Language of document : ECLI:EU:C:2024:12

Edição provisória

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

JEAN RICHARD DE LA TOUR

apresentadas em 11 de janeiro de 2024 (1)

Processo C808/21

Comissão Europeia

contra

República Checa

«Incumprimento de Estado — Cidadania da União — Artigo 22.° TFUE — Direito de eleger e de ser eleito nas eleições municipais e para o Parlamento Europeu no Estado‑Membro de residência nas mesmas condições que os nacionais desse Estado — Cidadãos da União que residem na República Checa sem terem a nacionalidade checa — Inexistência do direito de filiação num partido político — Candidatura às eleições municipais ou para o Parlamento Europeu em condições diferentes das previstas para os nacionais — Artigo 10.° TUE — Princípio da democracia — Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Artigos 12.°, 39.° e 40.° — Justificação — Artigo 4.°, n.° 2, TUE»






Índice


I. Introdução

II. Quadro jurídico

A. Direito da União

1. Tratado FUE

2. Carta

3. Diretiva 93/109/CE

4. Diretiva 94/80/CE

B. Direito checo

1. Lei relativa aos Partidos Políticos

2. Lei relativa às Eleições para os Conselhos Municipais

3. Lei relativa às Eleições para o Parlamento Europeu

III. Procedimento précontencioso

IV. Pedidos das partes

V. Análise

A. Quanto à exceção de inadmissibilidade arguida pela República Checa

1. Argumentos das partes

2. Apreciação

B. Quanto ao mérito

1. Quanto ao fundamento da ação por incumprimento

a) Argumentos das partes

1) Comissão

2) República Checa

b) Apreciação

2. Quanto à existência de uma limitação do exercício dos direitos eleitorais

a) Argumentos das partes

1) Comissão

2) República Checa

b) Apreciação

3. Quanto à justificação para a restrição da filiação num partido político

a) Argumentos das partes

1) Comissão

2) República Checa

3) República da Polónia, interveniente

b) Apreciação

VI. Quanto às despesas

VII. Conclusão

VIII. Anexo I: Regras de financiamento dos partidos políticos fornecidas pela Comissão

IX. Anexo II: Informações fornecidas pela República Checa quanto à composição das listas e aos candidatos eleitos nas eleições para o Parlamento Europeu e nas eleições municipais


I.      Introdução

1.        Com a sua ação apresentada em aplicação do artigo 258.° TFUE e baseada no artigo 22.° TFUE, a Comissão Europeia pede que o Tribunal de Justiça declare o incumprimento pela República Checa das obrigações que lhe incumbem pelo facto de, em substância, ao não conceder o direito de ser membro de um partido político aos cidadãos da União Europeia que não têm a nacionalidade checa, mas que residem no seu território (2), a probabilidade de estes serem eleitos nas eleições municipais ou para o Parlamento Europeu é menor do que a dos nacionais checos (3).

2.        Nas presentes conclusões, explicarei as razões pelas quais o entendimento da República Checa de que importa limitar‑se a uma leitura literal do artigo 22.° TFUE, no sentido de que o mesmo só regula as condições legais de elegibilidade, não é procedente e que, pelo contrário, a análise contextual e teleológica das obrigações resultantes desta disposição leva a considerar que a acusação relativa à violação do exercício efetivo do direito de ser eleito, apoiada pela Comissão, é fundada.

II.    Quadro jurídico

A.      Direito da União

1.      Tratado FUE

3.        O artigo 20.° TFUE tem a seguinte redação:

«1.      É instituída a cidadania da União. É cidadão da União qualquer pessoa que tenha a nacionalidade de um Estado‑Membro. A cidadania da União acresce à cidadania nacional e não a substitui.

2.      Os cidadãos da União gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres previstos nos Tratados. Assistem‑lhes, nomeadamente:

[...]

b)      O direito de eleger e ser eleitos nas eleições para o Parlamento Europeu, bem como nas eleições municipais do Estado‑Membro de residência, nas mesmas condições que os nacionais desse Estado;

[...]

Estes direitos são exercidos nas condições e nos limites definidos pelos Tratados e pelas medidas adotadas para a sua aplicação.»

4.        O artigo 22.° TFUE dispõe:

«1.      Qualquer cidadão da União residente num Estado‑Membro que não seja o da sua nacionalidade goza do direito de eleger e de ser eleito nas eleições municipais do Estado‑Membro de residência, nas mesmas condições que os nacionais desse Estado. Esse direito será exercido sem prejuízo das modalidades adotadas pelo Conselho, deliberando por unanimidade, de acordo com um processo legislativo especial, e após consulta do Parlamento Europeu; essas regras podem prever disposições derrogatórias, sempre que problemas específicos de um Estado‑Membro o justifiquem.

2.      Sem prejuízo do disposto no n.° 1 do artigo 223.° e das disposições adotadas em sua aplicação, qualquer cidadão da União residente num Estado‑Membro que não seja o da sua nacionalidade, goza do direito de eleger e de ser eleito nas eleições para o Parlamento Europeu no Estado‑Membro de residência, nas mesmas condições que os nacionais desse Estado. Esse direito será exercido sem prejuízo das modalidades adotadas pelo Conselho, deliberando por unanimidade, de acordo com um processo legislativo especial, e após consulta do Parlamento Europeu; essas regras podem prever disposições derrogatórias, sempre que problemas específicos de um Estado‑Membro o justifiquem.»

2.      Carta

5.        O artigo 12.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (4), sob a epígrafe «Liberdade de reunião e de associação», tem a seguinte redação:

«1.      Todas as pessoas têm direito à liberdade de reunião pacífica e à liberdade de associação a todos os níveis, nomeadamente nos domínios político, sindical e cívico, o que implica o direito de, com outrem, fundarem sindicatos e de neles se filiarem para a defesa dos seus interesses.

2. Os partidos políticos ao nível da União contribuem para a expressão da vontade política dos cidadãos da União.»

3.      Diretiva 93/109/CE

6.        A Diretiva 93/109/CE do Conselho, de 6 de dezembro de 1993, que estabelece o sistema de exercício do direito de voto e de elegibilidade nas eleições para o Parlamento Europeu dos cidadãos da União residentes num Estado‑Membro de que não tenham a nacionalidade (5), enuncia, no seu quarto considerando:

«Considerando que o n.° 2 do artigo 8.°‑B do Tratado CE refere‑se apenas à possibilidade de exercício do direito de voto e à elegibilidade para o Parlamento Europeu, sem prejuízo do n.° 3 do artigo 138.° do Tratado CE que prevê o estabelecimento de um processo uniforme para estas eleições em todos os Estados‑Membros, e que se destina essencialmente a suprimir a condição da nacionalidade atualmente exigida na maior parte dos Estados‑Membros para o exercício desses direitos.»

7.        O artigo 1.°, n.° 1, desta diretiva dispõe:

«A presente diretiva estabelece o sistema de exercício do direito de voto e de elegibilidade para o Parlamento Europeu para os cidadãos da União residentes num Estado‑Membro de que não sejam nacionais.»

4.      Diretiva 94/80/CE

8.        A Diretiva 94/80/CE do Conselho, de 19 de dezembro de 1994, que estabelece as regras de exercício do direito de voto e de elegibilidade nas eleições autárquicas dos cidadãos da União residentes num Estado‑Membro de que não tenham a nacionalidade (6), enuncia, no seu quinto considerando:

«Considerando que o n.° 1 do artigo 8.°‑B do Tratado tem por objetivo assegurar que todos os cidadãos da União, nacionais ou não do Estado‑Membro de residência, possam aí exercer o seu direito de voto e ser eleitos nas eleições autárquicas nas mesmas condições, e que é necessário, por conseguinte, que as condições, nomeadamente em matéria de período e de prova de residência, válidas para os não nacionais sejam idênticas às eventualmente aplicáveis aos nacionais do Estado‑Membro em questão; que os cidadãos não nacionais não estarão sujeitos a condições específicas a não ser que, a título excecional, se justifique um tratamento diferente dos nacionais e dos não nacionais por circunstâncias específicas destes últimos que os distingam dos primeiros.»

9.        O artigo 1.°, n.° 1, desta diretiva, dispõe:

«A presente diretiva estabelece as regras de exercício do direito de voto e de elegibilidade nas eleições autárquicas dos cidadãos da União residentes num Estado‑Membro de que não tenham a nacionalidade.»

B.      Direito checo

1.      Lei relativa aos Partidos Políticos

10.      O artigo 1.°, n.° 1, da zákon č. 424/1991 Sb., o sdružování v politických stranách a v politických hnutích (Lei n.° 424/1991 relativa às Associações em Partidos Políticos e em Movimentos Políticos), de 2 de outubro de 1991, conforme alterada (7), prevê:

«Os cidadãos têm o direito de se associar em partidos políticos e em movimentos políticos (a seguir, “partidos e movimentos”). O exercício deste direito permite aos cidadãos participarem na vida política da sociedade, em particular, na constituição dos órgãos legislativos e dos órgãos das coletividades territoriais regionais e locais [...]»

11.      O artigo 2.°, n.° 3, desta lei dispõe:

«Todos os cidadãos maiores de 18 anos podem filiar‑se num partido ou num movimento; porém, só podem filiar‑se um único partido ou movimento.»

2.      Lei relativa às Eleições para os Conselhos Municipais

12.      O artigo 20.°, n.° 1, da zákon č. 491/2001 Sb., o volbách do zastupitelstev obcí a o změně některých zákonů (Lei n.° 491/2001 relativa às Eleições para os Conselhos Municipais e que altera determinadas leis), de 6 de dezembro de 2001, conforme alterada (8), dispõe:

«Ao abrigo da presente lei, podem constituir um partido eleitoral os partidos políticos e os movimentos políticos registados [...] cujas atividades não tenham sido suspensas, bem como as coligações destes partidos, os candidatos independentes, as associações de candidatos independentes ou as associações de partidos políticos ou movimentos políticos e de candidatos independentes.»

3.      Lei relativa às Eleições para o Parlamento Europeu

13.      O artigo 21.°, n.° 1, da zákon č. 62/2003 Sb., o volbách do Evropského parlamentu a o změně některých zákonů (Lei n.° 62/2003 relativa às Eleições para o Parlamento Europeu e que altera determinadas leis) (9), de 18 de fevereiro de 2003, dispõe:

«As listas dos candidatos às eleições para o Parlamento Europeu podem ser apresentadas por partidos políticos e por movimentos políticos registados cujas atividades não tenham sido suspensas [...], bem como pelas suas coligações [...]»

14.      O artigo 22.°, n.os 2 e 3, desta lei, enuncia:

«(2)      A lista dos candidatos deve ser acompanhada de um comprovativo da nacionalidade do candidato e de uma declaração assinada pelo candidato e que indica que o mesmo consente na sua candidatura, que não tem conhecimento de impedimentos à sua elegibilidade, se for caso disso, que tais impedimentos terão desaparecido na data das eleições para o Parlamento Europeu e que o mesmo não pediu para constar de outra lista de candidatos às eleições para o Parlamento Europeu, nem mesmo noutro Estado‑Membro. O candidato indicará igualmente na sua declaração o seu local de residência ou, tratando‑se de um nacional de outro Estado‑Membro, o seu local de residência e a sua data de nascimento. A declaração do candidato pode ser redigida em língua checa ou numa das línguas de trabalho da União [...], em conformidade com o artigo 4.°

(3)      Se o candidato for nacional de outro Estado‑Membro, além das informações previstas no n.° 2, indicará na sua declaração o seu local de nascimento e a morada do seu último local de residência no seu Estado‑Membro de origem, apresentará uma declaração na qual refere que não foi destituído do direito de ser eleito no seu Estado‑Membro de origem e juntará à lista dos candidatos os documentos referidos no primeiro período do n.° 2.»

III. Procedimento précontencioso

15.      Em 2010, a Comissão analisou, no quadro do sistema EU Pilot 1300/10/JUST, a compatibilidade com o artigo 22.° TFUE da restrição exclusivamente aos nacionais checos do direito de filiação num partido político.

16.      Uma vez que as informações fornecidas pela República Checa não esclareceram as dúvidas da Comissão relativas ao incumprimento deste Estado‑Membro das obrigações que lhe incumbem por força do artigo 22.° TFUE, esta enviou‑lhe, em 22 de novembro de 2012, uma notificação para cumprir. Nas suas observações em resposta, de 22 de janeiro de 2013, este Estado‑Membro contestou qualquer violação do direito da União, em razão de discordar da interpretação deste artigo e, mais especificamente, da expressão «nas mesmas condições», nele constante. O mesmo alegou que o referido artigo não implica a obrigação de os Estados‑Membros permitirem que os cidadãos de outros Estados‑Membros se tornem membros de partidos políticos e criem partidos políticos.

17.      Em 22 de abril de 2014, a Comissão emitiu um parecer fundamentado no qual mantinha que a República Checa não tinha cumprido as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 22.° TFUE, ao recusar aos cidadãos «móveis» da União o direito de fundarem um partido político ou um movimento político.

18.      Na sua resposta de 20 de junho de 2014, a República Checa referiu que as medidas adotadas por este Estado‑Membro deviam ser consideradas proporcionais e, por conseguinte, conformes com o direito da União.

19.      Por carta de 2 de dezembro de 2020, o Comissário Europeu da Justiça solicitou à República Checa que o informasse sobre uma eventual evolução da sua posição ou sobre alterações legislativas adotadas com vista a garantir os direitos em causa aos cidadãos «móveis» da União.

20.      Não tendo obtido resposta a esta carta, a Comissão intentou a presente ação restringindo o seu objeto à limitação da qualidade de membro de um partido político apenas aos nacionais checos. A Comissão precisou que, no que respeita à questão do direito de fundar um partido político por cidadãos «móveis» da União, evocada nas fases anteriores do procedimento, a mesma se reservava a possibilidade de a suscitar no âmbito de um procedimento distinto.

IV.    Pedidos das partes

21.      Com a sua petição inicial, a Comissão pede que o Tribunal de Justiça se digne:

–        declarar que, «ao recusar aos cidadãos da União que não são nacionais checos mas residem na República Checa o direito de se tornarem membros de um partido político ou de um movimento político [ (10)], [este Estado‑Membro] não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 22.° [TFUE]», e

–        condenar a República Checa nas despesas.

22.      A República Checa conclui, a título principal, pela inadmissibilidade da ação e, a título subsidiário, pela improcedência do mesmo. Conclui igualmente pedindo a condenação da Comissão nas despesas.

23.      Por Decisão do presidente do Tribunal de Justiça de 19 de maio de 2022, a República da Polónia foi autorizada a intervir em apoio dos pedidos da República Checa.

24.      Para este efeito, no seu articulado de intervenção, a República da Polónia apresentou observações sobre o exercício dos direitos enunciados no artigo 22.° TFUE, sobre os direitos eleitorais dos cidadãos da União nas eleições para o Parlamento Europeu e nas eleições autárquicas ao abrigo do direito checo, bem como sobre os poderes derivados do artigo 22.° TFUE e de «filiação» num partido político.

25.      A Comissão conclui as suas observações relativas a estas três séries de argumentos mantendo os pedidos que formula na sua petição.

V.      Análise

26.      Em apoio da sua ação por incumprimento contra a República Checa baseado no artigo 22.° TFUE e relativo à legislação nacional que apenas confere o direito de se filiar num partido político aos nacionais checos, a Comissão expõe que este Estado‑Membro viola tal disposição ao não respeitar o princípio da não discriminação em razão da nacionalidade que lhe impõe que garanta aos cidadãos «móveis» da União o direito de serem candidatos às eleições autárquicas ou para o Parlamento Europeu nas mesmas condições que as aplicáveis aos seus nacionais.

27.      A Comissão sublinha a importância da possibilidade de se filiar num partido aquando das eleições e alega, nomeadamente, que o artigo 12.°, n.° 2, da Carta enuncia que, ao nível da União, os partidos políticos contribuem para a expressão da vontade política dos cidadãos da União.

A.      Quanto à exceção de inadmissibilidade arguida pela República Checa

1.      Argumentos das partes

28.      A República Checa sustenta que, embora a Comissão baseie formalmente a sua ação no artigo 22.° TFUE, a mesma invoca, contudo, no texto da sua petição, a violação de diversas outras disposições do direito da União.

29.      Este Estado‑Membro considera que, na ausência de argumentos que possam ser retirados do artigo 22.° TFUE que se limita, de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça (11), a aplicar ao direito de voto e de elegibilidade o princípio da não discriminação em razão da nacionalidade, a Comissão invocou, na realidade, no que respeita ao direito de se filiar num partido político, a violação deste princípio enunciado no artigo 18.° TFUE e a violação do artigo 12.°, n.° 1, da Carta.

30.      Nestas condições, o fundamento da ação não é compreensível e é diferente do que foi objeto de tratamento no âmbito da fase pré‑contenciosa do procedimento, expondo o Tribunal de Justiça ao risco de decidir ultra petita.

31.      Segundo a Comissão, resulta claramente quer da sua petição quer das suas conclusões, que a lei checa que apenas confere o direito de se filiar num partido político aos nacionais checos é incompatível com o artigo 22.° TFUE e que lhe compete considerar, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, outras normas de direito primário, em particular, as disposições da Carta, a fim de ter em conta o contexto jurídico das disposições retiradas dos Tratados, bem como os direitos fundamentais (12).

2.      Apreciação

32.      A República Checa considera que dos motivos da petição resultam diversos fundamentos da ação, em contradição com os pedidos formulados naquela.

33.      O Tribunal de Justiça declara de forma constante (13)que:

–        em conformidade com o artigo 120.°, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça e com a sua jurisprudência relativa a essa disposição, a petição inicial deve indicar o objeto do litígio, os fundamentos e argumentos invocados e uma exposição sumária desses fundamentos. Tal indicação deve ser suficientemente clara e precisa para permitir à parte demandada preparar a sua defesa e ao Tribunal de Justiça exercer a sua fiscalização. Daqui resulta que os elementos essenciais de facto e de direito nos quais assenta uma ação devem ressaltar, de forma coerente e compreensível, do texto da própria petição e que os pedidos desta última devem ser formulados de forma inequívoca a fim de evitar que o Tribunal de Justiça decida ultra petita ou que não se pronuncie sobre uma acusação, e

–        no âmbito de uma ação intentada nos termos do artigo 258.° TFUE, esta deve apresentar as acusações de forma coerente e precisa, para permitir ao Estado‑Membro e ao Tribunal de Justiça apreenderem exatamente o alcance da violação do direito da União imputada, condição necessária para que esse Estado possa apresentar utilmente os seus meios de defesa e para que o Tribunal de Justiça possa verificar a existência do incumprimento alegado.

34.      No caso em apreço, resulta dos motivos da petição, sem ambiguidade e em concordância com o parecer fundamentado, que o artigo 22.° TFUE, no qual a mesma se baseia, deve ser interpretado inserindo‑o no seu contexto e tendo em consideração as ligações existentes com a Carta e, nomeadamente, com o artigo 12.°, n.° 1, da mesma.

35.      A este respeito, a Comissão alegou que, tendo em conta o papel central e fundamental que desempenham os partidos políticos nos sistemas eleitorais dos Estados‑Membros e para a participação na vida política, não se pode considerar que um cidadão da União se possa apresentar às eleições no seu Estado de residência nas mesmas condições que os nacionais desse Estado, se o mesmo não se puder apresentar enquanto membro de um partido político no referido Estado‑Membro, uma vez que esta situação tem um impacto negativo sobre as possibilidades de ser eleito.

36.      Por conseguinte, do acima exposto não resulta que tenha sido invocada a violação do artigo 12.°, n.° 1, da Carta (14).

37.      Além disso, o equívoco invocado pela República Checa parece estar relacionado com a sua própria análise do fundamento do incumprimento invocado, o qual, segundo esta, deveria ser o artigo 18.° TFUE. Por conseguinte, trata‑se de um meio de defesa que este Estado pôde alegar utilmente e que deverá ser objeto de um exame quanto ao mérito e não na fase da admissibilidade da ação.

38.       Por conseguinte, proponho que o Tribunal de Justiça julgue improcedente esta exceção de inadmissibilidade.

B.      Quanto ao mérito

1.      Quanto ao fundamento da ação por incumprimento

a)      Argumentos das partes

1)      Comissão

39.      Esta instituição recorda que o artigo 20.°, n.° 2, alínea b) e o artigo 22.° TFUE exigem especificamente que os cidadãos «móveis» da União possam ser candidatos às eleições municipais ou às eleições para o Parlamento Europeu «nas mesmas condições» (15) que os nacionais. A mesma reconhece que o artigo 22.° TFUE não precisa as diferentes modalidades concretas segundo as quais a igualdade de tratamento deve ser garantida, mas considera que este enuncia uma obrigação geral e universal de igualdade de tratamento. Esta obrigação impõe aos Estados‑Membros, na falta de uma lista exaustiva de exigências, entre as quais a relativa à filiação num partido político, que assegurem que as regras existentes permitem aos cidadãos da União votar e apresentar‑se às eleições municipais e às eleições para o Parlamento Europeu nas mesmas condições que os seus nacionais.

40.      Assim, a fim de considerar que a referida obrigação é efetivamente respeitada, é necessário examinar a questão da existência num Estado‑Membro de impedimentos de direito ou de facto que tornam impossível ou difícil, para os cidadãos «móveis» da União, recorrerem a uma das formas de candidatura formalmente disponíveis ao abrigo do direito nacional (16).

41.      A Comissão apoia‑se igualmente na jurisprudência do Tribunal de Justiça segundo a qual, por um lado, embora caiba atualmente aos Estados‑Membros regulamentar os aspetos relativos às eleições para o Parlamento Europeu que não estejam harmonizados ao nível da União, ao fazê‑lo, estes devem respeitar o direito da União (17). Por outro lado, uma medida nacional que seja suscetível de entravar o exercício das liberdades fundamentais garantidas pelo Tratado só pode ser justificada à luz do direito da União pelo interesse geral, se esta medida for compatível com os direitos fundamentais garantidos pelo direito da União (18).

42.      A este respeito, esta alega que as restrições ao exercício do direito de fundar um partido político e do direito de se filiar num partido político constituem claramente restrições ao direito fundamental à liberdade de associação enunciado no artigo 12.°, n.° 1, da Carta, cuja redação corresponde ao artigo 11.° da Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (19).

43.      Com efeito, a Comissão entende que, tendo em conta o papel central e fundamental desempenhado pelos partidos políticos nos sistemas eleitorais dos Estados‑Membros, não se pode considerar que um cidadão da União se pode apresentar às eleições no seu Estado de residência nas mesmas condições que os nacionais desse Estado, se o mesmo não se puder apresentar enquanto membro de um partido político no referido Estado‑Membro.

44.      Assim, esta alega que:

–        em todos os Estados‑Membros, os partidos políticos ainda são uma forma essencial de participação na vida política e o meio mais comummente utilizado para participar nas eleições enquanto candidatos, e

–        a importância dos partidos políticos foi, assim, reconhecida na jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (20)e sublinhada nas Orientações sobre a Regulamentação de Partidos Políticos da Comissão Europeia para a Democracia pelo Direito (Comissão de Veneza) (21).

45.      A Comissão acrescenta que os motivos enunciados no artigo 11.°, n.° 2, CEDH, suscetíveis de justificar uma restrição ao exercício do direito à liberdade de associação, aos quais importa fazer referência por força do artigo 52.°, n.° 3, da Carta, não se aplicam manifestamente ao caso em apreço.

46.      Em resposta aos argumentos relativos ao alcance limitado do artigo 22.° TFUE relacionado com a competência dos Estados‑Membros em matéria de atividade política (22), a Comissão sustenta, primeiro, que o âmbito de aplicação das Diretivas 93/109 e 94/80, que regulam questões de natureza administrativa ou processual relativas aos direitos eleitorais em causa, não esgota o alcance da proibição de toda a discriminação em razão da nacionalidade decorrente do artigo 22.° TFUE. Este âmbito de aplicação não pode servir de fundamento ou de motivo para uma interpretação restritiva do alcance do direito primário (23). Além disso, por um lado, este raciocínio levaria a que se tivesse de admitir discriminações que tivessem por objeto outras regras, tais como as relativas à campanha eleitoral, em matéria, por exemplo, de reuniões ou de propaganda por cartazes. Por outro lado, a República Checa não pode deduzir do Acórdão Eman e Sevinger (24)que este tem por objeto direitos eleitorais dos nacionais de outros Estados‑Membros.

47.      Segundo, a Comissão contesta que a restrição da atividade política dos nacionais dos outros Estados‑Membros possa ser admitida pelo artigo 16.° da CEDH (25)e sublinha que se deve começar a ter em conta o conceito de «cidadania da União» e os direitos a ela inerentes. Esta recorda, a este respeito, que não contesta que os Estados‑Membros possam adotar medidas com vista a limitar a participação dos cidadãos «móveis» da União nas eleições legislativas nacionais, mas insiste no facto de o alcance das medidas adotadas não poder ir ao ponto de comprometer a igualdade das condições de participação destes cidadãos nas eleições municipais e nas eleições para o Parlamento Europeu. A Comissão salienta igualmente que, com exceção da República Checa e de um outro Estado‑Membro, nenhum Estado‑Membro prevê tal restrição.

48.      Terceiro, no que respeita ao aspeto constitucional da limitação da participação nos partidos políticos em razão da sua importância a nível nacional, justificado pela referência feita pela República Checa ao Acórdão do Nejvyšší správní soud (Supremo Tribunal Administrativo, República Checa) (26), a Comissão salienta que, no n.° 9 deste acórdão, é mencionado expressamente que o objeto do procedimento era a decisão de alterar os estatutos do referido partido e não uma «alegada violação dos direitos dos cidadãos da União [...] nas condições da sua participação nas eleições para o Parlamento Europeu e nas eleições municipais». Além disso, no que diz respeito à interpretação da Listina základních práv a svobod (Carta dos Direitos e Liberdades Fundamentais) que faz parte da ordem constitucional checa, pelo Nejvyšší správní soud (Supremo Tribunal Administrativo), segundo a qual a filiação de pessoas que não são cidadãos checos é proibida, a Comissão observa que o Ústavní soud (Tribunal Constitucional, República Checa) não se pronunciou sobre tal interpretação e que esta foi objeto de pareceres jurídicos divergentes (27).

2)      República Checa

49.      Segundo este Estado‑Membro, o artigo 22.° TFUE não abrange a questão da filiação num partido político. Este apoia‑se, em primeiro lugar, na génese e na constância do conteúdo desta disposição (28). Desde a sua primeira inscrição no direito primário, no artigo 8.°‑B CE, tal como alterado pelo Tratado de Maastricht, até ao Tratado de Lisboa, por força do qual os mesmos figuram no artigo 22.° TFUE, os direitos eleitorais dos cidadãos «móveis» da União têm sido enunciados nos mesmos termos.

50.      Em segundo lugar, a República Checa alega que a sua interpretação resulta da redação do artigo 22.° TFUE e da intenção do legislador da União inequivocamente expressa nos considerandos das Diretivas 93/109 e 94/80 (29). O objetivo consiste em suprimir qualquer condição de nacionalidade para o exercício do direito de voto e de elegibilidade, sem que diga respeito a outros aspetos, entre os quais as condições de adesão a um partido político (30). Além disso, este legislador referiu expressamente que, nesta matéria, deve ser tido em conta o princípio da proporcionalidade.

51.      Em terceiro lugar, a República Checa sublinha que o referido legislador precisou, assim, no artigo 22.° TFUE que os direitos de voto e de elegibilidade em causa são exercidos «sem prejuízo das modalidades adotadas pelo Conselho» (31). Ora, trata‑se precisamente das modalidades das Diretivas 93/109 e 94/80, que não fazem alusão à possibilidade de o direito previsto no artigo 22.° TFUE poder ter qualquer impacto nas condições de adesão a um partido político.

52.      Em quarto lugar, o alcance assim limitado do artigo 22.° TFUE e da regulamentação de execução da União está em plena conformidade com o artigo 4.°, n.° 2, TUE (32), por força do qual a União respeita a identidade nacional dos Estados‑Membros inerente às suas estruturas fundamentais políticas e constitucionais. Ora, a regulamentação aferente ao funcionamento dos partidos políticos é a pedra angular destas estruturas (33)e o artigo 16.° CEDH reconhece também que as partes contratantes podem impor restrições à atividade política dos estrangeiros. O artigo 22.° TFUE constitui a este respeito uma exceção que não pode ser interpretada de forma extensiva no sentido de que abrange toda a atividade política (34). Referir, como o faz a Comissão, o número de Estados‑Membros que não adotaram tal posição, não é pertinente.

53.      Além disso, resulta da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, referida pela Comissão, que os partidos políticos são fundamentais para as eleições a nível nacional. Ora, não é a este que o direito da União se aplica, tal como reconhece a Comissão.

54.      Por último, o direito de os Estados‑Membros reservarem para os seus nacionais a participação na plataforma‑chave para a atividade política nacional, ou seja, os partidos políticos, está diretamente relacionado com a possibilidade de limitarem as candidaturas para as eleições do órgão legislativo, a qual é admitida pela Comissão, e a possibilidade de excluírem os cidadãos «móveis» da União dos cargos nos órgãos executivos das autarquias, em conformidade com o artigo 5.°, n.° 3, da Diretiva 94/80.

55.      Na sua tréplica, a República Checa completa a sua argumentação de que a base jurídica material da presente ação deveria ser o artigo 18.° TFUE (35). Por um lado, deduz do Acórdão Eman e Sevinger (36), que este artigo se aplica às questões abrangidas pelo direito da União, na perspetiva de uma eventual discriminação em razão da nacionalidade tal como, por exemplo, a campanha eleitoral.

56.      Por outro lado, a República Checa considera que, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, para escolher a disposição do direito da União aplicável entre a que enuncia a proibição geral da discriminação e as disposições especiais do direito primário, é essencial saber se a pessoa em causa adquiriu um «estatuto» (37), previsto por uma disposição especial (38), tal como, entre outros, o de trabalhador na aceção do artigo 45.° TFUE ou o de pessoa estabelecida na aceção do artigo 49.° TFUE.

57.      Por conseguinte, segundo a República Checa, o artigo 22.° TFUE só se aplica a um cidadão «móvel» da União quando este obtém o estatuto de eleitor ou de candidato a uma eleição. O estatuto de candidato não pode depender da filiação num partido político, uma vez que esta não garante que o interessado figurará numa lista de candidatos (39).

b)      Apreciação

58.      A presente ação tem por objeto as consequências para a elegibilidade nas eleições autárquicas e para o Parlamento Europeu decorrentes do direito de filiação num partido político que, segundo a lei checa, não é concedido aos cidadãos «móveis» da União. Esta proibição tem por efeito, como sustenta a Comissão, que estes cidadãos não exercem o seu direito de ser eleitos nestas eleições «nas mesmas condições» que os nacionais checos, na aceção do artigo 22.° TFUE?

59.      No estado atual do direito da União, a filiação num partido político é da competência dos Estados‑Membros. No entanto, resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que, no exercício da sua competência, os Estados‑Membros têm de respeitar as obrigações que decorrem do direito da União (40).

60.      Por conseguinte, importa determinar quais as exigências que resultam do artigo 22.° TFUE, invocado pela Comissão.

61.      Em conformidade com a sua redação, o âmbito de aplicação do artigo 22.° TFUE limita‑se às únicas eleições nele referidas, a saber, as eleições municipais (n.° 1) e às eleições para o Parlamento Europeu (n.° 2), excluindo assim as eleições legislativas ou presidenciais.

62.      Com a presente ação, o Tribunal de Justiça é convidado a precisar se o princípio da igualdade enunciado no artigo 22.° TFUE deve ser entendido no sentido de que abrange todas as condições em que qualquer cidadão «móvel» da União se pode apresentar às eleições ou se incide apenas sobre as condições legais de elegibilidade.

63.      Trata‑se, portanto, de definir a margem de manobra conferida aos Estados‑Membros pelo facto de as regras de exercício do direto de voto e de elegibilidade nas eleições para o Parlamento Europeu (41)e nas eleições autárquicas serem fixadas, respetivamente, pelas Diretivas 93/109 e 94/80.

64.      O argumento da República Checa relativo a uma leitura literal do artigo 22.° TFUE, segundo o qual estas diretivas restringem o princípio da igualdade enunciado nesta disposição, deve ser desde logo rejeitado com o fundamento relativo à hierarquia das normas, justamente sustentado pela Comissão, nos termos da qual o direito derivado não pode restringir um direito reconhecido pelo tratado (42).

65.      Assim, as referidas diretivas apenas definem um quadro mínimo no qual é concretizado o princípio da igualdade para o exercício do direito de voto e da elegibilidade (43).

66.      Mas, sobretudo, a génese do artigo 22.° TFUE e a evolução do quadro jurídico em o conteúdo desta disposição se inscreve colocam em evidência, de forma muito clara desde o Tratado de Lisboa, que a referida disposição deve ser interpretada tendo em conta os dois pilares em que assenta, a saber, a cidadania da União e a democracia representativa.

67.      No que respeita, em primeiro lugar, à cidadania da União, a Comissão invoca, corretamente, a aplicação do artigo 20.°, n.° 2, alínea b), TFUE que enuncia que esta cidadania (44) confere, entre outros direitos, o gozo do direito de eleger e ser eleito nas eleições para o Parlamento Europeu, bem como nas eleições municipais do Estado‑Membro de residência, nas mesmas condições que os nacionais desse Estado.

68.      Este vínculo com a cidadania consta do direito primário desde o Tratado de Maastricht, assinado em 7 de fevereiro de 1992 (45). Esteve ligado desde o início ao direito de circular e de permanecer livremente no território dos Estados‑Membros (46), e ao princípio da não discriminação em razão da nacionalidade, que é a componente de cada uma das liberdades de circulação.

69.      No entanto, o referido vínculo assumiu uma dimensão especial com as alterações introduzidas pelo Tratado de Lisboa devido à vontade de os Estados‑Membros, nomeadamente, atribuírem um lugar preponderante à cidadania. Com efeito, por um lado, o Tratado UE foi melhorado com um título II, «Disposições relativas aos princípios democráticos», que inclui o artigo 9.°, nos termos do qual «[e]m todas as suas atividades, a União respeita o princípio da igualdade dos seus cidadãos, que beneficiam de igual atenção por parte das suas instituições, órgãos e organismos. É cidadão da União qualquer pessoa que tenha a nacionalidade de um Estado‑Membro. A cidadania da União acresce à cidadania nacional e não a substitui». Os direitos inerentes à cidadania da União estão enunciados nos artigos 20.° a 24.° TFUE, correspondentes aos artigos 17.° a 21.° CE. Os direitos dos cidadãos «móveis» da União nas eleições para o Parlamento Europeu e nas eleições municipais estão enunciados no artigo 20.°, n.° 2, alínea b) e no artigo 22.° TFUE.

70.      Por outro lado, cada um destes direitos também figura no título V da Carta (47), «Cidadania». Os direitos dos cidadãos «móveis» da União nas eleições para o Parlamento Europeu e nas eleições municipais estão aí consagrados, em termos gerais, nos artigos 39.° (48)e 40.° (49).

71.      Por conseguinte, com a entrada em vigor do Tratado de Lisboa, os direitos eleitorais dos cidadãos da União enunciados no artigo 22.° TFUE devem ser analisados enquanto direitos fundamentais e expressão do princípio da igualdade de tratamento, inerente ao estatuto fundamental dos nacionais dos Estados‑Membros (50).

72.      A sua reiteração no Tratado UE e na Carta tem igualmente por vocação estabelecer ligações com outros direitos ou princípios aí enunciados, como a igualdade e a democracia, que são valores comuns aos Estados‑Membros sobre os quais a União é fundada (51).

73.      Em segundo lugar, no que respeita aos princípios democráticos, desde o Tratado de Lisboa, o artigo 10.° TUE enuncia, no seu n.° 1, que «[o] funcionamento da União [se baseia] na democracia representativa» (52) e reconhece, nos seus n.os 2 e 3, o direito de os cidadãos europeus estarem diretamente representados no Parlamento Europeu e de participarem na vida democrática da União.

74.      Assim, em razão da combinação operada pelo Tratado de Lisboa, pelo menos para as eleições para o Parlamento Europeu, entre os direitos de voto e de elegibilidade inerentes à cidadania da União e os princípios democráticos na União, o objetivo de garantir uma representatividade efetiva dos cidadãos «móveis» da União está claramente expresso.

75.      A Comissão alega, com razão, que esta representatividade é corolário da integração dos cidadãos «móveis» da União no seu Estado de residência, conforme sublinhado nos considerandos das Diretivas 93/109 e 94/80 (53). Mais especificamente a nível local, os direitos políticos reconhecidos a estes cidadãos visam incentivar a inserção social dos referidos cidadãos que escolheram residir num Estado‑Membro de que têm a nacionalidade. Nesta perspetiva, deve igualmente salientar‑se o objetivo recordado nestes considerandos, a saber, o de «evitar qualquer polarização entre listas de candidatos nacionais e não nacionais».

76.       Por conseguinte, a meu ver, a Comissão pode, legitimamente, sustentar, com fundamento no artigo 22.° TFUE, inserido no contexto dos direitos inerentes à cidadania da União e dos princípios democráticos enunciados nos Tratados, que a garantia de igualdade dos direitos eleitorais dos cidadãos da União se deve traduzir, sem que seja necessário estabelecer uma lista de critérios indicativa, ou mesmo exaustiva, na obrigação geral de não desencorajar a participação nas eleições por diversos fatores (54).

77.      Por outras palavras, o artigo 22.° TFUE deve ser entendido no sentido de que qualquer entrave ao exercício dos direitos eleitorais fora dos quadros definidos pelas Diretivas 93/109 e 94/80, em razão da nacionalidade, constitui uma discriminação no domínio da aplicação dos Tratados (55), que é proibida.

78.      Uma vez que as medidas nacionais em causa devem ser analisadas à luz destas regras específicas de não discriminação previstas no Tratado FUE, o artigo 18.° deste Tratado, invocado pela República Checa, não é aplicável, em conformidade com a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça (56). Além disso, não é necessário procurar algum «estatuto» particular para efeitos da aplicação das disposições do artigo 22.° TFUE, uma vez que a igualdade dos direitos em matéria eleitoral resulta do estatuto de cidadão da União (57).

79.      Nestas condições, deve ser agora examinada a análise da Comissão de que a impossibilidade de filiação num partido político é suscetível de entravar o exercício destes direitos.

80.      No caso em apreço, as partes estão de acordo quanto à constatação de que a probabilidade de aceder a mandatos eletivos a nível local ou europeu dependem do grau de participação na vida democrática do Estado‑Membro no qual os cidadãos «móveis» da União são candidatos, quer no âmbito de um partido quer de modo independente.

81.      No entanto, sou de opinião, à semelhança da Comissão, que se baseia nas Orientações da Comissão de Veneza (58), não criticadas pela República Checa, que o acesso aos meios de que dispõem os partidos políticos constitui um elemento essencial para favorecer as candidaturas às eleições (59)municipais ou para o Parlamento Europeu.

82.      Além disso, conforme alegado pela Comissão com base na jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, o papel dos partidos políticos é primordial no exercício dos direitos políticos nos Estados‑Membros (60). Ao nível da União, este papel é claramente reconhecido no artigo 10.°, n.° 4, TUE (61), ao qual corresponde o artigo 12.°, n.° 2, da Carta (62).

83.      Com efeito, há uma ligação manifesta entre este artigo da Carta e os seus artigos 39.° e 40.° (63). Nestas condições e pelos motivos já expostos (64), bem como no estrito respeito do princípio da atribuição, conforme enunciado no artigo 5.°, n.° 2, TUE, cada Estado‑Membro deve ter em conta estas disposições, a fim de garantir o exercício dos direitos conferidos pelo artigo 22.° TFUE.

84.      Por conseguinte, partilho da opinião da Comissão de que a sua ação baseada no artigo 22.° TFUE deve ser apreciada à luz do direito à liberdade de associação consagrado no artigo 12.°, n.° 1, da Carta, conjugado com o seu artigo 11.° (65), relativo à liberdade de expressão. Estas liberdades são particularmente protegidas devido ao seu papel primordial na participação dos cidadãos na democracia (66). No artigo 12.°, n.° 2, da Carta figura uma declinação desta relação no que respeita aos partidos políticos europeus.

85.      Este direito à liberdade de associação corresponde ao direito garantido no artigo 11.°, n.° 1, da CEDH pelo que lhe deve ser reconhecido o mesmo sentido e âmbito que este último, em conformidade com o artigo 52.°, n.° 3, da Carta (67).

86.      Resulta da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem que o direito à liberdade de associação constitui um dos fundamentos essenciais de uma sociedade democrática e pluralista, uma vez que o mesmo permite aos cidadãos agirem coletivamente em domínios de interesse comum e, ao fazê‑lo, contribuírem para o bom funcionamento da vida pública (68).

87.      Assim, é igualmente à luz destas disposições do Tratado UE e da Carta que importa apreciar se, como sustenta a Comissão, a impossibilidade legal de os cidadãos «móveis» da União se filiarem num partido político na República Checa compromete a igualdade, com os nacionais checos, das condições da sua elegibilidade nas eleições municipais e para o Parlamento Europeu, designadamente uma vez que reduz significativamente a sua probabilidade de serem eleitos.

2.      Quanto à existência de uma limitação do exercício dos direitos eleitorais

a)      Argumentos das partes

1)      Comissão

88.      Em termos concretos, a Comissão sublinha três tipos de vantagens da filiação num partido político para se apresentar às eleições.

89.      Primeiro, os candidatos filiados num partido político estabelecido podem beneficiar da tradição, da imagem e das estruturas socio‑organizacionais associadas a este partido. A Comissão insiste no facto de que, sem ligação com um indivíduo, apenas o nome do partido já é suficiente para caracterizar determinados valores ou abordagens da política.

90.      Segundo, estes candidatos podem beneficiar do aparelho eleitoral e dos recursos dos partidos políticos. Assim, estes últimos apoiam os candidatos que se apresentam às eleições com a sua experiência, a sua infraestrutura e os seus procedimentos operacionais específicos (por exemplo, redes, meios de comunicação social e sistemas de comunicação).

91.      Terceiro, uma vez que os partidos políticos são atores políticos reconhecidos, beneficiam muitas vezes, ao abrigo do direito nacional, de privilégios específicos, tais como benefícios financeiros, um regime fiscal especial e o acesso aos meios de comunicação social. A respeito do financiamento na República Checa, a Comissão invoca diversas disposições relativas aos partidos (69).

92.      Por conseguinte, segundo a Comissão, contrariamente aos cidadãos membros de partidos políticos estabelecidos, os cidadãos «móveis» da União são obrigados na República Checa a apresentar-se como candidatos independentes, devem criar e impor a sua própria identidade política, a desenvolver a sua própria organização para conduzir uma campanha eleitoral, com um acesso ao financiamento sem privilégios específicos aos meios de comunicação social.

93.      Além disso, esta instituição sublinha diversas dificuldades relativas às listas no que respeita aos candidatos independentes. A mesma instituição precisa que, nas eleições municipais, só estes últimos são obrigados a apresentar uma petição assinada pelos eleitores em apoio da sua candidatura. O número destas assinaturas depende da dimensão da autarquia à qual o candidato se apresenta (70).

94.      Além disso, a Comissão considera que é incontestável que, para a sua inscrição na lista de um partido político, os candidatos independentes se encontram numa posição de fraqueza em relação aos candidatos membros deste partido, uma vez que dependem da decisão do referido partido para os inscrever na sua lista e para determinar o seu lugar nesta lista, sem poderem ter influência no mesmo partido.

95.      Esta sublinha também que deve ser tido em conta o facto de ser referido nas listas dos candidatos e nos boletins de voto que uma pessoa se apresenta na lista de um partido político como candidato independente ou «pessoa sem etiqueta». Nestas condições, no respeitante à escolha de prioridades ou de orientações políticas, a credibilidade dos candidatos independentes é menor do que a de um filiado que se pode prevalecer, junto dos seus eleitores, do seu papel ativo no seu partido (71).

96.      Por último, a Comissão refere a conclusão do český úřad ombudsmana (gabinete checo do defensor público dos direitos) de que os cidadãos «móveis» da União são prejudicados nas eleições, bem como o seu parecer sobre a discriminação direta sofrida por aqueles nas eleições para o Parlamento Europeu pelo facto da designação dos candidatos apenas pelos partidos políticos (72).

97.      Na sua réplica, a Comissão contesta todos os argumentos relativos às práticas eleitorais. Em primeiro lugar, esta recorda que a diferença de tratamento resulta da lei em causa segundo a qual o nacional checo pode escolher filiar‑se num partido político e representar este partido nas eleições ou permanecer independente e aceitar, eventualmente, uma oferta de inscrição na qualidade de candidato «não filiado» na lista de um partido político que o solicite, ao passo que um cidadão «móvel» da União não tem, por seu turno, esta possibilidade e pode apenas apresentar‑se enquanto independente ou esperar receber uma proposta do partido político no qual desejaria tornar‑se membro para que o invista na qualidade de candidato «não filiado».

98.       Em segundo lugar, no que respeita ao ónus da prova, a Comissão considera que, no caso de uma discriminação de jure tal como a que foi invocada, não é necessário, para constatar uma violação do direito da União, fornecer ao Tribunal de Justiça dados estatísticos sobre o número de cidadãos «móveis» da União que, na prática, foram prejudicados por tal discriminação direta. A Comissão acrescenta que é praticamente impossível identificar as situações em que cidadãos «móveis» da União foram dissuadidos de se apresentar a eleições devido à impossibilidade de se filiarem num partido político (73).

99.      Em terceiro lugar, a Comissão considera que os dados estatísticos fornecidos pela República Checa (74)      são destituídos de pertinência na presença de uma discriminação de jure. Pelo contrário, uma vez que são vaga e indiretamente conexos, estes confirmam a sua posição. A este respeito, a Comissão conclui que estas estatísticas incidem de um modo geral sobre as «pessoas sem filiação política», sem que seja possível identificar quantas entre estas são cidadãos «móveis» da União cuja situação é objeto da presente ação. Além disso, a sua análise detalhada destes dados leva‑a a salientar, no essencial, no que respeita às eleições para o Parlamento Europeu, que:

–        aproximadamente dois terços dos candidatos se apresentaram no âmbito de um partido político;

–        em três das quatro eleições para o Parlamento Europeu, a proporção de representantes eleitos é menor entre os candidatos independentes do que entre os que são membros de partidos políticos, e

–        os candidatos independentes eleitos para o Parlamento Europeu são muitas vezes personalidades que beneficiam de uma notoriedade e de uma popularidade excecionais (75).

100. No que respeita às eleições autárquicas, a Comissão admite que o conhecimento das personalidades locais determina com maior facilidade a escolha dos eleitores. No entanto, esta considera que isto demonstra que os cidadãos «móveis» da União têm precisamente uma maior necessidade de se filiarem num partido político para terem mais hipóteses de serem eleitos.

2)      República Checa

101. Depois de ter salientado novamente que a presente ação não tem por objeto as condições legais do exercício dos direitos eleitorais, este Estado‑Membro sublinha, antes de mais, que as pessoas que não são membros de um partido político podem beneficiar plenamente das vantagens que a Comissão especifica na sua petição, ao figurar na lista de candidatos de qualquer partido e que tal é uma prática corrente no seu território (76).

102. Em seguida, a República Checa salienta que a violação invocada pela Comissão assenta em suposições e alegações não comprovadas (77). Além disso, as explicações sobre as realidades locais dadas desde a fase pré‑contenciosa não foram tidas em consideração pela Comissão, não obstante estas demonstrarem que esta sustenta erradamente que a situação de fraqueza dos candidatos independentes é incontestável.

103. Esta fornece diversos elementos concretos a fim de justificar que as «pessoas sem filiação política» na República Checa são regularmente candidatas que encabeçam as listas dos maiores partidos políticos, que as mesmas são muitas vezes eleitas e que desempenham em seguida funções importantes na instituição para a qual foram eleitas (78). Este Estado‑Membro daqui conclui que o êxito de um candidato nas eleições não depende da sua filiação num partido político, mas antes de fatores como as suas opiniões e a sua personalidade.

b)      Apreciação

104. Segundo a República Checa, apoiada pela República da Polónia, a Comissão não produziu provas dos efeitos práticos das disposições legais em causa na elegibilidade dos cidadãos «móveis» da União.

105. Ora, o Tribunal de Justiça declarou que a existência de um incumprimento pode ser provada, no caso de este ter origem na adoção de uma medida legislativa ou regulamentar cuja existência e aplicação não sejam contestadas, através de uma análise jurídica das disposições dessa medida (79).

106. No caso vertente, o incumprimento que a Comissão imputa à República Checa tem origem na adoção de uma medida legislativa cuja existência e aplicação este Estado‑Membro não contesta e cujas disposições são objeto de uma análise jurídica na petição inicial.

107. Além disso, trata‑se de apreciar em que medida esta legislação tem efeitos dissuasores sobre eventuais candidaturas às eleições, o que não é quantificável.

108. Por conseguinte, a República Checa não pode acusar a Comissão de não ter feito prova dos efeitos práticos, nos direitos eleitorais dos cidadãos «móveis» da União, da lei que reserva a filiação num partido político aos nacionais checos.

109. No que respeita à lei checa em causa, que reserva o direito de filiação num partido político aos nacionais checos, a desigualdade de tratamento em termos de direitos eleitorais resulta, a meu ver, da simples constatação de que estes beneficiam livremente de uma opção para serem candidatos às eleições municipais ou para o Parlamento Europeu, a saber, enquanto membros de um partido político ou enquanto independentes, ao passo que os cidadãos «móveis» da União têm apenas este último meio à disposição. Ora, como foi acima exposto, o acesso aos partidos políticos permite exercer os direitos eleitorais de forma mais eficaz, a fim de participar na vida democrática.

110. Nenhum dos paliativos expostos pela República Checa é suscetível de alterar esta apreciação. Com efeito, em particular, a possibilidade de os cidadãos «móveis» da União serem admitidos como candidatos numa lista de um partido não é de natureza a compensar esta limitação da sua capacidade de ação, uma vez que estes dependem de critérios específicos a preencher, conforme expostos pela Comissão.

111. Além disso, à semelhança desta instituição, pressupondo que a presente ação possa ser apreciada com base em dados numéricos e detalhados sobre os candidatos eleitos, tal como os fornecidos pela República Checa (80), entendo que estes não são suscetíveis de demonstrar uma igualdade de tratamento dos cidadãos «móveis» da União. É certo que as estatísticas realçam as realidades locais específicas às eleições autárquicas. No entanto, não é possível daqui retirar conclusões pertinentes quanto à situação dos cidadãos «móveis» da União que é objeto da presente ação. Por um lado, resulta dos exemplos fornecidos que os candidatos que não são membros de partidos e que são eleitos para o Parlamento Europeu são maioritariamente (ou unicamente) nacionais checos. Por outro lado, devem ser tidas em conta as dificuldades que devem ser ultrapassadas na falta de filiação num partido político, em particular, as relativas às inscrições nas listas de candidatos, que resultem diretamente das disposições legais, qualificadas como discriminatórias pelos autores referidos pela Comissão (81).

112. Por conseguinte, proponho que o Tribunal de Justiça considere que a Comissão determinou de maneira suficiente a existência de uma limitação ao exercício dos direitos eleitorais em detrimento dos cidadãos «móveis» da União colocados na mesma situação que os cidadãos nacionais.

113. Daqui resulta que a República Checa, ao adotar as disposições nacionais em causa no exercício da sua competência, não respeitou as exigências decorrentes do direito da União, a saber, as do artigo 22.° TFUE, que deve ser lido em conjugação com os artigos 12.°, 39.° e 40.° da Carta.

3.      Quanto à justificação para a restrição da filiação num partido político

a)      Argumentos das partes

1)      Comissão

114. Em primeiro lugar, a Comissão considera que deve ser rejeitado o argumento da República Checa de que a restrição à filiação num partido político imposto aos cidadãos «móveis» da União é justificada pela necessidade de proteger os assuntos políticos nacionais de uma «ingerência» destes cidadãos, que resultaria da filiação num partido político, no qual são tomadas decisões importantes para as eleições do órgão legislativo (82).

115. A mesma considera que esta justificação está em contradição direta com o espírito fundamental e com a finalidade das disposições dos Tratados relativas à cidadania. Os direitos políticos enunciados por estas visam precisamente garantir que os cidadãos «móveis» da União possam integrar‑se e desempenhar um papel político ativo no seu Estado‑Membro de residência no quadro das eleições municipais e para o Parlamento Europeu.

116. A este respeito, a Comissão sublinha que a obrigação de garantir a igualdade de tratamento prevista no artigo 20.° n.° 2, alínea b) e no artigo 22.° TFUE, que devem ser interpretados à luz dos artigos 11.° e 12.° da Carta que garantem a participação em partidos políticos, não impede de modo algum que os Estados‑Membros reservem a possibilidade de apresentação às eleições para o órgão legislativo ou para as coletividades territoriais regionais a quem possua a nacionalidade do Estado‑Membro de acolhimento.

117. Em segundo lugar, em resposta ao argumento relativo à proteção da identidade nacional, ao abrigo do artigo 4.°, n.° 2, TUE, de que o funcionamento e a livre concorrência dos partidos políticos estão inscritos na Ústava (Constituição), a Comissão recorda que esta disposição deve ser interpretada em conformidade com as outras disposições dos Tratados que os Estados‑Membros se comprometeram a respeitar ao aderir à União, incluindo o artigo 22.° TFUE, que não se aplica às eleições para o órgão legislativo (83). Por conseguinte, não se pode considerar que os direitos eleitorais dos cidadãos «móveis» da União violem o princípio do respeito da identidade nacional.

118. Em terceiro lugar, no que respeita à objeção formulada pela República Checa de que a Comissão não especificou uma medida menos restritiva que permitisse alcançar o objetivo prosseguido, esta última duvida que um Estado‑Membro possa justificar uma medida nacional que derrogue às exigências do artigo 20.°, n.° 2, alínea b), e do artigo 22.° TFUE e que discrimine diretamente em razão da nacionalidade. Além disso, compete‑lhe justificar a proporcionalidade das suas medidas (84).

119. Por outro lado, a Comissão salienta que a República Checa não demonstrou no procedimento pré‑contencioso, nomeadamente, nas circunstâncias do caso em apreço, a existência de um interesse público específico na proibição da filiação dos cidadãos «móveis» da União num partido político. Daqui deduz que nem o objetivo prosseguido nem a necessidade ou a proporcionalidade desta proibição foram explicados.

120. Além disso, na sua réplica, quanto ao «princípio fundamental da igualdade dos membros de um partido político», invocado pela República Checa, a Comissão considera totalmente falso e incoerente qualificar como discriminação desproporcionada a fixação da participação dos cidadãos da União nos partidos políticos num nível correspondente aos seus direitos políticos segundo o direito da União mediante, por exemplo, uma limitação da sua participação em determinadas decisões do partido político e, pelo contrário, como discriminação proporcionada a proibição absoluta da filiação dos cidadãos «móveis» da União num partido político.

2)      República Checa

121. Esta evoca os três argumentos seguintes: «Primeiro, a regulamentação nacional visada prossegue o objetivo legítimo de reservar a participação numa plataforma‑chave para a atividade política a nível nacional aos cidadãos checos, o que está plenamente em conformidade com o artigo 4.°, n.° 2, TUE […] Aliás, é o que reconhece, em substância, a Comissão, no parecer fundamentado [...]. Segundo, autorizar a filiação num partido político unicamente aos cidadãos checos é uma medida adaptada para atingir este objetivo, uma vez que preenche diretamente a substância do mesmo. Terceiro, a referida regulamentação nacional é proporcionada. Esta não viola a substância dos direitos eleitorais segundo o artigo 22.° TFUE, uma vez que em nada altera os direitos eleitorais ativos e passivos completos dos cidadãos móveis da União [...] e permite, na prática, exercer integralmente estes direitos [...]. Deste modo, a regulamentação em causa é plenamente conforme com a jurisprudência referida pela Comissão [...]» (85).

122. A República Checa precisa que o objetivo legítimo visado não pode ser alcançado através de uma medida menos restritiva, pelo facto de não se vislumbrar que os cidadãos «móveis» da União sejam autorizados a filiar‑se num partido político apenas para participarem numa parte marginal da atividade política, limitada às eleições municipais ou para o Parlamento Europeu. Esta considera que uma regulamentação neste sentido é contrária ao princípio fundamental da igualdade de tratamento dos membros de um partido político. Além disso, não ofereceria a estes cidadãos a posição forte no partido político que a Comissão, erradamente, considera necessária. A República Checa salienta que esta instituição não logrou, ela própria, indicar que medida, a este respeito, poderia ser considerada menos restritiva.

3)      República da Polónia, interveniente

123. No respeitante à limitação do âmbito de atividade dos cidadãos «móveis» da União nos partidos políticos, pretendida pela Comissão, a República da Polónia alega que a «filiação» num partido político abrange um espetro muito mais amplo de atividades que as que precedem determinadas eleições. Estas estão relacionadas com a influência na política nacional, incluindo os domínios políticos que continuam a ser da competência exclusiva dos Estados‑Membros. Ora, não existe nenhuma obrigação para um Estado‑Membro permitir que estes cidadãos influenciem os resultados das eleições parlamentares e presidenciais através do sistema partidário.

b)      Apreciação

124. Os argumentos da República Checa levam a precisar em que condições se pode justificar uma restrição ao princípio da igualdade de tratamento enunciado no artigo 22.° TFUE.

125. Este Estado‑Membro invoca o artigo 4.°, n.° 2, TUE e alega, em substância, que o direito da União, conforme interpretado pela Comissão, teria por consequência que os cidadãos «móveis» da União participariam na vida pública num nível diferente do admitido pelos Estados‑Membros e, de modo particular, lhes permitiria ter um peso nas decisões nacionais ao beneficiar do vetor dos partidos políticos.

126. Há que recordar que, de acordo com o artigo 4.°, n.° 2, TUE, a União respeita a identidade nacional dos seus Estados‑Membros refletida nas estruturas políticas e constitucionais fundamentais de cada um deles.

127. Ora, é verdade que a organização da vida política nacional, para a qual contribuem os partidos políticos, faz parte da identidade nacional na aceção do artigo 4.°, n.° 2, TUE. Nesta matéria, o respeito desta identidade traduz‑se pela limitação da participação dos cidadãos «móveis» da União apenas nas eleições para o Parlamento Europeu e nas eleições municipais, sem o objetivo de harmonização dos regimes eleitorais dos Estados‑Membros (86). O legislador da União também tomou em consideração a incidência que o acesso facilitado a estas eleições tem no equilíbrio da vida política do Estado‑Membro de residência, ao prever que certos ajustamentos, enquadrados (87)e transitórios, possam ser adotados pelos Estados‑Membros a favor dos seus nacionais.

128. Quanto à questão do impacto a nível nacional da filiação dos cidadãos «móveis» da União em partidos políticos devido aos seus potenciais efeitos dentro destes partidos, observo que, no entendimento de todas as partes, é da competência destes últimos. Com efeito, podem definir livremente a sua organização e as modalidades de escolha dos seus candidatos (88). Saliento que a República Checa se limita a afirmar, sem a demonstrar, a impossibilidade de restringir o âmbito de ação dos filiados, cidadãos «móveis» da União, a determinadas eleições.

129. Por conseguinte, partilho do entendimento da Comissão de que admitir a filiação dos cidadãos «móveis» da União num partido político com vista a garantir a efetividade dos direitos destes últimos nas eleições municipais e para o Parlamento Europeu não é suscetível de ofender a identidade nacional da República Checa.

130.  Além disso, pressupondo que tal ofensa se verifique, o artigo 4.°, n.° 2, TUE deve ser lido tendo em conta as disposições de importância equivalente (89).

131. Por conseguinte, o artigo 4.°, n.° 2, TUE não pode dispensar os Estados‑Membros do respeito dos direitos fundamentais reafirmados pela Carta (90)      e entre os quais figuram o princípio da democracia e o princípio da igualdade, que é formulado no artigo 22.° TFUE (91)      e conferido pela cidadania da União, para o exercício do direito de elegibilidade nas eleições municipais e para o Parlamento Europeu. Estes princípios fazem parte dos valores fundadores da União (92).

132. Além disso, em razão dos argumentos da República Checa relativos à proporcionalidade da regulamentação nacional contestada, deve acrescentar‑se que a justificação da limitação dos direitos conferidos pelo artigo 22.° TFUE apenas pode ser analisada nas condições previstas nesta disposição.

133. Com efeito, os direitos eleitorais reconhecidos nos artigos 39.° e 40.° da Carta são objeto de disposições específicas no Tratado FUE, a saber, o artigo 22.° Os únicos ajustamentos do exercício destes direitos previstos pelo direito derivado para o qual este artigo remete (93)têm apenas por objeto as condições legais de voto ou de elegibilidade (94).

134. À luz de todas estas considerações, proponho ao Tribunal de Justiça que julgue procedente a ação da Comissão.

VI.    Quanto às despesas

135. Nos termos do artigo 138.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Na medida em que o Tribunal de Justiça deve, em meu entender, julgar procedentes os pedidos da Comissão, a República Checa deve ser condenada nas despesas.

136. Em conformidade com o artigo 140.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, a República da Polónia suportará as suas próprias despesas.

VII. Conclusão

137. À luz das considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça decida do seguinte modo:

1)      Ao recusar aos cidadãos da União que não são nacionais da República Checa, mas que residem neste país, o direito de se tornarem membro de um partido político ou de participarem num movimento político, a República Checa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 22.° TFUE.

2)      A República Checa é condenada nas despesas.

3)      A República da Polónia suportará as suas próprias despesas.

VIII. Anexo I: Regras de financiamento dos partidos políticos fornecidas pela Comissão

1.        Os partidos políticos que obtenham pelo menos 1 % dos votos nas eleições para o Parlamento Europeu recebem 30 coroas checas (CZK) (cerca de 1,20 euros) por cada voto a título de contribuição para as despesas eleitorais (artigo 65.° da Lei relativa às Eleições para o Parlamento Europeu).

2.        Os partidos políticos que obtenham pelo menos 1,5 % dos votos nas eleições para a Poslanecká sněmovna (Câmara dos Deputados, República Checa) recebem 100 CZK (cerca de 4 euros) por cada voto a título de contribuição para as despesas eleitorais (artigo 85.° da Lei n.° 247/1995 relativa às Eleições para o Parlamento da República Checa e que altera e completa determinadas leis).

3.        Os partidos políticos que arrecadaram 3 % dos votos nas últimas eleições para a Câmara dos Deputados também recebem uma contribuição anual do Estado de 6 000 000 CZK (cerca de 245 430 euros) para o partido ou o movimento e, simultaneamente, o partido ou o movimento recebe 200 000 CZK (cerca de 8 180 euros) por ano por cada 0,1 % de votos suplementares (artigo 20.°, n.° 6, da Lei relativa aos Partidos Políticos).

4.        Se um partido ou um movimento obtiverem mais de 5 % dos votos, a contribuição não aumenta e o partido ou o movimento recebe 10 000 000 CZK (cerca de 409 000 euros) (artigo 20.°, n.° 6, da Lei relativa aos Partidos Políticos).

5.         Os partidos políticos também recebem uma contribuição anual de 900 000 CZK (cerca de 36 800 euros) pelo mandato de um deputado ou de um senador, e de 250 000 CZK (cerca de 10 200 euros) pelo mandato de um membro do Conselho Regional e de um membro do Conselho Municipal de Praha (Praga) (artigo 20.°, n.° 7, da Lei relativa aos Partidos Políticos).

6.        Em determinadas condições, os partidos e os movimentos políticos também recebem uma contribuição anual para apoiar as atividades de um instituto político, elevando‑se a 10 % do montante total da contribuição para as atividades de tal partido ou movimento (artigo 20.°, n.os 5 e 8, da Lei relativa aos Partidos Políticos).


IX.    Anexo II: Informações fornecidas pela República Checa quanto à composição das listas e aos candidatos eleitos nas eleições para o Parlamento Europeu e nas eleições municipais

8.        As eleições para o Parlamento Europeu decorreram na República Checa em 2004, 2009, 2014 e 2019.

1.      A proporção de candidatos sem filiação política nas listas dos partidos políticos ou das coligações políticas foi a seguinte:

a)      em 2004, 37,22 % dos candidatos não tinham filiação política;

b)      em 2009, 38,28 % dos candidatos não tinham filiação política;

c)      em 2014, 30,27 % dos candidatos não tinham filiação política, e

d)      em 2019, 33,89 % dos candidatos não tinham filiação política.

2.      Foram eleitos:

a)      em 2004, sete candidatos sem filiação política, ou seja, 29,17 % das pessoas eleitas na República Checa;

b)      em 2009, um candidato sem filiação política, ou seja, 4,55 % das pessoas eleitas na República Checa;

c)      em 2014, oito candidatos sem filiação política, ou seja, 38,10 % das pessoas eleitas na República Checa, e

d)      em 2019, quatro candidatos sem filiação política, ou seja, 19,05 % das pessoas eleitas na República Checa.

3.      Os candidatos sem filiação política encabeçavam muitas vezes as listas dos candidatos, incluindo pelos maiores partidos políticos. Mais concretamente:

a)      em 2004, tratava‑se de três deputados eleitos para o Parlamento Europeu na lista do partido Sdružení nezávislých a evropští demokraté (União dos Candidatos Independentes e dos Democratas Europeus) (SNK), entre os quais o cabeça de lista, Zieleniec, e Hybáškov, na segunda posição da lista; ou ainda Remek, na segunda posição da lista de candidatos pelo partido Komunistická strana Čech a Moravy (Partido Comunista da Boémia e da Morávia) (KSČM);

b)      em 2009, tratava‑se de Remek, na segunda posição da lista de candidatos pelo KSČM;

c)      em 2014, tratava‑se do cabeça de lista do partido TOP 09 a Starostové (Top 09 e Presidentes de Câmara), Niedermayer, e de Pospíšil, na segunda posição desta lista, de Keller, líder da lista do partido Česká strana sociálně demokratická (Partido Social Democrata checo) (ČSSD), o partido mais forte do Governo na República Checa nessa época, ou ainda de quatro deputados eleitos pela lista do partido ANO, o segundo partido mais forte do Governo nessa época, cujo líder, Pavel Telička, veio a ser eleito vice‑presidente do Parlamento Europeu, e

d)      em 2019, tratava‑se de três deputados eleitos para o Parlamento Europeu que figuravam nos três primeiros lugares da lista do ANO, cuja líder, Dita Charanzová, veio a ser eleita vice‑presidente do Parlamento Europeu.

4.      Em 2004, o cidadão alemão Stros foi eleito para o Parlamento Europeu na República Checa.

2.      Quanto às eleições municipais (municípios, vilas e cidades) que decorreram em 2006, 2010, 2014 e 2018.

1.      A proporção de candidatos e de eleitos sem filiação política foi a seguinte:

a)      em 2006, 79,85 % dos candidatos 84,51 % dos eleitos;

b)      em 2010, 81,25 % dos candidatos e 86,15 % dos eleitos;

c)      em 2014, 84,13 % dos candidatos e 88,30 % dos eleitos, e

d)      em 2018, 84,97 % dos candidatos e 89,96 % dos eleitos.

2.      A proporção elevada de candidatos e de eleitos sem filiação política é um fenómeno que também se observa nas listas dos maiores partidos políticos. Por exemplo, para as eleições municipais de 2018:

a)      nas listas dos candidatos pelo ČSSD, o partido político checo mais antigo com uma forte implantação na política municipal, figuravam 54,58 % de pessoas sem filiação política e 57,31 % dos eleitos por estas listas não tinham filiação política;

b)      nas listas dos candidatos pelo partido Občanská demokratická strana (Partido Democrata Cívico) (ODS), um partido político conservador tradicional com forte implantação na política municipal, figuravam 59,47 % de pessoas sem filiação política, e 52,93 % dos eleitos por estas listas não tinham filiação política, e

c)      nas listas dos candidatos pelo partido Křesťanská a demokratická unie — Československá strana lidová (União Cristã e Democrata — Partido Popular checoslovaco) (KDU‑ČSL), um partido político tradicional que apresenta o número mais elevado de candidatos e de representantes eleitos na política municipal, figuravam 73,62 % de pessoas sem filiação política, e 72,49 % dos representantes eleitos por estas listas não tinham filiação política.

3.      No que respeita às grandes cidades checas, em Praga, o candidato sem filiação política Bohuslav Svoboda foi escolhido em 2010 para ser cabeça de lista pelo ODS, o partido mais forte do Governo da República Checa nessa época; em seguida, veio a ser presidente da câmara de Praga. Em 2014, Adriana Kmáčová, candidata sem filiação política, cabeça de lista pelo ANO, tornou‑se presidente da câmara de Praga e Tomáš Macura, candidato sem filiação política, cabeça de lista pelo ANO, tornou‑se presidente da câmara de Ostrava, a terceira maior cidade da República Checa.


1      Língua original: francês.


2      A seguir «cidadãos “móveis” da União».


3      A Comissão intentou uma ação idêntica contra a República da Polónia (processo C‑814/21) que é objeto de um tratamento coordenado. Em 12 de setembro de 2023, realizou‑se uma audiência de alegações comum a estes dois processos.


4      A seguir «Carta».


5      JO 1993, L 329, p. 34, bem como edição especial do Jornal Oficial da União Europeia na língua checa, capítulo 20, tomo 1, p. 7.


6      JO 1994, L 368, p. 38, bem como edição especial do Jornal Oficial da União Europeia na língua checa, capítulo 20, tomo 1, p. 12.


7      A seguir, «Lei dos Partidos Políticos».


8      A seguir, «Lei relativa às Eleições para os Conselhos Municipais».


9      A seguir «Lei relativa às Eleições para o Parlamento Europeu».


10      A seguir «filiar‑se num partido político».


11      A República Checa refere o Acórdão de 12 de setembro de 2006, Eman e Sevinger (C‑300/04, a seguir, «Acórdão Eman e Sevinger», EU:C:2006:545, n.° 53).


12      No que respeita ao princípio da não discriminação, a Comissão refere os Acórdãos de 5 de dezembro de 1989, Comissão/Itália (C‑3/88, EU:C:1989:606, n.° 8), e de 17 de julho de 2008, Raccanelli (C‑94/07, EU:C:2008:425, n.° 45), bem como o terceiro considerando da Diretiva 93/109. A título exemplificativo, a mesma refere‑se ao Acórdão de 16 de dezembro de 2004, My (C‑293/03, EU:C:2004:821, n.° 33 e jurisprudência referida), relativo ao artigo 18.° CE, atual artigo 21.° TFUE. A respeito dos direitos fundamentais, a Comissão refere o Acórdão de 18 de junho de 1991, ERT (C‑260/89, EU:C:1991:254, n.os 43 e 44), e recorda os que referiu na sua petição, a saber, os Acórdãos de 27 de abril de 2006, Comissão/Alemanha (C‑441/02, EU:C:2006:253, n.° 108), e de 15 de julho de 2021, The Department for Communities in Northern Ireland (C‑709/20, EU:C:2021:602, n.° 88). Quanto à exigência de conformidade das normas nacionais com a liberdade de associação consagrada no artigo 12.° da Carta, a mesma remete para o Acórdão de 18 de junho de 2020, Comissão/Hungria (Transparência associativa) (C‑78/18, EU:C:2020:476).


13      V., nomeadamente, Acórdão de 5 de junho de 2023, Comissão/Polónia (Independência e vida privada dos juízes) (C‑204/21, EU:C:2023:442, n.os 188 a 190, bem como jurisprudência referida).


14      V., por analogia, Acórdão de 30 de setembro de 2010, Comissão/Bélgica (C‑132/09, EU:C:2010:562, n.os 40 e 41).


15      O sublinhado é meu.


16      Este argumento é invocado em resposta ao articulado de intervenção da República da Polónia.


17      A Comissão refere‑se, a este respeito, ao Acórdão Eman e Sevinger.


18      A Comissão refere‑se ao Acórdão de 27 de abril de 2006, Comissão/Alemanha (C‑441/02, EU:C:2006:253, n.° 108).


19      Assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950, a seguir «CEDH».


20      A Comissão refere os Acórdãos do TEDH, de 30 de janeiro de 1998, Partido Comunista Unificado da Turquia e outros c. Turquia (CE:ECHR:1998:0130JUD001939292, § 44), e, no que respeita à importância dos partidos políticos, a título de exemplo, os Acórdãos de 25 de maio de 1998, Partido Socialista e outros c. Turquia (CE:ECHR:1998:0525JUD002123793, § 41), e de 13 de fevereiro de 2003, Refah Partisi (Partido do Bem‑Estar) e outros c. Turquia (CE:ECHR:2003:0213JUD004134098, §§ 86 a 89).


21      A seguir, «Orientações da Comissão de Veneza». V. 2.a edição destas orientações (Estudo n.° 881/2017). A Comissão refere‑se aos comentários constantes do ponto 1 (p. 5), bem como aos pontos 17 e 18 (p. 9). Relativamente à ligação que os partidos constituem entre os cidadãos e os titulares dos cargos públicos, esta instituição refere o ponto 18 (p. 8).


22      V. n.os 51 e 52 das presentes conclusões.


23      A Comissão salienta, a este respeito, que o argumento da República Checa relativo às disposições do artigo 5.°, n.° 3, da Diretiva 94/80 está mal fundamentado. Em resposta ao articulado de intervenção da República da Polónia, a Comissão alega que uma proibição generalizada de se filiar num partido político vai além das restrições admitidas pelo direito derivado.


24      N.° 53 deste acórdão.


25      A mesma faz referência ao Acórdão do TEDH, de 27 de abril de 1995, Piermont c. França (CE:ECHR:1995:0427JUD001577389, § 64), segundo o qual os Estados‑Membros da União não se podem prevalecer desta disposição contra os nacionais de outros Estados‑Membros que invocam os direitos que lhes são conferidos pelos tratados.


26      V. nota 33 das presentes conclusões. A Comissão precisa que, com esta decisão, se negou provimento ao recurso do partido político evropani.cz da decisão do Ministerstva vnitra (Ministério do Interior, República Checa) que recusou registar uma alteração ao estatuto deste partido político que visava autorizar a filiação de cidadãos da União titulares de uma autorização de residência permanente na República Checa.


27      A Comissão remete para os documentos referidos nas notas 71 e 72 das presentes conclusões.


28      No seu articulado de defesa, a título preliminar, a República Checa considera que o objetivo da presente ação é de ordem política, uma vez que visa assegurar uma maior participação dos cidadãos «móveis» da União na vida política europeia, incluindo o seu direito de voto nas eleições nacionais ou regionais. Este Estado‑Membro refere, a título de exemplo, o quarto relatório da Comissão sobre a cidadania da União (1 de maio de 2001 — 30 de abril de 2004) [COM(2004) 695 final], p. 11, ou o relatório da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões sobre a aplicação da Diretiva 94/80/CE que estabelece as regras de exercício do direito de voto e de elegibilidade nas eleições municipais, de 25 de janeiro de 2018 [COM(2018) 44 final], p. 12.


29      As citações que constam do articulado de defesa correspondem aos considerandos 4 a 6 da primeira destas diretivas e ao considerando 5 da segunda.


30      A República Checa sublinha que o Tribunal de Justiça interpretou neste sentido o artigo 19.°, n.° 2, CE e cita o Acórdão Eman e Sevinger (n.° 53).


31      Na sua tréplica, a República Checa sublinha que, por esta expressão, o artigo 22.° TFUE deve distinguir‑se, por exemplo, do artigo 59.° TFUE que faz referência à adoção de disposições de direito derivado com vista a «realizar» progressivamente a liberalização de um determinado tipo de serviços. Este Estado‑Membro deduz daqui que o exercício da livre prestação de serviços não depende diretamente da adoção de uma regulamentação derivada.


32      Por outras palavras, segundo a República Checa, este artigo 4.°, n.° 2, TUE não serve para restringir o teor do artigo 22.° TFUE, pelo facto de este não ter o alcance alegado pela Comissão, o que permite «aos Estados‑Membros adotar as regras que melhor se adaptem à sua estrutura constitucional». Este Estado‑Membro faz referência ao Acórdão Eman e Sevinger (n.° 50).


33      A este respeito, a República Checa cita, a título de exemplo, o Acórdão do Nejvyšší správní soud (Supremo Tribunal Administrativo), de 10 de janeiro de 2018, 6 As 84/2017‑27. Em resposta às observações da Comissão (v. n.º 48 das presentes conclusões), esta precisa que, na falta de decisão do Ústavní soud (Tribunal Constitucional), esta jurisprudência é determinante para a interpretação do direito da União.


34      Em apoio deste argumento, a República da Polónia alega que a interpretação desta disposição defendida pela Comissão é contrária ao princípio da atribuição, tal como enunciado no artigo 5.°, n.° 2, TUE.


35      V. n.os 29 e 37 das presentes conclusões relativos à admissibilidade desta ação.


36      V. nota 30 das presentes conclusões.


37      A República Checa refere o Acórdão de 12 de maio de 1998, Martínez Sala (C‑85/96, EU:C:1998:217, n.os 58, 59 e 63).


38      A República Checa refere‑se ao Acórdão de 30 de maio de 1989, Comissão/Grécia (305/87, EU:C:1989:218, n.° 28), precisando que «[e]ntre estas disposições particulares figuram, nomeadamente, as disposições que consagram as liberdades, a saber, os artigos 34.°, 45.°, 49.°, 56.° e 63.° TFUE, mas igualmente outras disposições tais como o artigo 54.° ou o artigo 94.° TFUE e, por último, o artigo 22.° TFUE».


39      Segundo este Estado‑Membro, esta abordagem foi adotada pelo Tribunal de Justiça no Acórdão de 29 de junho de 1999, Comissão/Bélgica (C‑172/98, EU:C:1999:335, n.° 12), ao declarar que a condição da nacionalidade para o reconhecimento da personalidade jurídica das associações afeta as liberdades fundamentais do mercado interno e, por conseguinte, está abrangido pela proibição geral da discriminação na aceção do artigo 6.°, do Tratado CE, atual artigo 18.° TFUE. A República Checa salienta que a liberdade de estabelecimento enquanto disposição específica do direito primário em matéria de proibição das discriminações não foi adotada neste processo.


40      V., em matéria eleitoral, no que respeita à determinação dos titulares dos direitos eleitorais, Acórdãos Eman e Sevinger (n.os 45 e 52), e de 6 de outubro de 2015, Delvigne (C‑650/13, EU:C:2015:648, n.° 42). V., também, no que respeita aos direitos inerentes à cidadania da União, Acórdão de 14 de dezembro de 2021, Stolichna obshtina, rayon «Pancharevo» (C‑490/20, EU:C:2021:1008, n.° 52). V., por último, no que respeita aos valores da União, Acórdão de 5 de junho de 2023, Comissão/Polónia (Independência e vida privada dos juízes) (C‑204/21, EU:C:2023:442, n.os 64 a 67 e jurisprudência referida).


41      O Tribunal de Justiça declarou que decorre do artigo 8.°, primeiro parágrafo e do artigo 12.° do Ato de 20 de setembro de 1976 relativo à eleição dos representantes ao Parlamento Europeu por sufrágio universal direto (JO 1976, L 278, p. 5), que especifica os princípios comuns aplicáveis ao processo de eleição dos membros do Parlamento Europeu por sufrágio universal direto, que os Estados‑Membros continuam em princípio a ser competentes para regulamentar o processo eleitoral. V. Acórdão de 19 de dezembro de 2019, Junqueras Vies (C‑502/19, EU:C:2019:1115, n.os 67 a 69).


42      V., neste sentido, Acórdão de 16 de junho de 2022, Comissão/Áustria (Indexação das prestações familiares) (C‑328/20, EU:C:2022:468, n.° 57).


43      V. artigo 22.° TFUE in fine, e o quarto e sexto considerandos da Diretiva 93/109, bem como o quarto e quinto considerandos da Diretiva 94/80. Estas diretivas especificam as condições comuns do exercício do direito de voto e da elegibilidade relativas, por exemplo, à cidadania da União e ao período de residência fixado pelo Estado‑Membro de residência, as modalidades de inscrição nos cadernos eleitorais e de declaração de candidatura e os casos de exclusão.


44      Quanto à qualificação de «estatuto fundamental», v., nomeadamente, Acórdão de 9 de junho de 2022, Préfet du Gers e Institut national de la statistique et des études économiques (C‑673/20, EU:C:2022:449, n.° 49 e jurisprudência referida).


45      V. primeiro a terceiro considerandos das Diretivas 93/109 e 94/180. Segundo Shaw, J., «Sovereignty at the Boundaries of the Polity», em Walker, N., Sovereignty in Transition, Hart Publishing, Londres, 2003, pp. 461 a 500, em particular p. 471, as disposições relativas aos direitos eleitorais representam uma grande parte da mais‑valia das disposições do Tratado de Maastricht. Com efeito, a possibilidade de participar nas eleições diretas para o Parlamento Europeu existe desde o Ato de 20 de setembro de 1976 (v. nota 41 das presentes conclusões). Só desde a entrada em vigor do Tratado de Maastricht é que este direito é regulado pelo Tratado CE, no artigo 8.º‑ B, subsequentemente, no artigo 19.° CE, e no artigo 22.° TFUE. V., para uma recapitulação do histórico legislativo, Khadar, L., e Shaw, J., «Article 39», em Peers, S., Hervey, T., Kenner, J., e Ward, A., The EU Charter of Fundamental Rights: A Commentary, 2.a ed., Hart Publishing, Oxford, 2021, pp. 1085 a 1112, em particular pontos 39.33 e 39.34 (p. 1093 e 1094). O mesmo se aplica às eleições municipais desde este Tratado. Para uma recapitulação histórica pormenorizada, v. Groenendijk, K., «Article 40», The EU Charter of Fundamental Rights: A Commentary, op. cit., pp. 1113 a 1123, em particular ponto 40.17 (p. 1118). V., no que respeita ao artigo 19.° CE, Acórdão de 12 de setembro de 2006, Espanha/Reino Unido (C‑145/04, EU:C:2006:543, n.° 66), e, no mesmo sentido, Acórdão de 6 de outubro de 2015, Delvigne (C‑650/13, EU:C:2015:648, n.° 42).


46      V. terceiros considerandos das Diretivas 93/109 e 94/80, bem como, neste sentido, Acórdão de 9 de junho de 2022, Préfet du Gers e Institut national de la statistique et des études économiques (C‑673/20, EU:C:2022:449, n.° 50).


47      De acordo com o artigo 6.° TUE, n.° 1, esta tem o mesmo valor jurídico que os tratados.


48      Segundo as Anotações relativas à Carta dos Direitos Fundamentais (JO 2007, C 303, p. 17) (a seguir, «Anotações relativas à Carta»), «o n.° 1 do artigo 39.° corresponde ao direito garantido no artigo 20.°, n.° 2, TFUE», e o artigo 22.° TFUE constitui a base jurídica da adoção das modalidades de exercício deste direito.


49      Segundo as Anotações relativas à Carta, este artigo «corresponde ao direito garantido no artigo 20.°, n.° 2, TFUE», e o artigo 22.° TFUE constitui a base jurídica da adoção das modalidades de exercício deste direito. V. Acórdão de 9 de junho de 2022, Préfet du Gers e Institut national de la statistique et des études économiques (C‑673/20, EU:C:2022:449, n.° 51).


50      V. Acórdão de 20 de setembro de 2001, Grzelczyk (C‑184/99, EU:C:2001:458, n.° 31).


51      V. artigo 2.° TUE. V., a este respeito, Acórdão de 5 de junho de 2023, Comissão/Polónia (Independência e vida privada dos juízes) (C‑204/21, EU:C:2023:442, n.os 64 e 67, e jurisprudência referida), a comparar com o Acórdão de 18 de junho de 2020, Comissão/Hungria (Transparência associativa) [(C‑78/18, EU:C:2020:476, n.° 112), baseado na ligação implícita entre três valores enunciados no artigo 2.° TUE, a saber, a democracia, o Estado de direito e o respeito dos direitos fundamentais]. Quanto ao poder de fiscalização das instituições, v. Acórdão de 16 de fevereiro de 2022, Hungria/Parlamento e Conselho (C‑156/21, EU:C:2022:97, n.° 159).


52      O Tribunal de Justiça declarou que o artigo 10.°, n.° 1, TUE concretiza o valor de democracia referido no artigo 2.° TUE. V. Acórdão de 19 de dezembro de 2019, Junqueras Vies (C‑502/19, EU:C:2019:1115, n.° 63).


53      V. décimo considerando e artigo 14.°, n.° 1, segundo parágrafo, da Diretiva 93/109, bem como décimo quarto considerando e artigo 12.°, n.° 1, alínea c), da Diretiva 94/80. V., também, quanto à importância deste fator, Shaw, J., «Sovereignty at the Boundaries of the Polity», op. cit., p. 478, segundo a qual «[o]s direitos eleitorais [...] são direitos complementares à migração dos cidadãos da União, direitos esses que devem ser estabelecidos pela União que atua como um conjunto político protetor para favorecer um sentimento mais profundo de implicação por parte do migrante da União no Estado de acolhimento e em certos aspetos da sua cultura política, e para limitar o prejuízo quanto à perda de direitos políticos de que o migrante pode ser vítima devido à saída do seu Estado de origem» (tradução livre).


54      Segundo jurisprudência constante, as regras de igualdade de tratamento entre nacionais e não nacionais proíbem não só as discriminações ostensivas em razão da nacionalidade, mas também todas as formas dissimuladas de discriminação que, mediante a aplicação de outros critérios de distinção, conduzam efetivamente ao mesmo resultado. V. Acórdão de 2 de fevereiro de 2023, Freikirche der Siebenten‑Tags‑Adventisten in Deutschland (C‑372/21, EU:C:2023:59, n.° 29).


55      V., neste sentido, sexto considerando da Diretiva 93/109 e quinto considerando da Diretiva 94/80.


56      V. Acórdão de 11 de junho de 2020, TÜV Rheinland LGA Products e Allianz IARD (C‑581/18, EU:C:2020:453, n.° 33 e jurisprudência referida).


57      V. Acórdão de 9 de junho de 2022, Préfet du Gers e Institut national de la statistique et des études économiques (C‑673/20, EU:C:2022:449, n.° 48).


58      V., especialmente, n.os 17 e 18 (p. 9).


59      V., a este respeito, quanto ao financiamento e ao acesso aos meios de comunicação social, Orientações da Comissão de Veneza, n.° 185 (pp. 59 e 60).


60      V. n.º 44 das presentes conclusões. V., igualmente, Acórdão do TEDH, 8 de julho de 2008, Yumak e Sadak c. Turquia (CE:ECHR:2008:0708JUD001022603, § 107 e jurisprudência referida). Na sua jurisprudência constante, o TEDH sublinha que o debate político, para o qual contribuem os partidos políticos, «está no próprio cerne do conceito de sociedade democrática».


61      Esta disposição é relativa aos partidos políticos europeus. Os termos do artigo 191.°, primeiro parágrafo, CE estão nela, em substância, reproduzidos.


62      V. Anotações relativas à Carta.


63      Quanto à ligação estabelecida entre os artigos 39.° e 40.° da Carta e o seu artigo 12.°, n.° 2, relativo ao papel dos partidos políticos, v. Costa, O., «Article 39 — Droit de vote et d’éligibilité aux élections municipales et au Parlement européen», em Picod, F., Rizcallah, C., Van Drooghenbroeck, S., Charte des droits fondamentaux de l’Union européenne: commentaire article par article, 3.a ed., Bruylant, Bruxelas, 2023, p. 1043 a 1068, em particular ponto 6 (p. 1048), e, na mesma obra, Ducoulombier, P., «Article 12 — Liberté de réunion et d’association», pp. 313 a 327, em particular ponto 6 (pp. 317 e 318). V., igualmente, Shaw, J., e Khadar, L., op. cit., n.° 39.04 (p. 1087), bem como Groenendijk, K., op. cit., ponto 40.26 (p. 1120).


64      V. n.º 72 das presentes conclusões.


65      Este artigo corresponde ao artigo 10.° da CEDH. V. Anotações relativas à Carta.


66      V., igualmente, a este respeito, artigo 3.° do Protocolo n.° 1 da CEDH, bem como Acórdão do TEDH, de 18 de fevereiro de 1999, Matthews c. Reino Unido (CE:ECHR:1999:0218JUD002483394, § 44), no que respeita à aplicação desta disposição às eleições dos membros do Parlamento Europeu.


67      V. Acórdão de 18 de junho de 2020, Comissão/Hungria (Transparência associativa) (C‑78/18, EU:C:2020:476, n.os 111 a 114).


68      V. Acórdão do TEDH, de 30 de janeiro de 1998, Partido Comunista Unificado da Turquia e outros c. Turquia (CE:ECHR:1998:0130JUD001939292, § 25). É nele precisado que «os partidos políticos representam uma forma de associação essencial ao bom funcionamento da democracia. Tendo em conta a importância desta no sistema da [CEDH] [...], não pode haver nenhuma dúvida de que são abrangidos pelo artigo 11.°». No que respeita à importância da participação dos cidadãos na vida pública num quadro mais amplo, v., nomeadamente, Acórdãos do TEDH, de 17 de fevereiro de 2004, Gorzelik e outros c. Polónia (CE:ECHR:2004:0217JUD004415898, §§ 88, 90 e 92), e de 8 de outubro de 2009, Tebieti Mühafize Cemiyyeti e Israfilov c. Azerbeijão (CE:ECHR:2009:1008JUD003708303, §§ 52 e 53).


69      Trata‑se do artigo 65.° da Lei relativa às Eleições para o Parlamento Europeu e do artigo 85.° da zákon č. 247/1995 Sb. o volbách do Parlamentu České republiky a o změně a doplnění některých dalších zákonů (Lei n.° 247/1995 relativa às Eleições para o Parlamento da República Checa e que altera e completa determinadas leis), de 27 de setembro de 1995, e do artigo 20.°, n.os 5 a 8, da Lei relativa aos Partidos Políticos. V., para uma recapitulação pormenorizada do conteúdo destas disposições, anexo I das presentes conclusões.


70      A Comissão refere‑se ao artigo 21.°, n.° 4, e ao anexo da Lei relativa àsEleições para os Conselhos Municipais.


71      A Comissão baseia‑se na opinião de Antoš, M., «Politická participace cizinců v České republice», Politologický časopis, Masarykova univerzita, Brno, 2012, n.° 2, pp. 113 a 127, em particular pp. 123 e 124.


72      A mesma faz referência ao comunicado de imprensa do gabinete checo do defensor público dos direitos de 23 de julho de 2014, intitulado «Občané EU žijící v ČR mají právo účastnit se politického života» (Os cidadãos da União Europeia que residem na República Checa têm o direito de participar na vida política), disponível no seguinte endereço Internet: https://www.ochrance.cz/aktualne/obcane‑eu‑zijici‑v‑cr‑maji‑pravo‑ucastnit‑se‑politickeho‑zivota, último parágrafo.


73      Não obstante, a Comissão faz referência ao Relatório de avaliação de impacto que acompanha a Proposta de diretiva do Conselho, apresentados em 25 de novembro de 2021 que estabelece o sistema de exercício do direito de voto e de elegibilidade nas eleições para o Parlamento Europeu dos cidadãos da União residentes num Estado‑Membro de que não tenham a nacionalidade [documento de trabalho SWD(2021) 357 final]. Esta observa que nele se indica que, aquando da consulta pública, e embora esta apenas tenha tido uma resposta limitada junto do público, foi encontrado pelo menos um contribuidor que afirma ter tentado apresentar‑se a eleições para o Parlamento Europeu noutro Estado‑Membro e ter‑se deparado com a impossibilidade de fundar um partido político ou de filiação num partido político existente.


74      V. anexo II das presentes conclusões.


75      A Comissão salienta que as pessoas referidas são de nacionalidade checa. Trata‑se, por exemplo, do único cosmonauta checo (Vladimír Remek), de um antigo Ministro dos Negócios Estrangeiros (Josef Zieleniec), de uma conhecida ex‑embaixadora checa no Qatar e no Kuwait (Jana Hybášková), de um membro de longa data do Conselho de Administração do Česká národní banka (Banco nacional checo), conhecido na comunicação social e ainda do antigo vice‑governador deste banco (Luděk Niedermayer), de um antigo Ministro da Justiça (Jiří Pospíšil), ou ainda de uma sumidade universitária popular e conhecida na comunicação social (Jan Keller). Quanto a Franz Stros, nacional alemão, eleito para o Parlamento Europeu, a Comissão recorda que se trata de um homem de letras, antigo cidadão checoslovaco.


76      A República da Polónia, interveniente, sublinha que os candidatos «não filiados» num partido, incluindo os cidadãos «móveis» da União, beneficiam de uma garantia total de acesso a todas as formas de candidatura previstas pela lei checa e que, na prática, a escolha de apresentar candidatos nas listas dos partidos políticos depende unicamente da vontade mútua de cooperar.


77      A República Checa recorda a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa ao ónus da prova que incumbe à Comissão e refere o Acórdão de 14 de março de 2019, Comissão/República Checa (C‑399/17, EU:C:2019:200, n.° 51).


78      V. anexo II das presentes conclusões. A República Checa precisa, na sua tréplica, que não faz sentido distinguir entre cidadãos checos e não checos, uma vez que é frequente os candidatos às eleições «não terem filiação política» e que o seu estatuto não difere de modo algum em função da sua nacionalidade. Esta contesta a forma como a Comissão relativiza as informações sobre os sucessos eleitorais de determinados candidatos (v. n.º 99 das presentes conclusões).


79      V. Acórdão de 18 de junho de 2020, Comissão/Hungria (Transparência associativa) (C‑78/18, EU:C:2020:476, n.° 37).


80      Estes são analisados no mesmo sentido pela República da Polónia.


81      V., nomeadamente, n.º 93 das presentes conclusões no que respeita às condições legais para as eleições municipais, invocadas pela Comissão, não contestadas pela República Checa, bem como documentos referidos nas notas 71 e 72 das mesmas.


82      Em resposta aos argumentos desenvolvidos pela República da Polónia (v. n.º 123 das presentes conclusões), a Comissão deduz dos mesmos que esta justificação também engloba a situação em que os cidadãos «móveis» da União elegem para os órgãos internos dos partidos políticos os nacionais dos Estados‑Membros de acolhimento, que interfeririam de forma inapropriada nos domínios reservados aos Estados‑Membros.


83      Segundo a Comissão, este limite demonstra que o respeito da identidade nacional «está plenamente refletido no artigo 22.° TFUE».


84      A Comissão refere os Acórdãos de 8 de maio de 2003, ATRAL (C‑14/02, EU:C:2003:265, n.° 69), e de 18 de junho de 2020, Comissão/Hungria (Transparência associativa) (C‑78/18, EU:C:2020:476, n.os 76 e 77), bem como o Acórdão de 22 de dezembro de 2010, Sayn‑Wittgenstein (C‑208/09, EU:C:2010:806, n.os 81 e 90).


85      Trata‑se do Acórdão de 27 de abril de 2006, Comissão/Alemanha (C‑441/02, EU:C:2006:253, n.° 108). Segundo a República Checa, a Comissão faz uma leitura errada deste ponto em razão da sua redação, da qual aquela sublinha a última parte, a saber: «[s]ó se podem invocar razões de interesse geral para justificar uma medida nacional  que seja suscetível de entravar o exercício das liberdades fundamentais [garantidas pelo Tratado] se a medida em causa tiver em conta esses direitos».


86      V., neste sentido, quinto considerando da Diretiva 93/109 e quarto considerando da Diretiva 94/80. V., igualmente, Acórdão Eman e Sevinger (n.os 52 e 53).


87      V. n.º 77 das presentes conclusões. V., a este respeito, a propósito da restrição do acesso a determinadas funções aos cidadãos nacionais e da participação nas eleições para a assembleia parlamentar, quinto e décimo considerandos, bem como artigo 5.°, n.os 3 e 4, da Diretiva 94/80. Quanto às regulamentações dos Estados‑Membros no âmbito desta margem de manobra, v. Relatório de avaliação de impacto referido na nota 73 das presentes conclusões, n.° 1.3.6 (p. 20), e Análise de Blacher, P., «Article 40 — Droit de vote et d’éligibilité aux élections municipales», em Picod, F., Rizcallah, C., Van Drooghenbroeck, S., op. cit., pp. 1069 a 1088, em especial, ponto 16 (pp. 1083 e 1084). No que respeita às limitações ao direito de voto e de elegibilidade, de modo particular em função da proporção de cidadãos «móveis» da União no Estado‑Membro de residência e dos períodos de residência, v. artigo 14.° da Diretiva 93/109 e artigo 12.° da Diretiva 94/80. V., igualmente, comentários de Shaw, J., e Khadar, L., op. cit., n.° 39.74 (p. 1104), no que respeita às eleições para o Parlamento Europeu, bem como de Groenendijk, K., op. cit., n.os 40.27 e 40.28 (p. 1121), quanto às eleições municipais.


88      V., a este respeito, Orientações da Comissão de Veneza, n.os 153 e 155 (pp. 49 e 50). V., igualmente, a título exemplificativo, Relatório de Alina Ostling financiado pelo Programa Direitos, Igualdade e Cidadania (2014‑2020) da Comissão, intitulado «Fair EU Synthesis report: Electoral Rights for Mobile EU Citizens — Challenges and Facilitators of Implementation», ponto 4.1.2 (p. 27).


89      V. Acórdão de 5 de junho de 2023, Comissão/Polónia (Independência e vida privada dos juízes) (C‑204/21, EU:C:2023:442, n.° 72).


90      V. segundo e quinto considerandos do preâmbulo da Carta.


91      No que respeita ao alcance deste artigo, há que remeter para os n.os 74, 84 e 87 das presentes conclusões.


92      V., neste sentido, Acórdãos de 16 de fevereiro de 2022, Hungria/Parlamento e Conselho (C‑156/21, EU:C:2022:97, n.° 127), e de 16 de fevereiro de 2022, Polónia/Parlamento e Conselho (C‑157/21, EU:C:2022:98, n.° 145). V. Acórdão de 5 de junho de 2023, Comissão/Polónia (Independência e vida privada dos juízes) (C‑204/21, EU:C:2023:442, n.° 72).


93      Contrariamente ao que sustenta a República Checa, há que concluir, em conformidade com o artigo 52.°, n.° 2, da Carta, que, contrariamente a outros artigos do Tratado, tais como, por exemplo, o artigo 45.°, n.° 3 e o artigo 65.°, n.° 2, TFUE, este artigo 22.° não prevê que, além dos atos de direito derivado adotados com fundamento no mesmo, os Estados‑Membros possam adotar medidas suscetíveis de entravarem os direitos eleitorais dos cidadãos «móveis» da União.


94      V. artigo 1.°, n.° 1, e artigo 3.°, primeiro parágrafo, da Diretiva 93/109, bem como artigo 1.°, n.° 1, e artigo 3.° da Diretiva 94/80. V., igualmente, n.º 127 das presentes conclusões.