Language of document : ECLI:EU:T:2015:388

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

16 de junho de 2015 (*)

«FEOGA – Secção ‘Garantia’ – FEAGA e Feader – Despesas excluídas do financiamento – Deficiências do Sistema de identificação de parcelas agrícolas e do Sistema de informação geográfica (SIP‑SIG), na execução de controlos no local e no cálculo das sanções (exercícios de 2005 a 2007)»

No processo T‑3/11,

República Portuguesa, representada por L. Inez Fernandes, M. Figueiredo e J. Saraiva de Almeida, na qualidade de agentes,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por P. Guerra e Andrade e P. Rossi, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto um pedido de anulação da Decisão 2010/668/UE da Comissão, de 4 de novembro de 2010, que exclui do financiamento da União Europeia determinadas despesas efetuadas pelos Estados‑Membros a título do Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola (FEOGA), secção «Garantia», do Fundo Europeu Agrícola de Garantia (FEAGA), e do Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER) (JO L 288, p. 24), na parte em que aplica correções financeiras à República Portuguesa no montante de 40 690 655,11 euros devido a «[d]eficiências no regime SIP‑SIG [Sistema de identificação das parcelas agrícolas‑Sistema de informação geográfica], na execução de controlos no local e no cálculo de sanções» durante os exercícios de 2005 a 2007,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção),

composto por: H. Kanninen, presidente, I. Pelikánová e E. Buttigieg (relator), juízes,

secretário: T. Bukšek, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 9 de dezembro de 2014,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio e decisão impugnada

1        Entre 23 e 27 de outubro de 2006, os serviços da Comissão das Comunidades Europeias realizaram uma missão de controlo da aplicação, por parte de Portugal, do regime de pagamento único e de outros pagamentos efetuados ao abrigo do título IV do Regulamento (CE) n.° 1782/2003 do Conselho, de 29 de setembro de 2003, que estabelece regras comuns para os regimes de apoio direto no âmbito da política agrícola comum e institui determinados regimes de apoio aos agricultores e altera os Regulamentos (CEE) n.° 2019/93, (CE) n.° 1452/2001, (CE) n.° 1453/2001, (CE) n.° 1454/2001, (CE) n.° 1868/94, (CE) n.° 1251/1999, (CE) n.° 1254/1999, (CE) n.° 1673/2000, (CEE) n.° 2358/71 e (CE) n.° 2529/2001 (JO L 270, p. 1).

2        Na sequência do referido controlo, a Comissão, em aplicação do artigo 11.° do Regulamento (CE) n.° 885/2006 da Comissão, de 21 de junho de 2006, que estabelece as regras de execução do Regulamento (CE) n.° 1290/2005 do Conselho no respeitante à acreditação dos organismos pagadores e de outros organismos e ao apuramento das contas do FEAGA e do Feader (JO L 171, p. 90), comunicou às autoridades portuguesas, por carta registada de 26 de abril de 2007, o resultado da missão de controlo. Resulta, nomeadamente, desta carta que a Comissão considerou que as autoridades portuguesas não respeitaram inteiramente as disposições da regulamentação da União Europeia em matéria de SIP‑SIG (Sistema de identificação das parcelas agrícolas‑Sistema de informação geográfica) e que era necessário adotar medidas corretivas.

3        Por ofício de 28 de junho de 2007, a Administração portuguesa respondeu à carta acima referida de 26 de abril de 2007, indicando que tinham sido introduzidas alterações ao SIP‑SIG sempre que tal se justificara, e explicou o seu desacordo nas outras situações. A Administração portuguesa considerou, em especial, que o SIP‑SIG respeitava o artigo 6.°, n.° 2, do Regulamento (CE) n.° 796/2004 da Comissão, de 21 de abril de 2004, que estabelece regras de execução relativas à condicionalidade, à modulação e ao sistema integrado de gestão e de controlo previstos no Regulamento n.° 1782/2003 (JO L 141, p. 18).

4        Em 16 de outubro de 2007, a Comissão enviou uma carta à República Portuguesa para obter informações complementares respeitantes, nomeadamente, à análise dos riscos, à taxa de execução de controlos no local e ao cálculo das sanções, carta à qual a Administração portuguesa respondeu por ofício de 17 de dezembro de 2007.

5        Por carta de 29 de janeiro de 2008, a Comissão indicou que mantinha as suas acusações e convidou as autoridades portuguesas para uma reunião bilateral, que se realizou em Bruxelas, em 28 de março de 2008, e cujas conclusões, formuladas pela Comissão, foram enviadas às autoridades portuguesas por carta de 22 de maio de 2008. Nesta última, a Comissão manteve o seu ponto de vista de que a regulamentação da União não tinha sido inteiramente respeitada no que se refere, nomeadamente, aos controlos no local, ao cálculo das sanções e ao SIP‑SIG, e solicitou um certo número de informações às autoridades portuguesas.

6        Por ofício de 22 de agosto de 2008, a República Portuguesa pronunciou‑se sobre as diferentes conclusões da Comissão respeitantes, nomeadamente, à análise qualitativa dos riscos, à taxa de execução de controlos no local, ao SIP‑SIG, ao cálculo das sanções e às regras aplicáveis em caso de incumprimento deliberado da regulamentação da União.

7        Por cartas de 10 de abril e 4 de maio de 2009, a Comissão transmitiu à República Portuguesa os motivos de exclusão das despesas. Com efeito, na sequência da reunião bilateral acima referida, a Comissão, tomando em consideração as informações suplementares comunicadas pelas autoridades portuguesas, confirmou a sua posição anteriormente comunicada.

8        É a seguinte a posição da Comissão antes da conciliação, conforme resulta do ponto 2 (intitulado «[C]onsequências financeiras») da sua carta de 4 de maio de 2009:

«Exercício de 2004:

(1)      Em relação às deficiências na administração e gestão dos pagamentos relativos aos frutos de casca rija, que constituem uma inexecução de um controlo‑chave, tendo em conta o nível intensivo de controlos no local, que pode considerar‑se como um fator limitante do risco para este tipo de cultura, justifica‑se uma correção de 2%.

Exercício de 2005:

(1)      Em relação às deficiências no funcionamento do SIP‑SIG, que constituem a inexecução de um controlo‑chave, justifica‑se uma correção de 5% de todas as subvenções ‘superfícies’, tanto no âmbito das medidas do primeiro como do segundo pilar (DR).

(2)      Em relação à aplicação incorreta das disposições relativas às sanções, que representa a inexecução de um controlo ‘ancilar’, justifica‑se uma correção de 2% das despesas destinadas aos agricultores cujos pagamentos foram reduzidos ou rejeitados. O risco correspondente para o fundo será, no entanto, coberto pela correção prevista na alínea 1).

(3)      Em relação à aplicação incorreta das disposições relativas à deteção de incumprimentos deliberados, que representa a inexecução de um controlo ‘ancilar’, justifica‑se uma correção forfetária de 2% das despesas relativas aos agricultores cujos pagamentos foram reduzidos ou rejeitados. O risco correspondente para o fundo será, no entanto, coberto pela correção prevista na alínea 1).

(4)      Em relação às deficiências na administração e gestão dos pagamentos relativos aos frutos de casca rija, que representam a inexecução de um controlo‑chave, justifica‑se, tendo em conta o nível intensivo de controlos no local que pode [ser] considerado um fator limitante do risco para este tipo de cultura, uma correção de 2%. O risco correspondente para o fundo será, no entanto, coberto pela correção prevista na alínea 1).

Exercício de 2006:

(1)      Em relação às deficiências no funcionamento do SIP‑SIG, que representam a inexecução de um controlo‑chave, justifica‑se uma correção de 5%. Esta correção aplicar‑se‑á a todas as subvenções ‘superfícies’, tanto no âmbito das medidas do primeiro como do segundo pilar (DR).

(2)      Em relação às deficiências na análise de risco e [a]o nível insuficiente de controlos no local, que representam a inexecução de um controlo ancilar e de um controlo‑chave, justifica‑se uma correção de 5%. O risco correspondente para o fundo será, no entanto, coberto pela correção prevista na alínea 1).

(3)      Em relação à aplicação incorreta das disposições relativas às sanções, que representa a inexecução de um controlo ‘ancilar’, justifica‑se uma correção de 2% das despesas relativas aos agricultores cujos pagamentos foram reduzidos ou rejeitados. O risco correspondente para o fundo será, no entanto, coberto pela correção prevista na alínea 1).

(4)      Em relação à aplicação incorreta das disposições relativas à deteção de incumprimentos deliberados, que representa a inexecução de um controlo ‘ancilar’, justifica‑se uma correção forfetária de 2% das despesas relativas aos agricultores cujos pagamentos foram reduzidos ou rejeitados. O risco correspondente para o fundo será, no entanto, coberto pela correção prevista na alínea 1).

[…]»

9        Em seguida, a República Portuguesa recorreu ao Órgão de Conciliação ao abrigo do artigo 16.°, n.° 1, do Regulamento n.° 885/2006. No seu pedido, as autoridades portuguesas retomaram as diferentes questões suscitadas pela Comissão. O relatório final do Órgão de Conciliação foi notificado às autoridades portuguesas por carta de 5 de novembro de 2009. O órgão de controlo concluiu, em especial, que não lhe tinha sido possível aproximar os pontos de vista de cada parte e sugeriu à Comissão que reexaminasse a bondade de certas correções financeiras previstas.

10      Em 4 de janeiro de 2010, a Comissão comunicou às autoridades portuguesas a sua posição definitiva.

11      No seu relatório de síntese de 19 de julho de 2010, a Comissão reproduziu os resultados dos controlos efetuados, as acusações da Comissão, bem como as respostas das autoridades portuguesas. O referido relatório contém, nomeadamente, a avaliação das despesas declaradas pelos organismos pagadores da República Portuguesa ao abrigo do Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola (FEOGA), Secção «Garantia», ao abrigo do Fundo Europeu Agrícola de Garantia (FEAGA) ou ao abrigo do Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (Feader) que deviam ser afastadas devido à sua desconformidade com as regras da União.

12      Através da Decisão 2010/668/UE, de 4 de novembro de 2010, que exclui do financiamento da União Europeia determinadas despesas efetuadas pelos Estados‑Membros a título do FEOGA, secção «Garantia», do FEAGA, e do FEADER (JO L 288, p. 24, a seguir «decisão impugnada»), a Comissão afastou do financiamento da União as despesas em causa. No ponto 12.4.5 do relatório de síntese, a posição final da Comissão tem a seguinte redação:

«A DG AGRI [Direção‑Geral da Agricultura e do Desenvolvimento Rural] mantém a sua opinião de que a auditoria indicou claramente que as informações do SIP‑SIG [v. artigo 20.° do Regulamento n.° 1782/2003] não são suficientemente precisas no que respeita à identificação correta e aos limites das parcelas e à respetiva superfície máxima elegível.

Tal sucede porque os agricultores nem sempre notificaram as alterações às parcelas de referência no momento em que apresentaram o respetivo pedido, e, não obstante a informação de que as autoridades portuguesas dispunham (por exemplo, as informações com origem na teledeteção ou nos tradicionais controlos no local), os dados do SIP‑SIG não foram atualizados ou não foram atualizados em tempo útil. Deste modo, os controlos cruzados exigidos pelo artigo 24.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 796/2004, que são considerados um controlo‑chave, são inconclusivos.

No que respeita aos controlos no local e, em especial, às deficiências da análise dos riscos, a DG AGRI sublinha que a sua principal crítica consiste no facto de a análise dos riscos não ser satisfatória no que respeita à sua eficácia para detetar irregularidades, não tendo as autoridades portuguesas garantido um aumento dos controlos no local de forma a observar o previsto no artigo 26.° do Regulamento n.° 796/2004. Tal representa uma deficiência num controlo‑chave.

Além disso, a DG AGRI mantém a sua opinião de que relativamente ao processo através do qual foram realizadas as medições no terreno, estas medições foram ‘alteradas’ através de medições realizadas por ecrã e conduziram a decisões erradas, em especial no que respeita à dedução de elementos característicos que constituem um motivo de inelegibilidade, afetando assim a qualidade dos controlos no local e criando uma desconformidade com o artigo 23.° do Regulamento n.° 796/2004.

No que respeita às sanções, a DG AGRI assinala que, com base nas informações disponíveis, considera que não foram efetuadas interpretações erradas, conforme indicado pelo Órgão de Conciliação.

Seguindo a interpretação efetuada e com base no cálculo realizado em certos casos específicos (abrangidos pelo convite para a reunião bilateral e discutidos no decurso da reunião), concluiu que Portugal não aplicou corretamente o artigo 51.°, o artigo 50.°, n.° 3, e o artigo 49.°, n.° 1, do Regulamento n.° 796/2004.

A respeito do cálculo dos efeitos financeiros, a DG AGRI não aceita que haja uma compensação entre os pagamentos excessivos e os pagamentos em falta, na medida em que a diferença que resulta dos pagamentos em falta não foi paga aos agricultores nem foi imputada ao orçamento da União.

Mais concretamente, mantém‑se a crítica segundo a qual o organismo pagador português não implementou orientações claras para apreciar se uma desconformidade é deliberada [v. artigo 53.° do Regulamento n.° 796/2004].

No que respeita aos subsídios aos frutos de casca rija, Portugal não forneceu em nenhum momento provas satisfatórias suscetíveis de contestarem as críticas formuladas pela DG AGRI a respeito da gestão e do controlo dos pedidos, conduzindo a um risco a respeito dos requisitos de elegibilidade das culturas de frutos de casca rija previstos nos Regulamentos n.° 2237/2004 [Regulamento (CE) n.° 2237/2003 da Comissão, de 23 de dezembro de 2003, que estabelece normas de execução de determinados regimes de apoio previstos no título IV do Regulamento n.° 1782/2003 (JO L 339, p. 52)] e n.° 1973/2004 [Regulamento (CE) n.° 1973/2004 da Comissão, de 29 de outubro de 2004, que estabelece normas de execução do Regulamento n.° 1782/2003 (JO L 345, p. 1)]. Mantém‑se assim a posição da Comissão comunicada na carta que notificou os fundamentos da correção.

Tendo em consideração o que precede, a DG AGRI mantém a sua posição segundo a qual, de acordo com o documento VI/5330/97, as constatações efetuadas representam uma falha dos controlos‑chave e dos controlos ancilares. Considera também que a aplicação de uma correção forfetária é a melhor forma de determinar o risco para o Fundo.

As taxas de correção forfetárias aplicadas são as que foram comunicadas por carta de 4 de maio de 2009 (v. posição da Comissão antes da conciliação).

Contudo, aceita‑se que estas correções, através de uma informação fornecida por Portugal e na sequência de um reexame global do processo, possam ser afinadas no que se refere à população à qual se aplicam.

Resultado total dos montantes a excluir:

Ano do pedido

Montante – EUR

2004

78 008,64

2005

24 176 385,83

2006

16 463 260,64


[…]»

 Tramitação processual e pedidos das partes

13      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 4 de janeiro de 2011, a República Portuguesa interpôs o presente recurso.

14      A República Portuguesa conclui pedindo ao Tribunal que se digne:

–        anular a decisão impugnada na parte em que aplica as correções financeiras que excluem do financiamento da União um montante de 40 690 655,11 euros correspondente a despesas por si declaradas nos exercícios de 2005 a 2007;

–        condenar a Comissão nas despesas.

15      A Comissão conclui pedindo ao Tribunal que se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a República Portuguesa nas despesas.

16      Através de medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do seu Regulamento de Processo, o Tribunal colocou várias questões às partes, a que estas responderam no prazo concedido.

 Questão de direito

17      A República Portuguesa invoca sete fundamentos de recurso.

18      O primeiro fundamento é relativo à violação do artigo 7.°, n.° 4, do Regulamento (CE) n.° 1258/1999 do Conselho, de 17 de maio de 1999, relativo ao financiamento da política agrícola comum (JO L 160, p. 103), por a Comissão ter aplicado uma correção financeira forfetária, que é um método que não se baseia numa estimativa precisa do prejuízo financeiro e que reveste as características de uma sanção. O segundo fundamento é relativo à violação do artigo 24.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 796/2004, por a Comissão ter erradamente considerado que as deficiências imputadas ao SIP‑SIG permitem concluir que a referida disposição não foi respeitada. O terceiro fundamento é relativo à violação dos artigos 26.° e 27.° do Regulamento n.° 796/2004, por a Comissão ter alegado erradamente que a taxa de execução de controlos no local era insuficiente pelo facto de se ter revelado que a eficácia da análise do risco para detetar irregularidades era insuficiente. O quarto fundamento é relativo à violação dos artigos 49.° a 51.° do Regulamento n.° 796/2004, por a Comissão acusar sem razão a República Portuguesa de ter calculado de forma errada o montante das reduções. O quinto fundamento é relativo à violação do artigo 53.° do Regulamento n.° 796/2004, por a Comissão acusar sem razão a República Portuguesa de não ter elaborado diretrizes claras que permitam avaliar a natureza deliberada de uma sobredeclaração. O sexto fundamento é relativo à violação do artigo 21.° do Regulamento (CE) n.° 2237/2003 da Comissão, de 23 de dezembro de 2003, que estabelece normas de execução de determinados regimes de apoio previstos no título IV do Regulamento n.° 1782/2003 (JO L 339, p. 52), para o ano de 2004, e do artigo 13.°, n.° 5, do Regulamento n.° 796/2004, para o ano de 2005, por a Comissão afirmar sem razão que a República Portuguesa não respeitou o controlo da densidade mínima das árvores de frutos de casca rija.

19      Quanto ao sétimo fundamento, respeitante à violação do artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006, por a Comissão ter aplicado correções financeiras que excedem as despesas relativas ao regime de pagamento único, a República Portuguesa indicou na réplica que, na sequência das explicações fornecidas pela Comissão na contestação, renunciava a este fundamento.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 7.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1258/1999

20      A República Portuguesa sublinha que as correções financeiras visadas pelo presente recurso foram objeto de um cálculo forfetário, de acordo com o método previsto no documento VI/5330/97 da Comissão, de 23 de dezembro de 1997, intitulado «Diretrizes para o cálculo das consequências financeiras aquando da preparação da decisão de apuramento das contas do FEOGA‑Garantia» (a seguir «documento VI/5330/97»). Aquelas correções financeiras não correspondem, assim, ao montante exato das despesas que foram efetuadas em violação do direito da União. Tal método de cálculo é contrário ao artigo 7.°, n.° 4, quarto parágrafo, do Regulamento n.° 1258/1999, nos termos do qual o montante das despesas a excluir do financiamento da União deve ser avaliado tendo em conta, nomeadamente, a importância do incumprimento, o tipo e a gravidade da infração, bem como o prejuízo financeiro da União. As despesas deviam ter sido afastadas do financiamento com base numa extrapolação de despesas concretamente determinadas.

21      O método de cálculo forfetário foi, aliás, posto em causa pelo Tribunal de Contas da União Europeia no ponto 66 do seu Relatório Especial n.° 7/2010, intitulado «Auditoria do procedimento de apuramento das contas», segundo o qual o referido método não se baseia numa estimativa precisa do prejuízo financeiro para a União. Conforme foi acertadamente referido no ponto 102 do mesmo relatório, as correções financeiras forfetárias têm a natureza de sanção, cujas consequências não são suportadas pelos beneficiários da ajuda, mas pelo Estado‑Membro, através dos seus contribuintes.

22      A Comissão contesta os argumentos da República Portuguesa.

23      Em conformidade com o artigo 7.°, n.° 4, quarto parágrafo, do Regulamento n.° 1258/1999, aplicável às despesas incorridas até 15 de outubro de 2006, e com o artigo 31.°, n.° 2, do Regulamento (CE) n.° 1290/2005 do Conselho, de 21 de junho de 2005, relativo ao financiamento da política agrícola comum (JO L 209, p. 1), sendo esta última disposição aplicável às despesas incorridas a partir de 16 de outubro de 2006 (v., neste sentido, acórdão de 6 de novembro de 2014, Grécia/Comissão, T‑632/11, EU:T:2014:934, n.° 44), a «Comissão avalia os montantes que devem ser excluídos atendendo, nomeadamente, à importância do incumprimento constatado e toma em consideração o tipo e a gravidade da infração, bem como o prejuízo financeiro causado» à União.

24      Contrariamente à tese que a República Portuguesa defende, a aplicação de uma correção forfetária não equivale à aplicação de uma sanção e não é incompatível com as disposições acima referidas.

25      Há que salientar que, no âmbito do processo de apuramento das contas do FEOGA, a Comissão tem a obrigação de proceder a uma correção financeira se as despesas cujo financiamento foi pedido não tiverem sido efetuadas de acordo com as regras da União. Essa correção financeira destina‑se a evitar que sejam imputados ao FEOGA montantes que não serviram para o financiamento de um objetivo prosseguido pela regulamentação da União em causa, não constituindo, portanto, uma sanção, embora se trate de um montante forfetário (v., neste sentido, a respeito de uma correção financeira forfertária, acórdãos de 11 de janeiro de 2001, Grécia/Comissão, C‑247/98, Colet., EU:C:2001:4, n.° 14, e de 9 de setembro de 2004, Grécia/Comissão, C‑332/01, Colet., EU:C:2004:496, n.° 63).

26      Por outro lado, já foi reiteradamente declarado que, no que respeita ao tipo de correção aplicada, à luz do documento VI/5330/97, quando não seja possível avaliar precisamente os prejuízos sofridos pela União, a Comissão pode ponderar aplicar uma correção forfetária (acórdão de 24 de abril de 2008, Bélgica/Comissão, C‑418/06 P, Colet., EU:C:2008:247, n.° 136). Quanto ao restante, contrariamente às alegações do Governo português, o Tribunal de Contas não contestou a legalidade do método das correções financeiras forfetárias no seu relatório n.° 7/2010, acima referido, conforme resulta, nomeadamente, da nota de pé de página n.° 26, para a qual remete o n.° 66 do referido relatório, e na qual o Tribunal de Contas não deixa de recordar que este método foi «aceite pelo Tribunal de Justiça como sendo conforme às disposições jurídicas subjacentes».

27      Além disso, segundo a jurisprudência, embora caiba à Comissão provar a existência da violação das regras da organização comum dos mercados agrícolas, cabe ao Estado‑Membro demonstrar, sendo caso disso, que a Comissão cometeu um erro quanto às consequências financeiras a retirar dessa violação (acórdão de 21 de março de 2002, Espanha/Comissão, C‑130/99, Colet., EU:C:2002:192, n.° 90).

28      Com efeito, a gestão do financiamento do FEOGA assenta principalmente nas administrações nacionais encarregadas de zelar pela estrita observância das regras da União e tem por base a confiança entre as autoridades nacionais e as autoridades da União. Só o Estado‑Membro está em condições de conhecer e de determinar com precisão os dados necessários à elaboração das contas do FEOGA, não desfrutando a Comissão da proximidade necessária para obter as informações de que precisa junto dos agentes económicos (acórdão de 7 de junho de 2013, Portugal/Comissão, T‑2/11, Colet., EU:T:2013:307, n.° 132).

29      Incumbe, pois, ao Estado‑Membro prestar a prova mais pormenorizada e completa da realidade dos seus controlos ou dos seus números a fim de demonstrar que as dúvidas da Comissão eram infundadas (acórdão Portugal/Comissão, referido no n.° 28 supra, EU:T:2013:307, n.° 133).

30      Ora, em apoio do presente fundamento, a República Portuguesa não apresentou nenhum elemento concreto suscetível de demonstrar que a Comissão tinha cometido um erro quanto às consequências financeiras decorrentes das irregularidades constatadas. Com efeito, o Governo português limita‑se a contestar a legalidade do método de cálculo forfetário enquanto tal e afirma que devia ter sido efetuada uma correção através de uma extrapolação, sem discutir a argumentação defendida pela Comissão, segundo a qual os incumprimentos em causa no presente caso, a saber, nomeadamente, as deficiências do SIP‑SIG e as deficiências dos controlos no local, constituem uma deficiência do sistema de controlo que impedia a Comissão de calcular o montante da correção através de uma simples extrapolação das irregularidades constatadas.

31      No presente caso, visto o Governo português não ter apresentado elementos de prova que tivessem permitido à Comissão determinar o montante da correção financeira em função da avaliação precisa dos prejuízos sofridos pela União e visto a Comissão não poder avaliar de forma precisa os prejuízos sofridos pela União devido a uma deficiência do sistema de controlo, como a que foi alegada pela Comissão, esta podia, em conformidade com a jurisprudência acima referida e nos termos do documento VI/5330/97, ponderar de forma válida proceder a uma correção forfetária.

32      A isto acresce que a República Portuguesa não demonstrou que uma determinação da correção por extrapolação das irregularidades constatadas teria conduzido a que se excluísse do financiamento da União um montante de despesas menos elevado.

33      Atendendo a todas as considerações precedentes, há que julgar improcedente o primeiro fundamento.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do artigo 24.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 796/2004

34      Segundo a República Portuguesa, as inexatidões apontadas ao SIP‑SIG durante o inquérito e a conclusão da Comissão de que os dados do SIP‑SIG nem sempre foram atualizados durante os períodos em causa, a saber, as campanhas de 2005 e de 2006, não permitem, por si só, concluir pela inobservância do artigo 24.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 796/2004.

35      A República Portuguesa alega que a fiabilidade do SIP‑SIG só é verificada através da «regra dos 75%‑90%» enunciada no artigo 6.°, n.° 2, do Regulamento n.° 796/2004, estando o SIP‑SIG em constante mutação. Um SIP‑SIG que, em conformidade com esta disposição, garanta a elegibilidade de pelo menos 90% da superfície individual relativamente a, pelo menos, 75% das parcelas de referência que são objeto de um pedido de ajuda assegura a qualidade da verificação cruzada da elegibilidade das superfícies declaradas, consagrada no artigo 24.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 796/2004. Ora, durante o procedimento de apuramento das contas, as autoridades nacionais fizeram prova de que o SIP‑SIG respeitou a referida regra e, mais, do universo das 34 parcelas verificadas no âmbito da missão de controlo, 82,35% apresentavam uma superfície elegível superior a 90% e 88,5% das parcelas analisadas tinham uma superfície de exclusão inferior a 10% da superfície total da parcela, valor que ascende a 92,35% se for considerada a superfície das parcelas analisadas. No seu ofício de 28 de junho de 2007, as autoridades portuguesas demonstraram claramente que a «regra dos 75%‑90%» tinha sido respeitada. A Comissão aceitou a referida demonstração e não voltou a abordar a questão de um eventual incumprimento desta regra, motivo pelo qual a correção não se baseia numa violação do artigo 6.°, n.° 2, do Regulamento n.° 796/2004, e, consequentemente, a decisão impugnada foi tomada em violação do artigo 24.°, n.° 1, alínea c), do mesmo regulamento.

36      A República Portuguesa acrescenta que o número total de parcelas do SIP‑SIG ascende em Portugal a 4,5 milhões, das quais cerca de 2 milhões constituem parcelas de explorações agrícolas identificadas no âmbito das ajudas para, aproximadamente, 200 000 agricultores. Em 2004, a amostra de agricultores escolhida para efeitos de controlo incidiu sobre 183 420 parcelas, das quais 2015 tinham sido atualizadas por terem sido mal delimitadas.

37      Por último, o exemplo fornecido pela Comissão no seu relatório de síntese, referente à parcela n.° 1432566396001, que inclui uma autoestrada na sua superfície máxima admissível, também não permite, por só si, demonstrar a existência de uma dúvida séria e razoável quanto à fiabilidade do SIP‑SIG e concluir pela existência de controlos não conclusivos ao abrigo do artigo 24.° do Regulamento n.° 796/2004. Seja como for, a Comissão chegou a esta conclusão baseando‑se na hipótese de que a zona foi coberta por teledeteção nos anos de 2004 e 2005, quando, no seu pedido de conciliação, as autoridades nacionais indicaram expressamente que a parcela em causa «não foi controlada por teledeteção nem in loco [no local], em 2004 e 2005», pelo que as autoridades nacionais não podiam saber da existência da autoestrada. A existência dessa autoestrada também não podia ter sido verificada aquando da apresentação do pedido de ajuda, uma vez que os ortofotomapas que instruíram o referido pedido se basearam em imagens de 1995.

38      A Comissão contesta os argumentos da República Portuguesa.

39      Há que recordar, a título preliminar, que o FEOGA só financia as intervenções efetuadas em conformidade com as disposições da União no âmbito da organização comum dos mercados agrícolas (v. acórdão de 24 de fevereiro de 2005, Grécia/Comissão, C‑300/02, Colet., EU:C:2005:103, n.° 32 e jurisprudência referida).

40      Segundo jurisprudência constante, cabe à Comissão provar a existência de uma violação das regras da organização comum dos mercados agrícolas. Por conseguinte, a Comissão está obrigada a justificar a sua decisão que constata a inexistência ou as deficiências dos controlos efetuados pelo Estado‑Membro em causa. No entanto, a Comissão não está obrigada a demonstrar de forma exaustiva a insuficiência dos controlos efetuados pelas administrações nacionais ou a irregularidade dos números transmitidos por estas, mas sim a apresentar um elemento de prova da dúvida séria e razoável que tem relativamente a esses controlos ou a esses números. O Estado‑Membro em causa, por seu turno, não pode pôr em causa as constatações da Comissão sem basear as suas próprias alegações em elementos que provem a existência de um sistema de controlo fiável e operacional. Quando não consiga demonstrar que as constatações da Comissão são incorretas, estas constituem elementos que podem dar origem a dúvidas sérias no que respeita à implementação de um conjunto adequado e eficaz de medidas de fiscalização e de controlo. Esta diminuição da exigência da prova de que a Comissão beneficia explica‑se pelo facto de que é o Estado‑Membro quem está melhor colocado para recolher e verificar os dados necessários ao apuramento das contas do FEOGA, e a quem incumbe, por conseguinte, apresentar uma prova que seja o mais detalhada e completa da realidade dos seus controlos ou dos seus números e, se for caso disso, da inexatidão das afirmações da Comissão (acórdãos Grécia/Comissão, referido no n.° 25 supra, EU:C:2001:4, n.os 7 a 9, e de 6 de novembro de 2014, Países Baixos/Comissão, C‑610/13 P, EU:C:2014:2349, n.° 58).

41      Em conformidade com o disposto no artigo 24.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 796/2004, os controlos administrativos previstos no artigo 23.° do Regulamento n.° 1782/2003 devem permitir a deteção de irregularidades, nomeadamente a deteção automática através de meios informáticos, incluindo controlos cruzados das parcelas agrícolas declaradas no pedido único e das parcelas de referência constantes do SIP‑SIG, para verificar se as superfícies, enquanto tais, são elegíveis para a ajuda.

42      Com o presente fundamento, a República Portuguesa alega, contrariamente à tese defendida pela Comissão, que o artigo 24.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 796/2004 não foi violado no presente caso devido às inexatidões do SIP‑SIG que lhe são imputadas pela Comissão quanto à identificação das parcelas, dos seus limites e da superfície admissível, bem como à atualização tardia dos dados no que respeita às campanha de 2005 e 2006, e cuja procedência esse Estado‑Membro não põe em causa, nem sequer discute na petição inicial ou na réplica. De acordo com a tese defendida pelo mesmo Estado‑Membro, o SIP‑SIG, que, nos termos do artigo 6.°, n.° 2, do Regulamento n.° 796/2004, garante a elegibilidade de, pelo menos, 90% da superfície relativamente a, pelo menos, 75% das parcelas de referência que são objeto de pedidos de ajuda, assegura a qualidade da verificação cruzada da elegibilidade das superfícies declaradas nos termos do artigo 24.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 796/2004. Um SIP‑SIG que garanta o cumprimento da referida regra assegura a qualidade mínima indispensável à verificação cruzada da elegibilidade das parcelas de referência com as superfícies declaradas no pedido único para efeitos desta disposição.

43      A este respeito, há que recordar, desde já, a importância que reveste a implementação do SIP‑SIG. Com efeito, a identificação das parcelas agrícolas constitui um elemento‑chave da aplicação correta de um regime ligado à superfície. A inexistência de um sistema fiável de identificação das parcelas implica, em si mesmo, um risco elevado de prejuízo para o orçamento da União. Uma aplicação incompleta do SIP‑SIG justifica, por si só, a aplicação de uma correção forfetária de 5% (v., neste sentido, acórdão de 31 de março de 2011, Grécia/Comissão, T‑214/07, EU:T:2011:130, n.° 94 e jurisprudência referida).

44      O artigo 20.° do Regulamento n.° 1782/2003 dispõe que o SIP‑SIG é instituído com base em mapas e documentos cadastrais ou outras referências cartográficas. As técnicas utilizadas apoiam‑se num sistema de informação geográfica informatizado que inclui, de preferência, uma cobertura por ortoimagens aéreas ou espaciais, com um padrão homogéneo que garanta um rigor, pelo menos, equivalente ao da cartografia à escala de 1:10 000. Todas as parcelas agrícolas devem ser identificadas de acordo com este sistema (v., neste sentido, acórdão Grécia/Comissão, referido no n.° 43 supra, EU:T:2011:130, n.° 54).

45      Como o Tribunal de Justiça salientou (acórdão de 10 de abril de 2014, Maatschap T. van Oosterom en A. van Oosterom‑Boelhouwer, C‑485/12, Colet., EU:C:2014:250, n.° 57), o SIP‑SIG permite identificar todas as parcelas declaradas por um agricultor e situá‑las geograficamente a fim, nomeadamente, de permitir à autoridade competente verificar o preenchimento dos requisitos de elegibilidade para a ajuda das referidas parcelas. Por conseguinte, para que os controlos automáticos possam ser efetuados com base nesse sistema, é indispensável que os dados relativos às parcelas em causa sejam exatos.

46      Deste modo, a fiabilidade do SIP‑SIG é essencial para que seja garantida, nomeadamente, a fiabilidade dos controlos administrativos cruzados exigidos pelo artigo 24.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 796/2004, ao passo que os referidos controlos administrativos cruzados são indispensáveis para garantir a eficácia dos sistemas de gestão e de controlo (acórdão de 17 de maio de 2013, Bulgária/Comissão, T‑335/11, EU:T:2013:262, n.os 29 e 135).

47      Ora, como a Comissão alegou, com razão, as inexatidões do SIP‑SIG quanto à identificação das parcelas, aos seus limites e à sua superfície admissível, bem como a atualização tardia do SIP‑SIG, que aquela mencionou logo na primeira comunicação dirigida à República Portuguesa por carta de 26 de abril de 2007, referidas no relatório de síntese e que não foram refutadas pela República Portuguesa na petição inicial nem na réplica, constituem omissões que podem prejudicar seriamente a fiabilidade do SIP‑SIG (v., neste sentido, acórdão de 12 de setembro de 2012, Grécia/Comissão, T‑356/08, EU:T:2012:418, n.° 101).

48      Contrariamente ao que foi afirmado na audiência pela República Portuguesa, que de resto não invocou uma violação do artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006 por a primeira comunicação de 26 de abril de 2007 não ter sido suficientemente explícita a respeito do incumprimento imputado (v., por analogia, acórdão Portugal/Comissão, referido no n.° 28 supra, EU:T:2013:307, n.os 46 e seguintes), a Comissão enumerou, efetivamente, no ponto 1.2 da referida comunicação um certo número de casos concretos dos quais resultava que a fiabilidade do SIP‑SIG não estava assegurada.

49      A isto acresce, como a Comissão observou, acertadamente, em resposta à afirmação da República Portuguesa, na réplica, segundo a qual mais de metade das parcelas «de referência» não eram parcelas de «exploração agrícola», embora estivessem todas registadas no SIP‑SIG, que esse Estado‑Membro sobrepõe dois conceitos distintos, em vez de basear a identificação das parcelas agrícolas no sistema de identificação das parcelas de referência para evitar riscos de confusão entre estes dois conceitos.

50      Assim, não pode proceder a única tese defendida pela República Portuguesa em apoio do presente fundamento, segundo a qual o artigo 24.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 796/2004 não foi violado, uma vez que a regra enunciada no artigo 6.°, n.° 2, do Regulamento n.° 796/2004 foi respeitada.

51      Com efeito, de acordo com o artigo 6.°, n.° 2, do Regulamento n.° 796/2004, os Estados‑Membros garantirão a elegibilidade, nos termos do regime de pagamento único, de, pelo menos, 90% da superfície relativamente a, pelo menos, 75% das parcelas de referência que são objeto de pedidos de ajuda. A avaliação será feita anualmente, utilizando métodos estatísticos adequados. Como a Comissão salientou a este respeito, a obrigação de os Estados‑Membros garantirem a elegibilidade incide sobre 75% do total das parcelas de referência objeto de um pedido de ajuda. Ora, quando a identificação das parcelas de referência não seja fiável devido a inexatidões, à não atualização ou à atualização tardia do SIP‑SIG, alegadas pela Comissão durante o inquérito, a fiabilidade da identificação das parcelas agrícolas, enunciada no artigo 6.°, n.° 1, segundo paragrafo, do Regulamento n.° 796/2004, não está garantida e o cálculo está viciado.

52      Nestas condições, deve ser rejeitada a argumentação defendida pela República Portuguesa em apoio do presente fundamento, segundo a qual, não obstante as inexatidões, a não atualização ou a atualização tardia do SIP‑SIG, constatadas pela Comissão durante o inquérito, as autoridades portuguesas respeitaram a regra enunciada no artigo 6.°, n.° 2, do Regulamento n.° 796/2004 e, por conseguinte, o artigo 24.°, n.° 1, alínea c), do mesmo regulamento, visto que, das 34 parcelas verificadas no âmbito da missão de controlo, 28 parcelas, ou seja, 82,35%, apresentavam uma superfície admissível superior a 90%.

53      Tanto assim é que foi declarado que o artigo 6.°, n.° 2, do Regulamento n.° 796/2004 enuncia um dos requisitos gerais que o sistema integrado de gestão e de controlo das despesas imputadas ao orçamento da União, mais concretamente ao SIP‑SIG, deve preencher. Este requisito aplica‑se sem prejuízo das outras exigências que incidem sobre o sistema integrado de gestão e de controlo, entre as quais a respeitante à precisão e à fiabilidade do SIP‑SIG, o que pode conduzir a que a Comissão, nos casos em que considere que a falta de precisão e de fiabilidade do SIP‑SIG pode dar origem a um risco para o fundo em questão, ponha em causa a assunção de despesas pelo fundo mesmo que esteja preenchido o requisito previsto no artigo 6.°, n.° 2, do Regulamento n.° 796/2004 (acórdãos de 16 de outubro de 2014, Polónia/Comissão, C‑273/13 P, EU:C:2014:2295, n.° 77, e de 27 de fevereiro de 2013, Polónia/Comissão, T‑241/10, EU:T:2013:96, n.° 57).

54      É certo que a República Portuguesa acrescenta que a parcela de referência n.° 1432566396001, exemplo citado no relatório de síntese e que inclui uma autoestrada na sua superfície máxima admissível, também não permite concluir que existe uma violação do artigo 24.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 794/2004.

55      No entanto, mesmo admitindo que, como a República Portuguesa afirma, as autoridades portuguesas possam ter ignorado a existência da autoestrada em causa por se terem baseado em imagens de 1995 para instruir o pedido de ajuda em causa e devido à falta de controlos no local ou por teledeteção nos anos de 2004 e 2005, esta circunstância não pode, seja como for, afetar, por si só, a conclusão precedente, relativa às inexatidões e à não atualização ou à atualização tardia do SIP‑SIG em Portugal, que foram assinaladas pela Comissão durante o inquérito. Quanto ao restante, com esta argumentação, a República Portuguesa reconhece que as autoridades competentes não dispuseram de dados recentes para verificar de forma eficaz o preenchimento dos requisitos de concessão das ajudas (v., neste sentido, acórdão Maatschap T. van Oosterom en A. van Oosterom‑Boelhouwer, referido no n.° 45 supra, EU:C:2014:250, n.° 58).

56      Embora o presente fundamento tenha unicamente por objeto a violação do artigo 24.°, n.° 1, do Regulamento n.° 796/2004, há que salientar, em resposta à acusação da República Portuguesa segundo a qual a aplicação de uma correção forfetária de 5% é, de qualquer modo, desproporcionada, que a inexistência de um sistema fiável de identificação das parcelas implica, em si mesma, um risco elevado de prejuízo para o orçamento da União, que pode, por si só, justificar a aplicação de uma correção forfetária de 5% (v., neste sentido, acórdão Grécia/Comissão, referido no n.° 43 supra, EU:T:2011:130, n.° 94).

57      Atendendo às considerações precedentes, não é necessário examinar a questão de saber, nomeadamente, se e em que medida o processo de atualização do SIP‑SIG pode assentar nas informações fornecidas pelos próprios agricultores, nem discutir previamente as deficiências do SIP‑SIG que foram invocadas pela Comissão em apoio da decisão impugnada e que a República Portuguesa contesta no âmbito do presente recurso pela primeira vez, de forma vaga e sem a sustentar em elementos de prova concretos, em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal relativamente ao âmbito do artigo 6.°, n.° 2, do Regulamento n.° 796/2004. Há assim que concluir que, na medida em que o referido Estado‑Membro não provou que, contrariamente às conclusões da Comissão, as informações do SIP‑SIG eram suficientemente precisas e exatas no que respeita à identificação e aos limites das parcelas, bem como à sua superfície admissível, a República Portuguesa não logrou eliminar as dúvidas existentes a respeito da natureza conclusiva dos controlos cruzados exigidos pelo artigo 24.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 796/2004 e que são considerados um controlo‑chave.

58      Por conseguinte, há que julgar improcedente o segundo fundamento.

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação dos artigos 26.° e 27.° do Regulamento n.° 796/2004 no que respeita aos controlos no local

59      Quanto à crítica da Comissão relativa a falhas na análise dos riscos ao abrigo do artigo 27.° do Regulamento n.° 796/2004, a República Portuguesa observa que reconheceu durante o inquérito que, relativamente à campanha de 2006, a taxa de irregularidades constatadas na amostra de controlo selecionada para uma análise de risco (a seguir «amostra assente no risco») era inferior à que foi constatada na amostra selecionada de forma aleatória (a seguir «amostra aleatória»). Com efeito, durante a referida campanha, as circunstâncias resultantes da integração de novas superfícies, a junção de novos setores e a heterogeneidade regional dificultaram a avaliação dos parâmetros e, consequentemente, a sua reformulação e implementação.

60      No entanto, a República Portuguesa considera que respeitou o artigo 27.° do Regulamento n.° 796/2004, uma vez que selecionou uma amostra assente no risco e que, relativamente à campanha de 2006, avaliou logicamente a eficácia dos parâmetros de análise dos riscos utilizados durante a campanha de 2005, e isto no início da campanha de 2006. A Comissão deveria ter apontado as razões pelas quais a amostra não foi corretamente avaliada no início da campanha de 2006, para fazer prova de uma dúvida séria e razoável a respeito desta avaliação.

61      De resto, um incumprimento do artigo 27.° do Regulamento n.° 796/2004 como aquele que foi alegado diz respeito a um controlo ancilar e, portanto, não pode justificar uma correção de 5%, sob pena de violar o princípio da igualdade. Seja como for, a Comissão parece ter baseado a correção financeira na violação do artigo 26.° daquele regulamento e não no artigo 27.° do mesmo.

62      No que respeita ao artigo 26.°, n.° 3, do Regulamento n.° 796/2004, contrariamente ao que a Comissão sustenta, este não obriga os Estados‑Membros a aumentarem a taxa de controlos no local quando a análise dos riscos não se revelar satisfatória ou no caso de a taxa de irregularidades da amostra assente no risco ser inferior à da amostra aleatória. Os Estados‑Membros gozam de um poder discricionário relativamente ao que, em cada caso concreto, se deve entender por «irregularidades significativas» constatadas aquando dos controlos no local, dentro dos limites de certos parâmetros razoáveis que permitem guardar no espírito que os controlos devem ser eficazes, como exigido pelo artigo 23.° do Regulamento n.° 796/2004.

63      Quanto ao artigo 26.°, n.° 4, do Regulamento n.° 796/2004, nos termos do qual os Estados‑Membros devem alargar a dimensão e o âmbito da amostra no caso de «os controlos realizados relativamente a essa amostra revelarem a existência de irregularidades», a República Portuguesa observa que a amostra assente no risco revelou taxas de erro reduzidas em comparação com a amostra aleatória, pelo que não havia razões para aumentar especificamente a amostra assente no risco.

64      Acresce que, num ofício de 11 de junho de 1999, a República Portuguesa manifestou o seu desacordo em relação à metodologia de trabalho sugerida pela Comissão. Não tendo havido reação por parte dessa instituição, a República Portuguesa tomou por certo que aquela tinha aceitado o seu ponto de vista.

65      Na verdade, relativamente à campanha de 2006, a taxa de controlo para efeitos do regime de pagamento único foi de 5,44% (correspondente a 10 484 pedidos, para uma superfície declarada de 419 328,81 hectares – 15,35% da superfície admissível). Deste modo, as autoridades nacionais privilegiaram a superfície elegível, na medida em que essa era a melhor forma de reduzir o risco para o fundo em causa, atendendo a que os pagamentos são feitos em função da superfície.

66      Segundo a República Portuguesa, a taxa de irregularidades que melhor traduz a realidade do terreno é a da amostra aleatória, que, em Portugal, corresponde a 60% da amostra total. Nesta amostra, o nível global de sobredeclaração (2,51%) não é significativo. Por conseguinte, o aumento decidido pelas autoridades portuguesas, traduzido no controlo de mais de 15% da superfície elegível para o regime de pagamento único, era apto para proteger o fundo em causa. Atendendo a que o artigo 26.°, n.° 3, do Regulamento n.° 796/2004 não impõe um aumento da percentagem de agricultores controlados ao longo do ano, mas apenas um aumento dos controlos, que foi executado, não existe uma falha significativa na aplicação das regras explícitas que exponha o fundo em causa a um risco efetivo.

67      Além disso, a República Portuguesa sustenta que, ao invocar, por outro lado, que o facto de a taxa de irregularidades relativa ao arroz e aos frutos de casca rija ter sido significativa (respetivamente, 56% e 66%), a Comissão não tomou em consideração que, relativamente ao arroz, 2006 foi o primeiro ano em que as estruturas fixas necessárias a esta cultura foram consideradas inelegíveis, o que necessariamente se traduziu num aumento do número de agricultores com sobredeclaração. Quanto aos frutos de casca rija, as autoridades nacionais portuguesas informaram a Comissão de que as constantes alterações na legislação criaram grandes dificuldades em matéria de controlos. Contudo, para os frutos de casca rija, uma superfície controlada durante a campanha de 2005 equivalente a 34% da superfície afetada aos frutos de casca rija, que chegou a 100% em alguns casos, dá cabal cumprimento ao artigo 26.°, n.° 3, do Regulamento n.° 796/2004 e é perfeitamente apta para proteger o fundo em causa.

68      Por último, na medida em que alega que a disposição que justifica a correção é, afinal, o artigo 23.° do Regulamento n.° 796/2004, a Comissão invoca um fundamento novo na sua contestação, que esvazia da sua substância a garantia processual prevista no artigo 8.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 1663/95 da Comissão, de 7 de julho de 1995, que estabelece as regras de execução do Regulamento (CEE) n.° 729/70 no que respeita ao processo de apuramento das contas do FEOGA, secção «Garantia» (JO L 158, p. 6).

69      A Comissão contesta os argumentos da República Portuguesa.

70      Em conformidade com o artigo 23.°, n.° 1, do Regulamento n.° 796/2004, que figura no título III, relativo aos «[c]ontrolos» e cujo objeto é enunciar princípios gerais nesta matéria, os controlos no local e os controlos administrativos previstos no referido regulamento devem ser efetuados de modo a assegurar a verificação eficaz do cumprimento dos requisitos de concessão das ajudas e dos requisitos e normas aplicáveis no âmbito da condicionalidade.

71      Nos termos do artigo 26.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.° 796/2004, incluído no mesmo título III e que figura no capítulo intitulado «Controlos relativos aos critérios de elegibilidade», secção II, consagrada aos «controlos in loco», o número total de controlos no local abrangerá, anualmente, pelo menos 5% dos agricultores que apresentem um pedido único. O n.° 3 da mesma disposição prevê que, se os controlos no local revelarem a existência de irregularidades significativas no contexto de um dado regime de ajudas ou numa região ou parte de região, as autoridades competentes aumentarão em conformidade o número de controlos no local durante o ano em curso e a percentagem de agricultores a controlar no local no ano seguinte. O n.° 4 do mesmo artigo acrescenta que, sempre que esteja previsto que determinados elementos de um controlo no local podem ser realizados com base numa amostra, esta última, cujos critérios de seleção serão estabelecidos pelos Estados‑Membros, deve garantir um nível fiável e representativo de controlo. Se os controlos realizados relativamente a essa amostra revelarem a existência de irregularidades, a dimensão e o âmbito da amostra serão alargados em conformidade.

72      Conforme enunciado no considerando 32 do Regulamento n.° 796/2004, a «amostra correspondente à taxa mínima de controlos in loco [no local] deve ser definida, em parte, com base numa análise de risco e, em parte, aleatoriamente».

73      Da mesma forma, o artigo 27.°, n.° 1, do Regulamento n.° 796/2004, que tem por objeto a «[s]eleção da amostra de controlo», enuncia que os agricultores submetidos a controlos no local serão selecionados pela autoridade competente com base numa análise dos riscos e num elemento de representatividade dos pedidos de ajudas apresentados. A eficácia dos parâmetros da análise dos riscos utilizados em anos anteriores deve ser avaliada anualmente. Para garantir esse elemento de representatividade do controlo, os Estados‑Membros selecionarão aleatoriamente entre 20% e 25% do número mínimo de agricultores a submeter a controlos no local conforme previsto no artigo 26.°, n.° 1, do mesmo regulamento. O artigo 27.°, n.° 2, do referido regulamento enuncia um certo número de parâmetros que os Estados‑Membros têm de ter em conta para efeitos da análise dos riscos.

74      No presente caso, é facto assente entre as partes que, relativamente à campanha abrangida pela correção contestada no âmbito do presente fundamento, a saber, a campanha de 2006, a amostra baseada numa análise dos riscos revelou uma percentagem de erro inferior àquela que foi constatada na amostra selecionada de forma aleatória. Deste modo, a superfície não encontrada na amostra selecionada por uma análise dos riscos correspondia a 1,49% da superfície controlada, ao passo que na amostra selecionada de forma aleatória a superfície não encontrada correspondia a 2,51% da superfície controlada. No que respeita às ajudas para o trigo duro e para o arroz, este mesmo relatório refere, respetivamente, 1,96% contra 2,36% e 3,73% contra 4,08%.

75      A Comissão pôde deduzir validamente desta situação que a avaliação anual dos fatores de risco efetuada pelas autoridades portuguesas, nos termos do artigo 27.° do Regulamento n.° 796/2004, no início da campanha de 2006 incidia nos riscos de forma insuficiente e que, por conseguinte, o nível da referida avaliação não permitia proteger de forma suficiente os interesses do fundo em causa. Com efeito, a taxa de irregularidades detetada na amostra aleatória que, nos termos do artigo 27.°, n.° 1, do Regulamento n.° 796/2004, é selecionada de acordo com um critério de representatividade dos pedidos de ajuda apresentados não deve, manifestamente, ser superior à taxa de irregularidades constatada numa amostra baseada numa análise dos riscos, a qual deve, precisamente, reduzir a natureza aleatória da amostra e permitir cobrir um maior número de casos de irregularidades.

76      A conclusão segundo a qual a análise dos riscos era insuficiente na amostra selecionada por tal análise justifica‑se ainda mais quando o artigo 23.° do Regulamento n.° 796/2004 enuncia que os controlos no local serão efetuados de modo a assegurar a verificação eficaz do cumprimento dos requisitos de concessão das ajudas e dos requisitos e normas aplicáveis no âmbito da condicionalidade, pelo que, como a Comissão salientou, não basta que a Administração portuguesa selecione a amostra de controlo com base numa análise dos riscos, sendo ainda necessário que a seleção seja eficaz. Ao invés do que a República Portuguesa sustenta, a referida acusação, relativa à insuficiência da análise dos riscos, resulta simultaneamente do relatório de síntese e das anteriores comunicações entre a Comissão e a Administração portuguesa e não pode assim ser qualificada de nova.

77      Por outro lado, as considerações vagas e genéricas, como a integração de novas superfícies ou a heterogeneidade regional, que foram apresentadas pela República Portuguesa para explicar a diferença entre os erros detetados na amostra assente no risco e os constatados na amostra aleatória não podem justificar uma violação do artigo 27.° do Regulamento n.° 796/2004. Seja como for, um Estado‑Membro não pode invocar disposições, práticas ou situações da sua ordem interna para justificar o incumprimento das obrigações que resultam do direito da União (acórdão Bulgária/Comissão, referido no n.° 46 supra, EU:T:2013:262, n.° 58).

78      A argumentação da República Portuguesa segundo a qual a avaliação da análise dos riscos, nomeadamente a constatação de que a taxa de irregularidades detetada na amostra assente no risco é inferior à constatada na amostra aleatória, só é efetuada no final da campanha em questão, ao passo que a amostra assente no risco é selecionada no início da campanha, não procede e não pode infirmar a conclusão de que a análise dos riscos se revelou ser insuficiente.

79      Com efeito, por um lado, o artigo 27.°, n.° 2, do Regulamento n.° 796/2004 enuncia os fatores que a autoridade competente tem de tomar em consideração na análise dos riscos, ao passo que o n.° 1 desta disposição prevê, a este respeito, a utilização dos parâmetros da análise dos riscos utilizados em anos anteriores, de modo que a Administração nacional dispõe, para efeitos da referida análise, dos parâmetros dos anos anteriores. Por outro lado, a análise dos riscos assenta em operações de previsão estatística, baseando‑se esta última, no essencial, em técnicas de extrapolação e de correlação retardada.

80      Quanto à acusação da Comissão segundo a qual o aumento do número de controlos no local nos termos do artigo 26.° do Regulamento n.° 796/2004 não foi suficiente atendendo às irregularidades constatadas, há que referir que é facto assente entre as partes que, para a campanha de 2006, a percentagem das superfícies sobredeclaradas oscilou entre 3% e 20% relativamente a 20,66% dos agricultores submetidos a um controlo no local e foi superior a 20% no que respeita a 6,11% dos agricultores sujeitos a um controlo no local. Quanto ao arroz e aos frutos de casca rija, as taxas de sobredeclaração ascenderam, respetivamente, a 56% e a 66% dos pedidos de ajuda.

81      Nestas condições, perante uma taxa global de sobredeclaração de 2,51% das superfícies controladas, quando a amostra aleatória, única tomada em consideração pela Comissão atendendo às deficiências da análise dos riscos alegada por esta, representa apenas 20% a 25% do número mínimo dos agricultores que devia ser submetido a um controlo no local, e, por conseguinte, não assenta sequer numa análise dos riscos, a Comissão concluiu validamente que um número total de controlos no local de 5,44% dos agricultores não era conforme com o artigo 26.° do Regulamento n.° 796/2004, como essa instituição já havia assinalado na sua carta de 16 de outubro de 2007, acima referida, contrariamente ao que o Governo português alega.

82      Com efeito, nos termos do artigo 26.°, n.° 3, do Regulamento n.° 796/2004, se os controlos no local revelarem a existência de irregularidades significativas, a autoridade competente aumenta «em conformidade» o número de controlos no local durante o ano em curso (v., neste sentido, acórdão Bulgária/Comissão, referido no n.° 46 supra, EU:T:2013:262, n.os 69, 72, 77 e 139). Ora, perante irregularidades tão consideráveis e atendendo a que a taxa mínima obrigatória de controlos no local foi fixada, nos termos do artigo 26.°, n.° 1, do Regulamento n.° 796/2004, em 5% para o regime de pagamento único, uma taxa de controlos no local equivalente a 5,44% do número total de requerentes não constitui, manifestamente, um aumento suficiente do número desses controlos durante o ano em curso, conforme exigido pelo artigo 26.°, n.° 3, do mesmo regulamento. A circunstância de, como a República Portuguesa alega, para certas culturas, a taxa de controlo ser significativamente mais elevada não altera esta conclusão (v., neste sentido, acórdão Portugal/Comissão, referido no n.° 28 supra, EU:T:2013:307, n.° 110).

83      Contrariamente à tese defendida pela República Portuguesa, a circunstância de, relativamente à campanha de 2006, 15,35% da superfície objeto de pedidos de ajuda ao abrigo do regime de pagamento único ter sido submetida a controlos no local, ainda que a amostra assente no risco se referisse apenas a 5,44% dos agricultores que apresentaram um pedido de ajuda, não permite que se chegue a uma conclusão diferente. Como a Comissão referiu com razão, daqui é possível deduzir que as autoridades portuguesas privilegiaram as grandes explorações, embora estas apresentassem uma taxa de erro inferior à das pequenas explorações e, por conseguinte, que as referidas autoridades privilegiaram a superfície controlada sem tomar em consideração o número de pedidos e sem tomar corretamente em consideração o critério assente numa análise dos riscos.

84      Na medida em que a República Portuguesa se refere, neste contexto, ao seu ofício de 11 de junho de 1999, no qual manifestou a sua oposição à metodologia adotada pela Comissão, sem que esta tenha reagido ao referido ofício, basta indicar que, conforme a Comissão observou em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal, o quadro legal aplicável em 1999, a saber, em especial, o Regulamento (CEE) n.° 3508/92 do Conselho, de 27 de novembro de 1992, que estabelece um sistema integrado de gestão e de controlo relativo a determinados regimes de ajudas comunitários (JO L 355, p. 1), foi entretanto profundamente alterado, conforme atestam, nomeadamente, os artigos 25.° e seguintes do Regulamento n.° 796/2004, pelo que não se pode retirar nenhuma consequência para o presente processo do comportamento pretensamente adotado pela Comissão em 1999 à luz de uma regulamentação anteriormente aplicável.

85      Por último, no que respeita à aplicação de uma correção forfetária de 5%, basta constatar que, embora a Comissão tenha considerado que tal correção financeira se justificava para a campanha de 2006 devido aos incumprimentos dos artigos 26.° e 27.° do Regulamento n.° 796/2004, lidos em conjugação com o artigo 23.° do mesmo regulamento, não deixa de ser verdade que essa instituição concluiu que o risco correspondente para a referida campanha estava coberto pela correção forfetária devida aos disfuncionamentos do SIP‑SIG, que, conforme resulta do exame do segundo fundamento, foi decidida validamente.

86      Atendendo às considerações precedentes, há que concluir que a Comissão apresentou elementos de prova da dúvida séria e razoável que tinha relativamente aos controlos em questão à luz das exigências dos artigos 26.° e 27.° do Regulamento n.° 796/2004, sem que a República Portuguesa tenha logrado pôr em causa as constatações da Comissão sustentado as suas próprias alegações em elementos que comprovem a existência de um sistema fiável e operacional de controlo. Por conseguinte, há que julgar improcedente o terceiro fundamento.

 Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação do artigo 49.°, n.° 1, do artigo 50.º, n.° 3, e do artigo 51.° do Regulamento n.° 796/2004, no que respeita ao cálculo das reduções

87      A República Portuguesa observa que o presente fundamento tem por objeto a determinação do método de cálculo dos pagamentos relativos aos hectares apurados como elegíveis para beneficiar da ajuda após a aplicação de uma sanção de redução na sequência de controlos, nos casos em que o requerente tem vários direitos com diferentes valores unitários. Este fundamento prende‑se, assim, apenas com a aplicação do artigo 49.°, n.° 1, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 796/2004 às reduções em caso de sobredeclarações, as quais são reguladas pelo artigo 51.°, n.° 1, do referido regulamento.

88      Neste contexto, a Comissão acusa a Administração portuguesa de ter tomado em consideração, para efeitos do pagamento dos hectares apurados, a decisão aplicada no que respeita à avaliação inicial dos direitos, segundo a qual os hectares elegíveis, determinados de acordo com a regulamentação em vigor, eram distribuídos pelo número de direitos ao dispor de cada requerente e pagos de acordo com o respetivo valor unitário, na proporção das superfícies correspondentes aos diferentes direitos.

89      A República Portuguesa alega que, em conformidade com o artigo 49.° do Regulamento n.° 796/2004, a média «diferentes valores/hectare» deve ser mantida mesmo após a redução, o que, na prática, obriga a que se faça uma proporção. Em suma, o artigo 49.°, n.° 1, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 796/2004 pretende que, após a aplicação da sanção de redução, a média do valor unitário pago relativamente à superfície elegível não seja superior à média do valor unitário relativamente à superfície declarada, o que, em caso de direitos com valores unitários diferentes no mesmo grupo de culturas, obriga a que seja feita uma proporção.

90      A República Portuguesa acrescenta que resulta de um ofício da Comissão de 11 de maio de 2005 que essa instituição considerou que a metodologia aplicada pelas autoridades portuguesas era conforme com o artigo 49.°, n.° 1, do Regulamento n.° 796/2004. Em todo o caso, não existiu risco para o fundo em causa, pois, como foi explicado pelos serviços de auditoria, a metodologia aplicada até 2007 não conduz, exclusivamente, a pagamentos por excesso.

91      Por último, existe uma desproporção manifesta entre o eventual risco a que o fundo em causa esteve exposto devido ao método aplicado e a aplicação de uma correção financeira de 2%.

92      A Comissão contesta os argumentos da República Portuguesa.

93      Há que salientar desde já que a Comissão não critica, no que respeita às campanhas de 2005 e de 2006, a redução das superfícies elegíveis para beneficiar da ajuda conforme foi efetuada pela Administração portuguesa, nos termos do artigo 51.° do Regulamento n.° 796/2004, devido às sobredeclarações constatadas.

94      Em contrapartida, a Comissão considera que a Administração portuguesa aplicou erradamente o artigo 49.°, n.° 1, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 796/2004, o qual, a propósito do regime de pagamento único e relativamente às superfícies para as quais a taxa de ajuda é diferente, enuncia como princípio geral para calcular as ajudas e as reduções que «será tida em conta a média dos valores de diferentes direitos aos pagamentos relacionados com a respetiva superfície declarada».

95      Deste modo, tal como as partes referem nas suas observações escritas, a sua divergência reside, em substância, na interpretação do artigo 49.°, n.° 1, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 796/2004. A Comissão considera que esta disposição deve ser interpretada no sentido de que, para calcular as ajudas e as reduções, deve ser tomada em consideração a média ponderada do valor dos diferentes direitos aos pagamentos relacionados com a superfície declarada, não devendo ser considerados, como a República Portuguesa sustenta, os valores unitários dos diferentes direitos aos pagamentos depois de a superfície elegível ter sido dividida proporcionalmente em função dos direitos detidos pelo requerente.

96      Há que julgar procedente a tese da Comissão.

97      Com efeito, resulta da letra do próprio artigo 49.°, n.° 1, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 796/2004 que é a «média dos valores de diferentes direitos aos pagamentos relacionados com a respetiva superfície declarada» que deve ser tomada em consideração. Como a Comissão sustenta, é precisamente pelo facto de o pagamento por superfície se relacionar com o mesmo grupo de culturas que o legislador previu que deve ser tomada em consideração a média ponderada do valor dos diferentes direitos aos pagamentos relacionados com a superfície elegível, e não o valor unitário dos diferentes direitos depois de se dividir proporcionalmente a superfície elegível em função dos direitos do requerente.

98      Contrariamente ao que a República Portuguesa sustenta, a aplicação deste método permite que os requerentes aos quais foi aplicada uma sanção através de uma redução da superfície elegível, na sequência da constatação de uma sobredeclaração, não beneficiem da tomada em consideração de um valor por hectare superior àquele de que beneficiam os requerentes que declararam uma superfície correspondente à superfície elegível. Com efeito, segundo o método preconizado pela Comissão, a média do valor unitário pago no que respeita à superfície considerada elegível após redução não pode em caso nenhum exceder a média do valor dos direitos relativamente à superfície inicialmente declarada, uma vez que o artigo 49.°, n.° 1, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 796/2004 enuncia uma regra geral que se aplica tanto ao cálculo da ajuda como às reduções.

99      Do mesmo modo, contrariamente ao que a República Portuguesa sustenta, no seu ofício de 11 de maio de 2005, a Comissão não se manifestou diretamente sobre a conformidade do método de cálculo utilizado pela Administração portuguesa nas campanhas de 2005 e de 2006 com o artigo 49.°, n.° 1, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 796/2004, tendo essa instituição indicado nesse ofício que estava de acordo com a «conclusão» a que as autoridades portuguesas tinham chegado. Tal pode ser explicado pelo facto de, como a Comissão salienta, no caso mencionado no referido ofício, o método de cálculo aplicado pela Administração portuguesa conduzir ao mesmo resultado que o obtido em aplicação do método de cálculo preconizado pela Comissão. Além disso, esta última recordou, efetivamente, nesse mesmo ofício que «o pagamento deve ser feito com base no valor médio dos direitos de pagamento relativos ao agricultor». Nestas condições, não se pode concluir que a interpretação errada do direito da União, seguida pela República Portuguesa, seja imputável ao comportamento da Comissão (acórdão Grécia/Comissão, referido no n.° 23 supra, EU:T:2014:934, n.os 29 e 30).

100    Por outro lado, o facto de o método de cálculo aplicado pela República Portuguesa poder, em certos casos específicos, conduzir a um pagamento inferior àquele que resulta do método de cálculo preconizado pela Comissão não permite concluir pela inexistência de risco para o fundo em causa.

101    Por último, também não procede o argumento da República Portuguesa segundo o qual uma correção financeira forfertária de 2% seria de qualquer forma desproporcionada relativamente ao prejuízo sofrido pelo fundo em causa.

102    A este respeito, basta referir que o Governo português não demonstrou que uma avaliação dos riscos para o fundo em causa diferente da avaliação defendida pela Comissão teria conduzido a excluir do financiamento da União um montante de despesas menos elevado do que o da correção forfetária fixado por essa instituição nas circunstâncias concretas, cujo nível foi o mais baixo que se encontra previsto nas diretrizes, ou seja, 2% das despesas destinadas aos agricultores que sofreram uma redução ou uma recusa de pagamento. Seja como for, a Comissão concluiu que o correspondente risco para as campanhas de 2005 e de 2006 estava coberto pela correção forfetária aplicada devido às deficiências do SIP‑SIG durante as mesmas campanhas, que, conforme resulta do exame do segundo fundamento, foi decidida validamente.

103    Nestas condições, há, igualmente, que julgar improcedente o presente fundamento.

 Quanto ao quinto fundamento, relativo à violação do artigo 53.° do Regulamento n.° 796/2004

104    Segundo a República Portuguesa, o artigo 53.° do Regulamento n.° 796/2004 não exige a elaboração de diretrizes escritas por parte do organismo pagador para avaliar se um incumprimento da regulamentação da União é ou não deliberado. Existem em Portugal procedimentos internos que, embora não estejam escritos, asseguram o cumprimento integral do artigo 53.° do referido regulamento. Com efeito, de acordo com estes procedimentos, sempre que os agentes da Administração verificarem que os indícios constatados em determinado processo são suscetíveis de configurar uma situação de incumprimento deliberado, remetem o processo para o departamento jurídico e a Administração é obrigada a denunciar os delitos de que toma conhecimento no exercício das suas funções. Para este efeito, a Administração aplica a legislação penal e diplomas administrativos existentes. A constatação de uma intenção delituosa cabe apenas às autoridades policiais e judiciárias.

105    A República Portuguesa acrescenta que, na medida em que a Comissão põe em causa a interpretação que as autoridades nacionais fizeram da lei portuguesa em matéria penal e administrativa quando criaram os procedimentos internos acima referidos, os desenvolvimentos em questão excedem a argumentação defendida pela Comissão durante o inquérito.

106    Por último, a Comissão não baseia as suas conclusões num exemplo concreto no qual a inexistência de diretrizes escritas tenha conduzido a pagamentos indevidos. Pelo contrário, essa instituição aceitou os esclarecimentos prestados pelas autoridades portuguesas no seu ofício de 28 de junho de 2007 em resposta aos três casos por ela identificados na sua primeira comunicação de 26 de abril de 2007.

107    A Comissão contesta os argumentos da República Portuguesa.

108    O artigo 53.° do Regulamento n.° 796/2004 exige que, em caso de sobredeclaração deliberada, seja indeferida a ajuda a que o agricultor teria direito em aplicação do artigo 50.°, n.os 3, 4, alínea b), e 5, do mesmo regulamento para o ano civil em causa. Além disso, sempre que a diferença seja superior a 20% da superfície determinada, o agricultor será excluído, uma vez mais, da ajuda, num montante igual ao montante correspondente à diferença entre a superfície declarada e a superfície determinada nos termos do artigo 50.°, n.os 3, 4, alínea b), e 5, do referido regulamento. Este montante será deduzido dos pagamentos de ajudas efetuados ao abrigo de qualquer dos regimes de ajudas referidos nos títulos III e IV do Regulamento n.° 1782/2003, a que o agricultor tem direito no âmbito dos pedidos que apresentou nos três anos civis seguintes ao ano civil em que a diferença for detetada.

109    No Tribunal, a República Portuguesa afirma, no essencial, que, contrariamente ao que a Comissão sustenta, não está obrigada a prever regras e procedimentos escritos destinados aos serviços competentes, para dar cumprimento ao artigo 53.° do Regulamento n.° 796/2004. A República Portuguesa afirma que existem procedimentos internos segundo os quais, quando os indícios constatados em determinado processo forem suscetíveis de configurar uma situação de incumprimento deliberado, os serviços competentes remetem o processo para o departamento jurídico para avaliação e eventual transmissão aos órgãos jurisdicionais.

110    É certo que, como a Comissão também reconhece, a referida disposição não prevê expressamente, para efeitos da aplicação do artigo 53.° do Regulamento n.° 796/2004, a adoção de regras e procedimentos internos destinados aos agentes da Administração competente.

111    Contudo, como a Comissão salientou, nomeadamente no relatório de síntese, a apreciação em condições satisfatórias e homogéneas da natureza deliberada de uma irregularidade cometida por um requerente exige que sejam emitidas diretrizes claras à atenção dos serviços competentes.

112    Ora, sem que seja necessário tomar posição sobre a afirmação da Comissão segundo a qual o regime das sanções administrativas pertence ao direito administrativo dentro do sistema jurídico português e não, como a República Portuguesa defende erradamente, ao direito penal, basta referir que, tanto durante o inquérito como perante o Tribunal, a República Portuguesa não apoiou em elementos de prova concretos a sua alegação de que existem em Portugal diretrizes claras dirigidas aos agentes da Administração que permitam assegurar uma apreciação, em condições satisfatórias e homogéneas, da natureza deliberada ou não de uma irregularidade cometida por um requerente.

113    Na medida em que a argumentação da República Portuguesa possa ser compreendida no sentido de que a aplicação das disposições do artigo 53.° do Regulamento n.° 796/2004 e das sanções que estas comportam pode estar subordinada ao desenrolar de um processo judicial no termo do qual o tribunal competente constate a realidade do comportamento deliberado do agricultor posto em causa, há que salientar que o desenrolar de tal processo antes da aplicação de sanções de natureza administrativa previstas na regulamentação da União seria contrário aos objetivos da política agrícola comum e seria suscetível de tornar impossível na prática a aplicação da regulamentação da União (v., neste sentido, acórdão Polónia/Comissão, referido no n.° 53 supra, EU:T:2013:96, n.os 86 e 87).

114    A isto acresce que, no que respeita, em especial, à parcela de referência n.° 1362459353002 (lote n.° 6), mencionada pela Comissão a título de exemplo de um caso que comporta irregularidades cometidas de forma deliberada sem que o artigo 53.° do Regulamento n.° 796/2004 tenha sido aplicado, é certo que a República Portuguesa indicou no seu ofício de 28 de junho de 2007 que «o requerente foi sancionado no âmbito do controlo [e] não recebeu qualquer ajuda na campanha de 2006, incluindo [a título do regime de pagamento único] (RPU)», pelo que, segundo esse Estado‑Membro, o artigo 53.° do Regulamento n.° 796/2004 foi aplicado neste caso. No entanto, como a Comissão salientou corretamente, o referido Estado‑Membro não provou, nem durante a fase escrita nem na resposta a uma questão colocada pelo Tribunal, que tinha efetivamente considerado que as irregularidades foram cometidas deliberadamente e que, por conseguinte, tinha aplicado o regime previsto no artigo 53.°, n.os 1 e 2, do Regulamento n.° 796/2004.

115    Nestas condições, e na medida em que não há outras provas que demonstrem a existência de mecanismos de aplicação do artigo 53.° do Regulamento n.° 796/2004 por parte da Administração, a Comissão apresentou elementos de prova da dúvida séria e razoável que tinha relativamente aos controlos em questão, sem que a República Portuguesa tenha logrado pôr em causa as constatações da Comissão, sustentando as suas próprias alegações em elementos que comprovem a existência de um sistema fiável e operacional de controlo. Há, assim, que julgar improcedente o presente fundamento.

 Quanto ao sexto fundamento, relativo à violação do artigo 21.° do Regulamento n.° 2237/2003 e do artigo 13.°, n.° 5, do Regulamento n.° 796/2004, no que respeita à densidade mínima das árvores de frutos de casca rija

116    A República Portuguesa entende que, relativamente ao pagamento por superfície para frutos de casca rija, as autoridades portuguesas não violaram a regulamentação pertinente, a saber, quanto à campanha de 2004, o Regulamento n.° 2237/2003 e, quanto à campanha de 2005, o Regulamento n.° 796/2004 e o Regulamento (CE) n.° 1973/2004 da Comissão, de 29 de outubro de 2004, que estabelece normas de execução do Regulamento n.° 1782/2003 (JO L 345, p. 1).

117    Relativamente à campanha de 2004, a República Portuguesa refere que os agricultores não tinham nenhuma obrigação de incluir no seu pedido de ajuda a posição das árvores de frutos de casca rija, uma vez que o artigo 21.° do Regulamento n.° 2237/2003, aplicável à época, previa apenas a obrigação de discriminar o número de árvores por tipo e por parcela. Nem o Regulamento n.° 796/2004 nem o Regulamento n.° 1973/2004 se aplicavam à campanha de 2004. Ainda que se admita que, para poder beneficiar da ajuda, a superfície deva ser «homogénea» e «coesa», este requisito não pode ser verificado senão através de controlos não automáticos com intervenção humana, que não são seguramente controlos administrativos, uma vez que estes devem permitir a deteção automática de irregularidades através de meios informáticos, em conformidade com o artigo 16.° do Regulamento (CE) n.° 2419/2001 da Comissão, de 11 de dezembro de 2001, que estabelece normas de execução do sistema integrado de gestão e de controlo relativo a determinados regimes de ajudas comunitárias, estabelecido pelo Regulamento n.° 3508/92 (JO L 327, p. 11).

118    Relativamente à campanha de 2005, a indicação obrigatória da posição das árvores no pedido de ajuda estava prevista no artigo 13.°, n.° 5, do Regulamento n.° 796/2004. Esta obrigação foi abandonada para as campanhas seguintes. Com efeito, na medida em que o Regulamento n.° 1782/2003 estabelecia como únicos requisitos de elegibilidade a dimensão da parcela e a sua densidade, a obrigação de indicação da posição das árvores dentro da parcela de referência não acrescentava nenhuma informação útil para a verificação dos requisitos de elegibilidade acima referidos.

119    A Comissão contesta os argumentos da República Portuguesa.

120    Há que referir que, de acordo com a tese defendida pela República Portuguesa, durante as campanhas de 2004 e 2005, as autoridades competentes podiam, para efeitos de pagamento por superfície para frutos de casca rija, considerar suficiente a indicação, no pedido de ajuda, do número de árvores de frutos de casca rija, repartido pelo tipo de árvore e por parcela agrícola, sem que o requerente tivesse além disso de indicar a posição das árvores especificadas na referida parcela. Segundo a República Portuguesa, era durante a fase dos controlos no local, efetuados com base em amostras, que os pedidos de ajuda deviam ser examinados do ponto de vista da sua posição. Uma vez que o controlo administrativo incidiu, assim, sobre todos os pedidos de ajuda, o referido controlo não gerou um risco quanto à observância dos requisitos de elegibilidade das culturas de frutos de casca rija e, por conseguinte, não se justificava a correção financeira decidida pela Comissão.

121    Em conformidade com o disposto no artigo 86.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1782/2003, o pagamento por superfície para frutos de casca rija depende, nomeadamente, dos «limites mínimos da dimensão das parcelas e da densidade de plantação».

122    No que respeita à campanha de 2004, embora o artigo 21.° do Regulamento n.° 2237/2003 disponha que os agricultores discriminarão no pedido de ajuda o número de árvores de frutos de casca rija, repartido por tipo e por parcela agrícola, o artigo 19.°, n.° 2, do mesmo regulamento enuncia que só serão elegíveis para o pagamento por superfície previsto no artigo 83.° do Regulamento n.° 1782/2003 «os pomares de frutos de casca rija que satisfizerem as condições referidas nos n.os 3 e 4», sendo que, nos termos do artigo 19.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2237/2003, há que entender por pomar uma «superfície coesa e homogeneamente plantada com árvores de frutos de casca rija, não intersetada por outras plantações ou culturas e com continuidade geográfica». Em conformidade com o artigo 19.°, n.° 3, do mesmo regulamento, a superfície mínima de uma parcela de pomar é de 0,10 hectares e o número mínimo de árvores por hectare de pomar varia consoante o tipo de árvore produtor de frutos de casca rija.

123    Como a Comissão referiu acertadamente, é o pomar, enquanto superfície homogénea e coesa, que é elegível para o pagamento por superfície. A eficácia do controlo administrativo da elegibilidade das árvores de frutos de casca rija pertencentes a um pomar pressupõe, deste modo, que o requerente indique a posição do tipo de árvores em questão, sem a qual não pode ser verificada a densidade de plantação mínima dentro do pomar, definido como uma superfície homogénea, coesa, com uma superfície mínima, plantada de árvores de frutos de casca rija.

124    A este respeito, por um lado, há que recordar que o controlo administrativo e a inspeção no local foram concebidos pelo legislador da União como dois meios de verificação que, embora distintos, se completam reciprocamente. Por outro lado, esse controlo administrativo, que precede as inspeções no local, deve ser efetuado de forma a permitir às autoridades nacionais retirar todas as conclusões possíveis, certezas ou dúvidas, acerca do respeito das condições de concessão das ajudas ou dos prémios (acórdão Bélgica/Comissão, referido no n.° 26 supra, EU:C:2008:247, n.° 72).

125    Ora, a tese defendida pela República Portuguesa teria como consequência impedir o controlo administrativo do cumprimento do requisito fundamental relativo à densidade de plantação.

126    Contrariamente às alegações da República Portuguesa, nada impede a realização desse controlo administrativo, o qual, em conformidade com o artigo 16.° do Regulamento n.° 2419/2001, se destina a permitir detetar qualquer irregularidade, em especial através de meios informáticos, desde que os dados relativos à posição das árvores estejam igualmente indicados no pedido de ajuda.

127    Por conseguinte, a tese defendida pela República Portuguesa deve ser rejeitada no que respeita à campanha de 2004.

128    Quanto à campanha de 2005, o artigo 15.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1973/2004 reproduz, a respeito do pagamento por superfície para frutos de casca rija, a definição de pomar conforme esta figura, para a campanha de 2004, no artigo 19.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2237/2003. Por outro lado, como a própria República Portuguesa refere, o artigo 13.°, n.° 5, do Regulamento n.° 796/2004, aplicável à campanha de 2005, dispõe expressamente que o pedido deve incluir o número de árvores, «a sua posição» e o seu tipo, pelo que a indicação da posição devia, manifestamente, ter sido incluída nos pedidos de ajuda.

129    Contrariamente à argumentação defendida pela República Portuguesa, a circunstância de o artigo 86.° do Regulamento n.° 1782/2003 prever, como requisitos de admissibilidade da ajuda, os limites da parcela e a densidade de plantação, não permite concluir que a indicação obrigatória da posição das árvores de frutos de casca rija não seja necessária para verificar os referidos requisitos de admissibilidade. Com efeito, como acima se referiu nos n.os 123 e 126, só a posição das árvores permite verificar se o requisito relativo à densidade do pomar está preenchido e nada impede a realização do controlo administrativo, destinado a permitir, em conformidade com o disposto no artigo 24.° do Regulamento n.° 796/2004, detetar qualquer irregularidade, em especial através de meios informáticos.

130    Nestas condições, no que respeita à campanha de 2005, a República Portuguesa violou a obrigação enunciada no artigo 13.°, n.° 5, do Regulamento n.° 796/2004, segundo a qual o pedido de ajuda deve incluir a posição das árvores de frutos de casca rija.

131    À luz das considerações precedentes, há que concluir que se deve igualmente julgar improcedente o sexto fundamento e, por conseguinte, negar provimento ao recurso na íntegra.

 Quanto às despesas

132    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a República Portuguesa sido vencida, há que condená‑la nas despesas em conformidade com os pedidos da Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A República Portuguesa é condenada nas despesas.

Kanninen

Pelikánová

Buttigieg

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 16 de junho de 2015.

Assinaturas

Índice


Antecedentes do litígio e decisão impugnada

Tramitação processual e pedidos das partes

Questão de direito

Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 7.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1258/1999

Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do artigo 24.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 796/2004

Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação dos artigos 26.° e 27.° do Regulamento n.° 796/2004 no que respeita aos controlos no local

Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação do artigo 49.°, n.° 1, do artigo 50.º, n.° 3, e do artigo 51.° do Regulamento n.° 796/2004, no que respeita ao cálculo das reduções

Quanto ao quinto fundamento, relativo à violação do artigo 53.° do Regulamento n.° 796/2004

Quanto ao sexto fundamento, relativo à violação do artigo 21.° do Regulamento n.° 2237/2003 e do artigo 13.°, n.° 5, do Regulamento n.° 796/2004, no que respeita à densidade mínima das árvores de frutos de casca rija

Quanto às despesas


* Língua do processo: português.