Language of document : ECLI:EU:T:2004:248

Ordonnance du Tribunal

DESPACHO DO PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
27 de Julho de 2004 (1)

«Contratos públicos de prestação de serviços – Procedimento de concurso comunitário – Processo de medidas provisórias – Pedido de suspensão da execução e de medidas provisórias – Urgência – Inexistência»

No processo T‑148/04 R,

TQ3 Travel Solutions Belgium SA, com sede em Mechelen (Bélgica), representada por R. Ergec e K. Möric, advogados,

requerente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por L. Parpala e E. Manhaeve, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

requerida,

apoiada por

Wagon‑Lits Travel SA, com sede em Bruxelas (Bélgica), representada por F. Herbert e H. Van Peer, advogados, e por D. Harrison, solicitor, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

interveniente,

que tem por objecto um pedido destinado a obter, por um lado, a suspensão da execução das decisões da Comissão de não adjudicar à requerente o lote n.° 1 do contrato objecto do aviso de concurso n.° 2003/S 143‑129409 para prestação de serviços de agência de viagens e de adjudicar esse lote a outra empresa e, por outro lado, que seja ordenado à Comissão que adopte as medidas necessárias para suspender os efeitos da decisão de adjudicação do referido contrato ou do contrato celebrado na sequência desta decisão,

O PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA





profere o presente



Despacho




Factos na origem do litígio e tramitação processual

1
Por contrato‑quadro n.° 98/16/IX.D.1/1, de 13 de Janeiro de 1999, a Comissão adjudicou à sociedade Belgium International Travel a gestão de serviços de agência de viagens destinados aos seus agentes em Bruxelas. Este contrato foi celebrado por um período inicial de dois anos, com a possibilidade de prorrogação por três vezes, por períodos de um ano, ou seja, para o período entre 1 de Abril de 1999 e 31 de Março de 2004. Por aditamento de 27 de Fevereiro de 2001, o referido contrato foi cedido à sociedade TQ3 Travel Solutions Belgium (a seguir «requerente»).

2
Por anúncio de concurso publicado no Suplemento do Jornal Oficial da União Europeia (JO 2003, S 103), a Comissão lançou um concurso limitado, com a referência ADMIN/D1/PR/2003/051, para a prestação de serviços de agência de viagens relativos às deslocações de funcionários e agentes em missão e de quaisquer outras pessoas em viagem por conta ou a pedido de instituições e organismos comunitários.

3
Decorre dos autos que este aviso de concurso foi anulado pela Comissão, na sequência da desistência de algumas instituições comunitárias.

4
Em 29 de Julho de 2003, ao abrigo do Regulamento (CE, Euratom) n.° 2342/2002 da Comissão, de 23 de Dezembro de 2002, que estabelece as normas de execução do Regulamento (CE, Euratom) n.° 1605/2002 do Conselho, que institui o Regulamento Financeiro aplicável ao orçamento geral das Comunidades Europeias (JO L 357, p. 1), a Comissão publicou no Suplemento do Jornal Oficial da União Europeia (JO 2003, S 143), com o número de referência 2003/S 143‑129409, um novo anúncio de concurso limitado para a prestação de serviços de agência de viagens relativos às deslocações de funcionários e agentes em missão e de quaisquer outras pessoas em viagem por conta ou a pedido de certas instituições e organismos comunitários (secção II.1.6 do aviso de concurso). O contrato era constituído por um determinado número de lotes que correspondiam, respectivamente, a um local de execução das prestações, designadamente Bruxelas (lote n.° 1), Luxemburgo (lote n.° 2), Grange (lote n.° 3), Geel (lote n.° 5), Petten (lote n.° 6) e Sevilha (lote n.° 7).

5
Por carta registada de 28 de Novembro de 2003, a requerente apresentou à Comissão uma proposta para os lotes n.os 1, 2, 3, 5, 6 e 7 do referido contrato.

6
Por carta de 24 de Fevereiro de 2004, a Comissão informou a requerente de que a sua proposta para o lote n.° 1 do contrato (a seguir «contrato controvertido») não tinha sido escolhida, uma vez que a relação qualidade/preço da sua proposta era inferior à da proposta seleccionada.

7
Por carta de 8 de Março de 2004, a requerente solicitou que lhe fossem comunicadas informações mais precisas sobre a escolha da proposta seleccionada para o contrato controvertido. Pediu igualmente à Comissão que suspendesse o processo de adjudicação desse contrato e que não celebrasse nenhum contrato com a empresa seleccionada.

8
Por carta de 16 de Março de 2004, a Comissão forneceu informações à requerente sobre os fundamentos da sua decisão de 24 de Fevereiro de 2004 de não lhe adjudicar o contrato controvertido e da sua decisão de o adjudicar a outra empresa (a seguir, respectivamente, «decisão de não‑adjudicação» e «decisão de adjudicação»). A Comissão esclareceu, nomeadamente, que a proposta da requerente tinha obtido 51,55 pontos, ao passo que a proposta seleccionada, da autoria da sociedade Wagon‑Lits Travel (a seguir «WT»), tinha recebido 87,62 pontos após uma análise qualitativa e financeira, e que, por conseguinte, a proposta da WT era a proposta economicamente mais vantajosa e justificava a adjudicação do contrato controvertido a essa empresa. A Comissão também indicou que, embora o preço da proposta da WT fosse claramente inferior ao da proposta da requerente (índice 100, no caso da WT, e índice 165,56, no caso da requerente), «não [tinha] revelado ser anormalmente baixa e que não havia, portanto, necessidade de recorrer ao disposto no artigo 139.° do Regulamento […] n.° 2342/2002».

9
Por fax de 17 de Março de 2004, a Comissão propôs à requerente a prorrogação do contrato‑quadro n.° 98/16/IX.D.1/1 relativo aos serviços de agência de viagens, que terminava em 31 de Março de 2004, até 27 de Junho de 2004, inclusive.

10
Por carta de 19 de Março de 2004, a Comissão justificou o seu pedido de prorrogação do contrato‑quadro supramencionado, precisando que a comunicação das instruções à nova co‑contratante, a saber, a WT, e a entrada em vigor do novo contrato não podiam ter lugar no termo previsto no referido contrato‑quadro.

11
Por fax de 22 de Março de 2004, a requerente informou a Comissão de que não desejava prorrogar o contrato‑quadro e que, por conseguinte, esse contrato terminava em 1 de Abril de 2004.

12
Em 31 de Março de 2004, a Comissão celebrou um contrato com a WT, que tinha como objecto a prestação de serviços de agência de viagens em Bruxelas.

13
Por petição entrada na Secretaria do Tribunal em 26 de Abril de 2004, a requerente interpôs um recurso destinado a obter, por um lado, a anulação da decisão de não‑adjudicação e da decisão de adjudicação e, por outro, a reparação do prejuízo por ela alegadamente sofrido por causa dessas decisões.

14
Por requerimento separado, entrado na Secretaria do Tribunal no mesmo dia, a requerente apresentou o presente pedido de medidas provisórias, destinado a obter:

por um lado, a suspensão da execução da decisão de não‑adjudicação e da decisão de adjudicação;

por outro, que seja ordenado à Comissão que adopte as medidas necessárias para suspender os efeitos da decisão de adjudicação ou do contrato celebrado na sequência dessa decisão.

15
Em 4 de Maio de 2004, a Comissão apresentou as suas observações sobre esse requerimento, considerando que não estava preenchida nenhuma das condições necessárias para a obtenção das medidas provisórias requeridas e que, por conseguinte, o referido requerimento devia ser indeferido.

16
Em 5 de Maio de 2004, o secretário do Tribunal transmitiu à requerente as observações da Comissão e, em 10 de Maio de 2004, convidou a requerente a apresentar as suas observações sobre estas últimas.

17
Em 12 de Maio de 2004, a requerente apresentou um pedido de diligências de instrução ao abrigo do artigo 105.°, n.° 2, e do artigo 65.°, alínea b), do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, bem como dos artigos 24.° e 26.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, para que fosse ordenada à Comissão a apresentação de um certo número de documentos, a saber, o contrato assinado entre a Comissão e a WT, em 31 de Março de 2004, a proposta apresentada pela WT em resposta ao concurso e o relatório do comité de avaliação das propostas (a seguir «documentos em causa»), nos quais, segundo ela, a Comissão se fundamenta nos n.os 46 a 49 das suas observações para concluir pela inexistência de fumus boni juris. A requerente também pediu ao presidente do Tribunal que autorizasse as partes a apresentarem as suas observações com base nos documentos já referidos.

18
Em 17 de Maio de 2004, a requerente apresentou as suas observações sobre as observações da Comissão de 4 de Maio de 2004. A requerente reiterou o seu pedido de medidas provisórias e, além disso, requereu ao presidente do Tribunal que excluísse da discussão as considerações desenvolvidas pela Comissão nos n.os 46 a 49 das suas observações de 4 de Maio de 2004.

19
Em 18 de Maio de 2004, a Comissão apresentou as suas observações sobre o requerimento de diligências de instrução, nas quais considera que esse requerimento deve ser indeferido.

20
Em 24 de Maio de 2004, a Comissão apresentou as suas observações em resposta às observações da requerente de 17 de Maio de 2004. A Comissão reiterou o seu pedido para que o presidente do Tribunal indeferisse o pedido de medidas provisórias e solicitou o indeferimento do requerimento, com fundamento na sua inadmissibilidade manifesta, em que se pedia que fossem excluídos da discussão os n.os 46 a 49 das suas observações de 4 de Maio de 2004.

21
Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal em 9 de Junho de 2004, a WT pediu para ser admitida a intervir no presente processo, em apoio da posição da Comissão. Este pedido de intervenção foi notificado às partes em conformidade com o artigo 116.°, n.° 1, do Regulamento de Processo. As partes não se opuseram a este último pedido.

22
Por despacho do presidente do Tribunal de 28 de Junho de 2004, foi admitida a intervenção da WT no presente processo, em apoio da posição da Comissão. Foi enviada à WT uma cópia de todas as peças processuais.

23
Em 5 de Julho de 2004, a WT apresentou as suas observações sobre o pedido de medidas provisórias. A interveniente adere às observações da Comissão. Pede que o presidente do Tribunal indefira o pedido de medidas provisórias e julgue manifestamente inadmissível o requerimento de diligências de instrução.

24
Em 16 de Julho de 2004, a requerente apresentou as suas observações sobre as observações da WT. Reitera o seu pedido de medidas provisórias e, contestando os argumentos da WT relativos à apresentação dos documentos em causa, reitera igualmente o requerimento de que seja ordenado à Comissão que junte os referidos documentos, que o presidente do Tribunal autorize as partes a apresentarem as suas observações com base nesses documentos e que, na falta destes, exclua da discussão os n.os 46 a 49 das observações de 4 de Maio de 2004. Por sua vez, a Comissão afirmou que não tinha observações a apresentar em relação às observações da interveniente.


Questão de direito

Quanto ao pedido de medidas provisórias

25
Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 242.° CE e 243.° CE, por um lado, e do artigo 225.°, n.° 1, CE, por outro, o Tribunal pode, se considerar que as circunstâncias o exigem, ordenar a suspensão da execução do acto impugnado ou decretar as medidas provisórias necessárias.

26
O artigo 104.°, n.° 2, do Regulamento de Processo dispõe que os pedidos de medidas provisórias devem especificar o objecto do litígio, as razões da urgência, bem como os fundamentos de facto e de direito que, à primeira vista (fumus boni juris), justificam a adopção da medida provisória requerida. Estas condições são cumulativas, de modo que as medidas provisórias devem ser indeferidas se uma delas não estiver preenchida [despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 14 de Outubro de 1996, SCK e FNK/Comissão, C‑268/96 P(R), Colect., p. I‑4971, n.° 30].

27
As medidas pedidas devem, além disso, ser provisórias no sentido de que não prejudiquem as questões de direito ou de facto em litígio nem neutralizem por antecipação as consequências da decisão a proferir posteriormente no processo principal [despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 19 de Julho de 1995, Comissão/Atlantic Container Line e o., C‑149/95 P(R), Colect., p. I‑2165, n.° 22].

28
Acresce que, no âmbito desta análise de conjunto, o juiz das medidas provisórias dispõe de um vasto poder de apreciação e tem a liberdade de determinar, face às especificidades do caso concreto, o modo como essas diferentes condições devem ser verificadas, bem como a ordem dessa análise, uma vez que nenhuma norma de direito comunitário lhe impõe um esquema de análise preestabelecido para apreciar a necessidade de decidir provisoriamente (despacho Comissão/Atlantic Container Line e o., já referido, n.° 23).

29
Face aos elementos constantes dos autos, o juiz das medidas provisórias considera dispor de todos os elementos necessários para decidir o presente pedido de medidas provisórias, sem que seja útil ouvir previamente as alegações das partes.

30
No caso em apreço, importa assim examinar, antes de mais, a condição relativa à urgência.

Argumentos das partes

31
A requerente alega que a condição relativa à urgência está preenchida. Sublinha não poder esperar pelo termo do processo principal sem sofrer um prejuízo grave e irreparável, designadamente a perda de uma importante quota de mercado, um prejuízo financeiro extremamente elevado e um dano particularmente significativo para a sua reputação.

32
A requerente alega que a decisão de adjudicação do contrato controvertido a outro proponente a priva de rendimentos e de uma quota de mercado significativos. O volume de negócios anual subjacente ao contrato controvertido é de 44 900 000 euros, quantia que representa cerca de 20% do volume de negócios anual da requerente no território belga. Com base em diferentes cálculos, a requerente estima que o contrato controvertido representa entre 16,83% e 23,85% do seu volume de negócios anual.

33
Segundo a requerente, a perda dessa quota de mercado e de uma «referência essencial ligada à prestação e à organização de serviços de agência de viagens no seio da Comissão em Bruxelas» conduzirá a uma alteração irremediável da sua posição no mercado, nomeadamente à luz de uma situação económica difícil. A este respeito, a requerente salienta que a quota de mercado em causa é muito importante no sector dos serviços de agência de viagens, que enfrenta um contexto económico particularmente difícil há vários anos, situação que se deteriorará ainda mais após 1 de Janeiro de 2005, data a partir da qual as comissões que eram até essa altura pagas pelas companhias aéreas às agências de viagens serão suprimidas na Bélgica. No seu entender, esta situação conduzirá a uma redução substancial dos rendimentos das agências de viagens.

34
Por último, a requerente considera que as medidas provisórias requeridas são necessárias, dado que a anulação das decisões controvertidas pelo Tribunal no processo principal não será suficiente para eliminar o prejuízo sofrido pela ordem jurídica comunitária e pela requerente, uma vez que o contrato entre a Comissão e a WT terá sido integralmente ou quase integralmente executado antes desta data.

35
A Comissão alega que o prejuízo invocado pela requerente não é grave nem irreparável na acepção da jurisprudência do Tribunal.

36
No que se refere ao prejuízo financeiro alegado, a Comissão considera que, uma vez que a requerente tem a possibilidade de quantificar o seu prejuízo directo, este pode ser reparado mediante o pagamento de uma indemnização por perdas e danos.

37
A Comissão acrescenta que a requerente não demonstra a existência de circunstâncias excepcionais que permitam qualificar o referido prejuízo financeiro de grave e irreparável. A este respeito, a Comissão salienta que a requerente não demonstrou que a perda do mercado em causa põe em perigo a sua existência nem que a sua posição no mercado será alterada de forma irremediável. A requerente não está impedida de recuperar a quota de mercado perdida e as suas actividades fora desse mercado são plenamente suficientes para evitar que a sua própria existência seja posta em perigo.

38
No que se refere aos prejuízos não financeiros invocados pela requerente, a saber, a perda de uma referência essencial e uma ofensa particularmente importante à sua reputação, a Comissão observa que a perda de uma referência essencial não assume qualquer relevância na fase da adjudicação dos contratos e que a perda de um mercado de referência não implica qualquer prejuízo para a reputação, conforme já foi decidido pelo Tribunal na sua jurisprudência.

39
Por último, a Comissão considera que o facto de o contrato celebrado com a WT poder ter sido integralmente executado no momento da prolação do acórdão do Tribunal no processo principal não é um elemento que demonstre que a condição relativa à urgência se encontra preenchida. Em caso de anulação, a Comissão pode restituir os direitos da requerente através de um novo concurso e do pagamento de uma indemnização.

40
A WT adere aos argumentos da Comissão, salientando que a requerente não demonstrou o carácter grave e irreparável dos prejuízos invocados. A WT precisa que a requerente não indicou em que medida uma diminuição do volume de negócios da ordem dos 20% poderá afectar a sua sobrevivência. A WT salienta que a requerente pertence a um grupo internacional, o grupo TUI, um dos principais grupos europeus no sector das viagens, que teve um volume de negócios de 19 215 milhões de euros em 2003 e um lucro de 315 milhões de euros nesse mesmo ano. No que se refere à perda das quotas de mercado, a WT observa que a requerente poderá facilmente recuperá‑las se, no termo do actual contrato ou na sequência de uma eventual anulação, o contrato lhe for adjudicado em novo concurso organizado pela Comissão. Quanto à ofensa à sua reputação, a WT adere aos argumentos da Comissão e acrescenta que, na prática, a perda de um contrato na sequência de um concurso não apresenta carácter prejudicial.

Apreciação do juiz das medidas provisórias

41
Resulta de jurisprudência assente que a natureza urgente de um pedido de medidas provisórias deve ser apreciada em relação à necessidade de decidir provisoriamente, a fim de evitar que se cause um prejuízo grave e irreparável à parte que requer a medida provisória. É a esta última que compete fazer prova de que não pode aguardar o termo do processo principal sem sofrer um prejuízo dessa natureza (v. despacho do presidente do Tribunal de Primeira Instância de 20 de Julho de 2000, Esedra/Comissão, T‑169/00 R, Colect., p. II‑2951, n.° 43, e a jurisprudência aí referida).

42
No caso em apreço, a requerente afirma que o carácter grave e irreparável do prejuízo alegado decorre do facto de, com a perda do contrato controvertido, sofrer um prejuízo consistente na perda de rendimentos e de uma importante quota de mercado (prejuízo de ordem financeira), por um lado, e, perder uma referência essencial e sofrer uma ofensa particularmente importante à sua reputação (prejuízo não financeiro), por outro.

43
No que respeita ao prejuízo de ordem financeira invocado pela requerente, deve observar‑se, conforme foi alegado pela Comissão, que, segundo jurisprudência bem assente, tal prejuízo não pode, em princípio, ser considerado irreparável, ou mesmo dificilmente reparável, quando puder ser objecto de compensação financeira posterior (v. despacho Esedra/Comissão, já referido, n.° 44, e a jurisprudência aí referida).

44
No caso em apreço, como a Comissão salienta acertadamente, a requerente parece ter a possibilidade de quantificar o prejuízo financeiro por ela invocado, uma vez que não só interpôs efectivamente um recurso com base nos artigos 230.° CE e 288.° CE para o Tribunal mas também avaliou o seu dano em 44 900 000 euros.

45
Em consequência, o prejuízo financeiro alegado pela requerente não pode ser considerado irreparável. Com efeito, tal prejuízo constitui uma perda económica susceptível de ser reparada no âmbito dos meios de recurso previstos no Tratado, nomeadamente no artigo 288.° CE (despacho Esedra/Comissão, já referido, n.° 47, e despacho do presidente do Tribunal de Primeira Instância de 1 de Outubro de 1997, Comafrica e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, T‑230/97 R, Colect., p. II‑1589, n.° 38).

46
À luz das considerações expostas, as medidas provisórias requeridas só se justificam, nas circunstâncias do caso vertente, se for claro que, na falta dessas medidas, a requerente se encontraria numa situação susceptível de pôr em perigo a sua própria existência ou de modificar de forma irremediável a sua posição no mercado (v., neste sentido, despacho Esedra/Comissão, já referido, n.° 45).

47
Ora, a requerente não produziu prova de que, na falta das medidas provisórias requeridas, corre o risco de se encontrar numa situação susceptível de pôr em perigo a sua própria existência ou de alterar de forma irremediável as suas quotas de mercado.

48
Há que observar, a este respeito, que a requerente não apresentou nenhum elemento relativo à sua situação financeira, que possa levar o juiz das medidas provisórias a concluir que a sua existência será posta em perigo. Importa, ao invés, considerar que o facto de o contrato controvertido representar apenas 15% a 25% do volume de negócios anual da requerente no território belga demonstra que a requerente tem capacidade para subsistir até que o Tribunal se pronuncie na lide principal. Esta conclusão é reforçada pelo facto de a requerente também exercer a sua actividade fora do território belga, de até lhe terem sido adjudicados outros lotes no concurso em causa e de pertencer a um grupo internacional que exerce actividades importantes e lucrativas. Os argumentos da requerente relativos às dificuldades encontradas pelas agências de viagens em nada modificam esta conclusão. A este respeito, deve observar‑se que, mesmo admitindo que a situação económica das agências de viagens seja difícil e que essa situação económica persista, a requerente não explica como é que a perda do contrato controvertido porá em perigo a sua existência. Em qualquer caso, os prejuízos alegados não serão consequência da decisão de não‑adjudicação, decorrendo antes de factores externos a esta.

49
Quanto à possibilidade de, na falta das medidas provisórias requeridas, a posição da requerente no mercado ser alterada de forma irremediável, deve observar‑se que a requerente não fez prova de que a sua posição será alterada dessa forma.

50
Com efeito, a requerente não demonstrou que obstáculos de natureza estrutural ou jurídica a impedirão de recuperar uma fracção considerável do mercado perdido (v., neste sentido, despacho do presidente do Tribunal de Primeira Instância de 16 de Janeiro de 2004, Arizona Chemical e o./Comissão, T‑369/03 R, ainda não publicado na Colectânea, n.° 84).

51
A requerente não demonstrou, em particular, que será impedida de obter outros contratos, inclusive o contrato controvertido, na sequência de um novo concurso. Os argumentos da requerente baseados na situação económica geral que afecta as agências de viagens não demonstram que a sua posição no mercado em causa será alterada de forma irremediável. A situação económica invocada tem as mesmas consequências para todos os prestadores de serviços de agência de viagens. Nada impede a requerente de recuperar a quota de mercado em causa, visto que terá todas as possibilidades de recuperar esse mercado na sequência de um novo concurso. A este respeito, há que verificar que o facto de a requerente ter perdido uma «referência essencial» não a impede de participar e de ganhar novos concursos. Deve observar‑se que essas referências só constituem um dos critérios, entre muitos outros, tidos em conta para efeitos da selecção qualitativa dos prestadores de serviços (v. artigo 137.° do Regulamento n.° 2342/2002; v., igualmente, neste sentido, despacho Esedra/Comissão, já referido, n.° 49).

52
Por conseguinte, a requerente não produziu prova suficiente que permita ao juiz das medidas provisórias considerar que os prejuízos financeiros invocados são de natureza grave e irreparável.

53
Quanto ao prejuízo de ordem não‑financeira invocado pela requerente, relativamente ao seu argumento de que as medidas provisórias são urgentes em virtude do dano irreparável que seria causado à sua reputação e à sua credibilidade, importa observar que a decisão de não‑adjudicação não tem necessariamente por efeito causar um dano desta natureza. Segundo jurisprudência assente, a participação num concurso público, por natureza altamente competitivo, implica forçosamente riscos para todos os participantes, e a eliminação de um concorrente, em virtude das regras do concurso, não tem, em si mesma, nada que possa causar prejuízo (despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 5 de Agosto de 1983, CMC/Comissão, 118/83 R, Recueil, p. 2583, n.° 5, e despacho Esedra/Comissão, já referido, n.° 48).

54
Como a Comissão e a WT salientam correctamente, o facto de uma empresa não poder renovar um contrato de duração determinada por ocasião de um novo concurso decorre do carácter periódico dos concursos relativos a contratos públicos e não pode constituir para esta empresa uma ofensa à sua credibilidade e à sua reputação.

55
Os argumentos da requerente destinados a demonstrar que a urgência decorre do facto de que a execução integral ou quase integral do contrato celebrado com a WT terá lugar antes da prolação do acórdão que decidir a causa principal também não podem ser acolhidos. Esta situação não constitui uma circunstância que prove a urgência, uma vez que se, por hipótese, o Tribunal vier a dar provimento ao recurso no processo principal, caberá à Comissão tomar as medidas necessárias para assegurar uma protecção adequada dos interesses da requerente (v., neste sentido, despacho Esedra/Comissão, já referido, n.° 51, e despacho do presidente do Tribunal de Primeira Instância de 2 de Maio de 1994, Candiotte/Conselho, T‑108/94 R, Colect., p. II‑249, n.° 27). Como a Comissão salienta, nessa hipótese, essa instituição poderá organizar um novo concurso, no qual a requerente pode participar sem se defrontar com dificuldades particulares. Esta medida poderá ser conjugada com o pagamento de uma indemnização. Ora, a requerente não refere nenhuma circunstância susceptível de impedir que os seus interesses sejam salvaguardados desta forma (v., neste sentido, despacho Esedra/Comissão, já referido, n.° 51).

56
Nestas circunstâncias, há que concluir que os elementos de prova apresentados pela requerente não fazem prova bastante de que, se as medidas provisórias pedidas não forem deferidas, ela sofrerá um prejuízo grave e irreparável.

57
Em consequência, há que negar provimento ao pedido de medidas provisórias, sem necessidade de apreciar se as restantes condições de concessão das medidas provisórias se encontram preenchidas.

Quanto ao requerimento de diligências de instrução e ao requerimento para que sejam excluídos da discussão os n.os 46 a 49 das observações da Comissão de 4 de Maio de 2004

Argumentos das partes

58
No seu requerimento de 12 de Maio de 2004 e nas suas observações de 17 de Maio de 2004 e de 16 de Julho de 2004, a requerente salienta que os documentos em causa desempenham um papel decisivo nas observações da Comissão relativas ao fumus boni juris. A requerente considera que lhe é difícil sustentar o seu pedido se não lhe for permitido tomar conhecimento integral desses documentos. Por conseguinte, a apresentação dos documentos em causa é indispensável, nomeadamente por força do artigo 6.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que submete o processo civil ou penal a uma exigência de equidade. A requerente requer, a título subsidiário, que os n.os 46 a 49 das observações da Comissão de 4 de Maio de 2004 sejam excluídos da discussão.

59
A Comissão, apoiada pela WT, considera que o requerimento de diligências de instrução deve ser indeferido pelo facto de a requerente não ter demonstrado a utilidade da apresentação dos documentos em causa, que, não existindo circunstâncias excepcionais, não é possível conceder acesso a esses documentos internos da Comissão e que a apresentação dos mesmos é contrária à protecção dos interesses comerciais legítimos dos concorrentes. A WT acrescenta que os documentos em causa são susceptíveis de conter segredos do negócio e que a sua comunicação a um concorrente é susceptível de violar as regras de concorrência.

Apreciação do juiz das medidas provisórias

60
Antes de mais, importa observar que o pedido da requerente relativo à apresentação dos documentos em causa e o seu pedido destinado a excluir da discussão os n.os 46 a 49 das observações da Comissão de 4 de Maio de 2004 não constituem um pedido de medidas provisórias relativo às decisões controvertidas, nem podem ser considerados um pedido de diligências de instrução ou de organização do processo.

61
A este respeito, há que recordar que, segundo o artigo 105.°, n.° 2, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, o presidente do Tribunal de Primeira Instância pode ordenar que se proceda a instrução. O artigo 65.° do Regulamento de Processo esclarece que as medidas de instrução compreendem, inter alia, a apresentação de documentos. O artigo 64.° do Regulamento de Processo permite ao Tribunal adoptar medidas de organização do processo que incluem, inter alia, a apresentação de documentos ou de quaisquer outros elementos relativos ao processo.

62
Em seguida, há que referir que os documentos em causa e os n.os 46 a 49 das observações da Comissão de 4 de Maio de 2004 dizem exclusivamente respeito à condição relativa ao fumus boni juris, como a própria requerente salienta no seu pedido de medidas provisórias e nas suas observações de 16 de Julho de 2004.

63
Uma vez que o pedido de medidas provisórias deve ser indeferido devido à inexistência de urgência, sem que seja necessário examinar se as restantes condições de concessão das medidas provisórias se encontram preenchidas, nomeadamente a condição relativa à existência de fumus boni juris, o juiz das medidas provisórias considera que os documentos em causa não apresentam interesse para o exame do presente pedido de medidas provisórias e que, por conseguinte, não há que ordenar as diligências relativas aos documentos em causa requeridas pela requerente.


Pelos fundamentos expostos,

O PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA



decide:

1)
É indeferido o pedido de medidas provisórias.

2)
Reserva‑se para final a decisão quanto às despesas.

Proferido no Luxemburgo, em 27 de Julho de 2004.

O secretário

O presidente

H. Jung

B. Vesterdorf


1
Língua do processo: francês.