Language of document : ECLI:EU:T:2010:17

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção)

20 de Janeiro de 2010 (*)

«Responsabilidade extracontratual – Política agrícola comum – Alteração do regime de apoio comunitário ao algodão – Título IV, capítulo 10‑A, do Regulamento (CE) n.° 1782/2003, introduzido pelo artigo 1.°, n.° 20, do Regulamento (CE) n.° 864/2004 – Anulação das disposições em causa por um acórdão do Tribunal de Justiça – Nexo de causalidade»

Nos processos T‑252/07, T‑271/07 e T‑272/07,

Sungro, SA, com sede em Córdova (Espanha),

demandante no processo T‑252/07,

Eurosemillas, SA, com sede em Córdova,

demandante no processo T‑271/07,

Surcotton, SA, com sede em Córdova,

demandante no processo T‑272/07,

representadas por L. Ortiz Blanco, advogado,

contra

Conselho da União Europeia, representado por M. Moore, A. De Gregorio Merino e A. Westerhof Löfflerova, na qualidade de agentes,

e

Comissão Europeia, representada por L. Parpala e F. Jimeno Fernández, na qualidade de agentes, assistidos por E. Díaz‑Bastien Lopez, L. Divar Bilbao e J. Magdalena Anda, advogados,

demandados,

que têm por objecto acções de indemnização, nos termos dos artigos 235.° CE e 288.°, segundo parágrafo, CE, para reparação dos danos alegadamente sofridos pelas demandantes por causa da adopção e da aplicação, na campanha de 2006/2007, do capítulo 10‑A do título IV do Regulamento (CE) n.° 1782/2003 do Conselho, de 29 de Setembro de 2003, que estabelece regras comuns para os regimes de apoio directo no âmbito da política agrícola comum e institui determinados regimes de apoio aos agricultores e altera os Regulamentos (CEE) n.° 2019/93, (CE) n.° 1452/2001, (CE) n.° 1453/2001, (CE) n.° 1454/2001, (CE) n.° 1868/94, (CE) n.° 1251/1999, (CE) n.° 1254/1999, (CE) n.° 1673/2000, (CEE) n.° 2358/71 e (CE) n.° 2529/2001 (JO L 270, p. 1), introduzido pelo artigo 1.°, n.° 20, do Regulamento (CE) n.° 864/2004 do Conselho, de 29 de Abril de 2004, que altera o Regulamento n.° 1782/2003 e que o adapta por força da adesão da República Checa, da Estónia, de Chipre, da Letónia, da Lituânia, da Hungria, de Malta, da Polónia, da Eslovénia e da Eslováquia à União Europeia (JO L 161, p. 48), e anulado pelo acórdão do Tribunal de Justiça de 7 de Setembro de 2006, Espanha/Conselho (C‑310/04, Colect., p. I‑7285),

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção),

composto por: E. Martins Ribeiro, presidente, S. Papasavvas e N. Wahl (relator), juízes,

secretário: J. Palacio González, administrador principal,

vistos os autos e após a audiência de 22 de Abril de 2009,

profere o presente

Acórdão

 Quadro jurídico

1        Por ocasião da adesão da República Helénica às Comunidades Europeias, em 1980, foi instituído um regime de ajuda ao algodão pelo Protocolo n.° 4 relativo ao algodão, anexo ao acto de adesão desse Estado‑Membro (JO 1979, L 291, p. 174, a seguir «protocolo n.° 4»).

2        Esse regime foi aplicado pela primeira vez à colheita de 1981 e veio a ser posteriormente alargado, quando o Reino de Espanha e a República Portuguesa aderiram às Comunidades, em 1986.

3        Nos termos do n.° 2 do protocolo n.° 4, esse regime destina‑se a promover a produção de algodão nas regiões da Comunidade onde seja importante para a economia agrícola, a permitir um rendimento equitativo aos produtores em causa e a estabilizar o mercado mediante a melhoria das estruturas ao nível da oferta e da comercialização.

4        O n.° 3 do protocolo n.° 4, quer na versão original quer na versão resultante do Regulamento (CE) n.° 1050/2001 do Conselho, de 22 de Maio de 2001, que adapta pela sexta vez o regime de ajuda ao algodão instituído pelo protocolo n.° 4 (JO L 148, p. 1), dispõe que esse regime «inclui a concessão de um auxílio à produção».

5        O n.° 6 do protocolo n.° 4, conforme alterado pelo Regulamento n.° 1050/2001, dispõe que «[o] Conselho, deliberando por maioria qualificada sob proposta da Comissão, e após consulta do Parlamento Europeu, decidirá das adaptações necessárias do regime instituído no presente protocolo e adoptará as regras de base necessárias para a execução das disposições previstas no presente protocolo».

6        Com base no referido n.° 6, o Conselho da União Europeia aprovou o Regulamento (CE) n.° 1051/2001 do Conselho, de 22 de Maio de 2001, relativo à ajuda à produção de algodão (JO L 148, p. 3).

7        Resulta dos artigos 2.°, 11.° e 12.° desse regulamento que a ajuda à produção de algodão não descaroçado equivale à diferença entre o preço de objectivo estabelecido para esse algodão, tal como fixado por esse regulamento, e o preço do mercado mundial, e que essa ajuda é concedida às empresas de descaroçamento para o algodão não descaroçado comprado a um preço pelo menos igual ao preço mínimo tal como fixado por esse mesmo regulamento.

8        No âmbito da reforma da política agrícola comum, o Conselho aprovou o Regulamento (CE) n.° 1782/2003, de 29 de Setembro de 2003, que estabelece regras comuns para os regimes de apoio directo no âmbito da política agrícola comum e institui determinados regimes de apoio aos agricultores e altera os Regulamentos (CEE) n.° 2019/93, (CE) n.° 1452/2001, (CE) n.° 1453/2001, (CE) n.° 1454/2001, (CE) n.° 1868/94, (CE) n.° 1251/1999, (CE) n.° 1254/1999, (CE) n.° 1673/2000, (CEE) n.° 2358/71 e (CE) n.° 2529/2001 (JO L 270, p. 1).

9        Os considerandos 24 e 28 do Regulamento n.° 1782/2003 têm a seguinte redacção:

«(24) O reforço da competitividade da agricultura comunitária e a promoção da qualidade dos alimentos e das normas ambientais implicam necessariamente uma redução dos preços institucionais dos produtos agrícolas e um aumento dos custos de produção das explorações agrícolas da Comunidade. Para atingir esses objectivos e promover uma agricultura mais orientada para o mercado e sustentável, é necessário completar a transição do apoio à produção para o apoio ao produtor, introduzindo um sistema de apoio ao rendimento, dissociado, para cada exploração agrícola. A dissociação, embora não afecte os montantes efectivamente pagos aos agricultores, aumentará de modo significativo a eficácia da ajuda ao rendimento. Assim, é conveniente condicionar o pagamento único por exploração ao cumprimento de normas ambientais, de segurança dos alimentos e de saúde e bem‑estar dos animais, bem como à manutenção da exploração em boas condições agrícolas e ambientais.

[…]

(28)      A fim de que os agricultores sejam livres de escolher o que produzem nas suas terras – incluindo produtos ainda abrangidos pelo apoio não dissociado – reforçando assim a sua orientação para o mercado, o pagamento único não deve ser condicionado à produção de nenhum produto específico. Todavia, por forma a evitar distorções da concorrência, devem ser excluídos alguns produtos da produção em terras elegíveis.»

10      Os considerandos 1, 2, 5, 6, 7, 22 e 23 do Regulamento (CE) n.° 864/2004 do Conselho, de 29 de Abril de 2004, que altera o Regulamento n.° 1782/2003 e que o adapta por força da adesão da República Checa, da Estónia, de Chipre, da Letónia, da Lituânia, da Hungria, de Malta, da Polónia, da Eslovénia e da Eslováquia à União Europeia (JO L 161, p. 48, a seguir «regulamento controvertido»), referem:

«(1)      A dissociação do apoio directo aos produtores e a introdução de um regime de pagamento único constituem elementos essenciais do processo de reforma da política agrícola comum, que tem por objectivo permitir a transição de uma política de apoio aos preços e à produção para uma política de apoio ao rendimento dos agricultores. O Regulamento [...] n.° 1782/2003 [...] introduziu esses elementos relativamente a uma série de produtos agrícolas.

(2)      Para alcançar os objectivos que constituem o fulcro da reforma da política agrícola comum, o apoio ao algodão, ao azeite, ao tabaco em rama e ao lúpulo deve ser em grande medida dissociado e integrado no regime de pagamento único.

[...]

(5)      A plena integração do regime de apoio actualmente em vigor no sector do algodão no regime de pagamento único implicaria um risco elevado de perturbações da produção nas regiões comunitárias produtoras de algodão. Por conseguinte, convém que uma parte do apoio continue ligada ao cultivo do algodão através de um pagamento específico por hectare elegível. O montante desse pagamento deve ser calculado de forma a garantir condições económicas que, em regiões propícias a essa cultura, permitam prosseguir a actividade no sector do algodão e impedir que a cultura do algodão seja afastada por outras culturas. Para atingir este objectivo, justifica‑se que a ajuda total disponível por hectare por Estado‑Membro seja fixada em 35% da parte nacional da ajuda de que os produtores tenham beneficiado indirectamente.

(6)      Convém integrar no regime de pagamento único os restantes 65% da parte nacional da ajuda de que os produtores tenham beneficiado indirectamente.

(7)      Por razões ambientais, deve ser estabelecida uma superfície de base por Estado‑Membro para restringir as superfícies semeadas com algodão. Além disso, as superfícies elegíveis devem ficar limitadas às autorizadas pelos Estados‑Membros.

[...]

(22)      A dissociação da ajuda para o algodão e para o tabaco em rama pode exigir medidas de reestruturação. É conveniente disponibilizar um apoio comunitário complementar para as regiões de produção dos Estados‑Membros em que foi concedida uma ajuda comunitária para o algodão e para o tabaco em rama durante os anos de 2000, 2001 e 2002, através de uma transferência de fundos da rubrica 1a) para a rubrica 1b) das perspectivas financeiras. Esse apoio complementar deve ser utilizado como previsto no Regulamento (CE) n.° 1257/1999 do Conselho, de 17 de Maio de 1999, relativo ao apoio do Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola (FEOGA) ao desenvolvimento rural […]

(23)      A fim de garantir a continuação harmoniosa do pagamento da ajuda ao rendimento aos produtores do sector do algodão, do azeite e do tabaco, não deve ser aplicada a opção que consiste em adiar a integração desses regimes de apoio no regime de pagamento único.»

11      O regulamento controvertido introduziu, no título IV do Regulamento n.° 1782/2003, um capítulo 10-A, intitulado «Pagamento específico para o algodão», que inclui os artigos 110.°‑A a 110.°‑F (a seguir «disposições controvertidas»).

12      Nos termos dos artigos 110.°‑A a 110.°‑C do Regulamento n.° 1782/2003, conforme alterado:

«Artigo 110.°‑A

Âmbito de aplicação

É concedida uma ajuda aos agricultores que produzam algodão do código NC 5201 00, nas condições estabelecidas no presente capítulo.

Artigo 110.°‑B

Elegibilidade

1.      A ajuda é concedida por hectare de superfície elegível de algodão. Para que seja elegível, a superfície deve situar‑se em terras agrícolas que beneficiem de uma autorização do Estado‑Membro para a produção de algodão, semeada com variedades autorizadas e mantida pelos menos até à abertura das cápsulas em condições de crescimento normais.

No entanto, se o algodão não atingir o estado de abertura das cápsulas devido a condições climáticas excepcionais reconhecidas enquanto tal pelo Estado‑Membro, as superfícies inteiramente semeadas com algodão permanecerão elegíveis para a ajuda desde que não tenham sido utilizadas, até à abertura das cápsulas, para outros fins que não a produção de algodão.

2.      Os Estados‑Membros autorizarão as terras e as variedades referidas no n.° 1 em conformidade com normas e condições específicas a adoptar nos termos do n.° 2 do artigo 144.°

Artigo 110.°‑C

Superfícies de base e montantes

1.      São estabelecidas as seguintes superfícies de base nacionais:

–        Grécia:          370 000 ha

–        Espanha: 70 000 ha

–        Portugal: 360 ha.

2.      Por cada hectare elegível, o montante da ajuda é fixado em:

–        Grécia:          594 euros para 300 000 hectares e 342,85 euros para os restantes 70 000 hectares

–        Espanha: 1 039 euros

–        Portugal: 556 euros.

[…]»

13      Os artigos 110.°‑D e 110.°‑E do Regulamento n.° 1782/2003, conforme alterado, tratam das organizações interprofissionais aprovadas, que são constituídas por agricultores que produzem algodão e, pelo menos, um descaroçador, «tendo em vista, em especial, assegurar o abastecimento do descaroçador com algodão não descaroçado de qualidade satisfatória». Essas organizações interprofissionais podem diferenciar até metade do montante total da ajuda a que os agricultores membros têm direito segundo uma tabela por elas fixada e que tenha especialmente em conta a qualidade do algodão não descaroçado.

14      O regulamento controvertido introduziu ainda no Regulamento n.° 1782/2003 um título IV‑B, com a epígrafe «Transferências financeiras», que abrange, nomeadamente, o artigo 143.°‑D, intitulado «Transferência financeira para a reestruturação nas regiões produtoras de algodão», e redigido nos seguintes termos:

«A partir do exercício orçamental [...] de 2007, ficará disponível, por ano civil, um montante de 22 milhões de euros, estabelecido com base nas despesas médias relativas ao algodão em 2000, 2001 e 2002, a título de apoio comunitário suplementar às medidas a favor das regiões produtoras de algodão no âmbito da programação de desenvolvimento rural financiada pela secção Garantia do FEOGA em conformidade com o Regulamento [...] n.° 1257/1999.»

15      Por último, o regulamento controvertido introduziu, no artigo 153.° do Regulamento n.° 1782/2003, um n.° 4‑A, que revoga o Regulamento n.° 1051/2001, que continuou, porém, a ser aplicável à campanha de comercialização de 2005/2006. Segundo o artigo 156.°, n.° 2, alínea g), do Regulamento n.° 1782/2003, conforme alterado, o novo regime de ajuda ao algodão é aplicável a partir de 1 de Janeiro de 2006 ao algodão cultivado desde essa data.

 Antecedentes do litígio

16      Por recurso interposto em 22 de Julho de 2004 no Tribunal de Justiça, o Reino de Espanha pediu, ao abrigo do artigo 230.° CE, a anulação do capítulo 10-A do título IV do Regulamento n.° 1782/2003, tal como introduzido pelo regulamento controvertido. Invocava quatro fundamentos de recurso, que consistiam, respectivamente, em violação do protocolo n.° 4, violação do dever de fundamentação, desvio de poder e, por último, violação dos princípios do direito comunitário, em particular dos princípios da proporcionalidade e da protecção da confiança legítima.

17      Por acórdão de 7 de Setembro de 2006, Espanha/Conselho (C‑310/04, Colect., p. I‑7285), o Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso. Embora julgando improcedentes os três primeiros fundamentos invocados pelo Reino de Espanha, julgou procedente o quarto fundamento e anulou as disposições controvertidas por o ter Conselho violado o princípio da proporcionalidade. Contudo, para evitar qualquer insegurança jurídica quanto ao regime aplicável às ajudas ao sector do algodão por causa dessa anulação, suspendeu os seus efeitos até à aprovação de novo regulamento, num prazo razoável.

18      Em 19 de Março de 2007, as demandantes, Sungro, SA, Eurosemillas, SA, e Surcotton, SA, empresas descaroçadoras de algodão em rama, com sede em Espanha, que beneficiaram do regime de ajuda ao algodão instituído pelo protocolo n.° 4, pediram ao Conselho e à Comissão das Comunidades Europeias uma indemnização pelos danos sofridos por causa das disposições controvertidas, avaliados, respectivamente, em 37 188 euros, quanto à Sungro, em 2 661 427 euros, quanto à Eurosemillas, e em 1 734 027 euros, quanto à Surcotton.

19      Em 1 de Junho de 2007, cada uma das demandantes recebeu um ofício do Conselho, que as informava de que, após análise do seu pedido de indemnização e dos documentos anexos, entendia não estarem reunidos os pressupostos da sua responsabilidade contratual.

20      Em 9 de Maio de 2007, a Comissão também respondeu negativamente ao pedido de indemnização apresentado por cada uma das demandantes.

 Tramitação do processo e pedidos das partes

21      Por petições apresentadas na Secretaria do Tribunal Geral entre 26 de Junho e 25 de Outubro de 2007, registadas sob os números T‑217/07, T‑218/07, T‑244/07 a T‑246/07, T‑252/07 a T‑255/07, T‑258/07 a T‑260/07, T‑268/07 a T‑272/07 e T‑394/07, 18 empresas descaroçadoras de algodão, incluindo as demandantes, propuseram acções de indemnização pelos danos que alegadamente sofreram devido à aprovação e à aplicação, na campanha de 2006/2007, das disposições controvertidas.

22      Por despacho de 18 de Outubro de 2007, o presidente da Oitava Secção do Tribunal Geral decidiu, ouvidas as partes, apensar esses processos, para efeitos de fase escrita e fase oral.

23      Na mesma data, o Tribunal Geral (Oitava Secção) ordenou uma medida de organização do processo, que limitava nesse momento a discussão à questão da existência da responsabilidade extracontratual da Comunidade e à metodologia da avaliação dos danos.

24      Por carta apresentada na Secretaria do Tribunal Geral, em 18 de Julho de 2008, os demandantes nos processos T‑217/07, T‑218/07, T‑244/07 a T‑246/07, T‑253/07 a T‑255/07, T‑258/07 a T‑260/07, T‑268/07 a T‑270/07 e T‑394/07 informaram o Tribunal de que desistiam das respectivas acções. Por despacho de cancelamento parcial do presidente da Oitava Secção do Tribunal Geral, de 20 de Outubro de 2008, esses quinze processos foram cancelados no registo do Tribunal.

25      Foram ouvidas as alegações das partes nos processos T‑252/07, T‑271/07 e T‑272/07 e as suas respostas às questões orais colocadas pelo Tribunal na audiência de 22 de Abril de 2009.

26      No processo T‑252/07, a Sungro pede que o Tribunal se digne:

–        julgar admissível a acção;

–        proferir acórdão que julgue procedente a acção de indemnização, intentada ao abrigo do artigo 288.° CE, e que declare o seu direito a ser pecuniariamente indemnizada, de forma solidária pelo Conselho e pela Comissão, no montante total de 37 188 euros, pelos danos causados pela adopção ilegal e pela aplicação ao sector do algodão, na campanha de 2006/2007, das disposições controvertidas;

–        condenar o Conselho e a Comissão nas despesas.

27      No processo T‑271/07, a Eurosemillas pede que o Tribunal se digne:

–        julgar admissível a acção;

–        proferir acórdão que julgue procedente a acção de indemnização, intentada ao abrigo do artigo 288.° CE, e que declare o seu direito a ser pecuniariamente indemnizada, de forma solidária pelo Conselho e pela Comissão, no montante total de 2 661 427 euros, pelos danos causados pela adopção ilegal e pela aplicação ao sector do algodão, na campanha de 2006/2007, das disposições controvertidas;

–        condenar o Conselho e a Comissão nas despesas.

28      No processo T‑272/07, a Surcotton pede que o Tribunal se digne:

–        julgar admissível a acção;

–        proferir acórdão que julgue procedente a acção de indemnização, intentada ao abrigo do artigo 288.° CE, e que declare o seu direito a ser pecuniariamente indemnizada, de forma solidária pelo Conselho e pela Comissão, no montante total de 1 734 027 euros, pelos danos causados pela adopção ilegal e pela aplicação ao sector do algodão, na campanha de 2006/2007, das disposições controvertidas;

–        condenar o Conselho e a Comissão nas despesas.

29      O Conselho pede que o Tribunal se digne:

–        julgar inadmissíveis as acções, no seu conjunto;

–        condenar solidariamente as demandantes nas despesas.

30      A Comissão pede que o Tribunal se digne:

–        julgar integralmente improcedentes as acções;

–        condenar as demandantes nas despesas.

31      Ouvidas as partes na audiência, o Tribunal Geral (Oitava Secção) decidiu apensar os três processos, também para efeitos de acórdão, em conformidade com o artigo 50.° do Regulamento de Processo do Tribunal Geral.

 Questão de direito

 Observações preliminares

32      Tal como confirmaram na audiência, em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal Geral, as demandantes baseiam a sua acção na existência de um direito à reparação por acto ilícito dos órgãos da Comunidade. Com efeito, declararam que, nas presentes acções, não tencionavam invocar a responsabilidade da Comunidade por facto lícito dos seus órgãos.

33      As demandantes alegam, mais precisamente, que, no caso presente, estão reunidos os três pressupostos cumulativos para a responsabilidade extracontratual da Comunidade por acto ilícito dos seus órgãos, na acepção do artigo 288.°, segundo parágrafo, CE, isto é, a ilicitude do acto imputado à instituição comunitária, a existência real do dano e a existência de um nexo de causalidade entre o acto e o dano.

34      O Conselho e a Comissão entendem, pelo contrário, que não está preenchido nenhum dos pressupostos da responsabilidade extracontratual da Comunidade. Consideram, nomeadamente, que as petições partem de uma premissa errada, pois deformam o sentido e o alcance do acórdão Espanha/Conselho, já referido.

35      O Tribunal lembra que, segundo jurisprudência assente, a responsabilidade extracontratual da Comunidade por acto ilícito dos seus órgãos, na acepção do artigo 288.°, segundo parágrafo, CE, está sujeita à reunião de um conjunto de pressupostos relativos à ilicitude do acto imputado às instituições comunitárias, à existência real do dano e à existência de um nexo de causalidade entre esse acto e o dano alegado (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 9 de Novembro de 2006, Agraz e o./Comissão, C‑243/05 P, Colect., p. I‑10833, n.° 26, e de 9 de Setembro de 2008, FIAMM e o./Conselho e Comissão, C‑120/06 P e C‑121/06 P, Colect., p. I‑6513, n.° 106 e jurisprudência aí referida).

36      O carácter cumulativo desses pressupostos implica que, quando um deles não estiver preenchido, a acção de indemnização deve julgada improcedente na íntegra, sem que seja necessário analisar os outros pressupostos da responsabilidade (acórdão do Tribunal de Justiça de 8 de Maio de 2003, T. Port/Comissão, C‑122/01 P, Colect., p. I‑4261, n.° 30; v. ainda, neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 9 de Setembro de 1999, Lucaccioni/Comissão, C‑257/98 P, Colect., p. I‑5251, n.os 14 e 63).

37      No caso, há que começar por analisar se está preenchido o pressuposto da existência de um nexo de causalidade entre o acto ilícito das instituições comunitárias e o dano alegado pelas demandantes.

 Quanto ao nexo de causalidade entre a violação do princípio da proporcionalidade pelo regulamento controvertido e os danos alegados

 Argumentos das partes

38      As demandantes alegam que as disposições controvertidas, que foram anuladas pelo acórdão Espanha/Conselho, já referido, mas cujos efeitos foram mantidos até à aprovação de um novo regulamento, estiveram na origem do dano que alegam ter sofrido.

39      Afirmam que esse dano consistiu, em primeiro lugar e a título principal, em lucros cessantes (lucrum cessans) resultantes da diminuição significativa das quantidades de algodão semeadas, produzidas e, por conseguinte, descaroçadas na campanha de 2006/2007, relativamente à média das quantidades de algodão semeadas, produzidas e descaroçadas nas três campanhas anteriores (2003/2004, 2004/2005 e 2005/2006), regidas pelo Regulamento n.° 1051/2001. Entendem que, com efeito, o regulamento controvertido, que institui um regime de ajuda dissociada da produção em 65%, sob a forma de subvenção por hectare cultivado, paga directamente ao agricultor, independentemente da quantidade de algodão produzida, em substituição de um regime de ajuda totalmente ligado à produção paga por meio das empresas descaroçadoras, que existia até então, causou uma diminuição brutal da área cultivada, do rendimento por hectare e da produção de algodão, da ordem dos 60%. A este propósito, as demandantes lembram que, em Espanha, a produção de algodão e a actividade de descaroçamento são actividades económicas fortemente ligadas. Em segundo lugar, as demandantes afirmam terem sofrido prejuízos financeiros (damnum emergens) correspondentes aos custos de serviços de assessoria jurídica e económica causados pela aprovação do regulamento controvertido.

40      Em apoio dos seus pedidos, as demandantes alegam que os documentos redigidos por um gabinete de peritagem, em Março de 2007, que juntaram aos autos, a saber, o relatório sobre os efeitos da reforma do regime de apoio ao algodão na produção espanhola (a seguir «relatório de 2007») e as peritagens sobre os prejuízos sofridos por cada uma delas (a seguir «peritagens»), provam não só a existência real do dano mas também o nexo de causalidade entre a aplicação das disposições controvertidas em Espanha e o dano que sofreram na campanha de 2006/2007, período em que essas disposições foram aplicadas. Foi a aprovação das disposições controvertidas anuladas pelo Tribunal de Justiça e a sua aplicação nessa campanha no sector do algodão que levaram a uma diminuição considerável da área semeada de algodão por agricultor e do rendimento por hectare, logo, a uma grande queda da produção e, consequentemente, do fornecimento de algodão às indústrias de descaroçamento. Na opinião das demandantes, se essas disposições não tivessem sido aprovadas ou se tivessem sido adoptadas outras disposições mais adequadas aos objectivos enunciados no protocolo n.° 4 e no considerando 5 do regulamento controvertido, o dano não se teria verificado ou, pelo menos, teria sido significativamente menor.

41      As demandantes salientam ainda que os diversos relatórios que o Reino de Espanha tinha junto à sua petição no processo que deu origem ao acórdão Espanha/Conselho, já referido, revelavam as consequências muito negativas que as disposições controvertidas tinham para a subsistência da cultura do algodão em Espanha, uma vez que a sua rentabilidade deixava de estar assegurada. Com efeito, segundo as demandantes, esses relatórios referiam que as disposições controvertidas, em particular as percentagens de ajuda associada e de ajuda dissociada fixadas pelo Conselho, não podiam assegurar a rentabilidade da produção nas zonas em causa, levando ao abandono de uma grande parte da área semeada e, portanto, da produção, bem como à sua substituição por outras culturas, assim provocando uma grande diminuição da quantidade de algodão transformável pelas indústrias de descaroçamento. Do mesmo modo, tanto o Parlamento Europeu como o Comité Económico e Social Europeu se opuseram às percentagens de ajuda fixadas pelo legislador comunitário e salientaram o carácter inadequado das medidas para atingir os objectivos enunciados.

42      As demandantes alegam que as previsões acima referidas e o carácter absoluto do nexo de causalidade entre as disposições controvertidas e o dano sofrido foram confirmados pelos factos. A esse respeito, o relatório de 2007 demonstra que a redução do volume de algodão produzido em Espanha, na sequência da aprovação das disposições controvertidas, causou danos muito consideráveis à indústria descaroçadora, cujo volume de vendas baixou de forma significativa, por falta de matéria‑prima. O efeito dessa diminuição foi ainda agravado pelo facto de essa indústria apenas se poder aprovisionar em matéria‑prima, isto é, em algodão em rama, através da produção local. Por outro lado, afirmam ainda que a importância da descida das vendas não pode ser associada a nenhuma outra variável geralmente considerada determinante para a produção agrícola.

43      As demandantes esclarecem que a aplicação das disposições controvertidas na campanha de 2006/2007 teve um efeito negativo não só nas quantidades de algodão que descaroçam mas também no preço de venda obtido pela fibra de algodão. Por outro lado, a redução do volume de fibra produzida, consequência da alteração regulamentar ocorrida, poderia ter repercussões negativas na posição concorrencial das empresas descaroçadoras, nas futuras campanhas, uma vez que a entrada de novos concorrentes de países terceiros no mercado tinha sido facilitada.

44      Resulta ainda do relatório de 2007 que os efeitos do novo regime ainda são piores na campanha de 2007/2008, uma vez que é possível que as demandantes não estivessem em condições de enfrentar financeiramente outra campanha sob o novo regime de ajuda ao sector do algodão e fossem obrigadas a abrir falência ou a encerrar.

45      Na réplica, as demandantes alegam que, ao contrário do que afirmam as instituições demandadas, o relatório de 2007 e as peritagens não se baseiam em simples presunções, mas sim em dados reais, confirmados pelo estudo de impacto efectuado pelos serviços da Comissão em 2007 e retirados dos relatórios financeiros das empresas descaroçadoras, que referem a existência de um dano efectivo provocado pela alteração de regulamentação. Esse dano foi calculado a partir da comparação dos resultados reais obtidos nos dois regimes, critério que, segundo a opinião dos peritos, está correcto. As críticas muito gerais das instituições demandadas sobre a relevância e as conclusões desses relatórios são reveladoras de que não tiveram o cuidado de as analisar atentamente.

46      O Conselho e a Comissão consideram, no essencial, que, no caso presente, não está preenchido o pressuposto da existência de um nexo de causalidade entre o ilícito praticado pelo Conselho na adopção do regulamento controvertido e o dano alegado. Salientam, nomeadamente, que as demandantes se limitam a afirmar que os prejuízos que alegadamente sofreram foram o resultado da aplicação das disposições controvertidas. Ora, as indicações que as demandantes forneceram não permitem considerar que cumpriram o ónus da prova que lhes cabe. As conclusões que foram extraídas do relatório de 2007 e das peritagens, que assentam numa avaliação do volume de algodão que teria sido produzido se não tivesse havido a reforma do regime de ajuda ao algodão introduzida pelo regulamento controvertido, são irrelevantes. As demandantes deveriam ter‑se baseado na diferença entre, por um lado, os efeitos do regulamento controvertido e, por outro, os efeitos de um regulamento que aprovasse uma reforma do regime de ajuda ao algodão, que não estivesse ferido de erro de direito, como aquele que o Conselho tenciona aprovar o mais brevemente possível.

 Apreciação do Tribunal

47      Quanto ao pressuposto da existência de um nexo de causalidade entre o acto e o dano alegados, resulta de jurisprudência assente que o dano alegado deve resultar do acto imputado, de forma suficientemente directa, devendo esse acto ser a causa determinante do dano (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 4 de Outubro de 1979, Dumortier e o./Conselho, 64/76, 113/76, 167/78, 239/78, 27/79, 28/79 e 45/79, Recueil, p. 3091, n.° 21; acórdãos do Tribunal Geral de 11 de Julho de 1996, International Procurement Services/Comissão, T‑175/94, Colect., p. II‑729, n.° 55, e de 19 de Julho de 2007, FG Marine/Comissão, T‑360/04, não publicado na Colectânea, n.° 50). Cabe às demandantes fazer a prova desse nexo de causalidade (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 30 de Janeiro de 1992, Finsider e o./Comissão, C‑363/88 e C‑364/88, Colect., p. I‑359, n.° 25, e acórdão do Tribunal Geral de 24 de Abril de 2002, EVO/Conselho e Comissão, T‑220/96, Colect., p. II‑2265, n.° 41 e jurisprudência aí referida).

48      Para determinar o dano imputável a um acto culposo de uma instituição comunitária, há que ter em conta os efeitos do ilícito gerador de responsabilidade, e não os do acto em que ele se inscreve, se a instituição pudesse ou devesse adoptar um acto com o mesmo efeito, sem violar a norma jurídica. Por outras palavras, a análise do nexo de causalidade não pode partir da premissa incorrecta de que, sem o acto ilícito, a instituição não teria agido ou teria adoptado um acto contrário, o que também poderia ser um acto seu ilegal, antes devendo proceder a uma comparação entre a situação gerada ao terceiro em causa pelo acto culposo e a situação que para ele teria resultado de um acto da instituição respeitador da norma jurídica.

49      Há que apurar, portanto, se o ilícito aqui em causa está directamente na origem do dano invocado (v., neste sentido, acórdão Finsider e o./Comissão, já referido, n.° 28), para determinar a existência de um nexo directo de causa/efeito entre o acto imputado à Comunidade e o dano alegado (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Dezembro de 1963, Société des Aciéries du Temple/Alta Autoridade, 36/62, Recueil, pp. 583, 603, Colect., p. 353, e acórdão Finsider e o./Comissão, já referido, n.os 41 e 50).

50      Quanto ao comportamento ilícito em causa, as demandantes, tal como confirmaram na audiência em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal Geral, identificam o facto gerador do dano que alegam ter sofrido, exclusivamente, no ilícito cometido pelo Conselho na adopção do regulamento controvertido, isto é, a violação do princípio da proporcionalidade, tal como declarada pelo Tribunal de Justiça no acórdão Espanha/Conselho, já referido.

51      A esse respeito, há que lembrar que o Tribunal de Justiça, no acórdão Espanha/Conselho, já referido, considerou que as disposições controvertidas deviam ser anuladas na medida em que o princípio da proporcionalidade tinha sido violado.

52      Mais precisamente, o Tribunal de Justiça referiu que estava assente que a aprovação das disposições controvertidas não tinha sido precedida de um estudo da Comissão que avaliasse os efeitos socioeconómicos prováveis da reforma proposta para o sector do algodão, ao passo que, na reforma dos regimes de ajuda a outros sectores, como o do tabaco, tinham sido efectuados tais estudos (n.° 103 do acórdão). Punha‑se, assim, a questão de saber em que bases tinha sido determinado o montante da ajuda específica ao algodão e, portanto, se, com essas bases, o legislador comunitário, sem exceder o seu amplo poder de apreciação, podia chegar à conclusão de que, fixado em 35% do total das ajudas existentes no regime de ajuda anterior, esse montante era suficiente para atingir o objectivo prosseguido de assegurar a rentabilidade e, portanto, a prossecução da cultura do algodão.

53      Pronunciando‑se sobre o princípio da proporcionalidade, que exige que os actos das instituições não ultrapassem os limites do adequado e necessário à realização dos objectivos legítimos prosseguidos pela regulamentação em causa (n.° 97 do acórdão), o Tribunal de Justiça considerou que as instituições comunitárias deviam, pelo menos, poder apresentar e expor de forma clara e inequívoca os dados de base que deviam ter sido tidos em conta para fundamentar as medidas impugnadas e dos quais dependia o exercício do seu poder de apreciação (n.° 123 do acórdão). Ora, no caso presente, em primeiro lugar, certos custos salariais não tinham sido tidos em conta no estudo comparativo da rentabilidade previsível da cultura do algodão no regime de ajuda, análise que tinha servido de fundamento à determinação do montante da ajuda específica ao algodão, e, em segundo lugar, os potenciais efeitos da reforma na situação económica das empresas de descaroçamento não tinham sido analisados, apesar de serem um dado de base a ter em conta na avaliação da rentabilidade da cultura do algodão (v. n.os 124 a 132 do acórdão).

54      O Tribunal de Justiça inferiu daí que o Conselho, autor do regulamento controvertido, não tinha demonstrado que o novo regime de ajuda ao algodão instituído por esse regulamento tinha sido aprovado por meio de um exercício efectivo do seu poder de apreciação, que implicava que fossem tomados em consideração todos os elementos e circunstâncias relevantes do caso, entre os quais o conjunto dos custos salariais ligados à cultura do algodão e a viabilidade das empresas de descaroçamento, o que devia ser tido em consideração na apreciação da rentabilidade dessa cultura (n.° 133 do acórdão). Segundo o Tribunal de Justiça, daí resulta que os dados apresentados pelas instituições comunitárias não lhe permitiam verificar se o legislador comunitário podia, sem exceder os limites do amplo poder de apreciação de que dispõe nessa matéria, chegar à conclusão de que a fixação do montante da ajuda específica ao algodão, em 35% do total das ajudas existentes no regime de ajuda anterior, era suficiente para garantir o objectivo referido no considerando 5 do regulamento controvertido, que era assegurar a rentabilidade e, portanto, a continuação dessa cultura, objectivo que reflecte o do n.° 2 do protocolo n.° 4 (n.° 134 do acórdão). O Tribunal de Justiça concluiu daí que o princípio da proporcionalidade tinha sido violado (n.° 135 do acórdão).

55      É à luz destas precisões que se tem de analisar se as demandantes fizeram prova ou apresentaram indícios susceptíveis de demonstrar uma relação de causa/efeito entre o ilícito cometido na aprovação do regulamento controvertido e os vários danos alegados.

–       Quanto ao nexo de causalidade entre a violação do princípio da proporcionalidade pelo regulamento controvertido e o dano resultante da redução da produção de algodão e da subsequente diminuição dos rendimentos auferidos pelas empresas de descaroçamento na campanha de 2006/2007

56      Resulta da argumentação apresentada pelas demandantes, quer na petição quer na réplica, quer ainda nos relatórios e peritagens que apresentaram em seu apoio, que a análise a que procedem consiste em demonstrar que existe um nexo entre a diminuição do volume de vendas de algodão na campanha de 2006/2007 e a entrada em vigor do regulamento controvertido, e não entre essa diminuição e o ilícito cometido pelo Conselho na aprovação desse regulamento.

57      Antes de mais, quanto ao relatório de 2007, este consiste, tal como resulta do seu objecto, em relatar «efeitos da reforma do regime de apoio ao algodão na produção espanhola». Os desenvolvimentos referidos nesse relatório são, como resulta claramente da redacção das suas diversas secções, dedicados quer à análise dos «efeitos da reforma nos incentivos ao cultivo do algodão» quer à «quantificação dos efeitos da reforma na produção espanhola». Note‑se também que essa avaliação se refere principalmente aos efeitos globais da passagem de um regime de ajuda exclusivamente ligada à produção de algodão para um regime de ajuda dissociado da referida produção em 65%.

58      Quanto às peritagens, destinam‑se a avaliar, na primeira parte, o impacto da reforma no sector do descaroçamento, no seu conjunto, e, na segunda parte, o montante do dano sofrido por cada uma das demandantes, por referência às três campanhas anteriores, nas quais estava ainda em vigor o regime anterior de ajuda ao algodão. As demandantes salientam, a esse respeito, que o dano que sofreram foi calculado nas peritagens «a partir da diferença existente entre os resultados estimados para a campanha [de 2006/2007,] tendo em conta a regulamentação actual das ajudas ao algodão (estimativa no encerramento da campanha) e os resultados que teriam sido os da empresa com base no regime de ajudas anterior (cenário alternativo)».

59      Não se pode deixar de observar que esses elementos não são susceptíveis de demonstrar que o dano invocado está directamente ligado à violação do princípio da proporcionalidade cometida pelo Conselho na aprovação do regulamento controvertido. Com efeito, tal como acima se refere no n.° 48, a análise do nexo de causalidade não pode partir da premissa incorrecta de que, se não tivesse existido o acto ilícito, a instituição não teria actuado ou teria praticado um acto contrário, devendo, sim, ser feita por comparação entre a situação causada ao terceiro em causa pela acção ilícita e a situação que para ele resultaria de um acto da instituição que respeitasse a norma jurídica.

60      No caso, resulta do acórdão Espanha/Conselho, já referido, que não são as disposições controvertidas por si próprias, mas sim o facto de não ter sido tomado em consideração o conjunto de elementos e circunstâncias relevantes, em particular mediante um estudo do impacto da reforma, antes da adopção daquelas, que foi considerado uma violação do princípio da proporcionalidade. Daí resulta que qualquer diminuição de rendimentos devida unicamente à reforma não tem um nexo de causalidade com o ilícito declarado pelo Tribunal de Justiça, pois esse ilícito não põe em causa a opção de proceder a essa reforma. Cabia, pois, às demandantes apresentar a prova de que as taxas das ajudas não dissociadas e das ajudas dissociadas aprovadas na reforma de 2004, isto é, as taxas de, respectivamente, 35% e 65%, que entendem estar na origem do dano alegado, teriam sido diferentes se as instituições comunitárias tivessem, de acordo com esse acórdão, tido em conta todos os dados relevantes (impacto na produção de algodão, custos salariais ligados à cultura do algodão e o efeito do novo regime no sector do descaroçamento).

61      Ora, as demandantes não demonstraram que, sem o ilícito declarado pelo Tribunal de Justiça no acórdão Espanha/Conselho, já referido, o regulamento controvertido não teria sido adoptado ou teria tido necessariamente um conteúdo diferente. A esse respeito, há que lembrar que o regulamento controvertido, nomeadamente o capítulo 10-A que introduz no Regulamento n.° 1782/2003, se insere, tal como resulta claramente do seu preâmbulo, no âmbito da reforma da política agrícola comum, iniciada pelo Regulamento n.° 1782/2003, cujo objectivo é substituir uma política de apoio aos preços e à produção por uma política de apoio directo ao rendimento dos agricultores, um de cujos elementos‑chave é a dissociação do apoio directo aos produtores e a introdução do regime de pagamento único (v. considerando 1). Uma vez que a passagem para um regime de ajuda progressivamente dissociada da produção está no centro da reforma da política agrícola comum, as demandantes não podem, no âmbito das presentes acções, basear‑se no regime de ajuda à produção existente antes da adopção do regulamento controvertido.

62      Saliente‑se igualmente que, à data da propositura das presentes acções, o Conselho ainda não tinha aprovado o novo regulamento e que, nessa fase, era impossível fazer um juízo sobre o conteúdo das disposições da reforma do regime de ajuda ao algodão que viriam a ser aprovadas na sequência e em conformidade com o acórdão Espanha/Conselho, já referido. Nestas condições, cabia às demandantes apresentar elementos concretos que permitissem demonstrar com certeza que o futuro regulamento, tendo em conta a obrigação de tomar em consideração todos os factores e circunstâncias específicos do sector do algodão, incluindo todos os elementos necessários à avaliação da rentabilidade da cultura, deveria instituir um sistema de apoio aos produtores de algodão, diferente do previsto no regulamento controvertido.

63      Por outras palavras, cabia‑lhes demonstrar que, adoptando um novo regime que respeitasse não só a norma jurídica que prevê a realização de um estudo do impacto da reforma mas também os objectivos subjacentes à reforma da política agrícola comum, o Conselho seria inevitavelmente levado a aprovar um sistema e uma taxa de dissociação da ajuda aos produtores, diferentes dos previstos nas disposições controvertidas.

64      Ora, não só as demandantes não apresentaram tais elementos, como resulta do estudo de impacto, efectuado pelos serviços da Comissão em 2007, de acordo com o acórdão Espanha/Conselho, já referido, que, entre as três opções estratégicas possíveis, isto é, a «ajuda à produção» (dita «cenário pré‑reforma»), a «dissociação total» e a «dissociação quase total» (dita «cenário de 2004»), esta última é a que fornece os melhores meios para atingir os diversos objectivos da reforma, uma vez que preenche as condições previstas no protocolo n.° 4 e vai no sentido do processo de reforma da política agrícola comum.

65      No mesmo sentido, a nova proposta de regulamento apresentada pela Comissão em 9 de Novembro de 2007 refere que os estudos efectuados chegam à conclusão de que as percentagens de 35% de ajudas não dissociadas e de 65% de ajudas dissociadas à produção deviam ser mantidas.

66      Por último, não se pode deixar de observar que o novo regulamento adoptado na sequência do acórdão Espanha/Conselho, já referido, isto é, o Regulamento (CE) n.° 637/2008 do Conselho, de 23 de Junho de 2008, que altera o Regulamento n.° 1782/2003 e institui programas nacionais de reestruturação para o sector do algodão (JO L 178, p. 1), fixa essas mesmas percentagens de ajudas não dissociadas e dissociadas (v. considerandos 9 e 10).

67      O facto, invocado pelas demandantes na audiência, de o Regulamento n.° 637/2008 conter disposições aparentemente mais favoráveis às empresas de descaroçamento que as do regulamento controvertido, também não é susceptível de provar que existe um nexo de causalidade suficientemente directo entre o ilícito cometido e os danos alegados, uma vez que não se demonstrou que as novas disposições contidas nesse regulamento, que se destinam a contribuir para a estabilização do sector do algodão no novo contexto jurídico e comercial, são necessariamente o resultado de diferentes estudos de impacto efectuados pelos serviços da Comissão em conformidade com o acórdão Espanha/Conselho, já referido. Com efeito, nem das conclusões desses estudos (v. ponto 5 do resumo do estudo de impacto acima referido) nem do preâmbulo do Regulamento n.° 637/2008 (v. considerandos 16 a 24) resulta, de maneira nenhuma, que a inserção dessas disposições tenha sido efectuada por terem sido tomados em consideração, em conformidade com o acórdão Espanha/Conselho, já referido, todos os elementos e circunstâncias relevantes.

–       Quanto ao nexo de causalidade entre a violação do princípio da proporcionalidade pelo regulamento controvertido e as despesas com assessoria jurídica e económica

68      Quanto ao dano resultante dos «custos de serviços de assessoria jurídica e económica» e, eventualmente, dos custos de amortização e provisão para as imobilizações corpóreas, não se pode deixar de considerar que as demandantes não indicaram em que medida esses custos de assessoria «causados pela aprovação do regulamento controvertido», admitindo que tenham efectivamente existido, apresentavam um nexo directo com o ilícito declarado pelo Tribunal de Justiça no acórdão Espanha/Conselho, já referido.

69      Com efeito, em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal na audiência, as demandantes esclareceram que esses custos, na realidade, eram relativos às despesas efectuadas para efeitos das presentes acções. Ora, as despesas efectuadas para efeitos de processos jurisdicionais nos tribunais comunitários devem ser consideradas abrangidas pelas decisões relativas às despesas, proferidas de acordo com as normas processuais específicas aplicáveis a esse tipo de despesas, nas decisões que põem fim à instância e no termo dos processos especiais previstos em caso de contestação do montante das despesas. Esses processos são exclusivos de um pedido dos mesmos montantes, ou de montantes dispendidos para os mesmos fins, no âmbito de uma acção que ponha em causa a responsabilidade extracontratual da Comunidade, incluindo a de partes que, tendo sido vencidas, tiveram de suportar as despesas.

70      Resulta do exposto que as demandantes não conseguiram demonstrar que o dano por elas sofrido está ligado, por uma relação de causa/efeito, à violação do princípio da proporcionalidade pelo regulamento controvertido.

71      Assim sendo, as acções devem ser julgadas improcedentes, sem que seja necessário analisar se os outros pressupostos da responsabilidade extracontratual da Comunidade estão preenchidos no caso.

 Quanto às despesas

72      Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo as demandantes sido vencidas, há que condená‑las nas respectivas despesas e, solidariamente, nas despesas do Conselho e da Comissão, em conformidade com os pedidos destes.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção)

decide:

1)      Apensam‑se os processos T‑252/07, T‑271/07 e T‑272/07, para efeitos de acórdão.

2)      As acções são julgadas improcedentes.

3)      A Sungro, SA, a Eurosemillas, SA, e a Surcotton, SA, suportarão as respectivas despesas e, solidariamente, as do Conselho da União Europeia e da Comissão Europeia.

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 20 de Janeiro de 2010.

Assinaturas


* Língua do processo: espanhol.