Language of document : ECLI:EU:T:2014:57

DESPACHO DO TRIBUNAL GERAL (juiz das medidas provisórias)

4 de fevereiro de 2014 (*)

«Processo de medidas provisórias — Contratos públicos — Processo de concurso — Rejeição de uma proposta — Pedido de suspensão da execução — Fumus boni juris»

No processo T‑644/13 R,

Serco Belgium SA, com sede em Bruxelas (Bélgica),

Bull SA, com sede em Bruxelas,

Unisys Belgium SA, com sede em Bruxelas,

representadas por V. Ost e M. Vanderstraeten, advogados,

requerentes

contra

Comissão Europeia, representada por S. Delaude, L. Cappelletti e F. Moro, na qualidade de agentes,

requerida,

que tem por objeto, em primeiro lugar, um pedido de suspensão da execução da decisão da Comissão Europeia de 30 de outubro de 2013, que rejeitou a proposta submetida pelo consórcio constituído pelas requerentes no âmbito do processo de concurso público DIGIT/R2/PO/2012/026 — ITIC‑SM relativo à gestão do serviço informático para o ambiente de trabalho integrado e consolidado da Comissão Europeia e que adjudicou o contrato a outro consórcio, em segundo lugar, a declaração no sentido de que a Comissão deverá abster‑se de celebrar o contrato‑quadro em questão e os contratos específicos ao abrigo do referido contrato‑quadro, bem como, em terceiro lugar, o deferimento de quaisquer outras medidas provisórias adequadas,

O JUIZ DAS MEDIDAS PROVISÓRIAS,

em substituição do presidente do Tribunal Geral, em conformidade com o artigo 106.° do Regulamento de Processo do Tribunal Geral,

profere o seguinte

Despacho

 Antecedentes do litígio

1        O presente processo tem por objeto o concurso público DIGIT/R2/PO/2012/026 — ITIC‑SM relativo à gestão do serviço informático para o ambiente de trabalho integrado e consolidado da Comissão Europeia (a seguir «concurso ITIC‑SM»). De acordo com o resumo do caderno de encargos, o objetivo do concurso ITIC‑SM é celebrar um único contrato‑quadro para o fornecimento de serviços de suporte informático para o ambiente de trabalho da Comissão Europeia. A introdução dos requisitos gerais do caderno de encargos prevê que o contrato‑quadro se destina à celebração de contratos específicos com a Comissão para diversas componentes de serviço de suporte informático, subdivididas em componentes de serviço essenciais (a implementar no início do contrato‑quadro) e em componentes de serviço adicionais (a implementar numa fase posterior).

2        De acordo com o Questionário de Avaliação Técnica (secção 2‑4‑0 do caderno de encargos), a avaliação técnica das propostas deve basear‑se nos seguintes critérios de qualidade ponderados acompanhados por limiares mínimos aplicáveis ao resultado global, assim como ao nível do critério e do subcritério:

Image not found

3        Nesse sentido, entre outras questões, o Questionário de Avaliação Técnica pedia aos proponentes, no capítulo 4.1.5., que definissem o número de efetivos necessários a afetar a cada elemento de serviço do «Front Office» tendo em conta as variáveis da exigência de serviço padrão e do nível de serviço padrão, que especificavam, de acordo com os capítulos 4.11 e 4.12 da secção 1‑2‑0 do caderno de encargos, valores médios ou valores padrão para diversos parâmetros dos serviços e metas de qualidade mínimas, respetivamente. Do mesmo modo, foi solicitado aos proponentes, nos termos dos capítulos 4.2.5 e 5.1.5 do questionário técnico, que definissem, respetivamente, o número de efetivos a afetar aos serviços de suporte logístico, e todos os elementos de serviço do suporte de «Back Office». De acordo com os capítulos acima mencionados, a proposta financeira tinha de basear‑se nos mesmos valores de efetivos afetados, tendo em conta a variável da exigência de serviço de 30 000 utilizadores que, de acordo com capítulo 5.5 do caderno de encargos, é o número estimado de pessoal a servir, ao abrigo do contrato‑quadro no ano 4 da sua execução.

4        Na resposta a uma questão submetida pelas requerentes, a Serco Belgium SA, Bull SA e a Unisys Belgium SA, a Comissão indicou, em 7 de maio de 2013, que os proponentes deviam descrever a sua abordagem geral para efeitos de determinação do número de efetivos (em termos de postos de trabalho equivalentes a tempo inteiro) necessários para fornecer um serviço baseado nas variáveis da exigência de serviço e do nível de serviço do concurso. De acordo com a resposta da Comissão, os números de efetivos propostos não criavam em si mesmos uma obrigação jurídica mas deviam ser suficientes para fornecer o serviço e, enquanto tal, seriam objeto de uma avaliação.

5        O consórcio das requerentes e um segundo consórcio apresentaram propostas no prazo fixado pela Comissão.

6        Por carta de 31 de outubro de 2013, a Comissão informou as requerentes de que, na fase da avaliação técnica, a sua proposta não tinha conseguido atingir o mínimo de 60% em relação a um critério e a um subcritério, nem o mínimo de 70% em termos de classificação geral, e que, portanto, a proposta não prosseguiria para a fase de avaliação financeira. No entanto, a Comissão informou as requerentes de que não assinaria o contrato com a empresa adjudicatária durante um período de suspensão de 10 dias consecutivos.

7        Na sequência de um pedido apresentado em nome das requerentes, a Comissão forneceu, por ofício de 6 de novembro de 2013, informação adicional sobre a avaliação das duas propostas, assim como uma folha de cálculo com as respetivas notas relativas a cada critério.

8        Por ofício de 19 de novembro de 2013, a Comissão informou as requerentes de que a decisão de adjudicação tinha sido tomada em 30 de outubro de 2013 e forneceu as atas de uma reunião de esclarecimento realizada com as requerentes em 8 de novembro de 2013.

9        Na sequência de um pedido apresentado pelas requerentes em 11 de novembro de 2013, ao abrigo do artigo 171.° do Regulamento Delegado (UE) n.° 1268/2012 da Comissão, de 29 de outubro de 2012, sobre as normas de execução do Regulamento (UE, Euratom) n.° 966/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, relativo às disposições financeiras aplicáveis ao orçamento geral da União (JO L 362, p. 1), a Comissão comunicou às requerentes, por ofício de 28 de novembro de 2013, a apreciação do funcionário responsável pela decisão de adjudicação, que confirmou a sua decisão inicial depois de ter revisto os argumentos das requerentes.

 Tramitação processual e pedidos das partes

10      Por requerimento que deu entrada na secretaria do Tribunal Geral em 4 de dezembro de 2013, as requerentes interpuseram um recurso de anulação da decisão da Comissão Europeia de 30 de outubro de 2013, comunicada às requerentes pelo ofício de 31 de outubro de 2013 (n.° 6 supra) que rejeitou a proposta submetida pelo consórcio das requerentes e que adjudicou o contrato a outro consórcio.

11      Por requerimento separado, que deu entrada na secretaria do Tribunal de Justiça em 4 de dezembro de 2012, as requerentes iniciaram o presente processo de medidas provisórias, no qual alegam, essencialmente, que o presidente do Tribunal Geral deve:

¾        suspender a execução da decisão que rejeitou a proposta das requerentes e adjudicou o contrato a outro consórcio (a seguir «decisão impugnada») até que o Tribunal Geral se pronuncie quanto ao mérito;

¾        ordenar à Comissão que não celebre o contrato‑quadro e que, no caso de o contrato‑quadro já ter sido celebrado, não celebre quaisquer contratos específicos ao abrigo do contrato‑quadro, até que o Tribunal Geral se pronuncie quanto ao mérito;

¾        ordenar quaisquer outras medidas provisórias que considerar adequadas;

¾        condenar a Comissão nas despesas.

12      Por despacho de 12 de dezembro de 2013, proferido nos termos do artigo 105.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, o juiz das medidas provisórias suspendeu a execução da decisão impugnada até ser proferido despacho no presente processo e ordenou à Comissão que não procedesse à celebração do contrato‑quadro e, caso já o tivesse feito, que não celebrasse quaisquer contratos específicos ao abrigo do referido contrato‑quadro enquanto não fosse proferida a decisão final no presente processo.

13      Nas suas observações sobre o pedido de medidas provisórias, apresentadas na Secretaria do Tribunal Geral em 6 de janeiro de 2014, a Comissão sustenta, essencialmente, que o presidente do Tribunal Geral deve:

¾        julgar o pedido improcedente;

¾        reservar para final a decisão quanto às despesas.

14      As partes apresentaram alegações orais na audiência de 20 de janeiro de 2014.

 Questão de direito

15      De acordo com os artigos 278.° TFUE e 279.° TFUE, lidos em conjugação com o artigo 256.°, n.° 1, TFUE, o juiz das medidas provisórias pode, se considerar que as circunstâncias o exigem, ordenar a suspensão do ato impugnado no Tribunal Geral e ordenar as medidas provisórias necessárias.

16      Além disso, o artigo 104.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral prevê que os pedidos de medidas provisórias devem especificar o objeto do litígio, as razões da urgência, bem como os fundamentos de facto e de direito que, à primeira vista, justificam a adoção da medida provisória requerida. Por conseguinte, o juiz das medidas provisórias pode conceder a suspensão da execução e as outras medidas provisórias se se provar que, à primeira vista, a sua concessão se justifica de facto e de direito (fumus boni juris) e que são urgentes, no sentido de que é necessário, para evitar um prejuízo grave e irreparável dos interesses do requerente, que sejam decretadas e produzam os seus efeitos antes da decisão no processo principal. O juiz das medidas provisórias procede também, se for caso disso, à ponderação dos interesses em causa. Estes requisitos são cumulativos, de modo que as medidas provisórias devem ser indeferidas se um deles não estiver preenchido (despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 14 de outubro de 1996, SCK e FNK/Comissão (C‑268/96 P(R), Colet., p. I‑4971., n.° 30).

17      No âmbito desta análise de conjunto, o juiz das medidas provisórias dispõe de um vasto poder de apreciação e é livre de determinar, à luz das especificidades do caso concreto, o modo como essas diferentes condições devem considerar‑se verificadas, bem como a ordem dessa análise, uma vez que nenhuma norma de direito lhe impõe um esquema de análise preestabelecido para apreciar a necessidade de decidir provisoriamente [despachos do presidente do Tribunal de Justiça de 19 de julho de 1995, Comissão/Atlantic Container Line e o., C‑149/95 P(R), Colet., p. I‑2165, n.° 23, e de 3 de abril de 2007, Vischim/Comissão, C‑459/06 P(R), não publicado na Coletânea, n.° 25].

18      Neste contexto, importa ter em conta o papel especial dos processos de medidas provisórias nos processos de contratação pública. Nesse sentido, também deve ser tido em conta o quadro jurídico criado pelo legislador da União que é aplicável a processos de adjudicação de contratos públicos organizados pelas autoridades adjudicantes dos Estados‑Membros. Em especial, conforme previsto no quadragésimo considerando do Regulamento n.° 1268/2012, as regras substantivas em matéria de contratos públicos devem basear‑se no disposto na Diretiva 2004/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos de empreitada de obras públicas, dos contratos públicos de fornecimento e dos contratos públicos de serviços (JO L 134, p. 114).

19      Além disso, conforme referido nos primeiro a terceiro considerandos da Diretiva 89/665/CEE do Conselho, de 21 de dezembro de 1989, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos processos de recurso em matéria de adjudicação dos contratos de direito público de obras de fornecimentos (JO L 395, p. 33), para garantir a aplicação efetiva dessas regras, o legislador considerou necessária a criação de um conjunto de requisitos processuais que disponibilizam vias de recurso rápidas numa fase em que as infrações podem ser corrigidas de forma adequada. Tendo em conta a curta duração dos processos de adjudicação de contratos, o papel das medidas provisórias é tão importante que o legislador considerou oportuno, no artigo 2.°, n.° 1, de Diretiva 89/665, no que diz respeito aos processos de adjudicação de contratos da competência dos Estados‑Membros, que sejam independentes de qualquer ação prévia quanto ao mérito (acórdão do Tribunal de Justiça de 19 de setembro de 1996, Comissão/Grécia, C‑236/95, Colet., I‑4459, n.° 11, e conclusões apresentadas em 20 de junho de 1996, no mesmo processo, pelo advogado‑geral P. Léger, n.° 15).

20      Além disso, como resulta claramente do segundo, terceiro e quinto considerandos e do artigo 2.°, n.° 1, da Diretiva 89/665, no contexto especial dos contratos de direito público, as medidas provisórias são, não só concebidas como um meio para suspender o processo de adjudicação, mas também, no mínimo, como um meio para corrigir uma infração aparente que, de outro modo, seria abrangida pelo objeto do processo principal.

21      Mesmo que tais considerações não possam pôr em causa a aplicação do artigo 104.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, que aplica os artigos 278.° e 279 TFUE e exige que a ação principal seja proposta antes de ser apresentado um pedido de medidas provisórias, as mesmas devem ser tidas em conta porque, tal como acontece a nível nacional, as medidas provisórias ao abrigo do Título III do Regulamento de Processo têm por fim, nos processos em matéria de contratação pública, garantir a proteção jurisdicional efetiva no que diz respeito às regras em matéria de contratação pública aplicáveis às instituições e órgãos da União que se baseiam, essencialmente, na Diretiva 2004/18 (v. n.° 18 supra).

22      Correlativamente, embora no contexto dos processos de medidas provisórias o juiz das medidas provisórias não esteja obrigado, regra geral, a realizar uma apreciação tão exaustiva como no contexto do processo principal, tal conclusão não pode ser interpretada no sentido de que esta seja absolutamente proibida (despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 3 de abril de 2007, Vischim/Comissão, já referido no n.° 17 supra, n.° 50).

23      Assim, no presente processo, é oportuno examinar, em primeiro lugar, se as alegações dos recorrentes estabelecem um fumus boni juris no sentido de que, tendo em conta as observações das outras partes, suscitam uma impressão séria de que a decisão impugnada é juridicamente errada. Caso se considere que este requisito esta preenchido, tal facto também poderá, pelos motivos referidos nos n.os 18 a 21 supra, ser tido em conta no âmbito da análise da urgência (v., nesse sentido, despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 23 de fevereiro de 2001, Áustria/Conselho, C‑445/00 R, Colet., p. I‑1461, n.os 100 e 110).

24      As requerentes apresentam quatro fundamentos que, em seu entender, demonstram, à primeira vista, a invalidade da decisão impugnada.

25      Em primeiro lugar, sustentam que a avaliação das propostas no que diz respeito às políticas em matéria de efetivos do «Front Office», do Suporte Logístico e do «Back Office» (v. n.° 3 supra) se baseou erradamente em declarações dos proponentes que não eram vinculativas.

26      Em segundo lugar, alegam que os subcritérios acima mencionados relativos aos efetivos são, por natureza, critérios de seleção, não podendo portanto ser avaliados no âmbito da fase de adjudicação, mas apenas no âmbito da fase de seleção.

27      Em terceiro lugar, alegam que a Comissão não deu indicações suficientemente precisas sobre como iria avaliar a parte das propostas relativas aos referidos subcritérios que conduziam, assim, a um resultado imprevisível.

28      Em quarto lugar, sustentam que se a Comissão tinha dúvidas quanto à capacidade do consórcio das requerentes para executar o contrato de acordo com o caderno de encargos devia ter solicitado esclarecimentos antes de rejeitar a proposta das requerentes, que era significativamente mais baixa do que a proposta apresentada pelo consórcio vencedor.

29      Tendo em conta a natureza das alegações acima referidas, e para efeitos da apreciação da existência de fumus boni juris, é necessário examinar, em primeiro lugar, o segundo fundamento (v. n.° 26 supra), seguindo‑se a apreciação do primeiro, terceiro e quarto fundamentos.

30      Quanto à natureza dos critérios referidos no n.° 25 supra, é jurisprudência assente que embora a verificação da aptidão dos proponentes com base em critérios de seleção nos termos dos artigos 146.° a 148.° do Regulamento n.° 1268/2012, por um lado, e a adjudicação do contrato com base em critérios de adjudicação nos termos do artigo 149.° do referido regulamento, por outro, possam ter lugar simultaneamente, essas duas operações são distintas e são reguladas por normas diferentes. Daí resulta que a verificação pela autoridade adjudicante no âmbito da fase de adjudicação deve visar a qualidade das próprias propostas para identificar a proposta economicamente mais vantajosa e não os critérios de seleção, que estão ligados à apreciação da aptidão dos proponentes para executar o contrato em questão, como é o caso de um critério para apreciar a capacidade de um proponente para colocar uma equipa à disposição da autoridade adjudicante a partir dos seus próprios recursos (v., nesse sentido, acórdão do Tribunal Geral de 17 de outubro de 2012, Evropaïki Dynamiki/Tribunal de Justiça, T‑447/10, n.os 34 a 39 e 41 e a jurisprudência aí referida).

31      Todavia, como sustenta a Comissão, a informação que os proponentes tinham de fornecer por força dos capítulos 4 e 5 do Questionário de Avaliação Técnica (v. n.° 3 supra) parecia não se destinar a avaliar a sua capacidade geral para afetar pessoal suficiente em termos de competência e de números para dar execução ao contrato, mas a avaliar as políticas concretas em matéria de efetivos definidas pelos proponentes tendo em vista a prestação dos serviços descritos no caderno de encargos.

32      Esta distinção é ainda mais clara se se comparar a natureza da informação sobre efetivos, fornecida ao abrigo dos referidos critérios de adjudicação, com a natureza da informação sobre efetivos, fornecida ao abrigo dos critérios de seleção do Questionário da Seleção Técnica. Este último exige que os proponentes indiquem os seus meios efetivos totais acompanhados de descrições dos seus perfis e fixa limiares mínimos gerais, sem qualquer exigência que pareça estar relacionada com a sua política em matéria de efetivos no que diz respeito ao contrato‑quadro em questão.

33      Convidadas a pronunciar‑se sobre as observações da Comissão a esse respeito, as requerentes não procuraram contestá‑las mas indicaram oralmente que este fundamento era meramente acessório do primeiro fundamento.

34      Nestas circunstâncias, o segundo fundamento invocado pelas requerentes não demonstra a existência de fumus boni juris.

35      Quanto ao primeiro fundamento (v. n.° 25 supra), os argumentos das requerentes parecem basear‑se numa premissa falsa.

36      Em especial, como resulta claramente do n.° 49 do requerimento de medidas provisórias, as requerentes contestam a avaliação efetuada pela Comissão no que diz respeito aos três subcritérios relativos aos efetivos. Estes referem‑se aos efetivos do «Front Office», do Suporte Logístico e do Apoio ao «Back Office», respetivamente (v. n.° 3 supra).

37      De acordo com a argumentação das requerentes, os números de efetivos indicados nas propostas no âmbito destes capítulos não conduzem a obrigações contratuais quanto ao número exato de efetivos que a empresa adjudicatária teria de disponibilizar. Pelo contrário, a empresa adjudicatária e futura fornecedora estaria vinculada pelos indicadores de desempenho relativos à qualidade do serviço definidos nos acordos sobre o nível de serviço. Se a empresa adjudicatária puder executar o contrato de acordo com os indicadores relevantes e, ao mesmo tempo, disponibilizar menos efetivos do que os referidos no Questionário de Avaliação Técnica, a sua decisão de remover o excesso de efetivos não violará as obrigações contratuais, nem conduzirá a uma revisão dos preços. De facto, os números de efetivos referidos no Questionário de Avaliação Técnica servem de base para o cálculo do preço fixo da proposta. Por outro lado, se o número de efetivos proposto por um proponente se mostrar insuficiente, a Comissão poderá executar as cláusulas de indemnização fixa a fim de levar o empreiteiro a cumprir as suas obrigações qualitativas. Nestas circunstâncias, as requerentes consideram que seria inaceitável que uma autoridade adjudicante concedesse notas baixas à parte da proposta relativa aos efetivos, com o simples fundamento no facto de uma proposta concorrente ter indicado números de efetivos muito superiores que pudessem subsequentemente ser removidos por serem, ou quando se revelassem, desnecessários.

38      As requerentes parecem efetivamente ter razão na parte em que alegam que, quando as declarações em matéria de efetivos não dão origem a obrigações contratuais, o simples facto de uma proposta concorrente propor um método que conduz a números mais elevados de efetivos não é um fundamento juridicamente válido para a autoridade adjudicante conceder uma nota mais baixa a uma proposta que envolve menos efetivos. Com efeito, se tal fosse aceitável, os proponentes seriam indiretamente incitados a propor métodos de determinação de efetivos que conduzissem a números de efetivos excecionalmente elevados, esperando que os seus concorrentes não o fizessem, deste modo aumentando consideravelmente a probabilidade de os excluir na fase de avaliação financeira, sabendo ao mesmo tempo que, se o contrato lhes fosse adjudicado, poderiam remover o excesso de efetivos sem afetar o preço do contrato.

39      No entanto, resulta dos elementos de prova produzidos que as notas baixas de que as requerentes se queixam não são o resultado de uma simples comparação entre os números de efetivos que as requerentes propuseram e os números de efetivos da proposta concorrente. Pelo contrário, as referidas notas parecem ter sido baseadas em apreciações pela Comissão relativas à inadequação objetiva da política em matéria de efetivos das requerentes para os serviços objeto do caderno de encargos.

40      Mais especificamente, como resulta claramente do capítulo 2 da secção 1‑5‑0 «Método de efetivos — Aspetos financeiros» do caderno de encargos, o método proposto pelos proponentes para a determinação do número de efetivos necessário para executar o contrato de acordo com as variáveis da exigência de serviço e do nível de serviço é aplicável tanto à formação da proposta financeira dos componentes e elementos de serviço inicialmente definidos, e à determinação do custo de qualquer componente ou elemento de serviço adicionais, como à determinação do custo no caso de qualquer alteração nas variáveis acima referidas. Além disso, dado que o método em questão deve corresponder a um «cenário de base» de 30 000 efetivos da Comissão no ano 4 da execução, o custo do serviço de qualquer pedido assente na premissa desse nível de efetivos deve ser idêntico ao da proposta.

41      Estas disposições do caderno de encargos sugerem que, tal como indicou a Comissão durante o processo de concurso (v. n.° 4 supra), os números de efetivos propostos não são por si só vinculativos, no sentido de que a execução do contrato pode revelar a necessidade de mais ou menos efetivos para cumprir as obrigações qualitativas e de que a adjudicatária terá, em última análise, de cumprir estas obrigações. Além disso, o método utilizado na política em matéria de efetivos parece ser vinculativo para a adjudicatária no sentido de que, se o «cenário de base» se materializar, a mesma é obrigada a «propor» o número de efetivos da proposta (v. também a introdução da secção 1‑1‑0 «Requisitos dos serviços de gestão» do caderno de encargos). Contudo, esta obrigação não parece afetar a possibilidade de remover efetivos se o respetivo número se revelar excessivo durante a execução do contrato.

42      Adicionalmente, ao contrário do que sugeriu a Comissão nas suas alegações orais, o capítulo 2.3.2 da secção 1‑0‑0 «Requisitos gerais» do caderno de encargos parece só dizer respeito às situações em que as características ou as condições de funcionamento de uma componente de serviço se alteram para além do que seria a sua evolução normal e exigem uma alteração do contrato, ou em que é aditado um novo elemento de serviço. Este capítulo limita‑se a referir que, nesses casos, a Comissão terá de apresentar um pedido de atualização com um caderno de encargos adicional. Além disso, a Comissão não explicou satisfatoriamente por que motivo esta disposição também lhe dá o direito, se o número de efetivos proposto se revelar excessivo, de elevar as exigências do nível de serviço, mantendo simultaneamente os efetivos excessivos sem o custo adicional que seria gerado por um novo pedido de serviço tendo por objeto uma componente ou um elemento de serviço adicionais ou refletindo uma alteração nas variáveis da exigência de serviço ou do nível de serviço.

43      Seja como for, independentemente das dúvidas quanto à interpretação do caderno de encargos pela Comissão, parece resultar da correspondência trocada entre as requerentes e a Comissão (v. n.os 7 a 9 supra) que as notas baixas atribuídas às diversas políticas em matéria de efetivos resultaram, de facto, daquilo que a Comissão avaliou como sendo insuficiências objetivas na proposta das requerentes.

44      Em especial, referindo‑se aos serviços de «Front Office», a Comissão referiu no seu ofício de 6 de novembro de 2013 que, com a exceção de um elemento de serviço, o número de efetivos indicado em relação a todos os outros elementos de serviço era inadequado para assegurar o nível de serviço exigido. Em seguida, a Comissão salientou que um nível de efetivos de 33,37 postos de trabalho equivalentes a tempo inteiro distribuídos por mais de 30 pontos de concentração por proximidade (Proximity Concentration Points) era claramente inadequado para realizar as tarefas exigidas. O mesmo acontecia, de acordo com a Comissão, em relação à proposta de 1,8 postos de trabalho equivalentes a tempo inteiro para cobrir os serviços prestados pelos grupos de competência (Competence Groups). No mesmo ofício, a Comissão também criticou o número proposto de postos de trabalho equivalentes a tempo inteiro em relação aos serviços de Suporte Logístico, assim como a metodologia pouco clara e o número proposto de postos de trabalho equivalentes a tempo inteiro em relação aos serviços de «Back Office».

45      Estas críticas foram reiteradas e, aparentemente, justificadas, através de exemplos na reunião de esclarecimento realizada em 8 de novembro de 2013, de acordo com as atas relevantes comunicadas às requerentes por ofício de 19 de novembro de 2013.

46      Por último, no seu ofício de 28 de novembro de 2013, a Comissão indicou que a proposta das requerentes assentava na premissa de que o número de 1,1 pontos de concentração por proximidade por cada 1 000 utilizadores podia ser reduzido. No entanto, esta presunção estava errada. Assim, dado o número elevado de postos de trabalho equivalentes a tempo inteiro afetados a pontos de concentração por proximidade que prestam serviço de platina, a afetação de 33.37 postos de trabalho equivalentes a tempo inteiro a 33 pontos de concentração por proximidade no cenário de base envolvendo 30 000 utilizadores, resultava numa média inferior a 1 posto de trabalho equivalente a tempo inteiro para cada ponto de concentração por proximidade remanescente. Além disso, depois de enumerar as tarefas mais importantes a realizar pelos grupos de competência, a Comissão repetiu que o valor de 1,84 postos de trabalho equivalentes a tempo inteiro para os grupos de competência era irrealista. Foi só a título de comparação que a Comissão referiu os 20,85 postos de trabalho equivalentes a tempo inteiro afetados aos grupos de competência pelo consórcio concorrente.

47      Os argumentos da Comissão relativamente ao número de pontos de concentração por proximidade parecem ser procedentes. De acordo com o ponto 5 do capítulo 4.11 da secção 1‑2‑0 «Requisitos dos serviços de ‘Front Office’» do caderno de encargos, o número padrão de pontos de concentração por proximidade é, com efeito, de 1,1 por cada 1 000 utilizadores, o que se traduz em 33 pontos de concentração por proximidade no cenário de base de 30 000 utilizadores. Além disso, as alegações da Comissão sobre o caráter fixo e inegociável deste parâmetro não foram contestadas pelas requerentes. Convidadas a esclarecer se a sua proposta assentava efetivamente na premissa de um número inferior a 1,1 pontos de concentração por proximidade por cada 1 000 utilizadores, as requerentes responderam que não era assim, mas não indicaram nenhuma parte da sua proposta, nem nenhum outro elemento para justificar esta afirmação.

48      Nestas circunstâncias, a posição das requerentes segundo a qual a decisão impugnada está viciada porque assenta numa avaliação comparativa limitada a declarações não vinculativas sobre os efetivos não parece proceder. Daí resulta que, ao contrário do alegado pelas requerentes no n.° 37 do seu requerimento, seria com efeito necessário que o Tribunal de Justiça verificasse se a Comissão errou ao concluir que o nível de efetivos proposto pelas requerentes era realmente insuficiente e se os motivos subjacentes a essa conclusão foram corretamente indicados. Contudo, conforme resulta do n.° 37 do seu requerimento, as requerentes não invocam esse fundamento.

49      Finalmente, neste contexto, importa analisar a alegação das requerentes no n.° 80 do requerimento de medida provisória, segundo o qual a Comissão não compreendeu o princípio básico da sua política em matéria de efetivos, que, de facto, consistia em disponibilizar números de efetivos superiores durante o primeiro ou os primeiros dois anos de funcionamento, tendo em vista a sua redução substancial nos anos 3 e 4, na sequência de ganhos de eficiência importantes através de políticas de consolidação inovadoras. Na medida em que esta alegação configure uma contestação das conclusões contidas nos n.os 44 a 46 supra, não poderá deixar de ser julgada improcedente. Em especial, embora não se possa excluir que um esforço de consolidação inovador durante os primeiros anos poderia resultar num menor número de efetivos a apoiar um número mais elevado de utilizadores nos anos seguintes e que poderia, portanto, pôr em causa a adequação de um modelo segundo o qual os proponentes só estão obrigados a indicar os números de efetivos para o ano 4, sendo os números relativos aos anos 1, 2, e 3 automaticamente calculados proporcionalmente ao número inferior de utilizadores, as requerentes não apresentaram quaisquer elementos que demonstrassem que propuseram realmente tais métodos na sua proposta, que estes eram, além disso transparentes, lógicos, coerentes, auditáveis, completos e práticos, conforme exigido pelo caderno de encargos (secção 1‑5‑0 «Método de efetivos — Aspetos financeiros», capítulo 2.2). O único elemento de reforço da eficácia que as requerentes referiram nas suas alegações orais foi o facto de proporem um sistema em que os utilizadores podiam solicitar equipamento informático através de uma plataforma online em vez de utilizarem outros meios de telecomunicação. Porém, mesmo supondo que um argumento deste tipo pode ser apreciado sem um suporte de prova claro, embora tais medidas pudessem reforçar uma gestão eficaz do tempo por parte dos utilizadores do serviço, as mesmas não parecem afetar de forma considerável, na falta de elementos de apreciação suplementares, o nível de eficácia dos efetivos da proponente, desde logo porque não foi alegada qualquer inovação especial no que diz respeito à sua tarefa de disponibilizar o equipamento solicitado.

50      Daqui resulta que o primeiro fundamento também não demonstra a existência de fumus boni juris.

51      No que diz respeito ao terceiro fundamento (v. n.° 27 supra), basta salientar que, ao contrário do alegado pelos recorrentes, a Comissão não parece ter avaliado a sua política em matéria de efetivos apenas com base no facto de estes não terem conseguido «adivinhar» os números de efetivos ideais concebidos pela Comissão. Em vez disso, resulta da análise relativa ao primeiro fundamento que a Comissão centrou a sua apreciação na questão de saber se a política em matéria de efetivos das requerentes cumpria objetivamente os critérios estabelecidos no caderno de encargos. A esse respeito, a referência na secção 1‑5‑0 «Método de efetivos — Aspetos financeiros», capítulo 2.2, ao «número ideal de postos de trabalho equivalentes a tempo inteiro» destina‑se claramente a definir o alcance do método que a proponente deve propor, enquanto que a avaliação desse método é realizada com base em critérios definidos no mesmo capítulo. Por conseguinte, as requerentes não conseguiram indicar nenhum elemento contido no caderno de encargos ou na correspondência posterior com a Comissão que suportasse a sua alegação de que a avaliação da sua proposta se baseou apenas na sua suposta incapacidade para «adivinhar» as ideias da Comissão sobre o número ideal de efetivos.

52      Assim, o terceiro fundamento também não demonstra a existência de fumus boni juris.

53      No que diz respeito ao quarto fundamento (v. n.° 28 supra), as requerentes procuram estabelecer um paralelo com a situação das propostas anormalmente baixas. Em especial, as requerentes sustentam que os fundamentos subjacentes à rejeição da sua proposta são semelhantes aos fundamentos com base nos quais pode ser rejeitada uma proposta anormalmente baixa. Por conseguinte, antes de rejeitar a sua proposta, a Comissão estava obrigada a solicitar informações detalhadas sobre os elementos constitutivos relevantes dessa proposta e a verificar esses elementos, depois de ter em conta as explicações recebidas em conformidade com o artigo 151.° do Regulamento n.° 1268/2012.

54      No entanto, este fundamento também se baseia numa falsa premissa.

55      Em especial, como referido no n.° 77 do requerimento de medidas provisórias, a proposta que parece ser anormalmente baixa levanta uma suspeita de que o proponente não será capaz de executar o contrato de acordo com as condições propostas. Isto pode ficar a dever‑se, por exemplo, ao facto de o preço proposto ser demasiado baixo ou de as soluções técnicas propostas ultrapassarem a competência da proponente. Seja como for, uma característica fundamental destas circunstâncias consiste no facto de a autoridade adjudicante considerar que as condições da proposta cumprem os critérios do concurso, recaindo as suspeitas desta última noutra parte da avaliação, a saber, a capacidade de a proponente executar o contrato de acordo com essas condições específicas. Esta preocupação também se distingue da avaliação da capacidade geral da proponente, a realizar na fase de seleção.

56      No entanto, como resulta claramente da análise do primeiro fundamento, no presente processo a Comissão considerou que as condições propostas eram inaceitáveis no que diz respeito à política em matéria de efetivos dos serviços de «Front Office», de Suporte Logístico e de «Back Office», uma vez que estas não satisfaziam os critérios técnicos para a avaliação dos métodos relevantes. Por conseguinte, o presente processo não pode ser equiparado à situação das propostas anormalmente baixas propostas.

57      Consequentemente, o quarto fundamento também não demonstra a existência de fumus boni juris.

58      Também resulta da análise de todos os fundamentos invocados pelas requerentes que os critérios em questão, conforme estabelecidos no caderno de encargos, não parecem estar afetados por qualquer vício legal.

59      Por conseguinte, o presente pedido deve ser julgado improcedente uma vez que não foi demonstrada a existência de fumus boni juris, não sendo necessário abordar as questões da urgência ou da ponderação dos interesses.

Pelos fundamentos expostos,

O JUIZ DAS MEDIDAS PROVISÓRIAS

decide nos seguintes termos:

1)      O pedido de medidas provisórias é indeferido.

2)      Reserva‑se para final a decisão quanto às despesas.

Feito no Luxemburgo, em 4 de fevereiro de 2014.

O secretário

 

      O juiz das medidas provisórias

E. Coulon

 

      N. J. Forwood


* Língua do processo: inglês.