Language of document : ECLI:EU:C:2019:16

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

MACIEJ SZPUNAR

apresentadas em 10 de janeiro de 2019 (1)

Processo C‑516/17

Spiegel Online GmbH

contra

Volker Beck

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesgerichtshof (Supremo Tribunal Federal, Alemanha)]

«Reenvio prejudicial — Direito de autor e direitos conexos — Direitos exclusivos de reprodução e de comunicação ao público — Flexibilidade na transposição para o direito nacional — Exceção relacionada com o relato de acontecimentos de atualidade — Possibilidade razoável de requerer uma autorização antes da publicação — Referências acessíveis através de uma hiperligação junto do texto — Obra publicada sob a sua forma particular com a autorização do autor»






 Introdução

1.        Não se pode subestimar o papel desempenhado, numa sociedade democrática, pela liberdade de expressão em geral e pela liberdade dos meios de comunicação social em particular. A livre troca de opiniões e o controlo do poder pela sociedade, mecanismos em que os meios de comunicação social são intermediários essenciais, constituem a pedra angular dessa sociedade.

2.        A liberdade de expressão é reconhecida como um direito fundamental desde a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, com o seu artigo 11.o Os autores dessa declaração estavam, no entanto, conscientes de que o exercício de uma liberdade por uns é suscetível de limitar a liberdade dos outros. Por conseguinte, introduziram, no artigo 4.o, o princípio segundo o qual «o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limites senão os que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos». No que respeita à questão de saber a quem compete estabelecer as regras de arbitragem entre estas liberdades, este artigo precisa, no segundo período, que «[e]stes limites apenas podem ser determinados pela Lei».

3.        Estes princípios simples e naturais mantêm‑se atuais. A lei, expressão da vontade geral (2), visa estabelecer um equilíbrio entre os diferentes direitos fundamentais, em benefício de todos. O mesmo sucede no domínio do direito de autor, como ilustra perfeitamente o presente processo.

 Quadro jurídico

 Direito internacional

4.        O artigo 9.o, n.o 1, da Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas, assinada em Berna, em 9 de setembro de 1886 (Ato de Paris de 24 de julho de 1971), na sua versão resultante da alteração de 28 de setembro de 1979 (a seguir «Convenção de Berna»), consagra o direito dos autores de autorizar a reprodução das suas obras. O artigo 9.o, n.o 2, o artigo 10.o, n.o 1, e o artigo 10.o‑A, n.o 2, da Convenção de Berna dispõem, respetivamente:

«Fica reservada às legislações dos países da União [constituída pelos Estados signatários da Convenção de Berna] a faculdade de permitir a reprodução das referidas obras, em certos casos especiais, desde que tal reprodução não prejudique a exploração normal da obra nem cause um prejuízo injustificado aos legítimos interesses do autor.

[…]

São lícitas as citações tiradas de uma obra, já licitamente tornada acessível ao público, na condição de serem conformes aos bons costumes e na medida justificada pelo fim a atingir, incluindo as citações de artigos de jornais e recolhas periódicas sob a forma de revistas de imprensa.

[…]

Fica igualmente reservada às legislações dos países da União a regulamentação das condições em que, por ocasião dos relatos dos acontecimentos da atualidade por meio de fotografia ou de cinematografia, ou por meio de radiodifusão ou de transmissão por fio ao público, as obras literárias ou artísticas vistas ou ouvidas no decurso do acontecimento podem, na medida em que o objetivo de informação a atingir o justificar, ser reproduzidas e tornadas acessíveis ao público.»

5.        O artigo 1.o, n.o 4, do Tratado da OMPI sobre o direito de autor (3) dispõe que «[a]s partes contratantes devem observar o disposto nos artigos 1.o a 21.o da Convenção de Berna […]». Segundo a declaração comum relativamente ao n.o 4 do artigo 1.o do Tratado da OMPI sobre o direito de autor, «[o] direito de reprodução, tal como estabelecido no artigo 9.o da Convenção de Berna, bem como as exceções previstas nessa disposição, são plenamente aplicáveis ao ambiente digital, em especial no que se refere à utilização de obras sob forma digital. Considera‑se que a armazenagem de uma obra protegida sob forma digital num suporte eletrónico constitui um ato de reprodução na aceção do artigo 9.o da Convenção de Berna» (4).

 Direito da União

6.        O artigo 2.o, alínea a), da Diretiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspetos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação (5), dispõe:

«Os Estados‑Membros devem prever que o direito exclusivo de autorização ou proibição de reproduções, diretas ou indiretas, temporárias ou permanentes, por quaisquer meios e sob qualquer forma, no todo ou em parte, cabe:

a)      Aos autores, para as suas obras;

[…]»

7.        Nos termos do artigo 3.o, n.o 1, desta diretiva:

«Os Estados‑Membros devem prever a favor dos autores o direito exclusivo de autorizar ou proibir qualquer comunicação ao público das suas obras, por fio ou sem fio, incluindo a sua colocação à disposição do público por forma a torná‑las acessíveis a qualquer pessoa a partir do local e no momento por ela escolhido.»

8.        O artigo 5.o, n.o 3, alíneas c) e d), da referida diretiva dispõe:

«Os Estados‑Membros podem prever exceções ou limitações aos direitos previstos nos artigos 2.o e 3.o nos seguintes casos:

[…]

c)      Reprodução pela imprensa, comunicação ao público ou colocação à disposição de artigos publicados sobre temas de atualidade económica, política ou religiosa ou de obras radiodifundidas ou outros materiais da mesma natureza, caso tal utilização não seja expressamente reservada e desde que se indique a fonte, incluindo o nome do autor, ou utilização de obras ou outros materiais no âmbito de relatos de acontecimentos de atualidade, na medida justificada pelas necessidades de informação desde que seja indicada a fonte, incluindo o nome do autor, exceto quando tal se revele impossível;

d)      Citações para fins de crítica ou análise, desde que relacionadas com uma obra ou outro material já legalmente tornado acessível ao público, desde que, exceto quando tal se revele impossível, seja indicada a fonte, incluindo o nome do autor, e desde que sejam efetuadas de acordo com os usos e na medida justificada pelo fim a atingir;

[…]»

9.        Por último, nos termos do artigo 5.o, n.o 5, desta mesma diretiva:

«As exceções e limitações contempladas nos n.os 1, 2, 3 e 4 só se aplicarão em certos casos especiais que não entrem em conflito com uma exploração normal da obra ou outro material e não prejudiquem irrazoavelmente os legítimos interesses do titular do direito.»

 Direito alemão

10.      A Diretiva 2001/29 foi transposta para direito alemão pela Gesetz über Urheberrecht und verwandte Schutzrechte — Urheberrechtsgesetz (Lei dos direitos de autor e direitos conexos), de 9 de setembro de 1965 (a seguir «UrhG»). O § 50 da UrhG dispõe:

«Para relatar acontecimentos de atualidade através de radiodifusão ou de meios técnicos semelhantes, em jornais, revistas e outras publicações ou em qualquer outro formato, que relatem principalmente os acontecimentos do dia, bem como num filme, é lícito reproduzir, distribuir e comunicar ao público, na medida em que o objetivo a alcançar o justifique, as obras que podem ser vistas e ouvidas no decurso dos acontecimentos relatados.»

11.      Nos termos do § 51 da UrhG:

«A reprodução, a distribuição e a comunicação ao público, para fins de citação, de uma obra já publicada são lícitas na medida em que a extensão da utilização seja justificada pelo objetivo específico a alcançar. Em particular, é lícito:

1.      integrar obras individuais, após a sua publicação, numa obra científica independente a fim de explicitar o seu conteúdo;

2.      citar passagens de uma obra, após a sua publicação, numa obra literária independente;

3.      citar, numa obra musical independente, trechos pontuais de uma obra musical já publicada.»

 Matéria de facto, tramitação processual e questões prejudiciais

12.      Volker Beck, recorrente em primeira instância e recorrido em «Revision» no processo principal (a seguir «recorrido»), foi membro do Bundestag (Câmara Baixa do Parlamento Federal, Alemanha) entre 1994 e 2017. É autor de um artigo sobre questões sensíveis e controversas relacionadas com a política penal. Este artigo foi publicado, em 1988, numa coletânea de textos. Nessa publicação, o editor alterou o título do manuscrito e encurtou uma frase. O recorrido queixou‑se dessas alterações ao editor e exigiu‑lhe, sem sucesso, que mencionasse o facto através de uma nota do editor aquando da publicação da coletânea. Pelo menos desde 1993, o recorrido distanciou‑se totalmente do conteúdo desse artigo.

13.      Em 2013, o manuscrito do artigo em causa foi descoberto em arquivos e foi apresentado ao recorrido, então candidato às eleições legislativas que se iriam realizar alguns dias mais tarde. O recorrido disponibilizou o documento a várias redações de jornais como prova de que o seu manuscrito tinha sido alterado no artigo publicado na coletânea. Em contrapartida, não autorizou a publicação dos textos pelos meios de comunicação social. Todavia, o próprio publicou as duas versões do artigo no seu sítio Internet, inserindo, em cada página, a seguinte menção: «Declaro dissociar‑me desta contribuição. Volker Beck». Nas páginas do artigo publicado na coletânea figurava ainda o seguinte texto: «[A publicação] deste texto não foi autorizad[a] e o mesmo foi falseado pelo editor, alterando a redação no título e em várias partes do texto».

14.      A Spiegel Online GmbH, recorrida em primeira instância e recorrente em «Revision» no processo principal (a seguir «recorrente»), explora o portal de informação Spiegel Online na Internet. Em 20 de setembro de 2013, publicou um artigo no qual afirmou que o recorrido tinha induzido em erro o público durante anos, devido ao facto de o conteúdo essencial do seu manuscrito não ter sido alterado na edição de 1988. Além deste artigo da recorrente, as versões originais do manuscrito e do artigo do recorrido publicado na coletânea estavam disponíveis para ser descarregadas, através de hiperligações.

15.      O recorrido contestou a disponibilização dos textos completos do seu artigo no sítio Internet da recorrente, que considera constituir uma violação do seu direito de autor. O Landgericht (Tribunal Regional, Alemanha) julgou procedentes os pedidos do recorrido. Em seguida, foi negado provimento ao recurso da recorrente. Esta interpôs recurso de «Revision» para o órgão jurisdicional de reenvio.

16.      Nestas condições, o Bundesgerichtshof (Supremo Tribunal Federal, Alemanha) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      As disposições do [d]ireito da União relativas às exceções e limitações [do direito de autor previstas] no artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva [2001/29] deixam alguma margem de apreciação na sua transposição para o direito nacional?

2)      De que modo devem ser tomados em consideração os direitos fundamentais da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia [a seguir “Carta”] na determinação do âmbito das exceções ou limitações previstas no artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2001/29 ao direito exclusivo de reprodução do autor [artigo 2.o, alínea a), da Diretiva 2001/29] e de comunicação das suas obras ao público, incluindo o direito de as colocar à disposição do público (artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva [2001/29])?

3)      O direito fundamental de informação (artigo 11.o, n.o 1, segunda frase, da [Carta]) ou a liberdade de imprensa (artigo 11.o, n.o 2, da [Carta]) podem justificar exceções ou limitações ao direito exclusivo de reprodução do autor (artigo 2.o, alínea a), da Diretiva [2001/29]) e de comunicação das suas obras ao público, incluindo o direito de as colocar à disposição do público (artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva [2001/29]), para além das exceções ou limitações previstas no artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva [2001/29]?

4)      Deve considerar‑se que a colocação à disposição do público de obras protegidas pelos direitos de autor num portal na Internet de uma empresa de comunicação social não é uma informação sobre acontecimentos de atualidade [dispensada] de autorização nos termos do artigo 5.o, n.o 3, alínea c), segunda hipótese, da Diretiva 2001/29, por ser possível e exigível à empresa de comunicação social obter o consentimento do autor antes de tornar as suas obras acessíveis ao público?

5)      Há incumprimento dos requisitos de publicação para fins de citação, nos termos do artigo 5.o, n.o 3, alínea d), da Diretiva [2001/29], quando os textos das obras citados ou parte deles não são introduzidos de forma inseparável no novo texto, por exemplo, através de excertos ou de notas de rodapé, mas são colocados à disposição do público na Internet através de um link no formato de ficheiros PDF que podem ser descarregados independentemente do novo texto?

6)      Para determinar qual o momento em que uma obra foi legalmente tornada acessível ao público, para efeitos do artigo 5.o, n.o 3, alínea d), da Diretiva [2001/29], há que ter em conta o facto de essa obra na sua forma concreta já ter sido anteriormente publicada com o consentimento do seu autor?»

17.      O pedido de decisão prejudicial deu entrada no Tribunal de Justiça em 25 de agosto de 2017. Foram apresentadas observações escritas pelas partes no processo principal, pelos Governos francês, português e do Reino Unido, bem como pela Comissão Europeia. As mesmas partes, com exceção do Governo português, estiveram representadas na audiência realizada em 3 de julho de 2018.

 Análise

18.      O órgão jurisdicional de reenvio colocou seis questões prejudiciais relativas tanto à interpretação das disposições da Diretiva 2001/29 como, mais genericamente, à margem de apreciação de que dispõem os Estados‑Membros na transposição e na aplicação dessas disposições e à sua articulação com os direitos fundamentais, nomeadamente a liberdade de expressão e a liberdade dos meios de comunicação social. Nas presentes conclusões, analisarei estas diferentes questões, modificando todavia a ordem por que foram submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio. Começarei por analisar a interpretação das disposições do direito derivado e posteriormente as questões mais gerais relativas aos direitos fundamentais.

 Quanto à primeira questão prejudicial

19.      Com a sua primeira questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pretende determinar a margem de apreciação de que dispõem os Estados‑Membros ao transpor para o direito interno as disposições do direito da União relativas às exceções e limitações ao direito de autor.

20.      Esta questão é semelhante à quinta questão prejudicial submetida pelo mesmo órgão jurisdicional de reenvio no processo Pelham e o. (6). Nas minhas conclusões no referido processo, proponho que se responda que os Estados‑Membros, embora permanecendo livres na escolha dos meios, são obrigados a garantir no seu direito interno a proteção dos direitos exclusivos previstos nos artigos 2.o a 4.o da Diretiva 2001/29, só podendo estes direitos ser restringidos no âmbito da aplicação das exceções e das limitações previstas de forma exaustiva no artigo 5.o desta diretiva. Por razões de brevidade, limito‑me aqui a remeter para os argumentos dedicados a esta questão no âmbito das referidas conclusões (7).

21.      Gostaria, no entanto, de acrescentar as seguintes observações no que respeita aos argumentos apresentados pela recorrente nas suas observações no presente processo.

22.      Em primeiro lugar, a recorrente sustenta que a margem de apreciação dos Estados‑Membros na execução do direito de autor da União decorre do artigo 167.o, n.o 4, TFUE. Nos termos desta disposição, a União Europeia «[n]a sua ação ao abrigo de outras disposições dos Tratados […] terá em conta os aspetos culturais, a fim de, nomeadamente, respeitar e promover a diversidade das suas culturas». A recorrente alega que, uma vez que o direito de autor faz parte da regulamentação em matéria de cultura, os Estados‑Membros devem dispor de uma ampla margem de apreciação na sua aplicação a fim de ter em conta a diversidade das suas culturas.

23.      No entanto, o artigo 167.o TFUE é uma disposição com valor geral de orientação, que rege a ação das instituições da União em áreas relacionadas com a cultura. Este artigo é até referido expressamente, no considerando 12 da Diretiva 2001/29 (8), pelo legislador da União que, aliás, retira consequências, no meu entender, opostas às da recorrente, ou seja, de que é necessário conceder uma proteção adequada às obras protegidas pelo direito de autor. No entanto, mesmo admitindo que a publicação de artigos sobre a vida política está abrangida pelo conceito de «cultura» na aceção do artigo 167.o TFUE, esta disposição não pode ser interpretada no sentido de que permite aos Estados‑Membros derrogar às obrigações incondicionais que resultam das disposições de direito derivado da União. Qualquer outra interpretação equivaleria a negar a competência da União para harmonizar o direito dos Estados‑Membros em qualquer domínio com uma ligação com a cultura, como o direito de autor, os serviços audiovisuais, o mercado das obras de arte, etc. O mesmo se diga no que diz respeito ao argumento da recorrente segundo o qual a importância concedida pelo direito alemão à liberdade de expressão e à liberdade dos meios de comunicação social constitui uma especificidade cultural desse Estado‑Membro.

24.      Se existe portanto uma margem de apreciação dos Estados‑Membros no que respeita à aplicação da Diretiva 2001/29, esta é limitada pelas obrigações que decorrem das disposições imperativas desta diretiva.

25.      Em segundo lugar, a recorrente sustenta que a ação do recorrido no processo principal tinha por objetivo proteger não os seus direitos patrimoniais de autor, mas os seus direitos morais, ou até os seus direitos pessoais. A este respeito, basta constatar que o presente processo tem por objeto os atos de reprodução e de comunicação ao público da obra de que o recorrido é autor, realizados pela recorrente, os quais são abrangidos incontestavelmente pela Diretiva 2001/29. No que diz respeito às semelhanças entre o presente processo e o processo Funke Medien NRW (9), abordarei esta questão mais adiante, na parte relativa à articulação entre o direito de autor e os direitos fundamentais (10).

26.      Por conseguinte, os argumentos da recorrente não afetam as minhas conclusões relativas à margem de apreciação dos Estados‑Membros na aplicação da Diretiva 2001/29.

 Quanto à quarta questão prejudicial

27.      Com a sua quarta questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se a exceção de relato de acontecimentos de atualidade, contida no artigo 5.o, n.o 3, alínea c), da Diretiva 2001/29, pode ser, em direito interno, limitada aos casos em que não se podia razoavelmente exigir que o utilizador de uma obra solicitasse a autorização do seu autor. Com efeito, segundo as informações que figuram no pedido de decisão prejudicial, essa limitação da exceção resulta, em direito alemão, da jurisprudência do órgão jurisdicional de reenvio.

28.      Não me parece que esta limitação da exceção possa suscitar questões do ponto de vista da sua conformidade com a referida disposição da Diretiva 2001/29. Com efeito, a ratio legis desta exceção decorre do facto de que por vezes é extremamente difícil, ou mesmo impossível, informar sobre um acontecimento de atualidade sem reproduzir ou comunicar ao público uma obra protegida pelo direito de autor. É o que acontece, nomeadamente, em dois tipos de situações. A primeira situação é aquela em que é a própria obra em causa que é objeto do acontecimento, por exemplo quando este consiste na abertura de uma exposição de obras de arte ou num concerto. O relato de tal acontecimento e, portanto, a informação prestada ao público relativamente a este acontecimento ficariam seriamente empobrecidos se não fosse possível comunicar pelo menos excertos das obras que são o centro do evento relatado. A segunda situação é aquela em que a obra pode ser vista ou ouvida fortuitamente no decurso do acontecimento. O exemplo frequentemente dado é o da música que acompanha uma cerimónia oficial. Nestas situações, justifica‑se portanto conceder ao autor do relato o direito de reproduzir a obra e de a comunicar livremente, porquanto, tratando‑se de um acontecimento de atualidade, não seria razoável exigir, quanto mais não seja por falta de tempo, que solicitasse a autorização do autor da obra em questão. Além disso, este último poderia, no exercício do seu direito exclusivo, recusar conceder a sua autorização, o que poria em causa o direito do público de ser informado do acontecimento em questão.

29.      Todavia, como o exige expressamente o artigo 5.o, n.o 3, alínea c), da Diretiva 2001/29, a exceção de relato é aplicável «na medida justificada pelas necessidades de informação». Esta limitação é relativa, em minha opinião, não apenas à extensão da reprodução e da comunicação autorizada como também às situações em que a exceção é aplicável, a saber, a situações em que não se pode razoavelmente exigir que o autor do relato solicite a autorização do autor da obra reproduzida e comunicada no âmbito do referido relato. Por conseguinte, em minha opinião, a limitação da exceção em questão, tal como prevista no direito alemão, não só não é contrária à disposição pertinente da Diretiva 2001/29 como é inerente à natureza e ao objetivo desta exceção.

30.      Todavia, a razão pela qual essa exceção não se aplica, na minha opinião, aos casos como o do presente processo é diferente.

31.      O artigo 5.o, n.o 3, alínea c), da Diretiva 2001/29 retoma o teor do artigo 10.o‑A da Convenção de Berna (11). A segunda parte do artigo 5.o, n.o 3, alínea c), da Diretiva 2001/29 reproduz o conteúdo do artigo 10.o‑A, n.o 2, da Convenção de Berna (12). Deve, portanto, ser interpretada em conformidade com esta disposição da Convenção de Berna, dado que a União Europeia é obrigada a observar esta convenção, como o Tribunal de Justiça já teve a oportunidade de declarar (13).

32.      Ora, o artigo 10.o‑A, n.o 2, da Convenção de Berna está redigido de forma muito mais precisa do que a disposição analisada da Diretiva 2001/29.

33.      Com efeito, a disposição convencional visa unicamente os casos dos relatos de atualidade comunicados por via sonora e visual (fotografia, rádio, televisão, cinematografia). É nesses casos permitido reproduzir, na medida justificada pelas necessidades de informação, as obras vistas ou ouvidas no decurso dos acontecimentos objeto desses relatos (14).

34.      Contrariamente ao que afirma o órgão jurisdicional de reenvio, entendo que esta exceção, interpretada à luz da Convenção de Berna, não se pode aplicar a uma situação como a do processo principal. Segundo esse órgão jurisdicional, o acontecimento em causa no litígio no processo principal consiste na confrontação do recorrido com o seu manuscrito encontrado nos arquivos, bem como a sua reação a esse facto. O referido manuscrito, portanto, teria sido tornado visível no decurso deste acontecimento através da publicação que foi feita tanto pela recorrente como pelo próprio recorrido no seu sítio Internet. Não concordo com esta análise.

35.      O relato em causa no caso em apreço é apresentado sob a forma de um documento escrito, ou seja, um sistema de transcrição da língua sob a forma de símbolos gráficos. Se a perceção de um texto se faz, frequentemente, por via visual, necessita de um processo mental de descodificação desses símbolos para perceber a informação que é assim transmitida. Por conseguinte, contrariamente à informação puramente visual, não basta ver o texto: é preciso lê‑lo.

36.      O mesmo se diga no que respeita à obra reproduzida no âmbito desse relato, neste caso o artigo do recorrido. O objetivo da reprodução e da comunicação deste artigo pela recorrente não era simplesmente ilustrar as afirmações do seu relato, mas demonstrar que as duas versões do artigo em causa, a do manuscrito e a publicada na coletânea, eram, em substância, idênticas e que, por conseguinte, as afirmações do recorrido não tinham sido desvirtuadas na versão publicada na coletânea. Para efeitos dessa demonstração, não bastava que o leitor do relato visse o artigo: era necessário que o lesse, nas duas versões, caso contrário o objetivo da reprodução (15) não seria atingido. Por conseguinte, não bastava que a obra utilizada fosse vista ou ouvida no decurso do acontecimento de atualidade objeto do relato em questão. Era necessária no caso em apreço uma análise suplementar pelo leitor do referido relato. Ora, tal análise suplementar ultrapassa o âmbito da exceção de relato de acontecimentos de atualidade prevista no artigo 5.o, n.o 3, alínea c), da Diretiva 2001/29, interpretado à luz do artigo 10.o‑A, n.o 2, da Convenção de Berna.

37.      Por conseguinte, proponho que se responda à quarta questão prejudicial que o artigo 5.o, n.o 3, alínea c), da Diretiva 2001/29 deve ser interpretado no sentido de que a utilização de uma obra literária no âmbito de um relato de atualidade não está abrangida pela exceção prevista no referido artigo quando o objetivo a alcançar por essa utilização requer a leitura da totalidade ou de parte dessa obra.

38.      Antes de mais, devo sublinhar que esta interpretação não prejudica o direito do público de receber a informação contida no relato em questão. Com efeito, embora essa utilização não possa ser considerada uma utilização lícita ao abrigo da disposição supramencionada, pode ser considerada uma citação, para a qual uma exceção ao direito exclusivo do autor está prevista no artigo 5.o, n.o 3, alínea d), da Diretiva 2001/29. Esta consideração leva‑nos à quinta e sexta questões prejudiciais.

 Quanto à quinta questão prejudicial

39.      Com a sua quinta questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 5.o, n.o 3, alínea d), da Diretiva 2001/29 deve ser interpretado no sentido de que a colocação à disposição do público de uma obra protegida pelo direito de autor na Internet, no formato de ficheiros PDF através de uma hiperligação para um artigo de imprensa, mas que pode ser descarregado independentemente, é abrangida pela exceção de citação prevista nesta disposição.

40.      Com efeito, no caso em apreço, o artigo do recorrido não foi introduzido de forma indissociável no artigo publicado pela recorrente no seu sítio Internet, mas foi disponibilizado no referido sítio como ficheiro autónomo, sendo a ligação com o artigo da recorrente assegurada por hiperligações. Esta forma pouco convencional de citar está na origem das dúvidas do órgão jurisdicional de reenvio.

41.      A exceção de citação é uma das exceções mais clássicas do direito de autor (16). Durante muito tempo considerou‑se que se aplicava apenas às obras literárias (17). Nesse tipo de obras, as citações são tradicionalmente assinaladas por meios tipográficos: aspas, itálico, carateres diferentes do texto principal, notas de pé de página, etc.

42.      Atualmente, não parece estar excluído que a citação possa abranger outras categorias de obras, nomeadamente obras musicais e cinematográficas, mas também obras de artes plásticas (18). Nesses casos, os métodos de incorporação das citações na obra que cita e a respetiva identificação devem naturalmente ser adaptados.

43.      O mesmo é válido, em meu entender, no que respeita à incorporação das citações em obras literárias. As tecnologias modernas, nomeadamente a Internet, permitem associar de formas diferentes os textos entre si, por exemplo através de hiperligações. Evidentemente, um nexo estreito entre a citação e a obra que cita deve ser mantido. Dado que as arquiteturas das páginas Internet podem variar significativamente, uma análise caso a caso será provavelmente necessária. Por exemplo, a chamada técnica de framing permite inserir um conteúdo de maneira a que o utilizador da página Internet tenha a impressão de que o conteúdo se encontra diretamente nessa página, embora tecnicamente se trate de uma hiperligação. De qualquer modo, não penso que se devam excluir liminarmente as citações feitas através de hiperligações (19).

44.      Todavia, parece‑me que o problema no presente processo resulta da maneira concreta como a recorrente procedeu à reprodução e à colocação à disposição do público do artigo do recorrido. Segundo as informações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, este artigo foi publicado no sítio Internet da recorrente na íntegra, sob a forma de ficheiros PDF, consultáveis e descarregáveis independentemente do texto principal que descrevia o acontecimento em questão. As hiperligações para os ficheiros encontravam‑se não só na página onde se encontrava o texto principal mas também na página Internet principal da recorrente. Ora, parece‑me que tal disponibilização (e a reprodução que a precedeu necessariamente) ultrapassa os limites do que é permitido ao abrigo da exceção de citação.

45.      No que diz respeito à possibilidade de citar uma obra inteira, a doutrina parece dividida (20). O teor do artigo 5.o, n.o 3, alínea d), da Diretiva 2001/29 não esclarece a extensão autorizada no que respeita a uma citação. O Tribunal de Justiça parece ter admitido a citação integral de uma obra fotográfica (21), ainda que descreva a citação como uma «reprodução de extratos» de uma obra (22). Na Convenção de Berna, a formulação restritiva inicial «citações curtas» (23) foi abandonada e substituída pela exigência geral de que as citações sejam utilizadas «na medida em que o objetivo de informação a atingir o justificar». Uma redação análoga foi adotada no artigo 5.o, n.o 3, alínea d), da Diretiva 2001/29. Parece, portanto, em princípio, permitido, se o objetivo a alcançar o justificar, citar uma obra na íntegra.

46.      O aspeto sobre o qual a doutrina é, porém, unânime é que a citação não deve entrar em concorrência com a obra original, dispensando o utilizador de fazer referência a esta última (24). Com efeito, tal citação, ao substituir‑se à obra original, permitiria contornar as prerrogativas exclusivas do autor sobre a sua obra, esvaziando‑as de conteúdo. O autor da obra assim citada seria privado do essencial dos direitos que detém nessa qualidade, podendo esses direitos, no entanto, ser exercidos em seu lugar pelo autor da obra que cita através da mesma.

47.      Em minha opinião, é precisamente o que sucede na situação em que uma obra literária, género no qual o elemento essencial para a perceção da obra não é a sua forma, mas o seu conteúdo, é colocada à disposição do público num sítio Internet, em formato de ficheiro acessível e disponível de maneira independente. Formalmente, tal ficheiro pode ser apresentado como uma citação e estar ligado com o texto do autor da citação, por exemplo através de uma hiperligação. No entanto, o referido ficheiro é efetivamente explorado independentemente deste texto e pode ser utilizado de maneira autónoma pelos utilizadores do sítio Internet do autor da citação, dando‑lhes um acesso não autorizado à obra original e, ao fazê‑lo, dispensando‑os da obrigação de recorrer à mesma.

48.      Entendo, por conseguinte, que a exceção de citação é suscetível de justificar utilizações de obras de outrem de diferentes extensões e através de diferentes meios técnicos. No entanto, a combinação da extensão da utilização e dos meios técnicos utilizados pode conduzir à violação dos limites desta exceção. Nomeadamente, a exceção de citação não pode abranger situações em que, sem autorização do autor, uma obra é colocada à disposição do púbico num sítio Internet, sob a forma de ficheiros acessível e disponível de maneira autónoma.

49.      Contrariamente ao que indicou o órgão jurisdicional de reenvio no pedido de decisão prejudicial, penso que o que está aqui em causa não é a apreciação do risco real de uma exploração autónoma da obra citada, mas a definição do próprio conceito de citação (25). Ora, pelo menos no caso de obras literárias, qualquer colocação à disposição da obra na íntegra na Internet, sob a forma de ficheiro autónomo, dispensa o leitor de utilizar a obra original e ultrapassa assim os limites da referida exceção, sem que seja necessário analisar o risco real da sua exploração subsequente.

50.      Admitir uma citação suscetível de substituir a obra original seria igualmente contrário às exigências do «triplo teste» contido tanto no artigo 9.o, n.o 2, da Convenção de Berna (26) como no artigo 5.o, n.o 5, da Diretiva 2001/29, segundo o qual as exceções ao direito de autor não podem prejudicar a exploração normal da obra nem os legítimos interesses do autor, sendo estes requisitos cumulativos. Ora, uma citação que dispensa o utilizador de recorrer à obra original, substituindo‑se a esta, prejudica necessariamente a sua exploração normal.

51.      Esta conclusão não é posta em causa pela afirmação da recorrente segundo a qual o recorrido não previa uma exploração económica do artigo em causa, sendo a sua oposição à comunicação deste ao público motivada apenas pela preocupação de proteger os seus interesses pessoais. Com efeito, esta conclusão não respeita unicamente à aplicação da exceção de citação no processo principal, mas também aos limites normativos desta exceção no direito da União. Ora, esses limites são independentes da questão de saber se, num caso concreto, o autor explora ou pondera explorar a sua obra. Com efeito, basta que a utilização no contexto da exceção prejudique potencialmente essa exploração para que essa interpretação da exceção seja contrária ao triplo teste, tal como previsto no artigo 5.o, n.o 5, da Diretiva 2001/29.

52.      Por conseguinte, proponho que se responda à quinta questão prejudicial que o artigo 5.o, n.o 3, alínea d), da Diretiva 2001/29 deve ser interpretado no sentido de que a exceção de citação prevista nesta disposição não abrange as situações em que uma obra, sem autorização do autor, é colocada à disposição do público num sítio Internet, na íntegra, como ficheiro acessível e disponível, de maneira autónoma, dispensando o utilizador de recorrer à obra original.

 Quanto à sexta questão prejudicial

53.      Com a sua sexta questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, como deve ser interpretado, nas circunstâncias do presente caso, a condição constante do artigo 5.o, n.o 3, alínea d), da Diretiva 2001/29 segundo a qual a citação apenas diz respeito a uma obra já licitamente disponibilizada ao público.

54.      Uma vez que a minha proposta de resposta à quinta questão prejudicial leva a excluir a aplicação desta exceção no caso vertente, a sexta questão reveste caráter hipotético. No entanto, formularei algumas observações sobre esta questão, para a eventualidade de o Tribunal de Justiça não concordar com a minha análise relativa à quinta questão prejudicial.

55.      A exigência de que a citação respeite unicamente às obras já licitamente disponibilizadas ao público é tradicionalmente admitida em matéria de direito de autor e encontra‑se, nomeadamente, no artigo 10.o, n.o 1, da Convenção de Berna. O objetivo desta exigência é proteger os direitos morais do autor, nomeadamente o direito de divulgação, por força do qual é o autor quem decide da primeira comunicação ao público ou da colocação à disposição do público da sua obra. Esta primeira colocação à disposição do público pode ser feita com o consentimento do autor ou ao abrigo de uma licença legal. O Tribunal de Justiça parece também ter tacitamente admitido a divulgação no âmbito de uma exceção, a saber, a do artigo 5.o, n.o 3, alínea e), da Diretiva 2001/29 (27). Esta solução não me parece evidente, uma vez que as exceções previstas no artigo 5.o, n.os 1 a 3, da Diretiva 2001/29 derrogam apenas aos direitos patrimoniais dos autores e não devem, em princípio, prejudicar os seus direitos morais. Em todo o caso, esta primeira colocação à disposição do público não pode evidentemente resultar da citação propriamente dita.

56.      No que respeita ao artigo do recorrido em causa no processo principal, resulta das informações contidas no pedido de decisão prejudicial que este foi publicado numa versão na coletânea publicada em 1988 e posteriormente nas duas versões no sítio Internet do recorrido após a descoberta do manuscrito nos arquivos. Por conseguinte, parece que, no momento da sua publicação no sítio Internet da recorrente, este artigo já tinha sido licitamente disponibilizado ao público, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

57.      O único problema poderia decorrer do facto de a publicação na coletânea ter pretensamente desvirtuado o pensamento do recorrido, ao passo que a publicação no seu sítio Internet foi completada por uma distanciação deste em relação ao seu artigo, não tendo essa distanciação sido reproduzida pela recorrente. Assim, poderia tratar‑se aqui de uma violação dos direitos morais do recorrido, nomeadamente o seu direito ao respeito da obra. No entanto, uma vez que os direitos morais não estão abrangidos pelas disposições da Diretiva 2001/29, a apreciação desta questão cabe plenamente aos órgãos jurisdicionais nacionais e ao direito interno dos Estados‑Membros.

58.      Na eventualidade de o Tribunal de Justiça não concordar com a minha proposta de resposta à quinta questão prejudicial, proponho responder à sexta questão prejudicial que o artigo 5.o, n.o 3, alínea d), da Diretiva 2001/29 deve ser interpretado no sentido de que a obra objeto da citação já deve ter sido colocada à disposição do público com o consentimento do autor ou ao abrigo de uma licença legal, o que cabe aos órgãos jurisdicionais nacionais verificar.

 Quanto à segunda e terceira questões prejudiciais

59.      Resulta das respostas que proponho dar à quarta e quinta questões prejudiciais que a utilização de uma obra como a que a recorrente fez do artigo do recorrido em causa no processo principal não está abrangida pelas exceções aos direitos exclusivos do autor previstas pelo órgão jurisdicional de reenvio, concretamente as previstas no artigo 5.o, n.o 3, alíneas c) e d), da Diretiva 2001/29. O órgão jurisdicional de reenvio pretende, todavia, igualmente saber se essa utilização pode ser justificada por considerações relacionadas com o respeito dos direitos fundamentais da recorrente, nomeadamente a sua liberdade de expressão, garantida ao abrigo do artigo 11.o, n.o 1, da Carta, e a liberdade dos meios de comunicação social, mencionada no n.o 2 desse artigo. É o objeto da segunda e terceira questões prejudiciais, que me proponho analisar em conjunto.

60.      Com a segunda e terceira questões prejudiciais, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se a liberdade de expressão e a liberdade dos meios de comunicação social constituem uma limitação ou justificam uma exceção ou uma violação dos direitos exclusivos do autor de autorizar ou de proibir a reprodução e a comunicação ao público da sua obra no caso de uma publicação desta por um órgão de comunicação social no âmbito de um debate de questões de interesse geral.

61.      Estas questões são idênticas à segunda e terceira questões prejudiciais submetidas pelo mesmo órgão jurisdicional de reenvio no processo Funke Medien NRW (28) e também são, em substância, semelhantes à sexta questão prejudicial submetida pelo mesmo órgão jurisdicional no processo Pelham e o. (29).

62.      Nas minhas conclusões no processo Pelham e o., propus que se respondesse, em substância, que, dado que o direito de autor já contém limitações e exceções destinadas a conciliar os direitos exclusivos dos autores com os direitos fundamentais, nomeadamente a liberdade de expressão, normalmente há que respeitar as opções feitas pelo legislador nesta matéria. Com efeito, estas opções decorrem de uma ponderação dos direitos fundamentais dos utilizadores das obras com os direitos dos autores e outros titulares de direitos, que são igualmente protegidos, enquanto direito fundamental, a saber, o direito de propriedade, consagrado no artigo 17.o da Carta, que menciona expressamente a propriedade intelectual no seu n.o 2. Esta ponderação faz parte da margem de apreciação do legislador, devendo o juiz intervir apenas excecionalmente, em caso de violação do conteúdo essencial de um direito fundamental (30).

63.      Acrescento que a ideia, sugerida na terceira questão prejudicial, de completar, por via judicial, o direito de autor da União com exceções não previstas no artigo 5.o da Diretiva 2001/29 e motivadas por considerações atinentes à liberdade de expressão poderia, na minha opinião, pôr em causa a eficácia deste direito e da harmonização que este visa. Com efeito, tal faculdade traduzir‑se‑ia em introduzir no direito da União uma espécie de «cláusula de fair use», uma vez que praticamente cada utilização de obras que violasse o direito de autor poderia invocar, de uma forma ou outra, a liberdade de expressão (31). Assim, a proteção efetivamente concedida aos direitos dos autores dependeria da sensibilidade dos juízes de cada Estado‑Membro à liberdade de expressão, de modo que qualquer esforço de harmonização seria vão (32).

64.      Em meu entender, este raciocínio aplica‑se plenamente ao caso em apreço.

65.      Já anteriormente salientei, na introdução das presentes conclusões, a importância da liberdade de expressão e da liberdade dos meios de comunicação social numa sociedade democrática, pelo que me dispenso aqui de insistir sobre esta questão. Estas liberdades, como todos os direitos fundamentais, não são porém absolutas nem ilimitadas, como decorre claramente do artigo 52.o, n.o 1, da Carta, bem como do artigo 10.o, n.o 2, da Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950 (a seguir «CEDH»), que preveem limitações aos direitos fundamentais e as condições de aplicação dessas limitações. O direito de autor pode constituir uma dessas limitações legítimas da liberdade de expressão (33) e essa liberdade não prevalece, em princípio, sobre o direito de autor, fora das limitações e exceções que o próprio direito de autor prevê.

66.      Assim, há que responder ao argumento invocado pela recorrente, segundo o qual é decisivo, para a liberdade de expressão e para a liberdade dos meios de comunicação social, saber quem controla a informação, que quando a informação em causa consiste numa obra protegida pelo direito de autor, é o seu autor quem controla a sua divulgação e circulação, sob reserva das limitações e exceções acima mencionadas.

67.      É certo que a situação no processo principal constitui um caso específico em que o autor da obra em questão é um político, a própria obra exprime as suas opiniões sobre um assunto de interesse geral e a comunicação controvertida dessa obra ao público pela recorrente ocorreu no âmbito do debate que precedeu as eleições legislativas. Poderia, assim, colocar‑se a questão de saber se o caso em apreço não constitui uma situação análoga à do processo Funke Medien NRW (34), no qual propus que se considerasse que os direitos de autor do Estado alemão não justificavam a violação da liberdade de expressão que daí resultava.

68.      Todavia, entendo que as circunstâncias do presente caso não podem conduzir à adoção de uma solução análoga.

69.      Em primeiro lugar, a particularidade do processo Funke Medien NRW (35) deve‑se ao facto de a obra em questão consistir em relatórios militares periódicos confidenciais de caráter puramente factual (36) e de o Estado alemão, titular dos direitos de autor desses relatórios, ter decidido substituir a proteção desses documentos enquanto informações confidenciais pela proteção decorrente do direito de autor. Tratando‑se de um Estado, este não pode invocar, para apoiar o seu direito de autor, um direito fundamental, uma vez que apenas os particulares são beneficiários dos direitos fundamentais.

70.      No presente processo, o caráter de obra, na aceção do direito de autor, do artigo em questão não é posto em causa e o titular dos direitos de autor é uma pessoa singular. Ora, essa pessoa, contrariamente ao Estado, não dispõe de instrumentos como a possibilidade de classificar um documento como confidencial, restringindo assim o acesso legal ao mesmo. No caso de uma pessoa singular, o principal meio, senão mesmo o único, de proteger a sua criação intelectual é o direito de autor. Além disso, este autor, enquanto pessoa singular, beneficia do direito fundamental de propriedade e de outros direitos fundamentais, protegidos da mesma forma que a liberdade de expressão dos potenciais utilizadores da sua obra. A limitação dessa liberdade de expressão, resultante das prerrogativas exclusivas do autor em causa, é, portanto, legítima no sentido de que decorre da proteção de outro direito fundamental. Por conseguinte, há que proceder a uma ponderação destes diferentes direitos fundamentais, ponderação que, em princípio, foi feita pelo legislador no âmbito das disposições que regulam o direito de autor.

71.      Em segundo lugar, é certo que o recorrido, pelo facto de exercer uma função eletiva, está sujeito a exigências especialmente rigorosas no que respeita ao controlo da sua atividade pública, nomeadamente o controlo exercido pelos meios de comunicação social. Em certas circunstâncias, este controlo poderia eventualmente justificar a comunicação ao público do artigo do recorrido sem a sua autorização, por exemplo se este tentasse dissimular o seu conteúdo (37).

72.      No entanto, no caso em apreço, o recorrido atuou com toda a transparência, publicando ele próprio, no seu sítio Internet, as duas versões do artigo e, deste modo, permitindo a cada um formar uma opinião sobre a importância das diferenças existentes entre as duas versões. Por outro lado, essa publicação no sítio Internet do recorrido facilitou a tarefa da recorrente, que podia alcançar o seu objetivo de informação através de outros meios menos atentatórios do direito de autor, nomeadamente citando as passagens pertinentes das duas versões do artigo do recorrido ou criando uma hiperligação para o sítio Internet do recorrido.

73.      No que respeita ao argumento da recorrente segundo o qual o facto de o recorrido se ter distanciado do seu artigo, através de uma menção aposta nos dois textos publicados no seu sítio Internet, impedia a perceção objetiva do leitor, basta observar que é permitido ao autor distanciar‑se da sua obra. Não considero que esta distanciação, que mais não constitui do que uma informação complementar, tenha impedido o leitor de avaliar objetivamente as duas versões do artigo em questão. Se o leitor é suficientemente prudente para comparar as duas versões do texto, é também capaz de avaliar a sinceridade de tal distanciação.

74.      Também não estou convencido pelo argumento da recorrente segundo o qual uma hiperligação para o sítio Internet do recorrido não seria suficiente por essa hiperligação ser necessariamente dependente do conteúdo da página. Uma vez que, por outro lado, a recorrente estava na posse do artigo do recorrido, poderia perfeitamente ter reagido na eventualidade de este suprimir o artigo em questão do seu sítio. Do ponto de vista da liberdade de expressão, a situação seria então diferente. No entanto, tal não era o caso.

75.      Por último, em terceiro lugar, a minha conclusão não é posta em causa pelo argumento da recorrente segundo o qual o recorrido, ao invocar os seus direitos de reprodução e de comunicação ao público do seu artigo, tinha, na realidade, por objetivo, não defender as suas prerrogativas patrimoniais de autor, mas proteger os seus direitos pessoais, incluindo os que não resultam da sua qualidade de autor do referido artigo. Ora, estes direitos pessoais não são abrangidos pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2001/29 nem pelo do direito da União em geral.

76.      Na medida em que a recorrente pretende invocar uma exceção aos direitos de autor, é de salientar, por um lado, que o gozo desses direitos não está condicionado por uma exploração efetiva da obra pelo seu autor. O direito de autor, nomeadamente os direitos patrimoniais do autor, garante ao autor não somente a exploração da sua obra sem entraves mas igualmente a proteção contra a exploração desta por terceiros, se essa exploração não for autorizada pelo autor. Ora, ao colocar à disposição do público o artigo do recorrido no seu sítio Internet, a recorrente efetuou um ato de exploração deste artigo na aceção do direito de autor.

77.      Por outro lado, os direitos morais de autor, embora permaneçam fora do âmbito da harmonização realizada pela Diretiva 2001/29 (38), devem ser tomados em consideração na interpretação das disposições desta diretiva, sempre que a aplicação dessas medidas possa afetar esses direitos. A Diretiva 2001/29 procede apenas a uma harmonização parcial do direito de autor. Isto significa que não se aplica nem fora de contexto nem diretamente, o que resulta da própria natureza de uma diretiva. As suas disposições devem ser transpostas para o direito interno dos Estados‑Membros, onde interagem com outras disposições deste direito, designadamente as que regem os direitos morais do autor. Assim, a interpretação de uma exceção a um direito patrimonial de autor não pode ignorar os seus direitos morais admitindo uma utilização livre da obra pelo simples facto de o autor em causa não ponderar qualquer exploração económica desta obra, mas procurar unicamente defender os seus direitos morais.

78.      Em seguida, se o argumento da recorrente for de compreender no sentido de que, na falta de exploração económica da obra, o direito de autor do recorrido, que é a emanação do seu direito de propriedade, protegido pelo artigo 17.o da Carta, não justifica a limitação da liberdade de expressão que daí resulta, observo que a situação no presente processo não é semelhante à do processo Funke Medien NRW, no qual propus um raciocínio análogo (39), pelas razões desenvolvidas nos n.os 69 e 70 das presentes conclusões.

79.      Além disso, na ponderação dos direitos fundamentais das partes no litígio no processo principal, há que ter em conta não só o direito de propriedade do recorrido mas igualmente os seus outros direitos fundamentais que podem eventualmente entrar em jogo. O acontecimento que está na origem do litígio no processo principal é a confrontação do recorrido com as convicções que tinha exprimido no passado na obra em causa. Através do seu recurso, o recorrido tinha como objetivo preservar o seu monopólio no que respeita à comunicação dessa obra ao público, a fim de poder complementar essa comunicação com a menção segundo a qual se distanciava das convicções expressas nesta obra. Ora, a Carta, no seu artigo 10.o, consagra a liberdade de pensamento que, segundo a redação expressa desta disposição, «implica a liberdade de mudar […] de convicção» (40). Não vejo razão para não conceder esse direito aos políticos. Assim, como poderia o recorrido efetivamente exercer a sua liberdade de mudar de convicções pessoais se o artigo com as suas convicções anteriores pudesse ser livremente publicado sob o seu nome e sem a menção de distanciação, sugerindo assim ao público que se trata das suas convicções atuais?

80.      O recorrido pode, portanto, proteger os seus direitos decorrentes da Carta (41) através dos instrumentos jurídicos de que dispõe, neste caso o direito de autor. Se o fizer dentro dos limites da lei, não há qualquer abuso e a limitação daí decorrente à liberdade de expressão da recorrente não pode ser considerada injustificada.

81.      Por conseguinte, proponho que se responda à segunda e terceira questões prejudiciais que a liberdade de expressão e a liberdade dos meios de comunicação social não constituem uma limitação e não justificam uma exceção ou uma violação dos direitos exclusivos do autor de autorizar ou de proibir a reprodução e a comunicação ao público da sua obra fora das limitações e exceções previstas no artigo 5.o, n.os 2 e 3, da Diretiva 2001/29. Assim acontece também na situação em que o autor da obra em questão exerce uma função pública e em que a obra revela as suas convicções sobre questões de interesse geral, na medida em que essa obra já tenha sido posta à disposição do público.

 Conclusão

82.      Tendo em conta o conjunto das considerações precedentes, proponho ao Tribunal de Justiça que dê as seguintes respostas às questões prejudiciais submetidas pelo Bundesgerichtshof (Supremo Tribunal Federal, Alemanha):

1)      Os Estados‑Membros são obrigados a garantir no seu direito interno a proteção dos direitos exclusivos previstos nos artigos 2.o a 4.o da Diretiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspetos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação, só podendo estes direitos ser restringidos no âmbito da aplicação das exceções e das limitações previstas de forma exaustiva no artigo 5.o desta diretiva. No entanto, os Estados‑Membros continuam a ser livres na escolha dos meios que considerem oportuno aplicar para dar cumprimento a esta obrigação.

2)      O artigo 5.o, n.o 3, alínea c), da Diretiva 2001/29 deve ser interpretado no sentido de que a utilização de uma obra literária no âmbito de um relato de atualidade não está abrangida pela exceção prevista no referido artigo quando o objetivo a alcançar por essa utilização requer a leitura da totalidade ou de parte dessa obra.

3)      O artigo 5.o, n.o 3, alínea d), da Diretiva 2001/29 deve ser interpretado no sentido de que a exceção de citação prevista nesta disposição não abrange as situações em que uma obra, sem autorização do autor, é colocada à disposição do público num sítio Internet, na íntegra, como ficheiro acessível e disponível, de maneira autónoma, dispensando o utilizador de recorrer à obra original.

4)      A liberdade de expressão e a liberdade dos meios de comunicação social, consagradas no artigo 11.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, não constituem uma limitação e não justificam uma exceção ou uma violação dos direitos exclusivos do autor de autorizar ou de proibir a reprodução e a comunicação ao público da sua obra fora das limitações e exceções previstas no artigo 5.o, n.os 2 e 3, da Diretiva 2001/29. Assim acontece também na situação em que o autor da obra em questão exerce uma função pública e em que a obra revela as suas convicções sobre questões de interesse geral, na medida em que essa obra já tenha sido posta à disposição do público.


1      Língua original: francês.


2      Isto é também um contributo da Declaração de 1789, artigo 6.o


3      Tratado da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI) sobre o direito de autor, adotado em Genebra, em 20 de dezembro de 1996, e que entrou em vigor em 6 de março de 2002 (a seguir «Tratado da OMPI sobre o direito de autor»), da qual a União Europeia é parte de acordo com a Decisão 2000/278/CE do Conselho, de 16 de março de 2000, relativa à aprovação, em nome da Comunidade Europeia, do Tratado da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI) sobre direito de autor e do Tratado da OMPI sobre prestações e fonogramas (JO 2000, L 89, p. 6).


4      Declaração da conferência diplomática que adotou o Tratado da OMPI sobre o direito de autor, anexa a este tratado (artigo 25.o do referido tratado).


5      JO 2001, L 167, p. 10.


6      C‑476/17, atualmente pendente no Tribunal de Justiça.


7      V. minhas Conclusões no processo Pelham e o. (C‑476/17, EU:C:2018:1002, n.os 71 a 79).


8      Mais precisamente a disposição que a precedeu, a saber, o artigo 151.o CE.


9      C‑469/17, atualmente pendente no Tribunal de Justiça.


10      V., em especial, n.os 69 e 70 das presentes conclusões.


11      Resulta implicitamente da exposição de motivos da proposta da Diretiva 2001/29 apresentada pela Comissão em 21 de janeiro de 1998 [COM(97) 628 final] que era essa a vontade do legislador. Nessa exposição é sublinhado, nomeadamente, que a Convenção de Berna garante aos autores o direito de reprodução; que, de acordo com a declaração comum relacionada com o n.o 4 do artigo 1.o do Tratado da OMPI sobre o direito de autor, este direito se aplica plenamente no ambiente digital, e que as exceções e limitações ao referido direito de reprodução devem ser compatíveis com o nível de proteção estabelecido por esta convenção (v. exposição de motivos da proposta da Comissão, pp. 14 e 15). V., igualmente, considerando 44, primeira frase, da Diretiva 2001/29.


12      A primeira parte do artigo 5.o, n.o 3, alínea c), da Diretiva 2001/29 retoma o artigo 10.o‑A, n.o 1, da Convenção de Berna, que é relativo à reprodução dos artigos de atualidade e das emissões da mesma natureza. Esta exceção não está em causa no presente processo.


13      V., mais recentemente, Acórdão de 13 de novembro de 2018, Levola Hengelo (C‑310/17, EU:C:2018:899, n.o 38).


14      Esta clarificação, segundo a qual deve tratar‑se de obras vistas ou ouvidas no decurso do acontecimento, também se encontra no § 50 da UrhG, que introduz a exceção dos relatos de atualidade no direito alemão.


15      Ou seja, o objetivo de informação a atingir, na redação do artigo 5.o, n.o 3, alínea c), da Diretiva 2001/29 e do artigo 10.o‑A, n.o 2, da Convenção de Berna.


16      Já em 1812, Charles Nodier observava em Questions de littérature légale que, «de todos os empréstimos que se podem tomar de um autor, não existe certamente nenhum mais desculpável do que a citação». Cito segundo Pollaud‑Dulian, F., Le droit d’auteur, Paris, Economica, 2014, p. 852).


17      O artigo 10.o da Convenção de Berna, na sua versão resultante do Ato de Bruxelas de 1948, dispunha: «Em todos os países da União são lícitas as citações curtas de artigos de jornais e de coleções periódicas, ainda que revistam a forma de resumo de Imprensa.»


18      O Tribunal de Justiça parece tê‑lo admitido tacitamente no que diz respeito a uma obra fotográfica (v. Acórdão de 1 de dezembro de 2011, Painer, C‑145/10, EU:C:2011:798, n.os 122 e 123).


19      Naturalmente, estou a falar aqui de ligações a conteúdos colocados à disposição pela pessoa que invoca a exceção de citação. As ligações para os sítios Internet de outrem nos quais objetos protegidos pelo direito de autor são licitamente disponibilizados não constituem atos de reprodução ou de comunicação ao público e não exigem, portanto, uma derrogação aos direitos exclusivos (v. Acórdão de 13 de fevereiro de 2014, Svensson e o., C‑466/12, EU:C:2014:76, dispositivo).


20      V., como exemplo, designadamente, Barta, J., Markiewicz, R., Prawo autorskie, Wolters Kluwer, Varsóvia, 2016, pp. 236 e 237; Pollaud‑Dulian, F., Le Droit d’auteur, Economica, Paris, 2014, p. 855; bem como Stanisławska‑Kloc, S., «Zasady wykorzystywania cudzych utworów: prawo autorskie i dobre obyczaje (etyka cytatu)», Diametros, n.o 19/2009, pp. 160 a 184, e em especial p. 168.


21      Acórdão de 1 de dezembro de 2011, Painer (C‑145/10, EU:C:2011:798, n.os 122 e 123). V., também, Conclusões da advogada‑geral V. Trstenjak nesse processo (C‑145/10, EU:C:2011:239, n.o 212).


22      Acórdão de 1 de dezembro de 2011, Painer (C‑145/10, EU:C:2011:798, n.o 135).


23      V. nota 17 das presentes conclusões.


24      V., designadamente, Barta, J., Markiewicz, R., Prawo autorskie, Wolters Kluwer, Varsóvia, 2016, p. 239; Pollaud‑Dulian, F., Le Droit d’auteur, Economica, Paris, 2014, p. 851; Preussner‑Zamorska, J., Marcinkowska, J., in Barta, J. (ed.), Prawo autorskie, C.H.Beck, Varsóvia, 2013, p. 565; bem como Vivant, M., Bruguière, J.‑M., Droit d’auteur et droits voisins, Dalloz, Paris, 2016, p. 572.


25      Este conceito deve ser interpretado como um conceito autónomo do direito da União (v., neste sentido, Acórdão de 3 de setembro de 2014, Deckmyn e Vrijheidsfonds C‑201/13, EU:C:2014:2132, n.os 14 a 17).


26      E retomado no artigo 10.o do Tratado da OMPI sobre o direito de autor.


27      Utilização para efeitos de segurança pública ou para assegurar o bom desenrolar de processos administrativos, parlamentares ou judiciais. V. Acórdão de 1 de dezembro de 2011, Painer (C‑145/10, EU:C:2011:798, n.os 143 e 144).


28      C‑469/17, atualmente pendente no Tribunal de Justiça.


29      C‑476/17, atualmente pendente no Tribunal de Justiça. É verdade que este processo diz respeito à liberdade das artes, consagrada no artigo 13.o da Carta. Esta liberdade mais não é, porém, do que uma encarnação da liberdade de expressão.


30      V. minhas Conclusões no processo Pelham e o. (C‑476/17, EU:C:2018:1002, n.os 90 a 99).


31      Segundo o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, é abrangida pela liberdade de expressão, por exemplo, a partilha de ficheiros no âmbito das redes peertopeer (v. TEDH, 19 de fevereiro de 2013, Neij e Sunde Kolmisoppi c. Suécia, CE:ECHR:2013:0219DEC004039712).


32      A expressão é de A. Lucas in Lucas, A., Ginsburg, J. C., «Droit d’auteur, liberté d’expression et libre accès à l’information (étude comparée de droit américain et européen)», Revue internationale du droit d’auteur, vol. 249 (2016), pp. 4 a 153, na p. 25.


33      V. TEDH, 10 de janeiro de 2013, Ashby Donald e o. c. França (CE:ECHR:2013:0110JUD003676908, § 36).


34      C‑469/17, atualmente pendente no Tribunal de Justiça.


35      C‑469/17, atualmente pendente no Tribunal de Justiça.


36      Não foi demonstrado que beneficiavam da proteção conferida pelo direito de autor (v. minhas Conclusões no processo Funke Medien NRW, C‑469/17, EU:C:2018:870, n.o 20).


37      É muitas vezes dado como exemplo de uma situação em que as necessidades do debate público devem prevalecer sobre o direito de autor a decisão do Gerechtshof Den Haag (Tribunal de Recurso de Haia, Países Baixos), de 4 de setembro de 2003, no processo relativo à publicação dos documentos da Igreja de Cientologia (NL:GHSGR:2003:AI5638) (v. comentários sobre este acórdão de Vivant, M., Propriétés intellectuelles, n.o 12, p. 834).


38      V. considerando 19 da Diretiva 2001/29.


39      V. minhas Conclusões no processo Funke Medien NRW (C‑469/17, EU:C:2018:870, n.os 58 a 61).


40      O mesmo direito é reproduzido no artigo 9.o, n.o 1, da CEDH, cujo teor é, em substância, idêntico ao do artigo 10.o, n.o 1, da Carta.


41      Deixo aqui de lado o debate sobre a questão de saber se o anúncio público de mudança das convicções ainda se enquadra no âmbito de aplicação do artigo 10.o da Carta, ou no do seu artigo 11.o