Language of document : ECLI:EU:C:2004:50

Ordonnance de la Cour

DESPACHO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)
27 de Janeiro de 2004 (1)

«Artigo 104.°, n.° 3, do Regulamento de Processo – Marcas – Directiva 89/104/CEE – Artigos 10.°, n.° 1, e 12.°, n.° 1 – Caducidade dos direitos do titular da marca – Conceito de uso sério da marca»

No processo C-259/02,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 234.° CE, pela High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division (Reino Unido), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

La Mer Technology Inc.

e

Laboratoires Goemar SA,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos artigos 10.°, n.° 1, e 12.°, n.° 1, da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1),



O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),



composto por: J. N. Cunha Rodrigues, exercendo funções de presidente da Terceira Secção, J.‑P. Puissochet (relator) e F. Macken, juízes,

advogado-geral: D. Ruiz-Jarabo Colomer,
secretário: R. Grass,

tendo o órgão jurisdicional de reenvio sido informado de que o Tribunal de Justiça se propõe decidir por meio de despacho fundamentado nos termos do artigo 104.°, n.° 3, do seu Regulamento de Processo,

tendo os interessados referidos no artigo 23.° do Estatuto do Tribunal de Justiça sido convidados a apresentar as suas eventuais observações a este respeito,

ouvido o advogado-geral,

profere o presente



Despacho



1
Por despacho de 19 de Dezembro de 2001, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 15 de Julho de 2002, a High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division, submeteu, nos termos do artigo 234.° CE, sete questões prejudiciais sobre a interpretação dos artigos 10.°, n.° 1, e 12.°, n.° 1, da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1, a seguir «directiva»).

2
Estas questões foram suscitadas no quadro de uma acção proposta pela sociedade de direito americano La Mer Technology Inc. (a seguir «La Mer Technology») contra a sociedade de direito francês Laboratoires Goemar SA (a seguir «Laboratoires Goemar») e destinada a obter a declaração de caducidade dos direitos que estes detêm sobre duas marcas denominadas «Laboratoire de la mer» de que obtiveram o registo no Reino Unido para produtos que comercializam.


Enquadramento jurídico

Direito comunitário

3
O artigo 10.°, n.os 1 a 3, da directiva dispõe:

«1.    Se, num prazo de cinco anos a contar da data do encerramento do processo de registo, a marca não tiver sido objecto de uso sério pelo seu titular, no Estado‑Membro em questão, para os produtos ou serviços para que foi registada, ou se tal uso tiver sido suspenso durante um período ininterrupto de cinco anos, a marca fica sujeita às sanções previstas na presente directiva, salvo justo motivo para a falta de uso.

2.      São igualmente considerados como uso para efeitos do n.° 1:

a)
O uso da marca por modo que difira em elementos que não alterem o carácter distintivo da marca na forma sob a qual foi registada;

b)
A aposição da marca em produtos ou na respectiva embalagem no Estado‑Membro em questão apenas para efeitos de exportação.

3.      O uso da marca com o consentimento do titular ou por qualquer pessoa habilitada a usar uma marca colectiva ou uma marca de garantia ou certificação será considerado feito pelo titular.»

4
Nos termos do artigo 12.°, n.° 1, da directiva:

«O registo de uma marca fica passível de caducidade se, durante um período ininterrupto de cinco anos, não tiver sido objecto de uso sério no Estado‑Membro em causa para os produtos ou serviços para que foi registada e se não existirem motivos justos para o seu não uso; contudo, ninguém poderá requerer a caducidade do registo de uma marca se, durante o intervalo entre o fim do período de cinco anos e a introdução do pedido de caducidade, tiver sido iniciado ou reatado um uso sério da marca; o início ou o reatamento do uso nos três meses imediatamente anteriores à introdução do pedido de caducidade, contados a partir do fim do período ininterrupto de cinco anos de não uso, não será, contudo, tomado em consideração se as diligências para o início ou reatamento do uso só ocorrerem depois de o titular tomar conhecimento de que pode vir a ser introduzido um pedido de caducidade.»

Legislação interna

5
Nos termos da section 46(1) do Trade Marks Act 1994 (lei de 1994 sobre as marcas):

«Pode declarar‑se a caducidade de um registo de marca com um dos seguintes fundamentos:

a)
Que, no período de cinco anos subsequentes à data do encerramento do processo de registo, não tenha sido objecto de uso sério no Reino Unido, pelo titular ou com a autorização do titular, relativamente a produtos ou serviços para os quais a marca foi registada e não houver justo motivo para a falta de uso.

b)
Que tal uso tenha sido suspenso por um período contínuo de cinco anos, e não houver justo motivo para a falta de uso.»


O litígio no processo principal e as questões prejudiciais

6
Os Laboratoires Goemar têm sede em Saint Malo (França) e são especializados em produtos à base de algas. Obtiveram no Reino Unido o registo da marca Laboratoire de la mer, por um lado, em 1988, para «produtos farmacêuticos, veterinários e sanitários, produtos dietéticos para uso médico [...] todos contendo produtos marinhos», incluídos na classe 5, definida no Acordo de Nice relativo à classificação internacional dos produtos para efeitos do registo das marcas, de 15 de Junho de 1957, revisto e alterado (a seguir «Acordo de Nice»), e, por outro, em 1989, para «cosméticos contendo produtos marinhos» incluídos na classe 3 do mesmo acordo.

7
A La Mer Technology deseja utilizar a marca La mer para comercializar uma gama de produtos cosméticos e de produtos similares no Reino Unido. Em 27 de Março de 1998, ou seja, mais de cinco anos após a data em que foram registadas as marcas Laboratoire de la mer, apresentou no Trade Mark Registry (registo de marcas) dois pedidos de caducidade destas, alegando que os Laboratoires Goemar não tinham feito um uso sério das mesmas no decurso dos 5 anos que antecederam os referidos pedidos.

8
Em 19 de Junho de 2001, o Hearing Officer (funcionário competente do Trade Mark Registry) julgou procedentes, por um lado, os pedidos de caducidade das marcas Laboratoire de la mer, mas apenas para os «perfumes» incluídos na classe 3 do Acordo de Nice e para os «produtos farmacêuticos veterinários e sanitários», incluídos na classe 5 do mesmo acordo. Esta parte da decisão do Hearing Officer não foi contestada. O mesmo, por outro lado, recusou os restantes pedidos que lhe foram submetidos, relativos à caducidade das marcas registadas para os «cosméticos contendo produtos marinhos» da referida classe 3 e para os «produtos dietéticos para uso médico», incluídos na referida classe 5.

9
A La Mer Technology interpôs dois recursos desta última parte da decisão do Hearing Officer na High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division.

10
Em 19 de Dezembro de 2001, a High Court deu provimento aos pedidos do recurso relativamente aos produtos incluídos na classe 5 do Acordo de Nice e, em consequência, declarou a caducidade da marca em causa.

11
Ao invés, no que respeita à marca registada para «cosméticos contendo produtos marinhos», incluída na classe 3 do Acordo de Nice, a High Court afirmou que, no período de cinco anos que antecede os pedidos de caducidade, os Laboratoires Goemar tinham encarregado a sociedade Health Scope Direct Ltd, com sede na Escócia, de comercializar tais produtos no Reino Unido. A High Court considerou que a venda desses produtos no decurso desse período tinha gerado apenas um volume de negócios muito reduzido, de algumas centenas de GBP, mas que esta situação reflectia mais o insucesso comercial da sociedade titular da marca do que um uso da mesma que teria apenas como objectivo manter os efeitos do registo. Por outro lado, a High Court reconheceu que os Laboratoires Goemar tinham contratado um novo intermediário comercial no Reino Unido para relançar as suas vendas pouco antes desse mesmo período.

12
A High Court considerou que a questão principal do litígio era saber se, em tais circunstâncias, a marca Laboratoire de la mer tinha sido objecto de um uso sério na acepção da Trade Marks Act 1994. A High Court afirmou que esse conceito de uso sério tinha o mesmo alcance que o enunciado nas disposições correspondentes da directiva.

13
Nestas condições, a High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division, decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)
Quais os elementos a ter em conta para se decidir se uma marca foi ‘objecto de um uso sério’ num Estado‑Membro, na acepção dos artigos 10.°, n.° 1, e 12.°, n.° 1, da [directiva]?

Em especial:

2)
Deve ser tida em conta a extensão do uso da marca para os bens e serviços para os quais está registada no Estado‑Membro?

3)
É suficiente qualquer medida de uso, ainda que diminuta, se esse uso tiver sido feito com propósitos estritamente comerciais, comercializando os produtos ou prestando os serviços a que se refere a marca?

4)
Se a resposta à questão anterior for negativa, qual o critério para determinar a medida de uso suficiente, e, em particular, esse critério deve tomar em consideração a natureza e a dimensão da empresa do titular do registo de marca?

5)
Deve ignorar‑se o uso meramente simbólico ou artificial, em particular o uso cujo objectivo exclusivo ou predominante é o de fazer fracassar potenciais pedidos de declaração de caducidade?

6)
Que tipos de uso podem ser tomados em consideração? Em particular, é necessário demonstrar que a marca foi usada no exercício do comércio no Estado‑Membro em questão? Mais em particular, a importação para esse Estado‑Membro por um único cliente será suficiente?

7)
Deve ignorar‑se o uso que foi feito após a apresentação de um pedido de declaração de caducidade, mesmo para averiguar se o uso durante o período pertinente foi sério?»

Quanto à aplicação do artigo 104.°, n.° 3, do Regulamento de Processo

14
Considerando que a resposta às seis primeiras questões podia claramente ser deduzida do acórdão de 11 de Março de 2003, Ansul (C‑40/01, Colect., p. I‑2439), proferido posteriormente à prolação do despacho de reenvio, e que a resposta à sétima questão não deixava lugar a qualquer dúvida razoável, o Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 104.°, n.° 3, do seu Regulamento de Processo, informou o órgão jurisdicional de reenvio, por carta de 22 de Maio de 2003, que se propunha decidir por meio de despacho fundamentado e convidou os interessados referidos no artigo 23.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, por carta de 27 de Outubro de 2003, a apresentar as suas eventuais observações a esse respeito.

15
A Comissão e o Governo francês não apresentaram observações quanto a este ponto.

16
No entanto, por decisão de 20 de Junho de 2003, o órgão jurisdicional de reenvio, ao mesmo tempo que anunciava que desistia da quinta questão prejudicial, indicou que mantinha as outras questões, pedindo ao Tribunal de Justiça para não aplicar o artigo 104.°, n.° 3, do Regulamento de Processo. A La Mer Technology, por carta de 4 de Julho de 2003, indicou ao Tribunal de Justiça que era necessário realizar uma audiência, com base no artigo 104.°, n.° 4, do referido regulamento. Por carta conjunta, de 17 de Novembro de 2003, assinada pelos seus advogados, os Laboratórios Goemar e La Mer Technology indicaram que compartilhavam da análise do órgão jurisdicional de reenvio exposta nessa decisão de 20 de Junho de 2003. Por carta de 24 de Novembro de 2003, o Governo do Reino Unido exprimiu o mesmo ponto de vista.

17
As observações, referidas no número precedente, não são susceptíveis de pôr em causa a decisão do Tribunal de Justiça de aplicar o artigo 104.°, n.° 3, do Regulamento de Processo e de não realizar a audiência.

Quanto à primeira, segunda, terceira, quarta e sexta questões

18
Através destas questões, que há que analisar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, essencialmente, quais são os critérios e os tipos de uso de uma marca que permitem determinar se esta «foi objecto de um uso sério» num Estado‑Membro, na acepção dos artigos 10.°, n.° 1, e 12.°, n.° 1, da directiva. O mesmo órgão jurisdicional de reenvio pergunta, designadamente, se um uso, mesmo mínimo, pode ser qualificado de sério, quando o único objectivo do titular é comercializar os produtos e serviços protegidos pela marca.

19
A resposta a estas questões pode ser claramente deduzida dos n.os 35 a 39 do acórdão Ansul, já referido, em que o Tribunal de Justiça expõe as seguintes considerações:

«35
[...] como alega a Ansul, a directiva precisa, no seu oitavo considerando, que as marcas devem ser ‘efectivamente usadas sob pena de caducidade’. O ‘uso sério’ é, por isso, um uso efectivo da marca. Esta análise é confirmada, nomeadamente, pela versão neerlandesa da directiva que, no seu oitavo considerando, emprega os termos ‘werkelijk wordt gebruikt’, bem como por outras versões linguísticas, como as versões espanhola (‘uso efectivo’), italiana (‘uso effettivo’) ou inglesa (‘genuine use’).

36
O ‘uso sério’ deve, assim, entender‑se como um uso que não é feito a título meramente simbólico, apenas para efeitos de manutenção dos direitos conferidos pela marca. Deve tratar‑se dum uso compatível com a função essencial da marca, que é garantir ao consumidor ou ao utilizador final a identidade de origem dum produto ou serviço, permitindo‑lhe distinguir, sem confusão possível, este produto ou serviço dos que tenham proveniência diversa.

37
Resulta do exposto que o ‘uso sério’ da marca pressupõe a utilização desta no mercado dos produtos ou serviços protegidos pela marca e não apenas no seio da empresa interessada. A protecção da marca e os efeitos que o seu registo torna oponíveis a terceiros não poderiam perdurar se a marca perdesse a sua razão de ser comercial, que consiste em criar ou conservar um mercado para os produtos ou serviços que ostentam o sinal que a constitui, em relação aos produtos ou serviços provenientes de outras empresas. O uso da marca deve, assim, fazer‑se sobre produtos ou serviços que já são comercializados ou cuja comercialização, preparada pela empresa com vista à conquista de uma clientela, nomeadamente no quadro de campanhas publicitárias, está iminente. Esse uso pode ser feito tanto pelo titular da marca como, conforme prevê o artigo 10.°, n.° 3, da directiva, por um terceiro autorizado a utilizar a marca.

38
Finalmente, deve tomar‑se em consideração, na apreciação do carácter sério do uso da marca, todos os factos e circunstâncias adequados para provar a existência da sua exploração comercial, em especial, os usos considerados justificados, no sector económico em questão para manter ou criar partes de mercado em benefício dos produtos ou dos serviços protegidos pela marca.

39
A apreciação das circunstâncias do caso concreto pode, assim, justificar que se tome em conta, nomeadamente, a natureza do produto ou do serviço em causa, as características do mercado em questão, a extensão e a frequência do uso da marca. Assim, não é necessário que o uso da marca seja sempre quantitativamente importante para ser qualificado de sério, pois tal qualificação depende das características do produto ou do serviço em questão no mercado correspondente.»

20
Resulta destas considerações que a manutenção dos direitos do titular da marca supõe um uso sério da mesma no exercício do comércio, no mercado dos produtos ou dos serviços para os quais foi registada no Estado‑Membro em questão.

21
Por outro lado, resulta do n.° 39 do acórdão Ansul, já referido, que um uso da marca pode, em certos casos, mesmo se este uso não é quantitativamente importante, apresentar carácter sério na acepção da directiva. Por conseguinte, um uso, mesmo mínimo, pode ser suficiente para ser qualificado de sério, desde que seja considerado justificado, no sector económico em causa, para manter ou criar quotas de mercado para os produtos ou serviços protegidos pela marca.

22
A questão de saber se um uso é quantitativamente suficiente para manter ou criar quotas de mercado para os referidos produtos ou serviços depende de vários factores e de uma apreciação do caso vertente que compete, em cada caso, ao órgão jurisdicional nacional. As características desses produtos ou serviços, a frequência ou a regularidade do uso da marca, o facto de a marca ser utilizada para comercializar a totalidade dos produtos ou serviços idênticos da empresa titular ou simplesmente alguns deles, ou ainda as provas que o titular tem de apresentar relativas ao uso da marca, são, alguns dos factores que podem ser tomados em consideração.

23
Do mesmo modo, como resulta dos n.os 35 a 39, já referidos do acórdão Ansul, as características do mercado em questão, que têm influência directa na estratégia comercial do titular da marca, podem igualmente ser tomadas em consideração para apreciar o carácter sério do uso.

24
Assim, a utilização da marca por um só cliente, importador dos produtos para os quais está registada, pode bastar para demonstrar que tal uso é sério, se se revelar que essa operação de importação tem uma justificação comercial real para o titular da marca.

25
Nestas condições, não é possível determinar a priori, de forma abstracta, qual o limite quantitativo que deve ser considerado para determinar se o uso tem ou não carácter sério. Uma regra de minimis que não permita ao órgão jurisdicional nacional apreciar a totalidade das circunstâncias do litígio que lhe é submetido, não pode, por conseguinte, ser fixado.

26
Por último, pode ser claramente deduzido do n.° 36 do acórdão Ansul, já referido, que um uso da marca que não tenha, essencialmente, por objectivo manter ou criar quotas de mercado para os produtos ou serviços que protege deve ser apreciado como tendo, na realidade, por objecto, evitar a apresentação de um possível pedido de caducidade. Tal uso não pode ser qualificado de «sério» na acepção da directiva.

27
Tendo em conta o exposto, importa responder à primeira, segunda, terceira, quarta e sexta questões que os artigos 10.°, n.° 1, e 12.°, n.° 1, da directiva devem ser interpretados no sentido de que uma marca é objecto de «uso sério» quando é utilizada, em conformidade com a sua função essencial que é garantir a identidade de origem dos produtos ou serviços para os quais foi registada, a fim de criar ou conservar um mercado para estes produtos e serviços, com exclusão de usos de carácter simbólico que tenham como único objectivo a manutenção dos direitos conferidos por essa marca. A apreciação do carácter sério do uso da marca deve assentar na totalidade dos factos e das circunstâncias adequados para provar a existência da exploração comercial da mesma no mundo dos negócios, em especial, nos usos considerados justificados no sector económico em questão para manter ou criar quotas de mercado em benefício dos produtos ou serviços protegidos pela marca, na natureza destes produtos ou serviços, nas características do mercado, na extensão e na frequência do uso da referida marca. Quando responde a uma justificação comercial real, nas condições acima referidas, um uso ainda que mínimo da marca ou que respeite apenas a um único importador no Estado‑Membro em questão pode ser suficiente para provar a existência do carácter sério na acepção dessa directiva.

Quanto à sétima questão

28
Através da sétima questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, essencialmente, se a directiva deve ser interpretada no sentido de que se opõe à tomada em consideração de um uso da marca posterior à apresentação do pedido de caducidade, para apreciar se o uso no decurso do período pertinente, isto é, nos cinco anos que precedem essa apresentação, reveste carácter sério.

29
Resulta das disposições do artigo 12.°, n.° 1, da directiva que, por um lado, a manutenção dos direitos do titular da marca pressupõe o seu uso sério, em qualquer caso antes da apresentação do pedido de caducidade e, por outro, que o início ou o reatamento do uso da marca, mesmo quando ocorrem antes da apresentação desse pedido, não permitem, em todos os casos, manter os direitos do titular, se se verificar que essas operações ocorreram depois de o titular tomar conhecimento de que pode vir a ser apresentado esse pedido.

30
Resulta do exposto que a directiva subordina a qualificação de «uso sério» da marca apenas à tomada em consideração das circunstâncias que ocorreram durante o período pertinente e que, por conseguinte, são anteriores à apresentação do pedido de caducidade.

31
No entanto, a directiva não exclui expressamente que a apreciação do carácter sério do uso no decurso do período pertinente, se for caso disso, possa ter em conta eventuais circunstâncias posteriores a essa apresentação. Tais circunstâncias podem permitir confirmar ou apreciar melhor o alcance da utilização da marca no decurso do período pertinente assim como as reais intenções do titular no decurso do mesmo período.

32
Compete ao órgão jurisdicional nacional analisar se eventuais circunstâncias posteriores à apresentação do pedido de caducidade confirmam a conclusão segundo a qual o uso da marca no período pertinente era sério ou se, pelo contrário, as mesmas traduzem uma vontade do titular de evitar a apresentação desse pedido.

33
Por conseguinte, importa responder à sétima questão que, embora a directiva subordine a qualificação de «uso sério» da marca apenas à tomada em consideração de circunstâncias que ocorreram durante o período pertinente e anteriores à apresentação do pedido de caducidade, a mesma não se opõe a que a apreciação do carácter sério do uso, se for caso disso, possa ter em conta, no decurso do período pertinente, eventuais circunstâncias posteriores a essa apresentação. Compete ao órgão jurisdicional nacional analisar se tais circunstâncias confirmam que o uso da marca, no período pertinente, apresentava carácter sério ou se, pelo contrário, traduzem uma vontade do titular de evitar a apresentação desse pedido.


Quanto às despesas

34
As despesas efectuadas pelos Governos do Reino Unido e francês, assim como pela Comissão, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),



pronunciando‑se sobre as questões submetidas pela High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division, por despacho de 19 de Dezembro de 2001, declara:

1)
Os artigos 10.°, n.° 1, e 12.°, n.° 1, da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas, devem ser interpretados no sentido de que uma marca é objecto de «uso sério» quando é utilizada, em conformidade com a sua função essencial que é garantir a identidade de origem dos produtos ou serviços para os quais foi registada, a fim de criar ou conservar um mercado para estes produtos e serviços, com exclusão de usos de carácter simbólico que tenham como único objectivo a manutenção dos direitos conferidos por essa marca. A apreciação do carácter sério do uso da marca deve assentar na totalidade dos factos e das circunstâncias adequados para provar a existência da exploração comercial da mesma no mundo dos negócios, em especial, nos usos considerados justificados no sector económico em questão para manter ou criar quotas de mercado em benefício dos produtos ou serviços protegidos pela marca, na natureza destes produtos ou serviços, nas características do mercado, na extensão e na frequência do uso da referida marca. Quando responde a uma justificação comercial real, nas condições acima referidas, um uso ainda que mínimo da marca ou que respeite apenas a um único importador no Estado‑Membro em questão pode ser suficiente para provar a existência do carácter sério na acepção dessa directiva.

2)
Embora a Primeira Directiva 89/104 subordine a qualificação de «uso sério» da marca apenas à tomada em conta de circunstâncias que ocorreram durante o período pertinente e anteriores à apresentação do pedido de caducidade, a mesma não se opõe a que a apreciação do carácter sério do uso, se for caso disso, possa ter em conta, no período pertinente, eventuais circunstâncias posteriores a essa apresentação. Compete ao órgão jurisdicional nacional analisar se tais circunstâncias confirmam que o uso da marca no período pertinente apresentava carácter sério ou se, pelo contrário, traduzem uma vontade do titular de evitar a apresentação desse pedido.

Proferido no Luxemburgo, em 27 de Janeiro de 2004.

O secretário

O presidente

R. Grass

V. Skouris


1
Língua do processo: inglês.