ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)
10 de Fevereiro de 2000 (1)
«Associação dos países e territórios ultramarinos à Comunidade Regulamento
(CE) n.° 2352/97 Regulamento (CE) n.° 2494/97 Recurso de anulação
Admissibilidade Decisão PTU Medidas provisórias Nexo de causalidade»
Nos processos apensos T-32/98 e T-41/98,
Governo das Antilhas Neerlandesas, representado por P. V. F. Bos e
M. M. Slotboom, advogados em Roterdão, com domicílio escolhido no Luxemburgo
no escritório do advogado M. Loesch, 11, rue Goethe,
contra
Comissão das Comunidades Europeias, representada por E. de March e T. van
Rijn, consultores jurídicos, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no
Luxemburgo no gabinete de C. Gómez de la Cruz, membro do Serviço Jurídico,
Centre Wagner, Kirchberg,
apoiada por
Reino de Espanha, representado por N. Díaz Abad, Abogado del Estado, na
qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada de
Espanha, 4-6, Boulevard E. Servais,
que tem por objecto, no processo T-32/98, o pedido de anulação do Regulamento
(CE) n.° 2352/97 da Comissão, de 27 de Novembro de 1997, que institui medidas
específicas para a importação de arroz originário dos países e territórios
ultramarinos (JO L 326, p. 21) e, no processo T-41/98, o pedido de anulação do
Regulamento (CE) n.° 2494/97 da Comissão, de 12 de Dezembro de 1997, relativo
à emissão de certificados de importação de arroz do código NC 1006 originário dos
países e territórios ultramarinos, no âmbito das medidas específicas instituídas pelo
Regulamento (CE) n.° 2352/97 (JO L 343, p. 17).
O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Terceira Secção),
composto por: M. Jaeger, presidente, K. Lenaerts e J. Azizi, juízes,
secretário: A. Mair, administrador,
vistos os autos e após a audiência de 21 de Setembro de 1999,
profere o presente
Acórdão
Enquadramento jurídico
- 1.
- O Reino dos Países Baixos abrange, além da parte europeia, as Antilhas
Neerlandesas e a Ilha de Aruba. Estas fazem parte dos países e territórios
ultramarinos (PTU) referidos no anexo IV do Tratado CE (que passou, após
alteração, a anexo II) e cuja associação à Comunidade é regida pela quarta parte
do referido Tratado.
Disposições do Tratado aplicáveis
- 2.
- O artigo 131.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 182.° CE)
dispõe, no segundo parágrafo, que «a finalidade da associação é promover o
desenvolvimento económico e social dos países e territórios e estabelecer relações
económicas estreitas entre eles e a Comunidade no seu conjunto».
- 3.
- Nos termos do artigo 132.°, n.° 1, do Tratado CE (actual artigo 183.°, alínea 1, CE),
«os Estados aplicarão às suas trocas comerciais com os países e territórios o
mesmo regime que aplicam entre si por força do presente tratado».
- 4.
- O artigo 183.°, n.° 1, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 184.°,
n.° 1, CE) prevê que «as importações originárias dos países e territórios
beneficiarão, ao entrarem nos Estados-Membros, da proibição dos direitos
aduaneiros que, nos termos do presente tratado, se deve proibir entre os
Estados-Membros».
- 5.
- O artigo 134.° do Tratado CE (actual artigo 185.° CE) dispõe, por seu lado, que,
«se o nível dos direitos aplicáveis às mercadorias provenientes de um país terceiro,
ao entrarem num país ou território, for, em consequência da aplicação do n.° 1 do
artigo 184.°, de ordem a provocar desvios de tráfego em prejuízo de qualquer
Estado-Membro, este pode pedir à Comissão que proponha aos outros
Estados-Membros as medidas necessárias para sanarem tal situação».
- 6.
- Nos termos do artigo 136.° do Tratado (que passou, após alteração, a artigo
186.° CE), o Conselho fixa as modalidades de associação entre os PTU e a
Comunidade.
Decisão PTU, decisão de revisão intercalar e diferentes medidas tomadas em 1997
- 7.
- Nos termos do artigo 136.° do Tratado, o Conselho aprovou a Decisão 91/482/CEE
relativa à associação dos países e territórios ultramarinos à Comunidade Económica
Europeia (JO L 263, p. 1, a seguir, a «Decisão PTU»).
- 8.
- Os artigos 101.°, n.° 1, e 102.° da Decisão PTU dispunham, respectivamente, antes
da sua alteração em 30 de Novembro de 1997: «Os produtos originários dos
Estados ACP podem ser importados na Comunidade com isenção de direitos
aduaneiros e de encargos de efeito equivalente.
...
A Comunidade não aplicará à importação de produtos originários dos PTU nem
restrições quantitativas nem medidas de efeito equivalente.»
- 9.
- O n.° 1 do artigo 109.° da Decisão PTU dispõe que a Comissão pode, segundo o
processo estabelecido no anexo IV da mesma decisão, tomar medidas excepcionais
sob a forma de medidas de protecção quanto às importações de produtos
originários dos PTU. Os artigos 109.°, n.° 2, e 110.° da Decisão PTU estabelecem
as condições a que aquelas medidas devem dar satisfação.
- 10.
- Nos termos do artigo 240.°, a Decisão PTU é aplicável durante um período de dez
anos a contar de 1 de Março de 1990. Esta disposição prevê ainda, no seu n.° 3,
que, antes da expiração do primeiro período de cinco anos, o Conselho, decidindo
por unanimidade e sob proposta da Comissão, decidirá, para além das
contribuições financeiras da Comunidade para o segundo período de cinco anos,
se for caso disso, alterações eventuais da Decisão PTU pretendidas pelas
autoridades competentes dos PTU ou propostas pela Comissão com base na sua
própria experiência ou na ligação com as alterações objecto de negociação entre
a Comunidade e os Estados ACP. As eventuais alterações assim decididas tomarão
a forma de «decisão de revisão intercalar».
- 11.
- Em 24 de Novembro de 1997, por força do disposto no artigo 240.°, n.° 3, já
referido, o Conselho aprovou a Decisão 97/803/CE, que procede à revisão
intercalar da Decisão PTU (JO L 329, p. 50, a seguir, a «decisão de revisão
intercalar»). Esta decisão limita as importações de arroz e de açúcar provenientes
dos PTU na Comunidade.
- 12.
- O recorrente interpôs recurso da decisão de revisão intercalar para o Tribunal de
Primeira Instância (acórdão T-310/97). Nos termos do artigo 177.° do Tratado CE
(actual artigo 234.° CE), o presidente do Arrondissementsrechtbank 's-Gravenhage
(Países Baixos) pediu ao tribunal de Justiça que se pronunciasse sobre a sua
validade (processo C-17/98). Por despacho de 16 de Novembro de 1998, Antilhas
Neerlandesas/Conselho (T-310/97, Colect., p. II-4131), o Tribunal de Primeira
Instância suspendeu a instância no processo T-310/97 até decisão do Tribunal de
Justiça no processo C-17/98.
- 13.
- No decurso do ano de 1997, a aplicação da Decisão PTU levou a Comissão a
tomar certas medidas nos termos do artigo 109.°, já referido, nomeadamente no
sector da importação do arroz.
- 14.
- Assim, no Regulamento (CE) n.° 304/97, de 17 de Fevereiro de 1997, que instaura
medidas de protecção relativamente à importação de arroz originário dos países
e territórios ultramarinos, aprovou as primeiras medidas de protecção que limitam
as importações na Comunidade de arroz originário dos PTU entre 1 de Janeiro de
1997 e 30 de Abril do mesmo ano. O Reino dos Países Baixos e as sociedade
Antillean Rice Mills interpuseram recurso, pedindo a anulação do referido
regulamento, respectivamente, para o Tribunal de Justiça (acórdão C-110/97) e
para o Tribunal de Primeira Instância (acórdão T-41/97). Por despacho de 16 de
Novembro de 1998, Antillean Rice Mills/Conselho (T-41/97, Colect., p. II-4117), o
Tribunal de Primeira Instância julgou-se incompetente para conhecer do pedido no
processo T-41/97, no entendimento de que caberia ao Tribunal de Justiça decidir
o pedido de anulação.
- 15.
- No Regulamento (CE) n.° 1036/97, de 2 de Junho de 1997, que institui medidas de
protecção relativas à importação de arroz originário dos países e territórios
ultramarinos (JO L 151, p. 8), o Conselho tomou novas medidas, limitando as
importações na Comunidade de arroz originário dos PTU entre 1 de Maio de 1997
e 30 de Novembro do mesmo ano. O recorrente e o Reino dos Países Baixos
interpuseram recurso do referido regulamento, respectivamente, para o Tribunal
de Primeira Instância (processo T-179/97) e para o Tribunal de Justiça (processo
C-301/97). Por despacho de 16 de Novembro de 1998, Antilhas
Neerlandesas/Conselho e Comissão (T-163/97 e T-179/97, Colect., p. II-4123), o
Tribunal considerou-se de novo incompetente no processo T-179/97, considerando
sê-lo o Tribunal de Justiça.
- 16.
- No Regulamento (CE) n.° 2352/97, de 27 de Novembro de 1997, que institui
medidas específicas para a importação de arroz originário dos países e territórios
ultramarinos (JO L 326, p. 21), a Comissão tomou uma terceira série de medidas
de protecção impondo a emissão de certificados de importação para o arroz
originário dos PTU e a prestação de garantia bancária correspondente a 50% do
montante de direitos alfândegarios normalmente aplicáveis à quantidade de arroz
para que são solicitados os certificados. O mesmo regulamento previa ainda que,
quando for ultrapassado um volume mensal de pedidos de certificados equivalente
a 13 300 toneladas de arroz e haja o risco de perturbação sensível do mercado
comunitário, a Comissão tomará determinadas medidas quanto aos pedidos que
ultrapassem aquele limite. O mesmo regulamento entrou em vigor em 1 de
Dezembro de 1997.
- 17.
- Em 12 de Dezembro de 1997, a Comissão aprovou o Regulamento (CE)
n.° 2494/97, de 12 de Dezembro de 1997, relativo à emissão de certificados de
importação de arroz do código NC 1006 originário dos países e territórios
ultramarinos, no âmbito das medidas específicas instituídas pelo Regulamento (CE)
n.° 2352/97 (JO L 343, p. 17). Prevê, nomeadamente, a não emissão de certificados
de importação a partir de 3 de Dezembro de 1997 e suspendeu a apresentação de
novos pedidos até 31 do mesmo mês e ano.
- 18.
- O Regulamento n.° 2352/97 foi revogado pelo artigo 14.° do Regulamento
n.° 2603/97/CE da Comissão, de 16 de Dezembro de 1997, que estabelece as
normas de execução para a importação de arroz originário dos Estados de África,
das Caraíbas e do Pacífico (ACP) e dos países e territórios ultramarinos (PTU)
(JO L 351, p. 22), em cumprimento do artigo 108.° da Decisão PTU na sua nova
versão. O recorrente interpôs também recurso deste regulamento para o Tribunal
de Primeira Instância (processo T-52/98). Mediante despacho de 11 de Fevereiro
de 1999, Antilhas Neerlandesas/Comissão (T-52/98, não publicado na Colectânea),
o Tribunal suspendeu a instância no processo T-52/98 até decisão do tribunal de
Justiça no processo C-17/98.
Tramitação processual
- 19.
- Por requerimento apresentado no Tribunal de Primeira Instância em 24 de
Fevereiro de 1998, o recorrente interpôs recurso, pedindo a anulação do
Regulamento n.° 2352/97 (processo T-32/98).
- 20.
- Mediante requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal em 6 de Março de
1998, o recorrente interpôs recurso, pedindo a anulação do Regulamento
n.° 2494/97 (processo T-41/98).
- 21.
- Mediante requerimentos apresentados no Tribunal em 28 de Maio e 11 de Junho
de 1998, o Reino de Espanha pediu, nos termos do artigo 115.° do Regulamento
de Processo, a sua intervenção nos processos T-32/98 e T-41/98, em apoio das
conclusões da Comissão, pedido deferido por despachos do presidente da Quarta
Secção de 1 e 10 de Julho do mesmo ano. Em 31 de Julho e 6 de Agosto, também
de 1998, o Reino de Espanha apresentou as suas alegações em intervenção, a que,
as partes puderam responder.
- 22.
- Com base no relatório do juiz-relator, o Tribunal (Terceira Secção) decidiu iniciar
a fase oral do processo sem proceder a instrução prévia. No quadro de diligências
de tramitação previstas no artigo 64.° do Regulamento de Processo, foram
apresentadas algumas questões escritas às partes, que responderam nos prazos
fixados.
- 23.
- Ouvidas as partes em alegações e ouvidas as respectivas respostas às perguntas
feitas pelo Tribunal na audiência, comum aos dois processos, de 21 de Setembro
de 1999.
- 24.
- Ouvidas as partes, o Tribunal decidiu apensar os dois processos para efeitos de
prolação do acórdão.
Conclusões das partes
- 25.
- No processo T-32/98, o recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:
anular o Regulamento n.° 2352/97;
condenar a Comissão nas despesas.
- 26.
- No processo T-41/98, o recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:
anular o Regulamento n.° 2494/97;
condenar a Comissão nas despesas.
- 27.
- A Comissão conclui, nos processos T-32/98 e T-41/98, que o Tribunal se digne:
julgar o recurso inadmissível ou, no mínimo, sem fundamento;
condenar o recorrente nas despesas.
- 28.
- A interveniente conclui, nos processos T-32/98 e T-41/98, que o Tribunal se digne:
julgar o recurso inadmissível, por ilegitimidade do recorrente;
subsidiariamente, negar provimento ao recurso por carecer de fundamento;
condenar o recorrente nas despesas.
Quanto à admissibilidade da intervenção
- 29.
- O recorrente sustenta que o Tribunal não pode ter em conta as observações
apresentadas pelo Reino de Espanha. Para o efeito, afirma que não existe qualquer
nexo relevante em termos de direito comunitário entre as Antilhas Neerlandesas
e aquele Estado-Membro. Efectivamente, o Reino dos Países Baixos só ractificou
o Tratado de adesão do Reino de Espanha quanto ao seu território europeu.
- 30.
- O Tribunal salienta que os despachos de 1 e 10 de Julho de 1998, que diferiram
o pedido do Reino de Espanha de intervenção em apoio das conclusões da
Comissão nos processos T-32/98 e T-41/98, não impedem que se reexamine a
admissibilidade da referida intervenção no acórdão final (acórdão do Tribunal de
Justiça de 8 de Julho de 1999, Shell/Comissão, C-234/92 P, ainda não publicado na
Colectânea, n.° 25).
- 31.
- No entanto, em contrário do que pretende o recorrente, a intervenção do Reino
de Espanha nos dois processo é admissível. Com efeito, nos termos do artigo 37.°,
primeiro parágrafo, do Estatuto CE do Tribunal de Justiça, aplicável ao Tribunal
de Primeira Instância nos termos do artigo 46.°, primeiro parágrafo, do mesmo
Estatuto, os Estados-Membros têm o direito de intervir nas causas submetidas ao
Tribunal. O facto de o Reino dos Países Baixos ter rectificado o Tratado de adesão
do Reino de Espanha apenas relativamente ao seu território europeu não é de
molde a afectar o exercício daquele direito, que lhe é reconhecido na sua qualidade
de Estado-Membro.
Quanto à admissibilidade dos recursos
Argumentação das partes
- 32.
- Sem deduzir formalmente excepções de inadmissibilidade nos termos do artigo
114.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, a Comissão contesta-a por três razões.
- 33.
- Em primeiro lugar, o recorrente não pode basear o seu recurso no segundo
parágrafo do artigo 173.° do Tratado CE (que passou, após alterações, a artigo
230.°, segundo parágrafo, CE). Invoca o despacho do tribunal de Justiça de 21 de
Março de 1997, Região da Valónia/Comissão (C-95/97, Colect., p. I-1787, n.° 6) e
acrescenta que a Parte IV do Tratado não confere às Antilhas Neerlandesas
direitos especiais nem lhes impõe obrigações especiais que lhe confiram uma
posição jurídica comparável à dos Estados-Membros. O seu papel no processo de
decisão quanto aos domínios objecto da Parte IV do Tratado não é comparável
também ao das instituições.
- 34.
- Em segundo lugar, considera que os recursos, uma vez que foi invocado como seu
fundamento o artigo 173.°, quarto parágrafo, do Tratado, são inadmissíveis. Em
primeiro lugar, os Regulamentos n.os 2352/97 e 2494/97 (a seguir os «Regulamentos
recorridos») não dizem directamente respeito ao recorrente. Com efeito, não
fazendo as Antilhas Neerlandesas, enquanto tais, comércio de arroz com a
Comunidade, os regulamentos recorridos apenas lhes poderiam dizer directamente
respeito se fossem por eles afectadas as empresas do sector do arroz estabelecidas
no seu território. Além disso, os regulamentos recorridos também não dizem
individualmente respeito ao recorrente. A Comissão salienta, a este propósito, que
a menção das Antilhas Neerlandesas no anexo IV do Tratado não é determinante.
O recorrente também não pertence a um círculo fechado de sujeitos dotados de
personalidade jurídica no sentido da jurisprudência (acórdão do Tribunal de Justiça
de 15 de Julho de 1963, Plaumann/Comissão, 25/62, Colect., p. 197), não sendo o
número e identidade das pessoas a que os regulamentos recorridos seriam
aplicáveis definitivamente conhecidos aquando da sua aprovação. As Antilhas
Neerlandesas não têm particularidades de facto ou de direito que impliquem a sua
distinção dos restantes PTU. Cada PTU tem, por isso, pelo menos em teoria, a
possibilidade de transformar arroz da mesma forma que as Antilhas Neerlandesas.
A actual situação é diferente da que prevalecia em 1993, em que apenas as
Antilhas Neerlandesas exportavam arroz para a Comunidade, verificando-se que,
a partir de 1996, Montserrat começou igualmente a exportá-lo. A Comissão cita
ainda um extracto do despacho do Tribunal de Primeira Instância de 16 de Junho
de 1998, Comunidade Autónoma de Cantabria/Conselho (T-238/97, Colect.,
p. II-2271, n.os 49 e 50).
- 35.
- Além disso, as Antilhas Neerlandesas são expressamente mencionadas no sétimo
considerando do Regulamento n.° 2352/97 apenas para referir que a decisão do
Ministro da Economia e das Finanças do respectivo Governo que instituiu um
preço mínimo para o arroz exportado não torna supérfluas as medidas de
protecção impugnadas. Daqui não pode concluir-se que o referido regulamento diz
individualmente respeito ao recorrente. Do mesmo modo, o artigo 109.° da Decisão
PTU impõe à Comissão que tenha em conta as consequências que medidas de
protecção poderão ter na economia de todos os PTU e não apenas na das Antilhas
Neerlandesas. Além disso, um critério quantitativo resultante da quantidade de
arroz exportado para a Comunidade não é condição suficiente de admissibilidade
nos termos consagrados pela jurisprudência.
- 36.
- Em terceiro lugar, a Comissão sustenta, antes de mais, que o recorrente não
demonstra interesse em agir que o legitime a interpor os presentes recursos com
base no artigo 173.°, quarto parágrafo, do Tratado. Lembra que as Antilhas
Neerlandesas são apenas uma parte do Reino dos Países Baixos, que, só ele, dispõe
do direito de voto no Conselho. Considera por isso que, atento o lugar ocupado
pelos representantes do recorrente no Governo dos Países Baixos, as Antilhas
Neerlandesas não poderão ser dissociadas do Estado-Membro de que fazem parte
integrante quando este se pronuncia sobre a questão referente aos PTU.
- 37.
- A Comissão salienta seguidamente que o Reino dos Países Baixos tem um direito
de recurso autónomo nos termos do segundo parágrafo do artigo 173.° do Tratado
e que, ao invés dos Regulamentos n.os 304/97 e 1036/97, os regulamentos recorridos
não foram objecto, da sua parte, de recurso de anulação (v. supra n.os 14 e 15).
- 38.
- Finalmente, a Comissão salienta que, para defender os interesses dos PTU, foi
instituído um recurso especial no Conselho, para os Estados-Membros de que
dependem os PTU (artigo 1.°, n.° 5, do anexo IV da Decisão PTU). Esta atribui
por isso a defesa dos interesses dos PTU àqueles Estados-Membros.
- 39.
- Na tréplica, a Comissão afirma que não é desejável o reconhecimento de interesse
em agir ao recorrente na medida em que isso equivaleria a admitir que este poderá
pôr em causa, no tribunal comunitário, a ponderação de interesses feita pelos
órgãos competentes do Reino dos Países Baixos e que, na matéria, apenas a eles
cabe. O Tribunal confirmou esta análise no despacho Comunidad Autónoma de
Cantabria/Conselho, já referido. Ao invés, diferente era a situação no processo em
que foi proferido o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 30 de Abril de
1998, Vlaams Gewest/Comissão (T-214/95, Colect., p. II-717), em que a decisão
recorrida tinha por objecto um auxílio da competência exclusiva de uma entidade
federada do Reino da Bélgica. No caso em pareço, a Comissão sublinha que as
diferentes entidades que constituem os Países Baixos não têm qualquer
competência própria desta natureza no que se refere ao regime comercial dos
PTU.
- 40.
- O Reino de Espanha conclui também pela inadmissibilidade dos recursos
afirmando que o recorrente não tem legitimidade para agir. Sustenta,
nomeadamente, que os regulamentos recorridos não lhe dizem directamente
respeito dado que ainda terão de ser tomadas medidas para a sua aplicação.
- 41.
- O recorrente contesta todos os argumentos da Comissão e sustenta que os recursos
que interpôs são admissíveis por força do disposto no artigo 173.° do Tratado, quer
no segundo quer no quarto parágrafos.
Apreciação do Tribunal
- 42.
- Antes de mais, quanto à admissibilidade dos recursos atenta a sua fundamentação
no segundo parágrafo do artigo 173.° do Tratado, deve lembrar-se que, nos termos
do artigo 3.° da Decisão 88/591/CECA, CEE, Euratom do Conselho, de 24 de
Outubro de 1988, que institui um Tribunal de Primeira Instância das Comunidades
Europeias (JO L 319, p. 1), é competente para conhecer, em primeira instância,
dos recursos a que se refere o quarto parágrafo do artigo 173.° do Tratado. Ao
invés, apenas o Tribunal de justiça é competente para conhecer dos recursos
interpostos nos termos do segundo parágrafo do artigo 173.° do Tratado por um
Estado-Membro, pelo Conselho ou pela Comissão. Por isso, se o recorrente
pretendia interpor recurso, com base nesta última disposição do Tratado, para
anulação dos regulamentos em causa, deveria tê-lo feito nesta jurisdição.
- 43.
- De qualquer modo, resulta da economia geral dos tratados que a noção de
Estado-Membro, no sentido das disposições institucionais e, em especial, das
referentes aos recursos jurisdicionais, abrange apenas as autoridades
governamentais dos Estados-Membros das Comunidades Europeias, não podendo
ser alagada aos governos de regiões ou de comunidades autónomas, qualquer que
seja a amplitude de competências que lhes sejam reconhecidas (acórdão Vlams
Gewest/Comissão, já referido, n.° 28, despacho Comunidad Autónoma de
Cantabria/Conselho, também já referido, n.° 42 e jurisprudência citada, e despacho
do Tribunal de Primeira Instância de 23 de Outubro de 1998, Regione
Puglia/Comissão e Reino de Espanha, T-609/97, Colect., p. II-4051, n.° 16). O
recorrente não pode por isso agir com base no segundo parágrafo do artigo 173.°
do Tratado.
- 44.
- Analisando seguidamente a admissibilidade dos recursos enquanto baseados no
artigo 173.°, quarto parágrafo, do Tratado, deve lembrar-se, à partida, que as
disposições do Tratado sobre o direito de agir dos particulares não podem serinterpretadas restritivamente (v., nomeadamente, o acórdão Plaumann/Comissão,
já referido, p. 22, e o do Tribunal de Primeira Instância de 11 de Julho de 1996,
Métropole télévision e o./Comissão, T-528/93, T-542/93, T-543/93 e T-546/93,
Colect., p. II-649, n.° 60).
- 45.
- Verifica-se que as Antilhas Neerlandesas são uma entidade autónoma que goza de
personalidade jurídica nos termos do direito neerlandês. Ora, um componente
territorial de um Estado-Membro com personalidade jurídica por força do disposto
no direito interno pode, em princípio, interpor recurso nos termos do artigo 173.°,
quarto parágrafo, do Tratado, que permite a qualquer pessoa singular ou colectiva
interpor recurso de decisão de que seja destinatária e de decisões que, embora sob
a forma de regulamento ou decisão dirigida a outra pessoa, lhes digam directa e
individualmente respeito (despacho Comunidad Autónoma de Cantabria/Conselho,
já referido, n.° 43).
- 46.
- Os regulamentos recorridos não são decisões dirigidas ao recorrente, nos termos
do quarto parágrafo do artigo 173.° do Tratado, pelo que se impõe examinar se
constituem actos de âmbito geral ou se deverão ser considerados como decisões
tomadas sob a forma de regulamento. Para avaliar se um acto tem ou não carácter
geral, deve atender-se à sua natureza e aos efeitos jurídicos que visa produzir ou
efectivamente produziu (acórdão do Tribunal de Justiça de 6 de Outubro de 1982,
Alusuisse/Conselho e Comissão, 307/81, Colect., p. 3463, n.° 8).
- 47.
- É verdade que, no caso em apreço, resulta do preâmbulo do Regulamento
n.° 2352/97 que a Comissão tomou em conta, na prática do acto recorrido, a
posição do recorrente e, nomeadamente, a fixação de um preço mínimo na
exportação, por ele decidida. Igualmente, tanto nas suas peças processuais como
no decurso da audiência, a Comissão não contestou que, aquando da aprovação
dos regulamentos recorridos, teve conhecimento de que a maior parte das
importações de arroz originário dos PTU vinha das Antilhas Neerlandesas.
Todavia, impõe-se ter em conta que a Comissão não tomou decisões atentas
apenas as importações de arroz com aquela proveniência. Com efeito, tomou
medidas de alcance geral, indistintamente aplicáveis à importação de arroz de
todos os PTU.
- 48.
- Por conseguinte, os regulamentos recorridos têm, por natureza, carácter geral e não
constituem decisões no sentido do artigo 189.° do Tratado CE (actual artigo
249.° CE).
- 49.
- Importa, no entanto, examinar se, não obstante a natureza genérica dos
regulamentos recorridos, pode considerar-se que dizem directa e individualmente
respeito ao recorrente. Efectivamente, a natureza genérica de uma acto não exclui,
só por si, que possa dizer directa e individualmente respeito a determinadas
pessoas singulares ou colectivas (acórdão do Tribunal de Justiça de 18 de Maio de
1994, Codorniu/Conselho, C-309/89, Colect., p. I-1853, n.° 19; acórdãos do Tribunal
de 14 de Setembro de 1995, Antillean Rice Mills e o./Comissão, T-480/93 e
T-483/93, Colect., p. II-2305, n.° 66, e de 13 de Dezembro de 1995, Exporteurs in
Levende Varkens e o./Comissão, T-481/93 e T-484/93, Colect., p. II-2941, n.° 50).
- 50.
- Quanto, antes de mais, a saber se os regulamentos recorridos dizem directamente
respeito ao recorrente deve recordar-se que, para que um acto de natureza
genérica praticado por uma instituição comunitária diga individualmente respeito
a uma pessoa singular ou colectiva, é necessário que o acto em causa a atinja em
virtude de qualidades que lhe são específicas ou de situação de facto que a
caracterize relativamente a qualquer outra pessoa (acórdãos Plaumann/Comissão,
já referido, p. 223, e Codorniu/Conselho, já referido, n.° 20; acórdãos do Tribunal
de Primeira Instância de 27 de Abril de 1995, CCE de Vittel e o./Comissão,
T-12/93, Colect., p. II-1247, n.° 36, e de 17 de Junho de 1998, UEAPME/Conselho,
T-135/96, Colect., p. II-2335, n.° 69, e despacho do Tribunal de Primeira Instância
de 30 de Setembro de 1997, Federolio/Comissão, T-122/96, Colect., p. II-1559,
n.° 59).
- 51.
- Importa lembra a este respeito que, segundo jurisprudência firmada, o facto de a
Comissão dever ter em conta, por força de disposições específicas, as
consequências do acto que pretende praticar na situação de determinados
particulares é bastante para os individualizar (acórdãos do Tribunal de Justiça de
17 de Janeiro de 1985, Piraiki-Patraiki e o./Comissão, 11/82, Colect., p. 207, de 26
de Junho de 1990, Sofrimport/Comissão, C-152/88, Colect., p. I-2477; acórdão do
Tribunal de Primeira Instância Antillean Rice Mills e o./Comissão, já referido,
n.° 67, e acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Fevereiro de 1999, Antillean Rice
Mills e o./Comissão, C-390/95 P, Colect., p. I-769, n.os 25 a 30).
- 52.
- No caso em pareço, o Regulamento n.° 2352/97 e, enquanto sua medida de
execução, o Regulamento n.° 2494/97, foram aprovados com base no artigo 109.°
da Decisão PTU, que prevê, no seu n.° 1, que a Comissão pode, em determinadas
condições, tomar medidas de protecção.
- 53.
- O artigo 109.° da mesma disposição dispõe, no n.° 2, que, «para a aplicação do
disposto no n.° 1 devem escolher-se prioritariamente as medidas que provoquem
o mínimo de perturbações no funcionamento da associação e da Comunidade.
Essas medidas não devem exceder o estritamente indispensável para sanar as
dificuldades que se tenham manifestado».
- 54.
- Desta disposição resulta que, quando a Comissão pretenda tomar medidas de
protecção com base no n.° 1 do artigo 109.° da Decisão PTU, deve ter em conta
as repercussões negativas que a decisão a tomar poderá ter na economia do país
ou do território de além-mar em causa bem como nas empresas interessadas
(acórdão de 11 de Fevereiro de 1999, Antillean Rice Mills e o./Comissão, já
referido, n.° 28, e acórdão de 14 de Setembro de 1995, Antillean Rice Mills
e o./Comissão, já referido, n.° 70).
- 55.
- Ora, o recorrente figura entre os PTU expressamente referidos no anexo IV do
Tratado a que se aplicam as disposições da Parte IV do Tratado referentes à
associação dos PTU. Por força do disposto no n.° 2 do artigo 109.° da Decisão
PTU, a Comissão devia ter em conta, aquando da aprovação dos regulamentos
recorridos, a situação especial do recorrente, tanto mais que era previsível que as
repercussões negativas das medidas tomadas seriam ressentidas principalmente no
seu território. Efectivamente, naquela altura, a Comissão tinha conhecimento, como
aliás reconheceu nos seus documentos juntos ao processo e na audiência, de que
a maior parte das importações na Comunidade de arroz originário dos PTU
provinha das Antilhas Neerlandesas.
- 56.
- Tendo em conta que o recorrente beneficiava assim de protecção específica do
direito comunitário aquando da aprovação pela Comissão dos regulamento
recorridos, é por estes atingido em virtude de situação de facto que o caracteriza
relativamente a qualquer outra pessoa (acórdãos Plaumann/Comissão, já referido,
p. 223, Piraiki-Patriki, já referido, n.os 28 a 31, e de 11 de Fevereiro de 1999,
Antillean Rice Mills e o./Comissão, já referido, n.° 28). Por conseguinte, os
regulamentos recorridos dizem individualmente respeito ao recorrente nos termos
do artigo 173.°, parágrafo quarto, do Tratado.
- 57.
- É verdade que, como sublinha a Comissão, não basta, para se concluir que um acto
comunitário diz individualmente respeito a uma colectividade regional de um
Estado-Membro, que esta demonstre que o seu cumprimento ou execução é
susceptível de afectar as condições sócio-económicas no respectivo território (v.
despachos Comunidad Autónoma de Cantabria/Conselho, já referido, n.os 49 e 50,
e Regione Puglia/Comissão e Reino de Espanha, já referido, n.os 21 e 22). Todavia,
no caso em pareço, os regulamentos recorridos dizem individualmente respeito ao
recorrente dado que a Comissão, quando se propunha aprová-lo, era obrigada a
ter em conta especificamente a situação do recorrente, nos termos do n.° 2 do
artigo 109.° da Decisão PTU.
- 58.
- Seguidamente, quanto ao interesse do recorrente em agir para obter a anulação
dos regulamentos recorridos, não pode excluir-se apenas porque o reino dos Países
Baixos dispõe de direito de recurso autónomo por força do segundo parágrafo do
artigo 173.° do Tratado. Deve referir-se, a este respeito, que, noutras matérias, a
co-existência do interesse em agir de um Estado-Membro e o de uma das suas
entidades relativamente ao mesmo acto não levou o Tribunal de Primeira Instância
a concluir que o interesse em agir da entidade não era suficiente para a
admissibilidade de um recurso interposto com base no quarto parágrafo do artigo
173.° do Tratado (v. acórdãos do tribunal Vlaams Gewest/Comissão, já referido,
n.° 30, e de 15 de Dezembro de 1999, Freistaat Sachsen e Volkswagen/Comissão,
T-132/96 e T-143/96, ainda não publicado na Colectânea, n.° 92). O facto de o
Reino dos Países Baixos ter podido utilizar, nos termos do artigo 1.°, n.° 5, do
anexo IV da Decisão PTU, o recurso especial para o Conselho contra os
regulamentos recorridos também não é de molde a afectar o interesse em agir do
recorrente no caso em apreço.
- 59.
- Não merece de igual modo acolhimento a tese da Comissão de que a ponderação
feita por um Estado-Membro dos interesses das diferentes regiões que o compõem,
anteriormente à definição da sua posição no Conselho, não pode ser posta em
causa por uma região mediante recurso ao juiz comunitário. Basta ter em conta,
a este propósito, que os regulamentos recorridos são da autoria da Comissão e não
do Conselho. Ora, a Comissão exerce as respectivas funções com plena
independência dos Estados-Membros, no interesse geral da Comunidade.
- 60.
- Analisando por fim a questão de os regulamentos recorridos dizerem directamente
respeito ao recorrente deve concluir-se que o Regulamento n.° 2352/97 contém
uma regulamentação completa que não deixa qualquer margem de apreciação às
autoridades dos Estados-Membros. Com efeito, quanto ao arroz originário dos
PTU, aquele regula, da forma vinculativa, o mecanismo do pedido e da emissão
dos certificados de importação e habilita, além disso, a Comissão a suspender
aquela emissão no caso de ser ultrapassada uma quota que determina e de
perturbações sensíveis do mercado. O Regulamento n.° 2352/97 diz, portanto,
directamente respeito ao recorrente (v. acórdãos do Tribunal de Justiça de 13 de
Maio de 1971, International Fruit Company e o./Comissão, 41/70 a 44/70, Colect.,
p. 411, n.os 23 a 28, e de 23 de Abril de 1986, Les Verts/Parlamento, 294/83,
Colect., p. 1339, n.° 31).
- 61.
- O Regulamento n.° 2494/97 diz também directamente respeito ao recorrente uma
vez que prevê a não emissão de certificados de importação quanto ao arroz do
código NC 1006 originário dos PTU se os pedidos forem apresentados
posteriormente a 3 de Dezembro de 1997 e suspende, até 31 do mesmo mês e ano,
a apresentação de novos pedidos de certificados de importação de arroz com
aquela origem.
- 62.
- Do que antecede se conclui pela admissibilidade dos recursos interpostos.
Quanto ao fundo
- 63.
- Em apoio do recurso o recorrente invoca seis fundamentos no processo T-32/98.
O primeiro consiste na existência de desvio de poder. O segundo em erro na
escolha da base jurídica do Regulamento n.° 2352/97. O terceiro em desrespeito do
princípio da segurança jurídica e o quarto no não cumprimento do n.° 1 do artigo
173.° do Tratado. O quinto consiste em não cumprimento dos artigos 132.°, n.° 1,
e 134.° do Tratado e do artigo 102.° da Decisão PTU bem como do artigo 19.° do
anexo II da mesma decisão. O sexto consiste no não cumprimento do n.° 5 do
artigo 7.° do acordo sobre as medidas de protecção e do artigo 13.°-2, alínea c), do
GATT (Acordo Geral sobre as Pautas Aduaneiras e Comércio) de 1994, bem como
do artigo 228.°, n.° 7, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 300.°,
n.° 7, CE). O sétimo fundamento consiste no não cumprimento do n.° 1 do artigo
109.° da Decisão PTU. O oitavo no não cumprimento do n.° 2 do artigo 109.° damesma decisão. O nono no não cumprimento do artigo 190.° do Tratado CE
(actual artigo 253.° CE) e o décimo em violação de formalidades essenciais.
- 64.
- No processo T-41/98, o recorrente pede a anulação do Regulamento n.° 2494/97
apoiando-se na ilegalidade do Regulamento n.° 2352/97, com base nos fundamentos
invocados no processo T-32/98.
- 65.
- Há, antes de mais, que examinar o fundamento de não cumprimento do artigo
109.°, n.° 1, da Decisão PTU.
Argumentos das partes
- 66.
- O recorrente sustenta, em primeiro lugar, que o n.° 1 do artigo 109.° da Decisão
PTU não autoriza a Comissão a tomar medidas de protecção em virtude do volume
das importações originárias dos PTU. O recorrente reporta-se, a propósito, ao n.° 1
do artigo 132.° do Tratado e sublinha que os Estados-Membros não podem tomar
medidas de protecção que restrinjam as trocas entre eles com base no volume das
importações provenientes de outros Estados-Membros. Em último lugar, salienta
que, admitindo mesmo que a Comissão possa prevalecer-se do volume das
importações provenientes dos PTU para tomar medidas de protecção, no caso em
apreço, não poderá demonstrar a existência do risco de que a quantidade de arroz
importada dos PTU seja de molde a perturbar o mercado comunitário. Em terceiro
lugar, o recorrente sustenta que a perturbação do mercado não poderia decorrer
do volume das importações de arroz proveniente dos PTU dado que fixou um
preço mínimo, na exportação, do arroz originário das Antilhas Neerlandesas.
- 67.
- A Comissão responde, antes de mais, que o primeiro argumento do recorrente
assenta numa interpretação inexacta do n.° 1 do artigo 132.° do Tratado. Este não
constitui uma norma de direito incondicional enunciando apenas um dos objectivos
prosseguidos pela cooperação entre os PTU e a Comunidade. Não poderia por isso
invocar validamente esta disposição para recusar à Comissão o direito de tomar
medidas com base no artigo 109.° da Decisão PTU com base no volume das
importações de produtos deles originários.
- 68.
- Em último lugar, a Comissão salienta que o aumento das quantidades de arroz
importadas dos PTU a partir da campanha 1995/1996 foi mais forte que a do
volume total das importações de arroz na Comunidade. A parte das importações
provenientes dos PTU aumentou posteriormente à campanha de 1994/1995, até
serem tomadas as primeiras medidas de protecção no início de 1997.
- 69.
- A Comissão declara que as estatísticas da Comunidade mostram que o volume total
das importações de arroz originário dos PTU se elevou a 162 541 toneladas de
arroz branqueado na campanha de 1996/1997 e não a 65 000 toneladas, como
pretende o recorrente. O aumento das importações de arroz proveniente dos PTU
sujeitou por isso o preço do arroz paddy comunitário a fortes pressões, impondo
compras em intervenção e mesmo exportações com restituições de arroz indica
comunitário num mercado que é estruturalmente deficitário. As medidas de
protecção conseguiram, efectivamente, suster e reverter a tendência para a baixa
no mercado comunitário.
- 70.
- A Comissão sublinha ainda que não lhe cabe demonstrar a existência de nexo de
causalidade entre a ameaça de perturbação do mercado comunitário do arroz e a
importação de arroz originário dos PTU. Basta a existência de uma certa relação
entre estes dois fenómenos. Ora, é inegável que as importações provenientes de
países terceiros têm influência neste mercado.
- 71.
- Em terceiro lugar, a Comissão responde que, se o arroz originário dos PTU
exportado para a Comunidade é essencialmente originário das Antilhas, não o é
menos que não provém exclusivamente das Antilhas Neerlandesas. A Comissão
sustenta que tinha de fixar um limite para todos os PTU e que não podia por isso
tomar medida distinta exclusivamente para as Antilhas Neerlandesas.
- 72.
- A interveniente afirma que, à data da aprovação do Regulamento n.° 2352/97, as
importações de arroz originário dos PTU provocavam graves perturbações no
mercado comunitário. Cita, nomeadamente, intervenções de deputados e de
membros da Comissão, ao Parlamento Europeu que revelam a existência de
importante aumento daquelas importações a partir de 1985. A interveniente
fornece igualmente indicações sobre o preço do arroz indica em equivalente
descascado produzido no seu território e que traduzem uma baixa deste preço
entre Janeiro de 1997 e Fevereiro de 1998. Lembra também o amplo poder de
apreciação reconhecido à Comissão na matéria.
Apreciação do Tribunal
- 73.
- Deve, antes de mais, lembrar-se que o Regulamento n.° 2352/97 foi aprovado com
base no artigo 109.° da Decisão PTU.
- 74.
- Nos termos do n.° 1 do artigo 109.° da Decisão PTU, a Comissão pode tomar ou
autorizar as «medidas de protecção necessárias» quer «se da aplicação da presente
decisão (Decisão PTU que prevê em princípio o livre acesso à Comunidade dos
produtos originários dos PTU) resultarem perturbações graves num sector da
actividade económica da Comunidade ou de um ou mais Estados-Membros ou o
comprometimento da sua estabilidade financeira externa», quer «se surgirem
dificuldades que ameacem deteriorar um sector de actividade da Comunidade ou
de uma das suas regiões».
- 75.
- Na audiência, a Comissão afirmou que a redacção da primeira frase do segundo
considerando do Regulamento n.° 2352/97 dá a impressão de que este se inclui na
primeira hipótese referida no n.° 1 do artigo 109.° da Decisão PTU.
- 76.
- Deve efectivamente concluir-se que resulta desta passagem do Regulamento
n.° 2352/97 que a Comissão tomou a medida em litígio neste quadro. A primeira
frase do segundo considerando do preâmbulo do Regulamento n.° 2352/97 é
efectivamente do seguinte teor: «A importação de arroz originário dos PTU sem
limite de quantidades pode perturbar gravemente o mercado comunitário do
arroz».
- 77.
- Ora, o Tribunal de Justiça declarou, no acórdão de 11 de Fevereiro de 1999,
Antillean Rice Mills e o./Comissão, já referido, que, «no primeiro caso mencionado
no artigo, isto é, quando a aplicação da Decisão PTU provoque perturbações
graves num sector de actividade económica da Comunidade ou de um ou de vários
Estados-Membros ou comprometa a respectiva estabilidade financeira externa,
deve determinar-se a existência de um nexo de causalidade porque as medidas de
protecção devem ter por objectivo sanar ou atenuar as dificuldades verificadas no
sector considerado» (n.° 47).
- 78.
- Por isso, ainda que a Comissão goze de amplo poder de apreciação não apenas
quanto à existência de condições que justifiquem medidas de protecção mas
também quanto à tomada dessas medidas (acórdãos de 14 de Setembro de 1995,
Antillean Rice Mills e o./Comissão, já referido, n.° 122, e de 11 de Fevereiro de
1999, Antillean Rice Mills e o./Comissão, já referido, n.° 48), não é menos verdade
que, no caso em apreço, lhe cabia, para poder tomar as medidas referidas no
Regulamento n.° 2352/97, demonstrar a existência de um nexo de causalidade entre
a aplicação da Decisão PTU e a superveniência das perturbações do mercado
comunitário.
- 79.
- Ora, impõe-se concluir que não resulta do Regulamento n.° 2352/97 que a
Comissão tenha demonstrado a existência daquele nexo. Assim, no seu preâmbulo,
não se explica de modo algum como e em que medida a aplicação da Decisão
PTU, que garante «a importação do arroz originário dos PTU sem limites
quantitativos» (v., supra, n.° 76), provocava perturbações graves do mercado
comunitário do arroz por forma a impor a aprovação do Regulamento n.° 2352/97
para eliminar ou atenuar as dificuldades encontradas.
- 80.
- É verdade que, à data em que o Regulamento n.° 2352/97 foi aprovado, 27 de
Novembro de 1997, o Regulamento n.° 1036/97, que limitava as importações de
arroz proveniente dos PTU (v., supra, n.° 15), chegava ao seu termo e a decisão de
revisão intercalar, que tem os mesmos efeitos (v., supra, n.° 11), ainda não tinha
entrado em vigor. Através dos regulamentos recorridos, a Comissão pretendeu por
isso controlar e limitar as importações de arroz originário dos PTU entre a
expiração do Regulamento n.° 1036/97 e a entrada em vigor da decisão de revisão
intercalar.
- 81.
- Todavia, em vez de examinar concretamente quais poderiam ser os efeitos da
aplicação da Decisão PTU no mercado comunitário do arroz, a Comissão
limitou-se a presumir que aquela aplicação, na ausência de medidas de protecção
limitadoras das importações de arroz proveniente dos PTU, iria necessariamente
perturbar de forma grave o mercado.
- 82.
- Assim, verifica-se que a Comissão não apurou se o preço do arroz importado dos
PTU era de nível inferior ao do arroz comunitário. Com efeito, a Comissão
reconhece, na resposta a uma questão escrita do Tribunal de 14 de Junho de 1999,
que nunca «comparou o preço do arroz importado dos PTU com o preço do arroz
comunitário». Explica que o seu entendimento de que era necessário tomar a
medida contestada «não se baseava no preço à exportação do arroz eventualmente
mais baixo mas na ameaça de uma importação de quantidades ilimitadas (v.
segundo considerando do Regulamento n.° 2352/97)». Ora, se se tivesse verificado,
como pretende o recorrente, que o arroz importado dos PTU era vendido a preço
superior ao do arroz comunitário, não seria objecto, na Comunidade, de procura
de nível tal que as quantidades importadas tivessem podido determinar
perturbações graves no mercado comunitário após a expiração do Regulamento
n.° 1036/97.
- 83.
- Todavia, a ameaça de importação de quantidades ilimitadas de produtos originários
dos PTU resulta directamente da aplicação das disposições da Parte IV do Tratado
e da Decisão PTU, que prevêem que as trocas com os PTU estão, em princípio,
em pé de igualdade com as trocas entre os Estados-Membros (v., supra, n.os 2 a 8).
Se tal ameaça, que está sempre iminente na ausência de medidas de protecção,
bastasse para demonstrar a existência de nexo de causalidade entre a aplicação da
Decisão PTU e eventuais perturbações sentidas por um sector da actividade
económica da Comunidade e, assim, para justificar a tomada de medidas nos
termos do n.° 1 do artigo 109.° da Decisão PTU, os objectivos prosseguidos pelas
disposições da Parte IV do Tratado e da Decisão PTU seriam eliminados.
- 84.
- Há, assim, que concluir que, ao contrário do exigido pelo artigo 109.°, n.° 1, da
Decisão PTU, a Comissão não apurou a existência de nexo de causalidade entre
o volume das importações provenientes dos PTU e decorrentes da aplicação da
Decisão PTU e eventuais perturbações graves que hajam podido verificar-se no
mercado comunitário do arroz. Esta falta procede de um erro de direito na medida
em que a Comunidade sublinhou ainda, em sua defesa nos dois processos, que não
tinha apurado a existência daquele nexo.
- 85.
- Verifica-se por isso a invocada violação do artigo 109.°, n.° 1, da Decisão PTU.
- 86.
- Não cabe ao Tribunal, no quadro do contencioso de anulação, substituir-se à
Comissão e avaliar, com base nos elementos do processo, se efectivamente,
aquando da aprovação do Regulamento n.° 2352/97, existia um nexo de causalidade
entre a aplicação da Decisão PTU e as perturbações do mercado comunitário do
arroz naquela época (v., neste sentido, o acórdão do Tribunal de Primeira Instância
de 22 de Outubro de 1996, SNCF e British Railways/Comissão, T-79/95 e T-80/95,
Colect., p. II-1491, n.° 64).
- 87.
- Sem necessidade de conhecer da procedência dos outros fundamentos invocadospelo recorrente, o Regulamento n.° 2352/97 deve por isso ser anulado. Por
conseguinte, o Regulamento n.° 2494/97, que assenta no Regulamento n.° 2352/97,
está igualmente viciado de ilegalidade e deve também ser anulado.
Quanto às despesas
- 88.
- Por força do disposto no n.° 2 do artigo 87.° do Regulamento de Processo do
Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida deve ser condenada nas despesas,
se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão sido vencida, há que
condená-la nas despesas, atento o pedido do recorrente.
- 89.
- Nos termos do n.° 4 do artigo 87.° do Regulamento de Processo, o Reino de
Espanha, que interveio em apoio da posição do Conselho e da Comissão, suportará
as suas despesas.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção),
decide:
1) Ordenar a junção dos processos T-32/98 e T-41/98 para efeitos de acórdão.
2) É anulado o Regulamento (CE) n.° 2352/97 da Comissão, de 27 de
Novembro de 1997, que institui medidas específicas para a importação de
arroz originário dos países e territórios ultramarinos.
3) É anulado o Regulamento (CE) n.° 2494/97 da Comissão, de 12 de
Dezembro de 1997, relativo à emissão de certificados de importação de
arroz do código NC 1006 originário dos países e territórios ultramarinos,
no âmbito das medidas específicas instituídas pelo
Regulamento (CE) n.° 2352/97.
4) A Comissão suportará as suas despesas bem como as despesas do Governo
das Antilhas Neerlandesas nos dois processos.
5) A interveniente suportará as suas despesas nos dois processos.
Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 10 de Fevereiro de 2000.
O secretário
O presidente
H. Jung
K. Lenaerts