Language of document : ECLI:EU:T:2011:720

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção)

8 de Dezembro de 2011 (*)

«Auxílios de Estado – Medidas tomadas pelas autoridades alemãs a favor da Deutsche Post AG – Decisão de dar início ao procedimento previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE – Inexistência de decisão definitiva anterior – Inadmissibilidade»

No processo T‑421/07,

Deutsche Post AG, com sede em Bona (Alemanha), representada por J. Sedemund e T. Lübbig, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada inicialmente por N. Khan e B. Martenczuk e, em seguida, por B. Martenczuk e D. Grespan, na qualidade de agentes,

recorrida,

apoiada por:

UPS Europe NV/SA, com sede em Bruxelas (Bélgica),

e

UPS Deutschland Inc. & Co. OHG, com sede em Neuss (Alemanha),

representadas por T. Ottervanger e E. Henny, advogados,

intervenientes,

que tem por objecto um pedido de anulação da decisão da Comissão de 12 de Setembro de 2007, de dar início ao procedimento previsto no artigo 88.°, n.° 2, [CE], no que respeita ao auxílio de Estado concedido pela República Federal da Alemanha a favor da Deutsche Post AG [auxílio C 36/07 (ex NN 25/07)],

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção),

composto por: L. Truchot, presidente, M. E. Martins Ribeiro e H. Kanninen (relator), juízes,

secretário: T. Weiler, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 9 de Junho de 2011,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Em 8 de Junho de 1989, a República Federal da Alemanha adoptou a Postverfassungsgesetz (Lei relativa à organização dos serviços postais, a seguir «PostVerfG») (BGBl. 1989 I, p. 1026). Por força do seu § 1, n.° 2, a administração postal alemã, a Deutsche Bundespost, foi cindida em três entidades jurídicas distintas, a saber, a Deutsche Bundespost Postdienst, a Deutsche Bundespost Telekom e a Deutsche Bundespost Postbank (a seguir, respectivamente, a «DB‑Postdienst», a «DB‑Telekom» e a «DB‑Postbank»). Nos termos do § 65, n.° 2, da PostVerfG, as referidas entidades estavam obrigadas a manter os serviços que eram oferecidos pela Deutsche Bundespost. Por essa razão, enquanto a DB‑Telekom sucedeu à Deutsche Bundespost nas suas actividades de telecomunicações, a DB‑Postdienst assumiu as actividades da Deutsche Bundespost no sector postal, incluindo a prestação do serviço postal universal.

2        Em 14 de Setembro de 1994, a República Federal da Alemanha adoptou a Postumwandlungsgesetz (Lei relativa à reorganização dos serviços postais, a seguir «PostUmwG») (BGBl. 1994 I, p. 2339). Nos termos dos seus §§ 1 e 2, as três entidades jurídicas acima referidas foram transformadas em sociedades anónimas, a partir de 1 de Janeiro de 1995. As actividades da DB‑Postdienst foram retomadas pela recorrente, a Deutsche Post AG. As actividades da DB‑Telekom e da DB‑Postbank foram retomadas, respectivamente, pela Deutsche Telekom AG e pela Deutsche Postbank AG.

3        Em 7 de Julho de 1994, a sociedade de distribuição de encomendas, a UPS Europe NV/SA (a seguir «UPS Europe»), apresentou uma denúncia (a seguir «denúncia de 1994») à Comissão das Comunidades Europeias contra a DB‑Postdienst baseada tanto no artigo 86.° do Tratado CE (actual artigo 82.° CE) como no artigo 92.° do Tratado CE (actual artigo 87.° CE). Esta denúncia foi seguida de outra apresentada, em 1997, pela associação de prestadores privados de serviços postais e de correio expresso, a Bundesverband Internationaler Express‑ und Kurierdienste eV (a seguir «BIEK»).

4        No essencial, a UPS Europe e a BIEK acusam a DB‑Postdienst de abusar da sua posição dominante ao seguir uma política de venda com prejuízo no sector aberto à concorrência das encomendas porta‑a‑porta, financiada através das receitas geradas no sector do transporte postal (ou correio de cartas), no qual beneficiava de um monopólio legal (a seguir «sector reservado»), ou de auxílios contrários ao artigo 87.° CE.

5        Por carta de 17 de Agosto de 1999, publicada no Jornal Oficial das Comunidades Europeias de 23 de Outubro de 1999 (JO C 306, p. 25), a Comissão informou a República Federal da Alemanha da sua decisão de dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE a respeito de diversas medidas em virtude das quais a recorrente tinha beneficiado de fundos públicos (a seguir «decisão de dar início ao procedimento de 1999») e solicitou‑lhe que fornecesse um determinado número de documentos e de informações.

6        Em 20 de Março de 2001, a Comissão adoptou a Decisão 2001/354/CE relativa a um processo de aplicação do artigo 82.° CE (Processo COMP/35.141 – Deutsche Post AG) (JO L 125, p. 27). A Comissão concluiu que a recorrente abusou da sua posição dominante no segmento da venda por correspondência, ao sujeitar, de 1974 a 2000, a concessão de descontos de fidelidade aos seus clientes à condição de se comprometerem a mandar processar pelos seus serviços toda ou a maior parte dos seus envios e ao praticar, de 1990 a 1995, uma política de venda com prejuízo.

7        Em 19 de Junho de 2002, a Comissão adoptou a Decisão 2002/753/CE relativa a medidas adoptadas pela República Federal da Alemanha a favor da recorrente (JO L 247, p. 27, a seguir «decisão de 2002»).

8        A decisão de 2002 envolvia, no essencial, uma argumentação que se divide em quatro momentos.

9        Num primeiro momento, a Comissão recordou, primeiramente, que, no quadro da sua decisão dar início ao procedimento de 1999, partiu do pressuposto de que os pagamentos compensatórios estatais recebidos pela DB‑Postdienst e, ulteriormente pela recorrente, a título da sua missão de prestação de serviços de interesse económico geral (a seguir «SIEG»), tinham excedido os custos líquidos adicionais originados por esta missão, anunciando assim que iria investigar cinco medidas de auxílio presumidas. Entre estas medidas figuravam, em primeiro lugar, garantias estatais por força das quais a República Federal da Alemanha se tornaria fiadora das dívidas contraídas pela Deutsche Bundespost antes da sua transformação em três sociedades por acções (a seguir «garantias públicas»), em segundo lugar, a existência de um financiamento público das pensões dos funcionários da DB‑Postdienst e da recorrente e, em terceiro lugar, um eventual apoio financeiro do Estado a favor da recorrente (considerandos 2, 4, 5, e 7 da decisão de 2002).

10      Em seguida, a Comissão expôs as observações da República Federal da Alemanha sobre as cinco medidas de auxílio presumidas referidas na decisão de dar início ao procedimento de 1999 (considerandos 12 a 20 da decisão de 2002). Quanto ao apoio financeiro do Estado, assinalou que a República Federal da Alemanha admitiu que a DB‑Postdienst e a recorrente tinham beneficiado de duas transferências estatais que consistiam, por um lado, na concessão de transferências efectuadas entre 1990 e 1994 pela DB‑Telekom, com base no § 37, n.° 3, da PostVerfG e, por outro, na renúncia por parte da DB‑Telekom, em 1 de Janeiro de 1995, com base no § 7 da PostUmwG, a um crédito contra a recorrente (a seguir «transferências efectuadas pela DB‑Telekom»). A Comissão indicou que o Governo alemão não negava que estas transferências se devessem ao Estado, mas afirmava, contudo, que eram indispensáveis para o cumprimento da missão de SIEG da recorrente (considerandos 16 a 20 da decisão de 2002).

11      Por último, a Comissão indicou que «[n]a sequência das denúncias apresentadas pela UPS [Europe] e pela BIEK, a [decisão de 2002] examina[ou] a cobertura dos custos dos serviços de encomendas porta‑a‑porta prestados em concorrência com outras empresas», pelo que a investigação da Comissão devia concentrar‑se na cobertura dos custos incorridos pela recorrente com os dois serviços mais importantes no sector das encomendas porta‑a‑porta que estão abertos à concorrência: o transporte de encomendas entre clientes institucionais e os serviços de distribuição de encomendas postais porta‑a‑porta por conta de empresas de venda por correspondência (considerando 21 da decisão de 2002).

12      Num segundo momento, a Comissão indicou que a República Federal da Alemanha a tinha informado de que, entre 1990 e 1998, a recorrente tinha registado lucros no sector reservado e prejuízos nos sectores abertos à concorrência, tendo registado um défice total, incluídos todos os sectores de actividade. Daí deduziu que um eventual défice no sector das encomendas não poderia ser compensado nem por receitas do sector reservado nem por receitas provenientes dos sectores abertos à concorrência (considerandos 66 a 69 e nota de pé de página n.° 107 da decisão de 2002).

13      Num terceiro momento, a Comissão constatou que os prejuízos da recorrente no sector das encomendas durante o período de 1990 a 1998, tiveram que ser necessariamente cobertos através de recursos públicos e decidiu analisar se estavam directamente relacionados com a sua missão de SIEG, assinalando, contudo, que a recorrente teria sido favorecida, na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE, se não estivessem (considerando 72 da decisão de 2002).

14      A este respeito, a Comissão observa que, a partir de 1 de Fevereiro de 1994, a recorrente tinha, por força do § 2, n.° 2, ponto 3, do Postdienst‑Pflichtleistungsverordnung (Regulamento sobre as prestações obrigatórias) (BGBl. 1994 I, p. 86), a possibilidade, mas não a obrigação, de conceder, no sector das encomendas, descontos aos seus clientes que se traduziam em tarifas inferiores à tarifa única fixada pelo § 1, n.° 1, do Postdienst‑Pflichtleistungsverordnung. Indicou que, tendo em conta os descontos aplicados, as receitas eram insuficientes, de 1994 a 1999, para cobrir os custos resultantes da exploração, o que provocou um défice de 1 118,7 milhões de marcos alemães (DEM) sem nexo de causalidade com nenhuma missão de SIEG (considerandos 75 a 79, 82, 86 e 88 da decisão de 2002).

15      Em seguida, a Comissão assinalou, em primeiro lugar, que os recursos utilizados para o financiamento público das pensões estavam sujeitos ao controlo da República Federal da Alemanha, em segundo lugar, em relação às garantias estatais, que a República Federal da Alemanha controlava directamente os títulos de dívida da recorrente e, em terceiro lugar, quanto ao apoio financeiro da República Federal da Alemanha a favor da recorrente, que as transferências efectuadas pela DB‑Telekom deviam ser imputadas a esse Estado‑Membro (considerandos 92 a 94 da decisão de 2002).

16      A Comissão observou que, sem as transferências efectuadas pela DB‑Telekom, a República Federal da Alemanha teria que ter recorrido aos recursos do orçamento geral para apoiar a DB‑Postdienst e a recorrente (considerando 95 da decisão de 2002).

17      A Comissão concluiu, a seguir, que existia uma distorção da concorrência e que as trocas comerciais entre os Estados‑Membros tinham sido afectadas. Concluiu ainda que os auxílios recebidos eram incompatíveis com o mercado comum, na medida em que não estavam justificados nos termos do artigo 87.°, n.os 2 e 3, CE e que não se podia considerar os custos líquidos adicionais de 1 118,7 milhões de DEM no sector das encomendas resultado das obrigações da missão de SIEG da recorrente, na acepção do artigo 86.°, n.° 2, CE (considerandos 96 a 106 da decisão de 2002).

18      Num quarto momento, a Comissão concluiu que, na medida em que a compensação que a República Federal da Alemanha concedeu a título de custos líquidos adicionais resultantes da adopção de uma política de venda com prejuízo se tinha traduzido na redução dos custos associados normalmente à prestação de serviços no sector de encomendas porta‑a‑porta, esta medida constituía uma vantagem na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE e, um auxílio incompatível com o mercado comum que se elevava a 572 milhões de euros (considerando 107 da decisão de 2002).

19      A parte decisória da decisão de 2002 tem a seguinte redacção:

«Artigo 1.°

O auxílio estatal concedido pela [República Federal da Alemanha] a favor da [recorrente], no montante de 572 milhões de euros (1 118,7 milhões de marcos alemães), é incompatível com o mercado comum.

Artigo 2.°

1.      A República Federal da Alemanha deverá tomar as medidas necessárias para pôr termo ao auxílio e para recuperar junto [da recorrente] o auxílio referido no artigo 1.°, que lhe foi ilegalmente concedido.

[…]»

20      Através do seu acórdão de 1 de Julho de 2008, Deutsche Post/Comissão (T‑266/02, Colect., p. II‑1233), o Tribunal Geral anulou a decisão de 2002. Ao recurso interposto pela Comissão do referido acórdão foi negado provimento pelo acórdão do Tribunal de Justiça, de 2 de Setembro de 2010, Comissão/Deutsche Post (C‑399/08 P, Colect., p. I‑0000).

21      Em 22 de Abril de 2004, a UPS Europe apresentou uma denúncia à Comissão com base no artigo 82.° CE alegando que as tarifas da recorrente no sector reservado eram abusivas. A este respeito, a Comissão iniciou uma investigação no âmbito da qual recebeu certos documentos respeitantes a decisões das autoridades alemãs relativas a essas tarifas.

22      Em 11 de Maio de 2004, a UPS Europe apresentou uma nova denúncia à Comissão alegando que esta, na decisão de 2002, não tinha examinado todas as medidas públicas mencionadas na denúncia de 1994 e que as vantagens de que beneficiava a recorrente ultrapassavam largamente o montante cuja recuperação a Comissão tinha ordenado. Por seu lado, em 16 de Julho de 2004, a TNT Post AG & Co. KG apresentou uma denúncia afirmando que as tarifas dos serviços facturadas pela recorrente à sua filial, a DB‑PostBank, eram excessivamente baixas e que estes serviços eram financiados mediante receitas provenientes do sector reservado. Na sequência destas denúncias, a Comissão transmitiu pedidos de informação à República Federal da Alemanha aos quais esta respondeu.

23      Por carta de 4 de Abril de 2006, a Comissão informou a UPS Europe de que não existia um interesse comunitário suficiente para dar seguimento à sua denúncia apresentada com base no artigo 82.° CE.

24      Em 26 de Abril de 2007, a UPS Europe convidou formalmente a Comissão a tomar todas as medidas necessárias a propósito da sua denúncia de 11 de Maio de 2004.

25      Por carta de 13 de Junho de 2007, a República Federal da Alemanha deu o seu acordo para que as informações fornecidas à Comissão no âmbito da investigação iniciada na sequência da denúncia da UPS Europe de 22 de Abril de 2004 fossem utilizadas no âmbito de um procedimento de auxílios de Estado.

26      Em 3 de Setembro de 2007, a UPS Europe e a UPS Deutschland Inc. & Co. OHG (a seguir conjuntamente designadas «UPS») interpuseram um recurso perante o Tribunal Geral, nos termos do artigo 232.° CE, para obter a declaração da omissão da Comissão na medida em que esta se absteve de decidir sobre a denúncia apresentada em 11 de Maio de 2004 (processo T‑329/07, UPS Europe e UPS Deutschland/Comissão).

27      Por carta de 12 de Setembro de 2007, a Comissão notificou à República Federal da Alemanha a sua decisão de dar início ao procedimento previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE, no que respeita ao auxílio de Estado concedido pelas autoridades alemãs a favor da Deutsche Post AG [auxílio C 36/07 (ex NN 25/07)] (a seguir «decisão impugnada»). A decisão impugnada foi publicada no Jornal Oficial da União Europeia de 19 de Outubro de 2007 (JO C 245, p. 21) na língua que faz fé (o alemão), precedida de um resumo em todas as outras línguas oficiais.

28      Por carta depositada na Secretaria do Tribunal Geral em 8 de Novembro de 2007, a UPS desistiu do seu recurso no processo T‑329/07, n.° 26 supra. Por despacho do Tribunal Geral de 11 de Dezembro de 2007, a UPS Europe e a UPS Deutschland/Comissão (T‑329/07, não publicado na Colectânea), o processo foi cancelado no registo.

29      A decisão impugnada está dividida em diversos pontos.

30      No ponto 1 da decisão impugnada, a Comissão recordou os procedimentos iniciados, nos termos dos artigos 82.° CE e 87.° CE, contra a recorrente desde a denúncia de 1994. Invocou a necessidade de levar a cabo uma investigação global sobre a totalidade das distorções da concorrência resultantes dos fundos públicos concedidos à recorrente e à sua predecessora e indicou que o procedimento iniciado pela decisão de dar início ao procedimento de 1999 seria completada para integrar as informações recentemente comunicadas e adoptar uma posição definitiva sobre a compatibilidade destes fundos com o Tratado CE (considerandos 1 a 15 da decisão impugnada).

31      A Comissão sublinhou que «a investigação complementar» à qual entendia proceder «não substituiria de modo nenhum a decisão de 2002», já que esta última declarava que «auxílios de Estado no valor de 572 milhões de euros tinham sido utilizados para a subvenção cruzada de actividades comerciais, mas sem se pronunciar sobre a questão geral de saber se [a recorrente e a sua predecessora] tinham recebido uma compensação excessiva [para a realização da sua missão de SIEG] através de fundos públicos». A Comissão explicou que pretendia, na sua investigação, determinar se tinha havido uma compensação excessiva, para além destes 572 milhões de euros, e anunciou que examinaria a totalidade das medidas públicas adoptadas em benefício das referidas empresas entre 1 de Julho de 1989, data da criação do DB‑Postdienst, e 31 de Dezembro de 2007, data presumida do termo da missão de SIEG da recorrente (considerando 15 da decisão impugnada).

32      No ponto 3 da decisão impugnada, intitulado «Descrição das medidas públicas a favor [da] DB‑Postdienst e da [recorrente]», por um lado, a Comissão indicou no essencial, que a DB‑Postdienst e a recorrente tinham beneficiado das transferências efectuadas pela DB‑Telekom bem como de garantias públicas (considerandos 25 a 32, 38 e 39 da decisão impugnada).

33      Por outro lado, a Comissão examinou a existência do financiamento público das pensões. Quanto ao período de 1989 a 1994, indicou não dispor de qualquer informação segundo a qual a DB‑Postdienst contribuiu para o financiamento das pensões dos seus empregados, dado que este estaria supostamente a cargo exclusivo do Estado alemão. Em relação ao período de 1995 a 1999, a recorrente teria pago um montante ao fundo de pensões para os funcionários dos correios criado em 1 de Janeiro de 1995, ao abrigo do § 16.°, n.° 1, da Gesetz zum Personalrecht der Beschäftigen der Früheren Deutschen Bundespost (Postpersonalrechtsgesetz, Lei de 14 de Setembro de 1994, relativa ao pessoal da antiga Deutsche Bundespost, BGBl. 1994 I, p. 2325). Ora, o Estado alemão teria coberto o défice do referido fundo. Por último, o montante das quotizações pagas pela recorrente a este fundo teria sido reduzido em 2000 para 33% do salário bruto dos funcionários no activo e, para os anos posteriores, a Comissão não dispunha de informações precisas (considerandos 40 a 48 da decisão impugnada).

34      No ponto 6 da decisão impugnada, intitulado «Apreciação quanto à existência de um auxílio de Estado», em primeiro lugar, a Comissão declarou que toda a vantagem selectiva concedida à DB‑Postdienst e à recorrente falseava a concorrência e afectava as trocas comerciais entre os Estados‑Membros. Em segundo lugar, a Comissão observou que as transferências efectuadas pela DB‑Telekom e as garantias públicas constituíam auxílios de Estado na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE (considerandos 72 a 75 da decisão impugnada). Em terceiro lugar, a Comissão assinalou que, em relação ao período entre 1989 e 1995, «[a] DB‑Postdienst não tinha manifestamente contribuído para o financiamento das pensões [dos seus] funcionários» e que, relativamente ao período de 1995 a 1999, «colocava a questão de saber se a [recorrente] tinha beneficiado de uma vantagem económica resultante das condições em que as pré reformas tinham sido acordadas». Em particular, a Comissão indicou pretender examinar em que medida o financiamento público das pensões «tinha sido mais vantajoso para [a recorrente] do que para outros operadores», após ter assinalado que a República Federal da Alemanha tinha alegado que, desde 1995, a recorrente tinha «suportado despesas ligadas às pensões de um montante superior às quantias pagas pelos seus concorrentes» (considerandos 76 a 78 da decisão impugnada).

35      No ponto 7 da decisão impugnada, intitulado «Apreciação da conformidade dos auxílios de Estado com o mercado comum», a Comissão indicou que examinaria em que medida a compensação concedida à recorrente e à sua predecessora era necessária para assegurar a execução da missão de SIEG que tiveram que suportar entre 1989 e 31 de Dezembro de 2007 (considerandos 80 e 81 da decisão impugnada). A Comissão expôs o método de cálculo que entendia utilizar a este respeito, bem como as receitas que pretendia tomar em consideração (considerandos 84 a 104 da decisão impugnada).

36      No ponto 8 da decisão impugnada, intitulado «Decisão», a Comissão convidou a República Federal da Alemanha a «participar a sua posição num prazo de um mês a contar da recepção [da decisão impugnada]» e «a comunicar todas as informações úteis para a apreciação jurídica das medidas já referidas à luz das disposições que regulam os auxílios de Estado».

 Tramitação do processo e pedidos das partes

37      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 22 de Novembro de 2007, a recorrente interpôs o presente recurso.

38      Por carta apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 29 de Fevereiro de 2008, a UPS pediu para intervir em apoio dos pedidos da Comissão.

39      Por despacho de 9 de Julho de 2008, o presidente da Primeira Secção do Tribunal Geral admitiu o pedido de intervenção da UPS.

40      Tendo sido modificada a composição das Secções do Tribunal Geral, o juiz‑relator foi afectado à Oitava Secção, à qual, por conseguinte, o presente processo foi distribuído.

41      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Oitava Secção) decidiu iniciar a fase oral do processo e, no quadro das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do seu Regulamento de Processo, colocou questões às partes. As partes responderam a estas questões no prazo fixado.

42      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às perguntas colocadas pelo Tribunal Geral na audiência de 9 de Junho de 2011.

43      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão impugnada;

–        condenar a Comissão nas despesas.

44      A Comissão, apoiada pela UPS, conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        julgar o recurso inadmissível ou, a título subsidiário, negar‑lhe provimento;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

45      Sem deduzir formalmente uma questão prévia de inadmissibilidade nos termos do artigo 114.°, do Regulamento de Processo, a Comissão, apoiada pela UPS, contesta a admissibilidade do recurso.

46      Apresenta dois argumentos principais em apoio da sua posição. Em primeiro lugar, sustenta na contestação que uma decisão de dar início ao procedimento formal de investigação só constitui um acto impugnável se incidir sobre a questão de saber se um auxílio deve ser considerado novo ou existente. Em contrapartida, esta decisão não é um acto impugnável se visar a qualificação de uma medida como auxílio de Estado. Ora, nem a recorrente nem a República Federal da Alemanha alegaram em tempo útil que as medidas examinadas na decisão impugnada eram auxílios existentes.

47      Em segundo lugar, a Comissão alega, na sua resposta escrita a uma questão colocada pelo Tribunal Geral e na audiência, que os efeitos negativos que para a recorrente podem resultar da decisão impugnada tinham já sido desencadeados pela decisão de dar início ao procedimento de 1999. Segundo a Comissão, esta decisão tinha por objecto todas as medidas qualificadas provisoriamente como auxílios novos na decisão impugnada. Embora a mesma tenha sido anulada, estas medidas continuariam a ser objecto de um procedimento formal de investigação iniciado desde 1999. Por conseguinte, a recorrente não tinha interesse em agir no caso em apreço.

48      A demandante sustenta que o recurso é admissível. A este respeito, alega que as medidas visadas pela decisão impugnada devem ser tratadas como auxílios existentes dado que já foram objecto de um procedimento encerrado em relação a todos os seus aspectos pela decisão de 2002. Portanto, na medida em que são qualificados como auxílios novos na decisão impugnada, o recurso é admissível. A título subsidiário, a recorrente alega que uma decisão de dar início ao procedimento é impugnável desde que a qualificação como auxílio de uma medida seja contestada.

49      Segundo jurisprudência assente, apenas constituem actos ou decisões susceptíveis de serem objecto de recurso de anulação, na acepção do artigo 230.° CE, as medidas que produzem efeitos jurídicos obrigatórios susceptíveis de afectar os interesses do recorrente, alterando de forma caracterizada a situação jurídica deste. Mais especialmente, quando se trate de actos ou decisões cuja elaboração se processa em várias fases, nomeadamente no termo de um processo interno, só constituem, em princípio, actos recorríveis as medidas que fixem definitivamente a posição da instituição no termo desse processo, excluindo as medidas transitórias cujo objectivo é preparar a decisão final (acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Novembro de 1981, IBM/Comissão, 60/81, Recueil, p. 2639, n.os 9 e 10, e acórdãos do Tribunal Geral de 10 de Julho de 1990, Automec/Comissão, T‑64/89, Colect., p. II‑367, n.° 42, e de 25 de Março de 2009, Alcoa Trasformazioni/Comissão, T‑332/06, não publicado na Colectânea, n.° 34).

50      Estando em causa uma decisão de dar início ao procedimento formal de investigação de um auxílio de Estado, decorre, porém da jurisprudência que, quando a Comissão qualifica uma medida em fase de execução como novo auxílio, tal decisão produz efeitos jurídicos autónomos, especialmente no que respeita à suspensão da medida considerada (acórdão do Tribunal de Justiça de 9 de Outubro de 2001, Itália/Comissão, C‑400/99, Colect., p. I‑7303, n.° 62; acórdãos do Tribunal Geral de 23 de Outubro de 2002, Diputación Foral de Álava e o./Comissão, T‑346/99 a T‑348/99, Colect., p. II‑4259, n.° 33, e Alcoa Trasformazioni/Comissão, n.° 49 supra, n.° 34). Essa conclusão impõe‑se não só no caso de a medida em fase de execução ser considerada pelas autoridades do Estado‑Membro em causa como um auxílio existente, mas também no caso de essas autoridades entenderem que a medida que é objecto da decisão de dar início ao procedimento não entra no âmbito de aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE (v., acórdão Alcoa Trasformazioni/Comissão, referido supra, n.° 35, e jurisprudência referida).

51      Com efeito, uma decisão de dar início ao procedimento formal de investigação relativamente a uma medida em fase de execução e qualificada de novo auxílio pela Comissão modifica necessariamente o alcance jurídico da medida considerada, bem como a situação jurídica das empresas que dela beneficiam, nomeadamente no que respeita ao prosseguimento da sua execução. Até à adopção de tal decisão, o Estado‑Membro, as empresas beneficiárias e os restantes operadores económicos podem pensar que a medida é executada de forma lícita enquanto medida geral que não está abrangida no âmbito de aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE ou enquanto auxílio existente. Em contrapartida, depois da adopção de tal decisão, existe, pelo menos, uma dúvida importante sobre a legalidade desta medida, que, sem prejuízo da faculdade de solicitar medidas provisórias ao juiz competente, deve conduzir o Estado‑Membro a suspender a sua aplicação, uma vez que a decisão de dar início ao procedimento formal de investigação exclui uma decisão imediata que declare a compatibilidade com o mercado comum que permitiria prosseguir licitamente a execução da referida medida. Tal decisão poderia ser igualmente invocada perante o juiz nacional chamado a extrair todas as consequências decorrentes da violação do artigo 88.°, n.° 3, último período, CE. Finalmente, essa decisão pode conduzir as empresas beneficiárias da medida a recusarem, em qualquer circunstância, novos pagamentos ou benefícios, ou a depositarem os montantes necessários a eventuais compensações financeiras posteriores. Os operadores comerciais terão igualmente em conta, nas suas relações com os referidos beneficiários, a situação jurídica e financeira fragilizada destes últimos (acórdãos Diputación Foral de Álava/Comissão, n.° 50 supra, n.° 34, e Alcoa Trasformazioni/Comissão, n.° 49 supra, n.° 36).

52      Resulta da decisão impugnada que esta foi adoptada com o objectivo de iniciar o procedimento formal de investigação relativamente a três medidas, a saber as transferências efectuadas pela DB‑Telekom, as garantias públicas e o financiamento público das pensões (a seguir «medidas controvertidas»).

53      Como se indicou no n.° 34 supra, na decisão impugnada, a Comissão qualificou como auxílios novos as transferências efectuadas pela DB‑Telekom e as garantias públicas (considerandos 72 a 75 da decisão impugnada). Quanto ao financiamento público das pensões, a Comissão indicou as suas dúvidas sobre a questão de saber em que medida este financiamento tinha conferido uma vantagem económica à recorrente (considerandos 76 a 78 da decisão impugnada).

54      Segundo a jurisprudência referida nos n.os 49 a 51 supra, importa examinar se a decisão impugnada produziu efeitos jurídicos autónomos que a tornem susceptível de recurso.

55      Com este fim, há que recordar que a decisão impugnada foi precedida de uma decisão de dar início ao procedimento formal de investigação, a saber a decisão de dar início ao procedimento de 1999. Por conseguinte, cumpre examinar se os efeitos jurídicos pretensamente gerados pela decisão impugnada não tinham já sido produzidos, em qualquer caso, pela decisão de dar início ao procedimento de 1999, como pretende a Comissão no âmbito da sua argumentação relativa à inadmissibilidade do recurso (v. n.° 47, supra).

56      É pacífico entre as partes que o procedimento formal de investigação instaurado pela decisão de dar início ao procedimento de 1999 incidia já sobre as medidas controvertidas, que são, de resto, analisadas na decisão de 2002.

57      Sobre este ponto, importa, com efeito, assinalar que a Comissão indicou no considerando 37 da decisão de dar início ao procedimento de 1999 que, segundo a UPS Europe e a BIEK, as dívidas da recorrente estavam, em conformidade com o § 40 da PostVerfG, cobertas por uma garantia estatal limitada, desde 2 de Janeiro de 1995, às dívidas existentes à data. No considerando 62 da decisão de dar início ao procedimento de 1999, a Comissão observou que uma análise preliminar desta medida não permitia concluir que não constituía um auxílio de Estado.

58      Em seguida, a Comissão indicou, no considerando 40 da decisão de dar início ao procedimento de 1999, que, segundo a BIEK, a República Federal da Alemanha tinha assumido a seu cargo o défice do fundo de pensões para os funcionários dos correios, o que constituiu um apoio estatal a favor da recorrente. No considerando 65 da decisão de dar início ao procedimento de 1999, a Comissão indicou que as despesas ligadas às pensões dos antigos empregados da recorrente e da sua predecessora eram suportadas por este fundo e assinalou que a República Federal da Alemanha tinha coberto o défice importante sofrido por este. A Comissão observou igualmente que uma análise preliminar desta medida não permitia concluir que não constituía um auxílio de Estado.

59      Finalmente, no considerando 63 da decisão de dar início ao procedimento de 1999, a Comissão indicou que a transferência pelo Estado de bens imóveis ou de outros elementos de activos para a recorrente deveria, em princípio, ser considerada um auxílio de Estado e, portanto, ser justificada. No considerando 80 desta decisão, a Comissão pediu às autoridades alemãs para fornecerem informações detalhadas sobre o apoio estatal financeiro concedido às actividades da recorrente, referindo, entre outras medidas, as eventuais subvenções que lhe fossem vantajosas, na medida em que eram significativas na acepção das disposições do Tratado CE relativas aos auxílios de Estado.

60      Em resposta ao pedido da Comissão, as autoridades alemãs informaram‑na de forma pormenorizada da existência de transferências efectuadas pela DB‑Telekom (v. considerandos 16 a 20 da decisão de 2002). A Comissão indicou, em resposta a uma questão do Tribunal Geral, que esta informação lhe tinha sido fornecida em 16 de Setembro de 1999. A República Federal da Alemanha comunicou igualmente à Comissão observações respeitantes à questão de saber se estas transferências constituíam auxílios de Estado.

61      Assim, uma vez que a decisão impugnada incide sobre as mesmas medidas que as que foram objecto da decisão de dar início ao procedimento de 1999, que, no âmbito desta decisão e do procedimento que se seguiu a esta, a Comissão já tinha mencionado que as medidas controvertidas podiam entrar no âmbito de aplicação da proibição do artigo 87.°, n.° 1, CE e que os efeitos jurídicos autónomos associados a um procedimento formal de investigação já se produziram, consequentemente, na sequência da referida decisão de dar início, a decisão impugnada não é susceptível de produzir tais efeitos e não pode, portanto, constituir uma decisão que possa ser objecto de um recurso de anulação. Com efeito, desde o procedimento iniciado em 1999, existia já, pelo menos, uma dúvida importante sobre a legalidade das medidas controvertidas, uma vez que o início do referido procedimento exclui uma decisão imediata que declare a compatibilidade com o mercado comum que teria permitido prosseguir licitamente a execução das referidas medidas e beneficiar delas.

62      No entanto, a recorrente alega que o procedimento formal de investigação iniciado em relação às medidas controvertidas pela decisão de dar início ao procedimento de 1999 tinha sido encerrado em relação a todos os seus aspectos pela decisão de 2002. Em contrapartida, a Comissão sustenta que esta decisão encerrou apenas parcialmente o referido procedimento.

63      Portanto, importa examinar se este procedimento foi encerrado no que respeita às medidas controvertidas antes da adopção da decisão impugnada.

64      Nos termos do artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 659/1999 do Conselho, de 22 de Março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo [88.° CE] (JO L 83, p. 1), aplicável ao procedimento relativo aos auxílios ilegais por força do artigo 13.°, n.° 1, do referido regulamento, o procedimento formal de investigação será encerrado por via de decisão, nos termos dos n.os 2 a 5 do mesmo artigo (com excepção dos casos de retirada da notificação pelo Estado‑Membro em causa).

65      Resulta do artigo 7.°, n.os 2 a 5, do Regulamento n.° 659/1999, que uma decisão de encerramento do procedimento formal de investigação pode ter quatro conteúdos diferentes, a saber que a medida notificada não constitui um auxílio (n.° 2), que a referida medida constitui um auxílio compatível com o mercado comum (decisão positiva, n.° 3), que a mesma constitui um auxílio compatível com o mercado comum desde que certas condições e obrigações sejam respeitadas (decisão condicional, n.° 4) ou, finalmente, que a referida medida constitui um auxílio incompatível com o mercado comum (decisão negativa, n.° 5).

66      Decorre destas disposições que o procedimento formal de investigação deve ser encerrado por uma decisão que qualifique de modo explícito a medida examinada à luz de uma das disposições do artigo 7.°, n.os 2 a 5, do Regulamento n.° 659/1999.

67      Ora, resulta da decisão de 2002, designadamente dos seus considerandos referidos nos n.os 9 a 16 supra, que a Comissão não qualificou expressamente nela as medidas controvertidas à luz destas disposições para além dos 572 milhões de euros a que se refere a parte decisória da decisão em causa. A Comissão limitou‑se a declarar, por um lado, que estas medidas comportavam uma transferência de recursos públicos a favor da recorrente e, por outro, que estes recursos deviam forçosamente ter sido utilizados para cobrir o défice gerado pela política de venda com prejuízo da recorrente no sector das encomendas, avaliada em 1 118,7 milhões de DEM, o que equivale a 572 milhões de euros, na medida em que a recorrente não podia financiar o défice em causa através de fundos próprios.

68      Na audiência, a Comissão admitiu que a decisão de 2002 não continha explicações que indicassem que se tratava de uma decisão definitiva parcial relativa às medidas controvertidas e que o procedimento formal de investigação tinha permanecido parcialmente aberto. Segundo a Comissão, esta decisão deve, contudo, ser interpretada na sua globalidade, uma vez que, a sua parte decisória deve ser lida à luz dos seus considerandos.

69      A este respeito, cumpre assinalar que, como se indicou no n.° 11 supra, a Comissão salientou, no considerando 21 da decisão de 2002, que esta decisão examinava a cobertura dos custos dos serviços de encomendas porta‑a‑porta prestados em concorrência com outras empresas.

70      Neste considerando, a Comissão precisou que a análise que tinha efectuado na decisão de 2002 para avaliar a compatibilidade das medidas controvertidas com o mercado comum dizia apenas respeito ao sector das encomendas. Assim, no ponto II F da decisão de 2002, intitulado «Custos de infra‑estrutura imputáveis aos serviços de encomendas porta‑a‑porta», a Comissão procedeu somente à análise dos possíveis custos adicionais originados por uma missão de SIEG nesse sector. No ponto II G da decisão de 2002, intitulado «Âmbito do mandato de serviço público da [recorrente] no sector das encomendas postais», não examinou outras missões de SIEG da recorrente. No ponto II H da decisão de 2002, intitulado «Encargos herdados do passado assumidos pela [recorrente] enquanto antiga empresa pública», a Comissão analisou unicamente o impacto no sector das encomendas dos encargos invocados pela República Federal da Alemanha e pela recorrente. O ponto III da decisão de 2002, intitulado «Observações de terceiros», diz respeito principalmente aos comentários dos terceiros relativamente à situação financeira, ao comportamento comercial e aos custos e custos adicionais ligados a uma missão de SIEG da DB‑Postdienst e da recorrente apenas no sector das encomendas.

71      Do mesmo modo, na decisão de 2002, a Comissão analisou a existência de uma vantagem para a recorrente e para a DB‑Postdienst no que respeita unicamente à cobertura dos seus prejuízos no sector das encomendas (considerandos 66 a 91 da decisão de 2002). Somente as questões da exigência de uma distorção da concorrência, da afectação das trocas comerciais entre os Estados‑Membros e da compatibilidade com o mercado comum desta vantagem foram a seguir examinadas (considerandos 96 a 106 da decisão final de 2002).

72      Por último, quando a Comissão concluiu na decisão de 2002 que uma medida que constituía o objecto do procedimento formal de investigação iniciado em 1999 não era um auxílio de Estado, fê‑lo de forma expressa.

73      Com efeito, a Comissão indicou na decisão de dar início ao procedimento de 1999 que um autor da denúncia tinha alegado que a recorrente tinha adquirido da República Federal da Alemanha uma parte da Deutsche Postbank em 1998 ao deduzir do preço de venda um crédito inexistente relativo ao Estado alemão. A Comissão considerou que um primeiro exame das condições em que esta aquisição se tinha realizado não permitia concluir que, através desta, a República Federal da Alemanha não tinha concedido um auxílio de Estado à recorrente. Ora, no considerando 65 da decisão de 2002, a Comissão indicou que a aquisição da DB‑Postbank pela recorrente não tinha implicado a concessão de auxílios de Estado.

74      Importa, portanto, declarar que a Comissão, na decisão de 2002, só analisou as medidas controvertidas na medida em que diziam respeito ao financiamento de certas actividades da recorrente relativas ao sector das encomendas. Consequentemente, há que considerar que a Comissão não excluiu nem confirmou, na decisão de 2002, que estas medidas constituíam auxílios de Estado incompatíveis com o Tratado CE para além dos 572 milhões de euros referidos na parte decisória desta decisão.

75      Resulta do que ficou exposto que, na adopção da decisão impugnada, o procedimento formal de investigação iniciado em 1999 relativamente às medidas controvertidas não tinha sido encerrado pela decisão de 2002 para além dos 572 milhões de euros referidos na parte decisória desta última.

76      É certo que, na decisão de 2002, a Comissão teria podido expor mais claramente em que medida encerrava a investigação formal iniciada pela decisão de dar início ao procedimento de 1999. No entanto, esta constatação não tem incidência sobre a análise da admissibilidade do recurso.

77      A conclusão exposta no n.° 75 supra não é posta em causa pelo acórdão Deutsche Post/Comissão, n.° 20 supra, pelo qual o Tribunal Geral anulou a decisão de 2002, após o recurso no presente processo ter sido interposto. Com efeito, neste acórdão, o Tribunal Geral não se pronunciou sobre a questão de saber se o procedimento formal de investigação iniciado em 1999 relativamente às medidas controvertidas tinha sido encerrado.

78      Consequentemente, há que considerar que, no momento da sua adopção, a decisão impugnada não modificou nem o alcance jurídico das medidas controvertidas nem a situação jurídica da recorrente.

79      Importa acrescentar que, segundo jurisprudência consolidada, o acórdão Deutsche Post/Comissão, n.° 20 supra, operou ex tunc, tendo, portanto, por efeito eliminar retroactivamente da ordem jurídica a decisão de 2002 (v., acórdão do Tribunal Geral de 10 de Outubro de 2001, Corus UK/Comissão, T‑171/99, Colect., p. II‑2967, n.° 50, e jurisprudência referida). Por conseguinte, este acórdão não pode, de modo nenhum, afectar a conclusão de que a decisão de 2002 não teve impacto sobre a existência de eventuais efeitos jurídicos autónomos produzidos pela decisão impugnada.

80      Decorre de todas as considerações precedentes que a decisão impugnada não constitui um acto impugnável na acepção do artigo 230.° CE. O recurso deve assim ser julgado inadmissível.

 Quanto às despesas

81      Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, em conformidade com o pedido da Comissão.

82      A UPS suportará as suas próprias despesas em aplicação do artigo 87.°, n.° 4, terceiro parágrafo, do Regulamento de Processo.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção)

decide:

1)      O recurso é julgado inadmissível.

2)      A Deutsche Post AG suportará as suas próprias despesas bem como as despesas efectuadas pela Comissão Europeia.

3)      A UPS Europe NV/SA e a UPS Deutschland Inc. & Co. OHG suportarão as suas próprias despesas.

Truchot

Martins Ribeiro

Kanninen

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 8 de Dezembro de 2011.

Assinaturas


* Língua do processo: alemão.