação em causa no processo principal constitua uma aplicação direito da União. A este respeito, observo que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, embora incumba exclusivamente aos Estados‑Membros definir os seus interesses essenciais de segurança e adotar as medidas adequadas para garantir a sua segurança interna e externa, o simples facto de uma medida nacional ter sido adotada para efeitos da proteção da segurança nacional não pode levar à inaplicabilidade do direito da União e dispensar os Estados‑Membros do respeito necessário deste direito (26).

70.      Quanto ao facto de a regulamentação eslovaca não ter sido adotada especificamente para aplicar a Decisão 2013/488, cabe recordar que o facto de uma regulamentação nacional não ter sido adotada para transpor um ato da União é indiferente, quando a aplicação dessa regulamentação dê efetivamente execução ao direito da União (27).

71.      Na minha opinião, é indiferente que a Decisão 2013/488 deixe uma ampla margem de apreciação aos Estados‑Membros para estabelecerem a existência e os critérios de um risco de segurança no âmbito do procedimento destinado a emitir, modificar ou revogar uma CSE. Esta situação corresponde àquela em que um ato da União atribui aos Estados‑Membros uma liberdade de escolha entre diversas modalidades de aplicação ou um poder discricionário ou de apreciação que é parte integrante do regime estabelecido por esse ato (28).

72.      Por outro lado, o facto de as autoridades e os procedimentos nacionais serem mobilizados para a execução das obrigações previstas na Decisão 2013/488 não impede que se declare a existência de uma aplicação do direito da União, na aceção artigo 51.°, n.° 1, da Carta. Trata‑se apenas de uma expressão clássica da regra de que os Estados‑Membros devem, no âmbito das suas estruturas e dos seus procedimentos nacionais, assegurar a aplicação das regras do direito da União que lhes impõem obrigações.

73.      Na minha opinião, a inexistência de um direito formal à obtenção ou à manutenção de uma CSE também não constitui uma condição à qual a aplicabilidade da Carta possa estar subordinada.

74.      Assim, a proteção das ICUE é assegurada pelos Estados‑Membros e pelas respetivas Autoridades Nacionais de Segurança em conformidade com as disposições legislativas e regulamentares nacionais (29). Esta referência ao direito nacional não pode ser entendida no sentido de que deixa aos Estados‑Membros o poder de fixar, de forma autónoma, o âmbito da proteção das ICUE. Os Estados‑Membros estão, por conseguinte, obrigados a garantir tal proteção no respeito pelas normas fixadas pelo direito da União.

75.      De um modo mais geral, parece‑me impossível sustentar que o direito da União é alheio à definição e à aplicação das regras relativas à proteção das ICUE, quando, na verdade, essas regras visam garantir o bom funcionamento da União. Tal equivaleria a considerar que a concessão ou a revogação de uma credenciação para aceder a tais informações pode ser vista como o exercício, pelos Estados‑Membros, de uma competência própria que não é abrangida pelo âmbito de aplicação do direito da União nem, consequentemente, pelo âmbito de aplicação da Carta. Pelo contrário, a aplicação em matéria de proteção das ICUE das disposições legislativas e regulamentares nacionais em matéria de informações classificadas deve, na minha opinião, ser efetuada em conformidade com o direito da União.

76.      Deduzo dos elementos que antecedem que, à luz das regras relativas à proteção das ICUE previstas na Decisão 2013/488, uma autoridade nacional que atribua um certificado de segurança industrial que equivale a uma CSE concede uma autorização prevista no direito da União. Os efeitos desta autorização, bem como os da sua revogação são definidos pelo direito da União e produzem‑se, essencialmente, nas relações entre a pessoa em causa e as instituições da União. Acresce que a autoridade nacional competente que decide revogar uma CSE age em cumprimento de uma missão que nela é delegada pelas instituições da União para assegurar a proteção das ICUE. Por conseguinte, essa autoridade deve conformar‑se com as exigências mínimas definidas pelo direito da União.

77.      No que diz respeito à recorrente no processo principal, importa igualmente sublinhar o caráter especialmente amplo do âmbito de aplicação pessoal da Decisão 2013/488. A este respeito, saliento que o n.° 8 do anexo V desta decisão está formulado em termos gerais na medida em que não limita as pessoas a quem uma CSE deve ser concedida (30).

78.      Acresce que esse número dispõe que «[a] CSE será apresentada ao SGC […] antes de as ICUE serem fornecidas ao contratante ou subcontratante ou potencial contratante ou subcontratante ou de lhe ser concedido acesso a essas informações». Decorre desta disposição que a credenciação de segurança prevista na Decisão 2013/488 pode beneficiar um potencial contratante, o que é muito genérico e pode abranger uma empresa como a recorrente no processo principal. No mesmo sentido, há que esclarecer que o conceito de «contratante» é definido no apêndice A desta decisão como uma «pessoa singular ou coletiva com capacidade jurídica para celebrar contratos» e não como uma pessoa atualmente vinculada ao Conselho por um contrato ou que já tenha iniciado diligências com vista a estabelecer uma relação contratual.

79.      Quanto à situação da protectus, tendo em conta o seu eventual acesso a ICUE, o que importa é que, ainda que tal acesso nunca tenha acontecido de facto, esta empresa pediu um certificado de segurança industrial cujo objeto é, nomeadamente, permitir ao seu beneficiário ter conhecimento de ICUE. Por outro lado, a protectus referiu, na audiência, que tinha contratos em vigor com o Ministerstvo hospodárstva (Ministério da Economia, Eslováquia). Ora, não se pode excluir que esse tipo de relações contratuais possa envolver ICUE, devido à imbricação dos domínios relativos à proteção das informações classificadas a nível nacional e à proteção das ICUE.

80.      Tendo em conta todos estes elementos, a aplicação dos critérios adotados na jurisprudência constante do Tribunal de Justiça à situação em causa no processo principal leva a concluir, na minha opinião, contrariamente ao que sustentam todos os participantes no presente processo, com exceção da protectus, que um Estado‑Membro aplica o direito da União, em conformidade com o previsto no artigo 51.°, n.° 1, da Carta, quando um dos seus órgãos jurisdicionais fiscaliza a legalidade de uma decisão que revoga um certificado de segurança industrial que autoriza o acesso a ICUE, que equivale a uma CSE, na aceção do artigo 11.° e do anexo V da Decisão 2013/488. A este respeito, é indiferente que a regulamentação nacional estabeleça uma ligação entre a validade desse certificado de segurança industrial e a validade de uma credenciação nacional de segurança industrial, na medida em que a revogação do referido certificado se baseie na conclusão de que o seu titular representa um risco de segurança. Daqui decorre que a Carta é aplicável ao processo principal.

C.      Quanto à segunda questão prejudicial

81.      Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio interroga o Tribunal de Justiça, em substância, sobre as garantias processuais que devem ser asseguradas, em aplicação do artigo 47.° da Carta, a uma empresa cuja CSE foi revogada por uma Autoridade Nacional de Segurança com base, em parte, em informações classificadas às quais essa empresa não pôde ter acesso. Mais concretamente, esse órgão jurisdicional pretende saber se este artigo se opõe a uma regulamentação nacional que não garante à pessoa em causa nem ao seu advogado acesso às informações classificadas que fundamentam a revogação de uma CSE e que não permite ao juiz assegurar tal acesso, quando o próprio juiz tem acesso a essas informações classificadas.

82.      A este respeito o órgão jurisdicional de reenvio refere que decorre do § 26, n.° 3, da Lei n.° 215/2004, lido em conjugação com o § 50, n.° 6, desta lei, que, quando decide que uma pessoa não pode tomar conhecimento de informações classificadas, a ANS deve indicar, na sua decisão, os elementos que a fundamentam, as considerações que orientaram a sua apreciação das provas, bem como as informações relativas à possibilidade de impugnar a decisão.

83.      Segundo a prática da ANS e da Comissão do Parlamento Nacional, as diferentes informações classificadas nas quais as suas decisões se baseiam não constam da fundamentação destas. Essas decisões contêm apenas uma remissão para o título da prova documental que inclui essas informações.

84.      Na medida em que contenham informações classificadas, as provas documentais não são acessíveis à pessoa sujeita a um procedimento de credenciação de segurança industrial.

85.      Se essa pessoa recorrer da decisão que revoga uma credenciação ou um certificado de segurança industrial, os juízes que apreciam esse recurso estão autorizados, sem restrições, ao abrigo do § 34, n.° 1, alínea f), da Lei n.° 215/2004, a tomar conhecimento de todas as informações classificadas contidas nos autos.

86.      Ao abrigo do § 35, n.° 3, da Lei n.° 215/2004, o advogado da pessoa em causa pode, também ele, tomar conhecimento dessas informações classificadas, mas apenas com o consentimento da autoridade que identificou a informação classificada em causa e a comunicou à ANS. Esse advogado fica, então, sujeito a um dever de confidencialidade no que respeita a essa informação, o que, na prática, significa que não a pode divulgar ao seu cliente.

87.      Antes de analisar a compatibilidade das garantias processuais assim descritas com o artigo 47.° da Carta, importa refletir, como o órgão jurisdicional de reenvio convida o Tribunal de Justiça a fazer, sobre a aplicabilidade deste artigo à situação em causa no processo principal.

1.      Quanto à aplicabilidade do artigo 47 da Carta

88.      Quando apliquem o direito da União, os Estados‑Membros estão obrigados, em conformidade com o artigo 51.°, n.° 1, da Carta, a assegurar o respeito pelas exigências que decorrem, nomeadamente, do direito à ação e do direito a um processo equitativo, consagrados no artigo 47.°, primeiro e segundo parágrafos, da Carta (31).

89.      À primeira vista, pode parecer que uma aplicação do direito da União, na aceção do artigo 51.°, n.° 1, da Carta, implica a aplicabilidade do artigo 47.° desta (32). Existiria, assim, uma certa automaticidade entre a condição de aplicação do direito da União e a necessidade de respeitar este último artigo.

90.      No entanto, a jurisprudência do Tribunal de Justiça parece indicar que essa automaticidade não é real.

91.      Com efeito, resulta desta jurisprudência que a aplicação do artigo 47.° da Carta num determinado caso concreto pressupõe que a pessoa que o invoca se baseie em direitos ou liberdades garantidos pelo direito da União ou que essa pessoa seja objeto de procedimentos que constituem uma aplicação do direito da União (33). Esta condição acresce à condição geral relativa à aplicação do direito da União enunciada no artigo 51.°, n.° 1, da Carta (34), que é objeto da primeira questão.

92.      No caso em apreço, o órgão jurisdicional de reenvio manifesta as suas dúvidas quanto à questão de saber se a recorrente no processo principal se pode basear num direito garantido pelo direito da União e convida o Tribunal de Justiça a determinar se as regras previstas na Decisão 2013/488 podem fundamentar, em benefício da recorrente no processo principal, um direito garantido pelo direito da União, cuja proteção a recorrente pode invocar com base no artigo 47.° da Carta.

93.      Considero que, no caso em apreço, esta condição está preenchida.

94.      É verdade, como referi anteriormente, que a Decisão 2013/488 deixa aos Estados‑Membros uma ampla margem de apreciação para determinarem em que casos deve ser concedida ou revogada uma CSE. Assim, o anexo V desta decisão impõe aos Estados‑Membros que efetuem determinadas verificações mínimas antes de emitir uma CSE, sem, contudo, conferir aos interessados um direito de obter uma CSE quando estejam reunidas determinadas condições. Estes também não dispõem de um direito de conservar a sua credenciação, mesmo que continuem a preencher as condições mínimas previstas na referida decisão.

95.      Contudo, considero que, embora a Decisão 2013/488 não conceda a uma empresa o direito de obter uma CSE nem o de a conservar, confere, no entanto, à empresa que obteve tal credenciação um direito específico de participar em contratos classificados do Conselho.

96.      Na mesma ordem de ideias, para determinar se o artigo 47.° da Carta é aplicável, na minha opinião, há que ter em conta os efeitos que uma decisão de revogação da CSE pode ter sobre uma empresa. A este respeito, recordo que, no anexo V, n.° 13, da Decisão 2013/488, está previsto que «[a] retirada [de tal credenciação] constituirá motivo suficiente para que o SGC, enquanto entidade adjudicante, ponha termo a um contrato classificado ou exclua um dos proponentes do concurso». Tendo em conta as consequências negativas que uma decisão de revogação de uma CSE pode ter para uma empresa, considero que esta pode legitimamente reclamar o respeito pelas exigências relativas à proteção jurisdicional efetiva quando contesta a legalidade de tal decisão.

97.      Em todo o caso, saliento que, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a proteção das pessoas, tanto singulares como coletivas, contra intervenções arbitrárias ou desproporcionadas do poder público na sua esfera de atividade privada constitui um princípio geral do direito da União (35). Segundo o Tribunal de Justiça, esta proteção pode ser invocada por uma pessoa coletiva, enquanto direito garantido pelo direito da União, na aceção do artigo 47.°, primeiro parágrafo, da Carta, para contestar judicialmente um ato lesivo (36).

98.      Uma vez que a aplicabilidade do artigo 47.° da Carta se afigura estabelecida, importa especificar quais são as garantias processuais que uma empresa como a protectus pode retirar deste artigo numa situação como a que está em causa no processo principal.

2.      Quanto às garantias decorrentes do artigo 47 da Carta em matéria de acesso às ICUE

99.      As interrogações do órgão jurisdicional de reenvio quanto à conformidade das regras processuais previstas na regulamentação eslovaca com o artigo 47.° da Carta têm origem na alegada diferença entre a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (a seguir «TEDH») e a jurisprudência do Tribunal de Justiça em matéria de limitação do princípio do contraditório perante informações classificadas.

100. Assim, de acordo com o órgão jurisdicional de reenvio, o TEDH, no seu Acórdão de 19 de setembro de 2017, Regner c. República Checa (37), considerou determinante, para concluir pela inexistência de violação do artigo 6.°, n.° 1, da CEDH, o facto de o órgão jurisdicional competente para fiscalizar a legalidade de uma decisão de revogação da credenciação de segurança ter acesso à totalidade das informações classificadas que fundamentaram a adoção de tal decisão (38).

101. Em aplicação do artigo 52.°, n.° 3, da Carta, pode, por conseguinte, afigurar‑se suficiente, à luz do artigo 47.° da Carta e dessa jurisprudência do TEDH relativa ao artigo 6.°, n.° 1, da CEDH, que apenas o órgão jurisdicional encarregado de fornecer proteção jurisdicional à pessoa em causa possa tomar conhecimento das informações classificadas.

102. No entanto, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que tal solução não é necessariamente suficiente à luz do artigo 47.° da Carta. O referido órgão jurisdicional remete, a este respeito, para o Acórdão Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság e o.

103. Por conseguinte, o Tribunal de Justiça é convidado a determinar se, em matéria de proteção das ICUE, o artigo 47.° da Carta deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional por força da qual uma decisão de revogação da CSE não refere as informações classificadas que estiveram na base dessa decisão, a pessoa coletiva em causa não tem acesso ao processo da Autoridade Nacional de Segurança que contém essas informações, o advogado dessa pessoa coletiva pode ter acesso a esse processo na condição de obter o consentimento dessa autoridade e de garantir a confidencialidade das informações comunicadas e, por seu turno, o órgão jurisdicional nacional encarregado de fiscalizar a legalidade dessa decisão tem acesso a todas as informações classificadas constantes desse processo.

104. Para responder a esta questão, saliento que decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, na falta de disposições aplicáveis do direito da União relativas à forma como os Estados‑Membros devem assegurar o respeito pelos direitos de defesa da pessoa em causa quando o seu direito de acesso ao processo seja restringido em aplicação de uma regulamentação nacional, as modalidades concretas dos procedimentos estabelecidos para o efeito integram a ordem jurídica interna de cada Estado‑Membro, por força do princípio da autonomia processual dos Estados‑Membros, desde que, todavia, não sejam menos favoráveis do que as que regulam situações semelhantes de direito interno (princípio da equivalência) e não tornem, na prática, impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União (princípio da efetividade) (39).

105. No que diz respeito ao princípio da equivalência, recordo que, como refere o órgão jurisdicional de reenvio, decorre do § 26, n.° 3, da Lei n.° 215/2004, lido em conjugação com o § 50, n.° 6, desta lei, que a ANS, quando decide que uma pessoa não pode tomar conhecimento de informações classificadas nos termos do direito nacional, nomeadamente quando se demonstre que essa pessoa representa um risco em termos de segurança, deve indicar, na sua decisão, os elementos que a fundamentam, as considerações que orientaram a sua apreciação das provas, bem como as informações relativas à possibilidade de impugnar a decisão.

106. Estas garantias processuais, que consistem na existência de uma decisão fundamentada, devem ser igualmente válidas no que se refere a uma decisão de revogação de uma CSE, sob pena de se violar o princípio da equivalência. Por conseguinte, afigura‑se‑me pacífico que uma empresa como a protectus, que é objeto de tal decisão, deve poder conhecer os motivos, pelo menos os essenciais, que subjazem a essa decisão, nas condições previstas nessas disposições da Lei n.° 215/2004, tal como interpretadas pelos órgãos jurisdicionais nacionais. Parece ser esse o caso atendendo à ligação que a regulamentação eslovaca estabelece entre a revogação de uma credenciação de segurança industrial e a revogação de um certificado de segurança industrial.

107. Contudo, há que observar que não se pode deduzir do princípio da equivalência uma obrigação de comunicar à pessoa que é objeto de uma decisão de revogação da sua CSE as informações classificadas que estiveram na base dessa decisão. Com efeito, como referi anteriormente, segundo a prática da ANS e da Comissão do Parlamento Nacional, as diferentes informações classificadas nas quais as suas decisões se baseiam não constam da fundamentação destas. Portanto, é à luz do princípio da efetividade que há que analisar este aspeto.

108. Quanto a este princípio, importa sublinhar que apenas é respeitado se a regra processual em causa estiver em conformidade com o direito à proteção jurisdicional efetiva garantido pelo artigo 47.° da Carta (40). Assim, a obrigação de os Estados‑Membros assegurarem a efetividade dos direitos conferidos aos particulares pelo direito da União implica uma exigência de proteção jurisdicional consagrada neste artigo 47.°, que o juiz nacional está obrigado a respeitar. Esta proteção deve ser assegurada tanto no plano da designação dos órgãos jurisdicionais competentes para conhecer de ações baseadas no direito da União como no plano da definição das regras processuais relativas a tais ações(41).

109. Importa igualmente recordar que, quando os Estados‑Membros aplicam o direito da União, têm a obrigação de assegurar o respeito pelas exigências que decorrem do direito a um recurso efetivo consagrado no artigo 47.°, primeiro parágrafo, da Carta, o qual impõe, no decurso de um processo judicial, o respeito pelos direitos de defesa da pessoa em questão (42).

110. Assim, decorre de jurisprudência constante que a efetividade da fiscalização jurisdicional garantida pelo artigo 47.° da Carta, que importa recordar que é suficiente por si só (43), exige que o interessado possa conhecer os motivos nos quais se baseia a decisão tomada a seu respeito, quer através da leitura da própria decisão quer através da comunicação desses motivos feita a seu pedido, sem prejuízo do poder do juiz competente de exigir à autoridade em causa que os comunique, para lhe permitir defender os seus direitos nas melhores condições possíveis e decidir com pleno conhecimento de causa se é útil recorrer ao juiz competente, bem como para dar a este último condições para exercer plenamente a fiscalização da legalidade da decisão nacional em causa (44). O respeito pelos direitos de defesa implica que o interessado possa aceder não apenas aos motivos da decisão tomada a seu respeito, mas igualmente a todos os elementos do processo nos quais a Administração se baseou, a fim de poder efetivamente tomar posição sobre esses elementos (45).

111. Além disso, o princípio do contraditório, que faz parte dos direitos de defesa, referidos no artigo 47.° da Carta, implica que as partes num processo devem ter o direito de tomar conhecimento de todos os documentos ou observações apresentados ao juiz a fim de influenciar a sua decisão e de os discutir, o que pressupõe que a pessoa em causa deve poder tomar conhecimento dos elementos do seu processo que são colocados à disposição do órgão jurisdicional chamado a pronunciar‑se sobre o recurso interposto dessa decisão (46).

112. No entanto, em conformidade com o previsto no artigo 52.°, n.° 1, da Carta, o direito de acesso ao processo não tem um caráter absoluto à luz do artigo 47.° da Carta. Por conseguinte, importa recordar que os direitos de defesa não são prerrogativas absolutas e que o direito de acesso ao processo, que é o seu corolário, pode ser limitado com base numa ponderação entre, por um lado, o direito a um recurso efetivo da pessoa em causa e, por outro, os interesses evocados para justificar a não divulgação de um elemento do processo a essa pessoa, em particular quando esses interesses digam respeito à segurança nacional (47). Com efeito, pode revelar‑se necessário, tanto num procedimento administrativo como num processo judicial, não comunicar determinadas informações ao interessado, designadamente atendendo a considerações relacionadas com a segurança nacional (48).

113. Contudo, o Tribunal de Justiça recusa, de forma constante, que os direitos de defesa sejam reduzidos a nada, seja qual for a sensibilidade do domínio em causa. Em cada processo, convida o juiz nacional a procurar o ponto de equilíbrio entre o direito a um recurso efetivo e a preservação das exigências de segurança.

114. Assim, de acordo com o Tribunal de Justiça, a ponderação que o juiz nacional deve efetuar não pode levar, tendo em conta o necessário respeito pelo artigo 47.° da Carta, a privar de efetividade os direitos de defesa da pessoa em causa e a esvaziar de conteúdo o direito de recurso de que essa pessoa deve dispor ao abrigo deste artigo, nomeadamente não lhe comunicando ou, sendo caso disso, ao seu representante legal, pelo menos, a essência dos motivos nos quais se baseia a decisão tomada a seu respeito (49).

115. Em contrapartida, esta ponderação pode levar a que determinados elementos do processo não sejam comunicados à pessoa em questão quando a divulgação desses elementos for suscetível de comprometer, direta e especialmente, a segurança nacional do Estado‑Membro em causa, na medida em que pode, nomeadamente, pôr em perigo a vida, a saúde ou a liberdade de pessoas ou revelar os métodos de investigação especificamente utilizados pelos órgãos encarregados de funções especializadas ligadas à segurança nacional e, assim, dificultar gravemente, ou até impedir, o cumprimento futuro das tarefas dessas autoridades (50).

116. Decorre do exposto que, embora o direito da União autorize os Estados‑Membros, nomeadamente quando a segurança nacional o exija, a não conceder à pessoa em causa um acesso direto a todo o seu processo, este direito não pode, sem violar o princípio da efetividade, o direito a uma boa administração e o direito a um recurso efetivo, ser interpretado no sentido de que permite às autoridades competentes colocar essa pessoa numa situação em que nem ela nem o seu representante legal estejam em condições de tomar utilmente conhecimento, sendo caso disso, no âmbito de um procedimento específico destinado a preservar a segurança nacional, da essência dos elementos determinantes constantes desse processo (51).

117. Neste contexto, o Tribunal de Justiça já declarou que, por um lado, quando a divulgação de informações constantes do processo foi restringida por um motivo de segurança nacional, o respeito pelos direitos de defesa da pessoa em causa não é suficientemente assegurado pela possibilidade de essa pessoa obter, em determinadas condições, uma autorização para aceder a essas informações acompanhada de uma proibição completa de utilizar as informações assim obtidas para efeitos do procedimento administrativo ou do processo judicial (52).

118. Por outro lado, quanto à questão de saber se os direitos de defesa da pessoa em causa são suficientemente garantidos pela faculdade de o órgão jurisdicional competente aceder ao processo, importa sublinhar que essa faculdade não pode substituir o acesso às informações constantes do processo pela pessoa em causa ou pelo seu representante legal (53). Assim, o respeito pelos direitos de defesa no processo judicial implica não que o órgão jurisdicional competente disponha de todos os elementos pertinentes para proferir a sua decisão, mas que a pessoa em causa, sendo caso disso por intermédio de um advogado, possa invocar os seus interesses manifestando o seu ponto de vista sobre esses elementos (54). Com efeito, o acesso às informações constantes do processo pelos órgãos jurisdicionais competentes e a implementação de procedimentos que garantam que os direitos de defesa da pessoa em causa são respeitados constituem dois requisitos distintos e cumulativos (55).

119. As considerações que precedem levaram o Tribunal de Justiça a declarar na sua jurisprudência mais recente, na linha dos seus acórdãos anteriores, que o princípio geral da boa administração e o artigo 47.° da Carta, lidos em conjugação com o artigo 20.° TFUE, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma regulamentação nacional que prevê que, quando uma decisão de retirada ou de recusa de um título de residência, adotada em relação a um nacional de um país terceiro que pode beneficiar de um direito de residência derivado ao abrigo do referido artigo 20.°, se baseia em informações cuja divulgação compromete a segurança nacional do Estado‑Membro em causa, esse nacional de um país terceiro ou o seu representante legal só podem aceder a essas informações após terem obtido uma autorização para esse efeito, não lhes é comunicada a essência dos motivos em que se baseiam essas decisões e não podem, em qualquer circunstância, utilizar, para efeitos do procedimento administrativo ou do processo judicial, as informações a que puderam ter acesso (56).

120. O órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se estes elementos retirados da jurisprudência do Tribunal de Justiça e as conclusões a que este chegou até ao momento são transponíveis para o domínio relativo à proteção das ICUE, o que poderia levar a concluir que o artigo 47.° da Carta se opõe à regulamentação nacional em causa no processo principal.

121. Esta questão afigura‑se legítima, atendendo à especificidade do domínio relativo à proteção das ICUE, que o distingue dos domínios em que o Tribunal de Justiça forneceu, até ao momento, indicações sobre a ponderação que deve ser efetuada entre o direito a um recurso efetivo e os interesses evocados para justificar a não divulgação de determinadas informações, em especial quando esses interesses dizem respeito à segurança nacional.

122. Decorre de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que a existência de uma violação dos direitos de defesa, incluindo o direito de acesso ao processo, deve ser apreciada em função das circunstâncias específicas de cada caso concreto, nomeadamente da natureza do ato em causa, do contexto em que foi adotado e das regras jurídicas que regem a matéria em causa (57).

123. A este respeito, importa sublinhar que o presente processo se distingue dos processos que deram origem aos Acórdãos ZZ, Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság e o., bem como NW e PQ (Informações classificadas). Com efeito, quando está em causa quer uma decisão que restringe a livre circulação de um cidadão da União por razões de segurança pública quer uma decisão de indeferimento de um pedido de proteção internacional ou de retirada de tal proteção devido a uma ameaça para a segurança nacional, quer uma decisão de retirada ou de recusa de emissão de um título de residência, por um motivo de segurança nacional, a um nacional de um país terceiro que pode beneficiar de um direito de residência derivado ao abrigo do artigo 20.° TFUE, o princípio é o da comunicação completa dos motivos e das informações nas quais essas decisões se baseiam. A limitação deste princípio afigura‑se, portanto, como uma exceção que deve ser objeto de interpretação estrita (58).

124. No domínio relativo à proteção das informações classificadas, parece‑me que a lógica deve ser invertida, pelo que o princípio é o da proibição de divulgar tais informações a pessoas não autorizadas. A divulgação das informações classificadas constitui, assim, a exceção a esta regra e apenas pode ser efetuada a favor de pessoas que preencham os requisitos necessários para beneficiar de uma credenciação de segurança. Enquanto exceção, tal divulgação pode, validamente, estar circunscrita dentro de limites restritos.

125. Daqui decorre que uma pessoa cuja CSE seja posta em causa por uma Autoridade Nacional de Segurança não pode, no âmbito do processo judicial destinado a impugnar uma decisão de revogação dessa credenciação, reivindicar o acesso às informações classificadas nas quais essa decisão se baseia, quer essa classificação resulte do direito nacional quer do direito da União. Seria paradoxal que, apesar de a sua credenciação para poder aceder a informações classificadas ser posta em causa por uma Autoridade Nacional de Segurança, uma pessoa pudesse obter, no âmbito desse processo, a possibilidade de consultar informações dessa natureza que lhe dizem respeito. Tal equivaleria a revelar‑lhe informações classificadas que estiveram na base da decisão destinada a impedi‑la de consultar ICUE e, portanto, a permitir‑lhe tomar conhecimento de informações classificadas com vista a demonstrar que, contrariamente ao que considera a autoridade nacional competente, está apta a aceder a tais informações. Por conseguinte, tendo em conta o próprio objeto da decisão de revogação de uma credenciação de segurança, o acesso a informações classificadas pela pessoa que é objeto dessa decisão, incluindo no âmbito de um processo judicial, levaria, na minha opinião, a pôr em causa a regra de que apenas as pessoas que possuem tal credenciação podem ter conhecimento dessas informações.

126. O respeito pelo princípio da não divulgação das informações classificadas às pessoas que contestam a revogação da sua credenciação de segurança no âmbito de um processo judicial é justificado pelas exigências de precaução e de prevenção que são inerentes ao domínio relativo à proteção das ICUE, bem como pela ampla margem de apreciação que deve ser reconhecida aos Estados‑Membros para efeitos de concessão ou de revogação de uma CSE.

127. Acresce que, como referi anteriormente, o Tribunal de Justiça já salientou a necessidade de determinados elementos do processo não serem comunicados à pessoa em causa quando a divulgação desses elementos seja suscetível de comprometer, direta e especialmente, a segurança nacional do Estado‑Membro em questão, na medida em que possa, nomeadamente, pôr em perigo a vida, a saúde ou a liberdade de pessoas ou revelar os métodos de investigação especificamente utilizados pelos órgãos encarregados de funções especializadas ligadas à segurança nacional e, assim, dificultar gravemente, ou até impedir, o cumprimento futuro das tarefas desses órgãos (59). Tais imperativos, que o Tribunal de Justiça salientou inicialmente no seu Acórdão ZZ (60), aos quais se pode acrescentar a necessidade de não prejudicar inquéritos penais em curso dos quais possa ser objeto a pessoa em causa ou pessoas que lhe sejam próximas (61), afiguram‑se especialmente pertinentes no domínio relativo à proteção das ICUE.

128. A este respeito, importa salientar que as pessoas que solicitam uma credenciação de segurança, assim como as que já obtiveram essa credenciação, são objeto de inquéritos que têm como finalidade detetar qualquer elemento que as possa expor ao risco de chantagem ou de pressão para as forçar a colaborar com estruturas ou agentes mal‑intencionados que desejem aceder às informações classificadas que estão na sua posse. Estes inquéritos assentam em critérios objetivos e métodos de investigação que permitem determinar se uma pessoa que solicitou ou que possua uma credenciação de segurança tem, pelo seu comportamento ou pelo seu contexto, uma vulnerabilidade que possa ser utilizada por um terceiro para obter dados protegidos. Em suma, cabe à autoridade nacional competente determinar se uma pessoa pode ou não ser considerada fiável do ponto de vista da segurança e da necessária confidencialidade das informações classificadas, assegurando‑se de que essa pessoa é leal e digna de confiança. Afigura‑se‑me essencial que sejam preservados não apenas o caráter confidencial das informações classificadas que permitem à Autoridade Nacional de Segurança concluir que uma pessoa representa um risco de segurança, mas também o sigilo que deve rodear as provas e os métodos de investigação pelos quais esse risco é demonstrado.

129. Assim, os inquéritos destinados a apreciar a existência de um risco de segurança industrial devem, por natureza, beneficiar de uma estrita confidencialidade, tanto mais que importa assegurar que a aplicação do direito da União não prejudica o exercício da competência puramente nacional que consiste em proteger as informações classificadas nos termos do direito nacional.

130. Resulta destes elementos que, no domínio relativo à proteção das ICUE, a função do juiz nacional que é chamado a fiscalizar a legalidade de uma decisão de revogação de uma CSE deve ser orientada pelo princípio da não divulgação de informações classificadas ao recorrente que contesta tal decisão.

131. No entanto, como já precisei, a jurisprudência do Tribunal de Justiça parece assentar na ideia fundamental de que, independentemente da sensibilidade do domínio em causa, os direitos de defesa não podem ser reduzidos a nada e a fiscalidade exercida pelo juiz nacional com base na totalidade das informações pertinentes não pode substituir o exercício efetivo desses direitos pela pessoa em causa ou pelo seu representante. Os direitos de defesa, que são indispensáveis para permitir, por um lado, à pessoa que é objeto de uma decisão de revogação de uma CSE exprimir o seu ponto de vista e, por outro, ao juiz fiscalizar a legalidade dessa decisão com total conhecimento de causa pressupõem, na minha opinião, que essa pessoa não desconheça totalmente o que lhe é imputado. De resto, os motivos nos quais uma decisão de revogação de uma CSE se baseia não resultam todos, necessariamente, de informações classificadas, como mostra a situação em causa no processo principal. Importa acrescentar que o exercício efetivo dos direitos de defesa, em virtude do qual a pessoa privada de um direito decorrente de uma CSE deve ter a possibilidade de contestar as acusações que lhe são feitas, não deve ser afetado pelo facto de essa pessoa não poder reivindicar o direito de obter ou de conservar essa credenciação.

132. Por conseguinte, considero que, embora, no domínio relativo à proteção das ICUE, o princípio da minimização dos elementos a comunicar à pessoa que é objeto de uma decisão de revogação de uma CSE deva prevalecer, essa pessoa ou, se for o caso, o seu representante deve ter conhecimento, pelo menos, da essência dos motivos nos quais essa decisão se baseia. Tal garantia mínima resulta de forma constante da jurisprudência do Tribunal de Justiça (62). Refiro, todavia, os seguintes limites no contexto específico do domínio em causa no presente processo.

133. Em primeiro lugar, a garantia de que deve ser comunicada à pessoa em causa ou, se for o caso, ao seu representante, pelo menos, a essência dos motivos nos quais uma decisão de revogação de uma CSE se baseia não pode levar a que sejam divulgadas, ainda que parcialmente, informações classificadas. Esta comunicação da essência dos motivos deve, por isso, ser efetuada no respeito pela estrita confidencialidade deste tipo de informações. Por outro lado, tal comunicação deve ser feita no respeito por outros interesses públicos que referi anteriormente, como a necessidade de não revelar métodos de investigação ou de não prejudicar inquéritos penais em curso.

134. Em segundo lugar, considero que, para que os direitos de defesa da pessoa que é objeto de uma decisão de revogação da sua CSE sejam suficientemente garantidos, não é necessário que se comunique a essa pessoa a essência de todos os motivos nos quais essa decisão se baseia. Na minha opinião, basta que a referida pessoa tenha conhecimento da essência do ou dos motivos que constituem, segundo o juiz nacional, uma base suficiente para sustentar a referida decisão, tendo em conta as exigências de precaução e de prevenção, bem como a ampla margem de apreciação que deve ser reconhecida à autoridade nacional competente no domínio relativo à proteção das ICUE (63).

135. A luz destas considerações, entendo que a regulamentação eslovaca contém garantias suficientes que, no seu conjunto, permitem assegurar o respeito pelos direitos de defesa de uma pessoa que é objeto de uma decisão de revogação de uma CSE.

136. A este respeito, recordo que, de acordo com as indicações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, o órgão jurisdicional que fiscaliza a legalidade dessa decisão tem acesso a todo o processo da Autoridade Nacional de Segurança. Por outro lado, embora a pessoa coletiva em causa não tenha acesso a esse processo que contém as informações classificadas que, a par de outros elementos, estiveram na base da referida decisão, o advogado dessa pessoa coletiva pode ter acesso ao referido processo na condição de obter o consentimento dessa autoridade e de garantir a confidencialidade das informações comunicadas. Além disso, saliento que, no decurso do processo judicial, a pedido do advogado da recorrente no processo principal, a ANS lhe comunicou duas provas documentais classificadas.

137. Além dessas informações classificadas, decorre da decisão de reenvio que a ANS tomou conhecimento de informações não classificadas segundo as quais, nomeadamente, a recorrente no processo principal ou membros do seu órgão de administração eram objeto de um inquérito penal, a recorrente tinha celebrado contratos com sociedades que eram objeto desse inquérito, tinha pagado a essas sociedades quantias em dinheiro fora do habitual e existiam suspeitas de ligações entre o seu pessoal e uma outra sociedade com a qual tinha participado em concursos públicos, tendo assim as duas sociedades apresentado propostas sob controlo comum. É ponto assente que a recorrente no processo principal pôde pronunciar‑se sobre as informações assim obtidas pela ANS.

138. Além disso, a revogação, pela ANS, da credenciação de segurança industrial, que teve como consequência automática a revogação do certificado de segurança industrial, baseou‑se na conclusão de que a recorrente no processo principal representava um risco de segurança devido à existência de uma relação comercial suscetível de prejudicar os interesses da República Eslovaca em matéria de segurança e de atos contrários aos interesses económicos deste Estado‑Membro. Na fundamentação desta decisão, a ANS remeteu, por um lado, para informações não classificadas que apresentou pormenorizadamente e, por outro, para informações classificadas cujo conteúdo não revelou.

139. Como refere o órgão jurisdicional de reenvio, a recorrente no processo principal põe em causa, no seu recurso, as diferentes considerações factuais e jurídicas nas quais a ANS e a Comissão do Parlamento Nacional basearam a sua conclusão de que a recorrente no processo principal representava um risco de segurança, o que permite supor que essas considerações foram dadas a conhecer à recorrente no processo principal, que, por conseguinte, teve a possibilidade de as contestar.

140. Deduzo destes elementos que, em aplicação das garantias previstas na regulamentação eslovaca, a recorrente no processo principal não está numa situação em que ignorava o que lhe é imputado, ainda que não dispusesse, na minha opinião corretamente, de todas as informações classificadas de que queria tomar conhecimento. As indicações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio levam‑me, pelo contrário, a considerar que foi comunicado à recorrente no processo principal a essência dos motivos suscetíveis de constituir uma base suficiente para justificar a decisão de revogação da sua CSE, o que compete, naturalmente, ao órgão jurisdicional de reenvio verificar. Tal significa que, se este órgão jurisdicional considerar que os motivos enunciados nessa decisão são suficientes para a justificar, tendo em conta a ampla margem de apreciação que deve ser reconhecida à autoridade nacional competente no domínio relativo à proteção das ICUE, e que esses motivos puderam ser discutidos pela recorrente no processo principal, o que parece ter sido o caso, não se deve concluir que existiu uma violação dos direitos de defesa.

141. Consequentemente, na minha opinião, o artigo 47.° da Carta deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma regulamentação nacional por força da qual uma decisão que revoga uma CSE não refere as informações classificadas que estiveram na base dessa decisão e a pessoa coletiva em causa não tem acesso ao processo da Autoridade Nacional de Segurança que contém essas informações, desde que, primeiro, o advogado dessa pessoa coletiva possa ter acesso a esse processo na condição de obter o consentimento dessa autoridade e de garantir a confidencialidade das informações comunicadas, segundo, o órgão jurisdicional nacional encarregado de fiscalizar a legalidade dessa decisão tenha acesso à totalidade das informações classificadas constantes do referido processo e, terceiro, a referida pessoa coletiva tenha tido conhecimento da essência dos motivos suscetíveis de constituir uma base suficiente para justificar a referida decisão, o que incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

D.      Quanto à terceira e quarta questões prejudiciais

142. Com as suas questões terceira e quarta, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 47.° da Carta deve ser interpretado no sentido de que impõe que o órgão jurisdicional ao qual incumbe fiscalizar a legalidade de uma decisão que revoga uma CSE, parcialmente baseada em informações classificadas, disponha do poder de autorizar o acesso da pessoa coletiva objeto dessa decisão ao processo da Autoridade Nacional de Segurança que contém essas informações. Em caso de resposta afirmativa, o órgão jurisdicional de reenvio pretende, igualmente, obter esclarecimentos quanto ao alcance de tal poder.

143. Há que esclarecer que a terceira questão é submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio na hipótese de o Tribunal de Justiça responder à segunda questão que o artigo 47.° da Carta se opõe à regulamentação eslovaca. Como referi anteriormente, sem prejuízo das verificações que o referido órgão jurisdicional deve efetuar, as garantias previstas nesta regulamentação afiguram‑se‑me, no seu conjunto, suficientes para assegurar a proteção dos direitos de defesa de uma pessoa que é objeto de uma decisão de revogação da sua CSE.

144. Parece‑me útil, porém, dar uma resposta ao órgão jurisdicional de reenvio quanto à questão de saber se o artigo 47.° da Carta impõe que um órgão jurisdicional encarregado de fiscalizar a legalidade de tal decisão disponha, além das garantias previstas na regulamentação eslovaca, do poder de autorizar o acesso da pessoa em causa a todo o processo que contém informações classificadas.

145. Quanto a este aspeto, a solução adotada recentemente pelo Tribunal de Justiça, no seu Acórdão NW e PQ (Informações classificadas) tem, na minha opinião, de se aplicar a fortiori no domínio da proteção das ICUE (64).

146. Assim, nesse acórdão, o Tribunal de Justiça baseou‑se nas orientações a retirar do seu Acórdão ZZ (65) para declarar que os Estados‑Membros podem atribuir às autoridades nacionais competentes em matéria de segurança o poder de comunicar ou não os motivos ou elementos de prova, desde que o órgão jurisdicional competente disponha do poder de retirar as consequências da decisão que vier a ser adotada a este respeito por essas autoridades (66).

147. Segundo o Tribunal de Justiça, tal solução é suscetível, quando uma autoridade nacional obste, de forma injustificada, à comunicação da totalidade ou de parte dos elementos que fundamentam a decisão em causa, de assegurar o respeito integral do artigo 47.° da Carta, na medida em que garanta que o incumprimento, por essa autoridade, das obrigações processuais que lhe incumbem não conduzirá a que a decisão judicial se baseie em factos e documentos de que o requerente não pôde tomar conhecimento e sobre os quais não pôde, portanto, tomar posição (67).

148. O Tribunal de Justiça deduz destas considerações que não se pode considerar que o artigo 47.° da Carta implica que o órgão jurisdicional competente para fiscalizar uma decisão baseada em informações classificadas deve necessariamente dispor do poder de desclassificar certas informações e de as comunicar, ele próprio, ao requerente, já que essa desclassificação e essa comunicação não são indispensáveis para assegurar uma proteção jurisdicional efetiva aquando da apreciação da legalidade da decisão impugnada (68).

149. Atendendo ao exposto, considero que importa responder à terceira questão que o artigo 47.° da Carta deve ser interpretado no sentido de que não impõe que um órgão jurisdicional ao qual incumbe fiscalizar a legalidade de uma decisão que revoga uma CSE, parcialmente baseada em informações classificadas, disponha do poder de autorizar o acesso da pessoa coletiva objeto dessa decisão ao processo da Autoridade Nacional de Segurança que contém essas informações.

150. Tendo em conta a resposta que proponho que o Tribunal de Justiça dê à terceira questão, não é necessário, na minha opinião, analisar a quarta questão.

IV.    Conclusão

151. Tendo em conta todas as considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça responda às questões prejudiciais submetidas pelo Najvyšší správny súd Slovenskej republiky (Supremo Tribunal Administrativo da República Eslovaca) da seguinte forma:

1)      O artigo 51.°, n.° 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia deve ser interpretado no sentido de que um Estado‑Membro aplica o direito na União quando um dos seus órgãos jurisdicionais fiscaliza a legalidade de uma decisão que revoga um certificado de segurança industrial que autoriza o acesso a informações classificadas da União Europeia, que equivale a uma credenciação de segurança de empresa (CSE), na aceção do artigo 11.° e do anexo V da Decisão 2013/488 do Conselho, de 23 de setembro de 2013, relativa às regras de segurança aplicáveis à proteção das informações classificadas da UE. A este respeito, é indiferente que a regulamentação nacional estabeleça uma ligação entre a validade desse certificado de segurança industrial e a validade de uma credenciação nacional de segurança industrial, na medida em que a revogação do referido certificado se baseie na conclusão de que o seu titular representa um risco de segurança.

2)      O artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma regulamentação nacional por força da qual uma decisão que revoga uma CSE não refere as informações classificadas que estiveram na base dessa decisão e a pessoa coletiva em causa não tem acesso ao processo da Autoridade Nacional de Segurança que contém essas informações, desde que, primeiro, o advogado dessa pessoa coletiva possa ter acesso a esse processo na condição de obter o consentimento dessa autoridade e de garantir a confidencialidade das informações comunicadas, segundo, o órgão jurisdicional nacional encarregado de fiscalizar a legalidade dessa decisão tenha acesso à totalidade das informações classificadas constantes do referido processo e, terceiro, a referida pessoa coletiva tenha tido conhecimento da essência dos motivos suscetíveis de constituir uma base suficiente para justificar a referida decisão.

3)      O artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais deve ser interpretado no sentido de que não impõe que um órgão jurisdicional ao qual incumbe fiscalizar a legalidade de uma decisão que revoga uma CSE, parcialmente baseada em informações classificadas, disponha do poder de autorizar o acesso da pessoa coletiva objeto dessa decisão ao processo da Autoridade Nacional de Segurança que contém essas informações.


1      Língua original: francês.


2      JO 2013, L 274, p. 1.


3      A seguir «Carta».


4      V., nomeadamente, Decisão (UE, Euratom) 2015/444 da Comissão, de 13 de março de 2015, relativa às regras de segurança aplicáveis à proteção das informações classificadas da UE (JO 2015, L 72, p. 53), e Decisão da Mesa do Parlamento Europeu, de 15 de abril de 2013, sobre as regras que regem o tratamento de informações confidenciais pelo Parlamento Europeu (JO 2014, C 96, p. 1). Importa, igualmente, referir o Acordo entre os Estados‑Membros da União Europeia, reunidos no Conselho, de 4 de maio de 2011, sobre a proteção das informações classificadas trocadas no interesse da União Europeia (JO 2011, C 202, p. 13).


5      C‑159/21, a seguir «Acórdão Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság e o.», EU:C:2022:708.


6      JO 2013, L 180, p. 60.


7      V. Acórdão Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság e o. (n.° 60).


8      V. Acórdão Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság e o. (n.° 57).


9      V., nomeadamente, Acórdão de 25 de abril de 2024, NW e PQ (Informações classificadas) (C‑420/22 e C‑528/22, a seguir «Acórdão NW e PQ (Informações classificadas)», EU:C:2024:344, n.° 55 e jurisprudência referida).


10      A seguir «Lei n.° 215/2004».


11      O § 46, alínea c), da Lei n.° 215/2004 prevê, nomeadamente, que uma credenciação de segurança industrial de profissional só pode ser emitida a um profissional que seja «fiável em matéria de segurança».


12      A seguir «Decreto n.° 134/2016».


13      V. § 5, n.° 1, alínea d), do Decreto n.° 134/2016.


14      V. § 5, n.° 4, alínea a), do Decreto n.° 134/2016.


15      V., nomeadamente, Acórdãos de 26 de fevereiro de 2013, Åkerberg Fransson (C‑617/10, EU:C:2013:105, n.os 17 e 19, e jurisprudência referida); de 5 de maio de 2022, BPC Lux 2 e o. (C‑83/20, EU:C:2022:346, n.os 25 e 26); e de 25 de janeiro de 2024, Parchetul de pe lângă Curtea de Apel Craiova e o. (C‑58/22, EU:C:2024:70, n.° 40 e jurisprudência referida).


16      V., nomeadamente, Acórdãos de 26 de fevereiro de 2013, Åkerberg Fransson (C‑617/10, EU:C:2013:105, n.° 19), e de 13 de dezembro de 2017, El Hassani (C‑403/16, EU:C:2017:960, n.° 33).


17      V., nomeadamente, Acórdão de 25 de janeiro de 2024, Parchetul de pe lângă Curtea de Apel Craiova e o. (C‑58/22, EU:C:2024:70, n.° 40 e jurisprudência referida).


18      V., nomeadamente, Acórdãos de 6 de outubro de 2016, Paoletti e o. (C‑218/15, EU:C:2016:748, n.° 14 e jurisprudência referida), e de 24 de fevereiro de 2022, Glavna direktsia «Pozharna bezopasnost i zashtita na naselenieto» (C‑262/20, EU:C:2022:117, n.° 60 e jurisprudência referida).


19      V., nomeadamente, Acórdão de 5 de maio de 2022, BPC Lux 2 e o. (C‑83/20, EU:C:2022:346, n.° 27 e jurisprudência referida).


20      V., nomeadamente, Acórdão de 30 de novembro de 2023, Ministero dell’Istruzione e INPS (C‑270/22, EU:C:2023:933, n.° 34 e jurisprudência referida).


21      V. Acórdão NW e PQ (Informações classificadas) (n.° 103).


22      V. § 60, n.° 7, da Lei n.° 215/2004, que, em conjugação com o § 5, n.° 6, do Decreto n.° 134/2016, é aplicável ao certificado de segurança industrial.


23      V., em especial, n.° 9, alíneas a) e b), deste anexo.


24      V. § 5, n.° 4, alínea a), do Decreto n.° 134/2016.


25      Itálico acrescentado por mim. O apêndice B da Decisão 2013/488, relativo à equivalência das classificações de segurança, mostra, igualmente, a ligação estreita entre as classificações nacionais e as classificações da União.


26      V., nomeadamente, Acórdão de 15 de julho de 2021, Ministrstvo za obrambo (C‑742/19, EU:C:2021:597, n.° 40 e jurisprudência referida).


27      V., por analogia, Acórdão de 26 de fevereiro de 2013, Åkerberg Fransson (C‑617/10, EU:C:2013:105, n.° 28).


28      V. Acórdão de 19 de novembro de 2019, TSN e AKT (C‑609/17 e C‑610/17, EU:C:2019:981, n.° 50).


29      V., nomeadamente, artigo 1.°, n.° 2, artigo 11.°, n.° 4 a 6, e artigo 15.°, n.° 3, da Decisão 2013/488. Numa lógica de reciprocidade, o artigo 4.°, n.° 3, desta decisão prevê que, «[q]uando os Estados‑Membros introduzirem nas estruturas ou redes da União informações classificadas que ostentem uma marca de classificação de segurança nacional, o Conselho e o SGC protegem essas informações nos termos dos requisitos aplicáveis às ICUE de nível equivalente, de acordo com a tabela de equivalências das classificações de segurança constante do apêndice B».


30      V. n.° 60 das presentes conclusões.


31      V., nomeadamente, Acórdão de 22 de junho de 2023, K.B. e F.S. (Conhecimento oficioso no domínio penal) (C‑660/21, EU:C:2023:498, n.° 40 e jurisprudência referida).


32      V., nomeadamente, Acórdão de 17 de maio de 2023, Funke (C‑626/21, EU:C:2023:412, n.° 76).


33      V., nomeadamente, Acórdãos de 22 de fevereiro de 2022, RS (Efeito dos acórdãos de um tribunal constitucional) (C‑430/21, EU:C:2022:99, n.° 34); de 17 de novembro de 2022, Harman International Industries (C‑175/21, EU:C:2022:895, n.° 32); e de 4 de maio de 2023, Agenția Națională de Integritate (C‑40/21, EU:C:2023:367, n.° 84).


34      V. Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.os 42 e 51).


35      V., nomeadamente, a propósito da questão de saber se deve ser reconhecido a uma pessoa coletiva, a quem a autoridade nacional competente dirigiu uma decisão de injunção para que lhe sejam comunicadas determinadas informações ou uma decisão de aplicação de uma sanção por incumprimento dessa injunção, o direito à ação garantido pelo artigo 47.° da Carta, perante tais decisões, Acórdãos de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.° 51); de 6 de outubro de 2020, État luxembourgeois (Direito à ação contra um pedido de informação em matéria fiscal) (C‑245/19 e C‑246/19, EU:C:2020:795, n.° 57 e jurisprudência referida); e de 25 de novembro de 2021, État luxembourgeois (Informações sobre um grupo de contribuintes) (C‑437/19, EU:C:2021:953, n.° 87).


36      V., nomeadamente, Acórdãos de 6 de outubro de 2020, État luxembourgeois (Direito à ação contra um pedido de informação em matéria fiscal) (C‑245/19 e C‑246/19, EU:C:2020:795, n.° 58 e jurisprudência referida), e de 25 de novembro de 2021, État luxembourgeois (Informações sobre um grupo de contribuintes) (C‑437/19, EU:C:2021:953, n.° 87).


37      CE:ECHR:2017:0919JUD003528911. Na origem deste processo está a decisão da Národní bezpečnostní úřad (Autoridade Nacional de Segurança, República Checa) (a seguir «Autoridade») de pôr termo à validade de uma credenciação de segurança, atribuída ao recorrente para lhe permitir exercer o cargo de adjunto no Prvního náměstka ministra obrany (vice‑ministro da defesa, República Checa), com o fundamento de que o interessado representava um risco para a segurança nacional. Contudo, a decisão não referia as informações confidenciais nas quais se baseava; uma vez que estas estavam classificadas na categoria «reservado», a lei não permitia a sua divulgação ao interessado. O pedido de anulação do recorrente foi depois indeferido pelo Městský soud v Praze (Tribunal Municipal de Praga, República Checa), ao qual os documentos em questão tinham sido transmitidos pela Autoridade. O recorrente e o seu advogado não foram autorizados a consultá‑los. Os subsequentes recursos do recorrente não procederam. No TEDH, o recorrente invocou uma violação do artigo 6.°, n.° 1, da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais (assinada em Roma em 4 de novembro de 1950) (a seguir «CEDH»). Alegou a existência de iniquidade no procedimento administrativo devido à impossibilidade de tomar conhecimento de um elemento de prova determinante, qualificado de informação confidencial, disponibilizado aos tribunais pelo recorrido.


38      V. § 152 desse acórdão. O processo instaurado pelo recorrente nos órgãos jurisdicionais nacionais tinha sofrido duas limitações relativamente às regras de direito comum destinadas a garantir um processo equitativo: por um lado, nem ele nem o seu advogado tiveram acesso aos documentos e informações classificados e, por outro, na medida em que a decisão de revogação se baseava nesses elementos, os fundamentos subjacentes à decisão não lhe foram comunicados (§ 150). Ao analisar o processo em causa no seu todo, o TEDH concluiu que não tinha havido violação do artigo 6.°, n.° 1, da CEDH. Para chegar a esta conclusão, o TEDH tomou em consideração, em especial, os poderes conferidos aos órgãos jurisdicionais nacionais. Assim, os tribunais tinham acesso a todos os documentos classificados, sem restrições, nos quais a Autoridade se baseara para justificar a sua decisão; tinham o poder de proceder a uma análise aprofundada das razões invocadas pela Autoridade para não comunicar os elementos classificados e de ordenar a comunicação dos que consideravam que deviam ter outra classificação; podiam igualmente apreciar o mérito da decisão da Autoridade que ordenou a revogação da credenciação de segurança e punir, se necessário, uma decisão arbitrária (§ 152). A sua competência abrangia todos os factos do caso em apreço e não se limitava à análise dos fundamentos invocados pelo recorrente, que foi ouvido pelos juízes e pôde também apresentar as suas observações por escrito (§ 153). Atendendo a estes elementos, o TEDH considerou que os órgãos jurisdicionais chamados a pronunciar‑se tinham exercido devidamente os poderes de fiscalização de que dispunham nesse tipo de processo, no que diz respeito quer à necessidade de manter a confidencialidade dos documentos classificados quer à justificação da revogação da credenciação de segurança do recorrente, fundamentando as suas decisões à luz das circunstâncias concretas do caso em apreço (§ 154).


39      V., por analogia, Acórdão NW e PQ (Informações classificadas) (n.° 79 e jurisprudência referida, bem como n.° 87).


40      V., a este respeito, Conclusões do advogado‑geral M. Bobek no processo que deu origem ao Acórdão An tAire Talmhaíochta Bia agus Mara e o. (C‑64/20, EU:C:2021:14, n.° 41), que refere que «a exigência de efetividade, entendida como uma condição de aplicação do princípio da autonomia processual, [...] coincide na prática com o direito fundamental a uma proteção jurisdicional efetiva na aceção do artigo 47.° da Carta».


41      V., nomeadamente, Acórdãos de 17 de julho de 2014, Sánchez Morcillo e Abril García (C‑169/14, EU:C:2014:2099, n.° 35 e jurisprudência referida), e de 22 de abril de 2021, Profi Credit Slovakia (C‑485/19, EU:C:2021:313, n.° 54 e jurisprudência referida). O Tribunal de Justiça esclareceu igualmente que o princípio da efetividade «não contém [...] exigências que vão além das que decorrem dos direitos fundamentais, nomeadamente do direito a uma proteção jurisdicional efetiva, garantidos pela Carta» [v. Acórdão de 26 de setembro de 2018, Staatssecretaris van Veiligheid en justitie (Efeito suspensivo do recurso) (C‑180/17, EU:C:2018:775, n.° 43)].


42      V., nomeadamente, Acórdão Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság e o. (n.° 44 e jurisprudência referida).


43      V., nomeadamente, Acórdãos de 14 de maio de 2020, Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság Dél‑alföldi Regionális Igazgatóság (C‑924/19 PPU e C‑925/19 PPU, EU:C:2020:367, n.° 140 e jurisprudência referida), e de 20 de fevereiro de 2024, X (Inexistência de causas de rescisão) (C‑715/20, EU:C:2024:139, n.° 80 e jurisprudência referida). Assim, o Tribunal de Justiça esclareceu que «o artigo 47.° da Carta é suficiente por si só e não tem de ser precisado por disposições do direito da União ou do direito nacional para conferir aos particulares um direito que pode ser invocado enquanto tal».


44      V., nomeadamente, Acórdão de 24 de novembro de 2020, Minister van Buitenlandse Zaken (C‑225/19 e C‑226/19, EU:C:2020:951, n.° 43 e jurisprudência referida).


45      V., nomeadamente, Acórdão NW e PQ (Informações classificadas) (n.° 92 e jurisprudência referida).


46      V., nomeadamente, Acórdão NW e PQ (Informações classificadas) (n.° 93 e jurisprudência referida).


47      V., nomeadamente, Acórdão NW e PQ (Informações classificadas) (n.° 94 e jurisprudência referida).


48      V., nomeadamente, neste sentido, Acórdão de 4 de junho de 2013, ZZ (C‑300/11, a seguir «Acórdão ZZ», EU:C:2013:363, n.° 54).


49      V., nomeadamente, Acórdão NW e PQ (Informações classificadas) (n.° 95 e jurisprudência referida).


50      V., nomeadamente, Acórdão NW e PQ (Informações classificadas) (n.° 96 e jurisprudência referida).


51      V., por analogia, Acórdão NW e PQ (Informações classificadas) (n.° 97 e jurisprudência referida).


52      V., nomeadamente, Acórdão NW e PQ (Informações classificadas) (n.° 98 e jurisprudência referida).


53      V., nomeadamente, Acórdão NW e PQ (Informações classificadas) (n.° 99 e jurisprudência referida).


54      V., nomeadamente, Acórdão NW e PQ (Informações classificadas) (n.° 100 e jurisprudência referida).


55      V. Acórdão Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság e o. (n.° 59).


56      V. Acórdão NW e PQ (Informações classificadas) (n.° 101).


57      V., nomeadamente, Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.° 97 e jurisprudência referida).


58      V. Acórdão ZZ (n.° 49). No entanto, o Tribunal de Justiça esclareceu, neste número, que essa interpretação estrita não deve levar a privar do seu efeito útil a disposição do direito da União que prevê a derrogação em causa. Neste contexto, o Tribunal de Justiça foi levado a determinar se e em que medida o artigo 30.°, n.° 2, e o artigo 31.° da Diretiva 2004/38/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativa ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados‑Membros, que altera o Regulamento (CEE) n.° 1612/68 e que revoga as Diretivas 64/221/CEE, 68/360/CEE, 72/194/CEE, 73/148/CEE, 75/34/CEE, 75/35/CEE, 90/364/CEE, 90/365/CEE e 93/96/CEE (JO 2004, L 158, p. 77; retificações no JO 2004, L 229, p. 35, e no JO 2005, L 197, p. 34), permitem a não divulgação dos motivos precisos e completos de uma decisão tomada em aplicação do artigo 27.° desta diretiva, devendo as disposições desta última ser objeto de uma interpretação conforme às exigências que decorrem do artigo 47.° da Carta (n.° 50). V., mais genericamente, quanto à regra de que as exceções devem ser objeto de interpretação estrita, Acórdão de 8 de novembro de 2022, Deutsche Umwelthilfe (Homologação dos veículos a motor) (C‑873/19, EU:C:2022:857, n.° 87 e jurisprudência referida).


59      V., nomeadamente, Acórdão NW e PQ (Informações classificadas) (n.° 96 e jurisprudência referida).


60      V. n.° 66 desse acórdão.


61      V., a este respeito, Acórdão do TEDH de 19 de setembro de 2017, Regner c. República Checa (CE:ECHR:2017:0919JUD003528911, § 157), no qual este tribunal salienta que o recorrente tinha sido objeto de processos penais por associação ao crime organizado, cumplicidade de abuso de poder público, cumplicidade de fraude em procedimentos de adjudicação de contratos públicos e adjudicação pública, bem como por cumplicidade de violação de regras imperativas em matéria de relações económicas. Portanto, o TEDH considera que é compreensível que, quando tais suspeitas existam, as autoridades entendam necessário atuar rapidamente sem esperar pelo termo do inquérito penal, evitando, ao mesmo tempo, a revelação, numa fase precoce, das suspeitas que recaem sobre os interessados, o que poderia prejudicar o inquérito penal.


62      V. Acórdãos ZZ (n.os 65, 68 e 69), Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság e o. (n.os 51, 53 e 60), e NW e PQ (Informações classificadas) (n.os 95, 97, 101, 111 e 116). Observo igualmente que, no seu Acórdão de 19 de setembro de 2017, Regner c. República Checa (CE:ECHR:2017:0919JUD003528911, § 160), o TEDH se mostra recetivo a que a pessoa à qual é revogada a sua credenciação de segurança possa dispor, na medida do que for compatível com a preservação da confidencialidade e da boa condução das investigações de que é objeto, de indicações, ainda que resumidas, sobre as acusações que lhe são feitas.


63      O Tribunal de Justiça pode, a este respeito, inspirar‑se no que declarou, em matéria de medidas restritivas, no seu Acórdão de 18 de julho de 2013, Comissão e o./Kadi (C‑584/10 P, C‑593/10 P e C‑595/10 P, EU:C:2013:518, n.° 130), ou seja, que, tendo em conta a natureza preventiva destas medidas, se, no âmbito da sua fiscalização da legalidade da decisão impugnada, o juiz da União considerar que, no mínimo, um dos motivos mencionados na exposição apresentada pelo comité de sanções é suficientemente preciso e concreto, está demonstrado e constitui, por si só, uma base suficiente para fundamentar esta decisão, o facto de outros desses motivos não o estarem não justifica a anulação da referida decisão. Na hipótese inversa, procederá à anulação da decisão impugnada.


64      V. Acórdão NW e PQ (Informações classificadas) (n.os 102 a 116).


65      V. Acórdão NW e PQ (Informações classificadas) (n.os 106 a 112).


66      V. Acórdão NW e PQ (Informações classificadas) (n.° 113).


67      V. Acórdão NW e PQ (Informações classificadas) (n.° 114).


68      V. Acórdão NW e PQ (Informações classificadas) (n.° 115).