Language of document : ECLI:EU:C:2005:650

CONCLUSÕES DA ADVOGADA‑GERAL

CHRISTINE STIX‑HACKL

apresentadas em 27 de Outubro de 2005 1(1)

Processos apensos C‑131/04 e C‑257/04

C. D. Robinson‑Steele

contra

R. D. Retail Services Ltd

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Employment Tribunal de Leeds (Reino Unido)]

Michael Jason Clarke

contra

Frank Staddon Ltd

e

J. C. Caulfield

C. F. Caulfield

K. V. Barnes

contra

Hanson Clay Products Ltd, anteriormente Marshalls Clay Products Ltd

[pedido de decisão prejudicial apresentado pela Court of Appeal (England and Wales) (Civil Division)]

«Protecção da segurança e da saúde do trabalhador – Organização do tempo de trabalho – Artigo 7.° da Directiva 93/104/CE – Direito a um período mínimo de férias remuneradas – Acordo de inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias (‘rolled up holiday pay’)»





I –    Introdução

1.        Nos presentes processos, o Tribunal é chamado a interpretar o artigo 7.° da Directiva 93/104/CE (2). Os órgãos jurisdicionais de reenvio pretendem saber, no essencial, em que medida é compatível com a referida disposição uma norma nacional que:

–        permite a inclusão, na retribuição de um trabalhador, de pagamentos por conta das suas férias anuais, e que esses pagamentos constituam uma parte da retribuição devida pelo tempo de trabalho prestado, e que

–        permite, portanto, que estes pagamentos sejam efectuados sem correspondência com os períodos de férias efectivamente gozados («rolled up holiday pay»).

II – Quadro jurídico

A –    Direito comunitário

2.        O artigo 7.° da Directiva 93/104, relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho, dispõe:

«Férias anuais

1.      Os Estados‑Membros tomarão as medidas necessárias para que todos os trabalhadores beneficiem de férias anuais remuneradas de pelo menos quatro semanas, de acordo com as condições de obtenção e de concessão previstas nas legislações e/ou práticas nacionais.

2.      O período mínimo de férias anuais remuneradas não pode ser substituído por retribuição financeira, excepto nos casos de cessação da relação de trabalho.»

B –    Direito nacional

3.        O Reino Unido transpôs a Directiva 93/104 através das Working Time Regulations 1998.

4.        A Regulation 13 prevê:

«(1)      [...] [Um] trabalhador tem direito a quatro semanas de férias por ano.

[...]

(9)      As férias a que o trabalhador tem direito nos termos da presente Regulation podem ser gozadas de forma repartida, mas –

(a)      só podem ser gozadas no ano em que se vencem e

(b)      não podem ser substituídas por uma retribuição financeira, excepto no caso de cessação da relação de trabalho.»

5.        A Regulation 16 dispõe:

«(1)      O trabalhador tem direito a retribuição por qualquer período de férias de que beneficie nos termos da Regulation 13, no valor correspondente a uma semana de trabalho por cada semana de férias.

[...]

(4)      O direito à retribuição de férias prevista no parágrafo (1) não afecta o direito do trabalhador à retribuição de férias estipulada no seu contrato (‘retribuição contratual’).

(5)      A retribuição contratual paga a um trabalhador por um período de férias desonera o empregador de qualquer responsabilidade pela retribuição desse mesmo período de férias nos termos da presente Regulation; inversamente, o pagamento da retribuição de um período de férias nos termos da presente Regulation desonera o empregador de qualquer responsabilidade pelo pagamento da retribuição contratual correspondente a esse período de férias.

6.        A Regulation 35 diz o seguinte:

«(1)      É nula qualquer cláusula contratual (quer o respectivo contrato seja um contrato de trabalho ou não) que tenha por objecto:

i)      (a)   excluir ou limitar a aplicação das disposições das presentes Regulations, excepto nos casos em que as presentes Regulations disponham que o contrato tem esse efeito [...]»

III – Factos, tramitação processual e questões prejudiciais

A –    Processo C‑131/04 (Robinson‑Steele)

1.      Factos

7.        O processo C‑131/04 tem por base o litígio que opõe, no processo principal, C. D. Robinson‑Steele, enquanto trabalhador, ao seu empregador R. D. Retail Services Ltd.

8.        C. D. Robinson‑Steele trabalhou de 19 de Abril de 2002 a 19 de Dezembro de 2003 para a R. D. Retail Services, mediante diversos contratos, o último dos quais, pelo menos, de trabalho temporário. O contrato de trabalho em vigor a partir de 29 de Junho de 2003 previa, em especial, que a retribuição de férias acresce de forma proporcional ao tempo de trabalho prestado continuamente no ano a que dizem respeito as férias gozadas pelo trabalhador temporário em missão. Além disso, o contrato incluía o consentimento, pelo trabalhador temporário, a que a retribuição de férias fosse paga simultaneamente com e em acréscimo à sua retribuição horária, no montante correspondente a 8,33% do valor desta última.

9.        Segundo informação prestada pelo órgão jurisdicional de reenvio, a percentagem de 8,33% relativa a férias pagas corresponde exactamente a uma semana de retribuição na sequência de uma prestação contínua de trabalho durante três meses no regime de turnos diurnos e nocturnos alternados.

10.      C. D. Robinson‑Steele auferia uma retribuição semanal. Dos recibos de retribuição constava a menção: «A retribuição compreende a os montantes correspondentes às férias e faltas por doença». Do recibo não constava qualquer indicação separada da retribuição das férias anuais.

2.      Tramitação processual nacional

11.      Em 14 de Janeiro de 2004, C. D. Robinson‑Steele (a seguir «demandante no processo principal») propôs uma acção no Employment Tribunal de Leeds. Na petição, alegava, no essencial, ter trabalhado durante 20 meses para a R. D. Retail Services (a seguir «demandada no processo principal»), tendo recebido unicamente «pagamentos por conta das férias» incluídos na sua retribuição («rolled up holiday pay»). Por isso, não pôde gozar férias, já que a correspondente retribuição não foi paga imediatamente antes, depois ou durante as férias.

12.      O órgão jurisdicional de reenvio entende ser necessária a interpretação do artigo 7.° da Directiva, na medida em que, por um lado, o Employment Tribunal inglês, a cuja decisão aquele está vinculado, decidiu que é válido à luz do direito nacional, em particular à luz das Regulations supramencionadas, o acordo, celebrado no âmbito da autonomia privada, de «rolled up holiday pay», nos termos do qual uma importância fixa ou percentagem é paga em acréscimo à retribuição (3), e, por outro, a Inner House of the Court of Session, na Escócia, declarou a nulidade de um acordo análogo, nos termos do qual a retribuição de férias é integrada numa outra prestação, paga independentemente das férias efectivamente gozadas (4).

13.      Por conseguinte, o Employment Tribunal de Leeds, por despacho de 9 de Março de 2004, submeteu ao Tribunal de Justiça, para que este se pronuncie a título prejudicial, as seguintes questões:

1.      O artigo 7.° da Directiva 93/104/CE do Conselho é compatível com uma legislação nacional que permite que a retribuição das férias anuais seja incluída na retribuição horária do trabalhador e seja considerada parte da retribuição correspondente ao tempo de trabalho, mas sem ser paga relativamente a um período de férias efectivamente gozado pelo trabalhador?

2.      O artigo 7.°, n.° 2, obsta a que um órgão jurisdicional nacional considere válidos esses pagamentos do empregador quando pretende conceder uma protecção efectiva ao demandante em conformidade com as competências previstas na legislação nacional?

B –    Processo C‑257/04

14.      Ao processo C‑257/04 estão subjacentes dois processos que correm termos na Court of Appeal (England and Wales) e cuja apensação foi ordenada por esta.

1.      Processo Caulfield e o. contra Marshalls Clay Products Ltd

a)      Factos

15.      Na Marshalls Clay Products Ltd foi implementado um sistema de turnos para assegurar que a actividade da empresa seja exercida sem interrupções, do que resulta que cada trabalhador trabalha quatro dias e pode gozar quatro dias livres.

16.      A fim de organizar as férias dos trabalhadores sem prejuízo desta modalidade de trabalho, em Julho de 1984 foi celebrado um acordo de empresa entre a Marshalls Clay Products e uma associação sindical, o qual faz parte integrante do contrato de trabalho de cada trabalhador e contém a seguinte cláusula:

«3.      Férias

A retribuição de férias está incluída na retribuição horária, pelo que não há lugar ao pagamento de retribuição de férias em acréscimo a esta última. As férias são gozadas durante os períodos de descanso no sistema de rotação por turnos. De modo a poderem ser organizados períodos de férias alargados, cada pessoa terá direito a:

dois períodos de 8 dias consecutivos

e

um período de 16 dias consecutivos. [...]»

17.      Para fixar o montante da retribuição de férias (5) havia ainda um outro acordo, celebrado em Maio de 1984 entre a Marshalls Clay Products e uma associação sindical, que previa, inter alia, o seguinte:

«Actualmente, os trabalhadores de Accrington auferem 31 dias de retribuição de férias por ano (para 29 dias de férias). Assim, a proporção daquela relativamente aos dias de trabalho (232) é de 13,36%. A retribuição horária inclui 13,36% como retribuição de férias.»

18.      No entanto, a parte da retribuição horária que funcionava como retribuição de férias não era indicada no contrato de trabalho nem nos recibos de retribuição; os contratos de trabalho continham, todavia, uma referência global aos acordos.

19.      O órgão jurisdicional de reenvio refere que o resultado era o de as férias serem gozadas durante os períodos de descanso. Os trabalhadores podem mas não têm de gozar, dois períodos de oito dias consecutivos cada, ou um período de dezasseis dias consecutivos, mas apenas acumulando ou juntando os seus dias de descanso e, através de uma série de trocas mutuamente acordadas, trabalhando nos turnos de outras pessoas.

20.      No sistema de trabalho por turnos, cada trabalhador aufere, por 182 dias de trabalho prestados em cada ano, uma retribuição de férias correspondente a 24,32 dias: em cada 7,515 GBP pagas por hora de trabalho, 6,629 GBP referem se ao tempo de trabalho efectivo e 88.6 p constituem o acréscimo por conta da retribuição de férias.

21.      Consequentemente, os trabalhadores são pagos pelos quatro dias em que trabalham, mas não pelos quatro dias em que não trabalham. Assim, a sua retribuição horária é aumentada de modo a incluir a retribuição de férias. Os montantes da retribuição horária aplicam‑se também às horas extraordinárias, pelo que os trabalhadores que efectuam horas extraordinárias recebem suplementos relativos tanto à retribuição‑base como à retribuição de férias.

b)      Tramitação processual nacional

22.      Por petições iniciais datadas de 3 de Setembro de 2001, J. C. Caulfield, C. F. Caulfield e K. V. Barnes (a seguir «demandantes no processo principal») propuseram acções no Manchester Employment Tribunal, pedindo a condenação da Marshalls Clay Products Ltd (a seguir «demandada») a pagar‑lhes as férias anuais relativas ao período de 1 de Outubro de 1998 a 3 de Setembro de 2001.

23.      Por decisão de 12 de Dezembro de 2002, o Manchester Employment Tribunal decidiu favoravelmente aos três recorrentes e ordenou que lhes fosse paga uma indemnização a liquidar posteriormente.

24.      Por requerimento apresentado no Employment Appeal Tribunal, a demandada interpôs recurso desta decisão.

25.      Em 25 de Julho de 2003, o Employment Appeal Tribunal concedeu provimento ao recurso interposto pela demandada.

2.      Processo Clarke contra Frank Staddon Ltd

a)      Factos

26.      Segundo informa o órgão jurisdicional de reenvio, M. J. Clarke (a seguir «demandante no processo principal») trabalhou de 2 de Abril de 2001 a 23 de Junho de 2001 para a empresa Frank Staddon Ltd (a seguir «demandada»), como trabalhador ficticiamente independente, no âmbito de um contrato de subempreitada (construction industry scheme). Não obstante, é pacífico que o demandante no processo principal beneficia dos direitos concedidos pela directiva e pelas Working Time Regulations 1998.

27.      De 24 de Junho de 2001 a 24 de Julho de 2001 o demandante gozou férias, durante as quais não foi pago.

28.      O contrato do demandante no processo principal estipulava:

«A retribuição das férias e feriados está incluída na retribuição horária».

O mesmo documento contém uma anotação manuscrita sob o título «MONTANTE DA RETRIBUIÇÃO»:

«Retribuição‑base: 8.689 Férias: 0.756 = 85 GBP por dia.»

29.      Do recibo da retribuição relativa a Agosto de 2001 constava a mesma discriminação. Porém, a retribuição de 85 GBP diz respeito apenas ao período que se iniciou em 24 de Junho de 2001. Assim, no período anterior a esta data a demandada não discriminou a quota‑parte da retribuição diária que corresponde à retribuição de férias.

b)      Tramitação processual nacional

30.      Por petição entregue no Employment Tribunal em 20 de Novembro de 2001, o demandante propôs uma acção na qual pediu que a demandada fosse condenada a pagar‑lhe a retribuição das férias anuais decorrentes do trabalho para esta no período de 2 de Abril a 16 de Novembro de 2001.

31.      Por decisão de 19 de Abril de 2002, o Employment Tribunal julgou improcedente o pedido do demandante.

32.      Por requerimento apresentado no Employment Appeal Tribunal, o demandante interpôs recurso da decisão do Employment Tribunal.

33.      O Employment Appeal Tribunal concedeu provimento ao recurso do demandante em 25 de Julho de 2003.

3.      Questões prejudiciais no processo C‑257/04

34.      Em ambos os processos nacionais, os demandantes interpuseram recurso da decisão do Employment Appeal Tribunal para a Court of Appeal. Este órgão jurisdicional decidiu proceder a um reenvio prejudicial, face à divergência de opiniões entre o Employment Appeal Tribunal inglês e o Inner House of the Court Session escocês e ao facto de o processo Robinson‑Steele estar pendente no Tribunal de Justiça.

35.      Consequentemente, a Court of Appeal, por despacho de 25 de Junho de 2004, submeteu ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1.      Um acordo contratual entre um empregador e um trabalhador que prevê que uma parte específica da retribuição que lhe é paga corresponde à «retribuição de férias» do trabalhador (um acordo designado por pagamento por conta das férias incluído na retribuição) constitui uma violação do direito do trabalhador a férias anuais remuneradas previsto no artigo 7.° da Directiva 93/104/CE relativa ao tempo de trabalho?

2.      A resposta à primeira questão será diferente se o trabalhador foi pago pelo mesmo montante antes e depois da entrada em vigor do acordo contratual em causa, de modo que o efeito deste acordo não foi estabelecer um pagamento adicional mas, em vez disso, consignar parte das retribuições pagas ao trabalhador ao pagamento das férias?

3.      Se a resposta à primeira questão for afirmativa, constitui violação do direito do trabalhador a férias anuais remuneradas, previsto no artigo 7.°, considerar válido o pagamento efectuado, de modo a que compense o benefício concedido nos termos da directiva?

4.      Para cumprir a obrigação, prevista no artigo 7.° da Directiva 93/104/CE, de garantir que um trabalhador tenha direito a férias anuais remuneradas de, pelo menos, quatro semanas é necessário que a correspondente retribuição seja paga ao trabalhador no período em que este goza as suas férias anuais ou, para cumprir o artigo 7.°, basta que seja paga durante todo o ano em prestações?»

IV – Quanto às questões prejudiciais

A –    Observações preliminares

36.      Antes de mais, refira‑se que, segundo jurisprudência assente, compete ao órgão jurisdicional de reenvio decidir da pertinência das questões prejudiciais (6). O Tribunal de Justiça pode eventualmente reformulá‑las, em caso de dúvida quanto à adequação da respectiva formulação no que respeita à apreciação do litígio à luz do direito comunitário (7).

37.      No âmbito do processo de reenvio nos termos do artigo 234.° CE cabe ao Tribunal de Justiça interpretar o direito comunitário. No que respeita à primeira questão há que notar, antes de mais, que, neste contexto, o problema que a mesma coloca não é a compatibilidade de uma disposição de direito derivado com disposições do direito interno, mas, ao invés, o de saber se a disposição de direito derivado em causa se opõe a determinadas disposições de direito interno.

38.      Da comparação com a primeira questão prejudicial no processo C‑257/04 e respectivos esclarecimentos apresentados pelo órgão jurisdicional que as submeteu, resulta claro que, nesse processo – e portanto também no processo C‑131/04 – o que está em causa não é tanto saber se o direito comunitário se opõe a determinadas disposições de direito interno, mas antes saber se uma interpretação destas disposições conforme ao direito comunitário, efectuada à luz do conteúdo normativo do artigo 7.° da directiva, permite concluir pela invalidade de determinadas cláusulas de contratos de trabalho ou de convenções colectivas, segundo as quais a retribuição de férias é incluída na retribuição normal do trabalhador («rolled up holiday pay»).

39.      Por conseguinte, há que reformular a primeira questão prejudicial no processo C‑131/04 à luz das primeira, segunda e quarta questões prejudiciais no processo C‑257/04, devendo entender‑se que o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se o direito do trabalhador a férias anuais remuneradas eventualmente decorrente do artigo 7.° da directiva obsta a que, por acordo entre particulares ou convenção colectiva, se estabeleça o pagamento da retribuição do período de férias juntamente com o da retribuição‑base.

40.      Porém, o órgão jurisdicional de reenvio no processo C‑257/04 sublinha, porventura com razão, que nem a directiva nem as disposições de direito nacional contêm uma norma expressa quanto a tal cláusula. Neste contexto, importa recordar o dever, que recai sobre os juízes nacionais, de dar às normas legais nacionais, especialmente às que são aprovadas para transposição de directivas, uma interpretação conforme com o direito comunitário e portanto com as directivas.

41.      Partindo da premissa subjacente a ambos os pedidos de decisão prejudicial, de que, no entender dos juízes nacionais, as disposições nacionais são susceptíveis de interpretação (8), em última análise o Tribunal de Justiça não tem de se pronunciar sobre a transposição da Directiva 93/104 no Reino Unido, mas proporcionar aos órgãos jurisdicionais de reenvio uma interpretação das disposições de direito comunitário em causa que lhes permita proceder a uma interpretação tão conforme com a directiva quanto possível das disposições de direito nacional ao apreciar os acordos controvertidos de inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias.

42.      O Tribunal de Justiça refere, em jurisprudência assente, que «ao aplicar o direito interno, nomeadamente as disposições de um instrumento legislativo especificamente aprovado para dar cumprimento às exigências de uma directiva, o órgão jurisdicional nacional é obrigado a interpretar o direito nacional, na medida do possível, à luz do texto e da finalidade da directiva em causa, para atingir o resultado por ela prosseguido e cumprir assim o artigo 249.°, terceiro parágrafo, CE» (9).

43.      Assume especial relevo o facto de este princípio da interpretação do direito nacional conforme ao direito comunitário ter sido reafirmado pelo acórdão Pfeiffer e o., já referido, conjugado com o regime da duração máxima do trabalho previsto na directiva. O Tribunal de Justiça afirmou, nomeadamente, que «compete [...] ao órgão jurisdicional de reenvio, ao qual são submetidos litígios que, como os que estão em causa nos processos principais, estão compreendidos no âmbito de aplicação da Directiva 93/104 e têm a sua origem em factos posteriores ao termo do prazo de transposição desta última, quando aplica as disposições do direito nacional especialmente destinadas a transpor essa directiva, interpretá‑las de modo que possam ter uma aplicação em conformidade com os objectivos da directiva» (10).

44.      É precisamente nos litígios entre particulares, como os do caso vertente, que o princípio da interpretação do direito nacional conforme com o direito comunitário constitui uma garantia indispensável da plena eficácia do direito comunitário (11).

45.      Em suma, há que concluir, pois, que, com a primeira questão submetida, respectivamente, por cada um dos órgãos jurisdicionais de reenvio (12), estes pretendem saber, no essencial, se o direito a férias anuais remuneradas previsto no artigo 7.° da directiva obsta a acordos de inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias.

Para poder responder a esta questão, antes de mais há que analisar o conteúdo e alcance do direito a férias anuais remuneradas previsto no artigo 7.° da directiva. Numa fase ulterior há que verificar se e em que medida uma convenção celebrada no âmbito da autonomia privada pode afastar essa disposição.

B –    Quanto às férias anuais remuneradas previstas no artigo 7.° da Directiva 93/104

1.      Objecto do direito a férias anuais remuneradas

a)      Teor e sistemática do artigo 7.° da directiva

46.      O artigo 7.°, n.° 1, da directiva garante o direito incondicional a quatro semanas de férias anuais remuneradas. O Tribunal já o reconhecera no seu acórdão de 26 de Junho de 2001, BECTU (13), em que afirmou, por um lado, que «o artigo 7.°, n.° 1, da Directiva 93/104 impõe aos Estados‑Membros uma obrigação de resultado clara e precisa» (14), e, por outro, que se trata de um «direito individual» (15) dos trabalhadores (16).

47.      Para além do reconhecimento básico deste direito, o artigo 7.°, n.° 1, da directiva contém poucas indicações quanto à forma como o empregador deve cumprir os respectivos deveres. Relativamente às «condições de obtenção e de concessão» do direito, a directiva simplesmente remete para as «legislações e/ou práticas nacionais».

48.      Na verdade, do texto do artigo 7.°, n.° 1, da Directiva resulta que o trabalhador tem direito a um período de «descanso efectivo» (17), durante o qual a sua retribuição se mantém (18). Porém, ficam em aberto os princípios pelos quais se rege o pagamento da retribuição do correspondente período de férias. Igualmente em aberto fica a questão de saber se a retribuição de férias deve ser paga durante as férias ou se pode também ser paga anterior ou posteriormente a estas. A remissão para as legislações e/ou práticas nacionais pode, pois, ser entendida no sentido de dar aos Estados‑Membros a mais ampla discricionariedade para colmatar as lacunas da regulamentação comunitária.

49.      No plano sistemático há que notar ainda que a directiva não contém nenhuma outra disposição que respeite às questões em apreciação. Em particular, o artigo 15.° da directiva permite aos Estados‑Membros aplicarem ou instituírem normas internas mais favoráveis à protecção da segurança e da saúde dos trabalhadores. Todavia, o artigo 17.° dispõe que os Estados‑Membros ou parceiros sociais só podem estabelecer derrogações a determinadas disposições da directiva, enumeradas taxativamente, sob determinadas condições. Porém, o artigo 7.° da Directiva 93/104 não figura expressamente entre as disposições da directiva que podem ser objecto de derrogação, como o Tribunal declarou já no acórdão BECTU (19).

b)      Sentido e finalidade do período mínimo de férias remuneradas

50.      No acórdão BECTU (20), o Tribunal teve igualmente oportunidade de se debruçar sobre a ratio legis do artigo 7.°, n.° 1, da directiva.

51.      O objectivo da directiva é estabelecer prescrições mínimas destinadas a promover a melhoria das condições de vida e de trabalho dos trabalhadores através de uma aproximação das disposições nacionais relativas, nomeadamente, à duração do tempo de trabalho (21). O Tribunal deduziu este objectivo, por um lado, da base jurídica da directiva – nomeadamente, do artigo 138.° CE (ex‑artigo 118.°‑A do Tratado CE), que visa uma protecção reforçada da saúde e da segurança dos trabalhadores – e, por outro, do teor do primeiro, quarto, sétimo e oitavo considerandos da directiva, bem como do teor do seu artigo 1.°, n.° 1.

52.      Destas regras resulta que a harmonização, a nível comunitário, da organização do tempo de trabalho deve garantir uma protecção melhorada da segurança e da saúde dos trabalhadores através da concessão de períodos mínimos de descanso e de períodos de pausa adequados (22).

53.      No entanto, para que seja realmente alcançado um melhor nível de protecção da segurança e da saúde dos trabalhadores, é necessário que estes efectivamente beneficiem dos períodos de descanso previstos e, portanto, também das férias anuais (23). Por este motivo, o artigo 7.°, n.° 2 da directiva proíbe a substituição do período mínimo de férias anuais por uma retribuição financeira, excepto no caso da cessação da relação de trabalho.

54.      Por conseguinte, a efectiva garantia das férias anuais implica que sejam proporcionadas ao trabalhador condições para gozar efectivamente as férias a que tem direito, sem que porventura disso seja desencorajado por imperativos de ordem prática. Este objectivo é alcançado através da manutenção da retribuição durante o período de férias, isto é, pela garantia de um período mínimo de férias remuneradas.

55.      Deve entender‑se, pois, que subjacente ao direito a um período mínimo de férias remuneradas previsto no artigo 7.° da directiva está, em primeira linha, não tanto o pagamento da retribuição durante o período de gozo de férias, mas sim a efectiva possibilidade de gozo de férias. Relativamente aos processos principais – e às diferentes situações de facto que lhes subjazem – importa, por isso, verificar em que medida o método controvertido de pagamento da retribuição de férias respeita esta efectiva possibilidade de gozo das férias.

2.      Em que medida pode o direito a férias remuneradas previsto no artigo 7.° da directiva obstar a um «rolled up holiday pay»?

a)      Alegações principais das partes

i)      Posição dos demandantes nos processos principais

56.      No processo C‑131/04, C. D. Robinson‑Steele não tomou posição perante o Tribunal.

57.      No processo C‑257/04, os demandantes no processo principal sustentam que o artigo 7.° da directiva exige que o pagamento das férias seja efectuado no período durante o qual o trabalhador auferiria a sua retribuição se tivesse continuado a trabalhar. Se o pagamento não for efectuado durante este período, está‑se perante a retribuição financeira a que se refere o artigo 7.°, n.° 2 da directiva ou perante um mecanismo que implica restrições ou levanta obstáculos ao gozo das férias e por isso mesmo é proibido. Em particular, o sistema do «rolled up holiday pay» desencoraja o trabalhador de gozar as suas férias anuais. O facto de o trabalhador ganhar mais se trabalhar todas as semanas constitui, para os trabalhadores que auferem retribuições baixas, um estímulo considerável para não gozarem férias.

58.      De mais a mais, a necessidade de «economizar» a retribuição de férias impede o gozo das férias durante a primeira parte do ano.

59.      Acresce que é pouco provável, sobretudo entre os trabalhadores que auferem retribuições baixas, que as quantias pagas semanalmente a título de retribuição de férias sejam poupadas e não gastas. Daí resulta a impossibilidade financeira de gozar férias, sobretudo quando, no ano em questão, o trabalho ainda não foi prestado durante um período suficientemente longo.

ii)    Posição dos demandados nos processos principais

60.      Os demandados nos processos principais, respectivamente R. D. Detail Services (processo C‑131/04) e Marshalls Clay Products e Frank Staddon (processo C‑257/04) sustentam que o pagamento da retribuição de férias em prestações juntamente com a retribuição‑base não é contrário à directiva, desde que este pagamento integrado tenha sido acordado contratualmente. Referem que o artigo 7.° da directiva apenas confere o direito absoluto e incondicional a um período mínimo de quatro semanas de férias remuneradas. Porém, nem a letra nem o espírito do artigo 7.° exigem o pagamento da retribuição de férias de uma determinada forma ou num determinado momento. O artigo 7.°, n.° 1, da directiva defere as «condições de obtenção e de concessão» para o direito nacional. Desde que não impeça o exercício efectivo dos direitos, o direito nacional está em consonância com os requisitos do direito comunitário.

61.      Acresce que a protecção garantida pela directiva deve levar em conta a necessidade de evitar obstáculos de ordem legislativa, financeira ou administrativa injustificados e de proporcionar flexibilidade. No que respeita à distinção entre o direito propriamente dito e as condições para o seu exercício, reflectida no equilíbrio, procurado pela directiva, entre a protecção da segurança e da saúde do trabalhador e a necessidade de flexibilidade na aplicação, ambas as demandadas aludem ao acórdão do Tribunal no processo C‑173/99 e às conclusões do advogado‑geral A. Tizzano.

62.      Ainda segundo os demandados nos processos principais, o trabalhador não pode ser obrigado a gozar férias. Da mesma forma, o trabalhador pode decidir sempre o que faz durante as férias a quem tem direito. Por isso, é livre de trabalhar para outro empregador durante as suas férias. Isto não pode, só por si, ser entendido como um desvio à norma do artigo 7.° da directiva. De resto, os trabalhadores estão em condições de administrar os seus recursos financeiros de modo a poderem adaptar‑se ao sistema de pagamentos integrados.

iii) Posição do Governo do Reino Unido

63.      O Governo do Reino Unido também sustenta que é admissível um sistema de inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias. Em particular, nem a letra nem o espírito do artigo 7.° exigem o pagamento da retribuição de férias num determinado momento. Pelo contrário, a letra do artigo 7.° da directiva – tal como os seus considerandos – demonstra, com a sua remissão para o direito e práticas nacionais, que pode ser necessário um certo grau de flexibilidade na sua transposição. Acresce que aqui surge novamente o princípio da subsidiariedade. O Governo do Reino Unido também alude, quanto a este aspecto, às conclusões e ao acórdão no processo C‑173/99.

64.      Segundo o Governo do Reino Unido, a Regulation 16 transpõe adequadamente o artigo 7.° da directiva, na medida em que garante ao trabalhador o direito a férias anuais reclamado e uma retribuição relativa a este período. Os requisitos do artigo 7.° são cumpridos, desde que as leis e práticas nacionais não tornem ilusório o direito a férias remuneradas.

65.      A interpretação proposta não leva a que o trabalhador seja desencorajado de gozar as suas férias anuais. Uma vez que o empregador não pode fixar unilateralmente o «rolled up payment», sendo antes necessário um acordo entre empregador e trabalhador, semelhante acordo só é relevante se o trabalhador for pago efectivamente e este pagamento for calculado correctamente.

66.      Acresce que um acordo de «rolled up payment» leva a que a retribuição de férias seja paga antecipadamente ao trabalhador, se as férias forem gozadas num momento posterior da relação de trabalho. Da mesma forma, é exigível ao trabalhador que diligencie no sentido de o pagamento da retribuição de férias em prestações não o levar a abster‑se de gozar as suas férias. Além disso, os pagamentos por conta das férias incluídos na retribuição constituem o mecanismo mais simples e justo para os trabalhadores vinculados por contrato de curta duração, os quais provavelmente cessam antes de poderem gozar quaisquer férias ou terem direito à retribuição destas. Não há, pois, qualquer motivo para se entender que o artigo 7.° exige que a retribuição de férias seja paga num determinado momento.

67.      Acresce ainda que efectuar o pagamento durante o período de gozo de férias implicaria, em contradição com os considerandos da directiva, consideráveis dificuldades administrativas para o empregador, especialmente no caso de trabalhadores ocasionais ou temporários. O pagamento em prestações poupa o cálculo da retribuição de férias devida em cada caso individual em que são gozadas férias. Devido à natureza do trabalho, levantam‑se frequentemente dificuldades quando o trabalhador insiste em gozar férias durante um período de trabalho.

iv)    Posição da Irlanda

68.      No articulado apresentado no processo C‑257/04, o Chief State Solicitor da Irlanda defende a tese de que da expressão «férias remuneradas» constante do artigo 7.°, n.° 1, da directiva resulta que o trabalhador deve ser pago durante ou imediatamente antes desse período. Ora sucede precisamente que, no sistema de pagamentos por conta das férias incluídos na retribuição, aquele não recebe qualquer quantia durante as suas férias.

69.      Face ainda ao objectivo da directiva de proteger a segurança e a saúde dos trabalhadores, importa assegurar que os trabalhadores não só têm direito a férias, mas também que lhes seja possível exercer efectivamente esse direito. Ao invés, a inclusão de pagamentos por conta das férias na retribuição leva a que não sejam gozadas férias, pois é exigido aos trabalhadores que gozem férias sem receber qualquer retribuição durante as mesmas, ao passo que, quando trabalham, auferem regularmente uma retribuição todas as semanas ou todos os meses. Isto contraria os objectivos da directiva, que visa precisamente impedir que o trabalhador receba dinheiro a troco das suas férias anuais.

v)      Posição da Comissão

70.      Partindo do princípio de que a manutenção da retribuição durante as férias anuais não é um objectivo em si mesma, mas sim um meio de assegurar que o período mínimo de férias pode ser efectivamente gozado, sem qualquer restrição de ordem financeira, um acordo relativo ao pagamento das férias é compatível com a directiva se assegurar que o trabalhador goza efectivamente um período mínimo de férias anuais de quatro semanas e que, relativamente a esse período, aufira uma retribuição com se estivesse a trabalhar.

71.      Uma vez que a directiva não prescreve a forma de alcançar este objectivo, cabe aos Estados‑Membros estabelecer o regime do pagamento da retribuição de férias. Porém, tal não deve levar a que o próprio direito fundamental a férias anuais seja prejudicado.

72.      Uma vez que a inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias implica que os mesmos sejam efectuados sem ter em conta se as correspondentes férias são ou não gozadas pelo trabalhador e não existe qualquer medida que assegure que o trabalhador goza efectivamente as suas quatro semanas de férias, conclui‑se que há um desvio ao requisito fundamental de garantia de quatro semanas de férias anuais, contrário à letra e aos objectivos da directiva.

73.      A inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias pode desencorajar o trabalhador de gozar as suas férias. Acresce que semelhante sistema pode levar a abusos por parte de empregadores que não desejam que os seus trabalhadores efectivamente gozem férias.

74.      A Comissão considera, portanto, o sistema do «rolled up holiday pay» incompatível com a directiva, na medida em que não garante o gozo efectivo do período mínimo de férias de quatro semanas.

b)      Apreciação jurídica

75.      Face ao conteúdo normativo do artigo 7.° da directiva, exposto resumidamente supra (24), os pagamentos por conta das férias incluídos na retribuição só parecem de todo compatíveis com os objectivos da directiva se o acordo contratual que lhes está subjacente assegurar que o trabalhador pode efectivamente gozar as férias a que tem direito. Em última análise, só o juiz nacional pode decidir definitivamente, face a todos os elementos do caso concreto – especialmente a todos os documentos relativos ao contrato – se um determinado acordo, tal como os acordos de «rolled up holiday pay» controvertidos, obsta ao efectivo gozo de férias anuais remuneradas.

76.      Consequentemente, a nossa análise só pode versar sobre a questão geral de saber se e em que medida os regimes controvertidos se podem revelar problemáticos face ao direito garantido pelo artigo 7.° da directiva ou se se pode justificar, por motivos de flexibilidade, um entorse genérico ao direito previsto no artigo 7.°

i)      O «rolled up holiday pay» constitui um impedimento ao gozo efectivo de férias anuais remuneradas?

77.      Mesmo num sistema de inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias, os trabalhadores são, em princípio, livres de gozar férias. É duvidoso, todavia, que o pagamento da retribuição de férias ao longo do período em que se desenrola a relação de trabalho não constitua um obstáculo prático que leve o trabalhador a não aproveitar as férias a que tem direito. A ser assim, não é cumprido o objectivo da directiva de protecção efectiva da segurança e da saúde do trabalhador. Como o Tribunal já afirmou, a propósito dos períodos de descanso, os períodos de pausa garantidos pela directiva devem prevenir, tanto quanto possível, a degradação da segurança e da saúde do trabalhador, que pode ocorrer no caso da acumulação de períodos de trabalho sem as necessárias interrupções (25).

78.      O Governo do Reino Unido parte primeiramente – porventura com razão – da ideia de que, em princípio, o trabalhador está em condições de administrar as suas finanças de modo a ter à sua disposição, no momento em que goza férias, a parte da sua retribuição que corresponde à retribuição de férias. Porém, esta hipótese assenta em premissas que se afiguram, no mínimo, discutíveis. Por um lado, há que notar que a margem de manobra de trabalhadores que auferem retribuições baixas, entre os quais se encontram, em regra, os trabalhadores ocasionais e os trabalhadores temporários, não é equivalente à dos outros trabalhadores: os trabalhadores que auferem retribuições baixas vêem‑se obrigados a gastar a maior parte, senão a totalidade, da retribuição para se sustentarem, pelo que parece inevitável o perigo de desvio em relação ao objectivo da retribuição das férias. Além disso, a possibilidade de ganharem mais por trabalharem adicionalmente proporciona precisamente aos trabalhadores que auferem retribuições baixas um estímulo significativo para não gozarem férias. Com efeito, se continuarem a trabalhar em vez de gozarem férias, recebem não só a retribuição do período de férias, mas também a retribuição habitual, pelo período em que trabalham adicionalmente, não obstante o período de férias (quatro semanas por ano) ter sido já remunerado através do pagamento integrado da retribuição de férias. Independentemente desta situação, há que ponderar também que a possibilidade de um «dever de diligência pessoal quanto às férias», avançada pelo Reino Unido, pressupõe sempre que seja dada a conhecer ao trabalhador qual a parte da sua retribuição que se destina a financiar as suas férias. Por outras palavras, semelhante dever de diligência financeira quanto às férias pressupõe a transparência do acordo de «rolled up holiday pay» (26).

79.      Outros argumentos sugerem, porém, que os acordos não estão isentos de problemas face aos objectivos do artigo 7.°, n.° 1, da directiva. Que não se pode imputar somente à esfera de responsabilidade do trabalhador o reconhecimento e a devida utilização da retribuição que lhe é paga relativamente ao período de férias, ainda que porventura não identificada como tal, resulta desde logo da consideração de que a protecção da saúde e da segurança dos trabalhadores não é um interesse individual do trabalhador, mas um interesse geral. Na verdade, o trabalhador não é obrigado a gozar as suas férias ou a utilizá‑las para descansar. No entanto, no interesse de uma interpretação orientada no sentido dos objectivos da directiva, só dificilmente deve ser possível autorizar acordos susceptíveis de encorajar o trabalho contínuo, com renúncia ao período mínimo de férias (27). Este efeito prejudicial à directiva dos acordos de «rolled up holiday pay» controvertidos é reconhecido também pelo Governo do Reino Unido, quando alega que se levantam dificuldades práticas quando um trabalhador temporário insiste em gozar as férias a que tem direito durante um período de trabalho e não no fim do seu contrato.

80.      Do exposto se conclui que, face à finalidade do direito a um período mínimo de férias remuneradas, da interpretação conforme com o direito comunitário de normas jurídicas nacionais destinadas a transpor a directiva deve resultar que acordos celebrados no âmbito da autonomia privada sobre «rolled up holiday pay» só são válidos se de algum modo assegurarem simultaneamente a efectiva possibilidade de o trabalhador gozar um período mínimo de férias anuais.

ii)    Análise da «necessidade de flexibilidade»

81.      Apesar de tudo, a própria directiva prevê, no seu décimo sétimo considerando, que «em face das questões susceptíveis de serem originadas pela organização do tempo de trabalho, se afigura oportuno prever uma certa flexibilidade na aplicação de determinadas disposições da presente directiva, assegurando ao mesmo tempo a observância dos princípios da protecção da segurança e da saúde dos trabalhadores».

82.      Importa recordar aqui novamente o significado do direito a férias remuneradas, tal como está consagrado nos pontos 8 e 19 da Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais dos Trabalhadores. Segundo a jurisprudência do Tribunal, este direito constitui um princípio do direito social comunitário que se reveste de especial importância (28). Uma vez que, em consonância com esta concepção, a directiva não estabelece nenhuma excepção ao mesmo direito (29), a simples ofensa deste direito deve, portanto, assentar em motivos ponderosos.

83.      Por conseguinte, a simples redução de encargos administrativos não constitui de modo nenhum um motivo satisfatório, visto que equivale a uma justificação com base em motivos económicos. Porém, logo do quinto considerando da directiva resulta que a melhoria da segurança e da saúde dos trabalhadores no trabalho não se pode subordinar a considerações de ordem puramente económica (30). A Directiva 93/104 teve também de levar em conta as implicações que a organização do tempo de trabalho nela estabelecida pode ter nas pequenas e médias empresas, na medida em que sujeita as medidas que têm por base jurídica o artigo 118.°‑A do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 138.° CE) à condição de não contrariarem a criação e o desenvolvimento de tais empresas (31).

84.      Pode‑se duvidar, no entanto, que os acordos controvertidos sejam admissíveis, em determinadas condições, por motivos ponderosos de ordem prática. Todavia, para apreciar estes motivos é necessário distinguir entre as duas formas de organização do tempo de trabalho subjacentes a ambos os processos principais, nomeadamente, entre trabalho por turnos e trabalho temporário.

–       Trabalho por turnos prestado por trabalhadores vinculados por contrato de duração indeterminada

85.      Este tipo de trabalho por turnos baseia‑se em relações de trabalho duradouras (32). Consequentemente, aqui pode‑se ainda abstrair da duração do período de férias a que o trabalhador tem direito. Antes de mais, face a esta regularidade – quatro dias de trabalho, quatro dias de descanso – não é possível discernir se e em que medida é necessária uma excepção ao princípio da manutenção da retribuição durante o período de férias.

86.      Porém, relativamente ao processo Caulfield e o./Marshalls Clay importa ponderar ainda que o acordo de inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias está ligado a um regime de férias, também controvertido, segundo o qual os períodos de férias só podem ser obtidos mediante a junção de períodos de descanso. Na verdade, embora quer os períodos de descanso quer os períodos de férias cumpram os objectivos, prosseguidos pela directiva, de protecção da segurança e da saúde dos trabalhadores, distinguem‑se entre si na medida em que os períodos de descanso são concedidos de acordo com um regime específico de horário de trabalho e, consequentemente, não afectam o direito a um período mínimo de férias anuais remuneradas previsto no artigo 7.°, n.° 1, da directiva.

87.      Se, porém o empregador puder demonstrar que os períodos de descanso (contratualmente) previstos estão calculados de modo a incluir também períodos de férias proporcionais, sendo possível gozar um período de férias mais longo, eventualmente através da permuta de turnos, então o acordo (separado) de inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias não parece lesivo, na medida em que – sem prejuízo da apreciação, pelo juiz nacional, de outras circunstâncias do caso concreto – não prejudica a efectiva possibilidade de gozo do período mínimo de férias anuais.

–       Trabalho temporário

88.      Em contrapartida, no caso do trabalho temporário, frequentemente não é previsível a duração do período durante o qual o trabalhador trabalha para o empregador em causa. Por isso, a passagem de um período de actividade para um período de inactividade assemelha‑se à cessação da relação laboral. Ora o artigo 7.°, n.° 2, da directiva permite justamente a compensação das férias mediante uma prestação pecuniária no caso da cessação da relação de trabalho. No entanto, parece de facto mais prático, em vez de calcular o período de férias correspondente a cada período de actividade, prever um pagamento em prestações contínuo, mediante o qual o empregador oferece ao trabalhador uma compensação pelos dias de férias remuneradas que este obteve ao longo do ano (33). Porém, não se pode ignorar o facto de os trabalhadores temporários terem um estatuto comparativamente muito menos seguro no mercado de trabalho. O afastamento do princípio da proibição da compensação financeira das férias constante do artigo 7.°, n.° 2, da directiva significa um enfraquecimento adicional da sua posição, o que, à falta providências no sentido de o compensar, só dificilmente pode estar em consonância com a directiva.

89.      Por conseguinte, propõe‑se que se responda à primeira questão prejudicial no processo C‑131/04 e à primeira e à quarta questões prejudiciais no processo C‑257/04 que compete ao juiz nacional, ao apreciar acordos particulares ou convenções colectivas sobre a inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias, determinar em que medida os trabalhadores têm efectivamente a possibilidade de gozar o período mínimo de férias a que têm direito. Em regra, essa possibilidade está excluída quando o acordo se limita a prever o pagamento da retribuição do período mínimo de férias juntamente com a retribuição‑base, sem regular o próprio gozo das férias, ainda que este seja objecto de outro acordo.

C –    Quanto à segunda e terceira questões no processo C‑257/04 e à segunda questão no processo C‑131/04

90.      Caso um acordo de «rolled up holiday pay» seja em princípio admissível, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, com a sua segunda questão no processo C‑257/04, se o acordo é, ainda assim, contrário ao artigo 7.° da Directiva, se o trabalhador tiver recebido o mesmo montante antes e depois da entrada em vigor do acordo contratual em causa, de modo que o efeito deste acordo não foi estabelecer um pagamento adicional mas, em vez disso, consignar parte das retribuições pagas ao trabalhador ao pagamento das férias.

91.      Caso os acordos controvertidos de inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias sejam inadmissíveis, então os órgãos jurisdicionais de reenvio, com a segunda questão no processo C‑131/04 e a terceira questão no processo C‑257/04, pretendem saber, no essencial, se os pagamentos já efectuados nos termos dos referidos acordos podem ser descontados na retribuição das férias anuais em causa, a que os trabalhadores continuam a ter direito por força do artigo 7.° da directiva.

1.      Quanto à necessidade do pagamento da retribuição de férias em acréscimo à retribuição do trabalho

a)      Alegações principais das partes

92.      M. J. Clarke, demandante num dos processos principais subjacentes ao processo C‑257/04, é de opinião que o regime em vigor antes de Agosto de 2001 era incompatível com a directiva, porquanto não era possível determinar a retribuição de férias, isto é, a parte da retribuição do trabalho que correspondia àquela. Uma vez que a Frank Staddon, demandada no processo em causa, só depois da celebração do acordo de inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias é que começou a mencionar especificamente, nos recibos de retribuição, a proporção da retribuição de férias, sem que isso se traduzisse num aumento da retribuição global, essa menção específica equivale a uma redução da retribuição horária.

93.      A demandante Frank Staddon, que é a única das demandantes neste processo principal a quem esta questão interessa directamente, não tomou posição sobre a mesma.

94.      O Governo do Reino Unido sustenta que cabe aos tribunais nacionais determinar se o facto de o montante da retribuição paga ao trabalhador permanecer o mesmo antes e depois da menção específica à retribuição de férias constitui um indício de que, na realidade, o trabalhador não recebe qualquer retribuição de férias.

95.      No entender da Comissão, o pagamento da retribuição das férias anuais no âmbito do sistema de inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias deve ser efectivamente concretizado mediante o acréscimo de uma percentagem ou de uma quantia determinada à retribuição horária normal (isto é, anterior ao acordo).

96.      A Irlanda não considera necessário debruçar‑se sobre estas questões, porquanto entende que o sistema de inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias é, sem mais, incompatível com o direito comunitário.

b)      Apreciação jurídica

97.      Antes de mais, note‑se que o órgão jurisdicional de reenvio, na sua questão prejudicial, não refere expressamente a data da menção específica à retribuição de férias, mas sim a entrada em vigor do próprio acordo sobre a inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias.

98.      Para satisfazer o objectivo de dar ao trabalhador a possibilidade e de o incentivar a gozar as suas férias, a aplicação do artigo 7.° deve efectivamente levar a que a retribuição de férias seja paga em acréscimo à retribuição paga pelo tempo de trabalho prestado. Em princípio, este acréscimo pode ser pago de uma só vez, constituindo uma compensação única por todo o período de férias, ou então sob a forma de prestações proporcionais à retribuição horária, diária ou semanal, adicionadas a esta. Esta última hipótese leva a que, a partir da entrada em vigor do acordo sobre «rolled up holiday pay» – pressupondo que este acordo é essencialmente compatível com a directiva – seja paga uma retribuição mais elevada.

99.      Por conseguinte, se o montante da retribuição do trabalhador permanecer o mesmo antes e depois da entrada em vigor do acordo contratual, a única alteração resultante deste acordo consiste na consignação de uma parte da retribuição ao pagamento das férias. Por isso, é manifesto que, após a entrada em vigor do acordo, o empregador só na aparência satisfez o direito a férias remuneradas. Com isso, o objectivo da fixação da garantia de um período mínimo de férias remuneradas ficaria esvaziado. Assim, o trabalhador não disporia de uma retribuição do seu período de férias que lhe permitisse efectivamente gozá‑las como tempo livre.

100. No processo Clarke/Staddon, subjacente ao processo C‑257/04, foi todavia acordado logo no contrato de trabalho que a retribuição incluía o pagamento das férias. A proporção exacta foi fixada mais tarde, por meio de um acordo ulterior. Contudo, neste contexto, o perigo de satisfação fictícia da garantia supramencionada de modo algum se reveste das mesmas proporções, visto que desde o primeiro acordo que a quantia controvertida está incluída na retribuição, embora só tenha sido objecto de especificação no segundo acordo.

101. Neste caso, todavia, o problema que se levanta é de transparência. Se o trabalhador não puder destrinçar entre a parte da sua retribuição que lhe servirá para o seu sustento e a parte que deve servir para concretizar o gozo das suas férias, ser‑lhe‑á difícil – sobretudo se se tratar de um trabalhador com baixos rendimentos – poupar efectivamente esta última quantia para as suas férias. Consequentemente, neste caso a falta de transparência contribui para desencorajar o trabalhador de gozar as suas férias. O mesmo vale, por maioria de razão, se, como se deduz também do processo Caulfield e o./Marshalls Clay, igualmente subjacente ao processo C‑257/04, o cálculo do suplemento devido por horas extraordinárias tiver por base o montante da retribuição acrescido da quantia correspondente às férias. Por isso, para o trabalhador esta retribuição configura‑se inteiramente como retribuição do trabalho prestado e não (também) como retribuição das férias.

102. É manifesto que esta transparência – assim como o dever de informação que lhe está associado (34) – também não existe se não resultar do contrato de trabalho que a retribuição de férias está incluída na retribuição paga ao trabalhador. Então a situação que se configura para o trabalhador é a de apenas ter direito a férias não remuneradas.

2.      Quanto à questão do desconto das quantias já pagas na retribuição de férias

a)      Alegações principais das partes

103. Os demandantes nos processos principais subjacentes ao processo C‑257/04 consideram que há violação do direito a férias remuneradas previsto no artigo 7.° da directiva se, por força de um acordo de «rolled up holiday pay», as quantias já pagas forem descontadas na retribuição das férias anuais a que têm direito.

104. Ao invés, os demandados nos processos principais sustentam que, mesmo que um acordo de inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias seja contrário ao artigo 7.° da directiva, as quantias já pagas podem ser descontadas na retribuição das férias anuais. Caso contrário, o empregador acaba por ter de pagar a retribuição de férias em duplicado.

105. O Governo do Reino Unido entende que não há motivo para que a proporção das retribuições pagas que corresponde às férias não seja tomada em consideração, desde que essa proporção tenha efectivamente sido paga em acréscimo à retribuição do trabalho prestado. No fim de contas, o trabalhador só tinha direito a essa quantia a título de direito a férias, tendo as partes no acordo pretendido regular assim o pagamento da retribuição de férias.

106. A Comissão entende igualmente que nem a letra nem o espírito do artigo 7.°, n.° 2, da directiva obstam a semelhante desconto das quantias já pagas, desde que o montante já liquidado e incluído na retribuição, tenha efectivamente sido pago em acréscimo à retribuição‑base. O artigo 7.°, n.° 2, apenas salienta que se pressupõe o efectivo gozo do período mínimo de férias anuais garantido.

107. A Irlanda considera, ao invés, que o desconto das quantias já pagas viola o direito a férias anuais remuneradas previsto no artigo 7.°

b)      Apreciação jurídica

108. O objectivo prosseguido pelo artigo 7.° da directiva tem um peso decisivo também na resposta a esta questão. Já não é possível alcançar a posteriori, isto é, à data da acção para pagamento da retribuição de férias proposta pelos trabalhadores, o objectivo da efectiva possibilidade de gozo de um período mínimo de férias anuais (35), visto que o ano em questão entretanto se escoou quase totalmente. Consequentemente, a condenação a posteriori do empregador no pagamento (de novo) da retribuição de férias, sem desconto das quantias já pagas, teria uma finalidade puramente punitiva.

109. No entanto, poderia ser do interesse de uma protecção jurídica efectiva não reconhecer aos pagamentos em prestações já efectuados o carácter de retribuição de férias exigida pelo artigo 7.° da directiva, se o empregador tiver optado por um modelo que não satisfaça o princípio da transparência (36) no que respeita à garantia do período mínimo de férias anuais. Então o risco de ter de pagar duas vezes poderia levar os empregadores a abster‑se de celebrar acordos ilegais. Porém, contra esta hipótese está o facto de, desta forma, se oferecer ao trabalhador mais um estímulo de ordem financeira para não gozar o período mínimo de férias anuais que lhe é devido.

110. No pressuposto de que é respeitada a exigência de transparência, não se vê em que medida o artigo 7.° da directiva possa obstar ao desconto das quantias já pagas em execução de um acordo sobre a inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias.

V –    Conclusão

111. Pelo exposto, propõe‑se ao Tribunal de Justiça que responda às questões prejudiciais da seguinte forma:

1)         Compete ao juiz nacional, ao apreciar, à luz das disposições de transposição do artigo 7.° da Directiva 93/104/CE do Conselho, de 23 de Novembro de 1993, relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho, acordos particulares ou convenções colectivas sobre a inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias, determinar em que medida os trabalhadores têm efectivamente a possibilidade de gozar o período mínimo de férias a que têm direito por força do referido artigo 7.° Em regra, essa possibilidade está excluída quando o acordo se limita a prever o pagamento da retribuição do período mínimo de férias juntamente com a retribuição‑base, sem regular o próprio gozo das férias, ainda que este seja objecto de outro acordo.

Em todo o caso, um acordo deste tipo não cumpre os requisitos do artigo 7.° da Directiva 93/104/CE, se a proporção exacta da retribuição de férias não for mencionada de forma transparente ou se tal menção só for feita posteriormente, sem que haja lugar a aumento do montante total da retribuição.

2)         Mesmo que um acordo de inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias não garanta, contrariando o disposto no artigo 7.° da Directiva 93/104/CE, a efectiva possibilidade de gozo, pelo trabalhador, das férias a que tem direito, o artigo 7.° da Directiva não exclui que as quantias que tenham sido comprovadamente pagas ao trabalhador como retribuição de férias, e que este possa claramente discernir como tais, possam ser descontadas na retribuição da totalidade das férias a que este tem direito.


1 – Língua original: alemão.


2 – Directiva 93/104/CE do Conselho, de 23 de Novembro de 1993, relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho (JO L 307, p. 18, a seguir «directiva»).


3 – Employment Appeal Tribunal, processo Marshalls Clay Products/Caulfield (2003) IRLR 552.


4 – Inner House of the Court of Session, processo MPS Structure Ltd/Munro (2003) IRLR 350.


5 – A importância que funciona como retribuição paga durante o período de férias será a seguir referida como «retribuição de férias», sem pretender sugerir que as férias foram compensadas mediante uma prestação financeira.


6 – Acórdãos de 6 de Dezembro de 2001, Clean Car Autoservice (C‑472/99, Colect., p. I‑9687, n.° 13) e de 7 de Janeiro de 2003, Banque internationale pour l'Afrique occidentale [BIAO] (C‑306/99, Colect., p. I‑1, n.° 88).


7 – Segundo jurisprudência assente, o Tribunal de Justiça tem procurado sempre fornecer ao órgão jurisdicional de reenvio esclarecimentos destinados a guiá‑lo na apreciação do litígio que é chamado a resolver. V., neste sentido, por exemplo, os acórdãos de 4 de Julho de 2000, Haim (C‑424/97, Colect., p. I‑5123, n.° 58) e de 12 de Setembro de 2000, Geffroy e Casino France (C‑366/98, Colect., p. I‑6579, n.° 20).


8 – Das explicações dadas por ambos os órgãos jurisdicionais de reenvio depreende‑se, designadamente, que os tribunais de Inglaterra, por um lado, e os da Escócia, por outro, interpretaram de forma diferente as disposições de transposição da directiva no que respeita aos supramencionados acordos.


9 – Acórdão de 5 de Outubro de 2004 nos processos C‑397/01 a C‑403/01 (Pfeiffer e o., ainda não publicado na Colectânea, n.° 113). V. ainda, entre outros, acórdãos de 10 de Abril de 1984, Von Colson e Kamann (14/83, Recueil, p. 1891, n.° 26), de 13 de Novembro de 1990, Marleasing (C‑106/89, Colect., p. I‑4135, n.° 8) e de 14 de Julho de 1994, Faccini Dori (C‑91/92, Colect., p. I‑3325, n.° 26). V. também acórdãos de 23 de Fevereiro de 1999, BMW (C‑63/97, Colect., p. I‑905, n.° 22), de 27 de Junho de 2000, Océano Grupo Editorial e Salvat Editores (C‑240/98 a C‑244/98, Colect., p. I‑4941, n.° 30) e de 23 de Outubro de 2003, Adidas‑Salomon e Adidas Benelux (C‑408/01, Colect., p. I‑12537, n.° 21).


10 – Acórdão Pfeiffer e o., já referido, n.° 117.


11 – V. também acórdão Pfeiffer e o., já referido, n.° 114: «A exigência de uma interpretação conforme do direito nacional é inerente ao sistema do Tratado, na medida em que permite ao órgão jurisdicional nacional assegurar, no âmbito das suas competências, a plena eficácia do direito comunitário quando decide do litígio que lhe é apresentado.»


12 – A estas questões acresce a quarta questão no processo C‑257/04, a qual será apreciada juntamente com as mesmas.


13 – Processo C‑173/99 (Colect., p. I‑4881).


14 – Loc.cit., n.° 34.


15 – Loc. cit., n.° 35.


16 – V. também n.° 43: «Resulta de quanto precede que o direito a férias anuais remuneradas de cada trabalhador deve ser considerado um princípio do direito social comunitário que reveste especial importância [...]». V. ainda o acórdão de 18 de Março de 2004, Merino Gómez (C‑342/01, Colect., p. I‑2605, n.° 31): «O artigo 7.°, n.° 1, da Directiva 93/104 [...] deve ser entendido no sentido de que significa que as modalidades de aplicação nacionais devem, de qualquer forma, respeitar o direito a férias anuais remuneradas de pelo menos quatro semanas.»


17 – V. acórdão Merino Gómez, já referido, n.° 30.


18 – Além disso, o artigo 7.°, n.° 2, da Directiva 93/104 esclarece que não se pode compensar o período mínimo de férias remuneradas com uma prestação pecuniária.


19 – Já referido, n.° 41.


20 – Já referido na nota 13.


21 – Acórdão BECTU (já referido na nota 13), n.° 37.


22 – O oitavo considerando, que se reveste de particular interesse, diz resumidamente o seguinte: «[...] [P]ara que sejam garantidas a segurança e a saúde dos trabalhadores da Comunidade, estes devem beneficiar de períodos mínimos de descanso – diários, semanais e anuais – e de períodos de pausa adequados; [...]».


23 – Acórdão de 9 de Setembro de 2003, Jaeger (C‑151/02, Colect., p. I‑8389, n.° 70).


24 – V. n.os 46 e segs., supra.


25 – Acórdão Jaeger (já referido na nota 23), n.° 92.


26 – Quanto a esta exigência de transparência, ver também as considerações expendidas quanto à segunda questão prejudicial no processo C‑257/04, n.os 101 e segs.


27 – Contrariamente ao sustentado pelas demandantes nos processos principais e, na audiência, pelo Governo neerlandês, que porém tinha presente um outro processo pendente (C‑124/05, Federatie Nederlandse Vakbeweging), nos casos em apreço o que está em causa é tão‑só a interpretação conforme com a directiva de disposições nacionais e não a questão de saber se a correcta transposição da Directiva 93/104 implicará a imposição ao trabalhador de um dever de gozar férias, eventualmente para efeitos de descanso. Na esfera do direito comunitário, o problema suscitado pela inclusão na retribuição de pagamentos por conta das férias, acordada contratualmente, não é o de o trabalhador não ser obrigado a gozar férias, mas sim o de receber um estímulo de ordem financeira para não invocar um «direito ao descanso» com base no artigo 7.°, n.° 1, da directiva.


28 – Acórdão BECTU (já referido na nota 13), n.° 43, bem como o acórdão Merino Gomez (C‑342/01, já referido na nota 16, n.° 29).


29 – V., a esse propósito, os artigos 17.° e 18.° da directiva.


30 – V., a este propósito, os acórdãos BECTU (já referido na nota 13), n.° 59, e Jaeger (já referido na nota 23), n.° 67.


31 – Acórdão BECTU (já referido na nota 13), n.° 60, com remissão para o acórdão de 12 de Novembro de 1996, Reino Unido/Conselho (C‑84/94, Colect., p. I‑5755, n.° 44).


32 – As considerações expendidas nos n.os 85 a 87 não dizem respeito, por isso, ao trabalho por turnos prestado por um trabalhador temporário, como sucede no processo C‑131/04.


33 – A dificuldade referida supra é resolvida, em diversos Estados‑Membros, através da criação de caixas de compensação da retribuição ou das férias. No sistema francês e belga das Caisses de congés payés, os empregadores pagam contribuições à caixa competente, que por sua vez procede ao pagamento da retribuição das férias anuais, de modo que o empregador apenas paga a proporção correspondente às férias anuais que o trabalhador obteve, ao passo que este recebe a sua retribuição durante o período em que goza férias. Parece análoga a Urlaubs‑ und Lohnausgleichskasse der Bauwirtschaft (caixa de compensação da retribuição ou das férias para o sector da construção civil) da Alemanha, onde o pedido da retribuição de férias é dirigido primariamente ao empregador.


34 – V. n.° 78 supra.


35 – V. n.° 55 supra.


36 – V. n.os 101 e segs. supra.