ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Primeira Secção)
14 de Julho de 1998 (1)
«Recurso de anulação Regulamento (CEE) n.° 816/92 Prazo de recurso
Admissibilidade Pedido de indemnização Organização comum de mercado
no sector do leite e dos produtos lácteos Quantidades de referência
Imposição suplementar Redução das quantidades de referência sem
indemnização»
No processo T-119/95,
Alfred Hauer, residente em Niederweiler (Alemanha), representado por François,
Neuhaus & Co, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório da advogada
Annick Wurth, 100, Boulevard de la Pétrusse,
contra
Conselho da União Europeia, representado por Arthur Brautigam, consultor
jurídico, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo no
gabinete de Alessandro Morbilli, director-geral da Direcção dos Assuntos Jurídicos
do Banco Europeu de Investimento, 100, boulevard Konrad Adenauer,
e
Comissão das Comunidades Europeias, representada por Klaus-Dieter Borchardt,
membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no
Luxemburgo no gabinete de Carlos Gómez de la Cruz, membro do Serviço
Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,
que tem por objecto um pedido de anulação do Regulamento (CEE) n.° 816/92 do
Conselho, de 31 de Março de 1992, que altera o Regulamento (CEE) n° 804/68
que estabelece a organização comum de mercado no sector do leite e dos produtos
lácteos (JO L 86, p. 83) e um pedido de indemnização pelos prejuízos sofridos pelo
recorrente devido à aplicação do referido regulamento,
O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Primeira Secção),
composto por: B. Vesterdorf, presidente, C. W. Bellamy e R. M. Moura Ramos,
juízes,
secretário: A. Mair, administrador,
vistos os autos e após a audiência de 4 de Março de 1998,
profere o presente
Acórdão
- 1.
- Em 1984, para combater os excedentes da produção de leite, o Conselho adoptou
o Regulamento (CEE) n.° 856/84, de 31 de Março de 1984, que altera o
Regulamento (CEE) n.° 804/68 que estabelece a organização comum de mercado
no sector do leite e dos produtos lácteos (JO L 90, p. 10; EE 03 F30 p. 61). Este
regulamento, ao inserir um novo artigo 5.°-C no Regulamento (CEE) n.° 804/68 do
Conselho, de 27 de Junho de 1968 (JO L 148, p. 13; EE 03 F2 p. 146; a seguir
«Regulamento n.° 804/68»), instituiu, durante cinco períodos consecutivos de doze
meses a partir de 1 de Abril de 1984, uma imposição suplementar sobre as
quantidades de leite entregues e que excedam uma quantidade de referência
(«quota»), a determinar para cada produtor ou comprador (n.° 1 do novo artigo
5.°-C), no limite de uma «quantidade global garantida» fixada para cada
Estado-Membro, igual à soma das quantidades de leite entregues durante o ano
civil de 1981, acrescidas de 1% (n.° 3), e completada, eventualmente, por uma
quantidade suplementar proveniente da «reserva comunitária» (n.° 4). A imposição
suplementar podia ser aplicada, à escolha do Estado-Membro, quer aos produtores,
consoante a quantidade das suas entregas («fórmula A»), quer aos compradores,
consoante as quantidades que lhes tivessem sido entregues pelos produtores, caso
em que seria repercutida sobre os produtores, proporcionalmente às suas entregas
(«fórmula B»).
- 2.
- Em 1986, dada a persistência da situação excedentária no sector do leite, as
quantidades globais garantidas foram reduzidas de 2% para o período 1987/1988
e de 1% para o período 1988/1989, sem indemnização, pelo Regulamento (CEE)
n.° 1335/86 do Conselho, de 6 de Maio de 1986, que altera o Regulamento
n.° 804/68 (JO L 119, p. 19) e o Regulamento (CEE) n.° 1343/86 do Conselho, de
6 de Maio de 1986, que altera o Regulamento (CEE) n.° 857/84 que estabelece as
regras gerais para a aplicação da imposição suplementar referida no artigo 5.°-C
do Regulamento n.° 804/68 no sector do leite e produtos lácteos (JO L 119, p. 34).
Esta redução foi acompanhada de um regime de indemnização pelo abandono da
produção, introduzido pelo Regulamento (CEE) n.° 1336/86 do Conselho, de 6 de
Maio de 1986, que fixa uma indemnização ao abandono definitivo da produção
leiteira (JO L 119, p. 21).
- 3.
- Em 1987, o Regulamento (CEE) n.° 775/87 do Conselho, de 16 de Março de 1987,
relativo à suspensão temporária de uma parte das quantidades de referência
mencionadas no n.° 1 do artigo 5.°-C do Regulamento n.° 804/68 (JO L 78, p. 5; a
seguir «Regulamento n.° 775/87»), procedeu a uma suspensão temporária de 4%
de cada quantidade de referência para o período de 1987/1988 e de 5,5% para o
período de 1988/1989. Em contrapartida da suspensão, os produtores recebiam
uma indemnização de 10 ecus por 100 kg para cada um desses períodos.
- 4.
- O Regulamento (CEE) n.° 1111/88 do Conselho, de 25 de Abril de 1988, que altera
o Regulamento n.° 775/87 (JO L 110, p. 30, a seguir «Regulamento (CEE)
n.° 1111/88») manteve a suspensão temporária de 5,5% das quantidades de
referência prevista pelo Regulamento n.° 775/87 por três períodos posteriores de
doze meses (1989/1990, 1990/1991 e 1991/1992). O artigo 1.°, n.° 2, do Regulamento
n.° 1111/88 previa também que a suspensão devia ser compensada pelo pagamento
directo de uma indemnização degressiva de 8 ecus por 100 kg para 1989/1990, de
7 ecus por 100 kg para 1990/1991 e de 6 ecus por 100 kg em 1991/1992.
- 5.
- Em 1989, o Regulamento (CEE) n.° 3879/89 do Conselho, de 11 de Dezembro de
1989, que altera o Regulamento n.° 804/68 (JO L 378, p. 1), diminuiu as
quantidades globais garantidas de 1%, a fim de aumentar a reserva comunitária e
desse modo permitir a reatribuição das quantidades de referência suplementares
a certos produtores menos favorecidos. Simultaneamente, para manter inalterado
o nível das quantidades de referência não suspensas, a taxa das quantidades de
referência temporariamente suspensas foi diminuída de 5,5% para 4,5% pelo
Regulamento (CEE) n.° 3882/89 do Conselho, de 11 de Dezembro de 1989, que
altera o Regulamento n.° 775/87 (JO L 378, p. 6). O Regulamento n.° 3882/89
também aumentou a indemnização prevista pelo Regulamento n.° 1111/88,
respectivamente, para 10 ecus, 8,5 ecus e 7 ecus por 100 kg para cada um dos
períodos de aplicação.
- 6.
- Em 1991, o Regulamento (CEE) n.° 1630/91 do Conselho, de 13 de Junho de 1991,
que altera o Regulamento n.° 804/68 (JO L 150, p. 19), efectuou uma nova redução
de 2% das quantidades globais garantidas, que foi indemnizada na medida prevista
pelos artigos 1.° e 2.° do Regulamento (CEE) n.° 1637/91 do Conselho, de 13 de
Junho de 1991, que fixa uma indemnização relativa à redução das quantidades de
referência previstas no artigo 5.°-C do Regulamento n.° 804/68, bem como uma
indemnização pelo abandono definitivo da produção leiteira (JO L 150, p. 30).
- 7.
- Posteriormente, o Regulamento (CEE) n.° 816/92 do Conselho, de 31 de Março de
1992, que altera o Regulamento n.° 804/68 (JO L 86, p. 83; a seguir «Regulamento
n.° 816/92»), prorrogou, pelo período compreendido entre 1 de Abril de 1992 e 31
de Março de 1993, o regime de redução das quantidades de referência à taxa de
4,5%, sem prever nenhuma indemnização.
- 8.
- Os dois primeiros considerandos do Regulamento n.° 816/92 têm a seguinte
redacção:
«Considerando que o regime de imposição suplementar estabelecido no artigo
5.°-C do Regulamento (CEE) n.° 804/68 (...) expira em 31 de Março de 1992; que
deve ser adoptado um novo regime aplicável até ao ano 2000, no âmbito da
reforma da política agrícola comum (PAC); que, entretanto, é conveniente
prosseguir o actual regime por um novo período de doze meses; que, de acordo
com as propostas da Comissão, a quantidade global estabelecida nos termos do
presente regulamento é susceptível de ser reduzida, mediante indemnização, no
referido período, a fim de prosseguir o esforço de saneamento já empreendido;
Considerando que a situação do mercado tornou necessária a suspensão temporária
de uma parte das quantidades de referência do quarto ao oitavo período de doze
meses, nos termos do Regulamento (CEE) n.° 775/87 (...); que a persistência da
situação excedentária exige que 4,5% das quantidades de referência relativas às
entregas sejam excluídos das quantidades globais garantidas durante o nono
período; que, no âmbito da reforma da PAC, o Conselho tomará uma decisão
definitiva sobre o futuro destas quantidades; que, nesta hipótese, é conveniente
precisar o montante das quantidades em questão que cabe a cada
Estado-Membro.»
- 9.
- O artigo 1.°, n.° 3, do mesmo regulamento altera o artigo 5.°-C, n.° 3, do
Regulamento n.° 804/68, acrescentando o seguinte ponto:
«g) Para o período de doze meses compreendido entre 1 de Abril de 1992 e 31
de Março de 1993, a quantidade global é fixada, em milhares de toneladas,
do seguinte modo, sem prejuízo, durante esse período, tendo em conta as
propostas da Comissão no âmbito da reforma da PAC, de uma redução de
1 %, calculada sobre a quantidade prevista no segundo parágrafo do
presente número:
[...]
Alemanha 27 154,205
[...]
As quantidades previstas no Regulamento (CEE) n.° 775/87 que não se
encontram incluídas no primeiro parágrafo são as seguintes, em milhares de
toneladas:
[...]
Alemanha 1 360,215
[...]
O Conselho decidirá definitivamente sobre estas quantidades no âmbito da
reforma da PAC.»
Matéria de facto na origem do litígio
- 10.
- O recorrente é produtor de leite na Alemanha. Em conformidade com as regras
sobre a organização comum de mercado do leite e dos produtos lácteos, a sua
produção leiteira estava limitada, na época dos factos, a uma quantidade de
referência fixada pela administração nacional, com base na quantidade fornecida
ao longo de um ano de referência. Dispunha, além disso, de uma quantidade de
referência suplementar, que tinha comprado às autoridades alemãs em 1990 e 1991.
- 11.
- Por decisão de 29 de Junho de 1992, a empresa de lacticínios Erbeskopf eG, com
sede em Thalfang (Alemanha), suspendeu sem indemnização 4,74% da quantidade
de referência do recorrente, em conformidade com as disposições conjugadas do
§ 4b, n.° 6 e do § 4c, n.° 6, da Milch-Garantiemengen-Verordnung, regulamentação
nacional sobre as quantidades de referência que retoma as disposições comunitárias
aplicáveis.
- 12.
- O recorrente apresentou uma reclamação desta decisão, que foi indeferida em 17
de Agosto de 1993 pelas autoridades alemãs competentes. O indeferimento foi
fundamentado por referência ao Regulamento n.° 816/92.
- 13.
- Por carta de 16 de Março de 1995, pediu à Comissão a anulação parcial do
regulamento e o pagamento de uma indemnização.
Tramitação processual e pedidos das partes
- 14.
- Por petição apresentada em 12 de Maio de 1995, o recorrente interpôs o presente
recurso.
- 15.
- Conclui pedindo que o Tribunal se digne:
anular o Regulamento n.° 816/92 na medida em que não prevê uma
indemnização para a parte da quantidade de referência suspensa;
arbitrar ao recorrente uma indemnização de 59 827,21 DM;
condenar os recorridos nas despesas.
- 16.
- O Conselho, recorrido, conclui pedindo que o Tribunal se digne:
julgar o pedido de anulação inadmissível ou, subsidiariamente,
improcedente;
julgar o pedido de indemnização improcedente;
condenar o recorrente nas despesas.
- 17.
- A Comissão, recorrida, conclui pedindo que o Tribunal se digne:
julgar o pedido de anulação inadmissível na medida em que é dirigido
contra si;
julgar o pedido de indemnização improcedente;
condenar o recorrente nas despesas da instância.
- 18.
- O recorrente e a Comissão foram ouvidos na audiência de 4 de Março de 1998. O
Conselho não se fez representar nessa audiência.
Pedido de anulação
Quanto à admissibilidade
Argumentação das partes
- 19.
- O Conselho entende que o pedido de anulação deve ser julgado inadmissível, na
medida em que o regulamento impugnado não diz directa e individualmente
respeito à recorrente (acórdãos do Tribunal de Justiça de 11 de Julho de 1968,
Zuckerfabrik Watenstedt/Conselho, 6/68, Colect. 1965-1968, p. 873 e de 18 de Maio
de 1994, Codorniu/Conselho, C-309/89, Colect., p. I-1853). O recorrente apenas é
afectado pelo diploma na sua qualidade objectiva de produtor de leite, como
qualquer outro operador económico que se encontre na mesma situação.
- 20.
- A Comissão alega que não é parte legítima no quadro de um pedido de anulação
relativo a um acto como o Regulamento n.° 816/92, adoptado pelo Conselho. O
pedido de anulação deve, portanto, ser julgado inadmissível na medida em que é
dirigido contra si.
- 21.
- O recorrente não tomou posição sobre estes argumentos.
Apreciação do Tribunal
- 22.
- O Tribunal recorda, a título preliminar, que, segundo jurisprudência constante, os
prazos de recurso não estão na disponibilidade do juiz nem na das partes e têm
natureza de ordem pública (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 15 de
Março de 1995, Cobrecaf, T-514/93). Em conformidade com o disposto no artigo
113.° do Regulamento de Processo, o Tribunal pode, a todo o tempo e
oficiosamente, verificar se o prazo de recurso foi respeitado (acórdão do Tribunal
de Primeira Instância de 18 de Setembro de 1997, Mutual Aid Administration
Services/Comissão, T-121/96 e T-151/96, Colect., p. II-1355, n.° 39), mesmo que,
como no caso vertente, as partes não se tenham pronunciado sobre a questão.
- 23.
- Dado que o pedido do recorrente tem em vista a anulação de um regulamento, o
prazo de interposição do recurso é o prazo, de dois meses, fixado no artigo 173.°,
quinto parágrafo, do Tratado. Uma vez que se trata de um recurso de um acto
publicado em 1 de Abril de 1992, o prazo deve ser contado, em aplicação do artigo
102.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a
partir de 16 de Abril de 1992. Acrescido de dilação em razão da distância de seis
dias, em aplicação do n.° 2 do mesmo artigo, expirou no mês de Junho do mesmo
ano.
- 24.
- Tendo a petição sido apresentada em 12 de Maio de 1995, ou seja, cerca de três
anos mais tarde, o recurso foi interposto tardiamente.
- 25.
- Nestas condições, sem que seja necessário pronunciar-se sobre os fundamentos de
inadmissibilidade invocados pelos recorridos, o pedido de anulação deve ser julgado
inadmissível.
Pedido de indemnização
- 26.
- Só há lugar a responsabilidade extracontratual da Comunidade decorrente de danos
causados pelas instituições, prevista no artigo 215.°, segundo parágrafo, do Tratado
CE, se estiver reunido um conjunto de condições, relativamente à ilegalidade do
comportamento censurado, à realidade do dano e à existência de um nexo de
causalidade entre o comportamento ilegal e o prejuízo invocado. Em matéria de
responsabilidade decorrente de actos de natureza normativa, o comportamento
censurado à Comunidade deve, segundo jurisprudência constante (acórdãos do
Tribunal de Justiça de 2 de Dezembro de 1971, Zuckerfabrik
Schöppenstedt/Conselho, 5/71, Colect., p. 375, n.° 11, e do Tribunal de Primeira
Instância de 15 de Abril de 1997, Schröder e o./Comissão, T-390/94, Colect.,
p. II-501, n.° 52), constituir uma violação de uma regra superior de direito que
proteja os particulares. Se a instituição adoptou o acto no exercício de um amplo
poder de apreciação, como é o caso em matéria de Política Agrícola Comum, essa
violação deve, além disso, ser suficientemente caracterizada, isto é, manifesta e
grave (ver, nomeadamente, acórdão do Tribunal de Justiça de 19 de Maio de 1992,
Mulder e o./Conselho e Comissão, C-104/89 e C-37/90, Colect., p. I-3061, n.° 12 e
acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 9 de Dezembro de 1997, Quiller e
Heusmann/Conselho e Comissão, T-195/94, e T-202/94, Colect., p. II-2247, n.os 48
e 49).
- 27.
- Nas circunstâncias do caso presente, o Tribunal considera que deve começar por
analisar a existência de um comportamento ilegal das instituições.
Quanto à existência de um acto ilegal na base dos prejuízos alegados
- 28.
- O recorrente invoca, no âmbito do pedido de anulação, três fundamentos sobre a
ilegalidade do Regulamento n.° 816/92, baseados, respectivamente, na violação do
direito de propriedade, na violação do princípio de protecção da confiança legítima
e na violação do princípio da igualdade.
Primeiro fundamento, baseado na violação do direito de propriedade
Argumentação das partes
- 29.
- O recorrente alega que o direito de propriedade faz parte dos princípios gerais de
que o Tribunal de Justiça assegura o respeito (acórdão do Tribunal de Justiça de
13 de Dezembro de 1979, Hauer, 44/79, Recueil, p. 3727, n.° 17). No caso vertente,
o facto de o regulamento impugnado não prever uma indemnização para a redução
da quantidade de referência tem um efeito equivalente a uma expropriação, na
medida em que o leite vendido além da quota está sujeito a imposição
suplementar. Por conseguinte, este efeito é o de uma proibição de comercialização.
Ora, mesmo resultando de uma disposição legal, uma expropriação só pode ter
lugar, à luz do direito nacional, se o diploma que a aplica regular o modo e o
montante da indemnização. Na falta de indemnização, a situação criada constitui
uma violação do direito de propriedade.
- 30.
- O recorrente considera que a sua situação difere, num ponto essencial, da dos
processos que deram lugar ao acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 13 de
Julho de 1995, O'Dwyer e o./Conselho (T-466/93, T-469/93, T-473/93, T-474/93 e
T-477/93, Colect., p. II-2071), que lhe opõem os recorridos. Sublinha, a este
respeito, que adquiriu quantidades de referência às autoridades nacionais.
Consequentemente, o raciocínio dos recorridos não se aplica a essas quantidades,
as quais, adquiridas a título oneroso, beneficiam da protecção concedida ao direito
de propriedade. O recorrente sublinha que, se tivesse sabido, no momento da
aquisição, que essas quantidades poderiam ser retomadas sem compensação, não
teria concluído tal operação, de que a administração nacional foi, no fim de contas,
a única a beneficiar.
- 31.
- Esta restrição ao direito de propriedade não se justifica pelo interesse comum. O
facto de privar os produtores dos seus rendimentos está em contradição total com
os objectivos do artigo 39.° do Tratado e é desproporcionado relativamente aos
resultados prosseguidos.
- 32.
- O Conselho sublinha que as quantidades de referência não são objecto de direito
de propriedade autónomo em relação à terra à qual estão ligadas. A redução
dessas quantidades imposta no caso em apreço não pode, portanto, em princípio,
infringir o direito de propriedade dos interessados (acórdão do Tribunal de Justiça
de 22 de Outubro de 1991, von Deetzen, C-44/89, Colect., p. 5119, n.° 27).
- 33.
- O direito de propriedade não constitui uma prerrogativa absoluta em direito
comunitário. Designadamente no âmbito de uma organização comum de mercado,
só está protegido contra uma intervenção desproporcionada e intolerável que
afecte a própria essência dos direitos fundamentais em causa (acórdão do Tribunal
de Justiça de 11 de Julho de 1989, Schräder, 265/87, Colect., p. 2237, n.° 15). No
caso em apreço, não se trata de semelhante intervenção e a restrição impugnada
corresponde claramente a um objectivo de interesse geral. Em todo o caso, tendo
em conta a pouca importância da redução em causa, não foi ameaçada a
sobrevivência da exploração do recorrente, pelo que a substância do seu direito de
propriedade não foi afectada.
- 34.
- O Conselho afirma igualmente que o objectivo de garantia dos rendimentos
agrícolas, visado pelo artigo 39.°, n.° 1, alínea b), do Tratado, deve ser conciliado
com o da estabilização dos mercados, visado pelo artigo 39.°, n.° 1, alínea c), ao
qual poderá ser concedida uma prioridade temporária em certas circunstâncias (v.
os acórdãos do Tribunal de Justiça de 11 de Março de 1987, Van den Bergh en
Jurgens e Van Dijk Food Products/Comissão, 265/85, Colect., p. 1155, n.° 20, e de
19 de Março de 1992, Hierl, C-311/90, Colect., p. I-2061, n.° 13). Esta prioridade
é, no presente caso, legítima.
- 35.
- A Comissão alega que, no acórdão O'Dwyer e o./Conselho, já referido, o Tribunal
já julgou improcedente o fundamento invocado pelo recorrente, afirmando que a
supressão sem indemnização, em aplicação do Regulamento n.° 816/92, da
quantidade de referência se justificava pela necessidade de estabilizar o mercado
do leite e pela redução dos excedentes estruturais. Esta suspensão não podia
portanto constituir, em si, uma violação do direito de propriedade.
- 36.
- Os recorridos defendem que, nos processos que deram lugar ao acórdão O'Dwyer
e o./Conselho, alguns recorrentes tinham igualmente adquirido quantidades de
referência suplementares. Sublinham que, no entanto, o Tribunal rejeitou qualquer
distinção, no que respeita à redução ou à suspensão das quantidades de referência,
em função da respectiva origem. Na opinião dos recorridos, as necessidades de
estabilização do mercado são incompatíveis com tal distinção.
- 37.
- A Comissão observa que a aquisição de quantidades de referência às autoridades
nacionais não é autorizada pela regulamentação, sendo apenas autorizadas, como
únicas transacções, as vendas entre produtores de leite. Sublinha que o recorrente
não indicou com que base jurídica adquiriu as quantidades suplementares. O
argumento do recorrente é, portanto, destituído de pertinência. Assinala que, se as
quantidades suplementares adquiridas pelos produtores não fossem todas tidas em
conta para a redução, o volume correspondente seria tal que se tornaria impossível
alcançar os objectivos do Regulamento n.° 816/92.
Apreciação do Tribunal
- 38.
- Importa recordar, a título preliminar, que o Regulamento n.° 816/92 foi adoptado
na sequência de uma série de outros diplomas que previam igualmente limitações
das quantidades de referência. O Tribunal de Justiça, por acórdãos de 20 de
Setembro de 1988, Espanha/Conselho (203/86, Colect., p. 4563, n.° 15) e Hierl, já
referido (n.° 21), considerou que, por um lado, os Regulamentos n.os 1335/86 e
1343/86, que reduziam em 3% a quantidade global garantida a cada
Estado-Membro e, por outro, a disposição do Regulamento n.° 775/87 que previa
a suspensão de uma parte de cada quantidade de referência, não violavam
nenhuma regra de direito comunitário. Por outro lado, no seu acórdão O'Dwyer
e o./Conselho, o Tribunal de Primeira Instância negou provimento a um recurso
que, como no presente caso, tinha por objectivo obter uma indemnização pelos
prejuízos causados pelo Regulamento n.° 816/92. Finalmente, no acórdão de 15 de
Abril de 1997, Irish Farmers Association e o. (C-22/94, Colect., p. I-1809, n.° 42),
o Tribunal de Justiça não descortinou, na disposição deste regulamento que prevê
a redução controvertida, nenhum elemento susceptível de afectar a sua validade.
É à luz desta jurisprudência que há que examinar o presente pedido de
indemnização.
- 39.
- O direito de propriedade cuja violação é alegada pelo recorrente é garantido na
ordem jurídica comunitária. No entanto, tal direito não constitui uma prerrogativa
absoluta, mas deve ser tomado em consideração tendo presente a sua função na
sociedade. Consequentemente, a Comunidade pode, no quadro dos objectivos de
interesse geral que são os seus, introduzir restrições ao direito de propriedade,
designadamente no âmbito de uma organização comum de mercado, desde que tais
restrições respondam efectivamente a esses objectivos e não constituam, à luz do
objectivo prosseguido, uma intervenção desproporcionada e intolerável (acórdãos
do Tribunal de Justiça Hauer, já referido, n.° 23, Schräder, já referido, n.° 15, de
10 de Janeiro de 1992, Kühn, C-177/90, Colect., p. I-35, n.° 16 e Irish Farmers
Association e o., já referido, n.° 27; acórdão do Tribunal de Primeira Instância
O'Dwyer e o./Conselho, já referido, n.° 98).
- 40.
- Na prossecução dos objectivos da política agrícola comum, as responsabilidades
políticas que são atribuídas ao legislador comunitário pelo Tratado são
acompanhadas de um amplo poder de apreciação. Esse poder deve permitir às
instituições comunitárias, designadamente, assegurar a conciliação permanente que
podem exigir as eventuais contradições entre esses objectivos considerados
separadamente e, se for caso disso, conceder a um ou a outro a prioridade
temporária imposta pelos factos ou circunstâncias económicas em função das quais
adoptam as suas decisões (acórdãos citados, Espanha/Conselho, n.° 10, e Hierl,
n.° 13). Assim, podem ser admitidas reduções das quantidades de referência se se
destinarem a assegurar o equilíbrio entre a oferta e a procura e a estabilização do
mercado do leite.
- 41.
- No caso vertente, a redução das quantidades de referência prevista pelo
Regulamento n.° 816/92 está em conformidade com estas exigências. Efectivamente,
como resulta dos considerandos deste regulamento, a suspensão das quantidades
de referência justificava-se pela necessidade de prosseguir, na sequência de outras
medidas da mesma natureza adoptadas em relação aos anos anteriores (v, supra,
n.os 2 a 7), o saneamento do mercado do leite.
- 42.
- A redução em causa não ultrapassa, pelo seu montante, os limites de uma
intervenção tolerável e, portanto, não afecta a própria substância do direito de
propriedade. Efectivamente, como o Tribunal de Justiça admitiu nos acórdãos já
referidos Hierl (n.os 13 a 15) e Espanha/Conselho (n.os 10 e 11), reduções
temporárias das quantidades de referência, previstas com o objectivo de estabilizar
mercados com produção excedentária, não violam do direito de propriedade. De
resto, resulta do acórdão Irish Farmers Association e o., já referido (n.° 29), que
mesmo a conversão da redução temporária de 4,5% das quantidades de referência
numa redução definitiva sem indemnização não é susceptível de violar esse direito.
- 43.
- Entretanto, o Tribunal observa que, se a percentagem de redução comunicada ao
recorrente fosse, como este afirma, de 4,74% e não de 4,5% como previsto pelo
Regulamento n.° 816/92, a responsabilidade por esta diferença incumbiria às
autoridades nacionais.
- 44.
- Vistas as considerações que precedem, o argumento do recorrente baseado na
violação do artigo 39.° do Tratado deve igualmente ser rejeitado. Efectivamente,
o Conselho podia legitimamente, no âmbito do seu amplo poder de apreciação em
matéria de política agrícola comum, atribuir uma prioridade temporária ao
objectivo da estabilização do mercado dos produtos lácteos, contribuindo as
medidas adoptadas, através de um desenvolvimento racional da produção, para a
manutenção de um nível de vida equitativo da população agrícola, na acepção da
alínea b) do n.° 1 do artigo 39.° do Tratado (acórdão O'Dwyer e o./Conselho, já
referido, n.° 82 e, no que respeita, em geral, ao sistema da imposição suplementar,
acórdão do Tribunal de Justiça de 17 de Maio de 1988, Erpelding, 84/87, Colect.,
p. 2647, n.° 26).
- 45.
- No que respeita às quantidades de referência suplementares adquiridas às
autoridades nacionais, o recorrente não invocou nenhum argumento susceptível de
demonstrar que as quantidades de leite suplementares devem ser distinguidas da
quantidade de referência inicial. Ora, é contrário à própria lógica do regulamento
impugnado, que tem por objectivo controlar os excedentes de produção, excluir
quantidades suplementares da redução prevista pelo Regulamento n.° 816/92
unicamente com o fundamento de que foram adquiridas fora da quantidade de
referência inicialmente concedida.
- 46.
- De qualquer modo, contrariamente ao que o recorrente alega, nos processos que
deram origem ao acórdão O'Dwyer e o./Conselho, já referido, alguns recorrentes
tinham igualmente adquirido quantidades de referência suplementares às
autoridades nacionais (ver n.os 119 a 130 do acórdão). O facto de ter comprado tais
quantidades suplementares é uma opção económica dos produtores, que lhes
permite aumentar o volume de fornecimento. Por conseguinte, esses produtores
contribuem para o aumento do excedente estrutural do sector, justificando-se assim
que sejam obrigados a participar, em maior medida, no esforço de redução pedido
aos produtores. A redução prevista pelo Regulamento n.° 816/92 é portanto
aplicável de modo proporcional ao conjunto das quantidades de referência,
independentemente da sua origem específica (ver acórdão O'Dwyer e o./Conselho,
já referido, n.° 128).
- 47.
- Nestas condições, sem necessidade de apreciar se, como afirma a Comissão, as
aquisições das quantidades suplementares em causa eram contrárias à
regulamentação em vigor na época, o argumento do recorrente, na medida em que
invoca a protecção do direito de propriedade, deve ser julgado improcedente.
- 48.
- Consequentemente, o primeiro fundamento deve ser globalmente julgado
improcedente.
Segundo fundamento, baseado na violação do princípio da protecção da confiança
legítima
Argumentação das partes
- 49.
- O recorrente afirma que, até à adopção do regulamento impugnado, a suspensão
das quantidades de referência era objecto de indemnização. Por conseguinte,
considera que tinha o direito de pensar que poderia conservar e ter em conta esses
elementos do seu património. Além disso, fez investimentos com o objectivo de
beneficiar das quantidades adquiridas às autoridades nacionais. Se tivesse
suspeitado da existência de tal intervenção, não teria adquirido as quantidades
suplementares nem feito tais investimentos.
- 50.
- Na audiência, convidado pelo Tribunal a tomar posição sobre o alcance do acórdão
Irish Farmers Association e o., já referido, o recorrente afirmou que a sua situação
era diferente da analisada pelo Tribunal de Justiça naquele acórdão, uma vez que
tinha comprado as quantidades de referência suplementares no quadro de medidas
adoptadas pelas autoridades nacionais. Por conseguinte, confiava na possibilidade
de os explorar, mas foi vítima da mudança de regulamentação ocorrida um ano
após essa aquisição.
- 51.
- O Conselho sublinha que reconhecer a confiança legítima dos produtores de leite
na manutenção da indemnização sem limite de tempo se traduziria em lhes
reconhecer direitos adquiridos nessa matéria, contrariamente a uma jurisprudência
constante (v. os acórdãos do Tribunal de Justiça de 22 de Janeiro de 1986, Eridania
e o., 250/84, Colect., p. 117, e Espanha/Conselho, já referido).
- 52.
- Várias outras reduções das quantidades de referência foram já impostas, nem
sempre a título temporário nem acompanhadas de uma indemnização. De resto,
segundo a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, um operador prudente
e avisado devia ter previsto as medidas que se impunham, tendo em conta a
evolução do mercado (v. o acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Fevereiro de
1990, Delacre e o./Comissão, C-350/88, Colect., p. I-395). Ora, as reduções em
causa eram perfeitamente previsíveis, tendo em conta esta evolução.
- 53.
- A Comissão sustenta que, segundo jurisprudência constante, confirmada pelo
acórdão O'Dwyer e o./Conselho, já referido (n.os 48 e 49), os operadores
económicos não podem depositar uma confiança legítima na manutenção de uma
situação existente que pode ser alterada no âmbito do poder de apreciação das
instituições. A circunstância de, ao abrigo da regulamentação anterior, qualquer
redução das quantidades de referência ser indemnizada, não poderia ter servido de
base a uma confiança legítima, uma vez que o novo regime instituído pelo
Regulamento n.° 816/92 se enquadra em tal poder de apreciação.
Apreciação do Tribunal
- 54.
- O Tribunal recorda, em primeiro lugar, que a possibilidade de invocar o princípio
da protecção da confiança legítima é facultada a qualquer operador económico em
cuja esfera jurídica uma instituição tenha feito nascer esperanças fundadas.
Todavia, os operadores económicos não podem depositar uma confiança legítima
na manutenção de uma situação existente que pode ser alterada no âmbito do
poder de apreciação das instituições comunitárias. É especialmente assim num
domínio como o das organizações comuns de mercados agrícolas, cujo objectivo
implica uma constante adaptação em função das variações da situação económica
(v. os acórdãos do Tribunal de Justiça, Delacre e o./Comissão, já referido, n.° 33,
e de 5 de Outubro de 1994, Alemanha/Conselho, C-280/93, Colect., p. I-4973,
n.° 80; e os acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Dezembro de
1994, Unifruit Hellas/Comissão, T-489/93, Colect., p. II-1201, n.° 67, de 21 de
Fevereiro de 1995, Campo Ebro e o./Conselho, T-472/93, Colect., p. II-421, n.° 61
e O'Dwyer e o./Conselho, já referido, n.° 48). Além disso, quando um operador
económico prudente e avisado esteja em condições de prever a adopção de uma
medida comunitária susceptível de afectar os seus interesses, não pode, quando
essa medida seja tomada, invocar uma violação da sua confiança legítima (acórdãos
Van den Bergh en Jurgens e Van Dijk Food Products/Comissão, já referido,
n.° 44).
- 55.
- Como resulta do acórdão Irish Farmers Association e o., já referido (n.° 22), o
Conselho e a Comissão não criaram uma situação que permitisse aos produtores
de leite contar legitimamente que, nas datas indicadas, as quantidades até então
suspendidas seriam restituídas. Efectivamente, mesmo antes da data em que o
regime de suspensão introduzido pelo Regulamento n.° 775/87 devia expirar, esse
regime foi prorrogado pelo Regulamento n.° 1111/88. Este último diploma
introduziu igualmente uma compensação que, contrariamente à prevista pelo
Regulamento n.° 775/87, era de natureza degressiva. Além disso, a Comissão
apresentou uma proposta formal no sentido de uma redução das quantidades de
referência sem indemnização, proposta que publicou em 31 de Dezembro de 1991
(JO C 337, p. 35). Finalmente, no momento em que os regimes assim prorrogados
chegaram ao termo, a saber, em 31 de Março de 1992, os produtores de leite não
podiam ignorar a persistência da situação excedentária da produção leiteira e, por
isso, a necessidade de manter o regime de imposição. Daqui resulta que a duração
do regime de suspensão temporária estava, desde a sua entrada em vigor, e desde
a sua renovação, intrinsecamente ligada ao período do regime da imposição
suplementar.
- 56.
- Nestas condições, e não tendo o recorrente apresentado nenhum elemento
susceptível de pôr em causa esta conclusão, não pode afirmar que as instituições
recorridas lhe suscitaram uma confiança legítima.
- 57.
- A sua decisão de fazer investimentos na sequência da aquisição de quantidades dereferência suplementares às autoridades nacionais tão-pouco pode ser justificada
por tal confiança legítima. A este propósito, importa sublinhar que o recorrente
afirma ter adquirido essas quantidades em 1990 e 1991. Ora, durante esse período,
as quantidades de referência eram objecto de uma suspensão temporária em
aplicação do Regulamento (CEE) n.° 1111/88. Assim, no momento da aquisição das
quantidades em causa, o recorrente não podia ignorar a existência de excedentes
de produção de leite e das medidas de suspensão das quantidades de referência
que, embora fossem objecto de uma compensação degressiva, demonstravam que
o mercado se encontrava numa situação muito particular. Nestas circunstâncias,
independentemente da questão de saber se, como afirma a Comissão, as aquisições
de quantidades de referência suplementares eram contrárias à regulamentação em
vigor na época, deve concluir-se que, ao adquirir essas quantidades suplementares,
o recorrente tomou uma decisão económica cujas consequências deve aceitar.
- 58.
- Assim, o segundo fundamento deve ser julgado improcedente.
Terceiro fundamento, baseado na violação do princípio da igualdade
Argumentação das partes
- 59.
- O recorrente considera que a redução das quantidades de referência instituída pelo
Regulamento n.° 816/92 é ilegal, na medida em que prevê uma taxa de redução
uniforme para todas as explorações, o que, na prática, tem por efeito que a
incidência da referida redução numa pequena exploração é mais importante do que
a sua incidência numa grande exploração. A instituição de uma taxa de redução
uniforme é, portanto, contrária ao princípio da igualdade de tratamento e constitui
igualmente uma violação do artigo 39.° do Tratado.
- 60.
- O Conselho sublinha que argumentos semelhantes já foram rejeitados pelo
Tribunal de Justiça nos acórdãos Espanha/Conselho e Hierl, já referidos. Neste
último acórdão, o Tribunal de Justiça considerou que o facto de a suspensão das
quantidades de referência se aplicar, de modo idêntico, aos grandes como aos
pequenos produtores de leite não constitui uma violação do artigo 39.° do Tratado.
O mesmo raciocínio deveria ser seguido no caso vertente.
- 61.
- O Conselho defende que, de qualquer modo, mesmo que o regulamento
impugnado estivesse ferido de ilegalidade, não é contrário às regras superiores de
direito que visam a protecção dos direitos dos indivíduos. Por conseguinte, não é
a causa dos prejuízos alegados.
- 62.
- A Comissão recorda que, no acórdão Hierl, já referido (n.° 19) o Tribunal de
Justiça indicou que o facto de uma medida adoptada no âmbito de uma
organização comum de mercado poder ter repercussões diferentes para certos
produtores não é constitutivo de uma discriminação, desde que essa medida se
baseie em critérios objectivos. Por conseguinte, considera que, como decidiu o
Tribunal de Primeira Instância no acórdão O'Dwyer e o./Conselho, já referido
(n.° 117), a redução sem indemnização da quantidade individual de referência,
operada para o período 1992/1993 em aplicação do Regulamento n.° 816/92, não
constitui um acto ilegal. Os direitos a indemnização invocados, com este
fundamento, pelo recorrente não são, assim, procedentes.
Apreciação do Tribunal
- 63.
- O princípio da igualdade de tratamento impõe que situações comparáveis não
sejam tratadas de modo diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de
modo igual, excepto se esse tratamento for objectivamente justificado. As medidas
decorrentes da organização comum dos mercados só podem, portanto, ser
diferenciadas, segundo as regiões e outras condições de produção ou de consumo,
em função de critérios objectivos que assegurem uma repartição equilibrada dos
benefícios e das desvantagens entre os interessados (acórdãos já referidos do
Tribunal de Justiça Espanha/Conselho, n.° 25, e Irish Farmers Association e o.,
n.° 34; acórdão do Tribunal de Primeira Instância O'Dwyer e o./Conselho, já
referido, n.° 113).
- 64.
- A circunstância de uma medida adoptada no âmbito de uma organização comum
de mercado poder ter repercussões diferentes para certos produtores, em função
da natureza especial da sua produção, não constitui uma discriminação, desde que
essa medida se baseie em critérios objectivos, conformes às necessidades de
funcionamento global da organização comum de mercado (acórdão do Tribunal de
Justiça de 9 de Julho de 1985, Bozetti, 179/84, Recueil, p. 2301, n.° 34). É o caso
do regime de suspensão temporária em causa, organizado de forma a que as
quantidades suspendidas sejam proporcionais às quantidades de referência (ver
acórdãos já referidos Hierl, n.° 19 e O'Dwyer e o./Conselho, n.° 117).
- 65.
- Assim, também o terceiro fundamento deve ser julgado improcedente.
- 66.
- De quanto precede resulta que não ficou demonstrado que na base dos prejuízos
alegados tenha estado um acto ilegal das instituições. Consequentemente, o pedido
de indemnização deve ser julgado improcedente, sem necessidade de apreciar se
os demais requisitos da responsabilidade estão preenchidos.
Quanto às despesas
- 67.
- Por força do disposto no n.° 2 do artigo 87.° do Regulamento de Processo, a parte
vencida deve ser condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.
Tendo o recorrente sido vencido, há que condená-lo nas despesas, em
conformidade com o pedido feito pelo Conselho e pela Comissão.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Primeira Secção),
decide:
- 1.
- O pedido de anulação é julgado inadmissível.
- 2.
- O pedido de indemnização é julgado improcedente.
- 3.
- O recorrente é condenado nas despesas.
VesterdorfBellamy
Moura Ramos
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Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 14 de Julho de 1998.
O secretário
O presidente
H. Jung
B. Vesterdorf