Language of document : ECLI:EU:C:2019:220

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

19 de março de 2019 (*)

«Reenvio prejudicial — Espaço de liberdade, segurança e justiça — Controlo nas fronteiras, asilo e imigração — Regulamento (UE) 2016/399 — Artigo 32.o — Reintrodução temporária por um Estado‑Membro do controlo nas suas fronteiras internas — Entrada irregular de um nacional de um país terceiro — Equiparação das fronteiras internas às fronteiras externas — Diretiva 2008/115/CE — Âmbito de aplicação — Artigo 2.o, n.o 2, alínea a)»

No processo C‑444/17,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pela Cour de cassation (Tribunal de Cassação, França), por decisão de 12 de julho de 2017, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 21 de julho de 2017, no processo

Préfet des PyrénéesOrientales

contra

Abdelaziz Arib,

Procureur de la République près le tribunal de grande instance de Montpellier,

Procureur général près la cour d’appel de Montpellier,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por K. Lenaerts, presidente, R. Silva de Lapuerta, vice‑presidente, A. Prechal, E. Regan, T. von Danwitz, C. Toader e C. Lycourgos (relator), presidentes de secção, A. Rosas, E. Juhász, M. Ilešič, J. Malenovský, M. Safjan, D. Šváby, C. G. Fernlund e C. Vajda, juízes,

advogado‑geral: M. Szpunar,

secretário: V. Giacobbo‑Peyronnel, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 12 de junho de 2018,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação do préfet des Pyrénées‑Orientales, por F.‑H. Briard e S. Bonichot, avocats,

–        em representação do Governo francês, por E. de Moustier, E. Armoët e D. Colas, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo alemão, por R. Kanitz, na qualidade de agente,

–        em representação da Comissão Europeia, por C. Cattabriga e G. Wils, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 17 de outubro de 2018,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 32.o do Regulamento (UE) 2016/399 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de março de 2016, que estabelece o código da União relativo ao regime de passagem de pessoas nas fronteiras (Código das Fronteiras Schengen) (JO 2016, L 77, p. 1, a seguir «Código das Fronteiras Schengen»), bem como do artigo 2.o, n.o 2, alínea a), e do artigo 4.o, n.o 4, da Diretiva 2008/115/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados‑Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular (JO 2008, L 348, p. 98).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe o préfet des Pyrénées‑Orientales (prefeito dos Pirenéus Orientais, França) a Abdelaziz Arib, ao procureur de la République près le tribunal de grande instance de Montpellier (procurador da República junto do Tribunal de Primeira Instância de Montpellier, França) e ao procureur général près la cour d’appel de Montpellier (procurador‑Geral junto do Tribunal de Recurso de Montpellier, França) sobre o prolongamento da detenção administrativa de A. Arib, que entrou irregularmente no território francês.

 Quadro jurídico

 Direito da União

 CAAS

3        A Convenção de aplicação do Acordo de Schengen, de 14 de junho de 1985, entre os Governos dos Estados da União Económica Benelux, da República Federal da Alemanha e da República Francesa relativo à supressão gradual dos controlos nas fronteiras comuns, assinada em Schengen em 19 de junho de 1990 e entrada em vigor em 26 de março de 1995 (JO 2000, L 239, p. 19, a seguir «CAAS»), faz parte do acervo de Schengen.

4        O artigo 26.o da CAAS estabelece:

«1.      Sem prejuízo dos compromissos decorrentes da sua adesão à Convenção de Genebra de 28 de julho de 1951 relativa ao estatuto dos refugiados, tal como alterada pelo Protocolo de Nova Iorque de 31 de janeiro de 1967, as partes contratantes comprometem‑se a introduzir na sua legislação nacional as seguintes regras:

a)      Se a entrada no território de uma das partes contratantes for recusada a um estrangeiro, o transportador que o conduziu à fronteira externa por via aérea, marítima ou terrestre deve imediatamente retomá‑lo a seu cargo. A pedido das autoridades de fiscalização da fronteira, deve conduzir de novo o estrangeiro ao Estado terceiro a partir do qual foi transportado, ao Estado terceiro que emitiu o documento de viagem com o qual viajou ou a qualquer outro Estado terceiro em que a sua admissão seja garantida;

b)      O transportador deve tomar as medidas necessárias para se assegurar de que o estrangeiro transportado por via aérea ou marítima se encontra na posse dos documentos de viagem exigidos para a entrada nos territórios das partes contratantes.

2.      As partes contratantes comprometem‑se, sem prejuízo dos compromissos decorrentes da sua adesão à Convenção de Genebra de 28 de julho de 1951 relativa ao estatuto dos refugiados, tal como alterada pelo Protocolo de Nova Iorque de 31 de janeiro de 1967, e em conformidade com o seu direito constitucional, a prever sanções contra os transportadores que conduzam por via aérea ou marítima, de um Estado terceiro para o seu território, estrangeiros que não possuam os documentos de viagem exigidos.

3.      O disposto na alínea b) do n.o 1 e no n.o 2 é aplicável aos transportadores de grupos que assegurem ligações rodoviárias internacionais de autocarro, com exceção do tráfego fronteiriço.»

 Código das Fronteiras Schengen

5        Nos termos do artigo 2.o do Código das Fronteiras Schengen:

«Para os efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

1)      “Fronteiras internas”:

a)      As fronteiras comuns terrestres, incluindo as fronteiras fluviais e lacustres, dos Estados‑Membros;

b)      Os aeroportos dos Estados‑Membros, no que respeita aos voos internos;

c)      Os portos marítimos, fluviais e lacustres dos Estados‑Membros no que diz respeito às ligações regulares por ferry;

2)      “Fronteiras externas”, as fronteiras terrestres, inclusive as fronteiras fluviais e as lacustres, as fronteiras marítimas, bem como os aeroportos, portos fluviais, portos marítimos e portos lacustres dos Estados‑Membros, desde que não sejam fronteiras internas;

[…]»

6        O artigo 5.o do referido código dispõe:

«1.      As fronteiras externas só podem ser transpostas nos pontos de passagem de fronteira e durante as horas de abertura fixadas. As horas de abertura devem ser indicadas claramente nos pontos de passagem de fronteira que não estejam abertos 24 horas por dia.

Os Estados‑Membros notificam a Comissão da lista dos respetivos pontos de passagem de fronteira, em conformidade com o disposto no artigo 39.o

[…]

3.      Sem prejuízo das exceções previstas no n.o 2 e das suas obrigações em matéria de proteção internacional, os Estados‑Membros aplicam sanções, nos termos do respetivo direito nacional, no caso de passagem não autorizada das fronteiras externas fora dos pontos de passagem de fronteira e das horas de abertura fixadas. Essas sanções devem ser efetivas, proporcionadas e dissuasivas.»

7        O artigo 13.o, n.o 1, do mesmo código prevê:

«A vigilância de fronteiras tem por objetivo principal impedir a passagem não autorizada da fronteira, lutar contra a criminalidade transfronteiriça e tomar medidas contra quem tiver atravessado ilegalmente a fronteira. Quem atravessar ilegalmente uma fronteira e não tiver direito a residir no território do Estado‑Membro em questão deve ser detido e ficar sujeito a procedimento por força da Diretiva 2008/115/CE.»

8        Nos termos do artigo 14.o do Código das Fronteiras Schengen:

«1.      A entrada nos territórios dos Estados‑Membros é recusada a qualquer nacional de país terceiro que não preencha todas as condições de entrada, tal como definidas no artigo 6.o, n.o 1, e não pertença às categorias de pessoas referidas no artigo 6.o, n.o 5. Tal não prejudica a aplicação de disposições especiais relativas ao direito de asilo e de proteção internacional ou à emissão de vistos de longa duração.

[…]

4.      Os guardas de fronteira asseguram que o nacional de país terceiro a quem tenha sido recusada a entrada não entre no território do Estado‑Membro em causa.

[…]

6.      As regras pormenorizadas relativas à recusa de entrada figuram no anexo V, parte A.»

9        O artigo 23.o do referido código, intitulado «Controlos no interior do território», prevê:

«A ausência do controlo nas fronteiras internas não prejudica:

a)      O exercício das competências de polícia pelas autoridades competentes dos Estados‑Membros, ao abrigo do direito nacional, na medida em que o exercício dessas competências não tenha efeito equivalente a um controlo de fronteira, o mesmo se aplicando nas zonas fronteiriças. Na aceção do primeiro período, o exercício das competências de polícia não pode considerar‑se equivalente ao exercício de controlos de fronteira, nomeadamente nos casos em que essas medidas policiais:

i)      não tiverem como objetivo o controlo fronteiriço,

ii)      se basearem em informações policiais de caráter geral e na experiência em matéria de possíveis ameaças à ordem pública e se destinarem particularmente a combater o crime transfronteiras,

iii)      forem concebidas e executadas de forma claramente distinta dos controlos sistemáticos de pessoas nas fronteiras externas,

iv)      forem aplicadas com base em controlos por amostragem;

[…]»

10      O artigo 25.o do mesmo código dispõe:

«1.      Em caso de ameaça grave à ordem pública ou à segurança interna de um Estado‑Membro no espaço sem controlos nas fronteiras internas, esse Estado‑Membro pode reintroduzir, a título excecional, o controlo em todas ou algumas partes específicas das suas fronteiras internas, por um período limitado não superior a 30 dias, ou pelo período de duração previsível da ameaça grave se a duração desta exceder 30 dias. O alcance e a duração da reintrodução temporária do controlo nas fronteiras internas não devem exceder o estritamente necessário para dar resposta à ameaça grave.

2.      O controlo nas fronteiras internas só pode ser reintroduzido em último recurso e de acordo com os artigos 27.o, 28.o e 29.o Os critérios enumerados, respetivamente, nos artigos 26.o e 30.o devem ser tidos em conta caso seja prevista uma decisão sobre a reintrodução do controlo nas fronteiras internas ao abrigo, respetivamente, dos artigos 27.o, 28.o ou 29.o

3.      Se a ameaça grave à ordem pública ou à segurança interna no Estado‑Membro em causa persistir para além do período previsto no n.o 1 do presente artigo, esse Estado‑Membro pode prolongar o controlo nas suas fronteiras internas, no respeito pelos critérios a que se refere o artigo 26.o e de acordo com o artigo 27.o, com base nas mesmas razões que as previstas no n.o 1 do presente artigo e, tendo em conta eventuais novos elementos, por períodos renováveis não superiores a 30 dias.

4.      A duração total da reintrodução do controlo nas fronteiras internas, incluindo quaisquer prorrogações previstas no n.o 3 do presente artigo, não pode exceder seis meses. Em circunstâncias excecionais, como referido no artigo 29.o, esse período total pode ser prorrogado pelo prazo máximo de dois anos nos termos do n.o 1 desse artigo.»

11      O artigo 32.o do Código das Fronteiras Schengen dispõe:

«Caso seja reintroduzido o controlo nas fronteiras internas, aplicam‑se, com as necessárias adaptações, as disposições aplicáveis do título II.»

12      Os artigos 5.o, 13.o e 14.o deste código fazem parte do seu título II, intitulado «Fronteiras externas», ao passo que os artigos 23.o, 25.o e 32.o do referido código fazem parte do seu título III, intitulado «Fronteiras internas».

13      O anexo V, parte A, ponto 2, do Código das Fronteiras Schengen prevê:

«Se o nacional de país terceiro a quem foi recusada a entrada tiver sido conduzido por um transportador até à fronteira, a autoridade localmente responsável:

a)      Ordena ao transportador que o nacional de país terceiro seja imediatamente transportado para o país terceiro donde tenha vindo, para o país terceiro que emitiu o documento que permite a passagem da fronteira ou para qualquer outro país terceiro em que a sua admissão esteja garantida, ou que sejam encontrados meios de o reencaminhar, nos termos do artigo 26.o da [CAAS] e da Diretiva 2001/51/CE do Conselho […]

b)      Até ao momento da recondução, toma as medidas adequadas, nos termos do direito nacional e atendendo às circunstâncias locais, para evitar a entrada ilegal de nacionais de países terceiros a quem tenha sido recusada a entrada.»

 Diretiva 2008/115

14      O considerando 5 da Diretiva 2008/115 enuncia:

«A presente diretiva deverá estabelecer um conjunto de normas horizontais aplicáveis a todos os nacionais de países terceiros que não preencham ou tenham deixado de preencher as condições de entrada, permanência ou residência num Estado‑Membro.»

15      O artigo 2.o desta diretiva dispõe:

«1.      A presente diretiva é aplicável aos nacionais de países terceiros em situação irregular no território de um Estado‑Membro.

2.      Os Estados‑Membros podem decidir não aplicar a presente diretiva aos nacionais de países terceiros que:

a)      Sejam objeto de recusa de entrada nos termos do artigo 13.o do Código das Fronteiras Schengen ou sejam detidos ou intercetados pelas autoridades competentes quando da passagem ilícita das fronteiras externas terrestres, marítimas ou aéreas de um Estado‑Membro e não tenham posteriormente obtido autorização ou o direito de permanência nesse Estado‑Membro;

b)      Estejam obrigados a regressar por força de condenação penal ou em consequência desta, nos termos do direito interno, ou sejam objeto de processo de extradição.

[…]»

16      Nos termos do artigo 3.o da referida diretiva:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

[…]

2.      “Situação irregular”, a presença, no território de um Estado‑Membro, de um nacional de país terceiro que não preencha ou tenha deixado de preencher as condições de entrada previstas no artigo 5.o do Código das Fronteiras Schengen ou outras condições aplicáveis à entrada, permanência ou residência nesse Estado‑Membro;

3.      “Regresso”, o processo de retorno de nacionais de países terceiros, a título de cumprimento voluntário de um dever de regresso ou a título coercivo:

–        ao país de origem, ou

–        a um país de trânsito, ao abrigo de acordos de readmissão comunitários ou bilaterais ou de outras convenções, ou

–        a outro país terceiro, para o qual a pessoa em causa decida regressar voluntariamente e no qual seja aceite;

[…]»

17      O artigo 4.o, n.o 4, da mesma diretiva prevê:

«No que diz respeito aos nacionais de países terceiros excluídos do âmbito de aplicação da presente diretiva por força da alínea a) do n.o 2 do artigo 2.o, os Estados‑Membros devem:

a)      Assegurar que o seu tratamento e nível de proteção não sejam menos favoráveis do que os previstos nos n.os 4 e 5 do artigo 8.o (restrições à utilização de medidas coercivas), na alínea a) do n.o 2 do artigo 9.o (adiamento do afastamento), nas alíneas b) e d) do n.o 1 do artigo 14.o (cuidados de saúde urgentes e tomada em consideração das necessidades das pessoas vulneráveis) e nos artigos 16.o e 17.o (condições de detenção); e

b)      Respeitar o princípio da não repulsão.»

 Direito francês

18      Nos termos do artigo L. 621‑2, 1° e 2°, do code de l’entrée et du séjour des étrangers et du droit d’asile (Código de Entrada e Permanência de Estrangeiros e do Direito de Asilo), conforme alterado pela Lei n.o 2012‑1560, de 31 de dezembro de 2012 (a seguir «Ceseda»):

«É punido com pena de prisão de um ano e multa de 3 750 euros o estrangeiro que, não sendo nacional de um Estado‑Membro da União Europeia:

1°       Tiver entrado no território metropolitano sem preencher as condições previstas no artigo 5.o, n.o 1, alíneas a), b) ou c), do Regulamento (CE) n.o 562/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março de 2006, que estabelece o código comunitário relativo ao regime de passagem de pessoas nas fronteiras (Código das Fronteiras Schengen) [(JO 2006, L 105, p. 1),] e sem ter sido admitido no território ao abrigo do artigo 5.o, n.o 4, alíneas a) e c), deste mesmo regulamento; o mesmo é aplicável se o estrangeiro estiver indicado para efeitos de não admissão em aplicação de uma decisão executória de outro Estado parte na [CAAS]

2°      Ou, vindo diretamente de um Estado parte nesta convenção, tiver entrado no território metropolitano sem cumprir o disposto nos seus artigos 19.o, n.os 1 ou 2, 20.o, n.o 1, e 21.o, n.os 1 ou 2, com exceção das condições referidas no artigo 5.o, n.o 1, alínea e), do Regulamento (CE) n.o 562/2006 […] e na alínea d), quando a indicação para efeitos de não admissão não resulte de uma decisão executória de outro Estado parte na [CAAS];

[…]

Para efeitos do presente artigo, a ação penal só pode ser exercida quando os factos tenham sido verificados nas circunstâncias previstas no artigo 53.o do code de procédure pénale [(Código de Processo Penal)]».

19      O artigo 53.o do Código de Processo Penal, na sua versão aplicável ao litígio no processo principal (a seguir «Código de Processo Penal»), dispõe:

«É flagrante delito o crime ou delito que esteja a ser cometido ou que tenha acabado de ser cometido. Reputa‑se também flagrante delito o caso em que o suspeito, logo após o crime, seja perseguido por qualquer pessoa ou encontrado na posse de objetos, ou apresente vestígios ou indícios que levem a supor que participou no crime ou no delito.

Na sequência da verificação de flagrante delito, o inquérito, levado a cabo sob a fiscalização do procurador da República nas condições previstas no presente capítulo, pode ser prosseguido, sem interrupções, durante oito dias.

Quando as investigações necessárias ao apuramento da verdade quanto a um crime ou um delito punido com pena de prisão igual ou superior a cinco anos não possam ser adiadas, o procurador da República pode decidir da prorrogação do inquérito, nas mesmas condições, por um período máximo de oito dias.»

20      O artigo 62.o‑2 do Código de Processo Penal enuncia:

«A detenção é uma medida coerciva decidida por um oficial da polícia judiciária, sob a fiscalização da autoridade judiciária, pela qual uma pessoa contra quem existam razões plausíveis para suspeitar que cometeu ou tentou cometer um crime ou um delito punido com pena de prisão é mantida à disposição dos investigadores.

[…]»

21      O artigo 78.o‑2 do Código de Processo Penal prevê:

«Os oficiais da polícia judiciária e, sob as ordens e responsabilidade destes, os agentes da polícia judiciária e os agentes adjuntos da polícia judiciária referidos nos artigos 20.o e 21.o‑1° podem pedir a comprovação da identidade, por quaisquer meios, a qualquer pessoa de quem haja razões plausíveis para suspeitar:

–        que cometeu ou tentou cometer uma infração;

–        ou que se prepara para cometer um crime ou um delito;

–        ou que pode fornecer informações úteis para o inquérito, em caso de crime ou de delito;

–        ou que violou as obrigações ou proibições a que está sujeita no âmbito de um controlo judiciário, de uma medida de obrigação de permanência na habitação com vigilância eletrónica, de uma pena ou de uma medida seguida pelo tribunal de aplicação das penas;

–        ou que é objeto de investigações ordenadas por uma autoridade judiciária.

Sob promoção, por escrito, do procurador da República, para efeitos de investigação e procedimento contra as infrações por ele indicadas, pode ser igualmente controlada a identidade de qualquer pessoa, segundo as mesmas modalidades, nos locais e pelo período de tempo determinados por este magistrado. Não constitui causa de nulidade dos procedimentos incidentais o facto de o controlo de identidade revelar infrações diferentes das referidas na promoção do procurador da República.

Pode ser igualmente controlada a identidade de qualquer pessoa, independentemente do seu comportamento, segundo as modalidades previstas no primeiro parágrafo, a fim de prevenir qualquer infração à ordem pública, designadamente à segurança das pessoas ou dos bens.

Numa zona compreendida entre a fronteira terrestre da França com os Estados partes na [CAAS] e uma linha traçada a 20 quilómetros dessa fronteira, bem como nas zonas, acessíveis ao público, de portos, aeroportos, estações ferroviárias ou rodoviárias abertos ao tráfego internacional e designados por portaria, para a prevenção e deteção das infrações relacionadas com a criminalidade transfronteiriça, a identidade de qualquer pessoa pode também ser objeto de controlo, segundo as modalidades previstas no primeiro parágrafo, tendo em vista verificar o respeito das obrigações de posse, porte e apresentação dos títulos e documentos previstos na lei. […] Quando houver um troço de autoestrada com início na zona referida no primeiro período do presente parágrafo e a primeira portagem se situar para além da linha de 20 quilómetros, o controlo pode ainda ter lugar, até esta primeira portagem, nas áreas de estacionamento, bem como na própria portagem e nas áreas de estacionamento contíguas a esta. As portagens abrangidas por esta disposição são designadas por portaria. Não constitui causa de nulidade dos procedimentos incidentais o facto de o controlo de identidade revelar uma infração diferente do não respeito das obrigações acima referidas. Para efeitos da aplicação do presente parágrafo, o controlo das obrigações de posse, porte e apresentação dos títulos e documentos previstos na lei só pode ser praticado por um período não superior a seis horas consecutivas num mesmo local e não pode consistir num controlo sistemático das pessoas presentes ou que circulam nas zonas ou locais referidos no mesmo parágrafo.

[…]»

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

22      Após a reintrodução temporária, em França, do controlo nas suas fronteiras internas comuns a outros Estados‑Membros que fazem parte do espaço Schengen, em conformidade com o artigo 25.o do Código das Fronteiras Schengen, A. Arib, de nacionalidade marroquina, foi sujeito a um controlo, em 15 de junho de 2016, na zona compreendida entre a fronteira que separa a França da Espanha e uma linha traçada a 20 quilómetros da mesma, nas condições previstas no artigo 78.o‑2, nono parágrafo, do Código de Processo Penal. A. Arib, que tinha anteriormente deixado a França na sequência de uma medida de afastamento que lhe havia sido notificada em 10 de agosto de 2013, encontrava‑se a bordo de um autocarro proveniente de Marrocos.

23      Sendo suspeito de ter entrado irregularmente no território francês, delito previsto no artigo L. 621‑2 do Ceseda, A. Arib foi detido. No dia seguinte, o prefeito dos Pirenéus Orientais emitiu contra A. Arib uma ordem de abandono do território francês e ordenou a sua colocação em detenção administrativa.

24      Por Despacho de 21 de junho de 2016, o juge des libertés et de la détention du tribunal de grande instance de Perpignan (juiz competente em matéria de liberdades e de detenção do Tribunal de Primeira Instância de Perpignan, França) decidiu anular a detenção de A. Arib e o processo subsequente, incluindo a sua detenção administrativa, com o fundamento de que, no essencial, aquela detenção não podia ser aplicada. A este respeito, salientou que A. Arib, nacional de um país terceiro em situação irregular, tinha atravessado uma fronteira interna entre a França e a Espanha, o que, em seu entender, devia levar à aplicação da Diretiva 2008/115, ao abrigo da qual nenhuma pena de prisão pode ser aplicada em circunstâncias como as do caso em apreço.

25      Por Despacho de 22 de junho de 2016, o conseiller délégué près la cour d’appel de Montpellier (conselheiro delegado junto do Tribunal de Recurso de Montpellier, França) confirmou a decisão de primeira instância. O prefeito dos Pirenéus Orientais interpôs recurso de cassação deste despacho para o órgão jurisdicional de reenvio, a Cour de cassation (Tribunal de Cassação, França), alegando, nomeadamente, que, em caso de ameaça grave à ordem pública ou à segurança interna, um Estado‑Membro pode excecionalmente reintroduzir o controlo nas suas fronteiras internas, afastando assim, parcialmente, a aplicação da Diretiva 2008/115. Segundo o prefeito, não sendo aplicáveis, no caso, as medidas protetoras previstas nesta diretiva, uma pessoa que tenha entrado irregularmente em França pode ser controlada em conformidade com as disposições do artigo 78.o‑2, nono parágrafo, do Código de Processo Penal e, se estiver em situação irregular, condenada em pena de prisão e, por isso, detida.

26      O órgão jurisdicional de reenvio salienta, por um lado, que o Código das Fronteiras Schengen estabelece o princípio da livre circulação no espaço Schengen e prevê a inexistência de controlos nas fronteiras internas entre os Estados‑Membros e, por outro, que, em caso de ameaça grave à ordem pública ou à segurança interna de um Estado‑Membro, este pode, não obstante, reintroduzir excecionalmente o controlo nas fronteiras em todas ou parte das suas fronteiras internas durante um período limitado, em aplicação do artigo 25.o desse código.

27      O mesmo órgão jurisdicional considera ainda que, segundo o artigo 32.o do Código das Fronteiras Schengen, caso seja reintroduzido um controlo nas fronteiras internas, aplicam‑se, com as necessárias adaptações, as disposições aplicáveis do título II desse código, relativas às fronteiras externas. Salienta, a este respeito, que, por força do artigo 5.o, n.o 3, do referido código, os Estados‑Membros aplicam sanções efetivas, proporcionadas e dissuasivas, em caso de passagem não autorizada das fronteiras externas. Acrescenta que, em conformidade com o artigo 13.o do mesmo código, a vigilância das fronteiras tem por objetivo impedir a passagem não autorizada das mesmas e tomar medidas contra quem as tiver atravessado ilegalmente, de tal forma que quem atravessar ilegalmente uma fronteira e não tiver direito a residir no território do Estado‑Membro em questão deve ser detido e ficar sujeito a procedimento por força da Diretiva 2008/115.

28      No entender do órgão jurisdicional de reenvio, a Diretiva 2008/115 impõe aos Estados‑Membros que tomem uma decisão de afastamento contra qualquer nacional de um país terceiro em situação irregular no território, o qual só poderá ser detido para preparar o seu regresso ou para proceder ao seu afastamento e desde que uma medida suficiente, mas menos coerciva, não possa ser aplicada eficazmente. Esse órgão jurisdicional remete para o Acórdão de 7 de junho de 2016, Affum (C‑47/15, EU:C:2016:408), no qual o Tribunal de Justiça declarou que a Diretiva 2008/115 se opõe a uma regulamentação de um Estado‑Membro que permite, devido unicamente à entrada irregular por uma fronteira interna, que leva a uma situação irregular, a prisão de um nacional de um país terceiro, relativamente ao qual o procedimento de regresso estabelecido por essa diretiva não foi ainda concluído.

29      O órgão jurisdicional de reenvio salienta que o artigo L. 621‑2 do Ceseda pune com pena de prisão acompanhada de uma multa a entrada irregular no território quando a mesma é constatada em circunstâncias de flagrante delito.

30      À luz dessa disposição, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se, em primeiro lugar, quanto à questão de saber se o controlo reintroduzido numa fronteira interna de um Estado‑Membro é equiparável ao controlo numa fronteira externa, aquando da sua passagem por um nacional de um país terceiro sem direito de entrada, quando o controlo é efetuado em flagrante delito.

31      Em caso de resposta afirmativa, importa, em seguida, segundo o referido órgão jurisdicional, determinar as modalidades desse controlo. Neste contexto, salienta, por um lado, que o artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2008/115 permite aos Estados‑Membros continuar a aplicar nas suas fronteiras externas procedimentos de regresso nacionais simplificados, sem ter de seguir todas as etapas dos procedimentos previstos pela referida diretiva, a fim de poder afastar mais rapidamente os nacionais dos países terceiros intercetados quando da passagem dessas fronteiras. Por outro lado, salienta que o artigo 4.o, n.o 4, da referida diretiva enquadra o exercício pelos Estados‑Membros da faculdade prevista no artigo 2.o, n.o 2, alínea a) da mesma, devendo os Estados‑Membros respeitar certas garantias mínimas, entre as quais figuram, nomeadamente, as condições de detenção estabelecidas nos artigos 16.o e 17.o da mesma diretiva.

32      O órgão jurisdicional de reenvio pergunta‑se, assim, sobre se um Estado‑Membro que restabeleceu o controlo nas fronteiras internas pode invocar o referido artigo 2.o, n.o 2, alínea a), para subtrair o nacional de um país terceiro que atravessa irregularmente tal fronteira e ainda não permaneceu no território nacional à aplicação da Diretiva 2008/115.

33      Em caso de resposta afirmativa, colocar‑se‑ia, por último, a questão de saber se o artigo 4.o, n.o 4, da Diretiva 2008/115 deve ser interpretado no sentido de que não obsta à prisão de nacionais de países terceiros, nas circunstâncias de facto do caso em apreço.

34      Nestas condições, a Cour de cassation (Tribunal de Cassação) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      O artigo 32.o do [Código das Fronteiras Schengen], que prevê que, caso seja restabelecido o controlo nas fronteiras internas, as disposições aplicáveis do título II (sobre as fronteiras externas) aplicam‑se com as necessárias adaptações, deve ser interpretado no sentido de que o controlo reintroduzido numa fronteira interna de um Estado‑Membro é equiparável a um controlo realizado numa fronteira externa, aquando da sua passagem por um nacional de um país terceiro privado do direito de entrada?

2)      Nas mesmas circunstâncias de restabelecimento do controlo nas fronteiras internas, este [código] e a Diretiva 2008/115 […] permitem aplicar à situação de um nacional de país terceiro, que passa uma fronteira onde o controlo foi restabelecido, a faculdade prevista no artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da [mesma] diretiva, que confere aos Estados‑Membros a possibilidade de continuarem a aplicar os procedimentos de regresso nacionais simplificados nas suas fronteiras externas?

3)      Em caso de resposta afirmativa a esta última questão, as disposições do artigo 2.o, n.o 2, alínea a), e do artigo 4.o, n.o 4, da [referida] diretiva opõem‑se a uma regulamentação nacional como o artigo L. 621‑2 do [Ceseda], que pune com pena de prisão a entrada irregular no território nacional de um nacional de país terceiro para o qual o procedimento de regresso estabelecido na [mesma] diretiva não foi ainda concluído?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira e segunda questões

35      Com a primeira e segunda questões, que importa analisar conjuntamente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2008/115, lido em conjugação com o artigo 32.o do Código das Fronteiras Schengen, deve ser interpretado no sentido de que é aplicável à situação de um nacional de um país terceiro, detido na proximidade imediata de uma fronteira interna de um Estado‑Membro, quando esse Estado‑Membro tenha reintroduzido, ao abrigo do artigo 25.o desse código, o controlo nessa fronteira, devido a uma ameaça grave à ordem pública ou à segurança interna do referido Estado‑Membro.

36      A título preliminar, importa sublinhar que, conforme referido nos n.os 22 e 23 do presente acórdão, A. Arib, de nacionalidade marroquina, não foi objeto de uma decisão de recusa de entrada no território francês, mas foi sujeito a um controlo, da parte das autoridades francesas, na proximidade imediata da fronteira franco‑espanhola, após a reintrodução de controlos nesta fronteira ao abrigo do artigo 25.o do Código das Fronteiras Schengen, e foi detido, na sequência desse controlo, dado que era suspeito de ter cometido o delito a que se refere o artigo L. 621‑2 do Ceseda, que consiste em ter entrado irregularmente no território francês.

37      Em primeiro lugar, cabe recordar, a este respeito, que decorre quer da definição do conceito de «situação irregular», que figura no artigo 3.o, ponto 2, da Diretiva 2008/115, quer do considerando 5 desta diretiva, segundo o qual esta se aplica «a todos os nacionais de países terceiros que não preencham ou tenham deixado de preencher as condições de entrada, permanência ou residência», que um nacional de um país terceiro que, na sequência da sua entrada irregular no território de um Estado‑Membro, se encontra nesse território sem preencher as condições de entrada, permanência ou residência está, por isso, em situação irregular, sem que essa presença esteja sujeita a um requisito que exija uma duração mínima ou uma intenção de permanecer nesse território (v., neste sentido, Acórdão de 7 de junho de 2016, Affum, C‑47/15, EU:C:2016:408, n.os 48 e 59).

38      Um nacional de país terceiro que, como A. Arib, após ter entrado irregularmente no território de um Estado‑Membro, é intercetado no território desse Estado‑Membro, na proximidade imediata de uma das suas fronteiras internas, sem preencher as condições de entrada, permanência ou residência nesse território deve, por conseguinte, ser considerado como estando em situação irregular.

39      Um nacional de país terceiro numa situação destas insere‑se, em conformidade com o artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115, e sem prejuízo do disposto no artigo 2.o, n.o 2, dessa diretiva, no âmbito de aplicação da mesma. Deve, portanto, em princípio, estar sujeito às normas e aos procedimentos comuns aí previstos com vista ao seu afastamento, desde que a sua situação não tenha sido, eventualmente, regularizada (v., neste sentido, Acórdão de 7 de junho de 2016, Affum, C‑47/15, EU:C:2016:408, n.o 61).

40      Em segundo lugar, cabe recordar, a este respeito, que, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a referida diretiva não se opõe a uma regulamentação de um Estado‑Membro que permite a prisão de um nacional de um país terceiro ao qual o procedimento de regresso instituído pela mesma diretiva foi aplicado e que ou permanece em situação irregular no território desse Estado‑Membro sem motivo justificado para o não regresso ou entrou de novo no território desse Estado, violando a proibição de entrada (v., neste sentido, Acórdão de 7 de junho de 2016, Affum, C‑47/15, EU:C:2016:408, n.os 54 e 64).

41      No entanto, resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça, bem como das respostas dadas na audiência às questões colocadas pelo Tribunal de Justiça, que A. Arib não se encontra em nenhuma das duas situações referidas no número anterior.

42      Em terceiro lugar, há que salientar que o artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2008/115 permite aos Estados‑Membros não aplicar esta diretiva, sem prejuízo do disposto no artigo 4.o, n.o 4, da mesma, em duas situações específicas, a saber, a de nacionais de países terceiros a quem tenha sido recusada a entrada numa fronteira externa de um Estado‑Membro, em conformidade com o artigo 14.o do Código das Fronteiras Schengen, ou a de nacionais de países terceiros detidos ou intercetados quando da passagem ilícita de tal fronteira externa e que não tenham posteriormente obtido autorização ou o direito de permanência nesse Estado‑Membro.

43      Conforme exposto no n.o 36 do presente acórdão, A. Arib não foi objeto de uma decisão de recusa de entrada no território francês. Daqui resulta que não pode, de forma alguma, ser abrangido pela primeira das duas situações referidas no artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2008/115.

44      Por conseguinte, há que determinar se um nacional de um país terceiro que se encontra em situação irregular no território de um Estado‑Membro e que foi detido na proximidade imediata de uma fronteira interna desse Estado‑Membro é abrangido pela segunda situação referida no artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2008/115, quando o Estado‑Membro em causa tenha reintroduzido os controlos nessa fronteira devido a uma ameaça grave à ordem pública ou à segurança interna do referido Estado‑Membro, em conformidade com o artigo 25.o do Código das Fronteiras Schengen.

45      A este propósito, importa recordar, em primeiro lugar, que, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, as duas situações visadas no artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2008/115 dizem exclusivamente respeito à passagem de uma fronteira externa de um Estado‑Membro, conforme definida no artigo 2.o do Código das Fronteiras Schengen, e, portanto, não dizem respeito à passagem de uma fronteira comum a Estados‑Membros que fazem parte do espaço Schengen (Acórdão de 7 de junho de 2016, Affum, C‑47/15, EU:C:2016:408, n.o 69).

46      Em particular, a segunda das situações referidas no artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2008/115 implica um nexo temporal e espacial direto entre a detenção e a interceção do nacional de um país terceiro e a passagem de uma fronteira externa. São assim visados os nacionais dos países terceiros que foram detidos ou intercetados pelas autoridades competentes no próprio momento da passagem ilícita de uma fronteira externa ou após essa passagem na proximidade dessa fronteira (v., neste sentido, Acórdão de 7 de junho de 2016, Affum, C‑47/15, EU:C:2016:408, n.o 72).

47      Deste modo, o artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2008/115 deve ser interpretado no sentido de que não permite aos Estados‑Membros excluir do âmbito de aplicação dessa diretiva nacionais de países terceiros em situação irregular devido à sua entrada irregular por uma fronteira interna (Acórdão de 7 de junho de 2016, Affum, C‑47/15, EU:C:2016:408, n.os 69 e 77).

48      Há contudo que determinar, em segundo lugar, se a circunstância de os controlos terem sido reintroduzidos por um Estado‑Membro nas suas fronteiras internas, de acordo com o artigo 25.o do Código das Fronteiras Schengen, é suscetível de subsumir no artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2008/115 a situação de um nacional de um país terceiro em situação irregular no território desse Estado‑Membro e detido nas imediações de tal fronteira interna.

49      O artigo 25.o do Código das Fronteiras Schengen autoriza um Estado‑Membro, a título excecional e em determinadas condições, a reintroduzir temporariamente um controlo nas fronteiras em todas ou algumas partes específicas das suas fronteiras internas em caso de ameaça grave à ordem pública ou à segurança interna desse Estado‑Membro. Nos termos do artigo 32.o desse código, caso seja reintroduzido um controlo nas fronteiras internas, aplicam‑se, com as necessárias adaptações, as disposições aplicáveis do referido código relativas às fronteiras externas.

50      A este respeito, cabe salientar, em primeiro lugar, que, enquanto derrogação ao âmbito de aplicação da Diretiva 2008/115, a exceção prevista no artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da mesma deve ser interpretada de forma estrita.

51      Ora, como resulta já dos n.os 45 e 47 do presente acórdão, esta disposição incide, em conformidade com a sua própria redação inequívoca a este respeito, sobre a situação de um nacional de país terceiro que se encontre numa «fronteira externa» de um Estado‑Membro ou na proximidade imediata de tal fronteira externa. Não contém, portanto, qualquer menção a uma possível equiparação à situação de um nacional de país terceiro que se encontre numa fronteira interna em que os controlos foram reintroduzidos, ao abrigo do artigo 25.o do Código das Fronteiras Schengen, ou na proximidade imediata de uma fronteira interna, quando, à data da adoção dessa diretiva, os artigos 23.o e 28.o do Regulamento n.o 562/2006 já previam, por um lado, que os Estados‑Membros podiam, a título excecional, reintroduzir controlos nas suas fronteiras internas em caso de ameaça grave à sua ordem pública ou à sua segurança interna e, por outro, que, nessa situação, as disposições pertinentes deste regulamento relativas às fronteiras externas se aplicavam com as necessárias adaptações.

52      No que diz respeito, em segundo lugar, à finalidade prosseguida pelo artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2008/115, o Tribunal de Justiça já declarou que essa finalidade consiste em permitir que os Estados‑Membros, nas duas situações referidas nesta disposição, continuem a aplicar, nas suas fronteiras externas, procedimentos de regresso simplificados, sem terem de seguir todas as etapas dos procedimentos previstos pela referida diretiva, a fim de poder afastar mais rapidamente os nacionais de países terceiros intercetados quando da passagem de tais fronteiras (Acórdão de 7 de junho de 2016, Affum, C‑47/15, EU:C:2016:408, n.o 74).

53      A este respeito, deve observar‑se que o artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2008/115 trata de maneira idêntica a interceção ou a detenção na proximidade imediata de uma fronteira externa de um Estado‑Membro, a que se refere o artigo 13.o do Código das Fronteiras Schengen, e a adoção de uma decisão de recusa de entrada, na aceção do artigo 14.o desse código.

54      Com efeito, se, como o artigo 14.o, n.o 4, do Código das Fronteiras Schengen confirma, a adoção de uma decisão de recusa de entrada no território do espaço Schengen pretende evitar que o nacional de país terceiro objeto da mesma entre nesse território, a detenção ou a interceção de tal nacional, em situação irregular, quando da passagem de uma fronteira externa ou na proximidade imediata de tal fronteira, permite igualmente às autoridades nacionais competentes tomar fácil e rapidamente, tendo em conta o lugar em que o referido nacional tenha sido detido, as medidas adequadas para evitar que o mesmo permaneça no referido território, conduzindo‑o de imediato à fronteira externa que foi ilicitamente passada.

55      Nestas circunstâncias, caracterizadas, nomeadamente, pela proximidade de uma fronteira externa, pode‑se justificar autorizar um Estado‑Membro a não seguir todas as etapas do procedimento previsto na Diretiva 2008/115, para acelerar o regresso dos nacionais de países terceiros em situação irregular no seu território para um país terceiro.

56      Inversamente, a simples reintrodução de controlos nas fronteiras internas de um Estado‑Membro não tem como consequência que um nacional de país terceiro, em situação irregular e detido quando da passagem dessa fronteira ou na proximidade imediata da mesma, possa ser afastado mais rápida ou facilmente do território do espaço Schengen, ao ser de imediato levado a uma fronteira externa, como se tivesse sido detido, durante um controlo de polícia, na aceção do artigo 23.o, alínea a), do Código das Fronteiras Schengen, no mesmo local, sem que os controlos nas referidas fronteiras tivessem sido reintroduzidos.

57      Contrariamente ao que alegou, em substância, o Governo alemão, tal conclusão não é afetada pela assunção das obrigações impostas aos transportadores por força do anexo V, parte A, ponto 2, do Código das Fronteiras Schengen e do artigo 26.o da CAAS.

58      Com efeito, mesmo admitindo que tais obrigações se aplicam da mesma forma, por força do artigo 32.o do referido código, quando os controlos nas fronteiras internas tenham sido reintroduzidos, deve, não obstante, salientar‑se que o anexo V, parte A, ponto 2, do Código das Fronteiras Schengen e o artigo 26.o da CAAS têm como consequência a imposição aos transportadores do reencaminhamento do nacional de um país terceiro que transportam apenas quando a entrada na fronteira lhe é recusada, e não quando, como A. Arib, esse nacional é detido ou intercetado após ter passado ilicitamente a mesma fronteira.

59      Daqui resulta que, tendo em conta a finalidade prosseguida pelo artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2008/115, não é necessário distinguir a situação de um nacional de um país terceiro em situação irregular, detido na proximidade imediata de uma fronteira interna, consoante os controlos tenham ou não sido reintroduzidos nessa fronteira.

60      Em terceiro lugar, a necessidade de uma interpretação restritiva do âmbito de aplicação do artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2008/115 é também corroborada por uma análise do contexto no qual se insere esta disposição e, em especial, por uma leitura sistemática do Código das Fronteiras Schengen.

61      A este respeito, deve salientar‑se, em primeiro lugar, que decorre desse código que uma fronteira interna na qual os controlos tenham sido reintroduzidos por um Estado‑Membro ao abrigo do artigo 25.o do referido código não se confunde com uma fronteira externa, na aceção do mesmo código.

62      Com efeito, nos termos do artigo 2.o do Código das Fronteiras Schengen, os conceitos de «fronteiras internas» e de «fronteiras externas» excluem‑se mutuamente. Ora, o artigo 32.o desse código limita‑se a prever que, quando os controlos nas fronteiras internas são reintroduzidos por um Estado‑Membro, apenas são aplicáveis, com as necessárias adaptações, as disposições do mesmo código relativas às fronteiras externas que sejam pertinentes. Em contrapartida, o referido artigo 32.o não prevê, como salientou o advogado‑geral, em substância, no n.o 52 das suas conclusões, que, nesse caso, se aplique o artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2008/115. A própria redação do Código das Fronteiras Schengen opõe‑se, assim, a que, para efeitos desta diretiva, uma fronteira interna na qual os controlos tenham sido reintroduzidos ao abrigo do artigo 25.o desse código seja equiparada a uma fronteira externa.

63      Além disso, é verdade que, como salienta o órgão jurisdicional de reenvio, o artigo 5.o, n.o 3, do Código das Fronteiras Schengen exige que os Estados‑Membros apliquem, no caso de passagem não autorizada das fronteiras externas fora dos pontos de passagem de fronteira e das horas de abertura fixadas, sanções que sejam efetivas, proporcionadas e dissuasivas.

64      Ainda assim, e independentemente da questão de saber se essa disposição constitui uma disposição aplicável, na aceção do artigo 32.o do Código das Fronteiras Schengen, com as necessárias adaptações, em caso de reintrodução por um Estado‑Membro de um controlo nas suas fronteiras internas, em qualquer caso, há que salientar que a referida disposição não pretende de forma alguma revogar as normas e procedimentos comuns instituídos pela Diretiva 2008/115, como é, além disso, expressamente confirmado no artigo 13.o, n.o 1, do mesmo código, o qual prevê que devem ser tomadas medidas contra quem tiver atravessado ilegalmente uma fronteira externa e que, se essa pessoa não tiver direito a residir no território do Estado‑Membro em questão, deve ser detida e ficar sujeita a procedimento por força da Diretiva 2008/115 (v., neste sentido, Acórdão de 7 de junho de 2016, Affum, C‑47/15, EU:C:2016:408, n.o 90).

65      O artigo 13, n.o 1, do Código das Fronteiras Schengen visa, deste modo, precisar a relação entre a vigilância das fronteiras e a aplicação dos procedimentos de regresso previstos pela Diretiva 2008/115 (Acórdão de 26 de julho de 2017, Jafari, C‑646/16, EU:C:2017:586, n.o 69). Daqui resulta que as medidas adotadas pelos Estados‑Membros, nomeadamente em conformidade com o artigo 5.o, n.o 3, do Código das Fronteiras Schengen, para garantir a eficácia da vigilância nas fronteiras, não podem ter por efeito alterar as obrigações que decorrem dessa diretiva para os Estados‑Membros.

66      Por último, importa recordar que a Diretiva 2008/115 não exclui a faculdade de os Estados‑Membros punirem com pena de prisão outros delitos que não os previstos simplesmente para uma entrada irregular, incluindo nas situações em que o procedimento de regresso previsto nesta diretiva ainda não tinha sido concluído (acórdão de 7 de junho de 2016, Affum, C‑47/15, EU:C:2016:408, n.o 65). Por conseguinte, a referida diretiva também não se opõe à prisão ou detenção de um nacional de país terceiro em situação irregular quando tais medidas são adotadas com o fundamento de que esse nacional é suspeito de ter cometido um delito além da simples entrada irregular no território nacional, e nomeadamente um delito suscetível de ameaçar a ordem pública ou a segurança interna do Estado‑Membro em causa.

67      Resulta do exposto que há que responder à primeira e segunda questões que o artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2008/115, lido em conjugação com o artigo 32.o do Código das Fronteiras Schengen, deve ser interpretado no sentido de que não se aplica à situação de um nacional de país terceiro, detido na proximidade imediata de uma fronteira interna e em situação irregular no território de um Estado‑Membro, mesmo quando esse Estado‑Membro tenha reintroduzido, ao abrigo do artigo 25.o desse código, o controlo nessa fronteira, devido a uma ameaça grave à ordem pública ou à segurança interna do referido Estado‑Membro.

 Quanto à terceira questão

68      Atendendo à resposta dada à primeira e segunda questões, não há que responder à terceira questão.

 Quanto às despesas

69      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

O artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2008/115/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa a normas e procedimentos comuns nos EstadosMembros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular, lido em conjugação com o artigo 32.o do Regulamento (UE) 2016/399 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de março de 2016, que estabelece o código da União relativo ao regime de passagem de pessoas nas fronteiras (Código das Fronteiras Schengen), deve ser interpretado no sentido de que não se aplica à situação de um nacional de país terceiro, detido na proximidade imediata de uma fronteira interna e em situação irregular no território de um EstadoMembro, mesmo quando esse EstadoMembro tenha reintroduzido, ao abrigo do artigo 25.o desse regulamento, o controlo nessa fronteira, devido a uma ameaça grave à ordem pública ou à segurança interna do referido EstadoMembro.

Assinaturas


*      Língua do processo: francês.