Language of document : ECLI:EU:T:2003:269

DESPACHO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção)

15 de Outubro de 2003 (1)

«Cooperação para o desenvolvimento - Serviço de Ajuda Humanitária da Comunidade Europeia (ECHO) - Contrato-quadro de parceria para o co-financiamento de actividades desenvolvidas por ONG - Rejeição da candidatura da recorrente - Recurso de anulação - Inadmissibilidade»

No processo T-372/02,

Internationaler Hilfsfonds eV, com sede em Rosbach (Alemanha), representada por H. Kaltenecker, advogado,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por M. Wilderspin e S. Fries, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida,

que tem por objecto, em primeiro lugar, um pedido de anulação da decisão da Comissão de 22 de Outubro de 2002 que indeferiu o pedido da recorrente no sentido de subscrever um contrato-quadro de parceria com o Serviço de Ajuda Humanitária da Comunidade Europeia (ECHO), em segundo lugar, um pedido destinado a que a Comissão seja obrigada a repor a recorrente na situação em que se encontrava em 1996 quando apresentou o seu pedido de subscrição de um contrato-quadro de parceria, ou, a título subsidiário, convidar a recorrente a subscrever o contrato-quadro de parceria actualmente em vigor e, em terceiro lugar, um pedido destinado a que a Comissão seja obrigada a reembolsar à recorrente as despesas correspondentes à queixa que apresentou ao Provedor de Justiça Europeu,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quinta Secção),

composto por: P. Lindh, presidente, R. García-Valdecasas e J. D. Cooke, juízes,

secretário: H. Jung,

profere o presente

Despacho

Enquadramento jurídico

1.
    O Serviço de Ajuda Humanitária da Comunidade Europeia (ECHO) foi criado por decisão da Comissão de 6 de Novembro de 1991, com a finalidade de permitir à Comunidade atribuir um auxílio eficaz em situações de crise humanitária. Para realizar a sua missão, o ECHO financia projectos humanitários executados por organizações não governamentais (ONG), organizações internacionais ou agências especializadas dos Estados-Membros.

2.
    O contrato-quadro de parceria (a seguir «CQP») é um instrumento de gestão de acções humanitárias que tem como objectivo estabelecer laços estreitos entre o ECHO e os seus parceiros e definir as respectivas funções e responsabilidades na execução das operações humanitárias financiadas pela Comunidade. Contém as condições gerais aplicáveis a todas as convenções de subvenção celebradas entre o ECHO e os seus parceiros que executam os projectos. O CQP permite também ao ECHO verificar se as ONG suas potenciais parceiras satisfazem um determinado número de critérios objectivos. Esta verificação é efectuada no momento do exame dos pedidos de subscrição do CQP. As organizações aprovadas no âmbito deste procedimento de pré-selecção são convidadas a subscrever um contrato-tipo e comprometem-se com as condições nele estabelecidas.

3.
    O CQP é celebrado para um período determinado, podendo ser prorrogado. O primeiro CQP foi celebrado em 1993 e manteve-se em vigor até Dezembro de 1998.

4.
    Em 20 de Junho de 1996, o Conselho adoptou o Regulamento (CE) n.° 1257/96 relativo à ajuda humanitária (JO L 163, p. 1). Este regulamento estabelece o enquadramento legislativo comunitário relativamente à atribuição e pagamento de uma ajuda humanitária. O n.° 2 do artigo 16.° do mesmo regulamento refere que o CQP é um «dos instrumentos de gestão das acções humanitárias».

5.
    O artigo 6.° do Regulamento n.° 1257/96 dispõe o seguinte:

«As acções de ajuda humanitária financiadas pela Comunidade podem ser executadas a pedido de organismos e organizações internacionais ou não governamentais de um Estado-Membro ou do país terceiro, ou por iniciativa da Comissão.»

6.
    Nos termos do artigo 7.° do Regulamento n.° 1257/96:

«1.    As organizações não governamentais que podem beneficiar de um financiamento comunitário para a execução das acções previstas no presente regulamento devem preencher os seguintes critérios:

a)    Estarem constituídas em organizações autónomas e sem fins lucrativos num Estado-Membro da Comunidade, segundo a legislação em vigor nesse Estado;

b)    Ter a sua sede principal num Estado-Membro da Comunidade ou nos países terceiros beneficiários da ajuda da Comunidade, devendo a referida sede constituir o centro efectivo de todas as decisões relativas às acções financiadas ao abrigo do presente regulamento. A título excepcional, a sede pode estar situada noutro país terceiro doador.

2.    Para determinar se uma organização não governamental pode ter acesso ao financiamento comunitário, serão tidos em consideração os seguintes elementos:

a)    A sua capacidade de gestão administrativa e financeira;

b)    A sua capacidade técnica e logística em relação à acção prevista;

c)    A sua experiência no domínio da ajuda humanitária;

d)    Os resultados das acções anteriormente executadas pela organização em questão, nomeadamente com financiamento comunitário;

e)    A sua disponibilidade para participar, se necessário, no sistema de coordenação instituído no âmbito de uma acção humanitária;

f)    A sua capacidade e disponibilidade para desenvolver a cooperação com os agentes humanitários e as comunidades de base nos países terceiros em questão;

g)    A sua imparcialidade na prestação da ajuda humanitária;

h)    A sua eventual experiência anterior no país terceiro visado pela acção humanitária em causa.»

7.
    O artigo 12.° do Regulamento n.° 1257/96 estipula:

«Qualquer contrato de financiamento celebrado ao abrigo do presente regulamento deve prever nomeadamente que a Comissão e o Tribunal de Contas possam proceder a controlos no local e na sede dos parceiros da ajuda humanitária, segundo as regras habituais definidas pela Comissão no âmbito das disposições em vigor, em especial as do Regulamento Financeiro aplicável ao orçamento geral das Comunidades Europeias.»

8.
    O artigo 14.° do Regulamento n.° 1257/96 dispõe:

«A Comissão será responsável pela instrução, decisão, gestão, acompanhamento e avaliação das acções referidas no presente regulamento, segundo os procedimentos orçamentais e outros em vigor, e nomeadamente os previstos no Regulamento Financeiro aplicável ao orçamento geral das Comunidades Europeias.»

9.
    Após ter adoptado este regulamento, a Comissão procedeu à reapreciação do primeiro CQP, tendo decidido adoptar um segundo CQP, que prevê outro processo de selecção. Este segundo CQP foi adoptado em Março de 1998 e entrou em vigor em Janeiro de 1999.

Matéria de facto na origem do litígio

10.
    A Internationaler Hilfsfonds eV (a seguir «recorrente» ou «IH») é uma ONG de direito alemão que desenvolve a sua actividade no domínio da ajuda humanitária. Nomeadamente, dá assistência a refugiados e a vítimas de guerras e de catástrofes.

11.
    Por carta de 9 de Fevereiro de 1995, a recorrente solicitou ao ECHO uma cópia do CQP e transmitiu determinadas informações a seu respeito. Na sequência dessa carta, o ECHO enviou, em 16 de Fevereiro de 1995, ao Auswärtiges Amt (Ministério Federal Alemão dos Negócios Estrangeiros) uma telecópia solicitando informações e referências sobre a IH. Em resposta, o Auswärtiges Amt indicou, em 15 de Março de 1995, que as actividades da IH «[foram] objecto de procedimentos judiciais». Em 26 de Outubro de 1995, o ECHO reiterou às autoridades alemãs o seu pedido de informações. Decorre de uma nota interna de 17 de Novembro de 1995, de R. Cox, consultor no ECHO, que os serviços alemães competentes informaram que não trabalhavam com a IH e que, por conseguinte, não a conheciam.

12.
    Em 20 de Março de 1996, a recorrente apresentou formalmente um pedido de subscrição do CQP.

13.
    Em 12 de Julho de 1996, R. Cox enviou à recorrente uma carta afirmando que:

«[...]

Actualmente, estão em estudo projectos que visam alargar o número dos nossos parceiros. Além disso, estamos também a trabalhar na elaboração de um novo sistema de avaliação das potenciais ONG parceiras, que será baseado num novo regulamento do Conselho relativo à ajuda humanitária adoptado em Junho de 1996.

Sublinho também que o [CQP] está a ser revisto com a finalidade de identificar os aperfeiçoamentos e as alterações que sejam necessárias à luz do novo regulamento.

No entanto, tomámos devida nota do vosso pedido e não deixaremos de vos manter ao corrente dos futuros desenvolvimentos.

[...]»

14.
    Tendo o primeiro CQP terminado em Dezembro de 1998, o pedido de subscrição deste último, apresentado pela recorrente, «caducou», segundo a Comissão, juntamente com os outros pedidos pendentes.

15.
    Na sequência da entrada em vigor do segundo CQP, em 1 de Janeiro de 1999, o ECHO decidiu considerar os pedidos de subscrição do primeiro CQP, ainda pendentes, como novos pedidos para o segundo CQP. Por carta de 1 de Junho de 1999, o ECHO informou a recorrente da entrada em vigor do segundo CQP e do novo processo aplicável. Informou também a recorrente de que a sua candidatura seria apreciada no âmbito da terceira fase deste processo.

16.
    Por carta de 14 de Dezembro de 2000, o ECHO informou a recorrente de que podia agora analisar o seu pedido de subscrição do segundo CQP, solicitando-lhe a apresentação de uma série de documentos. A recorrente não deu seguimento a este pedido.

17.
    Por carta de 23 de Janeiro de 2001, o ECHO informou a recorrente de que tencionava realizar uma auditoria à sede desta a fim de verificar se preenchia os critérios de elegibilidade fixados no artigo 7.° do Regulamento n.° 1257/96. Quando de contactos levados a cabo por via telefónica e postal, a recorrente recusou repetidamente submeter-se à referida auditoria.

18.
    Nestas circunstâncias, em 19 de Julho de 2001, o ECHO enviou à recorrente uma carta do seguinte teor:

«Em resposta à vossa carta de 6 de Julho de 2001, vimos por este meio esclarecer definitivamente a posição do ECHO relativamente à candidatura apresentada pela [IH] com vista à celebração de um [CQP].

A celebração de um [CQP] com o ECHO pressupõe o respeito de determinado número de obrigações por parte dos candidatos bem como a realização, pelo ECHO, de verificações indispensáveis, em colaboração com as autoridades nacionais dos Estados-Membros. Estas verificações podem implicar a realização das auditorias que forem consideradas indispensáveis para apurar se o potencial parceiro satisfaz o disposto no artigo 7.° do Regulamento [...] n.° 1257/96 [...]. A adopção e a execução destas medidas de controlo são parte integrante do nosso trabalho.

Como é do vosso conhecimento, o Auswärtiges Amt é a entidade alemã que tem a seu cargo fornecer informações sobre as organizações de ajuda humanitária na Alemanha. O ECHO consultou devidamente essa entidade para tal efeito, em 1995, no seguimento da recepção da vossa candidatura à celebração do [CQP]. Na falta de resposta positiva por parte das autoridades alemãs, a candidatura da IH não pôde ser examinada.

Em 1999, na altura da entrada em vigor do novo [CQP], o ECHO reabriu o processo da vossa candidatura e decidiu realizar uma auditoria, que é o procedimento normal em relação a todos os candidatos quando as autoridades nacionais não confirmam que estes satisfazem o disposto no artigo 7.°

O ECHO propôs-se efectuar uma auditoria à vossa organização, tendo-vos informado dessa decisão em 23 de Janeiro de 2001. Foram sugeridas duas datas para o efeito: 22 e 23 de Fevereiro. A nossa proposta não teve resposta. Por ocasião de outros contactos telefónicos, quando estes serviços (pelos Srs. Glatz e Buda) vos convidaram a propor datas alternativas, afigurou-se que a vossa reacção à ideia da realização de uma auditoria foi excessiva, tendo até os nossos agentes sido insultados. Em 21 de Fevereiro, o Sr. Brandt, chefe da unidade financeira do ECHO, enviou-vos uma telecópia cancelando a auditoria prevista e convidando-vos a propor uma data mais conveniente para a sua realização, pois a referida auditoria é condição essencial para a celebração de um [CQP]. A data-limite para apresentação dessa proposta era 31 de Março. Por carta de 27 de Março, foi-nos explicado que a vossa instituição já tinha sido objecto de uma auditoria realizada pelas autoridades nacionais e que tinha sido controlada por VENRO.

Não pondo em dúvida a correcção das vossas afirmações, a verdade é que o ECHO tem o direito de realizar as suas próprias auditorias.

Lamentamos que a vossa organização não tenha respondido positivamente a um pedido legítimo da nossa parte, apesar dos esforços desenvolvidos pelo ECHO para o efeito. Salientamos, além disso, que o tom ameaçador da vossa última carta e a vossa atitude para com o nosso serviço e os nossos agentes não se coaduna de modo algum com um verdadeiro espírito de parceria.

Por estas razões, vemo-nos obrigados a arquivar o vosso processo de candidatura e a dar-lhe uma resposta negativa. É enviada uma cópia da presente carta a S. Stevenson.

[...]»

19.
    Em resposta a esta carta, a recorrente enviou, em 25 de Julho de 2001, uma carta ao ECHO, criticando o tratamento por este dado ao seu processo e solicitando determinadas informações. Por carta de 27 de Agosto de 2001, o ECHO forneceu informações detalhadas sobre as razões que o levaram a rejeitar a candidatura da recorrente. Nessa mesma carta, sublinhou que o processo desta «[foi] arquivado em 19 de Julho de 2001».

20.
    Em 15 de Novembro de 2001, o Auswärtiges Amt dirigiu ao ECHO uma carta, informando-o da desistência dos procedimentos judiciais contra a recorrente, em 30 de Abril de 1996.

21.
    Em 22 de Novembro de 2001, a recorrente apresentou uma queixa ao Provedor de Justiça Europeu. Esta queixa, registada sob o número 1702/2001/GG, punha em questão vários aspectos do procedimento seguido pela Comissão no tratamento do processo da recorrente. No que diz respeito ao pedido de subscrição do segundo CQP, a recorrente salientava, nomeadamente, que o ECHO arquivara o seu processo em 19 de Julho de 2001.

22.
    O Provedor de Justiça Europeu tomou uma decisão sobre esta queixa, em 21 de Maio de 2002. Relativamente à candidatura da IH ao primeiro CQP, o Provedor de Justiça Europeu formulou os seguintes comentários críticos:

-    a decisão do ECHO de não examinar a candidatura da IH devido ao facto de faltarem referências das autoridades nacionais constitui um acto de má administração;

-    o facto de o ECHO não ter informado a IH da sua decisão de suspender o processamento da sua candidatura por falta de referências das autoridades nacionais constitui um acto de má administração;

-    o facto de o ECHO não ter examinado a candidatura da IH dentro de um prazo razoável constitui um acto de má administração;

-    o facto de o ECHO ter suspendido a candidatura da IH com base em informações recebidas das autoridades alemãs sem ter proporcionado à IH a possibilidade de comentar essas informações constitui um acto de má administração.

23.
    No entanto, como estes aspectos diziam respeito a acontecimentos passados específicos, o Provedor de Justiça Europeu concluiu que não se justificava tentar encontrar uma solução amigável e, por conseguinte, arquivou o processo.

24.
    Relativamente à candidatura da IH ao segundo CQP, o Provedor de Justiça Europeu concluiu pela razoabilidade da exigência da auditoria formulada pelo ECHO. Salientando, designadamente, que o ECHO efectuou onze auditorias desse género durante o ano de 2001, entendeu que a recorrente não demonstrou ter sido vítima de discriminação.

25.
    Em 27 de Agosto de 2002, a recorrente escreveu a P. Nielson, membro da Comissão, informando-o da decisão do Provedor de Justiça Europeu. A sua carta terminava afirmando:

«[...]

Consequentemente, a IH convida o Sr. P. Nielson a tomar as seguintes medidas:

[...]

b.    O conselho de administração entende que a IH pode legitimamente pedir para ser reintegrada nos direitos que lhe assistiam e na situação em que se encontrava na data da apresentação da sua candidatura (Março de 1996) e convidada a subscrever o novo ou o anterior [CQP].

[...]»

26.
    Em resposta a esta carta, a Sr.a Adinolfi, directora do ECHO, enviou à recorrente, em 22 de Outubro de 2002, uma carta em que afirmava (a seguir «decisão controvertida»):

«O comissário P. Nielson recebeu a vossa carta e pediu-me que respondesse em seu nome.

A Comissão recebeu e analisou o parecer do Provedor de Justiça de 21 de Maio de 2002 relativo à queixa, com a referência n.° 1702/2001/GG, apresentada pela [IH].

As observações críticas do Provedor de Justiça referem-se a acontecimentos passados, relativamente aos quais o Provedor de Justiça declarou já não ser possível encarar qualquer solução. Acresce que as observações dizem essencialmente respeito a questões de transparência que, como é sabido, estão actualmente a ser abordadas pela Comissão no âmbito de um vasto processo de reforma.

Quanto ao principal aspecto da vossa queixa, a saber, a vossa candidatura sem sucesso ao [CQP] com o ECHO, a Comissão entende dever sublinhar os seguintes elementos:

1)    O pedido apresentado com vista a que a IH seja convidada a subscrever o [CQP] de 1994 em conformidade com as disposições em vigor na data da apresentação da sua candidatura, em Março de 1996, é inadmissível pois, como este instrumento já não está em vigor, não é possível recorrer ao mesmo. Além disso, este caso diz respeito a questões que já não podem ser resolvidas.

2)    Com respeito aos desenvolvimentos recentes, o Provedor de Justiça declarou no seu parecer que a rejeição da candidatura da IH ao [CQP] actualmente em vigor foi justificada.

Passo a citar: ‘O Provedor de Justiça considera que é correcto o entendimento da Comissão segundo o qual incumbe ao ECHO verificar criteriosamente se as organizações candidatas ao [CQP] preenchem os critérios de admissibilidade. Uma auditoria afigura-se constituir um meio adequado para verificar se tal acontece. O Provedor de Justiça entende que a tese da Comissão segundo a qual o ECHO pode insistir na realização dessas auditorias é razoável [...].

Na falta de outros elementos de apreciação e tendo em conta a afirmação da Comissão de que o ECHO realizou onze auditorias deste género no ano de 2001, o Provedor de Justiça conclui que o argumento de que a queixosa foi discriminada pelo facto de o ECHO ter insistido na realização de uma auditoria no presente caso não tem fundamento. Nestas circunstâncias, não se afigura que a Comissão tenha cometido um acto de má administração no que se refere a esta alegação’.

A vossa carta não aduz elementos novos susceptíveis de provar que aceitam a realização de uma auditoria, aceitação essa indispensável para levar a Comissão a reconsiderar a sua decisão de rejeitar a candidatura da IH à celebração do [CQP] com o ECHO.

É evidente que se mantém o convite à IH para apresentar nova candidatura ao [CQP] nas condições que são do vosso conhecimento. A propósito, recordo que a aceitação da referida auditoria constitui condição prévia e incontornável de admissibilidade.

No que diz respeito às medidas disciplinares contra os agentes implicados na gestão do processo IH, solicitadas à Comissão, e conforme esta referiu na sua carta de 19 de Setembro de 2002, com a referência n.° (2002) D32992, dirigida ao vosso advogado, confirmo que nem a Comissão nem o Provedor de Justiça encontraram razões justificativas para a instauração de processos disciplinares aos agentes do ECHO.

[...]»

Tramitação processual e pedidos das partes

27.
    A recorrente interpôs o presente recurso por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 13 de Dezembro de 2002.

28.
    Em 27 de Fevereiro de 2003, a Comissão apresentou na Secretaria a sua resposta, contestando, designadamente, a inadmissibilidade do recurso.

29.
    Em 21 de Março de 2003, o Tribunal de Primeira Instância, no âmbito das medidas de instrução do processo, convidou a recorrente a apresentar observações limitadas aos fundamentos de inadmissibilidade invocados na resposta. A recorrente satisfez o solicitado por carta que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 29 de Abril de 2003.

30.
    Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 15 de Dezembro de 2001, a recorrente interpôs recurso de anulação de uma decisão da Comissão, que lhe foi comunicada por carta de 16 de Outubro de 2001, relativa ao indeferimento do pedido de co-financiamento de dois projectos apresentados, respectivamente, em Dezembro de 1996 e em Setembro de 1997. Este recurso foi registado sob o número T-321/01. O Tribunal de Primeira Instância proferiu acórdão nesse processo em 18 de Setembro de 2003 (Internationaler Hilfsfonds/Comissão, ainda não publicado na Colectânea).

31.
    A recorrente conclui pedindo que o Tribunal de Primeira Instância se digne:

-    julgar o recurso admissível;

-    anular a decisão controvertida;

-    determinar que a Comissão seja obrigada a repor a recorrente na situação em que se encontrava em 1996 quando apresentou a sua candidatura ao primeiro CQP ou, a título subsidiário, convidá-la a subscrever o segundo CQP;

-    determinar que a Comissão seja obrigada a reembolsar à recorrente as despesas correspondentes à queixa que apresentou ao Provedor de Justiça Europeu;

-    condenar a Comissão nas despesas.

32.
    A Comissão concluiu pedindo que o Tribunal de Primeira Instância se digne:

-    julgar o recurso inadmissível:

-    a título subsidiário, negar provimento ao recurso por ser manifestamente improcedente;

-    condenar a recorrente nas despesas

Quanto à admissibilidade

33.
    Nos termos do artigo 113.° do Regulamento de Processo, o Tribunal de Primeira Instância, decidindo nos termos do disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 114.° do mesmo regulamento, pode, a todo o tempo e oficiosamente, verificar se estão preenchidos os pressupostos processuais de ordem pública, entre os quais constam, segundo jurisprudência constante, as condições de admissibilidade de um recurso estabelecidas no artigo 230.°, quarto parágrafo, CE (despacho do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Julho de 1999, Area Cova e o./Conselho e Comissão, T-12/96, Colect., p. II-2301, n.° 21, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 13 de Março de 2003, Martí Peix/Comissão, T-125/01, Colect., p. II-865, n.° 40).

34.
    No caso vertente, o Tribunal de Primeira Instância considera-se suficientemente esclarecido pelos elementos dos autos e, consequentemente, decide pronunciar-se sem dar início à fase oral do processo.

35.
    Em primeiro lugar, há que analisar o primeiro pedido e, em segundo lugar, analisar em conjunto os segundo e terceiro pedidos.

Quanto ao primeiro pedido, destinado à anulação da decisão controvertida

36.
    Segundo jurisprudência assente, é inadmissível um recurso de anulação interposto de uma decisão puramente confirmativa de uma decisão anterior não impugnada dentro do prazo. Uma decisão é puramente confirmativa de uma decisão anterior quando não contenha qualquer elemento novo em relação ao acto anterior e não seja precedida de um reexame da situação do destinatário daquele acto anterior (acórdão do Tribunal de Justiça de 10 de Dezembro de 1980, Grasselli/Comissão, 23/80, Recueil, p. 3709, n.° 18; despacho do Tribunal de Primeira Instância de 4 de Maio de 1998, BEUC/Comissão, T-84/97, Colect., p. II-795, n.° 52, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 11 de Junho de 2002, AICS/Parlamento, T-365/00, Colect., p. II-2719, n.° 30).

37.
    No caso vertente, na sequência da repetida recusa da recorrente em submeter-se a uma auditoria, a Comissão, por carta de 19 de Julho, decidiu indeferir o seu pedido de subscrição do segundo CQP e arquivar o processo. Esta decisão foi confirmada pela Comissão na sua carta de 27 de Agosto de 2001.

38.
    Na decisão controvertida, adoptada em 22 de Outubro de 2002, a Comissão confirma uma vez mais a sua decisão de indeferir o pedido da recorrente de subscrever o segundo CQP.

39.
    Esta decisão não contém qualquer elemento novo relativamente à decisão de 19 de Julho de 2001.

40.
    A decisão adoptada pelo Provedor de Justiça Europeu relativamente à queixa que lhe foi apresentada pela recorrente não constitui um elemento novo. Com efeito, nesta decisão, o Provedor de Justiça Europeu confirma que a Comissão tinha o direito de exigir a realização de uma auditoria à recorrente.

41.
    Ao invés do que a recorrente afirma nas suas observações de 29 de Abril de 2003, o facto de, na decisão controvertida, a Comissão se recusar a instaurar processos disciplinares a elementos do pessoal do ECHO também não pode ser considerado um elemento novo.

42.
    Com efeito, esta decisão de recusa é nitidamente distinta da decisão de indeferimento do pedido apresentado pela recorrente no sentido de subscrever o CQP. Adoptar uma solução contrária equivaleria a admitir que uma empresa pode, mediante a simples apresentação de um pedido de instauração de processos disciplinares contra membros do pessoal da instituição responsável por uma decisão, prorrogar o prazo do recurso de anulação dessa decisão.

43.
    Seja como for, a decisão de instaurar processos disciplinares é um acto puramente interno da Comissão que não pode ser posto em causa pela recorrente no âmbito de um recurso de anulação. Note-se que, aparentemente, a recorrente teve em consideração este facto na carta que dirigiu à Comissão em 27 de Agosto de 2002.

44.
    De resto, não decorre do processo submetido ao Tribunal de Primeira Instância nem da decisão controvertida que a adopção desta tenha sido antecedida de um reexame da situação da recorrente. O facto de ECHO ter respondido mais uma vez a esta última não constitui um reexame da sua candidatura ao segundo CQP (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 26 de Outubro de 2000, Ripa di Meana e o./Parlamento, T-83/99 a T-85/99, Colect., p. II-3493, n.° 34).

45.
    A decisão controvertida é, assim, meramente confirmativa da decisão de 19 de Julho de 2001. Ora, é pacífico entre as partes que esta última decisão, de que a recorrente teve conhecimento o mais tardar em 25 de Julho de 2001 (v. supra, n.° 19), não foi impugnada no prazo de dois meses previsto no artigo 230.°, n.° 5, CE.

46.
    Cumpre salientar que o pedido da recorrente no sentido de subscrever o segundo CQP é objecto tanto da carta de 19 de Julho de 2001 como da decisão controvertida. Em contrapartida, a decisão cuja anulação foi solicitada no processo que deu lugar ao acórdão Internationaler Hilfsfonds/Comissão, já referido, continha, pela primeira vez, o indeferimento dos pedidos de co-financiamento em causa. Por conseguinte, as circunstâncias do caso em apreço são diferentes das examinadas pelo Tribunal de Primeira Instância no âmbito da questão prévia de inadmissibilidade suscitada pela Comissão no processo que deu lugar ao acórdão Internationaler Hilfsfonds/Comissão, já referido (v. n.os 28 a 34 do acórdão).

47.
    Nestes termos, o primeiro pedido é inadmissível.

Quanto ao segundo pedido, no sentido de a Comissão ser obrigada a repor a recorrente na situação em que se encontrava em 1996 quando apresentou a sua candidatura ao primeiro CQP ou convidar a recorrente a subscrever o segundo CQP e, quanto ao terceiro pedido, de que a Comissão seja obrigada a reembolsar à recorrente as despesas correspondentes à queixa que apresentou ao Provedor de Justiça Europeu

48.
    Recorde-se que é jurisprudência constante que o Tribunal não pode, no exercício da sua competência, dar ordens às instituições comunitárias ou substituir-se às mesmas (acórdão do Tribunal de Justiça de 8 de Julho de 1999, DSM/Comissão, C-5/93 P, Colect., p. I-4695, n.° 36, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 24 de Fevereiro de 2000, ADT Projekt/Comissão, T-145/98, Colect., p. II-387, n.° 83).

49.
    No âmbito de um recurso de anulação com base no artigo 230.° CE, a competência do juiz comunitário limita-se à fiscalização da legalidade do acto impugnado. Se concluir pela ilegalidade deste, anula-o. Cabe então à instituição em causa, nos termos do artigo 233.° CE, tomar as medidas que comporta a execução do acórdão de anulação (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Janeiro de 1998, Ladbroke Racing/Comissão, T-67/94, Colect., p. II-1, n.° 200, e ADT Projekt/Comissão, já referido, n.° 84).

50.
    Com os seus segundo e terceiro pedidos, a recorrente pretende manifestamente que o Tribunal de Primeira Instância dê ordens à Comissão. Tendo em vista os princípios referidos nos n.os 38 e 49 supra, estes pedidos devem ser julgados inadmissíveis.

51.
    No que se refere ao terceiro pedido, acrescente-se que, segundo a alínea b) do artigo 91.° do Regulamento de Processo, são consideradas despesas reembolsáveis «as despesas indispensáveis suportadas pelas partes para efeitos do processo, nomeadamente as despesas de deslocação e estadia e os honorários de agentes, consultores ou advogados». Decorre desta disposição que as despesas reembolsáveis se limitam às despesas que, por um lado, tenham sido suportadas para efeitos do processo no Tribunal de Primeira Instância e, por outro, tenham sido indispensáveis para tal fim (despacho do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Julho de 1998, Opel Austria/Conselho, T-115/94 DEP, Colect., p. II-2739, n.° 26). Por «processo», a disposição já referida visa apenas o processo perante o Tribunal de Primeira Instância (despacho do Tribunal de Primeira Instância de 24 de Janeiro de 2002, Groupe Origny/Comissão, T-38/95 DEP, Colect., p. II-217, n.° 29). A recorrente não pode, por isso, no âmbito do presente recurso de anulação, ser reembolsada pela Comissão das despesas referentes ao processo perante o Provedor de Justiça Europeu.

52.
    Convém observar igualmente que, ao invés do que a recorrente parece sugerir em certos trechos das suas observações de 29 de Abril de 2003, este terceiro pedido não pode ser interpretado como um pedido de indemnização. Com efeito, a petição não contém qualquer referência a um pedido desse tipo nem aos elementos essenciais de direito em que este teria de se fundamentar.

53.
    Do que antecede resulta que o recurso deve ser julgado inadmissível na totalidade.

Quanto às despesas

54.
    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená-la nas despesas, em conformidade com os pedidos da Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção)

decide:

1.
    O recurso é julgado inadmissível na totalidade.

2.
    A recorrente suportará as suas próprias despesas e as efectuadas pela Comissão.

Proferido no Luxemburgo, em 15 de Outubro de 2003.

O secretário

O presidente

H. Jung

P. Lindh


1: Língua do processo: inglês.