Language of document : ECLI:EU:T:2012:626

DESPACHO DO TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

27 de novembro de 2012 (*)

«Recurso de anulação — Decisões dirigidas a um Estado‑Membro a fim de corrigir uma situação de défice excessivo — Falta de afetação direta — Inadmissibilidade»

No processo T‑541/10,

Anotati Dioikisi Enoseon Dimosion Ypallilon (ADEDY), com sede em Atenas (Grécia),

Spyridon Papaspyros, residente em Atenas,

Ilias Iliopoulos, residente em Atenas,

representados por M.‑M. Tsipra, advogado,

recorrentes,

contra

Conselho da União Europeia, representado por T. Middleton, A. De Gregorio Merino e E. Chatziioakeimidou, na qualidade de agentes,

recorrido,

apoiado por:

Comissão Europeia, representada por B. Smulders, J.‑P. Keppenne e M. Konstantinidis, na qualidade de agentes,

interveniente,

que tem por objeto um pedido de anulação, por um lado, da Decisão 2010/320/EU do Conselho, de 10 de maio de 2010, dirigida à Grécia com o objetivo de reforçar e aprofundar a supervisão orçamental e que notifica a Grécia no sentido de tomar medidas para a redução do défice considerada necessária a fim de corrigir a situação de défice excessivo (JO L 145, p. 6; retificação no JO 1911, L 209, p. 63), e, por outro, da Decisão 2010/486/UE do Conselho, de 7 de setembro de 2010, que altera a Decisão 2010/320 (JO L 241, p. 12),

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção),

composto por: J. Azizi (relator), presidente, S. Frimodt Nielsen e M. Kancheva, juízes,

secretário: E. Coulon,

profere o presente

Despacho

 Quadro jurídico 

 Tratado UE

1        Nos termos do artigo 3.°, n.° 4, TUE:

«A União estabelece uma união económica e monetária cuja moeda é o euro.»

 Tratado FUE

2        Nos termos do artigo 119.° TFUE:

«1.      Para alcançar os fins enunciados no artigo 3.° do Tratado da União Europeia, a ação dos Estados‑Membros e da União implica, nos termos do disposto nos Tratados, a adoção de uma política económica baseada na estreita coordenação das políticas económicas dos Estados‑Membros, no mercado interno e na definição de objetivos comuns, e conduzida de acordo com o princípio de uma economia de mercado aberto e de livre concorrência.

2.      Paralelamente, nos termos e segundo os procedimentos previstos nos Tratados, essa ação implica uma moeda única, o euro, e a definição e condução de uma política monetária e de uma política cambial únicas, cujo objetivo primordial é a manutenção da estabilidade dos preços e, sem prejuízo desse objetivo, o apoio às políticas económicas gerais na União, de acordo com o princípio de uma economia de mercado aberto e de livre concorrência.

3.      Essa ação dos Estados‑Membros e da União implica a observância dos seguintes princípios orientadores: preços estáveis, finanças públicas e condições monetárias sólidas e balança de pagamentos sustentável.»

3        O artigo 126.° TFUE estabelece o procedimento de défice excessivo cujo objetivo é incitar e, se necessário, obrigar o Estado‑Membro em causa a reduzir o défice público eventualmente apurado. As partes pertinentes desse artigo estão redigidas como se segue:

«1.      Os Estados‑Membros devem evitar défices orçamentais excessivos.

2.      A Comissão acompanhará a evolução da situação orçamental e do montante da dívida pública nos Estados‑Membros, a fim de identificar desvios importantes. Examinará, em especial, o cumprimento da disciplina orçamental com base nos dois critérios seguintes:

a)      Se a relação entre o défice orçamental programado ou verificado e o produto interno bruto excede um valor de referência, exceto:

¾        se essa relação tiver baixado de forma substancial e contínua e tiver atingido um nível que se aproxime do valor de referência,

¾        ou, em alternativa, se o excesso em relação ao valor de referência for meramente excecional e temporário e se aquela relação continuar perto do valor de referência;

b)      Se a relação entre a dívida pública e o produto interno bruto excede um valor de referência, exceto se essa relação se encontrar em diminuição significativa e se estiver a aproximar, de forma satisfatória, do valor de referência.

Os valores de referência encontram‑se especificados no Protocolo relativo ao procedimento aplicável em caso de défice excessivo, anexo aos Tratados.

[…]

6.      O Conselho, sob proposta da Comissão, e tendo considerado todas as observações que o Estado‑Membro interessado pretenda fazer, decidirá, depois de ter avaliado globalmente a situação, se existe ou não um défice excessivo.

7.      Sempre que, nos termos do n.° 6, o Conselho decida que existe um défice excessivo, adota sem demora injustificada, sob recomendação da Comissão, recomendações que dirige ao Estado‑Membro em causa, para que este ponha termo a essa situação num dado prazo. Sem prejuízo do disposto no n.° 8, essas recomendações não serão tornadas públicas.

8.      Sempre que verificar que, na sequência das suas recomendações, não foram tomadas medidas eficazes no prazo estabelecido, o Conselho pode tornar públicas as suas recomendações.

9.      Se um Estado‑Membro persistir em não pôr em prática as recomendações do Conselho, este pode decidir notificar esse Estado‑Membro para, num dado prazo, tomar medidas destinadas a reduzir o défice para um nível que o Conselho considerar necessário para obviar à situação.

Nesse caso, o Conselho pode pedir ao Estado‑Membro em causa que lhe apresente relatórios de acordo com um calendário específico, a fim de analisar os esforços de ajustamento desse Estado‑Membro.

[…]

11.      Se um Estado‑Membro não cumprir uma decisão tomada nos termos do n.° 9, o Conselho pode decidir aplicar, ou eventualmente reforçar, uma ou mais das seguintes medidas:

¾        exigir que o Estado‑Membro em causa divulgue informações complementares, a determinar pelo Conselho, antes de emitir obrigações e títulos;

¾        convidar o Banco Europeu de Investimento a reconsiderar a sua política de empréstimos em relação ao Estado‑Membro em causa;

¾        exigir do Estado‑Membro em causa a constituição, junto da União, de um depósito não remunerado de montante apropriado, até que, na opinião do Conselho, o défice excessivo tenha sido corrigido;

¾        impor multas de importância apropriada.

O Presidente do Conselho informará o Parlamento Europeu das decisões tomadas.

12.      O Conselho revogará parte ou a totalidade das decisões ou recomendações a que se referem os n.os 6 a 9 e 11 na medida em que considere que o défice excessivo no Estado‑Membro em causa foi corrigido. Se o Conselho tiver previamente tornado públicas as suas recomendações, deve, logo que a decisão tomada ao abrigo do n.° 8 tiver sido revogada, fazer uma declaração pública de que deixou de existir um défice excessivo no Estado‑Membro em causa.

13.      Ao adotar as suas decisões ou recomendações a que se referem os n.os 8, 9, 11 e 12, o Conselho delibera por recomendação da Comissão.

[…]»

4        O artigo 136.°, n.° 1, TFUE dispõe:

«1.      A fim de contribuir para o bom funcionamento da união económica e monetária e de acordo com as disposições pertinentes dos Tratados, o Conselho […] adota medidas específicas para os Estados‑Membros cuja moeda seja o euro, com o objetivo de:

a)      Reforçar a coordenação e a supervisão da respetiva disciplina orçamental;

b)      Elaborar, no que lhes diz respeito, as orientações de política económica, procurando assegurar a compatibilidade dessas orientações com as adotadas para toda a União, e garantir a sua supervisão.»

5        Nos termos do artigo 1.° do Protocolo n.° 12 sobre o procedimento relativo aos défices excessivos, anexado aos Tratados:

«Os valores de referência a que se refere o n.° 2 do artigo 126.° do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia são:

¾        3% para a relação entre o défice orçamental programado ou verificado e o produto interno bruto a preços de mercado;

¾        60% para a relação entre a dívida pública e o produto interno bruto a preços de mercado.»

 Pacto de Estabilidade e Crescimento

6        Na sua reunião em Amesterdão (Países Baixos) em 17 de junho de 1997, o Conselho Europeu definiu um quadro regulamentar para a coordenação das políticas orçamentais nacionais dos Estados‑Membros que participam na União Económica e Monetária. Esse quadro tomou a forma de um pacto de estabilidade e crescimento baseado no objetivo de manter a estabilidade das finanças públicas para reforçar as condições propícias à estabilidade dos preços e a um forte crescimento sustentável que conduza à criação de emprego [v. Resolução do Conselho Europeu sobre o Pacto de Estabilidade e Crescimento (JO C 236, p. 1)].

7        O Pacto de Estabilidade e Crescimento é constituído pelos três seguintes textos: em primeiro lugar, a resolução acima citada no n.° 6, em segundo lugar, o Regulamento (CE) n.° 1466/97 do Conselho, de 7 de julho de 1997, relativo ao reforço da supervisão das situações orçamentais e à supervisão e coordenação das políticas económicas (JO L 209, p. 1), e, em terceiro lugar, o Regulamento (CE) n.° 1467/97 do Conselho, de 7 de julho de 1997, relativo à aceleração e clarificação da aplicação do procedimento relativo aos défices excessivos (JO L 209, p. 6).

8        O artigo 3.° do Regulamento n.° 1466/97, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.° 1055/2005 do Conselho, de 27 de junho de 2005 (JO L 174, p. 1), estabelece a obrigação de os Estados‑Membros que adotaram a moeda única apresentarem periodicamente ao Conselho da União Europeia e à Comissão das Comunidades Europeias um programa de estabilidade e crescimento contendo informações sobre as suas políticas económicas.

9        O artigo 3.°, n.° 2, alínea c), do Regulamento n.° 1466/97, conforme alterado pelo Regulamento n.° 1055/2005, especifica que o programa de estabilidade proporciona:

«Uma avaliação quantitativa pormenorizada das medidas orçamentais e de outras medidas de política económica aplicadas e/ou propostas para a realização dos objetivos do programa, incluindo uma análise custo‑benefício pormenorizada das reformas estruturais importantes aplicadas que induzam economias diretas a longo prazo, inclusive através do reforço do crescimento potencial[.]»

10      O artigo 3.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1467/97, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.° 1056/2005 do Conselho, de 27 de junho de 2005 (JO L 174, p. 5), está redigido da seguinte forma:

«A recomendação do Conselho, formulada nos termos do artigo [126.°], n.° 7, [TFUE], estabelecerá um prazo máximo de seis meses para o Estado‑Membro em causa tomar medidas eficazes. A recomendação do Conselho estabelecerá igualmente um prazo para a correção da situação de défice excessivo, que deverá ser realizada no ano seguinte à sua identificação, salvo se se verificarem circunstâncias especiais. Na recomendação, o Conselho requererá que o Estado‑Membro realize uma melhoria anual mínima de 0,5% do PIB, como valor de referência, do seu saldo corrigido de variações cíclicas, líquido de medidas pontuais ou temporárias, a fim de assegurar a correção da situação de défice excessivo no prazo fixado na recomendação.»

11      O artigo 5.° do Regulamento n.° 1467/97, conforme alterado pelo Regulamento n.° 1056/2005, dispõe:

«1.      Todas as decisões do Conselho de notificar os Estados‑Membros participantes em causa para que estes tomem medidas destinadas a reduzir o défice, nos termos do n.° 9 do artigo [126.° TFUE], serão adotadas no prazo de dois meses a contar da data da decisão do Conselho que tiver estabelecido que não foram tomadas medidas eficazes nos termos do n.° 8 do artigo [126.° TFUE]. Na notificação, o Conselho requererá que o Estado‑Membro realize uma melhoria anual mínima de 0,5% do PIB, como valor de referência, do seu saldo corrigido de variações cíclicas, líquido de medidas pontuais ou temporárias, a fim de assegurar a correção da situação de défice excessivo no prazo fixado na notificação.

2.      Caso tenham sido tomadas medidas eficazes, em resposta a uma notificação dirigida nos termos do n.° 9 do artigo [126.° TFUE] e, após a adoção dessa notificação, ocorram acontecimentos económicos adversos e imprevistos com um impacto desfavorável significativo nas finanças públicas, o Conselho pode decidir, com base numa recomendação da Comissão, adotar uma notificação revista, ao abrigo do n.° 9 do artigo [126.° TFUE]. A notificação revista, tendo em conta os fatores pertinentes mencionados no n.° 3 do artigo 2.° do presente regulamento, pode designadamente prorrogar por um ano o prazo para a correção da situação de défice excessivo. O Conselho apreciará a eventual ocorrência de acontecimentos económicos adversos e imprevistos com um impacto desfavorável significativo nas finanças públicas, face às previsões económicas contidas na sua notificação.»

 Antecedentes do litígio

 Crise da dívida grega e mecanismo intergovernamental de assistência financeira à República Helénica

12      Em 21 de outubro de 2009, a República Helénica notificou ao Eurostat (Serviço de Estatística da União Europeia) dados estatísticos que reviam o seu défice público para 2008, passando de 5,0% do produto interno bruto (PIB) (valor notificado pela República Helénica em abril de 2009) para 7,7% do PIB. Ao mesmo tempo, as autoridades gregas reviram o rácio do défice do país previsto para 2009, fazendo‑o passar de 3,7% do PIB (valor notificado na primavera de 2009) para 12,5% do PIB.

13      Essa revisão dos dados económicos suscitou dúvidas nos mercados quanto à solvabilidade do país, precipitando a crise da sua dívida pública. Durante os primeiros meses do ano de 2010, o comportamento dos investidores no mercado deu lugar à subida das taxas de juro das obrigações gregas. No fim de abril de 2010, uma agência de notação de crédito baixou a notação das obrigações gregas de BBB‑ para a de BB+, categoria considerada pelos mercados como dívida de alto risco.

14      Atendendo ao facto de a crise da dívida grega ameaçar ter efeitos em outros Estados‑Membros da zona euro e pôr em perigo a estabilidade da zona euro no seu conjunto, na cimeira do Conselho Europeu de 25 de março de 2010, os chefes de Estado ou de Governo da zona euro acordaram em instituir um mecanismo intergovernamental de assistência à República Helénica consistente em empréstimos bilaterais coordenados a taxas de juro não concessionadas, isto é, sem qualquer elemento de subvenção. O desembolso dos empréstimos estaria sujeito a fortes condições e a sua ativação deveria ter lugar na sequência de um pedido da República Helénica. O mecanismo de assistência compreendia também uma participação substancial do Fundo Monetário Internacional (FMI).

15      O mecanismo intergovernamental supramencionado baseia‑se em dois instrumentos: por um lado, num «intercreditor agreement» (convenção entre credores) na qual os Estados que fornecem o auxílio são partes contratantes e que contém regras essenciais de coordenação entre os mutuantes para a concessão de empréstimos e, por outro, um «loan facility agreement» (convenção de empréstimo) entre os Estados‑Membros da zona euro que fornecem auxílio (bem como uma entidade financeira pública alemã, agindo sob as instruções e a garantia da República Federal da Alemanha) e a República Helénica e o Banco Central Grego.

16      Em 23 de abril de 2010, a República Helénica pediu a ativação do mecanismo intergovernamental de assistência supramencionado.

17      Em 2 de maio de 2010, em aplicação do mecanismo de assistência supramencionado, os Estados‑Membros da zona euro deram o seu acordo em fornecer à República Helénica 80 mil milhões de euros no quadro de um pacote financeiro de 110 mil milhões de euros atribuído em comum com o FMI.

18      Em 3 de maio de 2010, os representantes da República Helénica e da Comissão — esta agindo por conta dos Estados‑Membros da zona euro — assinaram um documento intitulado «Memorandum of Understanding», que descreve um programa com duração de três anos elaborado pelo Ministério das Finanças grego em colaboração com a Comissão, o Banco Central Europeu e o FMI, que tem por objetivo a melhoria das finanças públicas gregas e o restabelecimento da confiança dos mercados em relação à situação das finanças públicas e da economia grega em geral. O «Memorandum of Understanding» é constituído por três memorandos específicos: um «Memorandum of Economic and Financial Policies», um «Memorandum of Understanding on Specific Economic Policy Conditionality» e um «Technical Memorandum of Understanding».

19      Em 8 maio de 2010, foram assinadas a convenção entre credores e a convenção de empréstimos supramencionadas (v. n.° 15, supra).

 Procedimento de défice excessivo em relação à República Helénica

 Procedimento que antecede a adoção dos atos impugnados

20      Em 27 de abril de 2009, o Conselho decidiu, em conformidade com o disposto no artigo 104.°, n.° 6, CE (atual artigo 126.°, n.° 6, TFUE), que existia um défice excessivo na Grécia, e dirigiu à República Helénica recomendações convidando‑a a corrigir o referido défice até ao ano de 2010, o mais tardar, em conformidade com o disposto no artigo 104.°, n.° 7, CE (atual artigo 126.°, n.° 7, TFUE) e com o artigo 3.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1467/97. O Conselho, além disso, fixou a data‑limite de 27 de outubro de 2009 para que fossem adotadas ações eficazes pela República Helénica.

21      Em 30 de novembro de 2009, o Conselho apurou, de harmonia com o disposto no artigo 126.°, n.° 8, TFUE, que a República Helénica não tinha desenvolvido nenhuma ação eficaz em resposta às recomendações de 27 de abril de 2009.

22      Em 16 de fevereiro de 2010, o Conselho, com base no artigo 126.°, n.° 9, TFUE e no artigo 136.° TFUE, adotou a Decisão 2010/182/EU, que notifica a Grécia no sentido de tomar medidas para a redução do défice considerada necessária a fim de corrigir a situação de défice excessivo (JO L 83, p. 13).

23      O artigo 1.°, n.° 1, da Decisão 2010/182 dispõe que a República Helénica deve pôr fim à atual situação de défice excessivo tão rapidamente quanto possível e, o mais tardar, até 2012.

24      O artigo 2.° da Decisão 2010/182 prevê um certo número de medidas de consolidação orçamental que a Republica Helénica devia adotar para pôr fim à situação de défice excessivo, nomeadamente as definidas no programa de estabilidade apresentado por esse Estado (v. n.os 8 e 9, supra).

25      O artigo 5.° da Decisão 2010/182 fixa 15 de maio de 2010 como data‑limite para que fossem adotadas medidas eficazes pela República Helénica.

 Atos impugnados

—       Decisão 2010/320/UE

26      Em 10 de maio de 2010, o Conselho adotou a Decisão 2010/320/UE, dirigida à Grécia com o objetivo de reforçar e aprofundar a supervisão orçamental e que notifica a Grécia no sentido de tomar medidas para a redução do défice considerada necessária a fim de corrigir a situação de défice excessivo (JO L 145, p. 6; retificação no JO 2011, L 209, p. 63; a seguir «ato de base»).

27      O ato de base tem por bases jurídicas o artigo 126.°, n.° 9, TFUE e o artigo 136.° TFUE.

28      Nos considerandos 4 e 5 do ato de base, explica‑se, em substância, que ocorreram acontecimentos económicos adversos e imprevistos com um impacto desfavorável significativo nas finanças públicas gregas, de forma que se justificava alterar o conteúdo da notificação inicial efetuada em 16 de fevereiro de 2010 pela Decisão 2010/182, e adotar uma notificação revista de harmonia com o disposto no artigo 126.°, n.° 9, TFUE e do artigo 136.° TFUE.

29      O considerado 8 do ato de base faz referência ao mecanismo intergovernamental de assistência financeira concedida à República Helénica, nos seguintes termos:

«A deterioração muito severa da situação financeira do governo grego conduziu os Estados‑Membros da área do euro a decidirem intervir para apoiar a estabilidade na Grécia, tendo em vista a salvaguarda da estabilidade financeira em toda a área do euro, em conjunção com uma assistência multilateral prestada pelo Fundo Monetário Internacional. O apoio fornecido pelos Estados‑Membros da área do euro assumirá a forma de um conjunto de empréstimos bilaterais coordenado pela Comissão. Os [mutuantes] decidiram subordinar o seu apoio ao respeito pela Grécia da presente decisão. Nomeadamente, a Grécia deverá pôr em prática as medidas especificadas na presente decisão, em conformidade com o calendário nela fixado.»

30      O artigo 1.° do ato de base reporta o termo do prazo para a correção do défice excessivo da Grécia para 2014 (em vez de 2012, tal como tinha sido fixado na Decisão 2010/182).

31      O artigo 2.° do ato de base prevê a adoção pela República Helénica, em conformidade com o calendário indicado nesse artigo, de um certo número de medidas de consolidação orçamental, com vista a reduzir drasticamente a despesa pública e a aumentar a receita fiscal do Estado, medidas com vista ao reforço da supervisão e da disciplina orçamentais e medidas de natureza estrutural com o objetivo, nomeadamente, de melhorar a competitividade da economia grega em geral.

32      As medidas contidas no artigo 2.° do ato de base dizem respeito a uma pluralidade de domínios, a saber, a política fiscal, o sistema de reformas e pensões, a organização da administração pública e do sistema bancário.

33      O artigo 4.°, n.° 1, do ato de base prevê a obrigação de a República Helénica apresentar ao Conselho e à Comissão um relatório trimestral do qual constem as medidas adotadas para dar cumprimento ao ato de base.

34      Segundo o artigo 4.°, n.° 2, alíneas a) e b), do ato de base, no relatório supramencionado, devem constar informações detalhadas sobre, por um lado, as medidas concretas aplicadas à data do relatório pela República Helénica para dar cumprimento ao ato de base, incluindo o seu impacto orçamental quantificado e, por outro, as medidas concretas que a República Helénica prevê aplicar após a data do relatório para dar cumprimento ao ato de base, bem como o respetivo calendário de execução e uma estimativa do seu impacto orçamental.

35      Segundo o artigo 4.°, n.° 3, do ato de base, a Comissão e o Conselho analisam os relatórios supramencionados a fim de avaliar o cumprimento por parte da República Helénica do ato de base. No quadro destas avaliações, a Comissão pode indicar as medidas necessárias para respeitar a trajetória de ajustamento estabelecida na presente decisão para a correção do défice excessivo.

36      O artigo 5.° do ato de base prevê que este produz efeitos na data da sua notificação.

37      Nos termos do artigo 6.° do ato de base, a República Helénica é a destinatária desse ato.

—       Decisão 2010/486/UE

38      Em 7 de setembro de 2010, o Conselho adotou a Decisão 2010/486/EU, que altera o ato de base (JO L 241, p. 12) (a seguir, tomados conjuntamente, «atos impugnados»). A Decisão 2010/486 tem igualmente por bases jurídicas o artigo 126.°, n.° 9, TFUE e o artigo 136.° TFUE e é dirigida à República Helénica.

39      Resulta dos considerandos 5 a 8 da Decisão 2010/486 que, após a adoção do ato de base, certas previsões económicas na base das quais esse ato tinha sido adotado, tiveram de ser revistas. Afigurou‑se, por isso, adequado, rever o ato de base em vários aspetos, mantendo, porém, inalterado o prazo para a correção do défice excessivo fixado no ato de base.

40      A Decisão 2010/486 revoga certas medidas previstas no ato de base, adita outras e altera, especifica ou recompõe o texto de certas medidas que nele são previstas.

41      De harmonia com o disposto no seu artigo 2.°, a Decisão 2010/486 produz efeitos a partir do dia da sua notificação.

 Tramitação do processo e pedidos das partes

42      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 22 de novembro de 2010, os recorrentes, Anotati Dioikisi Enoseon Dimosion Ypallilon (ADEDY), Spyridon Papaspyros e Ilias Iliopoulos, interpuseram o presente recurso.

43      Por ato separado, apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 3 de março de 2011, o Conselho suscitou uma questão prévia de inadmissibilidade de harmonia com o disposto no artigo 114.° do Regulamento de Processo do Tribunal Geral.

44      Por ato apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 7 de março de 2011, a Comissão pediu para intervir no presente processo em apoio das conclusões do Conselho. Esse pedido foi acolhido pelo despacho do presidente da Primeira Secção do Tribunal Geral de 27 de junho de 2011.

45      Em 29 de abril de 2011, os recorrentes apresentaram na Secretaria do Tribunal Geral observações sobre a questão prévia de inadmissibilidade suscitada pelo Conselho.

46      Em 8 de setembro de 2011, a Comissão apresentou na Secretaria do Tribunal Geral um articulado de intervenção.

47      Em 27 de outubro de 2011, os recorrentes apresentaram na Secretaria do Tribunal Geral observações sobre o articulado de intervenção da Comissão.

48      Na sua petição, os recorrentes concluem pedindo que o Tribunal se digne:

¾        declarar o presente recurso admissível e fundado;

¾        anular os atos impugnados;

¾        condenar o Conselho nas despesas.

49      O Conselho conclui pedindo que o Tribunal se digne:

¾        declarar o recurso manifestamente inadmissível no que diz respeito aos atos impugnados;

¾        a título subsidiário, declarar o recurso manifestamente inadmissível no que diz respeito ao ato de base;

¾        condenar as recorrentes nas despesas.

50      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne declarar o recurso manifestamente inadmissível.

51      Nas suas observações sobre a questão prévia de inadmissibilidade, os recorrentes concluem que o Tribunal Geral se digne rejeitar a questão prévia de inadmissibilidade suscitada pelo Conselho e condená‑lo nas despesas.

 Questão de direito

52      Nos termos do artigo 114.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, se uma das partes o pedir, o Tribunal Geral pode pronunciar‑se sobre a inadmissibilidade antes de conhecer do mérito da causa. Em conformidade com o n.° 3 do mesmo artigo, salvo decisão em contrário do Tribunal Geral, a tramitação ulterior do processo no que respeita ao pedido é oral.

53      No caso em apreço, o Tribunal Geral julga‑se suficientemente esclarecido pelo exame dos autos para se pronunciar sobre o pedido apresentado pelo Conselho sem dar início à fase oral do processo.

54      Resulta dos autos que o primeiro dos recorrentes, a ADEDY, constitui uma confederação sindical grega que inclui como membros as federações das uniões de trabalhadores empregados no setor público, pelas pessoas coletivas de direito público e pelas coletividades territoriais, que estão ligados a essas entidades por relações de trabalho de direito público e de direito privado. Segundo os recorrentes, a ADEDY inclui em suma como membros todos os funcionários e os empregados das pessoas coletivas de direito público e representa os seus interesses.

55      Os segundo e terceiro recorrentes são funcionários e, respetivamente, presidente e secretário‑geral da ADEDY. Interpõem o presente recurso a título pessoal e por conta da ADEDY.

56      No seu recurso, os recorrentes criticam os atos impugnados por conterem um certo número de disposições que afetam os interesses financeiros e as condições de trabalho dos funcionários gregos.

57      O Conselho, apoiado pela Comissão, alega que o recurso é inadmissível. Sustenta, a título principal, que o recurso é inadmissível por ilegitimidade dos recorrentes na aceção do artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE e limita a sua argumentação à questão da afetação individual dos recorrentes pelos atos impugnados, enquanto que a Comissão examina igualmente a admissibilidade do recurso pela ótica da condição da afetação direta. A título subsidiário, o Conselho, apoiado pela Comissão sustenta que o recurso é inadmissível no que diz respeito ao ato de base em razão do facto de ter sido interposto extemporaneamente.

58      Os recorrentes afirmam que os atos impugnados lhes dizem direta e individualmente respeito. Contestam, além disso, a tese defendida pelo Conselho e pela Comissão a título subsidiário relativa à inadmissibilidade do recurso no que diz respeito ao ato de base em razão da sua interposição extemporânea. Por fim, sustentam que, na hipótese de o seu recurso ser declarado inadmissível, serão privados do direito a uma tutela jurisdicional efetiva.

59      Deve, examinar‑se, em primeiro lugar, a admissibilidade do recurso no que diz respeito aos atos impugnados, à luz da legitimidade dos recorrentes.

 Quanto à legitimidade dos recorrentes

60      Segundo o artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE, «[q]ualquer pessoa singular ou coletiva pode interpor […] recursos contra os atos de que seja destinatária ou que lhe digam direta e individualmente respeito, bem como contra os atos regulamentares que lhe digam diretamente respeito e não necessitem de medidas de execução».

61      Essa disposição limita os recursos de anulação interpostos por uma pessoa singular ou coletiva a três categorias de atos, a saber, em primeiro lugar, os atos de que ela seja destinatária, em segundo lugar, os atos que lhe digam direta e individualmente respeito e, em terceiro lugar, os atos regulamentares que lhe digam diretamente respeito e não necessitem de medidas de execução.

62      No caso em apreço, é claro que os recorrentes não são os destinatários dos atos impugnados, mas afirmam que esses atos lhes dizem direta e individualmente respeito.

63      Tendo em conta as circunstâncias do caso, deve, em primeiro lugar, apreciar‑se o critério da afetação direta dos recorrentes que é comum à segunda e à terceira categorias de atos apresentados no n.° 61, supra.

64      Em conformidade com jurisprudência assente baseada no artigo 230.°, quarto parágrafo, CE, a condição de a decisão objeto de recurso dizer diretamente respeito a uma pessoa singular ou coletiva requer, em princípio, dois critérios cumulativos, a saber, que a medida contestada, em primeiro lugar, produza efeitos diretos na situação jurídica do particular e, em segundo lugar, não deixe nenhum poder de apreciação aos seus destinatários, que estão encarregados da sua implementação, tendo esta caráter puramente automático e decorrendo unicamente da regulamentação da União Europeia, sem aplicação de normas intermédias (acórdãos do Tribunal de Justiça de 22 de março de 2007, Regione Siciliana/Comissão, C‑15/06 P, Colet., p. I‑2591, n.° 31; de 10 de setembro de 2009, Comissão/Ente per le Ville Vesuviane e Ente per le Ville Vesuviane/Comissão, C‑445/07 P e C‑455/07 P, Colet., p. I‑7993, n.° 45; e despacho do Tribunal de Justiça de 15 de setembro de 2009, Município de Gondomar/Comissão, C‑501/08 P, não publicado na Coletânea, n.° 25).

65      Na medida em que, no que diz respeito ao exame do presente recurso, a condição de afetação direta consagrada pelo artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE não foi alterada, deve reconhecer‑se que essa jurisprudência se aplica igualmente no caso em apreço.

66      No caso, deve salientar‑se que, nas suas conclusões, os recorrentes pedem a anulação integral dos atos impugnados. Identificam, todavia, na petição um certo número de disposições que dizem respeito à situação jurídica dos funcionários e que lhes causa prejuízo, a saber, em primeiro lugar, à ADEDY enquanto organização sindical que representa o conjunto dos funcionários e, em seguida, aos próprios S. Papaspyros e I. Iliopoulos enquanto funcionários.

67      Assim, na petição, os recorrentes especificam que o prejuízo sofrido consiste, por um lado, na redução dos subsídios de Páscoa, de férias e de Natal que está prevista no artigo 2.°, n.° 1, alínea f), do ato de base e, por outro, no aumento da idade de reforma e na redução das pensões que devem ser pagas aos funcionários atualmente em funções resultante da transformação do sistema de pensões que está prevista no artigo 2.°, n.° 2, alínea b), do ato de base. Os recorrentes mencionam igualmente como prejuízo sofrido a degradação do funcionamento dos serviços públicos resultante da restrição à substituição dos funcionários que se reformam a qual está prevista no artigo 2.°, n.° 2, alínea a), do ato de base, conforme alterado pela Decisão 2010/486.

68      Deve, por isso, examinar‑se, antes de mais, a afetação direta dos recorrentes pelas três disposições supramencionadas, claramente identificadas, que lhes causarão prejuízo e, em seguida, a sua afetação direta pelas restantes disposições dos atos impugnados.

 Quanto à afetação direta dos recorrentes pelo artigo 2.°, n.° 1, alínea f), do ato de base, pelo artigo 2.°, n.° 2, alínea b), do ato de base e pelo artigo 2.°, n.° 2, alínea a), do ato de base, conforme alterado pela Decisão 2010/486

—        Artigo 2.°, n.° 1, alínea f), do ato de base

69      O artigo 2.°, n.° 1, alínea f), do ato de base prevê:

«1. A Grécia deve adotar as seguintes medidas antes do final de junho de 2010:

[…]

f)      Reduzir os subsídios de Páscoa, de férias e de Natal pagos aos funcionários, com o objetivo de economizar 1 500 milhões de EUR durante um ano completo (1 100 milhões de EUR em 2010)[.]»

70      Deve salientar‑se que essa disposição é vaga na medida em que não especifica os detalhes da redução prevista, a maneira como ela será executada e as categorias de funcionários abrangidas. Em contrapartida, essa disposição fixa um objetivo claro que deve ser atingido pela redução dos subsídios pagos aos funcionários, a saber, a realização de uma certo montante de economias por ano. Assim, essa disposição não impede a República Helénica, nomeadamente, de excluir do princípio da redução dos subsídios certas categorias de funcionários, desde que o objetivo das economias a realizar seja atingido. Segue‑se que essa disposição deixa às autoridades gregas uma margem de manobra para especificar todos os detalhes da redução dos subsídios por intermédio de medidas nacionais de aplicação e serão estas últimas medidas que, eventualmente, afetarão diretamente a situação jurídica dos recorrentes. Será, com efeito, o conteúdo dessas medidas que determinará se, ou em que medida, alguns dos recorrentes sofrerão uma redução de subsídios. Estes últimos poderão também interpor recurso dessas medidas nacionais de aplicação perante os órgãos jurisdicionais nacionais.

71      Em apoio da sua alegação de que o artigo 2.°, n.° 1, alínea f), do ato de base lhes diz diretamente respeito, os recorrentes invocam a jurisprudência bem assente segundo a qual o interessado é diretamente afetado pelo ato em causa quando a possibilidade de os destinatários desse ato não lhe darem seguimento for puramente teórica, não suscitando qualquer dúvida a sua vontade de tirar consequências conformes a esse ato (acórdãos do Tribunal de Justiça de 17 de janeiro de 1985, Piraiki‑Patraiki e o./Comissão, 11/82, Recueil, p. 207, n.os 8 a 10, e de 5 de maio de 1998, Dreyfus/Comissão, C‑386/96 P, Colet., p. I‑2309, n.° 44; acórdão do Tribunal Geral de 15 de setembro de 1998, Oleifici Italiani e Fratelli Rubino/Comissão, T‑54/96, Colet., p. II‑3377, n.° 56). A esse propósito, os recorrentes alegam, em substância, que a República Helénica não podia deixar de dar seguimento aos atos impugnados na medida em que o respeito desses atos seria uma condição para a concessão do apoio financeiro a esse Estado por intermédio do mecanismo intergovernamental, tal como atesta, nomeadamente, o considerando 8 do ato de base.

72      Essa argumentação não poderá vingar. Com efeito, resulta da própria redação do artigo 2.°, n.° 1, alínea f), do ato de base que essa disposição impõe a obrigação de a República Helénica atingir um objetivo orçamental, a saber, economizar 1 500 milhões de euros por ano (1 100 milhões de euros em 2010), por intermédio da redução dos subsídios pagos aos funcionários. Em contrapartida, essa disposição não determina nem as modalidades dessa redução nem as categorias de funcionários por ela abrangidas, elementos que são deixados à apreciação da República Helénica, tal com foi acima exposto no n.° 70.

73      Daí resulta que o artigo 2.°, n.° 1, alínea f), do ato de base não é suscetível de produzir diretamente efeitos na situação jurídica dos recorrentes e que, no quadro da sua execução, as autoridades gregas dispõem de uma importante margem de apreciação. Deve, assim, concluir‑se que essa disposição não afeta diretamente os recorrentes na aceção do artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE.

—       Artigo 2.°, n.° 2, alínea b), do ato de base

74      O artigo 2.°, n.° 2, alínea b), do ato de base prevê a obrigação de a República Helénica adotar até ao fim do mês de setembro de 2010 uma lei que reforme o sistema de pensões tendo em vista garantir a sua sustentabilidade e médio e longo prazo. Essa disposição define também as grandes linhas do conteúdo dessa lei. Essa disposição prevê, nomeadamente, que a lei deverá fixar em 65 anos a idade obrigatória para a reforma, a fusão dos fundos de pensão existentes em três fundos, uma redução do limiar máximo de pensões, um aumento gradual do período mínimo de quotização para beneficiar da totalidade das prestações de reforma e a introdução de condições mais estritas da elegibilidade para as pensões de invalidez. Nele é especificado, por fim, que, graças à execução dessa lei, reduzir‑se‑á o aumento previsto do rácio despesas pensões/PIB para um nível inferior à média da área do euro durante as próximas décadas e limitar‑se‑á o aumento das despesas do setor público relativas a pensões durante o período de 2010‑2060 a menos de 2,5% do PIB.

75      Não se pode deixar de observar que o artigo 2.°, n.° 2, alínea b), do ato de base foi suprimido pelo artigo 1.°, n.° 2, da Decisão 2010/486. Na ausência de qualquer alegação dos recorrentes de que a disposição suprimida tenha produzido efeitos jurídicos prejudiciais em relação a eles especificamente durante o seu período de validade, a saber, durante o período entre a data da notificação do ato de base à República Helénica e a data da notificação da Decisão 2010/486 à Republica Helénica, deve concluir‑se que é em vão que os recorrentes invocam o artigo 2.°, n.° 2, alínea b), do ato de base para efeitos de demonstrar a sua legitimidade para impugnarem o referido ato.

76      De qualquer forma, essa disposição não dizia diretamente respeito aos recorrentes no seu período de validade. Com efeito, resulta da redação dessa disposição que ela necessitava da adoção de uma lei nacional para ser executada. Fixava o objetivo que devia atingir essa lei, a saber, a sustentabilidade do sistema grego de pensões, e definia, de forma geral, algumas medidas que essa lei devia prever. Tendo em conta nomeadamente a sua amplitude, na medida em que não dizia respeito unicamente aos funcionários, mas sim à totalidade dos trabalhadores dos setores privado e público que passam à reforma, essa disposição não tinha por vocação constituir uma regulamentação completa e que se bastasse a si mesma do sistema grego de pensões, que não necessitasse de medidas de aplicação e cuja execução tivesse um caráter puramente automático e decorrendo unicamente dessa disposição. Daí resulta que o artigo 2.°, n.° 2, alínea b), do ato de base deixava uma margem de apreciação muito importante às autoridades gregas para definirem o conteúdo da lei que o devia executar, desde que esta garantisse a sustentabilidade do sistema grego de pensões a médio e longo prazo. Terá sido, por isso, essa lei que, eventualmente, terá afetado diretamente a situação jurídica dos recorrentes. Daí resulta que o artigo 2.°, n.° 2, alínea b), do ato de base não diz diretamente respeito aos recorrentes, na aceção do artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE.

—       Artigo 2.°, n.° 2, alínea a), do ato de base, conforme alterado pela Decisão 2010/486

77      O artigo 2.°, n.° 2, alínea a), do ato de base, conforme alterado pela Decisão 2010/486, prevê:

«A Grécia deve adotar as seguintes medidas até ao final de setembro de 2010:

a)      […] um limite de 20% para a substituição dos funcionários públicos que se reformam (administração central, municípios, empresas públicas, administração local, [organismos de segurança social], organismos estatais e outras instituições públicas […]»

78      O artigo 2.°, n.° 2, alínea a), do ato de base, conforme alterado pela Decisão 2010/486, não diz diretamente respeito aos recorrentes, uma vez que constitui uma medida geral de organização e de gestão da administração pública, que não afeta diretamente a sua situação jurídica. Na medida em que essa disposição possa provocar uma degradação do funcionamento dos serviços públicos e deteriorar as condições de trabalho dos recorrentes, como estes alegam, trata‑se de uma circunstância que não atinge a sua situação jurídica, mas unicamente a sua situação de facto (v., neste sentido, despacho do Tribunal Geral de 21 de maio de 2010, ICO Services/Parlamento e Conselho, T‑441/08, não publicado na Coletânea, n.° 62 e jurisprudência aí referida).

79      Em face do exposto, há que concluir que nenhuma das três disposições dos atos impugnados claramente identificadas pelos recorrentes os afeta diretamente na aceção do artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE.

 Quanto à afetação direta dos recorrentes pelas restantes disposições dos atos impugnados

80      No que diz respeito ao presente recurso, as restantes disposições dos atos impugnados preveem a adoção pela República Helénica de um certo número de medidas de consolidação orçamental, de medidas com vista ao reforço da supervisão e da disciplina orçamentais, bem como medidas de natureza estrutural que visam, nomeadamente, melhorar a competitividade da economia grega em geral, sendo o objetivo final a redução do défice público excessivo do país.

81      Entre essas restantes disposições, figuram as disposições que dizem respeito em geral aos funcionários e que os recorrentes se limitaram a citar na petição sem explicar especificamente de que forma estas os afetam diretamente e causam prejuízos aos funcionários em geral.

82      A título indicativo, o Tribunal Geral salienta que os recorrentes citaram o artigo 2.°, n.° 1, alínea b), do ato de base, que prevê a adoção pela República Helénica, antes do fim do mês de junho de 2010, de uma lei que revogue todas as isenções e disposições de tributação autónoma do sistema fiscal, incluindo para rendimentos correspondentes a subsídios especiais pagos aos funcionários públicos; o artigo 2.°, n.° 5, alínea a), do ato de base, que prevê, em substância, a adoção pela República Helénica, até ao final de junho de 2011, de uma tabela salarial unificada e harmonizada do setor público com remunerações que reflitam a produtividade e as tarefas; o artigo 2.°, n.° 3, alínea m), do ato de base, conforme aditado pela Decisão 2010/486, que prevê a adoção pela República Helénica, até ao fim do mês de dezembro de 2010, de um diploma legal que proíba as administrações locais de registar défices orçamentais, pelo menos até 2014, e, finalmente, o artigo 2.°, n.° 5, alínea e), do ato de base, tal como aditado pela Decisão 2010/486, que prevê uma revisão pelas autoridades gregas até ao fim de junho de 2011 do funcionamento dos regimes de pensão públicos complementares/auxiliares, a fim de estabilizar as despesas e garantir a neutralidade orçamental.

83      No que respeita às disposições supramencionadas e, em geral, a todas as restantes disposições dos atos impugnados, devem fazer‑se duas observações.

84      Em primeiro lugar, todas essas disposições, vista a sua amplitude, necessitam de medidas nacionais de aplicação que especificarão o seu conteúdo. No quadro dessa aplicação, as autoridades gregas dispõem de uma importante margem de apreciação, desde que o objetivo final de redução do défice excessivo seja respeitado. Serão essas medidas nacionais que, eventualmente, afetarão diretamente a situação jurídica dos recorrentes.

85      Em segundo lugar, no que diz respeito às eventuais consequências negativas que essas disposições possam ter para os recorrentes e para os funcionários em geral enquanto membros da ADEDY, no plano económico ou das condições de trabalho, deve salientar‑se que essas disposições não dizem respeito à sua situação jurídica, mas unicamente à sua situação de facto (v. n.° 78, supra).

86      Por conseguinte, na ausência de argumentação mais específica da parte dos recorrentes, há que concluir que as restantes disposições dos atos impugnados não os afetam diretamente no sentido do artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE.

87      Resulta do exposto que os atos impugnados não dizem diretamente respeito aos recorrentes.

88      Há que concluir, portanto, que os recorrentes não satisfazem uma das condições de admissibilidade consagradas pelo artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE, a saber, a relativa à afetação direta, que é comum aos recursos dirigidos contra a segunda e terceira categorias de atos referidos nessa disposição (v. n.° 61, supra), de forma que não é necessário examinar a questão de saber se os atos impugnados dizem individualmente respeito aos recorrentes ou se os atos impugnados constituem atos regulamentares na aceção das disposição supramencionada (v., neste sentido, despacho do Tribunal Geral de 15 de junho de 2011, Ax/Conselho, T‑259/10, não publicado na Coletânea, n.° 25).

 Quanto à proteção jurisdicional efetiva dos recorrentes

89      No tocante à alegação dos recorrentes de que, na hipótese de o seu recurso ser declarado inadmissível, eles serão privados do direito a uma tutela jurisdicional efetiva, deve salientar‑se que, tal como tem sido reconhecido por jurisprudência bem assente, o Tratado, pelos seus artigo 263.° TFUE e 277.° TFUE, por um lado, e pelo seu artigo 267.° TFUE, por outro, estabeleceu um sistema completo de vias de recurso e de meios processuais destinado a garantir a fiscalização da legalidade dos atos das instituições, confiando‑o ao juiz da União. Nesse sistema, pessoas singulares ou coletivas, que, em razão das condições de admissibilidade referidas no artigo 263.° TFUE, não podem impugnar diretamente atos da União como os que estão em causa no caso em apreço, têm a possibilidade nomeadamente de fazer valer a invalidade de tais atos perante os órgãos jurisdicionais nacionais e de levar esses órgãos jurisdicionais, que não são competentes para eles próprios declararem a invalidade dos referidos atos, a interrogarem a esse respeito o Tribunal de Justiça através de questões prejudiciais (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 25 de julho de 2002, Unión de Pequeños Agricultores/Conselho, C‑50/00 P, Colet., p. I‑6677, n.° 40, de 1 de abril de 2004, Comissão/Jégo‑Quéré, C‑263/02 P, Colet., p. I‑3425, n.° 30, e de 23 de abril de 2009, Sahlstedt e o./Comissão, C‑362/06 P, Colet., p. I‑2903, n.° 43).

90      Assim, no caso em apreço, tendo em conta que os atos impugnados necessitam de medidas de aplicação pela República Helénica, os recorrentes têm a possibilidade de impugnar essas medidas de aplicação perante o juiz nacional e, no contexto desse contencioso, fazer valer a invalidade dos atos impugnados, levando, assim, o juiz nacional a dirigir uma questão ao Tribunal de Justiça.

91      A fim de justificar a sua tese relativa à privação do seu direito a uma tutela jurisdicional efetiva, os recorrentes evocam a lentidão dos processos perante os tribunais administrativos gregos e que a declaração do seu recurso como inadmissível pelo Tribunal Geral conferiria uma presunção de legalidade aos atos impugnados.

92      Esses argumentos não poderão vingar.

93      Por um lado, resulta da jurisprudência que a admissibilidade de um recurso de anulação perante o juiz da União não poderá depender da questão de saber se existe uma via de recurso perante um órgão jurisdicional que permita o exame da validade do ato cuja anulação é pedida (v. despacho do Tribunal Geral de 28 de novembro de 2005, EEB e o./Comissão, T‑94/04, Colet., p. II‑4919, n.° 63 e jurisprudência aí referida). A fortiori, a admissibilidade do recurso perante o juiz da União não poderá depender da alegada lentidão dos processos nacionais. A esse propósito, há que recordar, aliás, que o artigo 19.°, n.° 1, segundo parágrafo, TUE dispõe que incumbe aos Estados‑Membros criarem os meios processuais necessários para assegurar uma tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União.

94      Por outro lado, a declaração do presente recurso como inadmissível não cria qualquer precedente quanto ao mérito para o juiz nacional.

95      Decorre do exposto que há que rejeitar a alegação dos recorrentes de que a eventual declaração do seu recurso como inadmissível pelo Tribunal Geral prejudicará o seu direito a uma tutela jurisdicional efetiva.

96      Finalmente, improcede a alegação dos recorrentes de que o recurso deve ser examinado quanto ao mérito, na medida em que os vícios dos atos impugnados são de tal forma graves que abalam a confiança dos cidadãos em relação aos órgãos da União. Com efeito, o juiz da União não pode ignorar as regras de admissibilidade do recurso de anulação consagradas no artigo 263.° TFUE.

97      Face ao que precede, há que declarar o presente recurso inadmissível. Por conseguinte, não há necessidade de conhecer da falta do pressuposto processual suscitada pelo Conselho a título subsidiário e relativa à interposição extemporânea do recurso no que se refere ao ato de base.

 Quanto às despesas

98      Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo os recorrentes sido vencidos, há que condená‑los nas despesas, em conformidade com o pedido do Conselho.

99      Nos termos do disposto no artigo 87.°, n.° 4, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, as instituições que intervenham no litígio suportarão as suas próprias despesas. Por conseguinte, a Comissão suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

decide:

1)      O recurso é rejeitado.

2)      A Anotati Dioikisi Enoseon Dimosion Ypallilon (ADEDY), Spyridon Papaspyros e Ilias Iliopoulos suportarão as suas próprias despesas, bem como as efetuadas pelo Conselho da União Europeia.

3)      A Comissão Europeia suportará as suas próprias despesas.

Feito no Luxemburgo, em 27 de novembro de 2012.

O secretário

 

       O presidente

E. Coulon

 

       J. Azizi


Índice


Quadro jurídicoII — 2

Tratado UEII — 2

Tratado FUEII — 2

Pacto de Estabilidade e CrescimentoII — 5

Antecedentes do litígioII — 7

Crise da dívida grega e mecanismo intergovernamental de assistência financeira à República HelénicaII — 7

Procedimento de défice excessivo em relação à República HelénicaII — 8

Procedimento que antecede a adoção dos atos impugnadosII — 8

Atos impugnadosII — 9

— Decisão 2010/320/UEII — 9

— Decisão 2010/486/UEII — 10

Tramitação do processo e pedidos das partesII — 11

Questão de direitoII — 12

Quanto à legitimidade dos recorrentesII — 13

Quanto à afetação direta dos recorrentes pelo artigo 2.°, n.° 1, alínea f), do ato de base, pelo artigo 2.°, n.° 2, alínea b), do ato de base e pelo artigo 2.°, n.° 2, alínea a), do ato de base, conforme alterado pela Decisão 2010/486II — 14

— Artigo 2.°, n.° 1, alínea f), do ato de baseII — 14

— Artigo 2.°, n.° 2, alínea b), do ato de baseII — 16

— Artigo 2.°, n.° 2, alínea a), do ato de base, conforme alterado pela Decisão 2010/486II — 17

Quanto à afetação direta dos recorrentes pelas restantes disposições dos atos impugnadosII — 17

Quanto à proteção jurisdicional efetiva dos recorrentesII — 19

Quanto às despesasII — 20



* Língua do processo: grego.