Language of document : ECLI:EU:T:2011:343

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção)

12 de Julho de 2011 (*)

«Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Mercado relativo aos projectos de mecanismos de comutação isolados a gás – Decisão que declara uma infracção ao artigo 81.° CE e ao artigo 53.° do Acordo EEE – Repartição do mercado – Direitos de defesa – Prova da infracção – Infracção única e continuada – Coimas – Gravidade e duração da infracção – Fundamentação – Montante de partida – Ano de referência»

No processo T‑113/07,

Toshiba Corp., com sede em Tóquio (Japão), representada inicialmente por J. MacLennan, solicitor, A. Schulz e J. Borum, advogados, e em seguida por J. MacLennan e A. Schulz,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada inicialmente por F. Arbault e J. Samnadda, e em seguida por X. Lewis, e em seguida por J. Bourke e F. Ronkes Agerbeek, e finalmente por Ronkes Agerbeek e N. Khan, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objecto, a título principal, um pedido de anulação da Decisão C (2006) 6762 final da Comissão, de 24 de Janeiro de 2007, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.° [CE] e do artigo 53.° do Acordo EEE (Processo COMP/F/38.899 – Mecanismos de comutação isolados a gás), na medida em que é relativa à recorrente, a título subsidiário, um pedido de alteração dos artigos 1.° e 2.° da referida decisão com vista à anulação ou redução do montante da coima que foi aplicada à recorrente,

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção),

composto por: I. Pelikánová (relator), presidente, K. Jürimäe e S. Soldevila Fragoso, juízes,

secretário: C. Kantza, administradora

vistos os autos e após a audiência de 11 de Dezembro de 2009,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1.     Recorrente

1        A recorrente, Toshiba Corp., é uma sociedade com actividade em diversos sectores, incluindo no domínio dos mecanismos de comutação isolados a gás (a seguir «MCIG»). Entre Outubro de 2002 e Abril de 2005, a sua actividade em matéria de MCIG era exercida por uma sociedade comum, a saber, a TM T & D Corp., que detinha em partes iguais com a Mitsubishi Electric Corp. (a seguir «Melco») e foi dissolvida em 2005.

2.     Produtos

2        Os MCIG são utilizados para controlar os fluxos de energia nas redes eléctricas. Trata‑se de equipamentos eléctricos pesados, utilizados como um dos principais componentes de subestações eléctricas. São vendidos no mundo inteiro enquanto parte de subestações eléctricas «chave na mão» ou como produtos isolados destinados a serem integrados nessas subestações.

3.     Procedimento administrativo

3        Em 3 de Março de 2004, a ABB Ltd informou a Comissão da existência de práticas anticoncorrenciais no sector dos MCIG, no âmbito de um pedido verbal de imunidade das coimas, nos termos da Comunicação da Comissão, de 19 de Fevereiro de 2002, relativa à imunidade em matéria de coimas e à redução do seu montante nos processos relativos a cartéis (JO 2002, C 45, p. 3, a seguir «comunicação sobre a cooperação»).

4        O pedido verbal de imunidade das coimas apresentado pela ABB foi completado por observações orais e por provas documentais. Em 24 de Abril de 2004, deu lugar a uma decisão da Comissão que concedeu imunidade condicional à ABB.

5        Com base nas declarações da ABB, a Comissão abriu um inquérito e, em 11 e 12 de Maio de 2004, procedeu a inspecções nas instalações de várias sociedades com actividade no sector dos MCIG.

6        Em 20 de Abril de 2006, a Comissão adoptou uma comunicação de acusações dirigida a 20 sociedades, entre as quais, designadamente, a recorrente. A Comissão procedeu à audição das sociedades às quais a comunicação de acusações tinha sido dirigida, em 18 e 19 de Julho de 2006.

4.     Decisão impugnada

7        Em 24 de Janeiro de 2007, a Comissão adoptou a Decisão C (2006) 6762 final, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.° [CE] e do artigo 53.° do Acordo EEE (Processo COMP/F/38.899 – Mecanismos de comutação isolados a gás) (a seguir «decisão impugnada»).

8        Nos considerandos 113 a 123 da decisão impugnada, a Comissão indicou que as diversas empresas participantes no cartel coordenaram a atribuição dos projectos de MCIG à escala mundial, com excepção de certos mercados, segundo regras convencionadas, nomeadamente a fim de manter quotas que reflectissem em grande medida as suas quotas de mercado históricas estimadas. Precisou que a atribuição dos projectos de MCIG era efectuada com base numa quota conjunta «japonesa» e numa quota conjunta «europeia» que deveriam seguidamente ser repartidas respectivamente pelos produtores japoneses e pelos produtores europeus entre si. Um acordo assinado em Viena, em 15 de Abril de 1988 (a seguir «acordo GQ») estipulava regras que permitiam atribuir os projectos de MCIG quer aos produtores japoneses quer aos produtores europeus e imputar o seu valor na quota correspondente. Além disso, nos considerandos 124 a 132 da decisão impugnada, a Comissão precisou que as diversas empresas que participaram no cartel tinham feito um acordo não escrito (a seguir «acordo comum»), segundo o qual os projectos de MCIG no Japão, por um lado, e nos países dos membros europeus do cartel, por outro, designados em conjunto como «países construtores» dos projectos de MCIG, estavam reservados, respectivamente, aos membros japoneses e aos membros europeus do cartel. Os projectos de MCIG nos «países construtores» não eram objecto de trocas de informações entre os dois grupos nem eram imputados nas respectivas quotas.

9        O acordo GQ continha igualmente regras relativas à troca das informações necessárias ao funcionamento do cartel entre os dois grupos de produtores, que era nomeadamente assegurado pelos secretários desses grupos, à manipulação dos concursos em causa e à fixação de preços para os projectos de MCIG que não podiam ser atribuídos. Segundo os termos do seu anexo 2, o acordo GQ aplicava‑se a todo o mundo, com excepção dos Estados Unidos, do Canadá, do Japão e de 17 países da Europa Ocidental. Além disso, nos termos do acordo comum, os projectos de MCIG nos países europeus diferentes dos «países construtores» estavam igualmente reservados ao grupo europeu, uma vez que os produtores japoneses se tinham obrigado a não apresentar propostas para os projectos de MCIG na Europa.

10      Segundo a Comissão, a repartição dos projectos de MCIG entre produtores europeus era regulada por um acordo igualmente assinado em Viena, em 15 de Abril de 1988, intitulado «E‑Group Operation Agreement for GQ‑Agreement» (a seguir «acordo EQ»). Indicou que a atribuição dos projectos de MCIG na Europa seguia as mesmas regras e procedimentos da atribuição dos projectos de MCIG noutros países. Em particular, os projectos de MCIG na Europa deviam igualmente ser notificados, repertoriados, atribuídos, convencionados ou ter recebido um nível mínimo de preços.

11      Com base nos factos apurados e nas apreciações jurídicas efectuadas na decisão, a Comissão verificou que as empresas em causa infringiram o artigo 81.° CE e o artigo 53.° do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (a seguir «Acordo EEE») e aplicou‑lhes coimas cujo montante foi calculado de acordo com a metodologia exposta nas Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.° do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA (JO 1998, C 9, p. 3, a seguir «orientações para o cálculo das coimas») e na comunicação sobre a cooperação.

12      No artigo 1.° da decisão impugnada, a Comissão declarou que as recorrentes tinham participado na infracção durante o período compreendido entre 15 de Abril de 1988 e 11 de Maio de 2004.

13      Pela infracção referida no artigo 1.° da decisão impugnada, foi aplicada à recorrente, no artigo 2.° da mesma decisão, uma coima no montante de 90 900 000 de euros, dos quais 4 650 000 euros, que correspondem à infracção praticada pela TM T & D, a pagar solidariamente com a Melco.

 Tramitação do processo e pedidos das partes

14      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 18 de Abril de 2007, a recorrente interpôs o presente recurso. A contestação e a réplica foram apresentadas respectivamente em 27 de Agosto e em 22 de Outubro de 2007.

15      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 29 de Novembro de 2007, a recorrente pediu que o seu pedido fosse julgado procedente à revelia, nos termos do artigo 122.° do Regulamento de Processo do Tribunal Geral. Este pedido foi indeferido por decisão da Segunda Secção do Tribunal Geral de 11 de Dezembro de 2007.

16      A fase escrita foi concluída com a apresentação da tréplica em 17 de Dezembro de 2007.

17      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Segunda Secção), em 22 de Setembro de 2009, decidiu abrir a fase oral do processo. No quadro das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do Regulamento de Processo, convidou a Comissão a apresentar determinados documentos e pediu às partes que se pronunciassem sobre a pertinência desses mesmos documentos em relação aos argumentos relativos à violação do direito de acesso ao processo. O Tribunal Geral apresentou também duas questões escritas à Comissão, convidando‑a a responder‑lhe na audiência.

18      Em resposta à solicitação do Tribunal, em 26 de Outubro de 2009, a Comissão transmitiu os documentos em causa. A recorrente apresentou as suas observações sobre estes documentos em 19 de Novembro de 2009. A Comissão respondeu às observações da recorrente em 2 de Dezembro de 2009.

19      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões escritas e orais do Tribunal na audiência de 11 de Dezembro de 2009.

20      Por despacho de 11 de Junho de 2010, o Tribunal Geral decidiu reabrir a fase oral do processo, requereu à Comissão que apresentasse certos documentos no âmbito de diligências de instrução previstas no artigo 65.° do Regulamento de Processo e fixou as modalidades de consulta dos mesmos pela recorrente.

21      A Comissão efectuou esta diligência de instrução no prazo estipulado.

22      A fase oral foi encerrada em 28 de Julho de 2010.

23      Na petição, a recorrente concluiu pedindo que o Tribunal se digne:

–        anular a decisão impugnada;

–        a título subsidiário, anular a decisão impugnada na medida em que lhe diz respeito;

–        a título mais subsidiário, alterar os artigos 1.° e 2.° da decisão impugnada com vista à anulação ou redução substancial do montante da coima que lhe foi aplicada;

–        condenar a Comissão nas despesas, incluindo as despesas provocadas pela constituição de uma garantia bancária.

24      Na audiência, a recorrente desistiu do seu primeiro pedido, relativo à anulação integral da decisão impugnada.

25      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

26      Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca quatro fundamentos. O primeiro é relativo ao facto de, na decisão impugnada, a Comissão não ter feito prova bastante da existência do acordo comum. O segundo é relativo ao facto de a Comissão não ter demonstrado a existência de uma infracção única e continuada. O terceiro é relativo ao facto de os seus direitos de defesa terem sido violados. O quarto é relativo ao facto de a Comissão lhe ter aplicado erradamente uma coima.

27      A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

28      Cumpre salientar, desde já, que a recorrente não especificou quais dos seus fundamentos eram invocados em apoio dos diferentes pedidos que apresentou. A este respeito, importa considerar, por um lado, que os primeiro, segundo e terceiro fundamentos foram invocados pela recorrente em apoio do seu pedido que tem por objecto a anulação da decisão impugnada na medida em que lhe diz respeito. Com efeito, se um destes fundamentos for acolhido, em princípio, haverá lugar à anulação integral da decisão impugnada na medida em que diz respeito a esta última. Por outro lado, o quarto fundamento é relativo à determinação da coima aplicada à recorrente e, por conseguinte, é invocado por esta última em apoio do seu pedido que tem por objecto a anulação ou a redução substancial do montante da coima que lhe foi aplicada.

1.     Quanto ao pedido de anulação dos artigos 1.° e 2.° da decisão impugnada na medida em que dizem respeito à recorrente

29      Na medida em que a anulação da decisão impugnada, em razão de uma violação dos direitos de defesa da recorrente, tornava desnecessária a análise da referida decisão quanto ao mérito, cumpre, numa primeira fase, apreciar o terceiro fundamento. Depois, devem ser examinados os primeiro e segundo fundamentos

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação, pela Comissão, dos direitos de defesa da recorrente

30      A recorrente considera que foram violados os seus direitos de defesa. No âmbito da primeira parte, invoca um erro processual fundamental no que respeita à identificação da infracção no dispositivo da decisão impugnada. No âmbito da segunda parte, alega uma violação do direito de acesso ao processo. No âmbito da terceira parte, sustenta que a Comissão desvirtuou elementos deste último.

31      A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

 Quanto à primeira parte, relativa à insuficiente identificação da infracção no dispositivo da decisão impugnada

–       Argumentos das partes

32      Segundo a recorrente, no artigo 1.° do dispositivo da decisão impugnada, a Comissão limitou‑se a mencionar a participação da recorrente num conjunto de acordos e de práticas concertadas, sem identificar qualquer infracção ao artigo 81.° CE e ao artigo 53.° do acordo EEE, o que constitui um erro processual fundamental.

33      A Comissão contesta a procedência do argumento da recorrente

–       Apreciação do Tribunal Geral

34      Decorre do artigo 1.° da decisão impugnada que a Comissão verificou que as sociedades em causa participaram num conjunto de acordos e de práticas concertadas contrários ao artigo 81.° CE e ao artigo 53.° do acordo EEE no sector do MCIG e especificou os períodos abrangidos. Assim, o dispositivo da decisão impugnada não especifica em que é que consistem os acordos e as práticas de que é acusada.

35      Importa, no entanto, recordar que o dispositivo de uma decisão deve ser entendido tendo em conta os fundamentos subjacentes (acórdão do Tribunal Geral de 20 de Abril de 1999, Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão, dito «PVC II», T‑305/94 a T‑307/94, T‑313/94 a T‑316/94, T‑318/94, T‑325/94, T‑328/94, T‑329/94 e T‑335/94, Colect., p. II‑931, n.° 761). No presente caso, é designadamente apresentado no considerando 2 da decisão impugnada um resumo dos elementos da infracção sancionada e os referidos elementos são pormenorizados noutros considerandos da decisão impugnada. Nestas circunstâncias, há que considerar que, face aos fundamentos que lhe estão subjacentes, a Comissão, no dispositivo da decisão impugnada, identificou a infracção em causa de maneira suficientemente precisa. Assim, a presente parte deve ser julgada improcedente.

 Quanto à segunda parte, relativa a uma violação do direito de acesso ao processo

–       Argumentos das partes

36      A recorrente considera que a Comissão não lhe facultou acesso a todos os elementos de acusação e de defesa.

37      Quanto aos elementos de acusação, a recorrente alega que teve apenas acesso parcial à resposta da Hitachi à comunicação de acusações e que não teve acesso às declarações da Fuji que alegadamente confirmavam as declarações da ABB, invocadas no considerando 125 da decisão impugnada. Por conseguinte, considera que não pôde pronunciar‑se e ser ouvida sobre estes elementos, que, consequentemente, em sua opinião, não podiam ser invocados na decisão impugnada.

38      No que respeita aos elementos de defesa, a recorrente especifica que, na medida em que não lhe foi atribuído acesso integral ao processo, não teve a possibilidade de determinar se foram apresentados por outras partes elementos pertinentes suplementares. Em qualquer caso, considera que devia ter tido acesso à resposta complementar da Hitachi Ltd à comunicação de acusações, que refuta as conclusões relativas à contabilização que foram retiradas na decisão impugnada das declarações da Hitachi. Evoca igualmente as declarações de empregados da Melco e da Hitachi que contradizem a existência do acordo comum. Finalmente, baseia-se nas declarações de S. apresentadas pela Areva, que, aparentemente, contradizem a teoria relativa à duração do acordo GQ.

39      A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal Geral

40      O respeito dos direitos de defesa exige que a pessoa interessada tenha tido a possibilidade, durante o procedimento administrativo, de dar a conhecer utilmente o seu ponto de vista sobre a realidade e a pertinência dos factos e circunstâncias alegados, bem como sobre os documentos considerados pela Comissão em apoio da sua alegação de existência de uma infracção ao Tratado (acórdão do Tribunal de Justiça de 7 de Janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, Colect., p. I‑123, n.° 66).

41      Corolário do princípio do respeito dos direitos de defesa, o direito de acesso ao processo implica que a Comissão deve dar à empresa em causa a possibilidade de proceder a um exame de todos os documentos que figuram no processo de instrução e que possam ser pertinentes para a sua defesa. Estes incluem elementos de prova, tanto de acusação como de defesa, com a ressalva dos segredos comerciais de outras empresas, dos documentos internos da Comissão e de outras informações confidenciais (acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, referido no n.° 40, supra, n.° 68).

42      A este propósito, há que recordar que é unicamente no início da fase administrativa contraditória do processo que a empresa interessada é informada, através da comunicação de acusações, de todos os elementos essenciais nos quais a Comissão se baseia nessa fase do processo, e que essa empresa goza do direito de acesso ao processo a fim de garantir o exercício efectivo dos seus direitos de defesa. Por conseguinte, a resposta das outras partes que tenham participado no cartel à comunicação de acusações não está, em princípio, incluída no conjunto dos documentos do processo instrutor que as partes podem consultar (acórdão do Tribunal Geral de 30 de Setembro de 2009, Hoechst/Comissão, T‑161/05, ainda não publicado na Colectânea, n.° 163).

43      Porém, se a Comissão tencionar basear‑se numa passagem de uma resposta à comunicação de acusações ou num documento anexo a essa resposta, para concluir pela existência de uma infracção num processo de aplicação do artigo 81.°, n.° 1, CE, deve ser dada às outras partes no processo a possibilidade de se pronunciarem sobre esse elemento de prova. Com efeito, nestas circunstâncias, essa passagem de uma resposta à comunicação de acusações ou o documento anexo a essa resposta constituem um elemento de acusação contra as diferentes empresas que participaram na infracção (v. acórdão Hoechst/Comissão, referido no n.° 42 supra, n.° 164, e jurisprudência aí referida). A jurisprudência referida é aplicável, por analogia, ao artigo 53.°, n.° 1, do acordo EEE.

44      Por analogia, se uma passagem de uma resposta a uma comunicação de acusações ou um documento anexo a essa resposta for susceptível de ser pertinente para a defesa de uma empresa na medida em que lhe permite invocar elementos não compatíveis com as deduções efectuadas nessa fase pela Comissão, constitui um elemento de defesa. Neste caso, a empresa em causa deve ter a possibilidade de proceder a uma análise da passagem ou do documento em questão e de se pronunciar a seu respeito.

45      No entanto, o simples facto de outras empresas terem invocado os mesmos argumentos que a empresa em causa e de eventualmente terem utilizado mais recursos na sua defesa não é suficiente para considerar esses argumentos como elementos de defesa (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 27 de Setembro de 2006, Jungbunzlauer/Comissão, T‑43/02, Colect., p. II‑3435, n.os 353 e 355).

46      Quanto às consequências de um acesso ao processo que não respeite estas regras, a não comunicação de um documento em que a Comissão se tenha baseado para acusar uma empresa apenas constitui violação dos direitos de defesa se a empresa demonstrar que o resultado a que a Comissão chegou na sua decisão teria sido diferente se o documento não comunicado viesse a ser afastado enquanto meio de prova da acusação (acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 40, supra, n.os 71 e 73).

47      Quanto à ausência de comunicação de um documento favorável à defesa, a empresa em causa deve unicamente demonstrar que a sua não divulgação pode ter influenciado, em seu detrimento, o desenrolar do processo e o conteúdo da decisão da Comissão. Basta que a empresa demonstre que poderia ter utilizado o referido documento em sua defesa, no sentido de que, se pudesse tê‑lo invocado no procedimento administrativo, teria podido invocar elementos que não concordavam com as deduções feitas nessa fase pela Comissão e, portanto, poderia ter influenciado, de qualquer maneira, as apreciações feitas por esta na decisão, pelo menos no que respeita à gravidade e à duração do comportamento que lhe era imputado, e, portanto, ao nível da coima (acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 40, supra, n.os 74 e 75).

48      A possibilidade de um documento não divulgado ter influenciado o desenrolar do processo e o conteúdo da decisão da Comissão só pode ser demonstrada através de um exame provisório de determinados meios do qual resulte que os documentos não divulgados podiam ter tido – em relação a esses meios de prova – uma importância que não deveria ter sido menosprezada (acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 40, supra, n.° 76).

49      No caso em apreço, cumpre excluir, desde já, os argumentos da recorrente relativos ao facto de não ter tido acesso à totalidade do processo da Comissão. Com efeito, decorre da jurisprudência acima referida no n.° 41 que a protecção dos direitos de defesa das pessoas interessadas num processo não implica que deva ser conferido um acesso total ao mesmo.

50      No que respeita aos elementos de acusação, observe‑se que a recorrente não especifica que elementos acolhidos como de acusação na decisão impugnada constavam da parte da resposta da Hitachi à comunicação de acusações a que não teve acesso. Também não especifica as razões pelas quais o facto de ter tido apenas acesso parcial ao referido documento não lhe permitiu pronunciar‑se sobre as declarações da Hitachi relativas à contabilização, cujo elemento essencial de acusação constituem. Nestas circunstâncias, o argumento da recorrente relativo ao acesso parcial à resposta da Hitachi à comunicação de acusações deve ser rejeitado.

51      Além disso, a Comissão admite que não podia apoiar‑se nas observações da Fuji que não foram comunicadas à recorrente para fundamentar as acusações imputadas a esta última na decisão impugnada, mas contesta que as tenha efectivamente invocado enquanto elementos de acusação.

52      Cumpre, todavia, salientar que, nos considerandos 125 e 255 da decisão impugnada, a Comissão se referiu às observações complementares da Fuji, em particular às apresentadas em 21 de Novembro de 2006, para confirmar a existência do acordo comum.

53      Nestas circunstâncias, o destino do argumento da recorrente depende do resultado da análise do primeiro fundamento, relativo à prova da existência do acordo comum. Com efeito, se se verificar que a existência do referido acordo, foi feita prova bastante já mesmo depois de excluir as observações em causa da Fuji enquanto elemento de acusação, as alegações da recorrente não poderão ser acolhidas. Em contrapartida, se se verificar que as referidas observações constituem um elemento necessário de apoio das observações efectuadas na decisão impugnada quanto à existência do acordo comum, haverá que acolher o argumento da recorrente e, portanto, anular a decisão impugnada na medida em que lhe diz respeito.

54      Quanto aos elementos de defesa, o Tribunal Geral pediu à Comissão que apresentasse todos os documentos que foram identificados pela recorrente com um mínimo de precisão. Dado que o pedido apresentado à Comissão se baseou nas indicações prestadas pela própria recorrente, o seu pedido, formulado nas observações de 19 de Novembro de 2009, com vista a que a Comissão lhe comunicasse todos os elementos apresentados em resposta a convites análogos enviados pelo Tribunal Geral nos processos T‑112/07, Hitachi e o./Comissão, e T‑133/07, Mitsubishi Electric/Comissão, não pode ser acolhido.

55      No que respeita aos diferentes elementos apresentados pela Comissão no presente processo, cumpre observar, em primeiro lugar, que, contrariamente ao que alega a recorrente, a resposta suplementar da Hitachi à comunicação de acusações não põe em causa o conteúdo factual das suas declarações relativas ao mecanismo de notificação e contabilização. Na referida resposta complementar, a Hitachi limitou‑se a contestar a interpretação feita pela Comissão das referidas declarações, em particular no que respeita à sua pertinência enquanto prova do acordo comum e da existência de uma infracção única que implica tanto este último como o acordo GQ. Ora, esta mesma argumentação já tinha sido apresentada pela Hitachi no extracto da sua primeira resposta à comunicação de acusações, transmitida à recorrente pela Comissão. Por conseguinte, a resposta suplementar da Hitachi à comunicação de acusações não pode ser considerada um elemento de acusação cuja comunicação fosse susceptível de influenciar o decurso do processo e o conteúdo da decisão impugnada.

56      Cumpre igualmente salientar que é erradamente que a recorrente se queixa, nas suas observações de 19 de Novembro de 2009, de, na sequência do convite dirigido pelo Tribunal Geral à Comissão, ter tido apenas acesso parcial à resposta suplementar da Hitachi à comunicação de acusações. Com efeito, o carácter parcial do acesso ao referido documento resulta de, nos seus articulados, a recorrente o ter identificado como um potencial elemento de defesa, unicamente na medida em que diz respeito ao mecanismo de notificação e contabilização.

57      Em segundo lugar, cumpre observar que, nas declarações escritas apresentadas em Novembro de 2006, os empregados da Melco e da Hitachi contestam a existência do acordo comum e das discussões relativas ao mesmo e referem a existência de barreiras «elevadas» à entrada no mercado europeu. Além disso, uma das testemunhas da Melco observa que a Fuji não participou nas negociações que precederam a assinatura do acordo GQ, enquanto a outra refere que, em sua opinião, a exclusão de certos países europeus do âmbito de aplicação do acordo GQ era devida ao risco de execução do direito da concorrência. Por sua vez, as testemunhas da Hitachi, relatam os pormenores de uma proposta da Alstom relativa a um acordo entre os produtores europeus e japoneses, apresentada em Julho de 2002, e à rejeição dessa proposta pela Hitachi.

58      A este respeito, observe‑se, por um lado, que os depoimentos escritos dos empregados de uma sociedade, elaborados sob o seu controlo e apresentados por ela para a sua defesa no âmbito de um procedimento administrativo efectuado pela Comissão não podem, em princípio, ser qualificados como elementos diferentes e independentes das declarações dessa mesma sociedade. Com efeito, regra geral, a posição de uma sociedade quanto à realidade dos factos de que é acusada pela Comissão baseia‑se, em primeiro lugar, nos conhecimentos e opiniões dos seus empregados e dos seus dirigentes.

59      Por outro lado, durante o procedimento administrativo, a própria recorrente contestou a existência do acordo comum e das discussões relativas ao mesmo e invocou a existência de barreiras «elevadas» à entrada no mercado europeu. Por conseguinte, o facto de outras empresas terem invocado estes argumentos não poderia ser considerado um elemento de defesa.

60      Do mesmo modo, os pormenores da proposta da Alstom apresentada em Julho de 2002, foram revelados na comunicação de acusações, enquanto a ausência da Fuji das negociações associadas ao acordo GQ é referida no depoimento de M., a que a recorrente não contesta ter tido acesso. Portanto, estes elementos não constituem elementos de defesa.

61      Em contrapartida, não se vê que o argumento relativo à razão pela qual certos países europeus estavam excluídos do âmbito de aplicação do acordo GQ tenha sido invocado pela recorrente, nem que esta última tenha tido acesso a um documento que o reproduzisse. Assim, essa passagem do depoimento de um dos empregados da Melco poderia ser considerada um elemento de defesa. No entanto, trata‑se de uma declaração proveniente de um empregado de uma das empresas implicadas, na qual este empregado se limita a contestar a existência do comportamento ilícito e que não tem qualquer fundamento. Nestas circunstâncias, não há que considerar que a comunicação deste elemento era susceptível de ter influência na evolução do processo e no conteúdo da decisão impugnada.

62      Em terceiro lugar, há que referir que a própria recorrente admite, nas suas observações de 19 de Novembro de 2009, que as declarações de S., apresentadas pela Areva, confirmam a sua própria argumentação no que respeita à alegada suspensão da execução do acordo GQ entre 1999 e 2002. Do mesmo modo, contrariamente ao que indica a recorrente, a alegação de que era necessária uma aproximação à TM T & D em 2002 com vista à retoma das actividades do cartel foi apresentada na nota explicativa da Areva, respeitante ao funcionamento do cartel, a que a recorrente teve acesso.

63      O único elemento potencialmente de defesa constante das declarações de S. é a alegação de que o acordo GQ não podia funcionar sem de um grande produtor como a Siemens. No entanto, esta alegação proveniente de um empregado de uma empresa que é acusada de ter participado na infracção não tem fundamento e é refutada tanto pelas declarações de outras empresas envolvidas como pelos elementos documentais reunidos pela Comissão e apresentados nos considerandos 191 a 198 da decisão impugnada. Portanto, a comunicação desse elemento não teria sido susceptível de influenciar a tramitação do processo e o conteúdo da decisão impugnada.

64      À luz do exposto, há que rejeitar os argumentos da recorrente relativos ao acesso aos elementos de defesa. No entanto, tal como acima resulta do n.° 53, o desfecho da presente parte depende do resultado do exame dos argumentos apresentados pela recorrente no âmbito do seu primeiro fundamento.

 Quanto à terceira parte, relativa à desvirtuação dos elementos do processo

–       Argumentos das partes

65      A recorrente alega que a Comissão desvirtuou os elementos do processo e, portanto, violou tanto os seus direitos de defesa como a obrigação de tratar o processo com imparcialidade e diligência.

66      Segundo a recorrente, em primeiro lugar, contrariamente ao que é referido no considerando 255 da decisão impugnada, a empresa pertencente ao grupo de que faz parte a VA TECH Transmission & Distribution GmbH & Co. KEG (a seguir «VA TECH») não ficou em silêncio acerca da existência do acordo comum, tendo‑o antes impugnado expressamente na audição.

67      Em segundo lugar, a recorrente contesta que, na audição, não tenha sido capaz de responder às questões relativas aos projectos contabilizados na quota prevista pelo acordo GQ e à lista dos projectos alegadamente notificados, fornecida pela ABB. Especifica, apoiando‑se numa passagem da transcrição da audição, que respondeu que não estava ao corrente da contabilização.

68      Em terceiro lugar, a recorrente sustenta que, na decisão impugnada, a Comissão declarou erradamente que tinha confirmado que o cartel GQ continuou após 24 de Abril de 1999, enquanto ela tinha argumentado que o cartel à escala mundial tinha terminado após a interrupção pela Siemens e pela Hitachi da sua participação.

69      Em quarto lugar, contrariamente à afirmação da Comissão no considerando 306 da decisão impugnada, a recorrente refere que não confirmou as declarações da Hitachi relativas à existência da notificação e que impugnou tanto a notificação como a contabilização.

70      Em quinto lugar, argumenta que, na medida em que não teve acesso às declarações das outras partes em que a Comissão apoiou as suas conclusões, não pode excluir que o conteúdo das referidas declarações tenha igualmente sido desvirtuado na decisão impugnada, o que aliás seria muito provável face às alegações acima indicadas.

71      A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal Geral

72      Por um lado, importa observar que o princípio do respeito dos direitos da defesa, cujo conteúdo foi acima recordado no n.° 40, só pode ser violado por desvirtuação dos factos quando esta tiver afectado a possibilidade de a parte interessada compreender o sentido das acusações feitas pela Comissão ou apreciar os elementos invocados em seu apoio.

73      Ora, no vertente caso, a recorrente não especifica em que medida as alegadas desvirtuações dos factos efectuadas pela Comissão dificultaram a sua defesa.

74      Consequentemente, há que rejeitar o fundamento relativo a uma violação do princípio do respeito dos direitos da defesa.

75      Por outro lado, a obrigação de tratar o processo com imparcialidade e diligência, que faz parte integrante do princípio de boa administração, é violada de cada vez que um elemento de facto é desvirtuado. No entanto, tal violação só permite concluir pela ilegalidade da decisão impugnada na medida em que a Comissão não pudesse chegar às mesmas conclusões se tivesse interpretado correctamente os elementos de facto em causa.

76      Nestas circunstâncias, a interpretação dos diferentes elementos de facto alegadamente desvirtuados e as consequências das desvirtuações eventualmente ocorridas serão analisadas no âmbito dos fundamentos da recorrente que põem em causa esses elementos de facto.

77      Atentas as considerações expostas, há que rejeitar a terceira parte do terceiro fundamento.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo ao facto de a Comissão não ter feito prova bastante da existência do acordo comum

78      Segundo a jurisprudência, a Comissão deve apresentar provas das infracções por ela declaradas e os elementos adequados a provar de modo bastante a existência dos factos constitutivos de uma infracção (v. acórdão do Tribunal Geral de 27 de Setembro de 2006, Dresdner Bank e o./Comissão, T‑44/02 OP, T‑54/02 OP, T‑56/02 OP, T‑60/02 OP e T‑61/02 OP, Colect., p. II‑3567, n.° 59, e jurisprudência aí referida).

79      Neste contexto, a existência de uma dúvida no espírito do julgador deve beneficiar a empresa destinatária da decisão que declara a existência de uma infracção. O juiz não pode, portanto, concluir que a Comissão fez prova bastante da existência da infracção em causa se ainda subsistir no seu espírito uma dúvida quanto a essa questão, nomeadamente no âmbito de um recurso de anulação de uma decisão que aplica uma coima (acórdão Dresdner Bank e o./Comissão, n.° 78 supra, n.° 60).

80      Com efeito, nesta última situação, é necessário ter em conta o princípio da presunção de inocência, tal como resulta, nomeadamente, do artigo 6.°, n.° 2, da Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma em 4 de Novembro de 1950, o qual faz parte dos direitos fundamentais que constituem princípios gerais do direito comunitário. Atenta a natureza das infracções em causa, bem como a natureza e o grau de severidade das sanções aplicáveis, o princípio da presunção de inocência aplica‑se, nomeadamente, aos processos atinentes a violações das regras de concorrência aplicáveis às empresas susceptíveis de conduzir à aplicação de coimas ou de sanções pecuniárias compulsórias (v., neste sentido, acórdão Dresdner Bank e o./Comissão, n.° 78 supra, n.° 61, e jurisprudência aí referida).

81      Assim, é necessário que a Comissão apresente provas precisas e concordantes para demonstrar a existência da infracção. No entanto, deve salientar‑se que cada uma das provas apresentadas pela Comissão não tem necessariamente de satisfazer esses critérios relativamente a cada elemento da infracção. Basta que o conjunto de indícios invocado pela instituição, apreciado globalmente, satisfaça essa exigência (v. acórdão Dresdner Bank e o./Comissão, n.° 78 supra, n.os 62 e 63, e jurisprudência aí referida).

82      Além disso, tendo em conta o carácter notório da proibição dos acordos anticoncorrenciais, não se pode exigir à Comissão que apresente documentos que comprovem de forma explícita a existência de contactos entre os operadores em causa. Os elementos fragmentários e dispersos de que a Comissão eventualmente dispõe devem, em qualquer caso, poder ser completados por deduções que permitam a reconstituição das circunstâncias pertinentes. Por conseguinte, a existência de uma prática ou de um acordo anticoncorrencial pode ser inferida de um determinado número de coincidências e de indícios que, considerados no seu todo, podem constituir, na falta de outra explicação coerente, a prova de uma violação das regras da concorrência (v. acórdão Dresdner Bank e o./Comissão, n.° 78 supra, n.os 64 e 65, e jurisprudência aí referida).

83      A este respeito, a recorrente alega que já não há lugar à aplicação das normas mais flexíveis em matéria de prova, associadas às dificuldades com que a Comissão se defronta ao tentar provar uma infracção. Na sua opinião, em primeiro lugar, o Regulamento n.° 1/2003 do Conselho, de 16 de Dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.° [CE] e 82.° [CE] (JO L 1, p. 1) reforçou os poderes da Comissão neste domínio. Em segundo lugar, no presente processo, a Comissão recebeu um número significativo de elementos de prova graças ao seu programa de clemência. Em terceiro lugar, devido à utilização das tecnologias modernas, havia múltiplas cópias dos documentos relativos aos membros do cartel em vários computadores. Segundo a recorrente, os documentos em causa podem, assim, ser procurados e identificados mais facilmente e o seu conteúdo pode ser reconstituído mesmo depois de terem sido apagados

84      No entanto, estes argumentos da recorrente não podem ser acolhidos. Com efeito, em primeiro lugar, embora decorre do considerando 25 do Regulamento n.° 1/2003 que o reforço dos poderes da Comissão tem por objectivo permitir detectar, designadamente, infracções ao artigo 81.° CE, este reforço não garante, por si mesmo, que possam efectivamente ser recolhidos com maior facilidade elementos probatórios pela Comissão num dado caso. A mesma observação é aplicável, em segundo lugar, ao programa de clemência. Com efeito, para poderem ser validamente invocados pela Comissão enquanto provas de uma infracção, os elementos recebidos das empresas interessadas devem, em quaisquer circunstâncias, cumprir os critérios jurisprudenciais aplicáveis. Assim, a existência de pedidos de clemência em si mesma não simplifica necessariamente o papel da Comissão. Em terceiro lugar, o impacto da proliferação dos ficheiros informáticos é compensado pelas medidas técnicas adoptadas a este respeito pelos membros do cartel. No caso em apreço, resulta dos considerandos 173 a 175 da decisão impugnada que as partes encriptaram os documentos pertinentes com o auxílio de ferramentas informáticas e que foram utilizadas caixas de correio electrónico anónimas para efectuar as comunicações relativas à actividades ilícita. Por um lado, não está provado que a recorrente tenha recusado sistematicamente aderir a estas medidas, dado que os elementos do processo não indicam uma oposição duradoura. Por outro, resulta destes mesmos elementos que, quando a recorrente não utilizava a encriptação e as caixas de correio electrónico anónimas, a comunicação com ela era efectuada por telefone e por telecópia, e não por correio electrónico ou por outra forma de troca de ficheiros informáticos.

85      Além disso, quando a Comissão se apoia unicamente na conduta das empresas em causa no mercado para concluir pela existência de uma infracção, basta a estas últimas demonstrar a existência de circunstâncias que dão uma explicação diferente dos factos provados pela Comissão e que deste modo permitem substituir a explicação da Comissão que levou a concluir pela existência de uma violação das regras da concorrência comunitárias por outra explicação plausível dos factos (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 8 de Julho de 2004, JFE Engineering e o./Comissão, T‑67/00, T‑68/00, T‑71/00 e T‑78/00, Colect., p. II‑2501, n.° 186, e jurisprudência aí referida).

86      Como argumenta a recorrente, esta regra é igualmente aplicável quando os elementos de prova em que se apoia a Comissão são insuficientes. Com efeito, neste caso, os referidos elementos não permitem demonstrar a existência da infracção, sem equívocos e sem que seja necessária uma interpretação (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 12 de Setembro de 2007, Coats Holding e Coats/Comissão, T‑36/05, não publicado na Colectânea, n.° 74).

87      Em contrapartida, contrariamente ao que indica a recorrente, a referida regra não é aplicável a todos os casos em que a infracção é demonstrada por dedução a partir de outros factos, através de provas indirectas ou não documentais. Com efeito, no que respeita aos meios de prova que podem ser invocados para demonstrar a violação do artigo 81.° CE, o princípio que prevalece no direito comunitário é o da livre administração da prova (acórdão do Tribunal Geral de 8 de Julho de 2004, Dalmine/Comissão, T‑50/00, Colect., p. II‑2395, n.° 72). A jurisprudência referida é aplicável, por analogia, ao artigo 53.° do acordo EEE.

88      Por conseguinte, ainda que as circunstâncias evocadas pela recorrente, presumindo‑as demonstradas, possam mostrar‑se pertinentes no quadro da apreciação global do conjunto de indícios invocados pela Comissão, em si mesmas, não têm por consequência permitir que a empresa em questão ponha em causa as alegações da Comissão apresentando uma explicação alternativa dos factos.

89      Além disso, nenhuma disposição nem nenhum princípio geral de direito comunitário proíbe a Comissão de invocar contra uma empresa as declarações de outras empresas acusadas de terem participado no cartel. Se assim não fosse, o ónus da prova dos comportamentos contrários ao artigo 81.° CE, que incumbe à Comissão, seria insustentável e incompatível com a missão de velar pela boa aplicação dessas disposições (acórdão JFE Engineering e o./Comissão, n.° 85 supra, n.° 192). A jurisprudência referida é aplicável, por analogia, ao artigo 53.° do acordo EEE.

90      No entanto, a declaração de uma empresa acusada de ter participado num cartel, cuja exactidão é contestada por várias outras empresas acusadas, não pode ser considerada prova suficiente da existência de uma infracção cometida por estas últimas sem ser sustentada noutros elementos de prova, podendo o grau de confirmação exigido ser menor devido à fiabilidade das declarações em causa (acórdão JFE Engineering e o./Comissão, n.° 85 supra, n.os 219 e 220).

91      Quanto ao valor probatório dos diversos elementos de prova, o único critério pertinente para apreciar as provas apresentadas reside na sua credibilidade (acórdão Dalmine/Comissão, n.° 87, supra, n.° 72).

92      Segundo as regras gerais em matéria de prova, a credibilidade e, portanto, o valor probatório de um documento dependem da sua origem, das circunstâncias da sua elaboração, do seu destinatário e do seu conteúdo (acórdão do Tribunal Geral de 15 de Março de 2000, Cimenteries CBR e o./Comissão, T‑25/95, T‑26/95, T‑30/95 a T‑32/95, T‑34/95 a T‑39/95, T‑42/95 a T‑46/95, T‑48/95, T‑50/95 a T‑65/95, T‑68/95 a T‑71/95, T‑87/95, T‑88/95, T‑103/95 e T‑104/95, Colect., p. II‑491, n.os 1053 e 1838).

93      Quanto às declarações, pode, além disso, ser reconhecido um valor probatório particularmente elevado às que, em primeiro lugar, são fiáveis, em segundo lugar, são feitas em nome de uma empresa, em terceiro lugar, são provenientes de uma pessoa que tem a obrigação profissional de agir no interesse dessa sociedade, em quarto lugar, são contrárias aos interesses do declarante, em quinto lugar, resultam de um testemunho directo das circunstâncias que relatam e, em sexto lugar, foram prestadas por escrito, de forma deliberada e após séria reflexão (v. neste sentido, acórdão JFE Engineering e o./Comissão, n.° 85, supra, n.os 205 a 210).

94      Além disso, embora se devam geralmente encarar com certa desconfiança os depoimentos voluntários dos principais participantes num cartel ilícito, tendo em conta a possibilidade, invocada pela recorrente, de esses participantes tenderem a facultar o maior número de elementos de acusação relativos aos seus concorrentes, não é menos verdade que o facto de se requerer o benefício da aplicação da comunicação sobre a cooperação a fim de obter uma imunidade ou uma redução da coima não cria necessariamente um incentivo para apresentar elementos de prova deformados em relação aos outros participantes no cartel. Com efeito, qualquer tentativa de induzir a Comissão em erro pode pôr em causa a sinceridade bem como a integridade da cooperação do requerente e, portanto, pôr em risco a possibilidade de este beneficiar plenamente da comunicação sobre a cooperação (V., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 16 de Novembro de 2006, Peróxidos Orgânicos/Comissão, T‑120/04, Colect., p. II‑4441, n.° 70).

95      Cumpre igualmente observar, a este respeito, que as consequências potenciais da comunicação de elementos deformados são tanto mais graves quanto a declaração contestada de uma empresa deva ser corroborada, como resulta do n.° 90, supra. Com efeito, esta circunstância aumenta o risco de que sejam identificadas declarações inexactas tanto pela Comissão como pelas outras empresas envolvidas.

96      No que respeita à aplicação destas regras ao caso em apreço, cumpre recordar, a título liminar, que, segundo as observações efectuadas na decisão impugnada, o acordo comum era um acordo não escrito que englobava, em primeiro lugar, o compromisso das empresas japonesas de não penetrarem no mercado dos projectos de MCIG no Espaço Económico Europeu (EEE), em segundo lugar, o compromisso das empresas europeias de não penetrarem no mercado japonês dos projectos de MCIG e, em terceiro lugar, o compromisso das empresas europeias de notificarem as empresas japonesas dos projectos de MCIG em países europeus distintos dos países construtores e de contabilizarem estes mesmos projectos na quota conjunta «europeia» prevista pelo GQ. Segundo a Comissão, o objectivo do mecanismo de notificação e de contabilização consistia em oferecer uma compensação às empresas japonesas, consideradas como concorrentes potenciais no mercado do EEE pelas empresas europeias.

97      Entre as diversas componentes do acordo comum enumeradas no n.° 96 supra, o alegado compromisso das empresas japonesas de não penetrarem no mercado do EEE é que constitui o fundamento da acusação da Comissão contra a recorrente. Por conseguinte, é a existência desse acordo que deve ser provada. No entanto, as outras componentes do acordo comum, se forem provadas, podem mostrar‑se relevantes enquanto provas indirectas que permitem deduzir a existência do correspondente compromisso das empresas japonesas.

98      A recorrente impugna a existência do acordo comum e a sua participação neste último. Critica o valor probatório dos diversos elementos avançados pela Comissão na decisão impugnada e refere outros elementos que, segundo ela, sugerem que o referido acordo não existiu. Por conseguinte, a recorrente considera que a Comissão tinha a obrigação de aceitar a explicação alternativa da ausência dos produtores japoneses do mercado dos projectos de MCIG no EEE, associada à existência dos obstáculos jurídicos, técnicos e comerciais à entrada neste mesmo mercado. Ao adoptar, nestas circunstâncias, a decisão impugnada, a Comissão inverteu o ónus da prova, violou o princípio de presunção de inocência e excedeu a sua competência.

99      A Comissão argumenta que a existência do acordo comum e, em particular, o compromisso das empresas japonesas de não penetrarem no EEE, é suficientemente demonstrada por um conjunto de provas que incluem provas documentais, declarações de empresas, depoimentos e elementos relativos ao funcionamento efectivo do cartel.

100    Cabe, pois, apreciar a fiabilidade e o conteúdo dos diferentes elementos em causa a fim de verificar se, globalmente considerados, os elementos invocados pela Comissão sustentam uma convicção firme quanto à existência do acordo comum que não seja susceptível de ser posta em causa pelos elementos aduzidos pela recorrente.

101    As alegações da recorrente relativas à violação do princípio de presunção de inocência e de que a Comissão excedeu a sua competência, por sua vez, baseiam‑se na premissa de que a Comissão não fez prova da existência do acordo comum e da participação da recorrente neste último. Por conseguinte, se os argumentos da recorrente relativos à prova da existência da infracção e da participação da recorrente nesta última vierem a ser afastados, isso implicará necessariamente que as alegações relativas à violação do princípio de presunção da inocência e de que a Comissão excedeu a sua competência deverão sê‑lo igualmente. Em contrapartida, se se concluir que a participação da recorrente na alegada infracção não foi demonstrada na decisão impugnada, essa verificação justificará, por si só, a anulação desta última na medida em que respeita à recorrente.

 Quanto aos elementos apresentados pela ABB

–       Argumentos das partes

102    A recorrente contesta que os diferentes elementos apresentados pela ABB constituam uma prova do acordo comum.

103    A título liminar, a recorrente sustenta que, de maneira geral, os elementos apresentados pela ABB têm fraco valor probatório devido ao facto de a ABB beneficiar de uma imunidade condicional. Afirma que as declarações da ABB já não contribuíam para a sua própria acusação. Em contrapartida, a ABB teria podido ser fortemente incitada a responder às questões da Comissão de uma maneira que confirmasse a existência do cartel, tendo em conta que continuava a correr o risco de perder o benefício da imunidade no caso de a sua cooperação ser considerada insuficiente. Portanto, há que adoptar uma abordagem crítica em relação aos elementos de prova provenientes da ABB.

104    Além disso, a recorrente põe em causa o valor probatório de cada elemento apresentado pela ABB considerado separadamente. Em primeiro lugar, sustenta que a declaração da ABB de 11 de Março de 2004, que confirma a existência do acordo comum, é ambígua, uma vez que a ABB admitiu igualmente que não existia qualquer acordo expresso e que o acordo comum se baseava no contexto factual, ou seja, no facto de as empresas japonesas serem aceites pelos clientes europeus apenas de forma restrita e serem confrontadas com certas dificuldades técnicas e jurídicas se pretendessem penetrar no mercado europeu. Do mesmo modo, segundo a ABB, os produtores japoneses participavam no cartel apenas na medida em que o mesmo abrangia territórios localizados fora do EEE.

105    Em segundo lugar, a recorrente questiona‑se sobre o depoimento prestado por M., um ex‑empregado da ABB, na entrevista que teve lugar em 23 de Setembro de 2005. A este respeito, sustenta que a vontade da ABB de apoiar a teoria da Comissão se manifestou pelos esforços do seu consultor externo em orientar as declarações de M. a fim de este último admitir que a penetração do mercado europeu pelos produtores japoneses podia tornar‑se rentável após um certo tempo.

106    A recorrente acrescenta que M. já não era empregado da ABB no momento da reunião, o que implica que não tinha a obrigação de agir no interesse desta última. Do mesmo modo, o facto de M. ter negado as suas declarações ilustrava a pressão exercida sobre ele, mais do que a sua vontade de prestar informações exactas.

107    A recorrente sustenta igualmente que as declarações de M. relativas à existência do acordo comum são «prova por ouvir dizer» pouco convincente. Segundo ela, M. declarou que não estava presente quando o acordo comum foi celebrado e que este último não tinha sido mencionado nas reuniões em que participou. Portanto, estas declarações baseavam‑se na opinião pessoal de M. quanto à existência de um cartel. A recorrente observa, a este respeito, que, supondo que o acordo comum tivesse existido, seria legítimo esperar que, dada a suposta importância do mesmo, as empresas que apresentaram um pedido de clemência apresentassem elementos de prova existentes no momento dos factos controvertidos.

108    Quanto ao conteúdo das declarações de M., a recorrente argumenta que este último, embora tenha declarado que a celebração de um acordo relativo a mercados estrangeiros pressupunha a existência de um acordo relativo aos países construtores dos diferentes participantes, explicou igualmente que, se eventualmente fosse possível aos produtores japoneses penetrarem no mercado europeu, esse esforço não teria sido rentável. A seguir, em 4 de Outubro de 2005, o consultor externo da ABB apresentou uma nova declaração, que visaria clarificar as declarações anteriores de M. e declarava formalmente a existência do acordo comum. Segundo a recorrente, estes dois elementos são contraditórios e, portanto, não podem ser invocados.

109    Em terceiro lugar, a recorrente sustenta que as declarações de W. e de P., empregados da ABB, são «vagas especulações», assentes em opiniões pessoais não fundamentadas. Assim, quando W. foi interrogado sobre os motivos da recusa dos produtores japoneses em participar em concursos para MCIG na Europa, não se referiu ao acordo comum. Em contrapartida, em declarações anteriores, explicou que a existência dos obstáculos «elevados» dificultava a penetração do mercado europeu.

110    A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal Geral

111    A título liminar, decorre dos n.os 94 e 95 supra que não há que tratar automaticamente com circunspecção elementos fornecidos por uma empresa que tenha requerido o benefício de uma imunidade de coimas. No que respeita ao caso específico dos depoimentos, é certamente possível que os empregados dessa empresa, que têm o dever de actuar no interesse desta, partilhem a vontade de apresentar tantos elementos de acusação quanto possível, considerando igualmente que a sua cooperação no âmbito do processo pode ter uma influência positiva no seu futuro profissional. No entanto, se assim for, os empregados em causa estarão igualmente conscientes das consequências negativas potenciais da apresentação de elementos inexactos, que se tornam mais sensíveis devido à exigência de confirmação.

112    Quanto a M., a recorrente argumenta, com razão, que um ex‑empregado, em princípio, já não tem a obrigação de agir no interesse do seu antigo empregador no que respeita à cooperação voluntária num procedimento administrativo. No entanto, esta circunstância implica igualmente que, em princípio, não tem interesse em apresentar elementos inexactos nesse contexto. A este propósito, cumpre salientar que, no momento da apresentação do seu testemunho, M. já se encontrava aposentado. Nestas circunstâncias, não parece que a sua falta de cooperação no procedimento administrativo tivesse consequências desfavoráveis para ele.

113    Além disso, não se pode considerar que os elementos fornecidos pela ABB não eram susceptíveis de ter efeitos prejudiciais para a mesma. Com efeito, na medida em que os referidos elementos foram apresentados antes do envio da comunicação de acusações, nem a ABB nem os seus empregados e o seu ex‑empregado podiam ter certezas quanto ao alcance e conteúdo exacto das acusações que iam ser feitas à ABB.

114    Quanto aos diferentes elementos invocados pela recorrente, em primeiro lugar, nas suas observações de 11 de Março de 2004, ou seja, antes de a imunidade condicional lhe ter sido concedida, a ABB invocou expressamente a existência de um acordo comum por força do qual as sociedades japonesas não iam apresentar propostas para os projectos europeus e as sociedades europeias não iam apresentar propostas para os projectos japoneses.

115    É verdade que a ABB declarou que o acordo comum se baseava na circunstância de os produtores japoneses não serem bem aceites pelos clientes europeus e terem que enfrentar certos obstáculos no mercado europeu. No entanto, decorre inequivocamente das suas observações de 11 de Março de 2004 que, segundo ela, as empresas japonesas envolvidas não se limitaram a verificar a existência destes obstáculos, tendo‑se comprometido, perante os seus parceiros, a não penetrar no mercado do EEE. Assim, os obstáculos à entrada no referido mercado constituiriam um factor que levou à celebração do referido acordo. Além disso, há que salientar que isso não é paradoxal, uma vez que é natural um produtor, no âmbito de uma repartição de mercados como a alegada pela Comissão no caso em apreço, deixar para os seus concorrentes os mercados em que a sua posição é frágil.

116    Além disso, é verdade que a ABB declarou que não existia qualquer acordo expresso com os produtores japoneses quanto à manipulação dos concursos públicos, quanto à fixação dos preços e quanto à repartição dos projectos no EEE. No entanto, lida no seu contexto, esta declaração reporta‑se à repartição dos mercados nacionais entre os produtores europeus ou à repartição de projectos de AIG no EEE. Portanto, não contradiz a existência do compromisso geral das empresas japonesas de não penetrarem no mercado do EEE, claramente explicitado pela ABB. Por outro lado, não se pode observar qualquer incoerência nas declarações da ABB. Com efeito, na medida em que, segundo a ABB, as empresas japonesas se tinham comprometido a não penetrar no mercado do EEE, não teria sido útil para elas celebrar acordos detalhados com os produtores europeus no que respeita à repartição de projectos de MCIG nesse mesmo mercado.

117    À luz de tudo o que precede, há que concluir que as declarações da ABB de 11 de Março de 2004 não são ambíguas e constituem indícios da existência do acordo comum.

118    Em segundo lugar, há que admitir que o consultor externo da ABB interveio num momento exacto da entrevista de M. para lhe sugerir que podia ser rentável para os produtores japoneses penetrar no mercado europeu, facto de que M. não parecia convencido. Por conseguinte, há que considerar que M. manifestava dúvidas quanto ao interesse comercial dessa diligência, devendo-se e ter em conta esta circunstância na apreciação do conteúdo do seu depoimento. No entanto, a recorrente não explica em que medida esta intervenção do consultor externo da ABB afecta a credibilidade do depoimento de M. quanto a outros aspectos.

119    Além disso, a recorrente alega acertadamente que o testemunho de M. não parece ser o resultado de uma reflexão aprofundada e que também não foi revisto após reflexão e verificações suplementares. Com efeito, o depoimento foi prestado verbalmente e não há qualquer indício de que anteriormente tenham sido apresentadas questões escritas pela Comissão a M. nem de que as declarações relativas ao acordo comum e aos obstáculos à entrada no mercado do EEE tenham sido verificadas e revistas posteriormente por este último.

120    No entanto, a recorrente não apresenta elementos que permitam pensar que as eventuais revisões das declarações de M. tenham sido motivadas por qualquer pressão que ele tenha sofrido.

121    Por sua vez, a alegação da recorrente de que o testemunho de M. é apenas uma «prova por ouvir dizer», deve ser afastada. Com efeito, M. foi um dos representantes da ABB no consórcio entre 1988 e 2002, ou seja, durante quase todo o tempo de funcionamento do mesmo, quando a própria ABB era um dos principais actores. M. foi, pois, testemunha directa e privilegiada das circunstâncias que apresentou.

122    A este respeito, há que admitir que, no seu depoimento, M. confirmou que não estava presente na ocasião da celebração do acordo comum. Do mesmo modo, interrogado quanto à questão de saber se o tema do acordo comum foi suscitado nas reuniões a que assistiu, M. respondeu que não era necessário referi‑lo, dado que o acordo comum era evidente. No entanto, estas circunstâncias não põem em causa o valor probatório do depoimento de M. Com efeito, por um lado, uma testemunha pode perfeitamente apresentar a prova de um fenómeno duradouro mesmo que não tenha assistido ao seu início. Por outro, embora M. tenha declarado que a questão do acordo comum não foi discutida expressamente nas reuniões em que participou, resulta do seu depoimento que, em sua opinião, era assim porque o conteúdo do referido acordo estava compreendido, aceite e posto em prática pelos participantes no cartel sem que fosse necessária uma discussão expressa.

123    Neste contexto, cumpre observar que o compromisso de um grupo de produtores de não penetrarem num mercado reservado a outro grupo, como o compromisso de que a Comissão acusa os produtores japoneses, baseia‑se num conceito simples que pode ser executado facilmente. Do mesmo modo, esta execução, em princípio, não exige interacção entre as empresas em causa. Por conseguinte, este compromisso pode perfeitamente existir enquanto acordo não escrito, o que permite, além disso, reduzir o risco de que seja descoberto. A este respeito, resulta dos considerandos 170 a 176 da decisão impugnada que, no presente caso, os participantes no cartel adoptaram uma série de precauções organizativas e técnicas a fim de evitarem a divulgação do mesmo.

124    Quanto ao conteúdo do depoimento de M., este declarou que existia entre os produtores japoneses e europeus um acordo relativo à protecção mútua dos mercados domésticos, anterior ao acordo GQ, que esse acordo era uma condição necessária para a celebração dos acordos relativos a outras regiões e que o respeito das regras do mesmo implicava que os produtores japoneses não penetrassem no mercado doméstico dos produtores europeus, mesmo que fossem capazes de o fazer no plano técnico. M. explicou igualmente, neste contexto, o mecanismo de notificação e de contabilização, bem como o facto de os projectos de MCIG nos países construtores não serem objecto de discussões entre os dois grupos de produtores e não serem imputados nas quotas previstas pelo acordo GQ.

125    Além disso, tal como acima observado no n.° 118, M. não estava convencido do interesse comercial das empresas japonesas em penetrarem no mercado europeu dos projectos de MCIG. No entanto, a posição de M., partilhada por P., não prejudica o facto de, tanto segundo as quatro testemunhas da ABB como segundo a própria ABB, as empresas japonesas se terem comprometido a não penetrar no mercado do EEE ainda que fossem capazes de o fazer no plano técnico.

126    Cumpre igualmente observar a este respeito que a possível falta de interesse comercial dos produtores japoneses em penetrarem no mercado do EEE num dado momento não torna a existência desse acordo, tal como o acordo comum, desprovida de objecto. Com efeito, esse acordo é susceptível, por um lado, de eliminar o risco residual da penetração futura dos mercados em causa em caso de alteração de situação concorrencial e de garantir assim uma segurança a longo prazo aos dois grupos de produtores, estabilizando as respectivas posições privilegiadas. Por outro lado, pode constituir a base de uma confiança mútua entre os dois grupos. Ora, segundo as declarações de M., essa confiança era necessária para aplicar o cartel à escala mundial.

127    Em face do exposto, importa concluir que o depoimento de M. constitui um indício da existência do acordo comum.

128    Em terceiro lugar, contrariamente ao que alega a recorrente, Wi. declarou que a ausência das empresas japonesas do mercado europeu era o resultado de um sistema de protecção dos mercados japonês e europeu, motivado pelo facto de cada um dos dois grupos de produtores não pretender que o outro grupo interviesse no seu mercado doméstico. Do mesmo modo, P. referiu‑se espontaneamente a um acordo comum com as empresas japonesas nos termos do qual estas últimas não participariam no mercado europeu e as empresas europeias não iam participariam no mercado japonês. Assim, os depoimentos de Wi. E de P. não poderiam ser qualificados como «vagas especulações», constituindo, pelo contrário, elementos que confirmam a existência do acordo comum.

129    A mesma observação é, aliás, aplicável ao último depoimento apresentado por iniciativa da ABB e fornecido por V.‑A. Interrogado sobre a existência de um qualquer acordo entre os produtores europeus e japoneses, este último referiu um acordo entre os produtores japoneses e europeus por força do qual as empresas europeias não iam «atacar» as empresas japonesas no mercado japonês e vice‑versa. Além disso, V.‑A. declarou que participou numa discussão expressa entre as empresas europeias e o representante de uma empresa japonesa sobre o cumprimento deste acordo, suscitada por tentativas das empresas japonesas de penetrarem no mercado europeu.

130    Em conclusão, cumpre observar que as declarações e depoimentos apresentados pela ABB constituem elementos susceptíveis de provar o acordo comum, uma vez que a existência desse acordo é referida, o conteúdo essencial deste acordo está descrito e são prestadas indicações quanto à sua duração e aos seus participantes.

131    Os elementos apresentados pela ABB são igualmente coerentes no que respeita à existência e ao conteúdo fundamental do acordo comum. Embora exista uma divergência no que respeita ao interesse comercial das empresas japonesas em penetrarem no mercado europeu, isso não é relevante para o caso, face às declarações relativas à existência do acordo comum, tal como acima referido no n.° 125.

132    Além disso, as declarações da ABB foram prestadas em nome de uma empresa e decorre do seu conteúdo que se baseiam em investigações internas e em discussões com trabalhadores da empresa. Portanto, há que reconhecer‑lhes um certo nível de valor probatório.

133    As declarações prestadas pelas quatro testemunhas em causa, por sua vez, são credíveis, tendo em conta que são provenientes de testemunhas directas das circunstâncias relatadas e das circunstâncias do caso não decorre que as referidas testemunhas tenham sido motivadas a apresentar elementos deformados. Assim, cumpre reconhecer‑lhes um valor probatório elevado.

134    No entanto, segundo a jurisprudência referida no n.° 90 supra, o conteúdo das declarações e dos depoimentos prestados pela ABB deve, em qualquer caso, ser confirmado por outros elementos.

 Quanto à confirmação dos elementos apresentados pela ABB

–       Argumentos das partes

135    A recorrente sustenta que, na decisão impugnada, a Comissão não indica elementos suficientes que corroborem os elementos apresentados pela ABB e não se refere designadamente a qualquer elemento de prova existente no momento dos factos controvertidas.

136    Em primeiro lugar, a alegação da Fuji de que esta estava consciente do acordo comum, feita na sua resposta à comunicação de acusações, não era fundada nem explicada e, portanto, correspondia apenas a uma tese unilateral da sua parte. Além disso, não especificava se era a única parte no alegado acordo, se se tratava de um acordo dos produtores europeus ou antes se os produtores japoneses estavam igualmente envolvidos. Acresce que, no seu pedido de clemência de 11 de Julho de 2006, a Fuji não mencionou a existência do acordo comum. Este último também não foi referido nos cinco testemunhos dos empregados da Fuji apresentados pela mesma.

137    Segundo a recorrente, as declarações posteriores da Fuji que alegadamente confirmam a existência do acordo comum, designadamente a sua declaração de 21 de Novembro de 2006, não lhe foram comunicadas e, portanto, não podem ser tidas em consideração.

138    Além disso, o reduzido valor probatório dos elementos apresentados pela Fuji era confirmado pelo facto de esta última não ter beneficiado de qualquer clemência por parte da Comissão em troca da sua comunicação.

139    Em segundo lugar, quanto à afirmação de que a Alstom e a Areva não impugnaram a existência do acordo comum e a VA TECH não o impugnou abertamente, a recorrente sustenta que a equiparação do silêncio a uma confissão constituiria uma violação do direito de não se acusar a si mesmo e dos princípios fundamentais em matéria de prova. Além disso, do ponto de vista prático, a existência do acordo comum teria sido, em larga medida, desprovida de pertinência para os produtores europeus, e o seu silêncio teria, assim, sido previsível. Ao nível processual, a recorrente observa que, não tendo tido acesso aos documentos em causa, não teve a possibilidade de verificar a procedência da alegação da Comissão. Além disso, considera que a VA TECH efectivamente contestou a existência do acordo comum.

140    Em terceiro lugar, a recorrente argumenta que a sua simples participação nas reuniões com produtores europeus no quadro do acordo GQ não é pertinente no que respeita à existência do acordo comum.

141    A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal Geral

142    Em primeiro lugar, no que respeita aos elementos fornecidos pela Fuji, resulta dos n.os 51 a 53 supra que as observações que não foram comunicadas à recorrente, designadamente as observações da Fuji, de 21 de Novembro de 2006, não podem ser invocadas como um elemento de acusação. Por conseguinte, as referidas observações não são susceptíveis de corroborar o conteúdo dos elementos apresentados pela ABB.

143    Em contrapartida, na sua resposta à comunicação de acusações, cuja passagem pertinente foi comunicada à recorrente, a Fuji declarou que tinha conhecimento do acordo comum por força do qual os produtores japoneses não tentariam penetrar no mercado europeu, enquanto especificava que a principal razão da ausência da Fuji do mercado do EEE era não se tratar de um fornecedor significativo credível dos MCIG na Europa.

144    Há que admitir que esta declaração é relativamente vaga, uma vez que a Fuji se limita a evocar o compromisso dos produtores japoneses de não penetrarem no mercado europeu. No entanto, fazendo‑o, a Fuji corroborou o elemento essencial decorrente dos elementos apresentados pela ABB e de que a Comissão acusou os produtores japoneses. Assim, a declaração em causa não deixa de ser pertinente no presente caso. Isso é tanto mais verdade quanto o alcance limitado dos conhecimentos da Fuji pode ser explicado pelo seu papel secundário no interior do cartel e, em especial, pelo facto de, tal como decorre do considerando 150 da decisão impugnada, a Fuji ser a única empresa japonesa que não era membro do comité do grupo dos produtores japoneses, responsável designadamente pela concertação entre os dois grupos no âmbito do acordo GQ.

145    No que respeita aos empregados da Fuji, importa observar que estes últimos não negaram a existência do acordo comum, tendo apenas mantido o silêncio quanto a este aspecto. Assim, o conteúdo das declarações dos empregados da Fuji não põe em causa o valor probatório da declaração da Fuji na sua resposta à comunicação de acusações.

146    Quanto ao conteúdo do pedido de clemência, decorre do ponto 21 da comunicação sobre a cooperação que, para que possa ser atribuída uma redução de coima pela Comissão, os elementos de prova em causa devem assumir um valor probatório significativo em relação aos elementos de que a Comissão já dispõe. Por conseguinte, num pedido de clemência apresentado após o envio da resposta à comunicação de acusações, é legítimo que a empresa que pretenda obter uma redução da coima se concentre nos elementos em relação aos quais, em sua opinião, até ao momento não houve prova bastante, com o objectivo de apresentar um valor acrescentado significativo. Ora, esta circunstância pode explicar que a empresa em causa omita os elementos que considera como provados sem qualquer dúvida por elementos comunicados anteriormente.

147    Do mesmo modo, face à redacção do ponto 21 da comunicação sobre a cooperação, não se pode excluir que a apresentação de elementos dotados de uma certa força probatória, mas relativos a factos já provados por outros elementos, não dê lugar a qualquer redução.

148    Em segundo lugar, decorre do excerto da transcrição da audição da VA TECH que, na referida audição, esta negou expressamente a existência do acordo comum. Portanto, a alegação da Comissão de que não é assim não corresponde aos factos.

149    No que respeita à posição alegadamente neutra da Alstom e da Areva, a Comissão sustenta que não se baseou nesta circunstância para concluir pela existência do acordo comum, tendo‑se limitado a verificá‑la. Esta interpretação, embora seja confirmada pela redacção do considerando 125 da decisão impugnada, em que não é reconhecido qualquer valor de confirmação à posição da Alstom, da Areva e da VA TECH, contrariamente às declarações da Fuji que confirmam a existência do acordo comum, é posta em causa pelo considerando 255 da referida decisão, em que a Comissão se refere ao reconhecimento implícito da existência do acordo comum por certos produtores europeus. Em quaisquer circunstâncias, a posição neutra da Alstom e da Areva não pode ser interpretada como uma prova da existência do acordo comum. Com efeito, atento o ónus da prova que recai sobre a Comissão no âmbito de um procedimento de aplicação do artigo 81.° CE e do artigo 53.° do acordo EEE, a não impugnação de um facto por uma empresa não prova o facto em questão.

150    Em terceiro lugar, como sustenta a recorrente, o simples facto de ter participado nas reuniões do acordo GQ não constitui uma prova da existência do acordo comum. Com efeito, a questão pertinente consiste em saber se, como refere a Comissão, o referido acordo era aplicado pelos diferentes participantes simultaneamente com o acordo GQ e em conexão com este último.

151    Em quarto lugar, resulta do considerando 127 da decisão impugnada que, na reunião de 10 de Julho de 2002 em que foi discutida a evolução dos métodos de funcionamento do cartel depois de a Siemens e a Hitachi terem retomado a sua participação no mesmo, a Alstom apresentou uma proposta segundo a qual os produtores europeus deviam permanecer na Europa e os produtores japoneses deviam permanecer no Japão e não tentarem penetrar no mercado europeu. Além disso, especifica‑se nesse considerando que, na reunião subsequente de 15 de Julho de 2002, o representante da Hitachi indicou que esta última recusava esta proposta, que os produtores europeus reagiram declarando que a Europa, incluindo a Europa Central e Oriental, era o seu mercado e que pretendiam manter os preços praticados na Europa Ocidental e anunciaram que a questão ia ser novamente discutida se assim não fosse.

152    À primeira vista, este resumo das reuniões de 10 e 15 de Julho de 2002, baseado em elementos fornecidos pela Hitachi, leva a crer que a Alstom propôs a celebração de um novo acordo que foi recusado pela Hitachi e não foi discutido posteriormente, o que implicava que, pelo menos a partir de Julho de 2002, não existiu qualquer acordo relativo ao comportamento dos produtores japoneses no mercado do EEE.

153    No entanto, o resumo da reunião de 15 de Julho de 2002 revela, por um lado, que a Hitachi não rejeitou a própria ideia de uma repartição de mercados mas apenas a proposta concreta da Alstom. Por outro lado, indica‑se nesse resumo que a Hitachi tinha referido que as reivindicações dos produtores europeus incluíam a Europa Central e Ocidental, o que deixa entender que a sua oposição se prendia com este aspecto específico, mas não com a situação na Europa Ocidental.

154    Importa igualmente observar que a apresentação da proposta em apreço pela Alstom põe em causa a argumentação da recorrente no que respeita à situação concorrencial no mercado do EEE. Com efeito, supondo que, tal como refere a recorrente, os produtores japoneses não tenham sido considerados concorrentes credíveis no mercado do EEE devido à existência de obstáculos intransponíveis à entrada, um acordo relativo a esse mesmo mercado teria efectivamente sido inútil. Nesta hipótese, os produtores europeus, conscientes dessa circunstância graças à sua posição privilegiada na Europa, não teriam qualquer motivação para propor tal acordo. Ora, resulta do resumo apresentado pela Hitachi que a proposta da Alstom efectivamente abrangia tanto o mercado do EEE como o da Europa Central e Oriental.

155    Nestas circunstâncias, há que acolher a interpretação segundo a qual, na reunião de 10 de Julho de 2002, a Alstom propôs o alargamento do acordo comum, tal como alegado pela Comissão, aos países da Europa Central e Oriental.

156    Em quinto lugar, como se observa no considerando 131 da decisão impugnada, o conteúdo do acordo EQ é, em certa medida, pertinente no que respeita à existência do acordo comum.

157    Com efeito, de acordo com o n.° 4 da parte «E (E‑Members)» do anexo 2 do acordo EQ, os produtores europeus «decidem sobre a notificação dos projectos ao [grupo dos produtores japoneses]». Decorre do contexto do anexo 2 que a comunicação das informações devia ter lugar antes da atribuição dos projectos de MCIG em causa.

158    Este elemento permite excluir, em certa medida, a argumentação da recorrente, uma vez que sugere que os produtores europeus consideravam que os produtores japoneses podiam estar interessados, pelo menos, pelo processo de atribuição de certos projectos de MCIG no EEE, e que eram, pois, concorrentes potenciais para esses projectos.

159    No entanto, nada no acordo EQ nem nos outros elementos avançados pela Comissão prova que o mecanismo em questão foi estabelecido pelos produtores europeus ou que os produtores japoneses sabiam da sua existência. Nestas circunstâncias, o acordo EQ constitui apenas um indício quanto à percepção das empresas japonesas pelos seus homólogos europeus.

160    À luz de tudo o que antecede, importa concluir, por um lado, que a declaração feita pela Fuji na sua resposta à comunicação de acusações visa confirmar os elementos apresentados pela ABB sobre a existência do acordo comum, sendo, todavia, limitado o seu valor probatório. Do mesmo modo, a proposta feita pela Alstom na reunião de 10 de Julho de 2002 constitui uma prova de que o acordo comum existia nesta última data. Além disso, o conteúdo do acordo EQ constitui um indício que leva a crer que os produtores japoneses eram considerados concorrentes credíveis para o fornecimento de determinados projectos de MCIG no EEE, tal como afirma a Comissão.

161    Por outro lado, nem a posição da VA TECH quanto à existência do acordo comum, nem a da Alstom, nem a da Areva, nem a simples participação da recorrente nas reuniões realizadas no âmbito do acordo GQ são elementos susceptíveis de corroborar os elementos apresentados pela ABB relativos à existência do referido acordo.

 Quanto ao mecanismo de notificação e de contabilização

–       Argumentos das partes

162    Em primeiro lugar, a recorrente alega que a argumentação da Comissão relativa ao mecanismo de notificação e de contabilização se baseia na alegação de que os produtores japoneses eram considerados como concorrentes potenciais no mercado dos projectos de MCIG no EEE. Entende que alegação é posta em causa pela declaração expressa da VA TECH segundo a qual era quase impossível para os produtores europeus proporem os seus produtos no Japão e vice‑versa, bem como pelo depoimento de M. do qual decorria que a penetração do mercado europeu não era rentável para os produtores japoneses. Por conseguinte, as alegações relativas à notificação e contabilização baseiam‑se numa premissa factual manifestamente inexacta. Além disso, neste contexto, o argumento da Comissão segundo o qual a existência da contabilização demonstra a ausência de obstáculos à entrada do mercado europeu e, consequentemente, a existência do acordo comum, é circular.

163    Em segundo lugar, a recorrente sustenta que as alegações da Comissão atinentes ao mecanismo de notificação e de contabilização não estão suficientemente demonstradas. Segundo ela, a argumentação da Comissão assenta no facto de os produtores japoneses serem sistematicamente informados dos projectos de MCIG nos países europeus distintos dos países construtores, a fim de poderem controlar a sua contabilização na quota conjunta «europeia». Ora, os elementos distintos das declarações da ABB invocados pela Comissão não demonstram nem o carácter sistemático da notificação nem a existência de uma distinção entre os países construtores e os outros países europeus.

164    A este respeito, a recorrente argumenta, antes de mais, que não era parte no acordo EQ e que, consequentemente, este último só pode ser considerado uma decisão unilateral dos produtores europeus. Além disso, segundo ela, o anexo 2 do referido acordo não prevê qualquer notificação sistemática aos produtores japoneses; pelo contrário, exclui‑a, uma vez que deixa aos produtores europeus a liberdade de decidir quanto à eventual notificação dos projectos europeus. Do mesmo modo, este texto não prevê qualquer contabilização dos projectos europeus na quota conjunta «europeia».

165    Depois, a lista dos projectos de MCIG, fornecida pela ABB, é um documento compilado pela ABB que não foi comunicado aos outros participantes no cartel. Portanto, segundo a recorrente, a referida lista não é uma prova da notificação sistemática dos projectos de MCIG na Europa às empresas japonesas.

166    Finamente, a passagem do pedido de clemência da Hitachi segundo a qual a Siemens fazia circular regularmente um quadro que sistematizava os projectos de MCIG atribuídos às empresas europeias e japonesas não especifica se as trocas em causa eram relativas a projectos de MCIG na Europa, e o contexto desta declaração sugere que tal não acontecia. Quanto à declaração constante da resposta da Hitachi à comunicação de acusações, segundo a qual a notificação era realizada a fim de permitir a contabilização, não é sustentada por qualquer outro produtor japonês e é mesmo especificamente refutada tanto pela recorrente como pela Fuji, tendo esta última indicado que não eram sistematicamente comunicadas aos produtores japoneses informações relativas à repartição dos projectos de MCIG na Europa.

167    Em terceiro lugar, a recorrente argumenta que o mecanismo de notificação e de contabilização descrito pela Comissão é complicado e não é aplicado automaticamente. Nestas circunstâncias, é pouco provável que não tenha sido mencionado no acordo GQ ou num outro documento existente no momento dos factos controvertidos.

168    Em quarto lugar, mesmo supondo que alguns projectos europeus tenham sido contabilizados na quota conjunta «europeia» prevista pelo acordo GQ, esta circunstância não é reveladora de uma infracção cometida pela recorrente. Segundo a recorrente, a contabilização só pode ter tido efeitos fora do território do EEE, uma vez que conferia direito a mais projectos fora desta zona, para os produtores japoneses. Ora, esta circunstância não equivale a uma infracção ao artigo 81.° CE e ao artigo 53.° do acordo EEE.

169    A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal Geral

170    A título liminar, cumpre observar que as alegações da Comissão quanto ao mecanismo de notificação e de contabilização não se baseiam exclusivamente na tese segundo a qual os produtores japoneses eram vistos como concorrentes credíveis no mercado do EEE. Com efeito, a Comissão considera que recolheu provas positivas da existência do referido mecanismo. Nestas circunstâncias, há que analisar o valor probatório dos elementos evidenciados pela Comissão para verificar se estes fazem prova bastante da existência do mecanismo de notificação e de contabilização, apesar da impugnação de certas empresas em causa.

171    Assim, há que referir que, no seu depoimento, M. afirmou que existia o mecanismo de notificação e de contabilização. Declarou igualmente que esse mecanismo não era respeitante aos projectos de MCIG nos países construtores, ou seja, no Japão e em certos países europeus. Em contrapartida, não alegou que a realidade ou a pertinência do referido mecanismo era posta em causa pelo facto de, em sua opinião, as empresas japonesas não terem interesse comercial em penetrar no mercado do EEE.

172    A existência de um mecanismo que consistia em imputar o valor dos projectos de MCIG no EEE na quota mundial prevista pelo acordo GQ foi igualmente afirmada nas declarações da ABB.

173    No que respeita ao acordo EQ, observou‑se no n.° 157 supra que o ponto 4 da parte «E (E‑Members)» do seu anexo 2 era dedicado à possível comunicação das informações que antecediam a repartição dos projectos de MCIG em causa. Em contrapartida, esta cláusula não abrangia o acompanhamento dos projectos já atribuídos. Por conseguinte, se o seu conteúdo constitui um indício que leva a crer que os produtores japoneses eram considerados como concorrentes credíveis para o fornecimento de certos projectos de MCIG no EEE, as medidas que estabelecia não fazem parte do mecanismo de notificação e de contabilização tal como alegado pela Comissão. Assim sendo, o anexo 2 do acordo EQ não é pertinente quanto à prova desse mesmo mecanismo.

174    Do mesmo modo, como alega a recorrente, não decorre da lista dos projectos apresentados pela ABB que tenham sido regularmente notificados aos produtores japoneses projectos de MCIG no EEE. Assim sendo, ela também não constitui uma prova do mecanismo de notificação e de contabilização.

175    Quanto aos elementos provenientes da Hitachi, cabe observar que, lida no contexto das frases imediatamente anteriores, a declaração de que a Siemens fazia circular regularmente os quadros que esquematizavam uma parte dos projectos de MCIG atribuídos aos diversos membros do cartel, remete para projectos de MCIG fora do EEE. Por conseguinte, esta declaração também não é pertinente quanto à prova do mecanismo de notificação e de contabilização, tal como alegado pela Comissão, que abrangia projectos de MCIG no EEE.

176    Em contrapartida, na sua resposta à comunicação de acusações, a Hitachi declarou que, antes de ter interrompido a sua participação no cartel em 1999, os produtores europeus comunicavam aos produtores japoneses os pormenores dos projectos de MCIG que iam fornecer na Europa, a fim de permitir que esses projectos fossem tidos em consideração na determinação da quota dos projectos de MCIG fora do EEE atribuídos aos dois grupos de produtores, nos termos do acordo GQ.

177    Esta declaração confirma expressamente a existência do mecanismo de notificação e de contabilização invocado pela Comissão até 1999. Além disso, a sua força probatória é elevada por duas razões. Por um lado, a referida declaração vai ao encontro dos interesses da Hitachi, uma vez que implica a existência de um nexo entre as actividades de conluio no EEE e os produtores japoneses, e, devido a esse facto, constitui um elemento de acusação. Por outro lado, verifica‑se, lendo a passagem em questão da resposta à comunicação de acusações, que a Hitachi não estava consciente das deduções que se podiam fazer a partir desta declaração.

178    Além disso, como acima referido no n.° 55, a Hitachi não refutou o conteúdo factual das suas declarações relativas ao mecanismo de notificação e de contabilização na sua resposta suplementar à comunicação de acusações.

179    Por sua vez, a Fuji, na sua resposta à comunicação de acusações, declarou que as informações relativas à repartição dos projectos de MCIG nos países europeus excluídos do âmbito de aplicação do acordo GQ não eram sistematicamente comunicadas aos produtores japoneses e que, consequentemente, a Fuji não estava a par do funcionamento do acordo EQ. A existência do mecanismo de notificação e de contabilização foi igualmente contestada pela recorrente, tal como decorre designadamente do excerto da transcrição da sua audição.

180    Cumpre, contudo, observar, por um lado, que as tomadas de posição da Fuji e da recorrente não são contrárias aos seus interesses, uma vez que visam contestar a existência de qualquer infracção ao artigo 81.° CE e ao artigo 53.° do acordo EEE. São, pois, dotadas de uma força probatória menos elevada do que os elementos pertinentes apresentados pela ABB e pela Hitachi.

181    Por outro lado, importa salientar que o papel secundário da Fuji no cartel, acima recordado no n.° 144, pode explicar o facto de a Fuji não participar em todas as trocas de informações oriundas do grupo dos produtores europeus. Esta circunstância põe igualmente em causa a fiabilidade das declarações da Fuji quanto a este aspecto em relação à dos elementos facultados pela ABB e pela Hitachi, que eram membros dos comités dos respectivos grupos e, por esta razão, estavam mais estreitamente associados ao funcionamento pormenorizado do alegado cartel.

182    Além disso, embora o mecanismo de notificação e de contabilização necessitasse de algumas medidas de execução, estas não eram especialmente complicadas, uma vez que consistiam essencialmente na comunicação de alguns dados pelo grupo europeu ao grupo japonês, a qual, além disso, era paralela à estabelecida nos termos do acordo GQ no que respeitava aos projectos de MCIG fora do EEE. Por conseguinte, não se verifica que tais medidas tivessem exigido regras escritas, tendo igualmente em conta a vontade de as partes num acordo anticoncorrencial reduzirem o risco de o mesmo ser descoberto.

183    À luz de tudo o que precede, há que concluir que a existência do mecanismo de notificação e de contabilização foi suficientemente demonstrada pelos elementos apresentados pela ABB, tais como confirmados pelas declarações da Hitachi na sua resposta à comunicação de acusações.

184    Contrariamente ao que indica a recorrente, não resulta dos elementos referidos no número anterior que o mecanismo de notificação e de contabilização tenha sido aplicado ocasionalmente e de maneira discricionária. Com efeito, embora as declarações da ABB e da Hitachi e o depoimento de M. não abordem expressamente este assunto, resulta claramente das formulações utilizadas nos documentos em causa que a notificação era um procedimento efectuado regularmente e aplicável à totalidade dos participantes e dos projectos em causa. Tal como acima se explica no n.° 181, as declarações da Fuji, por sua vez, são menos fiáveis quanto a este aspecto do que os elementos fornecidos pela ABB e pela Hitachi. Além disso, já acima se observou no n.° 173 que o anexo 2 do acordo EQ não é respeitante à notificação e à contabilização, tais como invocadas pela Comissão, e, portanto, não é relevante a esse respeito.

185    Quanto ao período de execução do mecanismo de notificação e de contabilização, as declarações da ABB não visam um período específico e, portanto, a priori, podem ser interpretadas no sentido de que se reportam à totalidade da infracção. As declarações de M., por sua vez, são relativas ao período durante o qual participou nas actividades do cartel, ou seja, entre 1988 e Junho de 2002. No entanto, na medida em que acima se observou no n.° 90 que os elementos apresentados pela ABB deviam ser confirmados por outros elementos, cabe salientar que as declarações da Hitachi são relativas ao período anterior ao momento em que esta última interrompeu a sua participação no cartel em 1999. Assim sendo, há que considerar que a existência do mecanismo de notificação e de contabilização foi demonstrada quanto a este último período.

186    No que respeita à relevância do mecanismo de notificação e de contabilização no quadro da prova do acordo comum, há que considerar que constitui um indício sério de que os produtores japoneses eram considerados pelos produtores europeus como potenciais concorrentes credíveis no mercado do EEE. Com efeito, presumindo que o mercado europeu era efectivamente impenetrável para os produtores japoneses, devido a existirem obstáculos à entrada, os produtores europeus não tinham razão para notificar os resultados da atribuição de certos projectos de MCIG no EEE e, a fortiori, de contabilizar esses mesmos projectos na quota conjunta «europeia» prevista pelo acordo GQ, porque essa contabilização equivalia a privá‑los de uma parte dos projectos de MCIG nas regiões abrangidas pelo acordo GQ. Portanto, a existência de tal mecanismo de notificação e contabilização implica que as empresas japonesas podiam penetrar no mercado europeu. Se não o fizeram, é porque se comprometeram a não o fazer, em troca de uma parte mais importante de projectos de MCIG fora do EEE. Assim, o mecanismo em causa constitui um nexo entre as actividades colusórias no EEE e os produtores japoneses e, por isso, uma prova indirecta da existência do acordo comum.

187    A questão de saber se o mecanismo de notificação e de contabilização tinha efeitos no mercado do EEE não é relevante para o caso em apreço. Com efeito, tal como acima se observou no n.° 97, o fundamento da acusação feita pela Comissão à recorrente na decisão impugnada é o compromisso das empresas japonesas de não penetrarem no mercado do EEE, que está indirectamente provado pela existência do mecanismo de notificação e de contabilização. Em contrapartida, não decorre da decisão impugnada que, no entender da Comissão, o referido mecanismo constitui uma infracção autónoma ao artigo 81.° CE e ao artigo 53.° do acordo EEE.

188    Do mesmo modo, não é necessário demonstrar que o mecanismo de notificação e de contabilização não abrangia os projectos de MCIG nos países construtores europeus para que o referido mecanismo possa ser considerado um indício relevante da existência do acordo comum, devido ao raciocínio acima exposto no n.° 226. Por conseguinte, a eventual falta de confirmação do depoimento de M. quanto a este aspecto não tem consequências.

189    Em face do exposto, há que concluir que a existência da notificação regular ao grupo de produtores japoneses de determinados projectos de MCIG no EEE depois da sua atribuição e da contabilização desses mesmos projectos na quota conjunta «europeia» prevista pelo acordo GQ foi provada, no que respeita ao período entre 1988 e a interrupção pela Hitachi da sua participação no cartel em 1999, pelas declarações da ABB, pelas da Hitachi e pelo depoimento de M.. Além disso, o mecanismo em causa constitui uma prova indirecta da existência do acordo comum invocado pela Comissão.

 Quanto aos elementos que alegadamente contradizem a existência do acordo comum

–       Argumentos das partes

190    A recorrente sustenta, em primeiro lugar, que decorre dos elementos do processo que, na reunião de 15 de Julho de 2002, a Hitachi recusou a proposta de celebrar o acordo comum, apresentada pela Alstom.

191    Em segundo lugar, a recorrente alega que a existência do acordo comum era impugnada não só por ela, mas também pela Hitachi, pela Melco, pela VA TECH e pela Siemens. Em particular, a Siemens apresentou uma declaração de um dos seus empregados que participou nas actividades do cartel, T., segundo a qual não existia qualquer acordo relativo à reserva mútua dos mercados japonês e europeu. Ora, na decisão impugnada, a Comissão não abordou este elemento, tendo‑se baseado inteiramente nos elementos contraditórios apresentados pela ABB.

192    A recorrente recorda igualmente que, segundo ela, a existência do acordo comum, em larga medida, não era pertinente para os produtores europeus que tinham admitido a existência de um cartel europeu. Nestas circunstâncias, o seu silêncio era previsível, porque tinham interesse em impugnar um mínimo de factos, a fim de não porem em perigo o resultado dos seus pedidos de clemência.

193    Em terceiro lugar, a recorrente acusa a Comissão de não ter tido em consideração o acordo intitulado «General Rules for GE Agreement» (a seguir «acordo GE»), concluído pelos produtores europeus em 17 de Março de 1987, a fim de repartirem entre si os projectos de MCIG na Europa.

194    Segundo a recorrente, a existência de um acordo relativo aos projectos de MCIG na Europa, anterior ao acordo GQ, contradiz, antes de mais, a alegação da Comissão de que o acordo comum proporcionava um apoio aos produtores europeus na organização do cartel para os referidos projectos. Em seguida, a existência do acordo GE põe igualmente em causa a observação feita pela Comissão na decisão impugnada de que a atribuição dos projectos de MCIG ao nível mundial começava pela atribuição do mercado japonês aos produtores japoneses e do mercado europeu aos produtores europeus. A colusão começou antes quando estes últimos repartiram o mercado europeu entre si. Finalmente, na medida em que os produtores europeus tinham constituído um cartel relativo aos projectos de MCIG na Europa, não tinham qualquer interesse em partilhar os referidos projectos com as empresas japonesas que não eram consideradas como concorrentes credíveis no mercado do EEE, nem em celebrar o acordo comum com estas.

195    A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal Geral

196    Em primeiro lugar, tal como acima referido no n.° 155, há que considerar que, na reunião de 10 de Julho de 2002, a Alstom propôs o alargamento do acordo comum, tal como alegado pela Comissão, aos países da Europa Central e Oriental. Esta circunstância confirma a existência do acordo comum.

197    Em segundo lugar, a Comissão não cometeu qualquer erro ao considerar que as declarações e testemunhos da ABB, as declarações da Fuji relativas à existência do acordo comum e as declarações da Hitachi relativas à notificação e à contabilização deviam ser consideradas dotadas de uma força probatória mais relevante do que as impugnações da existência do acordo comum pela recorrente, pela Hitachi, pela Melco, pela VA TECH e pela Siemens.

198    Com efeito, diversamente do primeiro grupo de elementos, as contestações em apreço não são contrárias aos interesses das empresas em causa, uma vez que visam contestar a existência de qualquer infracção ao artigo 81.° CE e ao artigo 53.° do acordo EEE. Esta observação é igualmente aplicável ao depoimento de T., no qual este último se limitou a apresentar a génese do acordo GQ, a contestar a existência do acordo comum e a invocar os obstáculos à entrada tanto no mercado do EEE como no mercado japonês. Especificamente no que respeita ao acordo comum, o depoimento de T. não fornece elementos novos em relação aos avançados pelos destinatários da comunicação de acusações.

199    Além disso, não se pode considerar que as empresas europeias, incluindo a Siemens, não tinham interesse em contestar a existência do acordo comum, dado que este último era interpretado pela Comissão na comunicação de acusações como um acordo colusório entre os produtores europeus e os produtores japoneses relativo ao mercado do EEE e, consequentemente, constituía uma violação do artigo 81.° CE e do artigo 53.° do acordo EEE. Ora, essa constatação, pelo menos potencialmente, era prejudicial aos interesses dos produtores europeus, no caso de as outras acusações que lhe eram feitas pela Comissão não poderem ser suficientemente provadas.

200    Em terceiro lugar, a argumentação da recorrente relativa ao acordo GE assenta no pressuposto de que este foi assinado e aplicado independentemente do acordo GQ ou do acordo comum. A este respeito, não se contesta que o acordo GE foi assinado antes do acordo GQ e do acordo EQ. No entanto, esta circunstância não implica que ele não estivesse associado aos outros elementos do cartel mundial tal como invocado pela Comissão.

201    Com efeito, nos termos do seu artigo 15.°, o acordo GE devia inicialmente ser uma solução intermédia válida até à entrada em vigor do acordo GQ e, caso tal não acontecesse, devia ser renegociado após 31 de Dezembro de 1988. Assim, verifica‑se que, no momento da celebração do acordo GE, os signatários já antecipavam a criação do cartel mundial e os seus diversos elementos, incluindo, segundo alega a Comissão, o acordo comum. Esta interpretação é confirmada pelo depoimento de M. segundo o qual o cartel mundial foi objecto de negociações complexas durante vários anos antes da assinatura do acordo GQ.

202    Além disso, segundo M., o compromisso mútuo dos dois grupos de produtores de não penetrarem no mercado doméstico do outro grupo, que constitui o essencial do acordo comum invocado pela Comissão, era anterior à celebração do acordo GQ. Por conseguinte, este compromisso podia ser tido em conta pelos produtores europeus na ocasião da assinatura do acordo GE.

203    Nestas circunstâncias, não se pode considerar que o acordo GE ponha em causa a existência do acordo comum invocado pela Comissão.

 Apreciação global

204    Decorre da análise acima efectuada nos n.os 111 a 189, em primeiro lugar, que as declarações da ABB e os depoimentos dos seus empregados e do seu ex‑empregado referem a existência de um acordo por força do qual os produtores europeus e japoneses se comprometeram reciprocamente a não penetrar nos mercados domésticos do outro grupo. Os referidos elementos permitem igualmente identificar as partes no acordo e concluir que, embora provavelmente seja anterior ao acordo GQ, foi celebrado, o mais tardar, no momento da celebração deste último acordo.

205    Em segundo lugar, a existência do acordo comum referido é corroborada pela proposta apresentada pela Alstom na reunião de 10 de Julho de 2002. A existência do compromisso das empresas japonesas de não penetrarem no mercado europeu é igualmente confirmada pelas declarações da Fuji.

206    Em terceiro lugar, resulta das declarações e do depoimento da ABB, corroborados pelas declarações da Hitachi, que os produtores japoneses aceitaram, pelo menos no que respeita ao período de 1988 a 1999, a notificação regular dos resultados da atribuição de certos projectos de MCIG no EEE e a sua contabilização na quota conjunta «europeia» prevista pelo acordo GQ. Do mesmo modo, por força do n.° 4 da parte «E (E‑Members)» do anexo 2 do acordo EQ, os produtores europeus previram a possibilidade de comunicar aos produtores japoneses os pormenores de certos projectos de MCIG no EEE antes da sua atribuição. Estas duas circunstâncias sugerem que os produtores japoneses eram considerados concorrentes credíveis para o fornecimento de certos projectos de MCIG no EEE, mas que se comprometeram a não penetrar no mercado europeu em troca de uma parte maior de projectos de MCIG noutras regiões. Constituem, portanto, provas indirectas da existência do acordo comum entre os produtores europeus e os produtores japoneses.

207    Assim, os elementos referidos pela Comissão sustentam as suas afirmações quanto à existência do acordo comum, acima resumidas no n.° 96. Em contrapartida, os elementos invocados pela recorrente e acima apreciados nos n.os 196 a 203 não são susceptíveis de pôr em causa as referidas afirmações. Há que concluir, pois, que foi feita prova bastante da existência do acordo comum.

208    Esta conclusão implica a rejeição das alegações da recorrente relativas à violação do princípio da presunção de inocência e ao facto de a Comissão ter excedido a sua competência, tal como acima explicado no n.° 101.

209    Além disso, dado que a Comissão não se apoiou unicamente na conduta das empresas em causa no mercado para concluir pela existência da infracção, não basta à recorrente substituir a explicação da Comissão por uma outra explicação plausível dos factos. Por conseguinte, a explicação alternativa proposta pela recorrente não é relevante no que respeita à existência da referida infracção.

210    Nestas circunstâncias, há que rejeitar o primeiro fundamento.

211    Além disso, resulta do que precede que a Comissão podia concluir pela existência do acordo comum sem tomar em consideração as observações da Fuji de 21 de Novembro de 2006 como elemento de acusação. Por conseguinte, em conformidade com o acima exposto no n.° 53, há que rejeitar, de modo definitivo, a segunda parte do terceiro fundamento, relativa a uma violação do direito ao acesso ao processo e, portanto, o terceiro fundamento na íntegra.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo ao facto de a Comissão não ter provado a existência de uma infracção única e continuada

212    No quadro da primeira parte do segundo fundamento, a recorrente alega que a Comissão não provou a existência de uma infracção única englobando o acordo GQ, o acordo comum e os comportamentos anticoncorrenciais dos produtores europeus no EEE. No âmbito da segunda parte do segundo fundamento, a recorrente refere que a Comissão não demonstrou nem a existência do cartel entre Setembro de 1999 e 25 de Março de 2002, nem a sua participação no cartel durante este mesmo período.

213    A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

 Quanto à primeira parte, relativa à prova de uma infracção única

–       Argumentos das partes

214    A recorrente argumenta que, mesmo supondo que tenha demonstrado adequadamente a existência do acordo comum, a Comissão não prova que este se destinava a contribuir para a repartição dos projectos, para a manipulação das propostas, para a fixação dos preços e para os outros comportamentos anticoncorrenciais adoptados no EEE pelos produtores europeus. Observa que, na decisão impugnada, a Comissão considerou que os produtores europeus se esforçavam para não revelar aos produtores japoneses as actividades do cartel europeu regulado pelo acordo EQ, preparando mesmo um acordo de não divulgação mútua pormenorizado.

215    A recorrente considera, pois, que as condições impostas pela jurisprudência para que uma empresa possa ser considerada responsável por todos os elementos de uma infracção, designadamente, no caso vertente, pelo comportamento dos produtores europeus, não estão preenchidas. A recorrente, afirma que nunca assistiu a reuniões relativas às actividades do cartel no EEE. Além disso, a Comissão não provou que ela decidiu contribuir com o seu próprio comportamento para os objectivos comuns prosseguidos pelo conjunto dos participantes. A este respeito, a mera possibilidade de deduzir a existência de um comportamento colusório no EEE não é suficiente.

216    A recorrente alega igualmente que a Comissão não é competente para perseguir e punir acordos que não tenham por objecto ou por efeito restringir a concorrência no interior do EEE, tais como o acordo GQ.

217    A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal Geral

218    Os acordos e práticas concertadas a que se refere o artigo 81.°, n.° 1, CE resultam necessariamente do concurso de várias empresas, todas co‑autoras da infracção, mas cuja participação pode revestir diversas formas, nomeadamente em função das características do mercado em causa e da posição de cada empresa no mercado, das finalidades prosseguidas e das modalidades de execução escolhidas ou planeadas. Todavia, a simples circunstância de cada empresa participar na infracção de forma específica não basta para excluir a sua responsabilidade no conjunto da infracção, incluindo nos comportamentos materialmente praticados por outras empresas participantes, mas que partilham o mesmo objectivo ou mesmo efeito anticoncorrencial (acórdão do Tribunal de Justiça de 8 de Julho de 1999, Comissão/Anic Partecipazioni, C‑49/92 P, Colect., p. I‑4125, n.os 79 e 80). A jurisprudência referida é aplicável, por analogia, ao artigo 53.°, n.° 1, do acordo EEE.

219    Uma empresa que tenha participado em tal infracção através de comportamentos próprios, que integram os conceitos de acordo ou de prática concertada com um objectivo anticoncorrencial, na acepção do artigo 81.°, n.° 1, CE, e que visam contribuir para a realização da infracção, no seu conjunto, é igualmente responsável, relativamente a todo o período em que participou na referida infracção, pelos comportamentos postos em prática por outras empresas no âmbito da mesma infracção. É o que se passa, com efeito, quando se prova que a empresa em questão conhecia os comportamentos ilícitos dos outros participantes ou podia razoavelmente prevê‑los e estava pronta a aceitar o risco (acórdão Comissão/Anic Partecipazioni, n.° 218, supra, n.° 83). A jurisprudência referida é aplicável, por analogia, ao artigo 53.°, n.° 1, do acordo EEE.

220    No presente caso, em primeiro lugar, resulta da análise do primeiro fundamento que as empresas japonesas, entre as quais a recorrente, participaram, com as empresas europeias, no acordo comum, que era um acordo entre empresas na acepção do artigo 81.° CE e do artigo 53.° do acordo EEE, cujo objecto era o mercado europeu dos projectos de MCIG. Por conseguinte, a Comissão era competente para perseguir e punir a participação da recorrente nesse acordo. Além disso, a existência do acordo comum implica que as empresas japonesas estivessem ao corrente do facto de os projectos de MCIG no EEE estarem reservados aos produtores europeus.

221    A este respeito, o facto de a recorrente não participar nas medidas colusórias específicas no EEE não é relevante. Face à natureza do seu compromisso por força do acordo comum, a sua participação não teria sido útil. Com efeito, os produtores japoneses não tinham qualquer interesse em intervir na própria atribuição dos projectos de MCIG no EEE, que se tinham comprometido a não ganhar. O seu único interesse seria conhecer o valor dos projectos em causa e a identidade dos seus adjudicatários, para poderem acompanhar a contabilização na quota conjunta «europeia» prevista pelo acordo GQ. Ora, pelo menos no que respeita ao período compreendido entre 1988 e 1999, estas informações eram comunicadas aos produtores japoneses pelo mecanismo de notificação.

222    Nestas circunstâncias, há que considerar que o papel passivo dos produtores japoneses no que respeita à atribuição dos projectos de MCIG no mercado do EEE não resultava de opção dos mesmos, mas da forma da sua participação no acordo relativo ao mercado do EEE. Em contrapartida, essa mesma participação era uma condição prévia para que a atribuição dos projectos de MCIG no EEE pudesse ser efectuada entre os produtores europeus quer ao abrigo do princípio de protecção dos países construtores, quer ao abrigo do acordo GE.

223    Em segundo lugar, as declarações da ABB e o depoimento de M. sugerem que, embora o acordo comum não fosse expressamente referido no acordo GQ, estava subjacente ao seu funcionamento, uma vez que permitia instaurar a confiança necessária para o funcionamento do cartel mundial. A existência da conexão entre o acordo comum e o acordo GQ é confirmada pelo depoimento de V.‑A. que referiu que, numa reunião do acordo GQ, a necessidade de respeitar o acordo comum foi discutida entre as empresas europeias e um representante das empresas japonesas.

224    Em terceiro lugar, o mecanismo de notificação e de contabilização constitui uma conexão entre as actividades colusórias das empresas europeias no interior do EEE e o cartel mundial regulado pelo acordo GQ. Com efeito, através desse mecanismo, os resultados da atribuição de certos projectos de MCIG no EEE eram tidos em consideração no âmbito da atribuição dos projectos situados noutras regiões, por força do acordo GQ. A existência do mecanismo em causa é demonstrada pelas declarações e depoimentos da ABB e pelas declarações da Hitachi.

225    Neste contexto, não resulta dos elementos comunicados pela recorrente que o acordo de não divulgação entre os produtores europeus tenha efectivamente sido celebrado nem, a fortiori, que a troca de informações entre os dois grupos de produtores tenha sido afectada por esta circunstância.

226    Em quarto lugar, há que considerar que, devido à notificação regular dos resultados dos concursos relativos a certos projectos de MCIG no EEE, efectuada pelo menos entre 1988 e 1999, as empresas japonesas podiam razoavelmente prever que a atribuição dos projectos de MCIG no EEE entre os produtores europeus era o resultado de um comportamento colusório. Com efeito, o facto de serem comunicados regularmente a um grupo de produtores, durante vários anos, os resultados dos concursos em que participaram os membros de outro grupo de produtores do mesmo sector industrial, sem razão legítima aparente, ultrapassa os limites de um comportamento concorrencial normal. A notificação devia, pois, suscitar dúvidas quanto às condições em que os projectos de MCIG em causa foram atribuídos. Isto é tanto mais assim quanto os resultados de um concurso não constituem necessariamente dados públicos, designadamente quando se trata de concursos lançados por empresas privadas e no que respeita aos pormenores da proposta aceite.

227    A este respeito, a Comissão indicou acertadamente, no considerando 277 da decisão impugnada, que o conhecimento do carácter colusório da atribuição dos projectos de MCIG no EEE, adquirido pelas empresas japonesas, graças ao mecanismo de notificação, entre 1988 e 1999, não era susceptível de ser afectado por uma eventual interrupção posterior da notificação. O mesmo acontece com a TM T & D. Com efeito, esta retomou as actividades dos seus accionistas em matéria de MCIG, que eram ambos partes no cartel. Nestas circunstâncias, pode considerar‑se que tinha os mesmos conhecimentos que os referidos accionistas no que respeita à atribuição dos projectos de MCIG no EEE.

228    Em quinto lugar, o acordo comum, o cartel mundial regulado pelo acordo GQ e as actividades colusórias dos produtores europeus no interior do EEE foram aplicados concomitantemente, eram relativos aos mesmos produtos e envolviam os mesmos produtores europeus e, no que respeita ao acordo comum e ao acordo GQ, os mesmos produtores japoneses. Do mesmo modo, as diferentes medidas tinham um mesmo objectivo comum, a saber, a instauração de um sistema de repartição do mercado mundial dos projectos de MCIG e de atribuição desses projectos entre os diferentes participantes.

229    Tendo em conta tudo o que precede, há que concluir que a Comissão não cometeu qualquer erro ao observar que o acordo comum, o cartel mundial regulado pelo acordo GQ e as actividades colusórias dos produtores europeus no interior do EEE formavam uma infracção única que prosseguia um objectivo comum. Em consequência, deve ser rejeitada a primeira parte do segundo fundamento.

 Quanto à segunda parte, relativa à aprova de uma infracção continuada e da participação continuada da recorrente na mesma

–       Argumentos das partes

230    A recorrente alega que a Comissão não demonstrou que a recorrente participou no acordo GQ durante o período em que outras empresas não participaram, ou seja, entre Setembro de 1999 e 25 de Março de 2002.

231    A recorrente argumenta, antes de mais, que, durante este período, em razão da ausência, designadamente, da Siemens, o cartel se tinha «desmoronado», tendo as reuniões GQ evoluído para um fórum de debates mais ou menos informal sem objecto ou efeito anticoncorrencial.

232    Em seguida, a recorrente afirma que não participou no acordo GQ durante o período em causa. Esta circunstância era comprovada pela declaração da Areva, segundo a qual era necessário, em 2002, abordar a TM T & D para discussões relativas ao mercado dos MCIG, o que implicava que a TM T & D não participava nas discussões em causa. Além disso, a declaração da ABB sobre a continuação do cartel entre Setembro de 1999 e Março de 2002 era contraditória, uma vez que a ABB referia simultaneamente que a recorrente prosseguiu as operações do cartel e que a TM T & D aderiu mais tarde ao cartel, designadamente, ao mesmo tempo que a Siemens. Acresce que a declaração da ABB não era confirmada e provinha de empresa que pediu uma imunidade de coimas.

233    Finalmente, a recorrente observa que as referências da Comissão ao cartel no que respeita ao período relevante remetem para o acordo GQ e, eventualmente, para os acordos existentes entre as empresas europeias, mas não para o acordo comum.

234    A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal Geral

235    Segundo a jurisprudência, quando é discutida a existência da infracção, a necessidade de segurança jurídica, de que devem beneficiar os operadores económicos, implica que a Comissão, que tem o ónus da prova das infracções, apresente elementos de prova adequados a fazer prova bastante da existência dos factos constitutivos da infracção. Mais especificamente, no que respeita à alegada duração de uma infracção, o mesmo princípio da segurança jurídica impõe que, na falta de elementos de prova que permitam determinar directamente a duração da infracção, a Comissão invoque, pelo menos, elementos de prova relativos a factos suficientemente próximos no tempo, de modo a poder‑se razoavelmente admitir que essa infracção perdurou ininterruptamente entre duas datas precisas (acórdãos do Tribunal Geral de 7 de Julho de 1994, Dunlop Slazenger/Comissão, T‑43/92, Colect., p. II‑441, n.° 79; de 6 de Julho de 2000, Volkswagen/Comissão, T‑62/98, Colect., p. II‑2707, n.° 188; e, de 5 de Abril de 2006, Degussa/Comissão, T‑279/02, Colect., p. II‑897, n.os 114 e 153).

236    Além disso, o facto de a prova da existência de uma infracção continuada não ter sido feita relativamente a determinados períodos não obsta a que a infracção seja considerada como praticada durante um período global mais extenso do que estes, desde que tal conclusão assente em indícios objectivos e concordantes. No âmbito de uma infracção que se estende por vários anos, o facto de as manifestações do acordo ocorrerem em períodos diferentes, podendo ser separados por lapsos de tempo mais ou menos longos, não tem incidência quanto à existência desse acordo, desde que as diferentes acções que fazem parte dessa infracção prossigam uma única finalidade e se inscrevam no âmbito de uma infracção com carácter único e continuado (acórdão do Tribunal de Justiça, de 21 de Setembro de 2006, Technische Unie/Comissão, C‑113/04 P, Colect., p. I‑8831, n.° 169).

237    Quanto à manutenção do cartel entre Setembro de 1999 e Março de 2002, cumpre observar, a título liminar, que, na medida em que o envolvimento das empresas japonesas nos termos do acordo comum não consistia numa acção positiva, mas numa omissão, é intrinsecamente difícil provar que esse acordo foi respeitado de forma continuada.

238    Contudo, em primeiro lugar, decorre do depoimento de M. que, até ao fim do seu envolvimento no cartel, em Junho de 2002, tanto o acordo GQ como o acordo comum continuaram a ser aplicados com a participação das empresas japonesas distintas da Hitachi, apesar de a ausência desta última e da Siemens tornar a operação menos eficaz. A mesma alegação decorre das declarações da ABB.

239    Em segundo lugar, na sua resposta à comunicação de acusações, a Fuji confirma que as empresas japonesas participaram na infracção, incluindo no acordo comum, até Setembro de 2000, data na qual alega ter abandonado o cartel.

240    Em terceiro lugar, no n.° 155 supra, concluiu‑se que, na reunião de 10 de Julho de 2002, a Alstom propôs o alargamento do acordo comum aos países da Europa Central e Oriental. Esta circunstância implica que o referido acordo existia tanto na data da reunião como durante um determinado período anterior à mesma.

241    Em quarto lugar, a ausência duradoura dos produtores japoneses do mercado europeu dos projectos de MCIG durante o período em causa constitui igualmente um indício que leva a crer que o acordo comum continuou a ser aplicado.

242    Em quinto lugar, na medida em que, no quadro da primeira parte do presente fundamento, se observou que a Comissão não cometeu qualquer erro ao concluir pela existência de uma infracção única, que englobava designadamente o acordo comum e o acordo GQ, há que considerar, contrariamente ao que indica a Comissão, que uma prova do funcionamento continuado deste último acordo, entre Setembro de 1999 e Março de 2002, constitui um indício relevante de que o acordo comum era igualmente aplicado durante o referido período. Com efeito, tendo em conta o carácter único da infracção, é plausível que o desaparecimento do acordo comum tivesse comprometido o funcionamento do acordo GQ.

243    Ora, a recorrente não impugna as declarações efectuadas nos considerandos 191 a 196 da decisão impugnada, segundo os quais a ABB, a Alstom e a Melco, em Dezembro de 2000 e em Janeiro de 2001, trocaram uma série de telecópias relativas à atribuição dos projectos por força do acordo GQ.

244    A recorrente confirmou igualmente que, das reuniões do acordo GQ enumeradas no considerando 197 da decisão impugnada, participou nas de 18 de Maio, de 13 de Julho e de 14 de Setembro de 2000, tendo contestado que as outras reuniões enumeradas tenham tido lugar.

245    Finalmente, a recorrente não contesta que os projectos de MCIG referidos no considerando 198 da decisão impugnada foram atribuídos por força do acordo GQ nem apresenta elementos que permitam pensar que se distanciou dos resultados das atribuições ou que não os respeitou. Ora, estas atribuições implicam que o cartel esteve activo ou, pelo menos, produziu efeitos entre 27 de Agosto de 1998, data em que foi celebrado o acordo sobre o projecto referido no considerando 198, alínea h), da decisão impugnada, e 12 de Outubro de 2001, data em que o acordo sobre o projecto referido no considerando 198, alínea a) da decisão impugnada deixou de produzir efeitos. A este respeito, importa recordar que o artigo 81.° CE é aplicável quando os efeitos de um acordo tiverem perdurado sem que lhe tenha sido posto termo formalmente (acórdãos do Tribunal Geral de 10 de Março de 1992, ICI/Comissão, T‑13/89, Colect., p. II‑1021, n.° 254, e de 13 de Dezembro de 2001, Acerinox/Comissão, T‑48/98, Colect., p. II‑3859, n.° 63). A jurisprudência referida é aplicável, por analogia, ao artigo 53.°, n.° 1, do acordo EEE.

246    À luz destes elementos, a argumentação da recorrente segundo a qual, durante o período em causa, as reuniões do acordo GQ se tornaram um fórum de debate sem objecto ou efeito anticoncorrencial, não pode ser acolhida, independentemente da questão de saber se foi apresentada durante o procedimento administrativo. Isto é tanto mais verdade quanto esta argumentação não é corroborada por outros elementos além das declarações não fundadas da Melco.

247    Assim sendo, há que considerar que os elementos de prova invocados pela Comissão quanto à aplicação do acordo comum e do acordo GQ entre Setembro de 1999 e Março de 2002 são respeitantes a factos suficientemente próximos no tempo, o que implica que foi feita a prova de uma infracção continuada quanto ao período em causa.

248    Importa acrescentar que os elementos acima referidos nos n.os 238 a 245 supra são relativos tanto à execução do acordo comum e do acordo GQ em geral como à participação pessoal da recorrente nos acordos em causa. De resto, no âmbito de certos projectos referidos na lista reproduzida no considerando 198 da decisão impugnada, cujo conteúdo não foi impugnado pela recorrente, esta última é identificada como secretária do grupo dos produtores japoneses. Ora, este elemento implica que, no momento da atribuição dos projectos em causa, a recorrente participava activamente no acordo GQ.

249    Neste contexto, as referências à necessidade de contactar a TM T & D aquando das negociações que tiveram lugar em 2002 e ao facto de ela ter integrado o cartel em 2002 podem explicar‑se pelo facto de, durante esse período, a sociedade comum da Toshiba e da Melco estar a ser criada para retomar as actividades dos seus accionistas em matéria de MCIG. Ora, na medida em que a TM T & D representava uma nova estrutura que reunia as actividades relevantes dos dois membros do cartel, é lógico que as modificações previstas do sistema do cartel deviam ser discutidas com ela.

250    No que respeita ao alegado interesse de uma empresa que pediu imunidade de coimas, dos seus empregados e dos seus antigos empregado, em sobrevalorizar o comportamento anticoncorrencial das outras empresas abrangidas pelo inquérito, há que remeter para os n.os 94, 95, 111 e 112 supra.

251    Resulta de tudo o que precede que a participação da recorrente no cartel, entre Setembro de 1999 e Março de 2002, foi demonstrada por elementos suficientemente próximos no tempo.

252    Portanto, há que rejeitar a segunda parte do segundo fundamento e, em razão disso, o segundo fundamento na íntegra.

253    Dado que nenhum dos fundamentos invocados em apoio do pedido de anulação dos artigos 1.° e 2.° da decisão impugnada, na medida em que são relativos à recorrente, pode ser acolhido, há que negar provimento ao referido pedido.

2.     Quanto ao pedido de anulação ou redução substancial da coima aplicada à recorrente

254    No âmbito do seu quarto fundamento, a recorrente sustenta que a coima que lhe foi aplicada é discriminatória e excessiva. Este fundamento divide‑se em seis partes. A primeira é relativa a um erro na apreciação da gravidade relativa da sua participação na infracção. A segunda é relativa à existência de um erro na apreciação da duração da infracção. A terceira é relativa ao desrespeito de fundamentação quanto ao cálculo da coima. A quarta é relativa a um erro na determinação do montante de partida. A quinta é respeitante ao carácter excessivo da coima correspondente à infracção cometida pela TM T & D. A sexta é relativa a um erro na apreciação das circunstâncias atenuantes.

255    A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

 Quanto à primeira parte, relativa a um erro na apreciação da gravidade relativa da participação da recorrente na infracção

 Argumentos das partes

256    A recorrente observa que a proporção das coimas aplicadas aos produtores europeus e aos produtores japoneses corresponde à proporção das quotas definidas pelo acordo GQ. Deduz daí que lhe foi aplicada uma coima pelo seu comportamento no âmbito do acordo GQ. Ora, essa abordagem era errada e discriminatória. Por um lado, a Comissão não teve em conta que a gravidade relativa da sua participação no cartel era menor, na medida em que participou unicamente no acordo comum, enquanto os produtores europeus participaram tanto neste como nas actividades colusórias relativas aos projectos de MCIG no EEE. Por outro lado, a recorrente argumenta que, ao sancioná‑la por um comportamento no exterior do EEE, a Comissão excedeu a sua competência.

257    A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

 Apreciação do Tribunal Geral

258    Segundo a jurisprudência, na medida em que uma infracção tenha sido cometida por diversas empresas, há que apreciar a gravidade relativa da participação de cada uma delas (v. acórdão Comissão/Anic Partecipazioni, n.° 218, supra, n.° 150, e jurisprudência aí referida). Assim, o facto de uma empresa não ter participado em todos os elementos constitutivos de um acordo ou ter desempenhado um papel secundário nas partes em que participou deve ser tomado em consideração na apreciação da gravidade da infracção e, eventualmente, na determinação da coima (acórdão Comissão/Anic Partecipazioni, n.° 218, supra, n.° 90).

259    A este respeito, há que especificar, a título liminar, que a decisão impugnada não pune a participação dos seus destinatários no acordo GQ, que não abrangia o território do EEE. Com efeito, o artigo 1.° da decisão impugnada refere claramente que a violação do artigo 81.° CE e do artigo 53.° do acordo EEE abrangia o sector dos projectos de MCIG no EEE. Nestas circunstâncias, o argumento relativo à alegada falta de competência da Comissão deve ser rejeitado.

260    De resto, decorre da análise do primeiro fundamento que a participação dos produtores japoneses e dos produtores europeus nos acordos e práticas concertadas que abrangiam o EEE não era da mesma natureza. Com efeito, as empresas japonesas comprometeram‑se, no quadro do acordo comum, a não penetrar no mercado do EEE, pelo que a sua participação consistia numa omissão de agir. As empresas europeias, por sua vez, repartiram entre si os diversos projectos de MCIG no mesmo mercado, através de actos colusórios positivos.

261    No entanto, não há qualquer diferença substancial no que respeita à gravidade destes dois tipos de comportamento. Com efeito, tal como acima observado no n.° 221, face à natureza do compromisso da recorrente por força do acordo comum, o facto de ela não participar na atribuição dos projectos de MCIG no EEE não é relevante, uma vez que a sua intervenção não era útil. Assim, a circunstância invocada pela recorrente não foi o resultado da sua opção, mas a mera consequência da natureza da sua participação no acordo relativo ao mercado do EEE. Em contrapartida, essa mesma participação era uma condição prévia para que a atribuição dos projectos de MCIG no EEE pudesse ser efectuada entre os produtores europeus segundo as normas acordadas para o efeito.

262    Por conseguinte, há que considerar que a gravidade do comportamento das empresas japonesas é comparável à do comportamento das empresas europeias. Há, pois, que rejeitar a primeira parte do quarto fundamento.

 Quanto à segunda parte, relativa a um erro na apreciação da duração da infracção

 Argumentos das partes

263    Ao referir‑se aos argumentos relativos à suspensão das actividades do cartel e da participação da recorrente no mesmo, entre Setembro de 1999 e Março de 2002, apresentados nos n.os 230 a 233 supra, a recorrente alega que a coima que lhe foi aplicada deve ser reduzida.

264    A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

 Apreciação do Tribunal Geral

265    A recorrente limita‑se a repetir na presente parte os argumentos que já foram analisados no âmbito da segunda parte do segundo fundamento. Ora, resulta dos n.os 235 a 252 supra que os referidos argumentos não permitem concluir que a Comissão cometeu um erro ao declarar que o cartel prosseguiu entre o mês de Setembro de 1999 e 25 de Março de 2002 e ao estabelecer a duração da participação da recorrente no cartel.

266    Nestas circunstâncias, há que julgar improcedente a presente parte.

 Quanto à terceira parte, relativa ao desrespeito de dever de fundamentação quanto ao cálculo da coima

 Argumentos das partes

267    A recorrente sustenta que a Comissão não explicou adequadamente o método de cálculo aplicado para determinar a coima que lhe foi aplicada. A este respeito, invoca dificuldades que sentiu ao determinar o montante que devia pagar à Comissão e alega que a sua posição é confirmada pela opinião de economistas experientes na matéria. Por conseguinte, entende que a Comissão não respeitou o seu dever de fundamentação.

268    A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

 Apreciação do Tribunal Geral

269    A fundamentação exigida pelo artigo 253.° CE deve revelar, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição autora do acto impugnado, de modo a permitir aos interessados conhecer as justificações da medida adoptada a fim de defenderem os seus direitos e ao juiz comunitário exercer a sua fiscalização (acórdão do Tribunal de Justiça de 18 de Setembro de 2003, Volkswagen/Comissão, C‑338/00 P, Colect., p. I‑9189, n.° 124). Embora, por força do artigo 253.° CE, a Comissão seja obrigada a mencionar os elementos de facto e de direito de que depende a justificação da decisão e as considerações jurídicas que a levaram a tomá‑la, essa disposição não exige que discuta todos os pontos de facto e de direito que teriam sido tratados no procedimento administrativo (acórdãos do Tribunal de Justiça de 17 de Janeiro de 1984, VBVB e VBBB/Comissão, 43/82 e 63/82, Recueil, p. 19, n.° 22; de 11 de Julho de 1989, Belasco e o./Comissão, 246/86, Colect., p. 2117, n.° 55; e de 18 de Setembro de 2003, Volkswagen/Comissão, já referido, n.° 127). A exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso em apreço, designadamente do conteúdo do acto, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas directamente e individualmente afectadas pelo acto possam ter em obter explicações (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 2 de Abril de 1998, Comissão/Sytraval e Brink’s France, C‑367/95 P, Colect., p. I‑1719, n.° 63 e jurisprudência referida). Esta jurisprudência é aplicável por analogia às decisões da Comissão que declaram uma infracção ao artigo 53.°, n.° 1, do Acordo EEE.

270    No caso em apreço, os elementos apresentados nos considerandos 471 a 552 da decisão impugnada permitem compreender o método escolhido pela Comissão para o cálculo da coima e acompanhar as suas diversas etapas.

271    De resto, na medida em que a recorrente se limitou a alegar a existência das dificuldades que sentia na determinação do montante que devia pagar à Comissão, sem especificar a sua natureza e a fase do cálculo em que elas ocorrem, e não reproduziu as observações dos economistas que indica ter consultado, a sua argumentação relativa à fundamentação do calculo da coima não pode ser objecto de uma análise mais aprofundada.

272    Portanto, há que rejeitar a terceira parte do quarto fundamento.

 Quanto à quarta parte, relativa a um erro na determinação do montante de partida


 Argumentos das partes

273    A recorrente alega que o montante de partida da coima é arbitrário e discriminatório.

274    Em primeiro lugar, a Comissão calculou as coimas aplicadas com base no volume de negócios relativos, simultaneamente, aos MCIG autónomos e às subestações de electricidade baseadas num MCIG. Ora, esta diligência é desfavorável aos produtores japoneses, uma vez que os projectos de MCIG no Médio Oriente, realizados em geral pelos produtores japoneses, implicam frequentemente subestações chave na porta e, consequentemente, incluem produtos e serviços distintos dos MCIG. Portanto, o volume de negócios dos produtores japoneses tende a ser superior ao dos produtores europeus.

275    Em segundo lugar, a Comissão baseou‑se no volume de negócios correspondente ao ano 2003, ou seja, o último ano completo da infracção, para determinar as quotas de mercado das empresas europeias, enquanto utilizou o volume de negócios de 2001, mais elevado, para os produtores japoneses, sem dar razões convincentes. Segundo a recorrente, a Comissão deveria ter utilizado os volumes de negócios do ano 2003 para todos os participantes no cartel, dividindo por dois os volumes de negócios das duas sociedades comuns em que as actividades de MCIG dos quatro produtores japoneses estavam concentradas na época. Tal abordagem teria sido coerente com o tratamento dos produtores europeus, bem como com a prática decisória da Comissão.

276    Em terceiro lugar, a recorrente defende que a Comissão a colocou incorrectamente no mesmo grupo que a Alstom ou a Areva. Entende que, supondo que o volume de negócios do ano 2003 tivesse servido de base para o cálculo do montante de partida da coima da recorrente, a diferença das quotas de mercado em relação à Alstom ou à Areva seria superior àquela que existia em relação às quotas de mercado das empresas pertencentes ao grupo inferior, o que implica que a recorrente devia ter sido classificada neste último grupo.

277    Quanto à primeira alegação, a Comissão alega que o mero facto de a tomada em consideração de certos produtos dar um volume de negócios superior não constitui a prova de uma discriminação.

278    No que respeita à segunda alegação, a Comissão refere que escolheu o ano 2001 como ano de referência porque se tratava do exercício anterior à criação da sociedade comum da recorrente e da Melco, a saber, a TM T & D. Explica, a este respeito, que as sociedades‑mãe participaram no cartel a título individual durante a maior parte da sua duração, o que implica que era mais adequado determinar os montantes de partida com base nos respectivos volumes de negócios, para ter designadamente em conta as diferenças existentes entre as suas quotas de mercado individuais no momento da criação da TM T & D.

279    Em terceiro lugar, a Comissão sustenta que a alegação relativa à colocação da recorrente num grupo só pode ser acolhida quando a relativa à escolha do ano de referência o for igualmente. Ora, não é esse o caso.

 Apreciação do Tribunal Geral

280    A título liminar, importa recordar que a Comissão dispõe de uma margem de apreciação na fixação do montante das coimas, a fim de orientar o comportamento das empresas no sentido do respeito das regras de concorrência (v. acórdão do Tribunal Geral de 29 de Abril de 2004, Tokai Carbon e o./Comissão, T‑236/01, T‑239/01, T‑244/01 a T‑246/01, T‑251/01 e T‑252/01, Colect., p. II‑1181, n.° 216, e jurisprudência aí referida).

281    O montante da coima é fixado pela Comissão em função da gravidade da infracção e, se for o caso, da sua duração. A gravidade da infracção deve ser determinada em função de critérios tais como as circunstâncias específicas do caso, o seu contexto e o carácter dissuasivo das coimas. Elementos objectivos como o conteúdo e a duração dos comportamentos anticoncorrenciais, o seu número e a sua intensidade, a extensão do mercado afectado e a deterioração sofrida pela ordem pública económica devem ser tomados em conta. A análise deve igualmente atender à importância relativa e à quota de mercado das empresas responsáveis, bem como a uma eventual reincidência. (acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 40 supra, n.os 89 a 91).

282    No entanto, cada vez que a Comissão decide aplicar coimas nos termos do direito da concorrência, tem de respeitar os princípios gerais do direito, entre os quais consta o princípio da igualdade de tratamento, tal como interpretado pelos tribunais comunitários (acórdão do Tribunal Geral de 27 de Setembro de 2006, Archer Daniels Midland/Comissão, T‑59/02, Colect., p. II‑3627, n.° 315). Segundo jurisprudência assente, o princípio da igualdade de tratamento ou da não discriminação exige que as situações comparáveis não sejam tratadas de modo diferente ou que as situações diferentes não sejam tratadas de igual maneira, salvo se esse tratamento se justificar por razões objectivas (v. acórdão do Tribunal Geral de 14 de Maio de 1998, BPB de Eendracht/Comissão, T‑311/94, Colect., p. II‑1129, n.° 309, e jurisprudência aí referida).

283    Na medida em que se justifique basear‑se no volume de negócios das empresas envolvidas numa mesma infracção para determinar as relações entre as coimas a aplicar, convém delimitar o período a ter em conta para que os números obtidos sejam tão comparáveis quanto possível (acórdão do Tribunal de Justiça de 7 de Junho de 1983, Musique diffusion française e o./Comissão, 100/80 a 103/80, Recueil, p. 1825, n.° 122).

284    No caso em apreço, resulta dos considerandos 480 a 490 da decisão impugnada que, na determinação dos montantes de partida, a Comissão, em conformidade com o ponto 1 A das orientações para o cálculo das coimas, decidiu aplicar um tratamento diferenciado aos participantes no cartel em função da sua capacidade de prejudicar a concorrência. Para este efeito, classificou as diversas empresas em cinco grupos em função da importância relativa dos seus volumes de negócios mundiais obtidos com as vendas de MCIG. Neste contexto, a Comissão considerou que os volumes de negócios relativos apenas ao mercado do EEE não constituíam um critério de apreciação fiável na medida em que o acordo comum tinha por objecto assegurar a ausência dos produtores japoneses deste mesmo mercado.

285    No que respeita aos produtos a tomar em consideração para a determinação do volume de negócios das empresas em causa, importa referir que, de acordo com a jurisprudência acima referida no n.° 281, a Comissão deve designadamente tomar em consideração o âmbito do mercado abrangido. Ora, no caso em apreço, como indicado no considerando 9 da decisão impugnada, o cartel era relativo tanto aos MCIG autónomos como às subestações que incluíam um MCIG. Por conseguinte, a Comissão não cometeu qualquer erro ao calcular o montante de partida das coimas das empresas em causa a partir dos volumes de negócios relativos a estes produtos. Assim, o argumento da recorrente a este respeito deve ser rejeitado.

286    Quanto à escolha do ano de referência, decorre dos considerandos 481, 482 e 484 da decisão impugnada que, na determinação do valor das vendas mundiais, a Comissão se baseou no ano 2001 no que respeita à recorrente, à Fuji, à Hitachi e à Melco, enquanto se baseou no ano 2003, a saber o último ano completo da infracção, no que respeita aos produtores europeus. Do mesmo modo, o cálculo do montante de partida das coimas da recorrente, da Fuji, da Hitachi e da Melco relativo ao período da sua participação no cartel enquanto empresas individuais foi efectuado com base nos seus volumes de negócios em 2001, enquanto o cálculo do montante de partida das coimas dos produtores europeus foi efectuado com base nos seus volumes de negócios em 2003.

287    Assim sendo, cumpre observar que a Comissão não tratou os produtores japoneses, entre os quais a recorrente, e os produtores europeus de maneira igual no que respeita à escolha do ano de referência. Portanto, por força da jurisprudência acima referida no n.° 282, cumpre verificar se existe uma justificação objectiva para este tratamento diferenciado.

288    A este respeito, no considerando 482 da decisão impugnada, a Comissão indicou que a utilização do ano 2001 no que respeita à recorrente era justificada pelo facto de, durante a maior parte do período da infracção, esta participar no cartel enquanto empresa individual, e não através da sociedade comum TM T & D, que tinha assumido as actividades em matéria de MCIG da recorrente e da Melco em 2002.

289    Na audiência, a Comissão especificou que o seu objectivo era tomar em consideração a posição concorrencial desigual das duas accionistas da TM T & D no momento da criação desta última, devido ao facto de a Melco deter uma parte consideravelmente mais significativa do mercado mundial dos MCIG do que a recorrente. Segundo a Comissão, o facto de se reportar ao último ano completo da participação da recorrente e da Melco no cartel enquanto empresas individuais, ou seja, ao ano 2001, permitia repercutir esta disparidade aquando da determinação dos montantes das coimas, contrariamente ao método que consiste em dividir o volume de negócios da TM T & D realizado em 2003 entre os dois accionistas em função das respectivas participações na sociedade comum.

290    O objectivo invocado pela Comissão é legítimo, uma vez que permite comparar a capacidade de os accionistas de uma sociedade comum afectarem a concorrência durante o período anterior à criação desta última.

291    No entanto, verifica‑se que, no caso em apreço, a Comissão podia ter utilizado outros métodos para alcançar o objectivo que prosseguia sem tratar os produtores japoneses, por um lado, e os produtores europeus, por outro, de modo desigual quanto à escolha do ano de referência. A título exemplificativo, na determinação das coimas da recorrente e da Melco relativas ao período anterior à criação da TM T & D, a Comissão podia ter‑se baseado no montante de partida da coima desta última, calculado a partir dos volumes de negócios correspondentes ao ano 2003 e dividido entre a recorrente e a Melco segundo a proporção das vendas dos MCIG que elas realizaram durante o último ano que antecedeu a criação da sociedade comum, ou seja, em 2001.

292    Portanto, há que observar que, no presente caso, a vontade da Comissão de reproduzir fielmente, no âmbito da determinação das coimas, a posição relativa da recorrente e da Melco não justifica o tratamento desigual de que a recorrente foi objecto.

293    Em face do exposto, há que concluir que, ao escolher o ano 2001 enquanto ano de referência para a determinação do valor das vendas mundiais dos produtores japoneses e para o cálculo da coima aplicada à recorrente pela sua participação individual no cartel, a Comissão violou o princípio de igualdade de tratamento.

294    Esta violação vicia directamente o cálculo da coima aplicada à recorrente no artigo 2.°, alínea i), da decisão impugnada pela sua participação no cartel enquanto empresa individual. Afecta indirectamente, através da determinação do valor das vendas mundiais e das quotas de mercado, o cálculo da coima aplicada à recorrente no artigo 2.°, alínea h), da decisão impugnada, relativa ao período da existência da TM T & D.

295    Portanto, há que acolher a presente parte e, consequentemente, anular o artigo 2.°, alíneas h) e i), da decisão impugnada. Em contrapartida, dado que o conteúdo do artigo 1.° da decisão impugnada não é afectado pela escolha do ano de referência, não há lugar à sua anulação ou modificação.

296    Além disso, não há que analisar as quinta e sextas partes do presente fundamento. Com efeito, mesmo que fossem procedentes, isso não poderia levar a uma anulação da decisão impugnada mais ampla do que aquela a que se chegou no número anterior.

297    Em último lugar, tendo em conta que a ilegalidade verificada é relativa à própria escolha da base de cálculo da coima aplicada à recorrente, o Tribunal Geral não tem condições para proceder ao cálculo da referida coima. Por conseguinte, no caso vertente, não há lugar ao exercício do poder de plena jurisdição do Tribunal Geral, modificando o artigo 2.°, alíneas h) e i), da decisão impugnada.

 Quanto às despesas

298    Nos termos do artigo 87.°, n.° 3, do Regulamento de Processo, se cada parte obtiver vencimento parcial, o Tribunal Geral pode determinar que as despesas sejam repartidas entre as partes ou que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas.

299    Na medida em que o pedido de anulação do artigo 1.° da decisão impugnada foi rejeitado, a recorrente foi vencida numa parte significativa do seu pedido, ainda que tenha obtido ganho de causa noutra parte do mesmo.

300    Nestas circunstâncias, há que decidir que a recorrente suportará três quartos das despesas apresentadas pelas partes ao Tribunal Geral e que a Comissão suportará um quarto dessas mesmas despesas.

301    Além disso, segundo jurisprudência assente, as despesas provocadas pela constituição de uma garantia bancária para evitar a execução da decisão não constituem despesas suportadas para efeitos do processo, na acepção da alínea b) do artigo 91.° do Regulamento de Processo (v. acórdão Cimenteries CBR e o./Comissão, n.° 92 supra, n.° 5133, e jurisprudência aí referida). Por conseguinte, há que rejeitar o pedido da recorrente de que a Comissão seja condenada a suportar essas despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção)

decide:

1)      O artigo 2.°, alíneas h) e i), da Decisão C (2006) 6762 final da Comissão, de 24 de Janeiro de 2007, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.° CE e do artigo 53.° do Acordo EEE (Processo COMP/F/38.899 – Mecanismos de comutação isolados a gás), é anulado na medida em que é relativo à Toshiba Corp.

2)      Nega-se provimento ao recurso quanto ao restante.

3)      A Toshiba suportará três quartos das despesas no Tribunal Geral.

4)      A Comissão Europeia suportará um quarto das despesas das partes no Tribunal Geral.

Pelikánová

Jürimäe

Soldevila Fragoso

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 12 de Julho de 2011.


* Língua do processo: inglês.