Language of document : ECLI:EU:C:2021:367

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

6 de maio de 2021(*)

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Regulamento (CE) n.o 1107/2009 — Artigos 4.o e 21.o — Critérios de aprovação — Revisão da aprovação — Produtos fitofarmacêuticos — Regulamento de Execução (UE) n.o 485/2013 — Substâncias ativas clotianidina e imidaclopride — Sementes tratadas com produtos fitofarmacêuticos que contêm estas substâncias ativas — Proibição de utilização não profissional — Princípio da precaução»

No processo C‑499/18 P,

que tem por objeto um recurso de um acórdão do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interposto em 27 de julho de 2018,

Bayer CropScience AG,

Bayer AG, com sede em Monheim am Rhein (Alemanha),

representadas por Z. Zdzieborska, solicitor, A. Robert, avocate, K. Nordlander, advokat, C. Zimmermann, avocat, e P. Harrison, solicitor,

recorrentes,

sendo as outras partes no processo:

Association générale des producteurs de maïs et autres céréales cultivées de la sousfamille des panicoïdées (AGPM), com sede em Montardon (França),

The National Farmers’ Union (NFU), com sede em Stoneleigh (Reino Unido), representada inicialmente por H. Mercer, QC, e J. Robb, barrister, mandatados por N. Winter, solicitor, e em seguida por H. Mercer, QC, J. Robb, barrister, e K. Tandy, advocate,

Association européenne pour la protection des cultures (ECPA), com sede em Bruxelas (Bélgica), representada inicialmente por D. Abrahams, E. Mullier e I. de Seze, avocats, e em seguida por D. Abrahams, e E. Mullier, avocats,

RapoolRing GmbH Qualitätsraps deutscher Züchter, com sede em Isernhagen (Alemanha),

European Seed Association (ESA), com sede em Bruxelas, representada inicialmente por P. de Jong, avocat, K. Claeyé, advocaat, e E. Bertolotto, avocate, e em seguida por P. de Jong, avocat, e K. Claeyé, advocaat,

Agricultural Industries Confederation Ltd, com sede em Peterborough (Reino Unido), representada inicialmente por P. de Jong, avocat, K. Claeyé, advocaat, e E. Bertolotto, avocate, e em seguida por J. Gaul, P. de Jong, avocats, e K. Claeyé, advocaat,

intervenientes em primeira instância,

Comissão Europeia, representada por B. Eggers, P. Ondrůšek, X. Lewis e I. Naglis, na qualidade de agentes,

recorrida em primeira instância,

apoiada por:

Stichting De Bijenstichting, com sede em Vorden (Países Baixos), representada por L. Smale, advocate,

interveniente no presente recurso,

Union nationale de l’apiculture française (UNAF), com sede em Paris (França), representada por B. Fau e J.‑F. Funke, avocats,

Deutscher Berufs und Erwerbsimkerbund eV, com sede em Soltau (Alemanha),

Österreichischer Erwerbsimkerbund, com sede em Großebersdorf (Áustria),

representados por B. Tschida e A. Willand, Rechtsanwälte,

Pesticide Action Network Europe (PAN Europe), com sede em Bruxelas,

Bee Life European Beekeeping Coordination (Bee Life), com sede em Lovaina‑a‑Nova (Bélgica),

Buglife — The Invertebrate Conservation Trust, com sede em Peterborough,

Stichting Greenpeace Council (Greenpeace), com sede em Amesterdão (Países Baixos),

representados por B. Kloostra, advocaat,

Reino da Suécia, representado inicialmente por C. Meyer‑Seitz, A. Falk, H. Shev, J. Lundberg e E. Karlsson, e em seguida por C. Meyer‑Seitz, H. Shev e E. Karlsson, na qualidade de agentes,

intervenientes em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por J.‑C. Bonichot, presidente de secção, K. Lenaerts, presidente do Tribunal de Justiça, exercendo funções de juiz da Primeira Secção, L. Bay Larsen (relator), M. Safjan e N. Jääskinen, juízes,

advogado‑geral: J. Kokott,

secretário: M. Longar, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 3 de junho de 2020,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 17 de setembro de 2020,

profere o presente

Acórdão

1        Com o seu recurso, a Bayer CropScience AG e a Bayer AG pedem, por um lado, a anulação do Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 17 de maio de 2018, Bayer CropScience e o./Comissão (T‑429/13 e T‑451/13, a seguir «acórdão recorrido», EU:T:2018:280), pelo qual este negou provimento ao seu recurso de anulação do Regulamento de Execução (UE) n.o 485/2013 da Comissão, de 24 de maio de 2013, que altera o Regulamento de Execução (UE) n.o 540/2011 no que se refere às condições de aprovação das substâncias ativas clotianidina, tiametoxame e imidaclopride e que proíbe a utilização e a venda de sementes tratadas com produtos fitofarmacêuticos que contenham essas substâncias ativas (JO 2013, L 139, p. 12, a seguir «regulamento controvertido»), e, por outro, a anulação do regulamento controvertido na medida em que este diz respeito às recorrentes.

I.      Quadro jurídico

A.      Diretiva 91/414/CEE

2        Antes de 14 de junho de 2011, a colocação dos produtos fitofarmacêuticos no mercado regia‑se pela Diretiva 91/414/CEE do Conselho, de 15 de julho de 1991, relativa à colocação dos produtos fitofarmacêuticos no mercado (JO 1991, L 230, p. 1).

3        O artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 91/414 dispunha que um produto fitofarmacêutico só podia ser autorizado por um Estado‑Membro nomeadamente se as suas substâncias ativas constarem do anexo I dessa diretiva.

4        O artigo 5.o dessa diretiva estabelecia designadamente:

«À luz dos conhecimentos científicos e técnicos existentes, uma substância ativa será incluída no anexo I por um período inicial não superior a dez anos, se for possível presumir que os produtos fitofarmacêuticos que contêm essa substância ativa respeitam as seguintes condições:

a)      Os seus resíduos resultantes de um[a] aplicação conforme com uma boa prática fitossanitária não têm efeitos prejudiciais para a saúde humana ou animal ou para as águas subterrâneas, ou uma influência inaceitável sobre o ambiente e, na medida em que se revistam de importância toxicológica e ambiental, podem ser determinados por métodos apropriados de uso corrente;

b)      A sua utilização consecutiva a uma aplicação conforme com uma boa prática fitossanitária não tem efeitos prejudiciais para a saúde humana ou animal ou uma influência inaceitável sobre o ambiente, nos termos do disposto no n.o 1, alínea b), subalíneas iv) e v) do artigo 4.o

2.      Para que uma substância ativa seja incluída no anexo I, é necessário ter especialmente em conta os seguintes elementos:

a)      Eventualmente, uma dose diária tolerável pelo homem (ADT);

b)      Se necessário, um nível aceitável de exposição do utilizador;

c)      Eventualmente, uma estimativa do seu destino e disseminação no ambiente, bem como o seu impacte sobre as espécies não visadas.

[…]»

B.      Regulamento (CE) n.o 1107/2009

5        O Regulamento (CE) n.o 1107/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de outubro de 2009, relativo à colocação dos produtos fitofarmacêuticos no mercado e que revoga as Diretivas 79/117/CEE e 91/414 do Conselho (JO 2009, L 309, p. 1), entrou em vigor em 14 de junho de 2011.

6        Os considerandos 8 e 16 deste regulamento têm a seguinte redação:

«(8)      O presente regulamento tem por objetivo garantir um elevado nível de proteção da saúde humana e animal e do ambiente, preservando simultaneamente a competitividade da agricultura da Comunidade. […]

[…]

(16)      Deverá ser prevista, em determinadas condições, a possibilidade de alterar ou retirar a aprovação de uma substância ativa nos casos em que os critérios de aprovação já não sejam cumpridos ou em que o cumprimento da Diretiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2000, que estabelece um quadro de ação comunitária no domínio da política da água esteja comprometido [(JO 2000, L 327, p. 1)].»

7        Por força do artigo 28.o, n.o 1, e do artigo 29.o, n.o 1, alínea a), do referido regulamento, um produto fitofarmacêutico só pode ser colocado no mercado ou utilizado se tiver sido autorizado no Estado‑Membro em causa em conformidade com o referido regulamento, pressupondo a autorização desse produto por um Estado‑Membro, nomeadamente, que as suas substâncias ativas tenham sido aprovadas a nível da União Europeia.

8        O artigo 4.o do Regulamento n.o 1107/2009, com a epígrafe «Critérios de aprovação das substâncias ativas», refere, nomeadamente, os critérios seguintes:

«1.      As substâncias ativas são aprovadas nos termos do anexo II se, à luz dos atuais conhecimentos científicos e técnicos, for previsível que os produtos fitofarmacêuticos que as contêm preenchem os requisitos previstos nos n.os 2 e 3, tendo em conta os critérios de aprovação previstos nos pontos 2 e 3 daquele anexo.

[…]

2.      Os resíduos de produtos fitofarmacêuticos resultantes de uma aplicação de acordo com as boas práticas fitossanitárias e em condições realistas de utilização devem cumprir os seguintes requisitos:

a)      Não terem efeitos nocivos na saúde humana, nomeadamente na dos grupos de pessoas vulneráveis, ou na saúde animal, tendo em conta os efeitos cumulativos e sinérgicos conhecidos, caso estejam disponíveis métodos científicos aceites pela [Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA)] para os avaliar, nem nas águas subterrâneas;

b)      Não terem efeitos inaceitáveis no ambiente.

[…]

3.      Os produtos fitofarmacêuticos, na sequência da sua aplicação de acordo com as boas práticas fitossanitárias e em condições realistas de utilização, devem cumprir os seguintes requisitos:

a)      Serem suficientemente eficazes;

b)      Não terem efeitos nocivos imediatos ou a prazo na saúde humana, nomeadamente na dos grupos de pessoas vulneráveis, ou na saúde animal, diretamente ou através da água potável (tendo em conta as substâncias resultantes do tratamento da água potável), dos géneros alimentícios, dos alimentos para animais ou do ar, nem consequências no local de trabalho, nem outros efeitos indiretos, tendo em conta os efeitos cumulativos e sinérgicos conhecidos, caso estejam disponíveis métodos científicos aceites pela Autoridade para os avaliar, nem nas águas subterrâneas;

c)      Não terem quaisquer efeitos inaceitáveis nos vegetais ou nos produtos vegetais;

d)      Não provocarem sofrimentos nem dores desnecessários aos animais vertebrados a controlar;

e)      Não terem efeitos inaceitáveis no ambiente, tendo particularmente em conta o seguinte, caso estejam disponíveis métodos científicos aceites pela [EFSA] para avaliar esses efeitos:

i)      o seu destino e distribuição no ambiente, particularmente no que respeita à contaminação das águas superficiais, incluindo as águas estuarinas e costeiras, das águas subterrâneas, do ar e do solo, tendo em conta locais distantes do local de utilização devido ao seu transporte a longa distância no ambiente;

ii)      o seu impacto sobre as espécies não visadas, nomeadamente sobre o comportamento atual dessas espécies;

iii)      o seu impacto na biodiversidade e no ecossistema.

[…]»

9        O artigo 7.o desse regulamento, com a epígrafe «Pedido», prevê, no seu n.o 1, primeiro parágrafo:

«O pedido de aprovação de uma substância ativa ou de alteração das condições de aprovação de uma substância ativa é apresentado pelo produtor da substância em causa a um Estado‑Membro, designado por “Estado‑Membro relator”, juntamente com um processo resumo e um processo completo […]; demonstrando que a substância ativa preenche os critérios de aprovação previstos no artigo 4.o»

10      O artigo 12.o do referido regulamento, com a epígrafe «Conclusões da [EFSA]», dispõe, no seu n.o 2, segundo parágrafo:

«No prazo de 120 dias a contar do termo do prazo previsto para a apresentação de comentários escritos, a [EFSA] aprova conclusões à luz dos conhecimentos científicos e técnicos atuais, com base em documentos de orientação disponíveis na altura do pedido, sobre a previsibilidade de a substância ativa satisfazer os critérios previstos no artigo 4.o […]»

11      Nos termos do artigo 21.o do mesmo regulamento, sob a epígrafe «Revisão da aprovação»:

«1.      A Comissão pode rever a aprovação de uma substância ativa em qualquer altura. A Comissão toma em consideração o pedido de um Estado‑Membro de revisão, à luz de novos conhecimentos científicos e técnicos e de dados de monitorização, da aprovação de uma substância ativa, inclusivamente sempre que, após a revisão da autorização nos termos do n.o 1 do artigo 44.o, houver indicação de que pode estar comprometida a realização dos objetivos fixados em conformidade com a subalínea iv) da alínea a) e a subalínea i) da alínea b) do n.o 1 do artigo 4.o e os n.os 2 e 3 do artigo 7.o da Diretiva 2000/60/CE.

Se, à luz de novos conhecimentos científicos e técnicos, a Comissão considerar que existem indicações de que a substância deixou de satisfazer os critérios de aprovação previstos no artigo 4.o, ou que as informações complementares solicitadas nos termos da alínea f) do artigo 6.o não foram apresentadas, informa desse facto os Estados‑Membros, a [EFSA] e o produtor da substância ativa e fixa um prazo para que o produtor apresente os seus comentários.

2.      A Comissão pode solicitar aos Estados‑Membros e à [EFSA] que emitam um parecer ou que prestem assistência científica ou técnica. Os Estados‑Membros podem também apresentar à Comissão os seus comentários no prazo de três meses a contar da data do pedido. A [EFSA] emite parecer ou apresenta os resultados dos seus trabalhos à Comissão no prazo de três meses a contar da data do pedido.

3.      Se concluir que os critérios previstos no artigo 4.o deixaram de estar satisfeitos ou que as informações complementares solicitadas nos termos da alínea f) do artigo 6.o não foram apresentadas, a Comissão aprova, pelo procedimento de regulamentação a que se refere o n.o 3 do artigo 79.o, um regulamento para retirar ou alterar a aprovação.

[…]»

12      O anexo II do Regulamento n.o 1107/2009, com a epígrafe «Procedimento e critérios para a aprovação de substâncias ativas, de protetores de fitotoxicidade e de agentes sinérgicos em conformidade com o capítulo II», contém, no ponto 3, intitulado «Critérios para a aprovação de uma substância ativa», o ponto 3.8.3, com a seguinte redação:

«Uma substância ativa, um protetor de fitotoxicidade ou um agente sinérgico só são aprovados se, em resultado de uma avaliação adequada do risco com base nas orientações para a realização de testes, acordadas a nível [da União] ou internacional, se estabelecer que a utilização nas condições de utilização propostas para um produto fitofarmacêutico que contenha a substância ativa, o protetor de fitotoxicidade ou o agente sinérgico:

–        representará uma exposição desprezível para as abelhas, ou

–        não tem efeitos inaceitáveis agudos ou crónicos na sobrevivência e no desenvolvimento da colónia, tendo em conta os efeitos nas larvas das abelhas ou no comportamento das abelhas.»

13      O artigo 69.o deste regulamento, sob a epígrafe «Medidas de emergência», prevê:

«Caso seja evidente que uma substância ativa, um protetor de fitotoxicidade, um agente sinérgico ou um coformulante aprovados, ou um produto fitofarmacêutico autorizado nos termos do presente regulamento, são suscetíveis de constituir um risco grave para a saúde humana ou animal ou para o ambiente, e que esse risco não pode ser contido satisfatoriamente através de medidas adotadas pelos Estados‑Membros em causa, são imediatamente adotadas medidas para restringir ou proibir a utilização e/ou venda dessa substância ou desse produto pelo procedimento de regulamentação a que se refere o n.o 3 do artigo 79.o, por iniciativa da Comissão ou a pedido de um Estado‑Membro. Antes da adoção das referidas medidas, a Comissão examina os factos e pode solicitar um parecer à [EFSA]. A Comissão pode fixar um prazo para a emissão desse parecer.»

14      O artigo 78.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Alterações e medidas de execução», prevê, no seu n.o 3, que, após a revogação da Diretiva 91/414 e da sua substituição pelo Regulamento n.o 1107/2009, as substâncias ativas incluídas no anexo I da Diretiva 91/414 consideram‑se aprovadas ao abrigo do Regulamento n.o 1107/2009 e passam a estar enumeradas na parte A do anexo do Regulamento de Execução (UE) n.o 540/2011 da Comissão, de 25 de maio de 2011, que dá execução ao Regulamento n.o 1107/2009, no que diz respeito à lista de substâncias ativas aprovadas (JO 2011, L 153, p. 1).

II.    Antecedentes do litígio

15      As substâncias ativas clotianidina e imidaclopride (a seguir «substâncias em causa»), pertencentes à família dos neonicotinóides, que tinham sido incluídas no anexo I da Diretiva 91/414, são enumeradas na parte A do anexo do Regulamento de Execução n.o 540/2011.

16      Na sequência de incidentes envolvendo a má utilização de produtos fitofarmacêuticos compostos, designadamente, pelas substâncias em causa e que causaram perdas de colónias de abelhas melíferas, a Comissão, em 18 de março de 2011, pediu à EFSA que revisse o sistema existente para a avaliação do risco dos produtos fitossanitários para as abelhas, instituído pela Organização Europeia e Mediterrânica para a Proteção das Plantas (OEPP), à luz da avaliação dos riscos crónicos para as abelhas, da exposição a pequenas quantidades, da exposição à gutação e da avaliação dos riscos cumulados. Esse sistema era apresentado num documento intitulado «Sistema de avaliação do risco dos produtos fitossanitários para o ambiente» e com a referência PP 3/10 (a seguir «Orientações da OEPP»).

17      Em 30 de março de 2012, foram publicados na revista Science dois estudos sobre os efeitos subletais de substâncias da família dos neonicotinóides nas abelhas. O primeiro desses estudos era relativo a produtos com a substância ativa tiametoxame (a seguir «estudo Henry»), o segundo dizia respeito a produtos contendo a substância ativa imidaclopride (a seguir, conjuntamente, «estudos de março de 2012»). Os autores desses estudos concluíram que os níveis normais dessas duas substâncias ativas podiam ter efeitos consideráveis na estabilidade e sobrevivência das colónias de abelhas melíferas e de abelhões.

18      Em 3 de abril de 2012, a Comissão pediu à EFSA, ao abrigo do artigo 21.o do Regulamento n.o 1107/2009, que avaliasse os estudos de março de 2012 e verificasse se as doses utilizadas nas experiências mencionadas nesses estudos eram comparáveis às doses às quais as abelhas estavam efetivamente expostas na União, tendo em conta as utilizações autorizadas a nível da União e as autorizações dadas pelos Estados‑Membros. A Comissão perguntava também se as conclusões do estudo eram transponíveis para outros neonicotinóides que eram utilizados para tratamento de sementes, em especial a clotianidina.

19      Em 25 de abril de 2012, a Comissão pediu à EFSA que atualizasse, até 31 de dezembro de 2012, as avaliações dos riscos associados, nomeadamente, às substâncias em causa, em particular no que respeitava, por um lado, aos efeitos agudos e crónicos no desenvolvimento e na sobrevivência das colónias, levando em conta os efeitos nas larvas de abelhas e no comportamento das abelhas e, por outro, os efeitos de doses subletais na sobrevivência e no comportamento das abelhas.

20      Em 23 de maio de 2012, em resposta ao pedido da Comissão de 18 de março de 2011, a EFSA publicou o parecer científico sobre a iniciativa científica subjacente à realização de uma avaliação dos riscos dos produtos fitofarmacêuticos para as abelhas (a seguir «parecer da EFSA»). Esse documento identificava vários domínios em que as futuras avaliações dos riscos para as abelhas deveriam ser melhoradas. Sublinhava, nomeadamente, vários pontos fracos das Orientações da OEPP, que levavam a incertezas quanto ao grau real de exposição das abelhas melíferas, e suscitava questões pertinentes quanto à saúde das abelhas que não tivessem sido anteriormente abordadas nas Orientações da OEPP.

21      Em 1 de junho de 2012, em resposta ao primeiro pedido da Comissão de 3 de abril de 2012, a EFSA apresentou a declaração sobre as conclusões de recentes estudos relativos aos efeitos subletais nas abelhas de certos neonicotinóides à luz das utilizações atualmente autorizadas na Europa. Nessa declaração, a EFSA avaliava os estudos de março de 2012 e um terceiro estudo, relativo à clotianidina, publicado em janeiro de 2012 (a seguir «estudo Schneider»). Em conjunto, a EFSA concluía pela necessidade de levar a cabo mais investigações com níveis de exposição diferentes ou noutras situações.

22      Em 16 de janeiro de 2013, a EFSA publicou as suas conclusões sobre a avaliação dos riscos das substâncias em causa para as abelhas (a seguir «conclusões da EFSA»), que identificavam:

–        um risco agudo elevado para as abelhas melíferas em caso de exposição à deriva de poeira na altura da sementeira de milho e de cereais (clotianidina, imidaclopride, tiametoxame), de colza (clotianidina, imidaclopride e, exceto nas utilizações à taxa mais baixa autorizada na União, tiametoxame) e de algodão (imidaclopride e tiametoxame);

–        um risco agudo elevado para as abelhas em caso de exposição a resíduos no néctar e no pólen em utilizações na colza (clotianidina e imidaclopride) e ainda no algodão e no girassol (imidaclopride), e

–        um risco agudo elevado em caso de exposição na gutação nas utilizações no milho (tiametoxame).

23      Além disso, as conclusões da EFSA evidenciaram numerosas incertezas devidas à falta de dados científicos. Isto respeitava, em particular, à exposição das abelhas melíferas à poeira, à ingestão de néctar e de pólen contaminados e à gutação, ao risco agudo e ao risco a longo prazo para a sobrevivência e desenvolvimento das colónias de abelhas melíferas, ao risco para outros insetos polinizadores, ao risco resultante de resíduos na melada e ao risco resultante dos resíduos nas culturas sucessoras.

24      Tendo em conta os riscos identificados pela EFSA, a Comissão adotou, em 24 de maio de 2013, o regulamento controvertido.

25      O artigo 1.o desse regulamento introduziu, nomeadamente para as substâncias em causa, as seguintes restrições:

–        proibição de qualquer utilização não profissional, no interior ou no exterior;

–        proibição de utilizações no tratamento de sementes ou dos solos nos seguintes cereais, quando sejam semeados entre janeiro e junho: cevada, milho painço, aveia, arroz, centeio, sorgo, triticale, trigo;

–        proibição de tratamentos foliares para os cereais seguintes: cevada, milho painço, aveia, arroz, centeio, sorgo, triticale, trigo, e

–        proibição das utilizações no tratamento das sementes, no tratamento dos solos ou nas aplicações foliares em cerca de uma centena de culturas, incluindo a colza, a soja, o girassol e o milho, com exceção das utilizações em estufa e do tratamento foliar após floração.

26      Acresce que, com o seu artigo 2.o, o regulamento controvertido proibiu a utilização e a colocação no mercado das sementes das culturas enunciadas no anexo II deste regulamento tratadas com produtos fitofarmacêuticos que contivessem as substâncias em causa, com exceção das sementes utilizadas em estufa.

III. Recurso no Tribunal Geral e acórdão recorrido

27      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 19 de agosto de 2013, a Bayer CropScience e a Syngenta Crop Protection AG, apoiadas pela Association générale des producteurs de maïs et autres céréales cultivées de la sous‑famille des panicoïdées (AGPM), The National Farmers’ Union (NFU), pela Association européenne pour la protection des énations (ECPA), pela Rapool‑Ring GmbH Qualitätsraps deutscher Züchter, pela European Seed Association (ESA) e pela Agricultural Industries Confederation Ltd interpuseram um recurso de anulação do regulamento controvertido.

28      Em apoio do referido recurso, a Bayer CropScience e a Syngenta Crop Protection apresentaram alegações relativas principalmente à aplicação do artigo 21.o, n.os 1 e 3, do Regulamento n.o 1107/2009.

29      Com o acórdão recorrido, o Tribunal Geral negou provimento ao recurso e condenou a Bayer CropScience e a Syngenta Crop Protection nas despesas.

IV.    Pedidos das partes no presente recurso

30      A Bayer CropScience e a Bayer pedem que o Tribunal de Justiça se digne:

–        anular o acórdão recorrido;

–        anular o regulamento controvertido na parte em que lhes diz respeito; e

–        condenar a Comissão nas despesas do processo no Tribunal Geral e no âmbito do recurso para o Tribunal de Justiça.

31      A NFU e a Agricultural Industries Confederation formulam os mesmos pedidos que a Bayer CropScience e a Bayer. A ECPA apoia os pedidos destas últimas sem formular nenhum argumento próprio.

32      A Comissão pede que o Tribunal de Justiça negue provimento ao presente recurso e condene a Bayer CropScience e a Bayer no pagamento das despesas.

33      A Union nationale de l’apiculture française (UNAF), a Deutscher Berufs‑ und Erwerbsimkerbund eV, a Österreichischer Erwerbsimkerbund, a Pesticide Action Network Europe (PAN Europe), a Bee Life European Beekeeping Coordination (Bee Life), o Buglife — The Invertebrate Conservation Trust, o Stichting Greenpeace Council (Greenpeace) e o Reino da Suécia, intervenientes em primeira instância, apoiam os pedidos da Comissão.

34      O mesmo acontece com a Stichting De Bijenstichting, que, por Despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 7 de fevereiro de 2019, foi admitida a intervir em apoio da Comissão no âmbito do presente recurso.

V.      Quanto ao presente recurso

35      Em apoio do seu recurso, a Bayer CropScience e a Bayer invocam seis fundamentos relativos, respetivamente, a erros de direito relativos à interpretação e à aplicação do artigo 21.o, n.os 1 e 3, do Regulamento n.o 1107/2009, bem como a erros de direito relativos à aplicação das medidas cautelares.

A.      Quanto à admissibilidade do recurso

36      Há que recordar, antes de mais, que a existência de interesse em agir por parte do autor de um recurso pressupõe que o recurso é suscetível pelo seu resultado de lhe conferir um benefício [v., nomeadamente, Despacho da vice‑presidente do Tribunal de Justiça de 16 de janeiro de 2020, Highgate Capital Management/Comissão, C‑605/19 P(R) e C‑605/19 P(R)‑R, não publicado, EU:C:2020:12, n.o 49 e jurisprudência referida].

37      No caso em apreço, como salienta a advogada‑geral no n.o 58 das suas conclusões, o interesse em agir da Bayer CropScience não suscitava dúvidas até à prolação do acórdão recorrido, uma vez que o regulamento controvertido limitava significativamente a utilização de produtos fitofarmacêuticos com base nas substâncias em causa, fabricadas por esta sociedade, e essas restrições teriam desaparecido se tivesse sido dado provimento ao recurso.

38      Todavia, pouco tempo após a prolação do acórdão recorrido, foram adotados o Regulamento de Execução (UE) 2018/783 da Comissão, de 29 de maio de 2018, que altera o Regulamento de Execução (UE) n.o 540/2011 no que respeita às condições de aprovação da substância ativa «imidaclopride» (JO 2018, L 132, p. 31), e o Regulamento de Execução (UE) 2018/784 da Comissão, de 29 de maio de 2018, que altera o Regulamento de Execução (UE) n.o 540/2011 no que respeita às condições de aprovação da substância ativa «clotianidina» (JO 2018, L 132, p. 35).

39      Estes regulamentos, como observa, em substância, a advogada‑geral no n.o 59 das suas conclusões, embora tenham redefinido as condições de aprovação das substâncias em causa, tornando‑as ainda mais restritivas do que as anteriormente fixadas pelo regulamento controvertido, não foram impugnados pelas recorrentes.

40      A este respeito, o Tribunal de Justiça reconheceu que o interesse em agir de um recorrente não desaparece necessariamente pelo facto de o ato por este impugnado ter deixado de produzir efeitos no decurso da instância (Acórdão de 28 de maio de 2013, Abdulrahim/Conselho e Comissão, C‑239/12 P, EU:C:2013:331, n.o 62). Com efeito, um recorrente pode conservar um interesse em obter uma declaração de ilegalidade do referido ato relativamente ao período em que era aplicável e produziu os seus efeitos, conservando essa declaração, pelo menos, um interesse enquanto fundamento de uma eventual ação de responsabilidade (Acórdãos de 27 de junho de 2013, Xeda International e Pace International/Comissão, C‑149/12 P, não publicado, EU:C:2013:433, n.o 32, e de 17 de setembro de 2015, Mory e o./Comissão, C‑33/14 P, EU:C:2015:609, n.o 69 e jurisprudência referida).

41      É o que acontece no caso em apreço. Com efeito, na medida em que a Bayer CropScience produz e comercializa as substâncias ativas visadas pelo regulamento controvertido e produtos fitofarmacêuticos que as contêm, o recurso seria suscetível de lhe conferir um benefício no âmbito de uma eventual ação de responsabilidade.

42      No que respeita ao argumento da UNAF, segundo o qual o recurso é inadmissível no seu conjunto, uma vez que visa uma nova apreciação dos factos, há que observar que, para além do facto, por um lado, de ser absolutamente geral e não identificar, em apoio da inadmissibilidade do recurso, nenhum elemento preciso da petição de recurso e, por outro, de não ter sido invocado pela Comissão, parte recorrida em apoio dos pedidos da UNAF, as recorrentes, globalmente, identificaram os números do acórdão recorrido que, segundo elas, padecem de um erro, mas sem pedir ao Tribunal de Justiça que proceda de forma genérica a uma nova apreciação dos factos.

43      Por último, há que referir que, embora o presente recurso tenha sido interposto em nome da Bayer CropScience e da Bayer, só a primeira sociedade era parte no processo no Tribunal Geral. Ora, nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, só pode ser interposto recurso pelas partes e partes intervenientes no processo do processo no Tribunal Geral, bem como pelos Estados‑Membros e instituições da União. Não tendo a Bayer participado no processo no Tribunal Geral e não tendo invocado nenhuma circunstância particular suscetível, eventualmente, de a habilitar a interpor recurso, este último é inadmissível na medida em que foi interposto em nome dessa sociedade.

44      Por outro lado, é útil recordar que, uma vez que a Syngenta Crop Protection não interpôs recurso do acórdão recorrido, a substância ativa «tiametoxame» não é visada pelo presente processo.

B.      Quanto ao mérito

1.      Quanto ao primeiro fundamento

a)      Argumentos das partes

45      A Bayer CropScience sustenta que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao concluir, nomeadamente nos n.os 162 e 179 do acórdão recorrido, que um aumento do nível de certeza dos conhecimentos científicos anteriores podia ser qualificado de «conhecimento novo», autorizando assim a Comissão a reexaminar a aprovação em causa em aplicação do artigo 21.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1107/2009.

46      A Comissão considera que este fundamento deve ser julgado improcedente.

b)      Apreciação do Tribunal de Justiça

47      Os n.os 162, 164 e 179 do acórdão recorrido têm a seguinte redação:

«162      […] como acertadamente salienta a ECPA, o conceito de “novos conhecimentos científicos e técnicos” não pode ser interpretado exclusivamente de modo temporal, pois inclui igualmente uma componente qualitativa, aliás, tanto ligada ao qualificativo “novo” como ao de “científico” Daí resulta que o limiar de aplicação do artigo 21.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1107/2009 não é atingido se os “novos conhecimentos” apenas disserem respeito a simples repetições de conhecimentos anteriores, a novas suposições sem fundamento sólido e a considerações políticas sem ligação com a ciência. Em resumo, os “novos conhecimentos científicos e técnicos” devem, pois, ter real relevância para a apreciação da manutenção dos requisitos de aprovação do artigo 4.o do Regulamento n.o 1107/2009.

[…]

164      Portanto e em conclusão, para a Comissão poder proceder a uma revisão da aprovação de uma substância ativa, nos termos do artigo 21.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1107/2009, basta que existam estudos novos […] cujos resultados suscitem, face aos conhecimentos disponíveis na anterior avaliação, preocupações quanto à questão de saber se continua a cumprir os requisitos de aprovação do artigo 4.o do Regulamento n.o 1107/2009, sem que seja necessário, nessa fase, verificar se essas preocupações têm realmente fundamento, uma vez que essa verificação está reservada à própria revisão.

[…]

179      Contudo, a qualificação desses resultados confirmativos de novos conhecimentos científicos pressupõe pelo menos que as novas metodologias sejam mais fiáveis do que as anteriormente utilizadas. Com efeito, num caso como esse, seria, então, o aumento do grau de certeza dos conhecimentos anteriores que deveria ser qualificado de conhecimento científico novo. No âmbito de uma decisão sobre a gestão do risco por aplicação do princípio da precaução, essa informação deve ser considerada relevante, ao contrário do que afirma a Bayer [CropScience].»

48      Importa salientar que resulta dos n.os 162, 164 e 179 do acórdão recorrido que o limiar de aplicação do procedimento de revisão, previsto no artigo 21.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1107/2009, pressupõe o surgimento de novos conhecimentos científicos que levem a crer que a substância em causa pode já não cumprir os critérios de aprovação, podendo estes novos conhecimentos científicos consistir em novas metodologias que forneceram resultados que aumentam o grau de certeza dos conhecimentos científicos anteriores.

49      Ora, ao fixar assim o limiar de aplicação do processo de reapreciação, o Tribunal Geral cometeu um erro de direito.

50      Com efeito, o artigo 21.o, n.o 1, primeiro parágrafo, primeiro período, do Regulamento n.o 1107/2009 autoriza a Comissão a rever a aprovação de uma substância ativa em qualquer altura, sem outras condições. Só nas situações expressamente definidas na segunda frase deste artigo 21.o, n.o 1, primeiro parágrafo, é que a abertura de um procedimento de revisão pressupõe a existência de novos conhecimentos científicos e técnicos.

51      A este respeito, o Tribunal de Justiça já declarou que a existência de novos conhecimentos científicos e técnicos é apenas uma das hipóteses em que a Comissão pode rever a aprovação de uma substância ativa (v., neste sentido, Acórdão de 1 de outubro de 2019, Blaise e o., C‑616/17, EU:C:2019:800, n.o 99).

52      Quanto ao considerando 16 do Regulamento n.o 1107/2009, que a Bayer CropScience invoca, não é pertinente, uma vez que as condições a que se refere são, como indica a advogada‑geral no n.o 80 das suas conclusões, as que devem verificar‑se para alterar ou retirar uma aprovação e não para dar início a um procedimento de revisão.

53      Dito isto, o erro de direito constatado no n.o 49 do presente acórdão não é passível de justificar a anulação do acórdão recorrido.

54      Com efeito, em conformidade com jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, se os fundamentos de uma decisão do Tribunal Geral contiverem uma violação do direito da União, mas se concluir que o seu dispositivo se baseia noutros fundamentos jurídicos, essa violação não é suscetível de acarretar a anulação dessa decisão e há que proceder à substituição da fundamentação (Acórdão de 23 de janeiro de 2019, Deza/ECHA, C‑419/17 P, EU:C:2019:52, n.o 87 e jurisprudência referida).

55      Ora, embora o Tribunal Geral tenha considerado, erradamente, que eram necessários novos conhecimentos científicos para autorizar a Comissão a rever a aprovação de uma substância ativa, na aceção do artigo 21.o, n.o 1, primeiro parágrafo, primeiro período, do Regulamento n.o 1107/2009, declarou, todavia, com razão, no n.o 217 do acórdão recorrido, que foi acertadamente que a Comissão considerou, no caso em apreço, que havia que proceder a uma revisão da aprovação das substâncias em causa.

56      À luz destas considerações, o terceiro fundamento deve ser julgado inoperante.

2.      Quanto ao segundo fundamento

a)      Argumentos das partes

57      A Bayer CropScience acusa o Tribunal Geral de ter cometido um erro de direito na sua interpretação do artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009, ao declarar que, para efetuar a avaliação dos riscos, a EFSA se baseou corretamente no seu próprio parecer e não estava obrigada a seguir o documento oficial de orientação relativo às avaliações dos riscos, em vigor no momento da revisão da aprovação das substâncias em causa.

58      Segundo essa sociedade, o Tribunal Geral enganou‑se ao basear‑se no facto de ter sustentado que, para proceder à avaliação dos riscos, a EFSA estava obrigada a aplicar o documento de orientação em vigor à data da concessão das aprovações iniciais, apesar de ter sustentado, como decorria da petição e da sua réplica, que a EFSA tinha a obrigação de aplicar as orientações em vigor no momento da revisão da aprovação das substâncias em causa. Por outro lado, as orientações oficiais de avaliação dos riscos aplicáveis no momento dessa revisão foram atualizadas em 2010, ou seja, posteriormente à adoção do Regulamento n.o 1107/2009 e dos critérios de aprovação previstos no artigo 4.o e no ponto 3.8.3 do anexo II deste regulamento.

59      A Comissão entende que este fundamento deve ser julgado improcedente.

b)      Apreciação do Tribunal de Justiça

60      Como resulta, nomeadamente, dos n.os 228, 260 e 271 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral baseou‑se na circunstância de a Bayer CropScience ter alegado que a EFSA e a Comissão estavam obrigadas, no âmbito do procedimento de revisão previsto no artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009, a basear a avaliação dos riscos num documento de orientação disponível à data do pedido de aprovação de uma substância ativa, adotado quer a nível da União, quer a nível internacional, quando essa sociedade visou, na realidade, como decorre claramente da petição que deu entrada no Tribunal Geral, o documento de orientação disponível no momento da revisão da aprovação das substâncias em causa.

61      Daqui resulta que o Tribunal Geral desvirtuou os factos imputados pela Bayer CropScience à EFSA e à Comissão e que pretensamente viciou o procedimento de revisão da aprovação das substâncias em causa.

62      Embora esta desvirtuação tenha levado o Tribunal Geral a declarar, em substância, nos n.os 266 e 271 do acórdão recorrido, que, no âmbito do procedimento de revisão nos termos do artigo 21.o do Regulamento n.o 1107/2009, a avaliação dos riscos para uma substância ativa aprovada não se pode basear nos documentos de orientação disponíveis à data do pedido de aprovação dessa substância, em contrapartida, não o levou, contrariamente ao que alega a Bayer CropScience, a constatar que essa avaliação não devia ser baseada no documento em vigor no momento da revisão.

63      Na realidade, como resulta dos n.os 16, 17, 223 a 235 e 238 do acórdão recorrido, é na sequência da adoção de uma diretiva que reforça os requisitos de aprovação, nomeadamente, das substâncias em causa, no que respeita à proteção, em particular, das abelhas, que, por um lado, a Comissão, em 18 de março de 2011, pediu à EFSA que reexaminasse o sistema existente, estabelecido pelo OEPP durante o ano de 2010, para a avaliação do risco dos produtos fitossanitários para as abelhas, em relação à avaliação dos riscos crónicos para as abelhas, da exposição a doses baixas, da exposição à gutação e da avaliação dos riscos cumulativos e, por outro, a EFSA emitiu o seu parecer com base numa utilização muito completa dos estudos disponíveis e na qual, em primeiro lugar, são analisadas em pormenor as diferentes vias de exposição das diferentes categorias de abelhas, em segundo lugar, são avaliadas as orientações existentes para os ensaios, em terceiro lugar, são identificadas certas fraquezas dessas orientações relativamente aos ensaios utilizados até agora e, em quarto lugar, é preconizado desenvolver as orientações existentes tendo em vista integrar nelas o estado atual dos conhecimentos científicos sobre certos pontos, e se for caso disso desenvolver novas orientações.

64      O Tribunal Geral deduziu daí, nos n.os 239 e 240 do acórdão recorrido, que, embora o parecer da EFSA, que dá uma base científica que pode servir de fundamento ao desenvolvimento de documentos de orientação e de linhas diretrizes para os ensaios a realizar, não constitua por si mesmo um documento desse tipo, a EFSA não se podia basear no seu parecer no âmbito da avaliação dos riscos, uma vez que, enquanto documento que analisa em pormenor as diferentes vias de exposição das diferentes categorias de abelhas e que avalia as orientações existentes para os ensaios, esse parecer podia servir para evidenciar os domínios em que as avaliações efetuadas até então apresentavam lacunas, suscetíveis de esconder riscos ainda não avaliados e não tidos em conta no âmbito das anteriores decisões de gestão do risco relativas às substâncias em causa.

65      Ao fazê‑lo, a Bayer CropScience sustenta que o Tribunal Geral se afastou da exigência prevista no ponto 3.8.3 do anexo II do Regulamento n.o 1107/2009 e no artigo 12.o, n.o 2, deste, de basear a avaliação dos riscos em orientações.

66      A esse respeito, há que lembrar que, por um lado, o ponto 3.8.3 do anexo II do Regulamento n.o 1107/2009 prevê que uma substância ativa só é aprovada se se demonstrar, no termo de uma avaliação dos riscos adequada com base nas orientações para os testes adotadas à escala da União ou à escala internacional, que a utilização dos produtos fitofarmacêuticos que contenham essa substância ativa, nas condições de utilização propostas, provocará uma exposição insignificante das abelhas, ou não terá efeitos agudos ou crónicos inaceitáveis na sobrevivência e desenvolvimento da colónia, tendo em conta os efeitos sobre as larvas de abelhas e o comportamento das abelhas.

67      Por outro lado, o artigo 12.o, n.o 2, segundo parágrafo, do referido regulamento dispõe que, no prazo de 120 dias a contar do termo do prazo para apresentação de comentários escritos, a EFSA adota, tendo em conta o estado atual dos conhecimentos científicos e técnicos atuais, utilizando os documentos de orientação disponíveis à data do pedido de aprovação de uma substância ativa, conclusões em que precisa se essa substância ativa é suscetível de satisfazer os critérios de aprovação previstos no artigo 4.o desse mesmo regulamento.

68      Em contrapartida, no âmbito da revisão da aprovação de uma substância ativa, o artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009, lido em conjugação com o n.o 1, segundo parágrafo, desse artigo, prevê que, quando a Comissão, tendo em conta os novos conhecimentos científicos e técnicos, chegue à conclusão de que deixaram de estar preenchidos os critérios de aprovação previstos no artigo 4.o do referido regulamento, é adotado um regulamento que retire ou altere a aprovação.

69      Decorre do exposto que, no âmbito da revisão da aprovação de uma substância ativa, a conclusão de que deixaram de estar satisfeitos os critérios de aprovação previstos no artigo 4.o do Regulamento n.o 1107/2009 pode basear‑se em novos conhecimentos, desde que seja científica ou técnica, pouco importando a fonte ou o documento do qual provém.

70      Tal interpretação do artigo 21.o, n.o 3, deste regulamento, que implica que, na referida revisão, são tidos em conta os melhores conhecimentos científicos e técnicos disponíveis, está, de resto, em consonância com o objetivo referido no considerando 8 do referido regulamento, de garantir um elevado nível de proteção da saúde humana e animal e do ambiente.

71      Resulta de todas as considerações precedentes que, embora tenha desvirtuado, como se concluiu nos n.os 60 e 61 do presente acórdão, os argumentos invocados pela Bayer CropScience em apoio do seu fundamento, o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao declarar, no n.o 240 do acórdão recorrido, que a EFSA, tendo identificado deficiências nas Orientações da OEPP, se podia basear no seu parecer no âmbito da avaliação dos riscos. Com efeito, enquanto documento que analisa em pormenor as diferentes vias de exposição das diferentes categorias de abelhas e que avalia as orientações existentes para os ensaios, o parecer da EFSA podia servir para evidenciar os domínios em que as avaliações efetuadas até então apresentavam lacunas, suscetíveis de esconder riscos ainda não avaliados e não tidos em conta no âmbito das anteriores decisões de gestão do risco relativas às substâncias em causa.

72      Nestas condições, há que declarar o segundo fundamento inoperante.

3.      Quanto ao terceiro e quinto fundamentos

73      A Bayer CropScience acusa o Tribunal Geral de ter cometido um erro de direito na aplicação do artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009, em primeiro lugar, ao não ter tido em conta o facto de que a EFSA devia efetuar uma avaliação dos riscos adequada, em segundo lugar, ao concluir que a Comissão podia adotar medidas de emergência com base nesta disposição, em terceiro lugar, ao não lhe ter concedido a possibilidade de apresentar os dados em falta, e, em quarto lugar, ao ter violado o princípio da segurança jurídica ao concluir que uma alteração no contexto regulamentar dos critérios de aprovação podia bastar por si só para permitir à Comissão eximir‑se do ónus da prova que lhe incumbia à luz da referida disposição.

74      A Comissão considera que o terceiro e quinto fundamentos devem ser julgados improcedentes.

a)      Quanto à primeira parte do terceiro fundamento e ao quinto fundamento

1)      Argumentos das partes

75      A Bayer CropScience acusa o Tribunal Geral de, nos n.os 309 e 310 do acórdão recorrido, não ter analisado se a avaliação dos riscos e a avaliação científica eram suficientemente exaustivas e esclarecidas para justificar a adoção do regulamento controvertido. Seria contrário às garantias processuais que constam do Regulamento n.o 1107/2009 que a Comissão pudesse precipitar um procedimento de revisão antes de adotar com ligeireza uma decisão de alteração ou revogação de uma aprovação sem, em momento algum, ter efetuado ou se ter baseado numa avaliação dos riscos exaustiva.

76      A Comissão contesta este argumento.

2)      Apreciação do Tribunal de Justiça

77      Os n.os 309 e 310 do acórdão recorrido, nos quais se concentram as alegações apresentadas pela Bayer CropScience no âmbito da primeira parte do terceiro fundamento, têm a seguinte redação:

«309      Ora, esse adiamento teria necessariamente atrasado o conhecimento, ainda que impreciso, pela Comissão, como gestor dos riscos, do nível de risco colocado pelas substâncias em causa e, consequentemente, a decisão sobre a necessidade e a utilidade de alterar os requisitos de aprovação dessas substâncias. Assim, a Comissão tinha um conflito de objetivos entre a celeridade da avaliação dos riscos, por um lado, e a sua exaustividade e precisão, por outro.

310      A questão que se coloca neste caso não é, portanto, a de saber se, em abstrato e sem condicionalismos temporais, teria sido possível uma avaliação científica mais exaustiva e precisa. Resulta do exposto que a resposta a essa questão será provavelmente afirmativa. Em contrapartida, há que examinar, num primeiro momento, se a data de encerramento da avaliação dos riscos foi escolhida pela Comissão de modo lícito […] e, na afirmativa, num segundo momento, se essa avaliação foi feita tendo em conta o estado dos conhecimentos científicos disponíveis na data escolhida […]»

78      Resulta dos n.os 307 e 308 do acórdão recorrido que se admite que o adiamento do termo da avaliação dos riscos pela EFSA, por um lado, para se chegar à finalização de um documento de orientação sobre os testes e, por outro, para permitir às recorrentes terem em conta esse documento de orientação teria permitido ter em conta um estado de conhecimentos científicos ainda mais avançado face ao que era refletido pelo parecer da EFSA. Daqui se deduz que é possível que o facto de a avaliação do risco ter terminado em 31 de dezembro de 2012 implique que certos riscos não tenham podido ser excluídos, apesar de, na realidade, serem inexistentes e de essa situação poder ter sido evitada adiando o seu termo para data posterior.

79      A este respeito, importa recordar que as disposições do Regulamento n.o 1107/2009 se baseiam no princípio da precaução e não impedem os Estados‑Membros de aplicar este princípio sempre que haja uma incerteza científica quanto aos riscos para a saúde humana ou animal ou para o ambiente apresentados pelos produtos fitofarmacêuticos a autorizar no seu território (Acórdão de 1 de outubro de 2019, Blaise e o., C‑616/17, EU:C:2019:800, n.o 44). O mesmo se diga da Comissão quando há uma incerteza científica quanto aos referidos riscos que representam as substâncias ativas objeto de revisão em conformidade com o artigo 21.o do Regulamento n.o 1107/2009.

80      Ora, o princípio da precaução implica que, havendo incertezas quanto à existência ou à extensão de riscos, podem ser tomadas medidas de proteção, sem que seja necessário esperar que a realidade e gravidade de tais riscos sejam plenamente demonstradas. Quando for impossível determinar com certeza a existência ou o alcance do risco alegado devido à natureza insuficiente, não conclusiva ou imprecisa dos resultados dos estudos levados a cabo, mas ainda assim persista a probabilidade de um dano real caso o risco se concretize, o princípio da precaução justifica a adoção de medidas restritivas (v., neste sentido, Acórdão de 1 de outubro de 2019, Blaise e o., C‑616/17, EU:C:2019:800, n.o 43 e jurisprudência referida).

81      Assim, contrariamente ao que alega a Bayer CropScience, não pode ser exigida uma avaliação dos riscos exaustiva no contexto da aplicação do princípio da precaução que corresponde a um contexto de incerteza científica.

82      Por outro lado, o princípio da precaução não exige que as medidas adotadas ao abrigo do artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009 sejam diferidas apenas pelo facto de estarem em curso estudos suscetíveis de pôr em causa os dados científicos e técnicos disponíveis (v., por analogia, Acórdão de 21 de julho de 2011, Etimine, C‑15/10, EU:C:2011:504, n.os 128 e 129).

83      Tendo em conta o exposto, há que concluir que os n.os 309 e 310 do acórdão recorrido não padecem do erro de direito invocado pela Bayer CropScience.

84      Por conseguinte, a primeira parte do terceiro fundamento e o quinto fundamento devem ser julgados improcedentes.

b)      Quanto à segunda parte do terceiro fundamento

1)      Argumentos das partes

85      Com a segunda parte do terceiro fundamento, a Bayer CropScience alega que, ao aceitar que a Comissão pudesse basear‑se numa avaliação dos riscos feita precipitadamente pela EFSA e precipitar a sua própria revisão invocando prazos coercivos, o Tribunal Geral declarou, na realidade, que a Comissão podia adotar, com base no artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009, medidas de emergência abrangidas pelo artigo 69.o deste regulamento.

86      A Comissão refuta esta argumentação.

2)      Apreciação do Tribunal de Justiça

87      Importa salientar que nada indica, no caso em apreço, que as condições de aplicação do artigo 21.o do Regulamento n.o 1107/2009 não estavam reunidas. Em particular, resulta dos n.os 312 e 313 do acórdão recorrido, que não foram contestados, que, tendo a data do termo da avaliação dos riscos colocados pelas substâncias ativas em causa sido fixada em 31 de dezembro de 2012, foi concedido à EFSA mais tempo do que o que estava legalmente previsto no artigo 21.o, n.o 2, do referido regulamento para proferir as suas conclusões. Por outro lado, é pacífico que a Comissão só adotou o regulamento controvertido em 24 de maio de 2013.

88      Por conseguinte, há que julgar improcedente a segunda parte do terceiro fundamento.

c)      Quanto à terceira parte do terceiro fundamento

1)      Argumentos das partes

89      Segundo a Bayer CropScience, o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao declarar, no n.o 142 do acórdão recorrido, que, tendo em conta que os dados gerados pelos estudos efetuados para efeitos da aprovação inicial eram insuficientes à luz dos critérios alterados de aprovação para identificar a totalidade dos riscos para as abelhas associados às substâncias em causa, a Comissão podia retirar a aprovação de que beneficiavam essas substâncias. Nessas circunstâncias, a Comissão tinha a obrigação de dar primeiro à interessada a possibilidade de apresentar dados atualizados. A avaliação dos riscos efetuada pela EFSA deveria ter sido baseada nesses dados atualizados, ao passo que a Comissão devia ter apreciado, com base nos referidos dados atualizados, se os critérios de aprovação alterados estavam preenchidos.

90      A Comissão contesta estes argumentos.

2)      Apreciação do Tribunal de Justiça

91      O n.o 142 do acórdão recorrido tem a seguinte redação:

«Assim, a Comissão cumpre de forma bastante o seu ónus da prova, à luz do artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009, se lograr demonstrar que, em face de uma alteração do contexto regulamentar que levou a um reforço dos requisitos de aprovação, os dados gerados pelos estudos efetuados para efeitos de aprovação inicial eram insuficientes para identificar todos os riscos para as abelhas ligados à substância ativa em causa […] Com efeito, o princípio da precaução impõe que se retire ou altere a aprovação de uma substância ativa na presença de dados novos que invalidem a conclusão anterior de que essa substância cumpre os critérios de aprovação previstos no artigo 4.o do Regulamento n.o 1107/2009. Neste contexto, a Comissão pode limitar‑se a fornecer, de acordo com o regime comum do direito da prova, indícios sérios e concludentes, que, sem remover a incerteza científica, permitam razoavelmente duvidar de que a substância ativa em causa cumpre os referidos critérios de aprovação […]»

92      Importa sublinhar que o n.o 142 do acórdão recorrido apenas diz respeito ao ónus da prova que incumbe à Comissão no âmbito do procedimento de revisão, em conformidade com o artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009, e não especificamente à questão de saber se um produtor como a Bayer CropScience tinha o direito de apresentar observações ou novos dados nessa ocasião.

93      Em todo o caso, no que respeita à pretensão da Bayer CropScience de poder apresentar dados atualizados durante o procedimento de revisão da aprovação, não é contestado que, como resulta do n.o 435 do acórdão recorrido, esta sociedade teve várias vezes a possibilidade de apresentar observações durante esse procedimento em aplicação do artigo 21.o do Regulamento n.o 1107/2009.

94      Ora, como salienta a advogada‑geral no n.o 119 das suas conclusões, o direito de ser ouvido não obriga a Comissão, no âmbito de uma revisão em aplicação do artigo 21.o do Regulamento n.o 1107/2009, a dar ao produtor a possibilidade de realizar novos estudos para preencher eventuais lacunas identificadas nos dados disponíveis.

95      Com efeito, como se enunciou no n.o 82 do presente acórdão, o princípio da precaução não exige que as medidas adotadas ao abrigo do artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009 sejam diferidas apenas pelo facto de estarem em curso estudos suscetíveis de pôr em causa os dados científicos e técnicos disponíveis.

96      Assim, tendo em conta, nomeadamente, o princípio da precaução recordado no n.o 442 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral decidiu corretamente, no n.o 446 do mesmo acórdão, que a Bayer CropScience, em particular, não tinha direito a que a Comissão adiasse a alteração da aprovação das substâncias em causa para lhe dar a oportunidade de gerar os dados necessários para preencher as lacunas identificadas nas conclusões da EFSA.

97      Por conseguinte, a terceira parte do terceiro fundamento deve ser julgada improcedente.

d)      Quanto à quarta parte do terceiro fundamento

1)      Argumentos das partes

98      Com a quarta parte do terceiro fundamento, a Bayer CropScience alega que o Tribunal Geral, no n.o 142 do acórdão recorrido, violou o princípio da segurança jurídica ao concluir que uma alteração do contexto regulamentar dos critérios de aprovação podia bastar, por si só, para permitir à Comissão cumprir o ónus da prova que lhe incumbe à luz do artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009.

99      Segundo esta sociedade, embora o limiar de aplicação do artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009 seja mais elevado do que o do artigo 21.o, n.o 1, deste regulamento e o limiar de aplicação desta última disposição exija novos conhecimentos científicos e técnicos que permitam pensar que os critérios de aprovação deixaram de estar preenchidos, o limiar de aplicação do artigo 21.o, n.o 3, do referido regulamento deve logicamente exigir a existência de novos conhecimentos científicos e técnicos que vão mais longe, defendendo a conclusão de que os critérios de aprovação não são respeitados.

100    A Comissão refuta estes argumentos.

2)      Apreciação do Tribunal de Justiça

101    Como recordou o Tribunal Geral no n.o 285 do acórdão recorrido, segundo jurisprudência constante, o princípio da segurança jurídica exige que as normas jurídicas sejam claras, precisas e previsíveis nos seus efeitos, para que os interessados se possam orientar nas situações e relações jurídicas abrangidas pela ordem jurídica da União.

102    Ora, a argumentação da Bayer CropScience baseia‑se numa leitura errada do n.o 142 do acórdão recorrido.

103    A este respeito, embora seja verdade que, como constatado no n.o 49 do presente acórdão, o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao declarar que o limiar de aplicação do procedimento de revisão previsto no artigo 21.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1107/2009 pressupõe o surgimento de novos conhecimentos científicos que levem a crer que a substância em causa poderia já não satisfazer os critérios de aprovação, tal erro não tem consequências no caso em apreço.

104    Com efeito, contrariamente ao que sustenta a Bayer CropScience, o Tribunal Geral não considerou, no n.o 142 do acórdão recorrido, que uma simples alteração do contexto regulamentar dos critérios de aprovação podia, por si só, bastar para permitir à Comissão cumprir o ónus da prova que lhe incumbe à luz do artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009, mas precisou que a retirada ou a alteração da aprovação de uma substância ativa pressupõe a existência de dados novos que invalidem a conclusão anterior segundo a qual esta substância satisfaz os critérios de aprovação previstos no artigo 4.o desse regulamento.

105    Por conseguinte, apesar do erro de direito do Tribunal Geral, recordado no n.o 103 do presente acórdão, não se afigura, no contexto desta parte do terceiro fundamento, que a regra que consta do artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009, conforme interpretada pelo Tribunal Geral, esteja em contradição com o princípio da segurança jurídica.

106    Consequentemente, há que julgar improcedente a quarta parte do terceiro fundamento.

107    Atendendo a todas as considerações que precedem, há que julgar improcedente o terceiro fundamento.

4.      Quanto ao quarto fundamento

108    Com o seu quarto fundamento, a Bayer CropScience acusa o Tribunal Geral de ter cometido um erro de direito ao não demonstrar, no que respeita à realização do risco alegado exigido para a aplicação das medidas cautelares, um nível de certeza científica apropriado, em primeiro lugar, ao interpretar e ao aplicar de forma errada o nível da prova exigido para adotar medidas cautelares, em segundo lugar, ao concluir que riscos puramente hipotéticos podiam justificar a adoção de medidas cautelares e, em terceiro lugar, ao não respeitar o regime jurídico do ónus da prova.

109    A Comissão considera que o quarto fundamento deve ser julgado inadmissível ou, pelo menos, improcedente.

a)      Quanto à primeira parte do quarto fundamento

1)      Argumentos das partes

110    A Bayer CropScience acusa o Tribunal Geral, em primeiro lugar, de ter ignorado que as substâncias em causa já tinham sido autorizadas na sequência de uma avaliação científica exaustiva e de não ter aplicado um nível de prova adequado, que é mais elevado para essas substâncias do que para as que ainda não foram autorizadas. Em segundo lugar, o Tribunal Geral entrou em contradição ao permitir à Comissão adotar medidas de precaução sem nenhum novo conhecimento científico pertinente e, erradamente, considerou suficiente que a Comissão alterasse as aprovações da recorrente com base em dados amplamente lacunares. Em terceiro lugar, na realidade, o Tribunal Geral permitiu à Comissão recorrer ao princípio da precaução para adotar medidas de emergência ao abrigo do artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009, em vez do artigo 69.o deste regulamento.

111    A Comissão defende, a título principal, a inadmissibilidade desta parte do quarto fundamento e, a título subsidiário, o seu caráter improcedente.

2)      Apreciação do Tribunal de Justiça

112    Importa salientar que a Bayer CropScience não contesta a conclusão que figura no n.o 142 do acórdão recorrido, segundo a qual, no âmbito da aplicação do artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009, a Comissão se pode limitar a apresentar, em conformidade com o regime comum do direito da prova, indícios sérios e concludentes, que, sem afastar a incerteza científica, permitem razoavelmente duvidar do facto de a substância ativa em causa cumprir os critérios de aprovação previstos no artigo 4.o deste regulamento.

113    No entanto, esta sociedade alega que o Tribunal Geral fez uma aplicação errada do nível de prova assim requerido ao não exigir que, para adotar medidas cautelares, a Comissão seja obrigada, em conformidade com uma exigência de prova mais elevada para as substâncias já aprovadas do que para as não aprovadas, a demonstrar, invocando novos dados, a existência de uma dúvida séria quanto à segurança da substância ativa em causa.

114    Com efeito, por um lado, nos n.os 177 e 180 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral admitiu que a Comissão podia adotar medidas cautelares sem nenhum conhecimento científico pertinente, e, por outro, no n.o 442 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral considerou suficiente que a Comissão alterasse as aprovações da Bayer CropScience com base em dados amplamente lacunares.

115    A este respeito, como resulta do n.o 79 do presente acórdão, as disposições do Regulamento n.o 1107/2009, que se baseiam no princípio da precaução, não impedem a Comissão de aplicar este princípio quando haja uma incerteza científica quanto aos riscos para a saúde humana ou animal ou para o ambiente que representam as substâncias ativas objeto de revisão em conformidade com o artigo 21.o do Regulamento n.o 1107/2009.

116    Este princípio implica que, como foi recordado no n.o 80 do presente acórdão, havendo incertezas quanto à existência ou à extensão de riscos, designadamente para o ambiente, podem ser tomadas medidas de proteção, sem que seja necessário esperar que a realidade e gravidade de tais riscos sejam plenamente demonstradas. Quando for impossível determinar com certeza a existência ou o alcance do risco alegado devido à natureza inconclusiva dos resultados dos estudos realizados, mas ainda assim persista a probabilidade de um dano real caso o risco se concretize, o princípio da precaução justifica a adoção de medidas restritivas. Neste contexto, em conformidade com o Regulamento n.o 1107/2009, a Comissão não está sujeita a uma exigência de prova mais elevada para as substâncias ativas já aprovadas do que para as não aprovadas.

117    Ora, o argumento da Bayer CropScience, segundo o qual o Tribunal Geral admitiu que a Comissão podia adotar medidas cautelares sem nenhum conhecimento científico pertinente, não pode ser acolhido.

118    A este respeito, importa salientar que os n.os 177 a 180 do acórdão recorrido incidem, no essencial, sobre a questão de saber se, tendo em conta os estudos de março de 2012 e o estudo Schneider, a Comissão dispunha, quando da abertura do procedimento de revisão, de «novos conhecimentos científicos e técnicos», na aceção do artigo 21.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1107/2009.

119    Ainda que o Tribunal Geral tenha considerado erradamente que esses novos conhecimentos eram necessários para iniciar uma revisão nos termos do artigo 21.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1107/2009, não é menos verdade que essa parte do acórdão recorrido tem por objeto a abertura do procedimento de revisão e não toma posição sobre as medidas de precaução que a Comissão adotou ao abrigo do artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009.

120    Quanto ao n.o 442 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral recordou aí que, no n.o 325 desse acórdão, se tinha considerado que o princípio da precaução justificava, tendo em conta as circunstâncias do caso, que a aprovação das substâncias em causa fosse alterada sem ter de aguardar que estivessem disponíveis os dados que preenchem as lacunas identificadas nas conclusões da EFSA.

121    Ora, como se enunciou no n.o 82 do presente acórdão, o princípio da precaução não exige que as medidas adotadas ao abrigo do artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009 sejam diferidas apenas pelo facto de estarem em curso estudos suscetíveis de pôr em causa os dados científicos e técnicos disponíveis. Com efeito, como observou acertadamente o Tribunal Geral no n.o 116 do acórdão recorrido, o contexto da aplicação do princípio da precaução corresponde, por hipótese, a um contexto de incerteza científica.

122    Quanto ao argumento da Bayer CropScience segundo o qual o Tribunal Geral, na realidade, permitiu à Comissão recorrer ao princípio da precaução para adotar medidas de emergência ao abrigo do artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009, em vez do artigo 69.o deste regulamento, importa salientar, abstraindo do que foi declarado nos n.os 87 e 88 do presente acórdão, que esta sociedade, contrariamente ao que exige o artigo 169.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, não identificou de modo nenhum, a este respeito, os fundamentos do acórdão recorrido que são contestados. Este argumento é, portanto, inadmissível.

123    Por conseguinte, a primeira parte do quarto fundamento deve ser julgada parcialmente inadmissível e parcialmente improcedente.

b)      Quanto à terceira parte do quarto fundamento

1)      Argumentos das partes

124    Com a terceira parte do quarto fundamento, a Bayer CropScience acusa o Tribunal Geral de ter cometido um erro de direito ao não respeitar o regime jurídico do ónus da prova.

125    No caso em apreço, o Tribunal Geral inverteu efetivamente o ónus da prova ao pedir à recorrente que demonstrasse, respetivamente nos n.os 546, 184, 216 e 499 a 500 do acórdão recorrido, primeiro, que a proibição dos usos foliares era manifestamente inadequada, segundo, que os estudos de março de 2012 e o estudo Schneider não traziam novos conhecimentos científicos e técnicos, terceiro, que as preocupações relativas ao facto de uma mortalidade acrescida de abelhas ou o desaparecimento de colónias coincidirem com a utilização de produtos fitofarmacêuticos que continham as substâncias em causa eram infundadas e, quarto, que a suposição quanto á existência de uma correlação entre os efeitos sobre as abelhas melíferas individuais e a incidência a nível da colónia era infundada.

126    Além disso, ao declarar, unicamente com base em certos riscos para as abelhas melíferas individuais e numa pretensa correlação entre esses riscos e uma incidência ao nível da colónia, que não se podia excluir um risco para as colónias, o Tribunal Geral cometeu um erro de direito na medida em que isentou a Comissão da sua obrigação de cumprir o critério jurídico aplicável, centrado na manutenção da saúde das colónias de abelhas melíferas e não das abelhas individuais, conforme inscrito no Regulamento n.o 1107/2009.

127    A Comissão refuta estes argumentos.

2)      Apreciação do Tribunal de Justiça

128    Em primeiro lugar, quanto ao pretenso erro de direito que consiste em exigir à recorrente que demonstre que a proibição dos usos foliares era manifestamente inadequada, importa recordar que, no n.o 546 do acórdão recorrido, se observa que a Bayer CropScience, em particular, não demonstrou que a proibição dos usos foliares era manifestamente inadequada para alcançar os objetivos do regulamento controvertido, a saber, a proteção do ambiente e, nomeadamente, a proteção das abelhas.

129    Como resulta dos n.os 79 e 80 do presente acórdão, o princípio da precaução implica que, quando subsistam incertezas quanto à existência ou ao alcance de riscos, nomeadamente para o ambiente, podem ser tomadas medidas de proteção, no âmbito do procedimento de revisão previsto no artigo 21.o do Regulamento n.o 1107/2009, sem ter de esperar que a realidade e a gravidade desses riscos sejam plenamente demonstradas e que, quando se revele impossível determinar com certeza a existência ou o alcance do risco alegado, em razão da natureza inconclusiva dos resultados dos estudos realizados, mas a probabilidade de um dano real para o ambiente persistir na hipótese de o risco de concretizar, o princípio da precaução justifica a adoção de medidas restritivas.

130    Daqui resulta que, quando se trata de a Comissão adotar uma medida restritiva, na aceção do artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009, para evitar um risco cuja existência ou alcance não é certo, mas que, não obstante, se afigura suficientemente documentado, incumbe ao interessado, em conformidade com o artigo 7.o, n.o 1, deste regulamento, demonstrar que a substância ativa em causa cumpre os critérios de aprovação estabelecidos no artigo 4.o do referido regulamento. Com efeito, como salientou, em substância, a advogada‑geral no n.o 150 das suas conclusões, se a Comissão fornecer indícios sérios e concludentes que permitam alimentar dúvidas razoáveis quanto ao respeito destas exigências, renasce o ónus da prova inicial a cargo do interessado.

131    Ora, no âmbito de uma alegação, como a do caso em apreço, que é unicamente relativa ao facto de o Tribunal Geral ter invertido o ónus da prova, e não de uma pretensa falta de indícios sérios e concludentes que permitissem duvidar do respeito dos critérios de aprovação estabelecidos no artigo 4.o do Regulamento n.o 1107/2009, a constatação que figura no n.o 546 do acórdão recorrido, segundo a qual a Bayer CropScience não demonstrou que a proibição dos usos foliares era manifestamente inadequada para alcançar o objetivo da proteção das abelhas, prosseguido pelo próprio regulamento controvertido, não constitui em si mesma um erro de direito.

132    No que respeita ao n.o 184 do acórdão recorrido, segundo o qual o estudo encomendado pela Bayer CropScience e finalizado em 24 de maio de 2013 sobre a questão de saber se os resultados do estudo Henry e do estudo Schneider se afastavam dos conhecimentos anteriores na matéria, não é suscetível de demonstrar que os estudos de março de 2012 e o estudo Schneider não forneciam «novos conhecimentos científicos e técnicos», na aceção do artigo 21.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1107/2009, o argumento relativo ao facto de que esta conclusão não respeita o regime jurídico do ónus da prova é, em todo o caso, inoperante uma vez que, como se salientou no n.o 50 do presente acórdão, o artigo 21.o, n.o 1, primeiro parágrafo, primeiro período, do Regulamento n.o 1107/2009 autoriza a Comissão a reexaminar a aprovação de uma substância ativa a todo o momento, sem outra condição.

133    Por outro lado, no n.o 55 do presente acórdão, é salientado que o Tribunal Geral declarou acertadamente, no n.o 217 do acórdão recorrido, que foi com razão que a Comissão pôde considerar, no caso em apreço, que havia que proceder a uma revisão da aprovação das substâncias em causa.

134    O mesmo se diga do argumento relativo ao facto de a constatação, que figura no n.o 216 do acórdão recorrido, não respeitar o regime jurídico do ónus da prova. Com efeito, este número, nos termos do qual os dados de controlo invocados pelas recorrentes eram certamente suscetíveis de lançar dúvidas sobre as preocupações suscitadas pelos estudos de março de 2012 e pelo estudo Schneider, mas, em contrapartida, não eram suscetíveis de demonstrar que essas preocupações eram infundadas, diz certamente respeito a uma questão relativa ao ónus da prova em matéria de conhecimentos científicos, mas no âmbito de uma decisão de proceder a uma revisão, nos termos do artigo 21.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1107/2009.

135    Quanto aos n.os 499 e 500 do acórdão recorrido, que a Bayer CropScience alega que desrespeita o regime jurídico do ónus da prova, têm a seguinte redação:

«499      Está assente, portanto, que existe uma correlação entre o risco para as abelhas individuais e o risco para a colónia. Em contrapartida, neste momento existe uma incerteza científica quanto à taxa de mortalidade de abelhas individuais a partir do qual se podem produzir “efeitos inaceitáveis agudos ou crónicos” para a sobrevivência e para o desenvolvimento da colónia. Esta incerteza deve‑se nomeadamente às dificuldades em medir em condições de terreno a amplitude das perdas individuais e a sua incidência na colónia.

500      Nestas condições, há que concluir que a Comissão tinha razão ao considerar que, face aos valores de quocientes de perigo identificados quanto às substâncias em causa nas conclusões da EFSA, não se podia excluir um risco para as colónias e que lhe incumbia, portanto, com fundamento no princípio da precaução, tomar medidas de proteção, sem ter que aguardar que se demonstrasse plenamente em que condições e a partir de que taxa de mortalidade a perda de abelhas individuais era suscetível de pôr em perigo a sobrevivência ou o desenvolvimento de colónias.»

136    Ora, estes números, enquanto tais, são apenas uma aplicação, a um caso concreto, do princípio da precaução, conforme recordado no n.o 129 do presente acórdão, em virtude do qual, quando subsistam incertezas quanto à existência ou ao alcance de riscos, nomeadamente para o ambiente, podem ser tomadas medidas de proteção, no âmbito do procedimento de revisão previsto no artigo 21.o do Regulamento n.o 1107/2009, sem ter de esperar que a realidade e a gravidade desses riscos sejam plenamente demonstradas, e quando se revele impossível determinar com certeza a existência ou o alcance do risco alegado, em razão da natureza inconclusiva dos resultados dos estudos realizados, mas persista a probabilidade de um dano real para o ambiente na hipótese de o risco se concretizar, o princípio da precaução justifica a adoção de medidas restritivas.

137    Por último, no que diz respeito ao argumento da Bayer CropScience através do qual esta alegou que, ao declarar, unicamente com base em certos riscos para as abelhas melíferas individuais e numa pretensa correlação entre esses riscos e uma incidência ao nível da colónia, que não se podia excluir um risco para as colónias, o Tribunal Geral cometeu um erro de direito, uma vez que isentou a Comissão da sua obrigação de cumprir o critério jurídico aplicável, centrado na manutenção da saúde das colónias de abelhas melíferas e não nas abelhas individuais, como inscrito no Regulamento n.o 1107/2009, importa sublinhar o seguinte.

138    Nos termos do ponto 3.8.3 do anexo II do Regulamento n.o 1107/2009, uma substância ativa só é aprovada se se demonstrar, designadamente, que a utilização dos produtos fitofarmacêuticos que contenham essa substância ativa não tem efeitos inaceitáveis agudos ou crónicos na sobrevivência e no desenvolvimento da colónia, tendo em conta os efeitos nas larvas das abelhas ou no comportamento das abelhas.

139    Segundo os n.os 499 e 500 do acórdão recorrido, reproduzidos no n.o 135 do presente acórdão, nas condições em que está assente que há uma correlação entre o risco para as abelhas individuais e o risco para a colónia, mas que, em contrapartida, existe, nessa fase, uma incerteza científica quanto à taxa de mortalidade de abelhas individuais a partir do qual podem produzir‑se «efeitos inaceitáveis agudos ou crónicos» na sobrevivência e no desenvolvimento da colónia, a Comissão podia considerar, corretamente, que não se podia excluir um risco para as colónias e que não lhe cabe, por isso, com base no princípio da precaução, tomar medidas de proteção.

140    Assim, contrariamente ao que a Bayer CropScience alegou, o Tribunal Geral, ao salientar que está assente que há uma correlação entre o risco para as abelhas individuais e o risco para a colónia, uma vez que a incerteza científica a esse respeito apenas diz respeito à taxa de mortalidade de abelhas individuais a partir da qual podem produzir‑se «efeitos inaceitáveis agudos ou crónicos» na sobrevivência e no desenvolvimento da colónia, não isentou a Comissão da sua obrigação de cumprir o critério jurídico relativo à manutenção da saúde das abelhas melíferas, previsto no ponto 3.8.3 do anexo II do Regulamento n.o 1107/2009.

141    Por conseguinte, não foi cometido nenhum erro de direito a este respeito.

142    Consequentemente, a terceira parte do quarto fundamento deve ser julgada improcedente.

c)      Quanto à segunda parte do quarto fundamento

1)      Argumentos das partes

143    Com a segunda parte do quarto fundamento, a Bayer CropScience acusa o Tribunal Geral de ter cometido um erro de direito ao concluir que riscos puramente hipotéticos podiam justificar a adoção de medidas cautelares. Com efeito, o Tribunal Geral declarou, erradamente, que tanto os usos foliares como as utilizações não profissionais podiam ser restringidos na falta de uma avaliação científica e com base em suposições segundo as quais, por um lado, os usos foliares ainda não avaliados pela EFSA podiam, como resulta dos n.os 533 e 534 do acórdão recorrido, colocar riscos análogos aos dos usos avaliados e, por outro, os utilizadores amadores eram, como resulta dos n.os 556 e 558 do acórdão recorrido, suscetíveis de não respeitar as instruções de utilização.

144    Por último, o Tribunal Geral também cometeu um erro de direito, no n.o 543 do acórdão recorrido, ao permitir à própria Comissão alegar que as aplicações foliares davam lugar a um depósito do produto em causa no solo e basear‑se nas suas próprias conclusões hipotéticas em vez de confiar a avaliação científica dos riscos à EFSA.

145    A Comissão contesta a argumentação da Bayer CropScience.

2)      Apreciação do Tribunal de Justiça

146    Em primeiro lugar, quanto à proibição das aplicações foliares, os números do acórdão recorrido criticados pela Bayer CropScience têm a seguinte redação:

«533      Em segundo lugar, há que salientar que o segundo mandato conferido à EFSA pela Comissão, na sua forma revista em 25 de julho de 2012 […], estava expressamente limitado aos “usos autorizados dessas substâncias no tratamento de sementes e granulados”. Consequentemente, a avaliação dos riscos efetuada pela EFSA não respeitava a outros usos autorizados e as conclusões da EFSA sobre as três substâncias em causa não continham nenhuma indicação quanto ao risco associado à aplicação foliar.

534      Em terceiro lugar, há que lembrar que as medidas tomadas no ato recorrido assentam numa aplicação do princípio da precaução, na medida em que há sérios indícios de que alguns dos usos das substâncias em causa até então aprovados podiam comportar riscos inadmissíveis para as abelhas, sem que exista ainda qualquer certeza científica a esse respeito. Nesta situação, a Comissão podia tomar medidas preventivas igualmente para usos ainda não especificamente avaliados pela EFSA, se e na medida em que pudesse razoavelmente supor que colocavam riscos análogos aos dos usos avaliados.

[…]

543      Segundo, quanto à translocação acrópeta, a Comissão alega que as aplicações foliares dão origem a um depósito do produto em causa no solo, pelo que as suas substâncias ativas podem ser absorvidas pela raiz e dispersadas na planta.»

147    No que respeita ao argumento da Bayer CropScience de que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao admitir que a própria Comissão podia proceder à avaliação dos riscos em vez de confiar essa tarefa à EFSA, há que salientar que, à semelhança da advogada‑geral no n.o155 das suas conclusões, em aplicação do artigo 21.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1107/2009, uma vez que o recurso à EFSA pertencia ao poder de apreciação da Comissão, a avaliação dos riscos pela EFSA não é, portanto, imperativamente necessária.

148    Do mesmo modo, ao admitir que a própria Comissão podia proceder à avaliação dos riscos para usos ainda não especificamente avaliados pela EFSA, como as aplicações foliares, o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito.

149    Quanto ao argumento da Bayer CropScience relativo ao facto de o Tribunal Geral ter cometido um erro de direito ao declarar que os usos foliares podiam ser restringidos na falta de uma avaliação científica e com base em suposições segundo as quais esses usos podiam colocar riscos análogos aos dos usos avaliados, importa sublinhar que o Tribunal Geral só admitiu, no n.o 534 do acórdão recorrido, que a Comissão tinha o direito de adotar medidas preventivas também para usos ainda não especificamente avaliados pela EFSA se e na medida em que pudesse razoavelmente supor que colocavam riscos análogos aos dos usos avaliados.

150    Assim, no que respeita à translocação basípeta, o Tribunal Geral considerou, no n.o 542 do acórdão recorrido, que, tendo em conta as deficiências dos estudos científicos invocados por ambas, não se pode daí concluir que a Comissão podia razoavelmente supor que as aplicações foliares colocavam riscos análogos aos dos usos avaliados.

151    Em contrapartida, quanto à translocação acrópeta, o Tribunal Geral salientou, nos n.os 543 e 544 do acórdão recorrido, que, tendo a Comissão alegado que as aplicações foliares davam lugar a um depósito do produto em causa no solo, de onde as suas substâncias ativas eram suscetíveis de ser absorvidas pelas raízes e dispersas na planta, esses elementos permitiam a esta instituição presumir razoavelmente que as aplicações foliares colocavam riscos análogos aos dos usos avaliados pela EFSA nas suas conclusões.

152    Por conseguinte, resulta do exposto que, como observou a advogada‑geral no n.o 160 das suas conclusões, no âmbito da proibição das aplicações foliares, o Tribunal Geral, contrariamente ao que alega a Bayer CropScience, não admitiu uma avaliação dos riscos com base em considerações puramente hipotéticas e, por conseguinte, não cometeu um erro de direito a este respeito.

153    No que respeita, em segundo lugar, à proibição das utilizações não profissionais, os n.os 553 a 558 do acórdão recorrido têm a seguinte redação:

«553      Terceiro, quanto à probabilidade de os utilizadores não profissionais fazerem uma utilização inadequada dos produtos fitofarmacêuticos que contêm as substâncias em causa, nem a Comissão nem as recorrentes fizeram realmente prova da medida em que essa probabilidade existe ou não. Contudo, a Bayer [CropScience] referiu‑se a uma sondagem de 2011, pedida pela Comissão, sobre a “compreensão pelo consumidor dos rótulos e da utilização sem riscos dos produtos químicos”, da qual entende resultar que quase 80 % dos sondados liam “sempre” ou “na maior parte das vezes” os rótulos apostos nos pesticidas e que outros 12 % os liam “às vezes”. Entre os que liam as instruções nos rótulos, quase 74 % respeitavam‑nas “integralmente”, enquanto 23 % as seguiam “em parte”. Afirma que estes números são confirmados por outra sondagem, da qual a Bayer [CropScience] apenas juntou extratos.

554      A esse respeito, refira‑se, desde logo, que os números indicados pela Bayer [CropScience], quanto à primeira dessas sondagens, não correspondem aos que constam da cópia que juntou. Com efeito, a percentagem dos sondados que responderam que liam “sempre” ou “na maior parte das vezes” os rótulos dos produtos fitofarmacêuticos era de 66 % (50 % “sempre” e 16 % “na maior parte das vezes”) e não a de “quase 80 %” indicada pela Bayer [CropScience].

555      Seguidamente, o extrato da segunda sondagem junta pela Bayer [CropScience] não revela quem efetuou a sondagem, de que modo foi composta a amostra dos sondados e se era representativa da população dos sete países onde foi efetuada. Nestas condições, tem um valor probatório muito reduzido.

556      Por último, a primeira sondagem, levada a cabo na totalidade dos Estados‑Membros, com base numa amostra representativa, revela que 34 % dos sondados só leem “às vezes” ou “nunca” as instruções de utilização que constam dos rótulos dos produtos fitofarmacêuticos. Há que observar, nestas circunstâncias, e tendo particularmente em conta o alto grau de toxicidade das substâncias em causa, que a Comissão tinha razão ao concluir que os utilizadores não profissionais, mais do que os utilizadores profissionais, podiam não respeitar as instruções de utilização.

557      Assim, a proibição dos usos não profissionais das substâncias em causa no exterior não pode ser qualificada de “manifestamente inadequada para atingir o objetivo prosseguido”, na aceção da jurisprudência acima referida no n.o 506.

558      Quarto, especificamente no que respeita às utilizações não profissionais no interior, é verdade que à primeira vista parece bastante improvável um perigo para as abelhas, admitindo que as instruções de utilização sejam respeitadas. Contudo, como se acaba de expor, não se pode excluir uma má utilização que não respeite as instruções de utilização, sobretudo no que diz respeito aos utilizadores não profissionais. A esse respeito, o risco, invocado pela Comissão, de uma planta tratada no interior ser seguidamente colocada no exterior parece mais episódico e, de qualquer forma, pontual. Em contrapartida, parece provável, dada a eficácia das substâncias em causa como inseticidas, que certos utilizadores possam ser tentados a utilizar diretamente no exterior os produtos que os contêm, mesmo que tenham sido vendidos para uma utilização no interior.»

154    A Bayer CropScience acusa, em substância, o Tribunal Geral de ter declarado, no n.o 558 do acórdão recorrido, que uma má utilização, que não respeita as instruções de utilização, não pode ser excluída, sobretudo no que respeita aos utilizadores não profissionais, apesar de, ao mesmo tempo, ter reconhecido, no n.o 553 desse acórdão, que nem as recorrentes nem a Comissão demonstraram em que medida a probabilidade de uma má utilização existia ou não existia.

155    A este respeito, há que recordar que, como resulta dos n.os 551 e 552 do acórdão recorrido, cabe às instituições responsáveis por opções políticas determinar o nível de risco considerado aceitável para a sociedade, sendo esse nível de risco determinado não apenas com base em considerações estritamente científicas mas também tendo em conta fatores sociais, como a viabilidade dos controlos.

156    Esta pode, com efeito, constituir um elemento pertinente na determinação do nível de risco aceitável, uma vez que os controlos tendem a assegurar o respeito das instruções de utilização dos produtos fitofarmacêuticos que contêm substâncias ativas, respeito esse que, por sua vez, é suscetível de atenuar o impacto da utilização dessas substâncias no ambiente.

157    É certo que o Tribunal Geral constata, no n.o 553 do acórdão recorrido, que nem a Comissão nem a Bayer CropScience demonstraram a probabilidade exata de uma utilização inadequada por não profissionais dos produtos fitofarmacêuticos que contêm as substâncias em causa. Todavia, tendo em conta o facto de os utilizadores não profissionais não estarem sujeitos a nenhuma fiscalização, pode considerar‑se, como faz o Tribunal Geral no n.o 556 do acórdão recorrido, que os utilizadores não profissionais podiam, mais do que os utilizadores profissionais, não respeitar as instruções de utilização.

158    Tendo em conta o elevado grau de toxicidade das substâncias ativas em causa para as abelhas, o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao concluir que a proibição de utilizações não profissionais dos produtos fitofarmacêuticos que contêm essas substâncias não podia ser qualificada de «manifestamente inadequada» para alcançar o objetivo prosseguido pelo regulamento controvertido.

159    Daqui resulta que a segunda parte do quarto fundamento também não procede.

160    Por consequência, o quarto fundamento deve ser julgado improcedente.

5.      Quanto ao sexto fundamento

a)      Argumentos das partes

161    Com o seu sexto fundamento, a Bayer CropScience acusa o Tribunal Geral de ter cometido um erro de direito, nos n.os 459 a 461 do acórdão recorrido, ao definir erradamente a dimensão da análise de impacto que deve ser efetuada antes da adoção das medidas cautelares e ao não ter em conta as exigências ligadas a esta análise. Com efeito, o Tribunal Geral limitou‑se a considerar que a Comissão tinha tomado conhecimento dos efeitos suscetíveis de serem induzidos pela ação prevista e constatou que a envergadura e a forma da análise de impacto se enquadravam no poder de apreciação da Comissão, julgando suficiente uma síntese sumária em quatro pontos de uma análise de impacto fornecida pelo setor, quando a Comissão não tinha tido um conhecimento completo dos produtos fitofarmacêuticos alternativos. Segundo a Bayer CropScience, a obrigação de proceder a uma análise do impacto foi assim esvaziada de qualquer conteúdo.

162    A Comissão refuta estes argumentos.

b)      Apreciação do Tribunal de Justiça

163    Os números do acórdão recorrido sobre os quais se concentram as críticas da Bayer CropScience são os seguintes:

«459      Primeiro, a esse respeito, há que observar que o ponto 6.3.4 da comunicação [relativa ao princípio da precaução, de 2 de fevereiro de 2000 [COM(2000) 1 final] (a seguir “comunicação relativa ao princípio da precaução”), prevê que seja efetuado um exame das vantagens e dos encargos resultantes da ação ou da falta dela. Em contrapartida, o formato e a envergadura desse exame não são esclarecidos. Nomeadamente, de nenhum lado resulta que a autoridade em causa seja obrigada a lançar um procedimento de avaliação específico e que leve, por exemplo, a um relatório escrito e formal de avaliação. Além disso, resulta do texto que a autoridade que aplica o princípio da precaução goza de uma margem de apreciação considerável quanto aos métodos de análise. Com efeito, embora a comunicação indique que o exame deverá incluir uma análise económica, a autoridade em causa deve, em qualquer caso, integrar igualmente considerações não económicas. Acresce que se salienta expressamente que, em certas circunstâncias, é possível que as considerações económicas devam ser consideradas menos importantes do que outros interesses reconhecidos como essenciais; a título de exemplo, são expressamente mencionados interesses como o ambiente ou a saúde.

460      Por outro lado, não é necessário que a análise económica dos custos e dos benefícios se faça com base num cálculo exato dos custos respetivos da ação prevista e da inação. Esses cálculos exatos serão na maior parte das vezes impossíveis de efetuar, uma vez que, no contexto da aplicação do princípio da precaução, os seus resultados dependem de diferentes variáveis, por definição desconhecidas. Com efeito, se todas as consequências da inação e da ação fossem conhecidas, não seria necessário recorrer ao princípio da precaução, pois seria possível decidir com base em certezas. Em conclusão, estão respeitados os requisitos da comunicação relativa ao princípio da precaução uma vez que a autoridade em causa, no caso, a Comissão, tomou efetivamente conhecimento dos efeitos, positivos e negativos, económicos e outros, suscetíveis de ser induzidos pela ação prevista e também pela inação, e uma vez que os teve em conta na sua decisão. Em contrapartida, não é necessário que esses efeitos sejam quantificados com precisão, se isso não for possível ou necessitar de esforços desproporcionados.

461      Segundo, refira‑se que é manifesto que a Comissão estabeleceu uma comparação entre as consequências positivas ou negativas mais prováveis da ação prevista e da inação, em termos de custo global para a União, cumprindo as exigências impostas pelo ponto 6.3.4 da comunicação relativa ao princípio da precaução. Isso resulta claramente da nota de 21 de janeiro de 2013 dirigida ao membro da Comissão competente nessa época. Essa nota destinava‑se a informá‑lo das discussões em curso sobre as conclusões da EFSA e a pedir a sua aprovação sobre as medidas previstas pelos serviços da Comissão. No anexo V da nota, intitulado “Informações contextuais sobre PE, Indústria, ONG”, eram enunciadas diferentes circunstâncias tidas em conta no âmbito da proposta. Em particular, no que diz respeito ao facto de os neonicotinóides serem largamente utilizados na agricultura, o anexo V mencionava os resultados substanciais do estudo Humboldt, apresentado pelas recorrentes à Comissão, incluindo as conclusões desse estudo quanto aos efeitos de uma proibição dos neonicotinóides para a economia, para o mercado do trabalho e para o balanço ecológico da União. Aí se mencionava igualmente que a Comissão não tinha um conhecimento completo dos produtos fitofarmacêuticos alternativos, pois estes eram autorizados a nível nacional. Por último, a nota indicava que o Parlamento [Europeu] iria debater o assunto três dias depois, em 24 de janeiro de 2013, com base num estudo por ele pedido quanto aos riscos colocados pelas substâncias em causa e que recomendava a proibição total dos neonicotinóides (e não uma simples restrição das utilizações), e ainda o facto de as ONG ambientais pedirem igualmente uma proibição total. Resulta de todos estes elementos que a Comissão estava consciente do que estava em causa, tanto a nível económico como ambiental, relativamente à utilização das substâncias em causa.»

164    A este respeito, importa recordar que, nos termos do artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009, sempre que a Comissão chegue à conclusão de que deixaram de estar preenchidos os critérios de aprovação previstos no artigo 4.o deste regulamento, é adotado um regulamento que retire ou altere a aprovação.

165    Ora, como se observou, no n.o 69 do presente acórdão, no âmbito da revisão da aprovação de uma substância ativa, a conclusão de que deixaram de estar satisfeitos os critérios de aprovação previstos no artigo 4.o do Regulamento n.o 1107/2009 pode basear‑se em novos conhecimentos, desde que sejam científicos ou técnicos.

166    Quando a Comissão chegar a essa conclusão, cabe‑lhe, em conformidade com o artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009, adotar um regulamento que retire ou altere a aprovação da substância ativa em causa. Assim, ao prever a retirada ou a alteração da referida aprovação, essa disposição incorpora expressamente o princípio da proporcionalidade, que, segundo jurisprudência constante, constitui um dos princípios gerais do direito da União e exige que os atos das instituições da União não ultrapassem os limites do que é adequado e necessário para a realização dos objetivos legítimos prosseguidos pela regulamentação em causa, entendendo‑se que, quando haja uma escolha entre várias medidas adequadas, se deve recorrer à menos restritiva e que os inconvenientes causados não devem ser desproporcionados relativamente aos objetivos prosseguidos (Acórdão de 8 de julho de 2010, Afton Chemical, C‑343/09, EU:C:2010:419, n.o 45 e jurisprudência referida).

167    No caso em apreço, como resulta dos n.os 22 a 24 do presente acórdão e do próprio regulamento controvertido, a Comissão, através desse regulamento, alterou os requisitos de aprovação das substâncias em causa, tendo em conta que essas substâncias apresentavam certos riscos agudos elevados para as abelhas e que não podiam ser excluídos riscos inaceitáveis resultantes dos efeitos agudos ou crónicos na sobrevivência e no desenvolvimento das colónias em várias culturas.

168    Daí resulta que a Comissão considerou que as utilizações aprovadas das substâncias ativas em causa no caso em apreço já não cumpriam os critérios de aprovação previstos no artigo 4.o do Regulamento n.o 1107/2009 e, em particular, no ponto 3.8.3 do anexo II desse regulamento, nos termos do qual uma substância ativa só é aprovada se se demonstrar que a utilização dos produtos fitofarmacêuticos que contêm essa substância ativa, nas condições de utilização propostas, provocará uma exposição negligenciável das abelhas ou não terá efeitos inaceitáveis agudos ou crónicos para a sobrevivência e o desenvolvimento das colónias, tendo em conta os efeitos nas larvas de abelhas e o comportamento das abelhas.

169    Quanto ao princípio da proporcionalidade, importa salientar que o artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009 não impõe formas ou modalidades especiais para assegurar o seu respeito.

170    A constatação do Tribunal Geral, segundo a qual a envergadura e a forma da análise das vantagens e dos encargos resultantes da ação ou da inação estão abrangidas pelo poder de apreciação da Comissão, não viola o artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009 nem, por outro lado, o princípio da proporcionalidade que, como foi salientado no n.o 166 do presente acórdão, está incorporado na referida disposição.

171    A esse respeito, refira‑se que a avaliação que a Comissão efetua no âmbito de uma revisão com base no artigo 21.o do Regulamento n.o 1107/2009, lido em conjugação com o ponto 3.8.3 do anexo II do mesmo regulamento, tem por objeto uma análise dos riscos que a utilização de um produto fitofarmacêutico que contém uma das substâncias em causa implica, nomeadamente, para a sobrevivência e para o desenvolvimento das colónias de abelhas.

172    Daqui resulta que a Bayer CropScience não pode alegar que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao referir‑se à ampla margem de apreciação de que a Comissão dispõe quando esta última decide efetuar além dessa avaliação dos riscos — única prescrita pelo quadro regulamentar já referido — também uma análise das vantagens e dos encargos resultantes da sua ação ou da sua inação.

173    Em todo o caso, há que observar que, contrariamente ao que alega a Bayer CropScience, o Tribunal Geral não se satisfez com o facto de a Comissão ter tomado conhecimento dos efeitos suscetíveis de serem induzidos pela ação prevista. Com efeito, a Comissão, como indicado no n.o 461 do acórdão recorrido, estabeleceu uma comparação entre as consequências positivas ou negativas mais prováveis da ação prevista e as da inação em termos de custo global para a União.

174    Por outro lado, como resulta dos n.os 463 a 466 do acórdão recorrido, a Comissão pôde medir o impacto na agricultura e no ambiente das medidas objeto do regulamento controvertido tendo em conta, por um lado, que era possível, se tal se revelasse necessário, conceder, a nível nacional, autorizações derrogatórias para produtos fitofarmacêuticos que contivessem as substâncias em causa e, por outro, o facto de, em determinados Estados‑Membros, a agricultura ter, no passado, podido funcionar de modo satisfatório sem recorrer a produtos fitofarmacêuticos que contivessem as substâncias em causa e sem que essa circunstância tenha efeitos negativos no ambiente.

175    Por último, resulta dos n.os 468 a 470 do acórdão recorrido que, embora seja verdade que, tendo em conta o sistema instituído pelo Regulamento n.o 1107/2009 no qual a Comissão é competente para aprovar as substâncias ativas a nível da União, quando os Estados‑Membros são competentes para autorizar produtos fitofarmacêuticos que contêm as substâncias ativas aprovadas, era impossível à Comissão determinar, para toda a União, em que medida, para que utilizações e para que culturas os agricultores dispunham de produtos alternativos aos que continham as substâncias em causa, não é menos verdade que a Comissão tinha conhecimento das substâncias alternativas que podiam substituir as substâncias visadas pelo regulamento controvertido.

176    Nestas condições e mesmo admitindo que a Comissão tenha, no âmbito do artigo 21.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1107/2009, uma obrigação autónoma de efetuar uma análise que tenha especificamente em conta as vantagens e os encargos resultantes da ação ou a inexistência de ação, há que constatar que os argumentos apresentados pela Bayer CropScience não podem, em todo o caso, ser acolhidos.

177    Por conseguinte, há que julgar improcedente o sexto fundamento.

178    Atendendo a todas as considerações expostas, deve ser negado provimento ao presente recurso.

VI.    Quanto às despesas

179    Nos termos do artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, se o recurso for julgado improcedente, o Tribunal de Justiça decidirá sobre as despesas.

180    Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do mesmo regulamento, aplicável ao processo de recurso de uma decisão do Tribunal Geral por força do seu artigo 184.o, n.o 1, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

181    Uma vez que a Comissão, a UNAF, o Deutscher Berufs‑ und Erwerbsimkerbund, o Österreichischer Erwerbsimkerbund, a PAN Europe, a Bee Life, a Buglife e o Greenpeace concluíram pela condenação das recorrentes e estas últimas foram vencidas, há que condená‑las nas despesas das referidas partes. Não tendo o Reino da Suécia pedido quanto às despesas, suportará as suas próprias despesas.

182    Nos termos do artigo 184.o, n.o 4, do Regulamento de Processo, um interveniente em primeira instância, quando não tenha ele próprio interposto o recurso, só pode ser condenado nas despesas do processo de recurso se tiver participado na fase escrita ou oral do processo no Tribunal de Justiça. Quando participe no processo, o Tribunal de Justiça pode decidir que essa parte suporte as suas próprias despesas.

183    A AGPM, a ECPA, a Rapool‑Ring Qualitätsraps deutscher Züchter e a ESA, que tinham a qualidade de intervenientes em primeira instância, não participaram no processo no Tribunal de Justiça. Em contrapartida, tendo a NFU e a Agricultural Industries Confederation participado no processo de recurso e sido vencidas, suportarão as suas próprias despesas.

184    Em conformidade com o artigo 140.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, aplicável ao processo de recurso de uma decisão do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, do mesmo, o Tribunal de Justiça pode decidir que um interveniente diferente dos Estados‑Membros, as instituições, os Estados partes no Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, de 2 de maio de 1992 (JO 1994, L 1, p. 3), diferentes dos Estados‑Membros ou o Órgão de Fiscalização da AELE suportará as suas próprias defesas.

185    Há que aplicar esta disposição e decidir que a Stichting De Bijenstichting suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) decide:

1)      O recurso é inadmissível, na parte em que foi interposto pela Bayer AG.

2)      É negado provimento ao recurso, na parte em que foi interposto pela Bayer CropScience AG.

3)      A Bayer CropScience AG e a Bayer AG são condenadas a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pela Comissão Europeia, a Union nationale de l’apiculture française (UNAF), a Deutscher Berufs und Erwerbsimkerbund eV, a Österreichischer Erwerbsimkerbund, a Pesticide Action Network Europe (PAN Europe), a Bee Life European Beekeeping Coordination (Bee Life), a Buglife — The Invertebrate Conservation Trust e o Stichting Greenpeace Council (Greenpeace).

4)      The National Farmers’ Union (NFU) e a Agricultural Industries Confederation Ltd, bem como a Stichting De Bijenstichting, suportam as suas próprias despesas.

5)      O Reino da Suécia suportará as suas próprias despesas.

Assinaturas


*      Língua do processo: inglês.