Language of document : ECLI:EU:C:2024:8

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

11 de janeiro de 2024 (*)

«Reenvio prejudicial — Propriedade intelectual e industrial — Medicamento para uso humano — Certificado complementar de proteção (CCP) — Diretiva 2004/48/CE — Artigo 9.o, n.o 7 — Colocação no mercado de produtos em violação dos direitos conferidos por um CCP — Medidas provisórias ordenadas com base num CCP — Nulidade posterior do CCP e revogação das medidas — Consequências — Direito a uma indemnização adequada em reparação do dano causado pelas medidas provisórias — Responsabilidade do requerente das referidas medidas pelo dano causado pelas mesmas — Legislação nacional que prevê uma responsabilidade objetiva»

No processo C‑473/22,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo markkinaoikeus (Tribunal dos Assuntos Económicos, Finlândia), por Decisão de 14 de julho de 2022, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 14 de julho de 2022, no processo

Mylan AB

contra

Gilead Sciences Finland Oy,

Gilead Biopharmaceutics Ireland UC,

Gilead Sciences Inc.,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: K. Jürimäe (relatora), presidente de secção, N. Piçarra, M. Safjan, N. Jääskinen e M. Gavalec, juízes,

advogado‑geral: M. Szpunar,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da Mylan AB, por A. Jäälinoja e B. Rapinoja, asianajajat,

–        em representação da Gilead Sciences Finland Oy, Gilead Biopharmaceutics Ireland UC e Gilead Sciences Inc., por R. Hilli e M. Segercrantz, asianajajat,

–        em representação do Governo Finlandês, por M. Pere, na qualidade de agente,

–        em representação do Governo Neerlandês, por M. K. Bulterman e J. M. Hoogveld, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão Europeia, por S. L. Kalėda, P.‑J. Loewenthal, J. Ringborg, J. Samnadda e I. Söderlund, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 21 de setembro de 2023,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 9.o, n.o 7, da Diretiva 2004/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativa ao respeito dos direitos de propriedade intelectual (JO 2004, L 157, p. 45, e retificação no JO 2004, L 195, p. 16).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Mylan AB à Gilead Sciences Finland Oy, à Gilead Biopharmaceutics Ireland UC e à Gilead Sciences Inc. (a seguir, em conjunto, «Gilead e o.») a respeito da indemnização dos danos sofridos pela Mylan como consequência de uma medida provisória adotada contra ela a pedido da Gilead e o. que foi posteriormente revogada.

 Quadro jurídico

 Direito internacional

3        O primeiro parágrafo do preâmbulo do Acordo sobre os Aspetos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados com o Comércio (a seguir «Acordo TRIPS»), que constitui o Anexo 1C do Acordo que institui a Organização Mundial do Comércio (OMC), assinado em Marraquexe, em 15 de abril de 1994, e aprovado pela Decisão 94/800/CE do Conselho, de 22 de dezembro de 1994, relativa à celebração, em nome da Comunidade Europeia, dos acordos resultantes das negociações multilaterais do Uruguay Round (1986/1994) (JO 1994, L 336, p. 1), tem a seguinte redação:

«Desejosos de reduzir as distorções e os entraves ao comércio internacional e tendo em conta a necessidade de promover uma proteção eficaz e adequada dos direitos de propriedade intelectual e de garantir que as medidas e processos destinados a assegurar a aplicação efetiva dos direitos de propriedade intelectual não constituam eles próprios obstáculos ao comércio legítimo.»

4        O artigo 1.o do Acordo TRIPS, sob a epígrafe «Natureza e âmbito das obrigações», estipula, no seu n.o 1:

«Os Membros implementarão as disposições do presente Acordo. Os Membros podem, embora a tal não sejam obrigados, prever na sua legislação uma proteção mais vasta do que a prescrita no presente Acordo, desde que essa proteção não seja contrária às disposições do presente Acordo. Os Membros determinarão livremente o método adequado para a execução das disposições no presente Acordo, no quadro dos respetivos sistemas e práticas jurídicas.»

5        O artigo 50.o desse acordo, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação», prevê, no seu n.o 7:

«No caso de as medidas provisórias serem revogadas ou caducarem devido a qualquer ato ou omissão do requerente, ou no caso de se verificar ulteriormente que não existiu qualquer infração ou ameaça de infração de um direito de propriedade intelectual, as autoridades judiciais serão habilitadas a ordenar ao requerente, a pedido do requerido, que conceda a este último uma compensação adequada pelos prejuízos causados por essas medidas.»

 Direito da União

6        Os considerandos 4, 5, 7, 8, 10 e 22 da Diretiva 2004/48 enunciam:

«(4)      No plano internacional, todos os Estados‑Membros, bem como a própria Comunidade [Europeia], no que diz respeito às questões da sua competência, estão ligados pelo [Acordo TRIPS].

(5)      O Acordo TRIPS contém, nomeadamente, disposições relativas aos meios para fazer respeitar os direitos de propriedade intelectual, que constituem normas comuns aplicáveis no plano internacional e implementadas em todos os Estados‑Membros. A presente diretiva não afeta as obrigações internacionais dos Estados‑Membros, incluindo as decorrentes do Acordo TRIPS.

[…]

(7)      Conclui‑se das consultas efetuadas pela Comissão [Europeia] relativamente a esta questão que, apesar das disposições do Acordo TRIPS, ainda existem, nos Estados‑Membros, disparidades importantes em relação aos meios para fazer respeitar os direitos de propriedade intelectual. Assim, as regras de aplicação das medidas provisórias que são utilizadas, designadamente, para preservar os elementos de prova, o cálculo das indemnizações por perdas e danos, ou ainda as normas de aplicação das ações inibitórias da violação de direitos de propriedade intelectual variam significativamente de um Estado‑Membro para outro. […]

(8)      As disparidades existentes entre os regimes dos Estados‑Membros no que diz respeito aos meios para fazer respeitar os direitos de propriedade intelectual são prejudiciais ao bom funcionamento do mercado interno e não permitem assegurar que os direitos de propriedade intelectual beneficiem de um nível de proteção equivalente em todo o território da Comunidade. […]

[…]

(10)      O objetivo da presente diretiva é aproximar [as legislações dos Estados‑Membros] a fim de assegurar um nível elevado de proteção da propriedade intelectual equivalente e homogéneo no mercado interno.

[…]

(22)      É igualmente indispensável prever medidas provisórias que permitam a cessação imediata da violação sem aguardar uma decisão relativa ao mérito, respeitando os direitos da defesa, velando pela proporcionalidade das medidas provisórias em função das especificidades de cada caso em apreço e acautelando as garantias necessárias para cobrir os danos e perdas causados ao requerido por uma pretensão injustificada. Estas medidas justificam‑se, designadamente, sempre que esteja devidamente estabelecido que qualquer atraso pode implicar um prejuízo irreparável ao titular do direito.»

7        Nos termos do artigo 1.o desta diretiva:

«A presente diretiva estabelece as medidas, procedimentos e recursos necessários para assegurar o respeito pelos direitos de propriedade intelectual. Para efeitos da presente diretiva, a expressão “direitos de propriedade intelectual” engloba os direitos da propriedade industrial.»

8        O artigo 2.o da referida diretiva, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação», dispõe, no seu n.o 3:

«A presente diretiva não prejudica:

[…]

b)      As obrigações decorrentes das convenções internacionais, designadamente do [Acordo TRIPS], incluindo as que se relacionem com os processos e as sanções penais;

[…]»

9        O capítulo II da Diretiva 2004/48, sob a epígrafe «Medidas, procedimentos e recursos», inclui os artigos 3.o a 15.o desta diretiva. O artigo 3.o desta diretiva, sob a epígrafe «Obrigação geral», prevê:

«1.      Os Estados‑Membros devem estabelecer as medidas, procedimentos e recursos necessários para assegurar o respeito pelos direitos de propriedade intelectual abrangidos pela presente diretiva. Essas medidas, procedimentos e recursos devem ser justos e equitativos, não devendo ser desnecessariamente complexos ou onerosos, comportar prazos que não sejam razoáveis ou implicar atrasos injustificados.

2.      As medidas, procedimentos e recursos também devem ser eficazes, proporcionados e dissuasivos e aplicados de forma a evitar que se criem obstáculos ao comércio lícito e a prever salvaguardas contra os abusos.»

10      O artigo 7.o da referida diretiva, sob a epígrafe «Medidas de preservação da prova», tem a seguinte redação:

«1.      Antes de se intentar uma ação relativa ao mérito da causa, os Estados‑Membros devem garantir que as autoridades judiciais competentes possam, a pedido de uma parte que tenha apresentado provas razoavelmente disponíveis para fundamentar as alegações de que o seu direito de propriedade intelectual foi ou está prestes a ser violado, ordenar medidas provisórias prontas e eficazes para preservar provas relevantes da alegada violação, desde que a proteção das informações confidenciais seja salvaguardada. Essas medidas podem incluir, a descrição pormenorizada, com ou sem recolha de amostras, a apreensão efetiva dos bens litigiosos e, sempre que adequado, dos materiais e instrumentos utilizados na produção e/ou distribuição desses bens e dos documentos a eles referentes. Essas medidas devem ser tomadas, se necessário, sem ouvir a outra parte, sobretudo sempre que um eventual atraso possa causar danos irreparáveis ao titular do direito ou quando exista um risco demonstrável de destruição da prova.

[…]

4.      Nos casos em que as medidas de preservação da prova tenham sido revogadas ou deixem de produzir efeitos por força de qualquer ação ou omissão do requerente, bem como nos casos em que se venha a verificar posteriormente não ter havido violação ou ameaça de violação de um direito de propriedade intelectual, as autoridades judiciais deverão ter competência para ordenar ao requerente, a pedido do requerido, que pague a este último uma indemnização adequada para reparar qualquer dano causado por essas medidas.

[…]»

11      O artigo 9.o da mesma diretiva, sob a epígrafe «Medidas provisórias e cautelares», dispõe:

«1.      Os Estados‑Membros devem garantir que as autoridades judiciais competentes possam, a pedido do requerente:

a)      Decretar contra o infrator presumível uma medida inibitória de qualquer violação iminente de direitos de propriedade intelectual ou de proibição, a título provisório e eventualmente sujeita a quaisquer sanções pecuniárias compulsivas previstas na legislação nacional, da continuação da alegada violação dos referidos direitos, ou fazer depender essa continuação da constituição de garantias destinadas a assegurar a indemnização do titular; pode igualmente ser decretada uma medida inibitória, nas mesmas condições, contra qualquer intermediário cujos serviços estejam a ser utilizados por um terceiro para violar direitos de propriedade intelectual; as medidas inibitórias contra intermediários cujos serviços estejam a ser utilizados por terceiros para violar direitos de autor ou direitos conexos são abrangidas pela [Diretiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspetos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação (JO 2001, L 167, p. 10)];

b)      Ordenar a apreensão ou a entrega dos bens que se suspeite violarem direitos de propriedade intelectual, a fim de impedir a sua entrada ou circulação nos circuitos comerciais.

2.      Em caso de infrações à escala comercial, os Estados‑Membros devem assegurar que, se a parte lesada provar a existência de circunstâncias suscetíveis de comprometer a cobrança de indemnizações por perdas e danos, as autoridades judiciais competentes possam ordenar a apreensão preventiva dos bens móveis e imóveis do alegado infrator, incluindo o congelamento das suas contas bancárias e outros bens. Para o efeito, as autoridades competentes podem ordenar a comunicação de documentos bancários, financeiros ou comerciais, ou o devido acesso às informações pertinentes.

3.      Relativamente às medidas a que se referem os n.os 1 e 2, as autoridades judiciais devem ter competência para exigir que o requerente forneça todos os elementos de prova razoavelmente disponíveis, a fim de adquirirem, com suficiente certeza, a convicção de que o requerente é o titular do direito em causa e de que este último é objeto de uma violação atual ou iminente.

4.      Os Estados‑Membros devem garantir que as medidas provisórias referidas nos n.os 1 e 2 possam, sempre que adequado, ser adotadas sem audição da parte contrária, em particular quando qualquer atraso possa prejudicar de forma irreparável o titular do direito. Nesse caso, as partes devem ser informadas do facto imediatamente após a execução das medidas.

A pedido do requerido, deve proceder‑se a uma revisão, incluindo o direito de ser ouvido, a fim de decidir, num prazo razoável após a notificação das medidas, se estas devem ser alteradas, revogadas ou confirmadas.

5.      Os Estados‑Membros devem assegurar que as medidas provisórias a que se referem os n.os 1 e 2 sejam revogadas ou deixem de produzir efeitos, a pedido do requerido, se o requerente não intentar uma ação relativa ao mérito junto da autoridade judicial competente, num prazo razoável a determinar pela autoridade judicial que ordenar essas medidas, e desde que a legislação do Estado‑Membro o permita ou, na falta dessa determinação, num prazo não superior a vinte dias úteis ou a trinta e um dias de calendário, consoante o que for mais longo.

6.      As autoridades judiciais competentes podem sujeitar as medidas provisórias a que se referem os n.os 1 e 2, à constituição, pelo requerente, de garantias ou de outras cauções equivalentes adequadas, destinadas a assegurar a eventual indemnização do prejuízo sofrido pelo requerido, tal como previsto no n.o 7.

7.      Quando as medidas provisórias tenham sido revogadas ou deixem de produzir efeitos por força de qualquer ato ou omissão do requerente, bem como nos casos em que se venha a verificar posteriormente não ter havido violação ou ameaça de violação de um direito de propriedade intelectual, as autoridades judiciais deverão ter competência para ordenar ao requerente, a pedido do requerido, que pague a este último uma indemnização adequada para reparar qualquer dano causado por essas medidas.»

 Direito finlandês

12      Do artigo 11.o, Capítulo 7, do oikeudenkäymiskaari (Código de Processo Civil) resulta que, quando uma medida provisória tiver sido desnecessariamente decretada, a requerimento de uma parte, esta deve indemnizar a parte contrária pelos danos causados por esta medida e pela sua execução, incluindo as despesas em que essa parte tiver incorrido.

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

13      Em 3 de dezembro de 2009, o Patentti — ja rekisterihallitus (Instituto de Patentes e Registos, Finlândia) concedeu à Gilead e o., com base na patente europeia n.o EP 0 915 894, que designa a República da Finlândia, o certificado complementar de proteção n.o 266 «Tenofovir disoproxil (TD) e os sais, hidratos, tautómeros e solventes em combinação com a emtricitabina» (a seguir, «CCP controvertido»), para um medicamento antirretroviral indicado para o tratamento das pessoas infetadas pelo VIH.

14      Na primavera de 2017, a Mylan apresentou propostas em concursos públicos de dois distritos sanitários finlandeses com vista a poder fornecer o seu medicamento genérico «EMTRICITABINE/TENOFOVIR DISOPROXIL MYLAN 200 mg/245 mg, comprimidos revestidos por película» (a seguir «medicamento genérico controvertido»), tendo ganhado os dois concursos.

15      A patente europeia n.o EP 0 915 894 caducou em 25 de julho de 2017.

16      Em 15 de setembro de 2017, a Gilead e o. intentou uma ação no markkinaoikeus (Tribunal dos Assuntos Económicos, Finlândia) contra a Mylan por contrafação do CCP controvertido. A Gilead e o. apresentou também um pedido de medidas provisórias contra a Mylan. Esta última sociedade contestou a ação por contrafação e o pedido de medidas provisórias. Em 30 de novembro de 2017, intentou também uma ação de declaração de nulidade do CCP controvertido nesse órgão jurisdicional.

17      Por Decisão de 21 de dezembro de 2017, o markkinaoikeus (Tribunal dos Assuntos Económicos) deferiu o pedido da Gilead e o. destinado a que fossem decretadas medidas provisórias com base no CCP controvertido e proibiu a Mylan, sob pena de uma coima de 500 000 euros, de oferecer, colocar no mercado e utilizar o medicamento genérico controvertido durante o período de validade do CCP controvertido, bem como de o importar, fabricar e deter para esses fins. Além disso, ordenou ainda que esta medida fosse mantida em vigor até ser proferida uma decisão no processo principal ou serem tomadas providências em sentido contrário no âmbito do processo.

18      As medidas provisórias acima referidas foram posteriormente revogadas, a pedido da Mylan, por decisão do Korkein oikeus (Supremo Tribunal, Finlândia) de 11 de abril de 2019.

19      Por Sentença de 25 de setembro de 2019, o markkinaoikeus (Tribunal dos Assuntos Económicos) anulou o CCP controvertido. Esta sentença foi objeto de recurso para o Korkein oikeus (Supremo Tribunal) que, por Despacho de 13 de novembro de 2020, não admitiu o recurso apresentado pela Gilead e o., tendo essa sentença transitado em julgado.

20      Ao abrigo do § 11, do capítulo 7, do Código de Processo Civil, que transpõe o artigo 9.o, n.o 7, da Diretiva 2004/48 para o direito finlandês, a Mylan requereu ao markkinaoikeus (Tribunal dos Assuntos Económicos), órgão jurisdicional de reenvio no presente processo, a condenação da Gilead e o. no pagamento de uma indemnização de 2 367 854,99 euros, acrescida de juros de mora, pelos danos causados pelas medidas provisórias desnecessariamente obtidas com base no CCP controvertido, que foi posteriormente declarado nulo.

21      Segundo a Mylan, da interpretação deste artigo 9.o, n.o 7, levada a cabo pelo Tribunal de Justiça no Acórdão de 12 de setembro de 2019, Bayer Pharma (C‑688/17, a seguir «Acórdão Bayer Pharma», EU:C:2019:722), não é possível concluir que esta diretiva se opõe à aplicação do princípio da responsabilidade objetiva previsto no direito finlandês. Pelo contrário, a Gilead e o. alegam que o Acórdão Bayer Pharma interpretou esta disposição no sentido de que a mesma se opõe à imposição de uma obrigação de indemnização pelo simples facto de o CCP controvertido, cuja violação justificou a adoção do despacho de medidas provisórias, ter sido posteriormente declarado nulo.

22      O órgão jurisdicional de reenvio observa que, segundo a jurisprudência finlandesa, o § 11, do capítulo 7 do Código de Processo Civil, prevê uma responsabilidade pelo risco, ou seja, uma responsabilidade objetiva. Daqui resulta que quem tiver solicitado uma medida provisória deverá pagar uma indemnização se o direito de propriedade intelectual com base no qual a medida provisória foi concedida vier a ser declarado nulo.

23      O órgão jurisdicional de reenvio salienta, no entanto, que, segundo jurisprudência finlandesa constante, mesmo nos casos previstos por esta disposição, o montante da indemnização pode ser reduzido pelo facto de o próprio requerido ter tornado possível a ocorrência do dano ou de não ter tomado medidas razoáveis para o prevenir ou limitar, tendo com isso contribuído para a sua ocorrência.

24      Além disso, o órgão jurisdicional de reenvio sublinha que quando é decretada uma medida provisória, também é tido em conta o princípio da responsabilidade objetiva, conforme está previsto na ordem jurídica finlandesa. Com efeito, para que essa medida possa ser decretada, há que apreciar a probabilidade de o título de propriedade intelectual em que essa medida se baseia vir a ser declarado nulo na sequência de uma eventual ação de declaração de nulidade. Quanto aos danos respetivamente sofridos, há que ponderar, por um lado, os danos que a decretação da medida provisória causa à pessoa contra a qual é dirigida e, por outro, os danos que seriam causados ao requerente se a medida provisória não fosse decretada.

25      No entanto, tendo em conta a interpretação adotada pelo Tribunal de Justiça no Acórdão Bayer Pharma, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre se um regime de indemnização baseado na responsabilidade objetiva pode ser considerado compatível com o artigo 9.o, n.o 7, da Diretiva 2004/48.

26      Foi neste contexto que o markkinaoikeus (Tribunal dos Assuntos Económicos) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Deve um regime de indemnização baseado na responsabilidade objetiva, como o regime em vigor na Finlândia […], ser considerado compatível com o artigo 9.o, n.o 7, da [Diretiva 2004/48]?

2)      Em caso de resposta negativa à primeira questão, em que tipo de responsabilidade se baseia a obrigação de indemnização prevista no artigo 9.o, n.o 7, da [Diretiva 2004/48]? Deve considerar‑se que esta responsabilidade é uma forma de responsabilidade [com base na] culpa, uma forma de responsabilidade por abuso de direitos ou uma responsabilidade por qualquer outro motivo?

3)      Quanto à segunda questão, quais são as circunstâncias a tomar em conta para determinar a existência de responsabilidade?

4)      Em particular, no que respeita à terceira questão, deve a apreciação ser feita apenas com base nas circunstâncias conhecidas no momento da concessão de uma medida provisória, ou pode, por exemplo, ter‑se em conta o facto de o direito de propriedade intelectual cuja pretensa violação justificou a medida provisória ter sido posteriormente, após a obtenção desta, declarado nulo ab initio, e, na afirmativa, qual é a importância que deve ser atribuída a esta última circunstância?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira questão

27      Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 9.o, n.o 7, da Diretiva 2004/48 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma legislação nacional que prevê um mecanismo de indemnização de todos os danos causados por uma medida provisória, na aceção desta disposição, baseado num regime de responsabilidade objetiva do requerente dessas medidas, em cujo âmbito o juiz pode no entanto adaptar o montante da indemnização tomando em consideração as circunstâncias do caso concreto, incluindo a eventual participação do requerido na produção do dano.

28      O artigo 9.o, n.os 1 e 2, da Diretiva 2004/48 prevê que o titular de um direito de propriedade intelectual pode pedir às autoridades judiciais competentes a adoção de diversas medidas provisórias enumeradas nessa disposição, e que permitem, nomeadamente, a cessação imediata da violação desse direito sem aguardar uma decisão relativa ao mérito. Estas medidas provisórias devem, todavia, como indica o considerando 22 desta diretiva, ser adotadas no respeito dos direitos da defesa, ser proporcionadas à luz das especificidades de cada caso em apreço e acautelar as garantias necessárias para cobrir os danos e perdas causados ao requerido por uma pretensão injustificada.

29      Nesta perspetiva, o artigo 9.o, n.o 7, da referida diretiva prevê que, quando as medidas provisórias tenham sido revogadas ou deixem de produzir efeitos por força de qualquer ato ou omissão do requerente, bem como nos casos em que se venha a verificar posteriormente não ter havido violação ou ameaça de violação de um direito de propriedade intelectual, as autoridades judiciais deverão ter competência para ordenar que o requerente, a pedido do requerido, pague a este último uma indemnização adequada para reparar qualquer dano causado por essas medidas.

30      Resulta assim claramente da redação desta disposição que incumbe à autoridade judiciária a quem foi submetido esse pedido apreciar se os três requisitos previstos na referida disposição estão preenchidos. Primeiro, esta deve verificar se as medidas provisórias foram revogadas ou deixaram de produzir efeitos por força de um ato ou omissão do requerente, ou se não houve violação ou ameaça de violação do direito de propriedade intelectual desse requerente. Segundo, a autoridade judiciária tem de apreciar se existe um dano. Terceiro, a autoridade judiciária tem de determinar se existe um nexo de causalidade entre esse dano e essas medidas.

31      Importa todavia observar que a mesma disposição não menciona, entre esses requisitos, a existência de culpa do requerente das medidas provisórias.

32      Para determinar se o artigo 9.o, n.o 7, da Diretiva 2004/48 impõe aos Estados‑Membros um regime de responsabilidade específico aplicável aos requerentes de medidas provisórias, há que tomar em consideração o contexto em que esta disposição se inscreve, os objetivos prosseguidos pela regulamentação na qual a mesma está inserida e a sua génese.

33      A este respeito, cabe recordar que, segundo jurisprudência constante, as disposições desta diretiva não se destinam a reger todos os aspetos relacionados com os direitos de propriedade intelectual, mas apenas aqueles que são inerentes, por um lado, ao respeito destes direitos e, por outro, às violações destes últimos, obrigando a que existam meios jurídicos eficazes destinados a prevenir, fazer cessar ou remediar qualquer violação de um direito de propriedade intelectual existente. Ao fazê‑lo, o legislador da União optou por proceder a uma harmonização mínima do respeito pelos direitos de propriedade intelectual em geral (v., neste sentido, Acórdão de 28 de abril de 2022, Koch Media, C‑559/20, EU:C:2022:317, n.os 31 e 32 e jurisprudência referida).

34      No que diz mais especificamente respeito ao direito à indemnização do dano sofrido pelo requerido em razão das medidas provisórias, a redação do artigo 9.o, n.o 7, da referida diretiva corresponde, no essencial, à do artigo 50.o, n.o 7, do Acordo TRIPS. Ora, este acordo prevê expressamente, no seu artigo 1.o, n.o 1, designadamente, que os membros da Organização Mundial do Comércio determinam livremente o método adequado para a execução das disposições no referido acordo, no quadro dos respetivos sistemas e práticas jurídicas.

35      Assim, ao retomar, no artigo 9.o, n.o 7, da Diretiva 2004/48, a formulação muito ampla do artigo 50.o, n.o 7, do Acordo TRIPS, o legislador da União manifestou a sua vontade, por um lado, de não harmonizar as regras relativas à indemnização do requerido além do exigido por este acordo e, por outro, de deixar aos Estados‑Membros uma margem de manobra quanto à aplicação concreta do regime de responsabilidade do requerente.

36      Daqui resulta que o artigo 9.o, n.o 7, da Diretiva 2004/48, lido à luz do artigo 50.o, n.o 7, do Acordo TRIPS, deve ser interpretado no sentido de que prevê um padrão mínimo relativo ao respeito pelos direitos de propriedade intelectual, deixando, em princípio, aos Estados‑Membros uma margem de manobra que lhes permite optar, sendo caso disso, por um regime de responsabilidade objetiva ou por um regime de responsabilidade baseada na culpa.

37      É certo que, no Acórdão Bayer Pharma, o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 9.o, n.o 7, desta diretiva não se opunha, em princípio, a uma legislação nacional que recusasse indemnizar um requerido que tivesse sido objeto de medidas provisórias quando este não tivesse adotado o comportamento que geralmente se poderia esperar de qualquer pessoa preocupada em evitar ou reduzir o seu prejuízo, mesmo que a patente com base na qual essas medidas tivessem sido concedidas viesse a ser declarada nula. No entanto, o Tribunal de Justiça precisou expressamente que essa legislação só é compatível com aquela disposição se, para eventualmente vir a concluir no sentido dessa recusa, o juiz puder ter em conta todas as circunstâncias do processo (v., neste sentido, Acórdão Bayer Pharma, n.o 71).

38      Em contrapartida, tendo em conta o caso específico a que o Tribunal de Justiça circunscreveu a sua resposta no referido acórdão, não se pode deduzir do mesmo que o artigo 9.o, n.o 7, da Diretiva 2004/48 só prevê que o requerido seja indemnizado em caso de culpa do requerente das medidas provisórias. Como resulta do n.o 51 do Acórdão Bayer Pharma, o Tribunal de Justiça pretendeu apenas recordar à autoridade judiciária que lhe compete apreciar as circunstâncias específicas do processo submetido à sua apreciação para decidir se há que condenar o requerente a pagar ao requerido uma indemnização «adequada», isto é, justificada à luz dessas circunstâncias.

39      Com efeito, embora o poder dos órgãos jurisdicionais nacionais competentes concederem tal indemnização esteja estritamente sujeito aos requisitos enunciados no artigo 9.o, n.o 7, da Diretiva 2004/48, o facto de esses requisitos estarem preenchidos, num determinado processo, não implica que os referidos órgãos jurisdicionais fiquem automaticamente, e em todos os casos, obrigados a condenar o requerente a reparar quaisquer danos sofridos pelo requerido em razão das referidas medidas (v., neste sentido, Acórdão Bayer Pharma, n.o 52).

40      Daqui resulta que, quando os Estados‑Membros transpõem o artigo 9.o, n.o 7, da Diretiva 2004/48, devem tomar em consideração a exigência segundo a qual o juiz deve poder ter em conta todas as circunstâncias do processo que lhe foi submetido, incluindo o comportamento das partes (v., neste sentido, acórdão Bayer Pharma, n.o 71), independentemente do regime de responsabilidade previsto.

41      A margem de manobra de que os Estados‑Membros dispõem para essa transposição é também enquadrada pelo disposto no artigo 3.o da Diretiva 2004/48. Com efeito, os meios previstos por esses Estados para assegurar o respeito pelos direitos de propriedade intelectual em aplicação desta diretiva devem nomeadamente ser, por força deste artigo, equitativos, proporcionados e dissuasivos e aplicados para evitar que se criem obstáculos ao comércio lícito, cuja proteção é, em conformidade com o primeiro parágrafo do preâmbulo do Acordo TRIPS, um dos objetivos desse acordo, e prever salvaguardas contra os abusos.

42      Para determinar se um regime de responsabilidade objetiva é conforme com os requisitos do artigo 3.o da Diretiva 2004/48, importa inseri‑lo no contexto das medidas provisórias previstas no artigo 9.o desta diretiva e examinar se o sistema resultante da combinação desses dois artigos é equitativo, proporcionado e não cria obstáculos ao comércio lícito, ao mesmo tempo que se mantém dissuasivo.

43      No caso em apreço, resulta das explicações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio que, segundo a legislação nacional em causa no processo principal, um requerente que tenha obtido uma medida provisória desnecessária ou sem fundamento deve indemnizar o requerido pelos danos causados pela medida provisória e pela sua execução, bem como pelas despesas incorridas a este respeito. Assim, não é necessário, no âmbito dessa legislação, que o requerente tenha agido com culpa para que a responsabilidade lhe seja imputada. Daqui resulta que, quem solicita uma medida provisória deverá pagar uma indemnização para cobrir os danos causados por essa medida se o direito de propriedade intelectual com base no qual a referida medida foi concedida for posteriormente declarado nulo. No entanto, segundo a jurisprudência nacional, o montante da indemnização pode ser reduzido quando o próprio requerido tenha tornado possível a ocorrência do dano ou não tenha tomado medidas razoáveis para prevenir ou limitar o dano, tendo assim contribuído para a sua ocorrência.

44      No que respeita, primeiro, ao caráter proporcionado e equitativo de um sistema de medidas provisórias que prevê um regime de responsabilidade objetiva para assegurar a indemnização de um requerido que sofreu um dano causado por medidas provisórias injustificadas, há que constatar que, com a Diretiva 2004/48, o legislador da União previu instrumentos jurídicos que permitem atenuar de forma global o risco de o requerido sofrer um prejuízo devido às medidas provisórias e, assim, de o proteger (v., neste sentido, Acórdão de 28 de abril de 2022, Phoenix Contact, C‑44/21, EU:C:2022:309, n.o 44). Ao fazê‑lo, o legislador da União pretendeu assegurar um equilíbrio entre um nível elevado de proteção dos direitos de propriedade intelectual e os direitos e liberdades do requerido.

45      Com efeito, resulta das medidas, dos procedimentos e dos recursos previstos na Diretiva 2004/48 que as vias de recurso destinadas a assegurar a proteção dos direitos de propriedade intelectual são completadas por ações com vista à reparação do dano que lhes estão estreitamente associadas. Assim, por um lado, o artigo 7.o, n.o 1, e o artigo 9.o, n.o 1, desta diretiva preveem medidas cautelares e provisórias destinadas, em especial, a prevenir qualquer violação iminente de um direito de propriedade intelectual, medidas essas que incluem designadamente o arresto de bens suspeitos de violarem esse direito. Por outro lado, para assegurar o equilíbrio referido no n.o 44 do presente acórdão, o artigo 7.o, n.o 4, e o artigo 9.o, n.o 7, da referida diretiva preveem medidas que permitem ao requerido pedir uma indemnização nos casos em que se venha a verificar posteriormente não ter havido violação ou ameaça de violação de um direito de propriedade intelectual. Como resulta do considerando 22 da mesma diretiva, estas medidas de indemnização constituem garantias consideradas necessárias pelo legislador como contrapartida das medidas provisórias rápidas cuja existência previu (Acórdão de 16 de julho de 2015, Diageo Brands, C‑681/13, EU:C:2015:471, n.o 74).

46      Não se pode sustentar que um mecanismo de responsabilidade objetiva como o que está em causa no processo principal poria em causa o equilíbrio descrito no número anterior, dissuadindo o titular de um direito de propriedade intelectual de agir judicialmente e de invocar esse direito. Com efeito, as medidas provisórias destinam‑se a prevenir uma violação iminente desse direito ou a impedir a continuação de um alegado ato de contrafação. No entanto, se se vier a verificar que esse direito não foi violado, o fundamento das medidas provisórias desaparece, o que obriga, em princípio, o requerente a reparar qualquer dano que tenha sido causado por essas medidas injustificadas. A este respeito, importa todavia salientar que um mecanismo de responsabilidade objetiva como o que está em causa no processo principal, no âmbito do qual o juiz chamado a pronunciar‑se pode ter em conta todas as circunstâncias do caso concreto, incluindo a eventual participação do requerido na produção do dano, permite, nomeadamente, adaptar o montante da indemnização e, assim, atenuar um eventual efeito dissuasivo para o titular do direito de propriedade intelectual.

47      O facto de o requerente de tais medidas ser obrigado a apreciar o risco da execução das mesmas corresponde ao risco assumido pelo requerido ao decidir comercializar produtos que podem constituir uma contrafação. Assim, um mecanismo de responsabilidade objetiva, baseado no risco assumido pelo requerente, é proporcionado ao objetivo do legislador da União de assegurar o respeito pelos direitos de propriedade intelectual, ao mesmo tempo que o risco de o requerido sofrer um prejuízo devido às medidas provisórias é globalmente atenuado.

48      O equilíbrio dos direitos do requerente e do requerido é, aliás, perfeitamente garantido por um mecanismo de responsabilidade objetiva como o que está em causa no processo principal. Com efeito, o facto de o requerido não ter de provar a culpa do requerente constitui a contrapartida do facto de esse requerente ter podido obter essas medidas sem ter de fazer prova definitiva de uma eventual contrafação, em conformidade com o artigo 9.o, n.o 3, da Diretiva 2004/48.

49      No que respeita, segundo, à inexistência de obstáculos ao comércio lícito, há que salientar que a presunção de validade de um direito de propriedade intelectual permite ao seu titular agir e requerer medidas provisórias antes de qualquer ação relativa ao mérito da causa. No entanto, este último deve intentar uma ação por contrafação no prazo previsto no artigo 9.o, n.o 5, da Diretiva 2004/48, uma vez que este processo é geralmente acompanhado de uma ação ou de um pedido reconvencional de declaração de nulidade do referido direito por parte do requerido. Se, no termo desses processos, o direito de propriedade intelectual que serviu de fundamento às medidas provisórias for declarado nulo retroativamente, como acontece no processo principal, importará então declarar que os atos do requerido que foram travados por essas medidas se integravam plenamente no comércio lícito e não deviam ter sido restringidos. Do mesmo modo, neste caso, o elevado nível de proteção da propriedade intelectual pretendido pelo legislador da União não pode ser invocado, uma vez que se considera que o direito de propriedade intelectual, declarado nulo retroativamente, nunca existiu. Daqui resulta que um sistema de medidas provisórias que integra um regime de responsabilidade objetiva como o que está em causa no processo principal não cria obstáculos ao comércio lícito.

50      No que respeita, terceiro, ao caráter dissuasivo de um sistema de medidas provisórias, como o previsto no artigo 9.o da Diretiva 2004/48, que integra um regime de responsabilidade objetiva como o descrito no n.o 43 do presente acórdão, há que salientar que, uma vez que o juiz chamado a pronunciar‑se sobre o pedido de indemnização pode ter em conta todas as circunstâncias do processo, incluindo o comportamento do requerido, para determinar o montante da indemnização, esse regime de responsabilidade objetiva não é suscetível de pôr em causa o caráter dissuasivo do sistema de medidas provisórias. Com efeito, o direito à indemnização está estritamente circunscrito aos danos sofridos pelo requerido, causados pelas medidas provisórias injustificadas requeridas pelo titular do direito de propriedade intelectual em causa. Nesta perspetiva, o direito à indemnização previsto no artigo 9.o, n.o 7, desta diretiva não pode ser invocado para cobrir a parte do dano que resulta do comportamento do requerido e que eventualmente levou a agravar o dano inicialmente causado pelas medidas provisórias.

51      Tendo em conta todas as considerações precedentes, há que responder à primeira questão que o artigo 9.o, n.o 7, da Diretiva 2004/48 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma legislação nacional que prevê um mecanismo de indemnização de qualquer dano causado por uma medida provisória, na aceção desta disposição, baseado num regime de responsabilidade objetiva do requerente dessas medidas, em cujo âmbito o juiz pode adaptar o montante da indemnização tomando em consideração as circunstâncias do caso concreto, incluindo a eventual participação do requerido na produção do dano.

 Quanto às questões segunda a quarta

52      Tendo em conta a resposta dada à primeira questão, e uma vez que as questões segunda a quarta só são submetidas em caso de resposta negativa a esta, não há que responder a estas questões.

 Quanto às despesas

53      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara:

O artigo 9.o, n.o 7, da Diretiva 2004/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativa ao respeito dos direitos de propriedade intelectual,

deve ser interpretado no sentido de que:

não se opõe a uma legislação nacional que prevê um mecanismo de indemnização de qualquer dano causado por uma medida provisória, na aceção desta disposição, baseado num regime de responsabilidade objetiva do requerente dessas medidas, em cujo âmbito o juiz pode adaptar o montante da indemnização tomando em consideração as circunstâncias do caso concreto, incluindo a eventual participação do requerido na produção do dano.

Assinaturas


*      Língua do processo: finlandês.