Language of document : ECLI:EU:T:2004:222

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção alargada)

8 de Julho de 2004 (*)

«Auxílio de Estado – Recurso de anulação – Critério do credor privado – Auxílios ao salvamento e à reestruturação concedidos a empresas em dificuldade – Direitos de defesa – Fundamentação»

No processo T‑198/01,

Technische Glaswerke Ilmenau GmbH, com sede em Ilmenau (Alemanha), representada inicialmente por S. Gerrit e C. Arhold, e posteriormente por C. Arhold e N. Wimmer, advogados, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por V. Kreuschitz e V. Di Bucci, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida,

apoiada por

Schott Glas, com sede em Mainz (Alemanha), representada por U. Soltész, advogado,

interveniente,

que tem por objecto um pedido de anulação da Decisão 2002/185/CE da Comissão, de 12 de Junho de 2001, relativa a um auxílio estatal concedido pela República Federal da Alemanha a favor da Technische Glaswerke Ilmenau GmbH (Alemanha) (JO 2002, L 62, p. 30),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quinta Secção alargada),

composto por: R. García‑Valdecasas, presidente, P. Lindh, J. D. Cooke, H. Legal e M. E. Martins Ribeiro, juízes,

secretário: D. Christensen, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 11 de Dezembro de 2003,

profere o presente

Acórdão

 Enquadramento jurídico

1       O artigo 87.°, n.° 1, CE dispõe que, salvo o disposto em contrário no Tratado, os auxílios estatais susceptíveis de afectar as trocas comerciais entre os Estados‑Membros e de falsear a concorrência são incompatíveis com o mercado comum.

2       O artigo 87.°, n.° 3, CE determina:

«Podem ser considerados compatíveis com o mercado comum:

[…]

c)      Os auxílios destinados a facilitar o desenvolvimento de certas actividades ou regiões económicas, quando não alterem as condições das trocas comerciais de maneira que contrariem o interesse comum […]».

3       Em 23 de Dezembro de 1994, a Comissão publicou uma comunicação que fixa as orientações comunitárias relativas aos auxílios estatais de emergência e à reestruturação das empresas em dificuldade, que são aplicáveis no caso em apreço (JO C 368, p. 12, a seguir «orientações relativas aos auxílios de emergência e à reestruturação das empresas em dificuldade»). Nos termos destas orientações:

«1.2. […] existem circunstâncias que justificam a concessão de auxílios estatais a empresas em dificuldade, destinados à sua recuperação e a ajudá‑las a reestruturar‑se. Pode ser o caso, por exemplo, de razões de política social ou regional, de ser desejável manter uma estrutura de mercado concorrencial quando o desaparecimento de empresas pudesse conduzir a uma situação de monopólio ou de oligopólio restritivo e de necessidades específicas ou benefícios económicos mais gerais do sector das pequenas e médias empresas (PME).

[…]

3.2.      Auxílios à reestruturação

[…]

3.2.2. Condições gerais

[…] para que a Comissão aprove um auxílio é preciso que o plano de reestruturação preencha as seguintes condições gerais:

i) Restauração da viabilidade

A condição sine qua non de todos os planos de reestruturação reside no restabelecimento num prazo razoável da viabilidade a longo prazo da empresa, com base em hipóteses realistas no que diz respeito às suas condições futuras de exploração. Por consequência, o auxílio à reestruturação deve estar associado a um programa de reestruturação/recuperação viável, que deve ser apresentado à Comissão com todos os dados relevantes. Este plano deve permitir restabelecer a competitividade da empresa num prazo razoável.

[…]

iii) Auxílio proporcional aos custos e benefícios da reestruturação

O montante e a intensidade do auxílio devem ser limitados ao mínimo rigorosamente necessário para permitir a reestruturação e devem ser proporcionais aos benefícios previstos do ponto de vista comunitário. Por tais razões, os beneficiários do auxílio devem normalmente contribuir de maneira significativa para o plano de reestruturação com recursos próprios ou através de um financiamento externo obtido em condições de mercado. Para limitar as distorções de concorrência, convém evitar que o auxílio seja concedido de forma que permita à empresa dispor de meios de liquidez excedentários, susceptíveis de ser utilizados em actividades agressivas que possam provocar distorções no mercado e não estejam ligadas ao processo de reestruturação. O auxílio também não deve servir para financiar novos investimentos que não sejam necessários à reestruturação. O auxílio destinado à reestruturação financeira não deve reduzir de forma exagerada os encargos financeiros da empresa.

[…]»

4       No que se refere ao procedimento de controlo dos auxílios de Estado, o Regulamento (CE) n.° 659/1999 do Conselho, de 22 de Março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo [88.°] do Tratado CE (JO L 83, p. 1), entrou em vigor em 16 de Abril de 1999.

5       O artigo 4.°, n.° 4, do referido regulamento dispõe que a Comissão dará início ao procedimento formal de exame da medida que lhe tenha sido notificada quando, após a análise preliminar, considerar que aquela suscita dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado comum. Segundo o artigo 6.°, n.° 1, do regulamento em questão, a Comissão convida o Estado‑Membro em causa e as outras partes interessadas a apresentarem as suas observações num prazo fixado. Nos termos do artigo 6.°, n.° 2, do referido regulamento, as observações recebidas serão transmitidas ao Estado‑Membro em causa, que tem a possibilidade de lhes dar resposta.

6       O artigo 20.°, n.° 1, do Regulamento n.° 659/1999 estabelece:

«Qualquer parte interessada pode apresentar observações nos termos do artigo 6.° na sequência da decisão da Comissão de iniciar o procedimento formal de exame. Todas as partes interessadas que tenham apresentado observações e todos os beneficiários de um auxílio individual receberão cópia da decisão da Comissão nos termos do artigo 7.°»

 Antecedentes do litígio

7       A Technische Glaswerke Ilmenau GmbH é uma sociedade alemã que tem a sua sede em Ilmenau, no Land da Turíngia. A sociedade exerce as suas actividades no sector vidreiro.

8       A recorrente foi constituída em 1994 pelo casal Geiß, com o objectivo de retomar quatro das doze linhas de produção de vidro da antiga sociedade Ilmenauer Glaswerke GmbH (a seguir «IGW»), cuja liquidação fora decidida pelo Treuhandanstalt (organismo de direito público responsável pela reestruturação das empresas da antiga República Democrática Alemã, posteriormente transformado no Bundesanstalt für vereinigungsbedingte Sonderaufgaben, organismo federal para os assuntos relacionados com a reunificação, a seguir «BvS»). As linhas de produção em causa provinham de bens nacionalizados da Volkseigener Betrieb Werk für Technisches Glas Ilmenau, que era, no período anterior à reunificação alemã, o centro de produção de vidro da antiga República Democrática Alemã.

9       A venda das quatro linhas de produção pela IGW à recorrente foi realizada em duas etapas, a saber, por um primeiro contrato de 26 de Setembro de 1994 [a seguir «asset‑deal 1» (acordo de cessão de activos)], aprovado pelo Treuhandanstalt em Dezembro de 1994, e por um segundo contrato de 11 de Dezembro de 1995 (a seguir «asset‑deal 2»), aprovado pelo BvS em 13 de Agosto de 1996.

10     Segundo o asset‑deal 1, o preço de venda das três primeiras linhas de produção ascendia no total a 5,8 milhões de marcos alemães (DEM) [2 965 493 EUR] e devia ser pago em três prestações, cada uma em 31 de Dezembro dos anos de 1997, 1998 e 1999. O pagamento era garantido por uma hipoteca de 4 milhões de DEM (2 045 168 EUR) e por uma garantia bancária de 1,8 milhões de DEM (920 325 EUR).

11     É facto assente que nenhuma dessas três prestações foi paga.

12     Por força do asset‑deal 2, a quarta linha de produção foi igualmente vendida pela IGW à recorrente pelo preço de 50 000 DEM (25 565 euros).

13     É igualmente facto assente que a requerente teve problemas de tesouraria em 1997. Tendo em conta essas dificuldades, encetou negociações com o BvS. Estas conduziram à celebração de um contrato, em 16 de Fevereiro de 1998, pelo qual o BvS aceitou reduzir o preço de venda estabelecido no asset‑deal 1 em 4 milhões de DEM (a seguir «dispensa de pagamento»).

14     Por carta de 1 de Dezembro de 1998, a República Federal da Alemanha notificou à Comissão diversas medidas destinadas à consolidação financeira da recorrente, entre as quais a dispensa de pagamento. Uma parte desta notificação incidia sobre um plano de reestruturação da recorrente para o período entre 1998 e 2000, compreendendo, nomeadamente, a procura de um novo investidor privado que pudesse entrar com uma contribuição no valor de 3 850 000 DEM (1 968 474 EUR).

15     Através da carta SG (2000) D/102831, de 4 de Abril de 2000, a Comissão deu início ao procedimento formal de exame previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE. Considerou que as autoridades alemãs tinham possivelmente concedido diversos auxílios estatais no quadro do asset‑deal 1 e do asset‑deal 2. Esses alegados auxílios são descritos na comunicação publicada no Jornal Oficial das Comunidades Europeias de 29 de Julho de 2000 [Convite para apresentação de observações nos termos do n.° 2 do artigo 88.° do Tratado CE, relativamente ao auxílio C 19/2000 (ex NN 147/98) – Auxílio a favor da Technische Glaswerke Ilmenau GmbH – Alemanha (JO C 217, p. 10)], na qual a Comissão concluía provisoriamente que duas das medidas em questão podiam ser consideradas auxílios incompatíveis com o mercado comum, a saber, a dispensa de pagamento e um empréstimo do Aufbaubank da Turíngia (TAB), no montante de 2 milhões de DEM (1 015 677 EUR), concedido em 30 de Novembro de 1998 à recorrente, ao abrigo do regime de auxílios NN 74/95 [aprovado pela Decisão SG (96) D/1946].

16     Por carta recebida em 7 de Julho de 2000, a República Federal da Alemanha apresentou à Comissão as suas observações relativas ao início do procedimento formal de exame. Em sua opinião, a dispensa de pagamento não constituía um auxílio de Estado, correspondendo, ao invés, ao comportamento de um credor privado que procura cobrar o seu crédito numa situação em que a exigência integral do preço de venda conduziria provavelmente à falência da recorrente.

17     Após ter adquirido conhecimento da comunicação de 29 de Julho de 2000, a recorrente apresentou, em 28 de Agosto de 2000, as suas observações à Comissão. Pediu a esta que lhe desse acesso à parte não confidencial do processo e, em seguida, a possibilidade de apresentar novas observações.

18     Por carta de 11 de Outubro de 2000, o BvS concedeu prazos à recorrente para o pagamento do crédito correspondente ao preço fixado no asset‑deal 1, a saber, 1,8 milhões de DEM, bem como para o pagamento dos juros vencidos entre 1 de Janeiro de 1998 e 20 de Junho de 2000, que ascendem a 198 800 DEM (101 645 EUR). O BvS fixou os novos prazos de pagamento em 31 de Dezembro dos anos de 2003 a 2005, em relação aos quais não pediu juros suplementares. Foi assim estabelecido que seria reembolsado um montante de 666 600 DEM (340 827 EUR) em cada uma destas datas.

19     Por comunicação de 20 de Novembro de 2000, a República Federal da Alemanha apresentou à Comissão as suas observações em relação às observações apresentadas em 28 de Setembro de 2000 pela empresa Schott Glas, uma concorrente da recorrente à Comissão, no quadro do procedimento formal de exame.

20     Em 27 de Fevereiro de 2001, a República Federal da Alemanha transmitiu à Comissão, em anexo à sua comunicação, uma cópia do relatório de Arnold, técnico de contas, com data de 24 de Novembro de 2000, sobre a situação e as perspectivas de rentabilidade da recorrente (a seguir «relatório Arnold»).

21     Em 12 de Junho de 2001, a Comissão adoptou a Decisão 2002/185/CE relativa ao auxílio de Estado concedido pela República Federal da Alemanha a favor da Technische Glaswerke Ilmenau GmbH, Alemanha (JO 2002, L 62, p. 30, a seguir «decisão recorrida»). Tendo expressamente renunciado a examinar, no quadro do mesmo procedimento formal de exame, outros potenciais auxílios, como a novação da garantia bancária de 1,8 milhões de DEM, constituída no quadro do asset‑deal 1, através da sua substituição por uma dívida hipotecária subordinada («nachrangige Grundschuld») e o diferimento do pagamento do crédito correspondente ao preço de aquisição fixado neste contrato para 2003 (considerandos 42, 64 e 65 da decisão recorrida), a Comissão chegou à conclusão de que a dispensa de pagamento não teria sido aceite por um credor privado, constituindo, ao invés, um auxílio de Estado, na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE, incompatível com o mercado comum.

22     A Comissão considerou por três ordens de razões (considerandos 76 a 80 da decisão recorrida) que o BvS não agiu como um credor privado ao conceder a dispensa de pagamento. Mesmo que o asset‑deal 2 estivesse subordinado à dispensa de pagamento, nada indicava, segundo a decisão recorrida, que a operação realizada ao abrigo daquele era menos onerosa do que a que consistiria em exigir o pagamento integral do preço inicialmente acordado com renúncia ao asset‑deal 2 (considerando 81). Por outro lado, a Comissão rejeitou o argumento apresentado pela recorrente, segundo o qual, tendo em conta a redução pelo Land da Turíngia dos subsídios prometidos, a dispensa de pagamento constituía apenas um ajustamento do contrato de privatização. De facto, a Comissão considerou que o BvS e o Land da Turíngia constituíam, para qualquer efeito, pessoas colectivas distintas (considerando 82). A Comissão deduziu deste facto que o BvS não agiu no intuito de preservar os seus interesses financeiros, mas no de assegurar a sobrevivência da recorrente (considerando 83).

23     Segundo a decisão recorrida, a dispensa de pagamento não podia beneficiar de uma derrogação como auxílio ad hoc à reestruturação, pois as condições fixadas nas orientações comunitárias relativas aos auxílios estatais de emergência e à reestruturação concedidos a empresas em dificuldade não estavam preenchidas. Em particular, o plano de reestruturação da recorrente não se baseava em hipóteses realistas e o restabelecimento da sua viabilidade a longo prazo era duvidoso (considerandos 92 a 97).

24     A Comissão lembrou a condição imposta aos auxílios à reestruturação segundo a qual o plano de reestruturação deve prever medidas para atenuar, tanto quanto possível, as consequências desfavoráveis que deles podem resultar para os concorrentes (considerandos 98 a 101). Não obstante as observações de um concorrente da recorrente que referem «a existência de um excedente de capacidade nalguns segmentos de mercado nos quais a [recorrente] opera», concluiu que, segundo as informações de que dispunha, não existia «um excedente de capacidade no conjunto do mercado» (considerando 101).

25     Finalmente, a Comissão considerou que a condição relativa à proporcionalidade do auxílio não estava preenchida, na medida em que não existia qualquer contribuição de um investidor privado na acepção das orientações acima referidas (considerandos 102 a 107). Além disso, reconhecendo que, segundo o mesmo concorrente, a recorrente vendia sistematicamente produtos abaixo do preço de mercado ou até abaixo do preço de custo, e beneficiara, com carácter constante, de injecções de liquidez destinadas a colmatar as suas perdas, a Comissão afirmou não ser possível excluir que a recorrente tenha aplicado os fundos recebidos em actividades que provocaram distorções de concorrência no mercado e que não estavam ligadas ao processo de reestruturação (considerando 103). A Comissão concluiu que a renúncia parcial à cobrança do preço não era, portanto, compatível com o mercado comum (considerando 109).

26     Nos termos dos artigos 1.° e 2.° da decisão recorrida:

«Artigo 1.°

O auxílio estatal concedido pela [República Federal da] Alemanha a favor da Technische Glaswerke Ilmenau GmbH, [sob a forma de uma renúncia parcial à cobrança do preço de aquisição,] no montante de 4 000 000 de [DEM], no quadro do asset‑deal 1, celebrado em 26 de Setembro de 1994, não é compatível com o mercado comum.

Artigo 2.°

1. A [República Federal da] Alemanha tomará todas as medidas necessárias para recuperar junto do beneficiário o auxílio referido no artigo 1.° e [que lhe foi] ilegalmente concedido.

2. A recuperação deve ter lugar de imediato e em conformidade com os procedimentos de direito alemão, desde que estes permitam uma execução imediata e efectiva da presente decisão. O auxílio a recuperar inclui juros a partir da data em que foi colocado à disposição do beneficiário até à data da sua recuperação. Os juros são calculados com base na taxa de referência utilizada para o cálculo do equivalente subvenção líquido no âmbito dos auxílios com finalidade regional.»

27     A recorrente reconhece ter tido conhecimento da decisão recorrida em 19 de Junho de 2001, quando os representantes do BvS lhe remeteram uma cópia da mesma.

28     Por carta de 23 de Agosto de 2001, a República Federal da Alemanha informou a Comissão de que, sob reserva do acordo desta, tinha a intenção de diferir a recuperação do auxílio controvertido, a fim de não comprometer as negociações iniciadas entre a recorrente e um potencial novo investidor.

 Tramitação da fase contenciosa

29     Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal em 28 de Agosto de 2001, a recorrente interpôs o presente recurso.

30     Em 13 de Novembro de 2001, a Comissão apresentou, por requerimento separado, um pedido de tramitação acelerada do processo, nos termos do artigo 76.°‑A do Regulamento de Processo do Tribunal. A recorrente opôs‑se a este pedido nas observações que apresentou sobre o mesmo em 11 de Dezembro de 2001. A decisão da Quinta Secção alargada do Tribunal, que indeferiu o pedido de tramitação acelerada do processo apresentado pela Comissão, foi notificada às partes em 17 de Janeiro de 2002.

31     Por despacho de 4 de Abril de 2002 (Technische Glaswerke Ilmenau/Comissão, T‑198/01 R, Colect., p. II‑2153), o presidente do Tribunal suspendeu, na sequência do pedido da recorrente, até 17 de Fevereiro de 2003 a execução do artigo 2.° da decisão recorrida. Esta suspensão foi acompanhada da exigência de a recorrente respeitar três condições, que foram por ela satisfeitas.

32     Por despacho de 15 de Maio de 2002 do presidente da Quinta Secção alargada do Tribunal, a sociedade Schott Glas foi admitida a intervir em apoio das conclusões da Comissão.

33     Por despacho de 18 de Outubro de 2002 [Technische Glaswerke Ilmenau/Comissão, C‑232/02 P (R), Colect., p. I‑8977], o presidente do Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso interposto pela Comissão do despacho de 4 de Abril de 2002, Technische Glaswerke Ilmenau/Comissão, já referido.

34     Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal (Quinta Secção alargada) decidiu iniciar a fase oral do processo e, em 10 de Julho de 2003, convidar as partes principais a responder a várias questões, por escrito ou na audiência, consoante o caso, e a apresentar determinados documentos. As partes corresponderam a este convite.

35     Por despacho de 1 de Agosto de 2003 (Technische Glaswerke Ilmenau/Comissão, T‑198/01 R II, ainda não publicado na Colectânea), o presidente do Tribunal suspendeu, na sequência de um novo pedido da recorrente, a execução do artigo 2.° da decisão recorrida até 17 de Fevereiro de 2004, subordinando igualmente esta suspensão à exigência de a recorrente respeitar três condições.

36     Por carta de 15 de Outubro de 2003, a recorrente pediu que a Comissão apresentasse o anexo 1 da comunicação da República Federal da Alemanha de 27 de Fevereiro de 2001, tendo a Comissão apresentado a referida comunicação no âmbito das medida de organização do processo. A recorrente solicitou igualmente ao Tribunal uma autorização para responder por escrito – e não na audiência, como tinha sido pedido pelo Tribunal – a uma das questões que lhe tinha sido colocada a si e à Comissão, uma vez que esta última tinha respondido a esta questão por escrito. O Tribunal deferiu estes pedidos.

37     Por despacho de 12 de Novembro de 2003, o presidente da Quinta Secção alargada do Tribunal deferiu os pedidos de confidencialidade apresentados pela recorrente, no que se refere tanto aos actos processuais notificados às partes como, sendo esse o caso, daqueles que o devam ser, relativamente a determinados dados constantes das respostas das partes principais às questões do Tribunal e aos seus pedidos de apresentação de documentos, reservando‑se, em qualquer caso, a possibilidade de considerar procedentes eventuais objecções susceptíveis de ser formuladas a este respeito.

38     Foram ouvidas as alegações das partes e as respostas às questões colocadas pelo Tribunal na audiência que teve lugar em 11 de Dezembro de 2003.

39     Por requerimento apresentado em 17 de Fevereiro de 2004, a recorrente submeteu ao presidente do Tribunal um pedido de prorrogação da suspensão da execução da decisão recorrida até à prolação pelo Tribunal da decisão final do recurso no processo principal.

40     Por despacho de 3 de Março de 2004, adoptado nos termos do artigo 105.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento de Processo, o presidente do Tribunal ordenou a prorrogação temporária da suspensão da execução da decisão recorrida até decisão do pedido de prorrogação.

41     Por despacho de 12 de Maio de 2004 (Technische Glaswerke Ilmenau/Comissão, T‑198/01 R [III], ainda não publicado na Colectânea), o presidente do Tribunal ordenou a suspensão da decisão recorrida até à prolação do presente acórdão.

 Pedidos das partes

42     A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–       anular a decisão recorrida;

–       condenar a Comissão nas despesas.

43     A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–       negar provimento ao recurso;

–       condenar a recorrente nas despesas.

44     A interveniente, em apoio da Comissão, conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–       negar provimento ao recurso;

–       condenar a recorrente nas despesas, incluindo as relativas à sua intervenção.

 Questão de direito

45     Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca, no essencial, cinco fundamentos baseados, em primeiro lugar, na violação do artigo 87.°, n.° 1, CE e na falta de fundamentação; em segundo lugar, na violação do artigo 87.°, n.° 3, alínea c), CE e na insuficiência da fundamentação; em terceiro lugar, na violação do direito de defesa e do princípio da boa administração; em quarto lugar, na insuficiência da fundamentação da decisão recorrida e, em quinto lugar, na violação do artigo 20.°, n.° 1, segundo período, do Regulamento n.° 659/1999.

 Quanto ao primeiro fundamento, baseado na violação do artigo 87.°, n.° 1, CE e na falta de fundamentação

46     No quadro deste primeiro fundamento, a recorrente sustenta, a título liminar, que a dispensa de pagamento não constitui um auxílio na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE. A recorrente alega a este respeito que a referida dispensa constitui uma modificação do asset‑deal 1, à qual tinha direito pelo facto de o Land da Turíngia não ter cumprido uma promessa de subvenção permitida ao abrigo de um regime de auxílio previamente aprovado pela Comissão. Acresce que a decisão recorrida carece de fundamentação neste ponto. Em seguida, a recorrente alega que a Comissão aplicou erradamente o critério do investidor privado em economia de mercado e que a decisão recorrida contém fundamentação insuficiente nesta matéria. Por último, contesta, a título subsidiário, a determinação do montante do auxílio cuja recuperação é exigida pela Comissão.

 Quanto ao direito à modificação do asset‑deal 1

–       Argumentos das partes

47     A recorrente alega que a dispensa de pagamento de 4 milhões de DEM do preço fixado no quadro do asset‑deal 1 em 5,8 milhões de DEM se destina a compensar o incumprimento pelo Land da Turíngia de uma promessa de pagamento de 4 milhões de DEM feita em 1994, no âmbito das negociações que precederam a conclusão deste contrato.

48     A promessa de auxílio do Land da Turíngia integrava‑se no 23.° plano‑quadro da missão de interesse comum «Melhoria da estrutura económica e regional», um regime de auxílios ao investimento de carácter regional aprovado por decisão da Comissão [n.° 157/94, SG (94) D/11038], de 1 de Agosto de 1994, ao abrigo do artigo 87.°, n.° 3, alínea a), CE. A recorrente observa que, segundo este programa, a República Federal da Alemanha podia conceder auxílios aos investidores que comprassem uma empresa ao BvS até ao montante de 27% da quantia investida nesta empresa. Caso o investidor fosse uma «pequena ou média empresa» (a seguir «PME»), podia ser concedido um auxílio suplementar até 16% da soma investida. No quadro do asset‑deal 1, foi prometido à recorrente este auxílio suplementar, correspondente a um montante de 4 milhões de DEM. No entanto, o Land da Turíngia recusou posteriormente o seu pagamento, sem indicar os motivos exactos desta recusa. Em consequência, a recorrente e o BvS iniciaram negociações no final do ano de 1996 com o objectivo de modificar o asset‑deal 1, tendo, neste contexto, o preço de venda fixado no quadro do asset‑deal 1 sido reduzido em 4 milhões de DEM.

49     Ao contrário do que é afirmado pela interveniente, a promessa de auxílio acima referida não é contrária às regras comunitárias, uma vez que a recorrente era, pelo menos até ao final de 1995, uma PME.

50     Além disso, este argumento da interveniente não é pertinente, uma vez que, no asset‑deal 1, a recorrente e o BvS teriam fixado o preço de venda em 1 milhão de DEM (511 292 EUR) se soubessem que o auxílio prometido pelo Land da Turíngia não seria pago. Por outro lado, a fixação do preço de venda em 1,8 milhões de DEM não era contrária às regras que disciplinam os auxílios de Estado. Com efeito, em 1994, estas regras não impediram que o BvS vendesse por um preço negativo – ou seja, por um montante simbólico condicionado pelas suas promessas de auxílio – empresas com menos de 1 000 assalariados que devia privatizar.

51     A recorrente recorda ter alegado no quadro do procedimento formal de exame, que dispunha face ao BvS de um direito à modificação («zivilrechtlicher Anspruch auf Anpassung») do asset‑deal 1, na sequência da recusa de cumprimento pelo Land da Turíngia da sua promessa de auxílio. Este direito decorre das regras de direito civil alemão relativas à modificação do contrato em caso de alteração dos pressupostos que estão na base do negócio («Wegfall der Geschäftsgrundlage»), regras essas que foram desenvolvidas pela jurisprudência e codificadas no artigo 313.° do Bürgerliches Gesetzbuch (Código Civil alemão). No caso concreto, um dos motivos determinantes da conclusão do asset‑deal 1 residiu na promessa já referida. As duas partes concordaram em elevar o preço de venda para 5,8 milhões de DEM com base na sua expectativa comum de concretização desta promessa. Face à não concessão do auxílio prometido, este preço foi adaptado, em conformidade com o artigo 313.°, n.° 3, do Código Civil alemão, ao valor real da empresa, o qual correspondia ao preço discutido pelas partes em momento anterior à promessa.

52     Ao contrário do que é alegado pela Comissão, o Governo alemão confirmou as alegações da recorrente ao declarar, na sua comunicação de 27 de Fevereiro de 2001, que «[aderia] ao teor das explicações fornecidas pela [recorrente] nas suas observações relativas ao início do procedimento formal de exame».

53     Segundo a recorrente, na decisão recorrida (considerando 82), a Comissão admite como possível a existência da promessa de auxílio do Land da Turíngia e do direito da recorrente a obter uma modificação do contrato em razão do seu incumprimento. Não obstante, a Comissão limita‑se a negar a pertinência jurídica destes factos, que chegaram ao seu conhecimento através das observações da recorrente de 28 de Agosto de 2000 e que foram confirmados pelo Governo alemão na sua comunicação à Comissão de 27 de Fevereiro de 2001. Atendendo a que este argumento da Comissão não tem qualquer pertinência, a decisão recorrida é desprovida de fundamento neste ponto.

54     Nestas circunstâncias, a Comissão e a interveniente não têm legitimidade para contestar pela primeira vez estes factos perante o Tribunal com o fim de justificar a decisão recorrida. Em conformidade com o artigo 253.° CE, a decisão recorrida deve efectivamente bastar‑se a si própria e a sua fundamentação não pode resultar de explicações escritas ou orais dadas ulteriormente (despacho de 4 de Abril de 2002, Technische Glaswerke Ilmenau/Comissão, já referido, n.° 75, e jurisprudência referida).

55     A este respeito, a recorrente alega que cabe à Comissão provar, na decisão recorrida, a existência de um auxílio, após ter verificado com cuidado e imparcialidade se, no contexto factual e jurídico do caso em apreço, a modificação do preço fixado no quadro do asset‑deal 1 podia ser considerada uma decisão que um credor privado razoável teria adoptado. Na falta desta análise, a existência de um auxílio de Estado não está provada e a decisão recorrida encontra‑se viciada por falta de fundamentação. Por conseguinte, deve ser anulada, não sendo necessário examinar as regras de direito civil alemão.

56     Por outro lado, se for considerada necessária uma confirmação dos factos alegados pela recorrente, esta sugere, por um lado, que se coloquem questões ao BvS e, por outro, que o Sr. Geiß seja ouvido como testemunha, na medida em que este participou em todas as negociações relativas à privatização.

57     A recorrente também contesta o argumento da Comissão, exposto no considerando 82 da decisão recorrida, de que o não pagamento do auxílio prometido pelo Land da Turíngia não é relevante no presente caso, pelo facto de o BvS e o Land Turíngia serem duas pessoas jurídicas distintas. Com efeito, no quadro da fiscalização dos auxílios de Estado, todos os actos dos diversos organismos territoriais são imputáveis ao Estado‑Membro em causa enquanto uno (acórdão do Tribunal de 15 de Junho de 1999, Regione autonoma Friuli‑Venezia Giulia/Comissão, T‑288/97, Colect., p. II‑1871, n.° 38). No caso em apreço, o Land da Turíngia é apenas o organismo pagador. A promessa de auxílio do Land da Turíngia e a dispensa de pagamento aceite pelo BvS não são, portanto, imputáveis a pessoas jurídicas distintas.

58     A Comissão, apoiada pela interveniente, contesta globalmente esta argumentação.

–       Apreciação do Tribunal

59     No que se refere, por um lado, à falta de fundamentação invocada pela recorrente, uma vez que a Comissão não teria indicado os verdadeiros motivos para justificar porque é que não teve em conta, na decisão recorrida, a alegada promessa de auxílio do Land da Turíngia no montante de 4 milhões de DEM, importa recordar que, segundo jurisprudência constante, a fundamentação exigida pelo artigo 253.° CE deve ser adaptada à natureza do acto em causa e deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição, autora do acto, de forma a permitir aos interessados conhecer as razões da medida adoptada e ao órgão jurisdicional competente exercer a sua fiscalização. A exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso em apreço. Não se exige que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um acto preenche os requisitos do artigo 253.° CE deve ser apreciada à luz não somente do seu teor literal, mas também do seu contexto e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa (acórdãos do Tribunal de Justiça de 2 de Abril de 1998, Comissão/Sytraval e Brink’s France, C‑367/95 P, Colect., p. I‑1719, n.° 63, de 19 de Setembro de 2002, Espanha/Comissão, C‑113/00, Colect, p. I‑7601, n.os 47 e 48, e C‑114/00, Colect., p. I‑7657, n.os 62 e 63; acórdão do Tribunal de 26 de Fevereiro de 2002, INMA e Itainvest/Comissão, T‑323/99, Colect., p. II‑545, n.° 55).

60     Em particular, a Comissão não é obrigada a tomar posição sobre todos os argumentos invocados perante ela pelos interessados, mas basta‑lhe expor os factos e as considerações jurídicas que assumam importância essencial na economia da decisão (acórdãos do Tribunal de 8 de Junho de 1995, Siemens/Comissão, T‑459/93, Colect., p. II‑1675, n.° 31, e de 13 de Junho de 2000, EPAC/Comissão, T‑204/97 e T‑270/97, Colect, p. II‑2267, n.° 35).

61     Para efeitos do exame da exigência de fundamentação no presente contexto, cumpre precisar que o procedimento de controlo dos auxílios de Estado é um procedimento instaurado relativamente ao Estado‑Membro responsável pela concessão do auxílio e que os interessados na acepção do artigo 88.°, n.° 2, CE, entre os quais figura o beneficiário do auxílio, não podem exigir a participação num debate contraditório com a Comissão, como o que existe a favor do referido Estado‑Membro (acórdãos do Tribunal de Justiça de 10 de Julho de 1986, Bélgica/Comissão, 234/84, Colect, p. 2263, n.° 29, e de 24 de Setembro de 2002, Falck e Acciaierie di Bolzano/Comissão, C‑74/00 P e C‑75/00 P, Colect, p. I‑7869, n.os 81 e 82).

62     No caso em apreço, a República Federal da Alemanha não afirmou durante o procedimento administrativo, contrariamente ao que é alegado pela recorrente, que a concessão do auxílio por parte do BvS se destinava a compensar o facto de o Land da Turíngia não ter cumprido a promessa de auxílio ao investimento de 4 milhões de DEM. No decurso do procedimento administrativo, a República Federal da Alemanha limitou‑se a afirmar que a concessão da dispensa de pagamento se destinava a impedir a falência da recorrente.

63     Se é verdade que, na sua comunicação à Comissão de 27 de Fevereiro de 2001, a República Federal da Alemanha indicou que «aderia ao teor das explicações fornecidas pela [recorrente] nas suas observações sobre o início do procedimento formal de exame», há, todavia, que salientar que esta declaração figura na parte introdutória da referida comunicação relativa à aplicação do artigo 87.°, n.° 3, alínea c), CE. Em qualquer caso, continua a ser válido o argumento de que a República Federal da Alemanha não se referiu expressamente à alegada promessa de auxílio feita pelo Land da Turíngia à recorrente com vista a justificar a dispensa de pagamento aceite pelo BvS.

64     Nestas circunstâncias, não é possível exigir que a fundamentação da Comissão para rejeitar o argumento baseado no direito à modificação do asset‑deal 1, que foi invocado pela recorrente durante o procedimento administrativo, seja tão exaustiva como a que a República Federal da Alemanha podia legitimamente esperar da Comissão ao rejeitar os seus argumentos.

65     No caso em apreço, a Comissão respondeu ao argumento invocado pela recorrente no procedimento administrativo baseado no seu direito à modificação do asset‑deal 1 em consequência da existência de uma promessa de auxílio que não foi cumprida pelo Land da Turíngia.

66     Com efeito, nos termos do considerando 82 da decisão recorrida:

«[A recorrente] argumenta que a renúncia por parte do BvS não constitui um auxílio estatal, mas sim um ajustamento do contrato de privatização, uma vez que o Land da Turíngia concedeu menos subsídios ao investimento do que o que estava acordado no quadro da privatização das três primeiras linhas de produção. No entanto, o BvS e o Land da Turíngia são pessoas jurídicas distintas, pelo que a Comissão não pode de forma alguma aceitar este argumento. Os eventuais direitos que a [recorrente] possa ter relativamente ao Land da Turíngia e relativamente ao BvS devem ser tratados em separado.»

67     Esta fundamentação da Comissão permitiu à recorrente, na sua qualidade de interessada, compreender a justificação da rejeição do seu argumento, justificação cuja pertinência, aliás, contesta e sobre a qual o Tribunal pode exercer a sua fiscalização da legalidade.

68     Por conseguinte, o fundamento baseado na falta de fundamentação da decisão recorrida neste ponto deve ser julgado improcedente.

69     Por outro lado, no que diz respeito ao mérito da apreciação da Comissão contida no considerando 82 da decisão recorrida, cumpre recordar que, contrariamente ao que é alegado pela recorrente, a Comissão não admitiu neste considerando que o Land da Turíngia tinha prometido à recorrente um auxílio ao investimento no montante de 4 milhões de DEM. A Comissão limitou‑se unicamente a configurar a hipótese de a recorrente poder invocar direitos desta natureza contra o Land da Turíngia, o que é confirmado pelo facto de se ter referido aos «eventuais direitos que a [recorrente] possa ter relativamente ao Land da Turíngia».

70     Assim, mesmo que se admita que a recorrente pode invocar estes direitos, a Comissão considerou que a sua argumentação era desprovida de pertinência, pelo facto de o Land da Turíngia e o BvS serem pessoas jurídicas distintas.

71     É certo que a proibição do artigo 87.°, n.° 1, CE abrange a totalidade dos auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos de Estado, sem distinção entre os auxílios concedidos directamente pelo Estado ou por organismos públicos ou privados que institua ou designe para gerir o auxílio (acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Março de 1977, Steinike & Weinlig, 78/76, Colect., p. 203, n.° 21, e acórdão Regione autonoma Friuli‑Venezia Giulia/Comissão, já referido, n.° 38).

72     No entanto, nem por isso é possível admitir, apenas com base neste argumento, que a dispensa de pagamento pelo BvS se destinava a compensar a falta de pagamento pelo Land da Turíngia de um alegado auxílio ao investimento.

73     Antes de mais, há que reconhecer que este alegado auxílio ao investimento do Land da Turíngia não é uma das medidas que foram notificadas pela República Federal da Alemanha à Comissão em 1 de Dezembro de 1998, entre as quais figurava a dispensa de pagamento.

74     Além disso, deve recordar‑se que, segundo a recorrente, o Land da Turíngia lhe prometera, em 1994, um auxílio ao investimento integrado no 23.° plano‑quadro da missão de interesse comum «Melhoria da estrutura económica e regional», a saber, um regime de auxílios ao investimento de carácter regional.

75     Ora, como a Comissão sustenta nos seus articulados, a dispensa de pagamento não está integrada neste programa de auxílios específicos e não pode, portanto, ser apreciada pela Comissão à luz das disposições deste regime. Com efeito, esta dispensa de pagamento foi concedida à recorrente pelo BvS, um organismo federal de gestão fiduciária, com o objectivo de lhe permitir fazer face às dificuldades financeiras em que se encontrava e de restaurar a sua viabilidade, e não com o objectivo de apoiar a economia regional do Land da Turíngia, objectivo prosseguido pelo 23.° plano‑quadro.

76     A concessão deste alegado auxílio ao investimento inclui‑se, por outro lado, nas competências autónomas do Land Turíngia e não nas do BvS, como confirma o facto, admitido pela recorrente durante a audiência, de que o referido Land devia ter concedido este auxílio por meio dos seus recursos próprios.

77     Nestas circunstâncias, não é possível considerar que a Comissão cometeu um erro de apreciação ao rejeitar o argumento baseado no direito à modificação do asset‑deal 1, pelo facto de o BvS e o Land da Turíngia serem pessoas colectivas distintas, mesmo que o Land da Turíngia tenha efectivamente prometido à recorrente o referido auxílio ao investimento.

78     Em qualquer caso, cumpre notar que, nos seus articulados, a recorrente não apresentou prova bastante de que o Land da Turíngia tinha efectivamente prometido conceder‑lhe um auxílio ao investimento no valor de 4 milhões de DEM.

79     Ainda que, na decisão recorrida, a Comissão não se tenha fundamentado nesta consideração para rejeitar o argumento da recorrente baseado no seu direito à modificação do asset‑deal 1, o Tribunal ordenou, a título de medidas de organização do processo, a apresentação de vários documentos comprovativos da promessa de auxílio do Land da Turíngia. Assim, em primeiro lugar, a recorrente transmitiu ao Tribunal a carta do BvS de 18 de Fevereiro de 1998, através da qual lhe foram comunicados os elementos essenciais da acção concertada entre o BvS, o Land da Turíngia e o investidor privado, a sua carta ao BvS de 19 de Fevereiro de 1998 e o contrato de 19 de Fevereiro de 1999, relativo à dispensa de pagamento. Esta correspondência foi mencionada pela recorrente nas observações que apresentou à Comissão sobre o início do procedimento administrativo, de 28 de Agosto de 2000.

80     No entanto, apesar de estes documentos dizerem precisamente respeito à concessão da dispensa de pagamento à recorrente, nenhum deles faz prova da existência de uma promessa de auxílio do Land da Turíngia no montante de 4 milhões de DEM.

81     Em seguida, a recorrente apresentou um pedido de subsídio – mencionado na petição – que tinha dirigido ao Land da Turíngia por carta de 5 de Fevereiro de 2001. Nos termos desta carta, «[n]o quadro das negociações relativas à privatização, o Land da Turíngia tinha prometido apoiar o projecto por meio de subsídios ao investimento no valor de 43% (27% + 16% [caso o investidor fosse uma] PME) = 10,75 milhões de DEM, […] dos quais apenas 6,75 milhões acabaram por ser autorizados, uma vez que, durante este período, a definição comunitária de PME foi alterada em desfavor da [recorrente], de forma que o Land deixou de poder cumprir as suas promessas». Não é, porém, possível considerar que esta carta da recorrente faz prova bastante da existência de uma promessa de auxílio do Land da Turíngia no montante de 4 milhões de DEM, susceptível de justificar a aceitação pelo BvS de uma dispensa de pagamento de igual montante. Com efeito, mesmo admitindo que a alegada promessa de subsídio de 16%, à qual a recorrente se refere nesta carta, seja a promessa de auxílio em causa no montante de 4 milhões de DEM, o Land da Turíngia revogou esta promessa como a própria recorrente confessou.

82     Tendo a recorrente afirmado, por outro lado, que a dispensa de pagamento constituiu um elemento determinante para a conclusão do asset‑deal 1, o Tribunal solicitou‑lhe igualmente a apresentação deste contrato. Contudo, nenhum elemento do asset‑deal 1 permite considerar que a referida dispensa de pagamento era justificada pela alegada promessa de auxílio que não foi cumprida pelo Land da Turíngia.

83     Por último, a pedido do Tribunal, a recorrente apresentou cópia de uma carta de 15 de Agosto de 1996 – mencionada nas observações que apresentou à Comissão em 28 de Agosto de 2000 – que lhe foi enviada pelo Land da Turíngia e que faz prova da atribuição pelo referido Land de um subsídio de 4 680 000 DEM (2 392 846 EUR), à qual a recorrente juntou, por iniciativa própria, cópia de uma decisão de atribuição de um subsídio, de 19 de Agosto de 1996, do Land da Turíngia. Todavia, inquirida sobre o conteúdo destas cartas na audiência, a recorrente indicou que o auxílio em questão nas cartas enviadas não era a promessa de auxílio de 4 milhões de DEM que o Land da Turíngia se comprometera alegadamente a atribuir à recorrente no quadro da privatização em causa.

84     Decorre das considerações precedentes que a recorrente não fez prova bastante de que a fixação do preço de venda das três primeiras linhas de produção em 5,8 milhões de DEM era justificada pela alegada promessa de auxílio ao investimento de 4 milhões de DEM do Land da Turíngia. Por outro lado, a recorrente admitiu durante a audiência que não dispunha de um documento que comprovasse formalmente a existência dessa promessa de auxílio por parte do Land da Turíngia.

85     O Tribunal, considerando‑se suficientemente esclarecido pelas medidas de organização do processo adoptadas nos termos do artigo 64.° do Regulamento de Processo, entende não ser necessário deferir o pedido da recorrente destinado a que sejam colocadas questões ao BvS ou a que o Sr. Geiß seja ouvido como testemunha (v. n.° 56 supra).

86     Nestas circunstâncias, uma vez que não foi feita prova da premissa em que assenta a argumentação da recorrente sobre a existência de uma promessa de auxílio ao investimento do Land da Turíngia, não é necessário examinar os argumentos da recorrente a respeito do conceito de modificação dos contratos em razão da alteração dos pressupostos que lhe serviam de fundamento nem determinar se esta alegada promessa de auxílio estava integrada no 23.° plano‑quadro.

87     Face ao exposto, este argumento baseado no direito à modificação do asset‑deal 1 deve ser rejeitado por infundado.

 Quanto à aplicação alegadamente errada do critério do operador privado em economia de mercado

–       Argumentos das partes

88     A recorrente alega que a Comissão interpretou o critério do investidor privado de maneira demasiado restritiva. Com efeito, a Comissão devia ter considerado a dispensa de pagamento do ponto de vista de uma holding privada ou de um grupo privado de empresas, motivado por perspectivas de rentabilidade a longo prazo das empresas beneficiárias do auxílio e pela credibilidade da sua própria imagem (despacho de 4 de Abril de 2002, Technische Glaswerke Ilmenau/Comissão, já referido, n.° 65).

89     Em particular, ao aplicar o critério do investidor privado à República Federal da Alemanha, a Comissão devia ter tido em conta a promessa de auxílio do Land da Turíngia de 1994 e ter concluído que a dispensa de pagamento apenas representava uma modalidade de cumprimento desta promessa e não conduzia, por este motivo, a nenhuma perda. Além disso, ao evitar a insolvência e a falência da recorrente, esta medida também evitou que esta perdesse os auxílios que lhe foram anteriormente concedidos.

90     A recorrente critica igualmente a Comissão pelo facto de ter rejeitado, na decisão recorrida (considerandos 67 a 85), a argumentação apresentada pela República Federal da Alemanha, segundo a qual, do ponto de vista de um credor privado, era preferível a renúncia parcial ao pagamento do preço fixado no quadro do asset‑deal 1, a fim de permitir a cessão da quarta linha de produção ao abrigo do asset‑deal 2. Ao perspectivar a hipótese desta cessão, mesmo em caso de falência da recorrente, a Comissão não só substituiu pela sua a apreciação do Estado‑Membro em causa, como também se afastou das considerações que um investidor privado tem razoavelmente em conta.

91     Por outro lado, a decisão recorrida está insuficientemente fundamentada, na medida em que não menciona o relatório da avaliação do BvS com data de 30 de Maio de 2000, anexo à comunicação da República Federal da Alemanha à Comissão de 3 de Julho de 2000. Com efeito, a Comissão devia ter indicado os motivos que a levaram a afastar‑se desta avaliação, que explica porque é que a República Federal da Alemanha concluíra que a dispensa de pagamento era conforme com o comportamento de um investidor privado.

92     A Comissão objecta que a decisão recorrida (considerandos 78, 79 e 83) se refere ao critério do credor privado e não ao do investidor privado, que é invocado pela recorrente. A argumentação relativa a este último critério é, por conseguinte, desprovida de pertinência e os argumentos a respeito do critério do credor privado são inadmissíveis pelo facto de não terem sido invocados na petição.

93     A Comissão nega ter aplicado o critério do credor privado de modo demasiado restrito. Tendo sido informado pela República Federal da Alemanha de que a recorrente se encontrava quase numa situação de cessação de pagamentos e insolvente, um credor privado ter‑se‑ia empenhado em recuperar os seus créditos. Ora, os cálculos efectuados pela Comissão demonstram que era menos oneroso para a República Federal da Alemanha não conceder a dispensa de pagamento.

94     Quanto a esta questão, as três razões que permitem concluir que o BvS não agiu como um credor privado são descritas em pormenor na decisão recorrida (considerandos 76 a 80). No que se refere, em especial, à quarta linha de produção, objecto do asset‑deal 2, a Comissão precisa que nunca considerou que esta linha poderia, em qualquer hipótese, ser vendida à recorrente. A decisão recorrida tem por base a ideia de que esta linha de produção podia ser vendida a um terceiro, com as restantes instalações da recorrente, em caso de falência desta última. Acresce que nada permitia supor que o asset‑deal 2 não teria sido celebrado sem a dispensa de pagamento, visto que o preço de 50 000 DEM fixado neste contrato corresponde praticamente a uma doação. Por último, a recorrente não explica quais são as consequências do erro pretensamente cometido pela Comissão na apreciação dos seus cálculos.

95     A interveniente faz sua a argumentação da Comissão.

–       Apreciação do Tribunal

96     No que diz respeito, em primeiro lugar, à admissibilidade dos argumentos da recorrente a respeito do critério do credor privado, deve recordar‑se que o artigo 48.°, n.° 2, do Regulamento de Processo proíbe a dedução de novos fundamentos no decurso da instância, a menos que tenham origem em elementos de direito e de facto que se tenham revelado durante o processo. No caso em apreço, a argumentação utilizada pela recorrente na sua réplica relativamente ao critério do credor privado, que é tido em conta pela Comissão na decisão recorrida, constitui uma resposta ao argumento de defesa apresentado pela Comissão, segundo o qual o critério do investidor privado invocado na petição não era pertinente no presente caso. Esta argumentação não constitui, portanto, um fundamento novo, mas o desenvolvimento do fundamento invocado na petição, baseado na violação do artigo 87.°, n.° 1, CE, pelo facto de a Comissão ter alegadamente procedido a uma aplicação errada do critério do operador privado em economia de mercado. Por conseguinte, a inadmissibilidade invocada pela Comissão deve ser recusada.

97     Em segundo lugar, no que respeita ao mérito desta argumentação, deve recordar‑se que a apreciação, pela Comissão, da questão de saber se uma medida preenche o critério do operador privado em economia de mercado implica uma apreciação económica complexa. Ao adoptar um acto que implica uma apreciação desta natureza, a Comissão goza de um amplo poder de apreciação e a fiscalização jurisdicional, mesmo que seja em princípio completo no que toca à questão de saber se uma medida é abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE, limita‑se à verificação do respeito das regras de tramitação processual e de fundamentação, da inexistência de erros de direito, da exactidão material dos factos considerados, da inexistência de erro manifesto na apreciação desses factos e da inexistência de desvio de poder. Em particular, não cabe ao Tribunal substituir a apreciação económica do autor da decisão pela sua apreciação (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de 11 de Julho de 2002, HAMSA/Comissão, T‑152/99, Colect., p. II‑3049, n.os 125 a 127 e 129, e de 17 de Outubro de 2002, Linde/Comissão, T‑98/00, Colect., p. II‑3961, n.° 40).

98     No caso concreto, com vista a determinar se a redução de uma parte das dívidas da recorrente ao BvS tem carácter de auxílio estatal, é pertinente aplicar o critério do credor privado em economia de mercado que foi indicado na decisão recorrida e que, por outro lado, não foi contestado pela recorrente.

99     Com efeito, ao conceder a dispensa de pagamento, o BvS não agiu como um investidor público cuja intervenção deveria ser comparada ao comportamento de um investidor privado prosseguindo uma política estrutural, global ou sectorial e orientado por perspectivas de rentabilidade a longo prazo dos capitais investidos. Esse organismo estatal deve, na realidade, ser comparado a um credor privado que procure obter o pagamento das quantias que lhe são devidas por um devedor em dificuldades financeiras (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 29 de Abril de 1999, Espanha/Comissão, C‑342/96, Colect., p. I‑2459, n.° 46, e de 29 de Junho de 1999, DM Transport, C‑256/97, Colect., p. I‑3913, n.° 24, e acórdão HAMSA/Comissão, já referido, n.° 167).

100   Neste contexto, há que salientar que, durante o procedimento administrativo, a República Federal da Alemanha reconheceu que, em 1997, a recorrente se encontrava em graves dificuldades financeiras. A manutenção pelo BvS do preço de venda fixado no quadro do asset‑deal 1 teria, portanto, segundo as autoridades alemãs, provavelmente conduzido à falência da recorrente e, consequentemente, à inexecução do asset‑deal 2. Nestas condições, o custo total da dispensa de pagamento de 4 milhões de DEM (1 811 000 EUR) foi, segundo a República Federal da Alemanha, mais vantajosa para o BvS do que a manutenção da totalidade do preço de aquisição fixado no quadro do asset‑deal 1, que teria originado despesas no montante de 2 590 000 DEM (considerandos 73 e 75 da decisão recorrida).

101   A recorrente contesta os motivos que levaram a Comissão a considerar improcedente, na decisão recorrida, a tese defendida pela República Federal da Alemanha durante o procedimento administrativo, segundo a qual a dispensa de pagamento de 4 milhões de DEM do preço fixado no quadro do asset‑deal 1 se destinava a diminuir os encargos financeiros do BvS, representando assim a solução economicamente mais vantajosa.

102   Nos seus articulados, a recorrente alega a este respeito que a decisão recorrida se baseia numa hipótese irrealista, a saber, que o asset‑deal 2 poderia ter sido executado mesmo que a recorrente tivesse falido e afirma que, em qualquer caso, uma vez que a tese da República Federal de Alemanha é baseada em considerações económicas razoáveis, a Comissão não devia substituir a apreciação do Estado‑Membro em causa pela sua própria.

103   Todavia, importa reconhecer que, em apoio deste argumento, a recorrente se limita a afirmar que a Comissão, ao considerar que «nada indica[va] que o asset‑deal 2 não teria produzido efeitos caso o BvS não tivesse prescindido de uma parte do seu crédito», ultrapassou os poderes de fiscalização que lhe incumbem a fim de verificar se o Estado‑Membro em questão agiu como um credor privado.

104   Ora, esta afirmação não fundamentada não é susceptível de demonstrar que a Comissão cometeu um erro de apreciação manifesto ao entender que nenhum elemento permitia considerar que a dispensa de pagamento era uma condição prévia à execução do asset‑deal 2 (considerandos 76 a 78 da decisão recorrida).

105   Em qualquer caso, há que salientar que a Comissão também considerou, na decisão recorrida, a hipótese de que o asset‑deal 2 não teria sido executado no caso de o BvS exigir o pagamento integral do preço de aquisição das três primeiras linhas de produção fixado no quadro do asset‑deal 1. Neste contexto, a Comissão baseou‑se em duas outras considerações que demonstram, segundo ela, que a República Federal da Alemanha não podia validamente defender que a dispensa de pagamento era a solução economicamente mais vantajosa.

106   Em primeiro lugar, a Comissão considerou que, na hipótese de o asset‑deal 2 não poder ser executado sem a existência da dispensa de pagamento, não foi demonstrado que o BvS agiu como um credor privado ao conceder esta dispensa (considerando 79 da decisão recorrida). Relativamente a esta questão, a Comissão considerou que, na hipótese de o BvS não ter concedido a dispensa de pagamento, o que teria como consequência a falência da recorrente, os encargos de reabilitação do terreno no qual se situa a quarta linha de produção não deviam ser tidos em conta, ao contrário do que foi feito pela República Federal da Alemanha no quadro das suas considerações económicas em apoio da sua tese. Esta reabilitação era efectivamente necessária à criação de um parque tecnológico. Ora, um credor privado não estaria vinculado à realização de um projecto desta natureza.

107   No que se refere à reabilitação do terreno da quarta linha de produção, necessária à criação de um parque tecnológico, há que salientar que, nos seus articulados, a recorrente não contestou as alegações da Comissão quanto a este ponto. No âmbito das suas respostas ao Tribunal, a recorrente alegou, no entanto, que o BvS estava legalmente obrigado a reabilitar este terreno e que o projecto de criação de um parque tecnológico era largamente subvencionado.

108   Para além de a recorrente não ter fundamentado este argumento, há que constatar que ele não é de modo algum susceptível de pôr em causa a afirmação da Comissão de que um credor privado não pode estar vinculado à obrigação associada à criação de um parque tecnológico. Com efeito, uma vez que tal projecto não apresentava qualquer ligação ao objectivo de reestruturação da recorrente, a Comissão pôde legitimamente considerar que estava em causa uma obrigação que não se inclui no comportamento de um credor privado, mas no exercício de prerrogativas de poder público que se incluem na autoridade do Estado.

109   A este respeito, a Comissão também reconheceu que as autoridades alemãs fixaram o valor do preço de venda deste terreno à recorrente em 1 047 000 DEM (535 323 EUR), para a hipótese de o preço estabelecido no asset‑deal 1 ser reduzido em 4 milhões de DEM. Em contrapartida, a República Federal da Alemanha avaliou‑o em apenas 470 000 DEM (240 307 EUR) no caso de o BvS não conceder a dispensa de pagamento, provocando desta forma a falência da recorrente. A Comissão salientou que esta redução do preço de venda do referido terreno não foi objecto de explicações mais detalhadas (considerando 79 da decisão recorrida).

110   Apesar de não ter contestado esta apreciação da Comissão nos seus articulados, a recorrente alegou, no quadro das suas respostas às questões do Tribunal, que esta redução do preço de venda do terreno tinha sido justificada pela necessidade de o reabilitar. No entanto, mesmo supondo que o BvS estava obrigado a proceder à reabilitação do terreno no qual se situa a quarta linha de produção, não é admissível a consideração simultânea desta reconversão num montante de 2 200 000 DEM (1 124 842 EUR) e da diminuição do seu preço de venda de 1 047 000 DEM para 470 000 DEM.

111   Face ao exposto, a Comissão podia, sem cometer um erro manifesto de apreciação, não tomar em conta os encargos de reabilitação do terreno no qual se situava a quarta linha de produção, na análise das despesas a cargo do BvS no caso de este exigir o pagamento integral do preço fixado no quadro do asset‑deal 1.

112   Esta circunstância permite, por si só, considerar que a Comissão entendeu, correctamente, que as despesas que advêm para o BvS da concessão da dispensa de pagamento, contrariamente às informações transmitidas pela República Federal da Alemanha nesta matéria, são superiores às que deveriam ter sido suportadas caso a referida dispensa não existisse.

113   Em segundo lugar, a Comissão também alegou na decisão recorrida (considerando 80) que, na análise comparativa dos encargos financeiros a suportar pelo BvS no caso da concessão da dispensa de pagamento, por um lado, e no caso do pagamento do preço inicialmente fixado no quadro do asset‑deal 1, por outro, a República Federal da Alemanha não teve em consideração um subsídio ao investimento de 1 milhão de DEM que foi concedido pelo BvS no quadro do asset‑deal 2. Ora, a consideração deste montante permite constatar que os encargos do BvS seriam superiores na hipótese de este último conceder a dispensa de pagamento.

114   A este respeito, a recorrente sustentou, na resposta a uma questão colocada pelo Tribunal, que este subsídio de 1 milhão de DEM, previsto no artigo 5.° do asset‑deal 2, era um custo irrecuperável («sunk cost»). Com efeito, segundo a recorrente, uma vez que a quarta linha de produção apenas podia funcionar caso as suas componentes fossem remodeladas, o BvS comprometeu‑se a reembolsar à recorrente os encargos de manutenção desta linha até ao valor de 1 milhão de DEM, os quais, em virtude da sua afectação, não eram recuperáveis e não fundamentavam qualquer direito em caso de falência.

115   Contudo, deve observar‑se que a recorrente se limitou a afirmar, na sua resposta à questão do Tribunal, que o subsídio de 1 milhão de DEM prometido pelo BvS constituía um custo irrecuperável, sem apresentar a este respeito os meios de prova que, segundo ela, se encontravam à disposição da Comissão durante o procedimento administrativo.

116   Acresce que esta circunstância não é susceptível de justificar que o montante deste subsídio seja omitido na análise das despesas que para o BvS resultam da execução do asset‑deal 2. Com efeito, mesmo supondo que este subsídio constitua para o BvS um custo irrecuperável em caso de falência da recorrente e da subsequente não execução do asset‑deal 2, a verdade é que o BvS concedeu este subsídio relacionado com a execução do asset‑deal 2. Por esta razão, o subsídio devia ter sido considerado na análise das despesas que o BvS teve de suportar com a execução do asset‑deal 2, após a concessão da dispensa de pagamento.

117   Daqui decorre que a recorrente não demonstrou que a Comissão cometeu um erro manifesto na análise descrita no considerando 80 da decisão recorrida.

118   Na medida em que se apurou anteriormente que a dispensa de pagamento já constituía a opção mais onerosa (v. n.° 112 supra), chega‑se, por maioria de razão, à mesma conclusão caso se admita que o BvS tinha a obrigação de pagar um subsídio suplementar no montante de 1 milhão de DEM.

119   Nestas circunstâncias, o argumento através do qual a recorrente acusa a Comissão de não ter em conta o facto de a dispensa de pagamento poder ter sido motivada pelo interesse de evitar a perda dos auxílios que lhe tinham sido anteriormente pagos com vista à conclusão do asset‑deal 1 também não pode ser acolhido.

120   Por outro lado, a recorrente alega nos seus articulados que o interesse de preservar a credibilidade do BvS e de promover a sua imagem de marca pode incluir‑se nos elementos que podem razoavelmente ser tidos em conta por um operador privado. Assim, a Comissão devia ter considerado a promessa de auxílio de 1994 do Land da Turíngia e ter verificado que a dispensa de pagamento apenas representava uma modalidade de cumprimento desta promessa.

121   No entanto, como já foi anteriormente observado, a recorrente não demonstrou que a Comissão cometeu um erro de apreciação manifesto ao considerar que a recorrente não podia invocar o direito à modificação do asset‑deal 1. Por conseguinte, não era possível considerar que a credibilidade do BvS poderia ser afectada pela manutenção do preço de venda das três primeiras linhas de produção que foi fixado no quadro do asset‑deal 1 em 5,8 milhões de DEM.

122   Resulta das considerações precedentes que a Comissão não cometeu qualquer erro manifesto de apreciação ao entender que o BvS não actuou como um credor privado que opera em condições normais de mercado e que não aplicou erradamente este critério.

123   Finalmente, em terceiro lugar, no que se refere à insuficiência da fundamentação da decisão recorrida, na medida em que a Comissão não teria explicado as razões pelas quais não teve em consideração o relatório da avaliação do BvS de 30 de Maio de 2000, deve recordar‑se que, na sua fundamentação, a Comissão podia limitar‑se a expor os factos e as considerações jurídicas que assumam uma importância essencial na economia da sua decisão (v. n.° 60 supra).

124   Ora, esta avaliação, elaborada dois anos após a concessão da dispensa de pagamento, indica o seguinte:

«No plano económico, a melhor solução tanto para o BvS como para a [recorrente] consiste em esta conseguir, como considera, encontrar no ano 2000 um investidor que possa colocar à sua disposição um capital de 3 850 000 DEM e na extinção do crédito do preço de aquisição do BvS de 5 800 000 DEM pelo pagamento de 1 800 000 DEM acrescidos de juros.»

125   Por conseguinte, esta avaliação subordinava a prossecução da actividade da recorrente não apenas à dispensa de pagamento como também a uma nova contribuição de um investidor num montante de 3 850 000 DEM. Ora, o plano de reestruturação de 1998 já previa a necessidade desta contribuição. No entanto, é facto assente que não foi possível encontrar nenhum novo investidor privado (considerando 95 da decisão recorrida).

126   Além disso, na sua comunicação à Comissão de 27 de Fevereiro de 2001, a República Federal da Alemanha declarou que a avaliação do BvS de 30 Maio de 2000 apenas constituía uma primeira abordagem que não tinha em conta, para efeitos de ajustamento do plano de reestruturação de 1998, alguns trimestres de recessão dos anos de 1998 e 1999.

127   Neste contexto, a Comissão pôde justamente considerar que esta avaliação não constituía um facto pertinente que devesse referir na decisão recorrida. Em consequência, a decisão recorrida não está viciada por fundamentação insuficiente neste ponto.

128   Atendendo às considerações precedentes, este argumento deve igualmente ser rejeitado.

 Quanto à determinação alegadamente errada do montante do auxílio

129   A título subsidiário, a recorrente sustenta que a Comissão determinou erradamente o montante do auxílio sujeito à obrigação de recuperação nos termos do artigo 2.° da decisão recorrida. Alega que, de facto, a Comissão não produziu a prova de que este auxílio ascendia efectivamente a 4 milhões de DEM. Atendendo a que o artigo 87.°, n.° 1, CE visa os auxílios «provenientes de recursos estatais», o montante do auxílio declarado incompatível com o mercado comum corresponde ao da perda de receitas sofrida pelo BvS ao conceder a dispensa de pagamento.

130   Segundo a recorrente, a Comissão não contesta que a recorrente teria ido à falência caso o BvS tivesse exigido o pagamento do preço fixado no quadro do asset‑deal 1. Mas admite que, nesta hipótese, o asset‑deal 2 teria, apesar disso, sido executado, o que, na opinião da recorrente, é irrealista. Na determinação do montante do alegado auxílio, a Comissão não teve, portanto, em conta as perdas suplementares que o BvS teria sofrido pela falta de execução do segundo contrato. Além disso, segundo o cálculo feito na decisão controvertida, a perda de rendimentos do BvS, em caso de falência da requerente, apenas corresponderia à quota‑parte atribuída aos credores na massa falida, e não aos 4 milhões de DEM. Uma vez que a Comissão calculou o valor do auxílio em causa num montante que contradiz as suas próprias conclusões, a decisão recorrida deve ser anulada.

131   A Comissão, apoiada pela interveniente, contesta a argumentação da recorrente.

132   O Tribunal lembra que, segundo jurisprudência constante, o objectivo prosseguido pela Comissão ao exigir a recuperação de um auxílio ilegal consiste em fazer com que o seu beneficiário perca a vantagem de que tinha beneficiado no mercado relativamente aos seus concorrentes e em repor a situação anterior ao pagamento do referido auxílio (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 21 de Março de 1990, Bélgica/Comissão, C‑142/87, Colect., p. I‑959, n.° 66, e de 4 de Abril de 1995, Comissão/Itália, C‑348/93, Colect., p. I‑673, n.° 27). Acresce que este objectivo não pode depender da forma como o auxílio foi concedido (acórdão do Tribunal de Justiça de 10 de Junho de 1993, Comissão/Grécia, C‑183/91, Colect., p. I‑3131, n.° 16).

133   Além disso, já foi decidido (v., nomeadamente, acórdão do Tribunal de Justiça 24 de Fevereiro de 1987, Deufil/Comissão, 310/85, Colect., p. 901) que a supressão de um auxílio ilegal mediante recuperação é a consequência lógica da declaração da sua ilegalidade. Por conseguinte, a recuperação de um auxílio estatal ilegalmente concedido, com vista ao restabelecimento da situação anterior, não pode, em princípio, ser considerada uma medida desproporcionada relativamente aos objectivos das disposições do Tratado em matéria de auxílios de Estado (acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de Março de 1990, Bélgica/Comissão, já referido, n.° 66).

134   O artigo 2.°, n.° 1, da decisão recorrida determina:

«A [República Federal da] Alemanha tomará todas as medidas necessárias para recuperar junto do beneficiário o auxílio referido no artigo 1.° e ilegalmente concedido.»

135   Estando em causa, como no presente caso, um auxílio ilegal concedido sob a forma de uma dispensa de pagamento acordada no quadro de um contrato de compra e venda, não é exacto sustentar, como faz a recorrente, que o montante do auxílio a recuperar é inferior ao montante desta dispensa.

136   De facto, nos termos do asset‑deal 1, o montante da venda das três primeiras linhas de produção pelo BvS ascendia a 5,8 milhões de DEM. Ao conceder a dispensa de pagamento, a recorrente recebeu uma vantagem económica de 4 milhões de DEM, da qual os seus concorrentes não beneficiaram.

137   A recorrente não pode validamente sustentar a este respeito que, do ponto de vista de um credor privado, o elemento constitutivo do auxílio de Estado é inferior ao valor da dispensa de pagamento e que o pagamento integral do preço fixado no quadro do asset‑deal 1 teria conduzido a perdas suplementares para a República Federal da Alemanha, uma vez que já foi acima decidido que um credor privado operando em condições normais de mercado não teria concedido a referida dispensa (v. n.° 122 supra).

138   Em qualquer caso, a recorrente sustenta que a perda sofrida pela República Federal da Alemanha não é de 4 milhões de DEM, sendo, ao invés, constituída pela provisão correspondente a este valor que viesse a ser atribuída à massa dos credores no quadro da falência que teria ocorrido se o BvS não tivesse concedido a dispensa de pagamento.

139   Todavia, atendendo a que o objectivo da recuperação de um auxílio ilegalmente concedido consiste no restabelecimento da situação anterior ao pagamento deste auxílio, a Comissão tinha legitimidade para ordenar a restituição do referido auxílio. Com efeito, ao exigir a recuperação do montante da dispensa de pagamento do preço, que é susceptível de conduzir à falência da recorrente, esta última ficará numa situação comparável à que teria prevalecido se a dispensa de pagamento não tivesse sido concedida, ou seja, segundo a recorrente, a sua falência. Caso a falência da recorrente seja efectivamente decidida, caberá à República Federal da Alemanha assegurar a este respeito, segundo as modalidades previstas nesse contexto pelo direito nacional, que o auxílio em causa é efectivamente recuperado, sem que a colocação em liquidação se oponha à execução da decisão recorrida (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Janeiro de 1986, Comissão/Bélgica, 52/84, Colect., p. 89, n.os 16 e 17).

140   Em consequência, este argumento e o primeiro fundamento na sua totalidade devem ser julgados improcedentes.

 Quanto ao segundo fundamento, baseado na violação do artigo 87.°, n.° 3, alínea c), CE e na insuficiência da fundamentação

 Argumentos das partes

141   Em primeiro lugar, a recorrente recorda que, ao examinar a proporcionalidade do auxílio à luz do artigo 87.°, n.° 3, alínea c), CE, a Comissão deve ter em conta a estrutura do mercado (acórdãos do Tribunal de 6 de Outubro de 1999, Salomon/Comissão, T‑123/97, Colect., p. II‑2925, n.° 79, e de 30 de Janeiro de 2002, Keller e Keller Meccanica/Comissão, T‑35/99, Colect., p. II‑261, n.° 88). A este respeito, baseia‑se nas orientações relativas aos auxílios de emergência e à reestruturação das empresas em dificuldade. Estas orientações enumeram, a título exemplificativo, o caso de o desaparecimento de empresas poder conduzir à criação de uma situação de monopólio ou de oligopólio. A recorrente acrescenta que a Comissão tem a obrigação de verificar se à concessão do auxílio não está associada a violação de outras disposições do direito comunitário, como o artigo 82.° CE e o artigo 2.° do Regulamento (CEE) n.° 4064/89 do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, relativo ao controlo das operações de concentração de empresas (JO 1990, L 257, p. 13) (acórdãos do Tribunal de Justiça de 19 de Setembro de 2000, Alemanha/Comissão, C‑156/98, Colect., p. I‑6857, n.° 78; de 3 de Maio de 2001, Portugal/Comissão, C‑204/97, Colect., p. I‑3175, n.os 41 e segs., e do Tribunal de Primeira Instância de 31 de Janeiro de 2001, RJB Mining/Comissão, T‑156/98, Colect., p. II‑337, n.os 112 e segs.).

142   No caso em apreço, a Comissão cometeu um erro de apreciação manifesto ao não ter em consideração, entre o conjunto dos elementos ponderados para efeitos da sua apreciação da proporcionalidade do auxílio nos termos do artigo 87.°, n.° 3, alínea c), CE, o facto de que, em caso de desaparecimento da recorrente, o grupo Schott Glas adquiriria ou reforçaria uma posição dominante em certos sectores da produção de vidro.

143   A recorrente acusa mais particularmente a Comissão de ter ignorado as suas explicações sobre a estrutura do mercado e de não ter verificado se o seu desaparecimento era susceptível de conduzir à constituição de um oligopólio restrito, como é demonstrado pelo Governo alemão na sua comunicação de 20 de Novembro de 2000. A recorrente retoma um determinado número de dados respeitantes aos segmentos de mercado que figuram nesta comunicação e salienta que a respectiva contestação pela interveniente não é fundamentada, uma vez que esta constitui a principal empresa no sector. A interveniente não refuta, nomeadamente, o argumento de que existe um mercado de matérias‑primas do «vidro de observação», no qual ficaria numa situação de quase monopólio caso a recorrente desaparecesse.

144   Por último, a decisão recorrida está insuficientemente fundamentada, na medida em que não permite apurar se, ao avaliar a dispensa de pagamento à luz do artigo 87.°, n.° 3, alínea c), CE, a Comissão teve em conta a modificação da estrutura do mercado na sequência do desaparecimento da recorrente, na hipótese de o preço de aquisição ser integralmente mantido.

145   Em segundo lugar, a recorrente acusa a Comissão de ter baseado a sua apreciação nos termos do artigo 87.°, n.° 3, alínea c), CE em factos inexactos, a saber, o plano de reestruturação que lhe fora comunicado em 1 de Dezembro de 1998. Com efeito, este plano não é conforme com projecto de reestruturação da recorrente na data de adopção da decisão recorrida, 12 de Junho de 2001, que é determinante no caso em apreço (acórdão do Tribunal de 5 de Junho de 2001, ESF Elbe‑Stahlwerke Feralpi/Comissão, T‑6/99, Colect., p. II‑1523, n.° 93). Quanto a esta questão, a Comissão garantira às autoridades alemãs de que as informaria antes de adoptar uma decisão final, para que estas estivessem em condições de lhe transmitir o novo plano de reestruturação, transmissão esta que lhe tinham proposto na sua comunicação de 27 de Fevereiro de 2001. A recorrente entende que, nestas condições, a Comissão não deve basear a decisão recorrida no plano de reestruturação de 1998.

146   Finalmente, a decisão recorrida está insuficientemente fundamentada, na medida em que não faz referência à avaliação Arnold elaborada a pedido do Land da Turíngia e anexa à comunicação da República Federal da Alemanha à Comissão de 27 de Fevereiro de 2001. Trata‑se da única peça do processo administrativo que comporta uma análise sistemática da situação económica da recorrente. Aquela demonstra que, em 2000, esta estava em vias de saneamento. Ora, na decisão recorrida (considerandos 96 e 97), a Comissão concluiu, em total contradição com esta avaliação, que o plano de reestruturação não tinha permitido restabelecer a viabilidade da recorrente. Além disso, esta apreciação da Comissão tinha entretanto sido infirmada pela avaliação Pfizenmayer de 10 de Dezembro de 2001.

147   A Comissão, apoiada pela interveniente, contesta a argumentação da recorrente.

 Apreciação do Tribunal

148   Impõe‑se lembrar que a Comissão dispõe de um amplo poder de apreciação no domínio do artigo 87.°, n.° 3, CE (acórdãos do Tribunal de Justiça de 21 de Março de 1990, Bélgica/Comissão, já referido, n.° 56, e de 11 de Julho de 1996, SFEI e o., C‑39/94, Colect., p. I‑3547, n.° 36). A fiscalização exercida pelo juiz comunitário deve, portanto, limitar‑se à verificação do respeito das regras de processo e do dever de fundamentação, bem como da exactidão material dos factos, da ausência de erro manifesto de apreciação e de desvio de poder (acórdão do Tribunal de 22 de Outubro de 1996, Skibsvaerftsforeningen e o./Comissão, T‑266/94, Colect., p. II‑1399, n.° 170). Não compete ao Tribunal substituir pela sua apreciação no plano económico a apreciação efectuada pela Comissão (acórdãos do Tribunal de 12 de Dezembro de 1996, AIUFFASS e AKT/Comissão, T‑380/94, Colect., p. II‑2169, n.° 56, e HAMSA/Comissão, já referido, n.° 48).

149   Todavia, a Comissão encontra‑se, por um lado, vinculada pelos enquadramentos ou comunicações que adopta em matéria de controlo dos auxílios de Estado, na medida em que não se afastem das normas do Tratado e na medida em que sejam aceites pelos Estados‑Membros (acórdãos do Tribunal de Justiça Deufil/Comissão, já referido, n.° 22; de 24 de Março de 1993, CIRFS e o./Comissão, C‑313/90, Colect., p. I‑1125, n.° 36; de 15 de Outubro de 1996, IJssel‑Vliet, C‑311/94, Colect., p. I‑5023, n.° 43, e de 26 de Setembro de 2002, Espanha/Comissão, C‑351/98, Colect., p. I‑8031, n.° 53). Por outro lado, deve recordar‑se que, nos termos do artigo 253.° CE, a Comissão deve fundamentar as suas decisões, incluindo as que recusam declarar auxílios compatíveis com o mercado comum com fundamento no artigo 87.°, n.° 3, alínea c), CE.

150   Em primeiro lugar, cumpre examinar o argumento da recorrente, nos termos do qual acusa a Comissão de ter fundamentado a decisão recorrida no plano de reestruturação de Dezembro de 1998 e não no plano de reestruturação de 19 de Abril de 2001, bem como de não ter tomado em consideração o relatório Arnold de 24 de Novembro de 2000.

151   No que concerne, por um lado, ao plano de reestruturação em que a Comissão fundamentou a sua decisão, há que recordar que, nos termos dos pontos 3.2.2 das orientações comunitárias relativas aos auxílios estatais de emergência e à reestruturação concedidos a empresas em dificuldade, é indicado, nomeadamente, que o auxílio à reestruturação deve estar associado a um programa de reestruturação/recuperação viável, que deve ser apresentado à Comissão com todos os dados relevantes e que este plano deve permitir restabelecer a competitividade da empresa num prazo razoável.

152   Em primeiro lugar, no caso em apreço, a dispensa de pagamento de 4 milhões de DEM do preço fixado no quadro do asset‑deal 1 foi concedida à recorrente pelo BvS antes da sua notificação à Comissão em 1 de Dezembro de 1998. É facto assente que as autoridades alemãs comunicaram, no quadro da notificação da dispensa de pagamento, o plano de reestruturação de Dezembro de 1998, que dizia respeito aos anos de 1998 a 2000. Está igualmente assente que o plano de reestruturação de 19 de Abril de 2001 não foi comunicado à Comissão durante o procedimento administrativo.

153   Em resposta a uma questão do Tribunal, a recorrente invocou a este respeito que foi para evitar a apresentação simultânea de vários planos alternativos que, num primeiro momento, este último plano não foi transmitido à Comissão.

154   Em segundo lugar, decorre da comunicação da República Federal da Alemanha à Comissão de 27 de Fevereiro de 2001 que a necessidade de adaptar o plano de reestruturação resulta, por um lado, da inexistência do investidor privado previsto neste plano e, por outro lado, da conjuntura extremamente débil do primeiro semestre de 1999, que contribuiu para a degradação da situação financeira da recorrente. A necessidade de adoptar um novo plano de reestruturação em 2001 confirma, pois, o insucesso do plano de reestruturação elaborado em 1998, na medida em que este último não permitiu restabelecer a viabilidade da recorrente num prazo razoável.

155   Em terceiro lugar, importa reconhecer que nenhum elemento do processo permite concluir que a Comissão se comprometeu efectivamente a informar as autoridades alemãs da iminência da adopção da decisão recorrida, o que é sustentado pela recorrente.

156   Relativamente a esta questão, foi decidido que a obrigação de a Comissão prevenir o Estado‑Membro em causa da iminência da adopção de uma decisão negativa é susceptível de constituir um procedimento dilatório que impede a conclusão do processo administrativo em curso (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 21 de Janeiro de 1999, Neue Maxhütte Stahlwerke e Lech‑Stahlwerke/Comissão, T‑129/95, T‑2/96 e T‑97/96, Colect., p. II‑17, n.° 231).

157   Além disso, nos termos da sua comunicação de 27 de Fevereiro de 2001, as autoridades alemãs apenas indicaram que «o governo federal informará em breve a Comissão, na medida em que esta o considere necessário, do resultado definitivo da decisão sobre o ajustamento do plano de reestruturação». Assim, a recorrente não pode validamente defender que, na referida comunicação de 27 de Fevereiro de 2001, o Governo alemão se propôs transmitir‑lhe um novo plano de reestruturação, uma vez que este plano não se encontrava efectivamente disponível nesta data.

158   Acresce que, no âmbito desta comunicação, não obstante as autoridades alemãs referirem a necessidade de proceder a uma adaptação do plano de reestruturação de 1998, as autoridades alemãs afirmaram o seguinte:

«Todavia, o governo federal parte da ideia de que, com base no comportamento característico de mercado do BvS, a Comissão pode concluir o procedimento sem examinar as modificações do plano de reestruturação que deverão ainda ser acordadas em pormenor.»

159   Em quarto e último lugar, como a Comissão salienta, a recorrente não considerou útil comunicar este plano à Comissão entre 19 de Abril de 2001, data da sua adopção, e 12 de Junho de 2001, data de adopção da decisão recorrida.

160   Decorre de todas estas considerações que a recorrente não tem razão ao alegar que a República Federal da Alemanha pedira formalmente à Comissão uma autorização para apresentar um plano de reestruturação actualizado. Por conseguinte, não se pode considerar que a Comissão cometeu um erro de apreciação manifesto ao basear a decisão recorrida no plano de reestruturação de Dezembro de 1998.

161   No que se refere, por outro lado, ao relatório Arnold de 24 de Novembro de 2000, este indica, na sua introdução, que foi elaborado a pedido do Land da Turíngia, a fim de examinar o risco associado à concessão de auxílios suplementares.

162   Por outro lado, na conclusão deste relatório, é afirmado o seguinte:

«Os resultados da sociedade entre 1997 e 2002 demonstram que a sociedade conhece uma evolução positiva.

Devido, por um lado, ao aumento do volume de negócios e, por outro lado, à redução das despesas, os resultados melhoraram continuamente após 1997, com excepção do ano de 1999. Em 2000, tendo em conta as receitas extraordinárias, será possível obter um resultado de equilíbrio. O limiar de rentabilidade será atingido em 2002, com um volume de negócios de 40 milhões de DEM.

Parte‑se do pressuposto que não existem factores excepcionais que afectem esta evolução.

A evolução esperada tem, porém, como condição a realização dos investimentos necessários, avaliados, conforme as previsões, em 11 500 000 DEM. Em 2000, apenas foi possível realizar investimentos até ao montante de 1 000 000 DEM.

A situação dos meios de liquidez da sociedade é muito inquietante. Além de recursos destinados a investimentos de substituição e de renovação que ascendem a 11 500 000 DEM, existem créditos antigos a consolidar no montante de 20 538 000 DEM.

Segundo os cálculos que efectuámos, a sociedade sofrerá de uma falta de meios de liquidez na ordem de 7 842 000 DEM em 2001 e na ordem de 2 215 000 DEM em 2002.

De acordo com as nossas estimativas, a sociedade não será capaz de prover ao seu financiamento com base nos seus recursos próprios futuros. Se o resultado do procedimento de notificação à União Europeia vier a revelar‑se negativo, afigura‑se conveniente a entrada de novos recursos financeiros que perfaçam a quantia de 6 000 000 DEM.

A sociedade não está em condições de o fazer.

Na nossa opinião, para assegurar a unidade de produção são indispensáveis subsídios e auxílios complementares ou então a renúncia a anteriores créditos em vigor.»

163   Face ao exposto, não resulta do relatório Arnold que a recorrente apresentasse perspectivas de rentabilidade a longo prazo.

164   Além do mais, no seu pedido de concessão de um subsídio dirigido ao Land da Turíngia de 5 de Fevereiro de 2001, cuja apresentação em juízo fora ordenada pelo Tribunal, a recorrente declarou que os investimentos previstos no relatório Arnold eram «contrários à regulamentação relativa aos auxílios na situação actual da empresa» e que, portanto, deviam recusar‑se as conclusões do referido relatório neste ponto.

165   Em consequência, não se pode considerar, como é defendido pela recorrente nos seus articulados, que a adaptação do plano de reestruturação de 1998 tinha por base o relatório Arnold, uma vez que ela própria considerou que era necessário afastar‑se das respectivas conclusões.

166   Neste contexto, mais particularmente tendo em vista as conclusões do relatório Arnold e a apreciação realizada pela recorrente a respeito daquelas, a Comissão pôde legitimamente considerar que não era necessário fazer‑lhes referência na decisão recorrida. Assim, há que rejeitar o argumento da recorrente baseado na insuficiência da fundamentação da decisão recorrida nesta parte.

167   Quanto à invocação, pela recorrente, da avaliação Pfizenmayer de 10 de Dezembro de 2001, deve recordar‑se que, segundo jurisprudência assente, a legalidade de uma decisão em matéria de auxílios deve ser apreciada em função dos elementos de informação de que a Comissão podia dispor no momento em que a tomou (acórdão de 10 de Julho de 1986, Bélgica/Comissão, já referido, n.° 16). Ora, basta verificar que sendo a avaliação Pfizenmayer, apresentada pela recorrente para efeitos do processo de medidas provisórias com vista a avaliar as suas possibilidades de sobrevivência económica na hipótese de ser negado provimento ao presente recurso, posterior à adopção da decisão recorrida, aquela não se encontrava à disposição da Comissão durante o procedimento administrativo.

168   Face ao exposto, a recorrente não fez prova de que a Comissão baseou a apreciação que fez nos termos do artigo 87.°, n.° 3, CE em factos inexactos ou que a decisão recorrida está viciada por fundamentação insuficiente nesta matéria.

169   Em segundo lugar, há que verificar, à luz das indicações fornecidas pelas orientações relativas aos auxílios de emergência e à reestruturação das empresas em dificuldade, se a Comissão cometeu um erro de apreciação manifesto ao recusar declarar compatível com o mercado comum, em aplicação do artigo 87.°, n.° 3, alínea c), CE, a dispensa de pagamento, sem ter em conta a criação de uma situação de oligopólio que resultaria do desaparecimento da recorrente.

170   A este respeito, há que observar que, nos termos do ponto 1.2 das orientações acima mencionadas (v. n.° 3 supra), que consta da introdução das referidas orientações, são indicadas, a título exemplificativo, algumas circunstâncias que justificam a concessão de auxílios de emergência e à reestruturação a empresas em dificuldade, em derrogação do princípio enunciado no ponto 1.1 das referidas orientações, segundo o qual não é desejável que os Estados‑Membros atribuam subsídios a empresas que, nas novas condições de mercado, devam desaparecer ou proceder a reestruturações. Não se pode, todavia, considerar que a verificação de uma destas circunstâncias seja, só por si, suficiente para justificar a concessão de uma derrogação. Com efeito, uma circunstância deste tipo apenas pode justificar a concessão de um auxílio de Estado destinado a salvar as empresas em dificuldade e a encorajar a sua reestruturação, no caso de as condições gerais de autorização dos auxílios de emergência e à reestruturação, como definidos nas orientações, estarem preenchidas.

171   No entanto, a recorrente não fez prova de que a Comissão cometeu um erro de apreciação manifesto ao considerar que o plano de reestruturação de 1998 não era, contrariamente ao que é exigido pelas referidas orientações, de molde a permitir‑lhe restaurar a sua viabilidade (v. n.° 154 supra).

172   Além disso, contrariamente ao que é sustentado pela recorrente, não decorre nem das regras do Tratado nem das orientações acima mencionadas que os auxílios ilegais de emergência e à reestruturação devem ser autorizados quando o desaparecimento da empresa beneficiária conduza à criação de uma situação de monopólio ou de oligopólio restrito num determinado mercado.

173   A jurisprudência invocada pela recorrente para fundamentar a sua argumentação não é, por outro lado, susceptível de infirmar a conclusão referida no número precedente. Com efeito, no seu acórdão Salomon/Comissão, já referido (n.° 79), o Tribunal limitou‑se a reconhecer que a Comissão, na decisão recorrida nesse processo, não tinha concluído pela compatibilidade do auxílio apenas com base no carácter oligopolista atribuído aos mercados em causa, uma vez que a estrutura dos mercados em causa apenas foi considerada pela Comissão com o objectivo de fortalecer a sua argumentação no sentido de que o montante do auxílio não era susceptível de gerar distorções de concorrência indevidas, contrárias ao interesse comum na acepção do artigo 87.°, n.° 3, alínea c), CE. Quanto ao acórdão Keller e Keller Meccanica/Comissão, já referido (n.° 88), o Tribunal limitou‑se a declarar no mesmo que o mercado relevante no qual os recorrentes operavam não apresentava uma estrutura oligopolista.

174   Além disso, no que se refere à insuficiência da fundamentação alegada pela recorrente quanto a este ponto, impõe‑se notar que a Comissão considerou na decisão recorrida que a dispensa de pagamento estabelecida no quadro do asset‑deal 1 não é abrangida pela derrogação prevista no artigo 87.°, n.° 3, alínea c), CE. Por outro lado, a recorrente não invocou durante o procedimento administrativo, em apoio do seu pedido subsidiário de concessão de uma derrogação para a medida controvertida ao abrigo do artigo 87.°, n.° 3, alínea c), CE, o argumento relativo às consequências do seu eventual desaparecimento do mercado sobre a estrutura deste.

175   Assim, atendendo às exigências de fundamentação referidas nos n.os 59 e 60 supra, deve considerar‑se que, nas circunstâncias do caso em apreço, a Comissão não estava obrigada a aprofundar o exame do risco de criação de uma situação de oligopólio no mercado em causa e que o argumento baseado na insuficiência da fundamentação da decisão recorrida neste ponto deve ser rejeitado.

176   Face ao exposto, o presente fundamento deve ser considerado improcedente.

 Quanto ao terceiro fundamento, baseado na violação do direito de defesa e do princípio da boa administração

 Argumentos das partes

177   A recorrente sustenta que, no procedimento formal de exame de um auxílio de Estado, os princípios gerais do procedimento conferem ao beneficiário do auxílio garantias que vão para além do direito a apresentar observações após o início do procedimento, como está previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE. O reconhecimento de direitos suplementares é compatível com a jurisprudência invocada pela Comissão, nos termos da qual o beneficiário constitui apenas um «interessado» na acepção da disposição já referida.

178   A situação do beneficiário do auxílio distingue‑se da dos terceiros interessados pelo facto de, não obstante o beneficiário não ser directamente parte no procedimento, a sua existência poder ser ameaçada pela decisão final que ordena a recuperação do auxílio. Esta circunstância justifica o reconhecimento de mais direitos.

179   Em particular, o direito a um processo equitativo (acórdão do Tribunal de 20 de Fevereiro de 2001, Mannesmannröhren‑Werke/Comissão, T‑112/98, Colect., p. II‑729, n.° 77) e o direito de defesa exigem que a Comissão permita ao beneficiário do auxílio dar a conhecer eficazmente a sua posição quanto aos elementos de facto e de direito apurados durante o procedimento formal de exame e nos quais esta instituição entende fundamentar a sua decisão. Esta garantia decorre da jurisprudência que consagra a protecção do direito de defesa de qualquer pessoa contra a qual possa ser adoptado um acto que afecte os seus interesses (acórdão do Tribunal de 10 de Maio de 2001, Kaufring e o./Comissão, T‑186/97, T‑187/97, T‑190/97 a T‑192/97, T‑210/97, T‑211/97, T‑216/97 a T‑218/97, T‑279/97, T‑280/97, T‑293/97 e T‑147/99, Colect., p. II‑1337, n.° 153). Este direito a ser ouvido e o princípio da boa administração implicam o direito de acesso ao processo (acórdão do Tribunal de 19 de Fevereiro de 1998, Eyckeler & Malt/Comissão, T‑42/96, Colect., p. II‑401, n.os 75 e segs.). Por último, a circunscrição dos direitos do beneficiário do auxílio ao direito de apresentar observações ao abrigo do artigo 88.°, n.° 2, CE também é contrária às regras relativas à audição das empresas interessadas, consagradas nos processos de aplicação dos artigos 81.° CE e 82.° CE e de controlo das operações de concentração.

180   Por outro lado, o respeito do princípio da boa administração exige um exame diligente e imparcial (acórdão Comissão/Sytraval e Brink’s France, já referido, n.° 62, e acórdão do Tribunal de 30 de Janeiro de 2002, max.mobil/Comissão, T‑54/99, Colect., p. II‑313, n.° 48). Incumbe, portanto, à Comissão investigar, por sua própria iniciativa, todos os pontos de vista necessários, solicitando, nomeadamente, informações aos beneficiários, a fim de decidir com pleno conhecimento dos elementos de facto pertinentes na data da adopção da sua decisão (acórdão ESF Elbe‑Stahlwerke Feralpi/Comissão, já referido, n.os 93, 126, 128 e 130).

181   Tendo em conta o poder de apreciação reivindicado pela Comissão no âmbito do controlo dos auxílios de Estado, nomeadamente no momento da aplicação do artigo 87.°, n.° 3, CE, o respeito do direito do beneficiário do auxílio a ser ouvido deve, por maioria de razão, ser garantido (acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de Novembro de 1991, Technische Universität München, C‑269/90, Colect., p. I‑5469, n.os 13 e segs., e acórdãos do Tribunal de 2 de Julho de 1992, Dansk Pelsdyravlerforening/Comissão, T‑61/89, Colect., p. II‑1931, n.° 129, e Kaufring e o./Comissão, já referido, n.° 152). Caso este direito se cingisse, no procedimento administrativo, ao direito a apresentar observações ao abrigo do artigo 88.°, n.° 2, CE, o beneficiário do auxílio, apesar de plenamente habilitado a tomar posição perante o Tribunal, apenas beneficiaria de uma protecção jurídica parcial.

182   A recorrente afirma que, no presente caso, a Comissão menosprezou os direitos processuais da recorrente sob três aspectos. Em primeiro lugar, não acolheu o pedido de acesso à parte não confidencial do processo da Comissão para tomar posição sobre o mesmo, formulado pela recorrente nas suas observações de 28 de Agosto de 2000, ao abrigo do artigo 88.°, n.° 2, CE.

183   Em segundo lugar, segundo a recorrente, a Comissão não aceitou a proposta do Governo alemão, constante da sua comunicação de 27 de Fevereiro de 2001, que consistia em transmitir‑lhe o plano mais recente de reestruturação da recorrente tendo em vista o exame da medida em causa nos termos do artigo 87.°, n.° 3, alínea c), CE, no caso de a Comissão entender que, contrariamente à tese deste governo, esta medida constituía um auxílio de Estado na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE. Em particular, a Comissão não respeitou o seu compromisso perante o Governo alemão de o informar previamente à adopção da sua decisão, o que teria permitido a este último apresentar‑lhe de imediato o novo plano de reestruturação.

184   Além disso, a exigência do respeito do direito de defesa da recorrente era tanto mais importante quanto a Comissão pretendia afastar‑se da tese do Estado‑Membro em causa, relativa à inexistência de um auxílio de Estado (acórdão Kaufring e o./Comissão, já referido, n.° 152 in fine). Em especial, contrariamente à tese da interveniente, a posição deste Estado‑Membro não prevalecia sobre a do beneficiário do auxílio, e não era, por conseguinte, supérfluo ouvir este último.

185   Nestas condições, a recorrente acusa a Comissão, por um lado, de não ter examinado seriamente o seu argumento relativo ao seu direito à modificação do asset‑deal 1. Por outro lado, afirma que a Comissão tinha a obrigação de informar a recorrente de que punha a hipótese de qualificar a dispensa de pagamento como um auxílio de Estado. A sua obrigação de proceder a um controlo minucioso e imparcial exigia‑lhe, além disso, que pedisse directamente à recorrente que lhe comunicasse o novo plano de reestruturação ou, na sua falta, as suas grandes linhas e a data em que este estaria disponível.

186   Com efeito, na sua comunicação de 27 de Fevereiro de 2001, já referida, a República Federal da Alemanha indicou, no essencial, que a avaliação Arnold de 24 de Novembro de 2000, que foi transmitida à Comissão, constituía a base para a adaptação do plano de reestruturação. Esta adaptação tornara‑se necessária em virtude da inexistência de um investidor privado e da insuficiência de meios de liquidez associada à recessão que afectou o período de 1998/1999. Ora, segundo o relatório Arnold, a recorrente viria a atingir o limiar de rentabilidade em 2002. Estando assim informada sobre o saneamento da situação financeira da recorrente no início do ano de 2001 em relação à sua situação em 1998, a Comissão não podia, segundo a recorrente, basear‑se no plano de reestruturação de 1998, como fez na decisão recorrida (considerandos 34 e 108).

187   Em terceiro lugar, a recorrente alega que a Comissão não comunicou nem ao Governo alemão nem à recorrente, antes da conclusão do procedimento administrativo, as questões que tinha colocado ao grupo Schott Glas na sequência das observações deste último de 28 de Setembro de 2000 e as observações suplementares deste de 23 de Janeiro de 2001, a fim de lhes dar a possibilidade de fazerem valer a sua posição. Ao informar‑se desta forma unilateral junto do principal concorrente da recorrente – quanto aos pontos que considerava importantes, como é demonstrado pelo próprio facto de a Comissão ter colocado estas questões (v. as conclusões apresentadas pelo juiz Vesterdorf, exercendo funções de advogado‑geral, no acórdão do Tribunal de 24 de Outubro de 1991, Rhône‑Poulenc/Comissão, T‑1/89, Colect., pp. II‑867, II‑869) – a Comissão não respeitou o seu dever de imparcialidade face a todos os interessados, bem como o princípio da não discriminação entre estes últimos, o princípio da boa administração e o direito da recorrente a um processo equitativo. Além disso, a Comissão restringiu consideravelmente o efeito útil do direito da recorrente a ser ouvida (despacho de 4 de Abril de 2002, Technische Glaswerke Ilmenau/Comissão, já referido, n.° 85).

188   Acresce que, ao proceder deste modo, a Comissão violou o direito de defesa do Governo alemão. Contrariamente às alegações da interveniente, a recorrente podia, de facto, invocar esta violação a título de prova da violação dos seus próprios direitos. De facto, o Estado‑Membro interessado surge como o «representante legal» do beneficiário do auxílio, na medida em que a Comissão considerou este último uma mera fonte de informação. Ora, o beneficiário não pode coagir o Estado‑Membro a interpor recurso.

189   No entender da recorrente, estas irregularidades justificam a anulação da decisão recorrida, porque, caso não se verificassem, o procedimento formal de exame podia ter conduzido a um resultado diferente (acórdão do Tribunal de Justiça de 5 de Outubro de 2000, Alemanha/Comissão, C‑288/96, Colect., p. I‑8237, n.° 101). Em particular, a apresentação de observações pelo Governo alemão e pela recorrente em relação às observações suplementares da Schott Glas podia ter influenciado o sentido da decisão recorrida. Com efeito, na referida decisão (considerandos 35 e 36), a Comissão procede à análise do mercado, nomeadamente com base nas observações suplementares acima referidas, contestando a ideia – avançada pelo Governo alemão na sua comunicação de 20 de Novembro de 2000 – de que o desaparecimento da recorrente conduziria a uma situação de oligopólio. Além disso, a Comissão baseia‑se nestas observações suplementares relativas, nomeadamente, à existência de um excesso de activos e a uma política de preços alegadamente agressiva da recorrente para concluir que a medida em causa não cumpre o critério da proporcionalidade (considerandos 102 e 103 da decisão recorrida).

190   A Comissão e a interveniente contestam a argumentação da recorrente.

 Apreciação do Tribunal

191   Deve recordar‑se que, segundo jurisprudência assente, o procedimento de controlo dos auxílios de Estado é, dada a sua economia geral, um procedimento instaurado relativamente ao Estado‑Membro responsável pela concessão do auxílio, no que diz respeito às suas obrigações comunitárias (v. acórdãos de 10 de Julho de 1986, Bélgica/Comissão, já referido, n.° 29, e Falck e Acciairie di Bolzano/Comissão, já referido, n.° 81).

192   Neste procedimento, os interessados para além do Estado‑Membro responsável pela concessão do auxílio não podem, eles próprios, exigir a participação num debate contraditório com a Comissão, como o que é aberto a favor do referido Estado (acórdãos Comissão/Sytraval e Brink’s France, já referido, n.° 59, e Falck e Acciairie di Bolzano/Comissão, já referido, n.° 82). Os interessados têm, pois, essencialmente um papel de fontes de informação para a Comissão (acórdãos do Tribunal Skibsværftsforeningen e o./Comissão, já referido, n.° 256, e de 25 de Junho de 1998, British Airways e o./Comissão, T‑371/94 e T‑394/94, Colect., p. II‑2405, n.° 59).

193   A este respeito, nenhuma disposição do procedimento de controlo dos auxílios de Estado reserva um papel especial, entre os interessados, ao beneficiário do auxílio. Cabe ainda salientar que o procedimento de controlo dos auxílios de Estado não é um procedimento instaurado «contra» o beneficiário dos auxílios que implicaria que este último pudesse invocar direitos tão vastos como os direitos de defesa enquanto tais (acórdão Falck e Acciaierie di Bolzano/Comissão, já referido, n.° 83).

194    Neste contexto, cumpre observar que os princípios gerais de direito, como o do direito a um processo equitativo, o direito a ser ouvido, o da boa administração ou o da não discriminação, que foram invocados pela recorrente, não permitem ao juiz comunitário alargar os direitos processuais conferidos aos interessados pelo Tratado e pelo direito derivado no quadro dos procedimentos de fiscalização dos auxílios de Estado. Do mesmo modo, não é pertinente fazer referência à jurisprudência relativa, nomeadamente, à aplicação dos artigos 81.° CE e 82.° CE e ao controlo das concentrações, que dizem respeito aos procedimentos instaurados contra empresas, em que estas beneficiam, nessa qualidade, de direitos processuais específicos, e não contra um Estado‑Membro.

195   À luz das considerações precedentes, há que julgar improcedente a alegação da recorrente de que a situação do beneficiário do auxílio é diferente da dos terceiros interessados.

196   No caso em apreço, é facto assente que a recorrente foi convidada a apresentar observações nos termos do artigo 88.°, n.° 2, CE e do artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 659/1999, e que fez uso desta possibilidade ao apresentar, em 28 de Agosto de 2000, as suas observações à Comissão. Por outro lado, como resulta do oitavo considerando do Regulamento n.° 659/1999, o respeito do procedimento formal de exame previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE constitui o melhor meio de garantir os direitos dos interessados.

197   Assim, os interessados que não o Estado‑Membro em questão não podem invocar o direito a um procedimento contraditório com a Comissão, pelo que não se deve considerar que a recorrente devia poder aceder à parte não confidencial dos autos do procedimento administrativo ou que a Comissão devia necessariamente transmitir‑lhe as observações ou respostas às questões da Comissão que foram apresentadas pela Schott Glas.

198   De resto, foi decidido, a este respeito, que não resulta de nenhuma disposição relativa aos auxílios de Estado nem da jurisprudência que a Comissão é obrigada a ouvir o beneficiário de recursos de Estado quanto à apreciação jurídica que faz sobre a medida em causa ou que é obrigada a informar o Estado‑Membro em questão – e, a fortiori, o beneficiário do auxílio – da sua posição antes de adoptar a sua decisão quando os interessados e o Estado‑Membro foram notificados para apresentarem as suas observações (v., neste sentido, acórdão Neue Maxhütte Stahlwerke e Lech‑Stahlwerke/Comissão, já referido, n.os 230 e 231).

199   Quanto ao argumento invocado pela recorrente durante o procedimento administrativo quanto ao seu direito à modificação do asset‑deal 1, em consequência da existência de uma promessa de auxílio ao investimento que não foi cumprida pelo Land da Turíngia, basta recordar que foi rejeitado pela Comissão e que os fundamentos que invocou neste ponto são suficientes (v. n.os 67 e 77 supra). Por conseguinte, a recorrente não tem fundamento para alegar que a Comissão não examinou com diligência a sua argumentação sobre esta questão.

200   Por último, no que diz respeito à violação do direito de defesa da República Federal da Alemanha, a recorrente acusa a Comissão de não ter «aceite a proposta» do referido Estado de lhe transmitir o plano de reestruturação de 19 de Abril de 2001. Acusa igualmente a Comissão de não ter transmitido à República Federal da Alemanha as respostas da Schott Glas, de 23 de Janeiro de 2001, às questões que aquela lhe tinha colocado na sequência da apresentação das suas observações, de 28 de Setembro de 2000, quanto ao início do procedimento formal.

201   Deve lembrar‑se que, segundo jurisprudência constante, o princípio do respeito dos direitos de defesa exige que seja dada ao Estado‑Membro em causa a possibilidade de exprimir utilmente o seu ponto de vista sobre as observações apresentadas por terceiros interessados, em conformidade com o artigo 88.°, n.° 2, CE e nas quais a Comissão pretende fundamentar a sua decisão, e que, na medida em que ao Estado‑Membro não tenha sido facultado comentar tais observações, a Comissão não as pode ter em conta na sua decisão contra esse Estado. Contudo, para que essa violação dos direitos de defesa dê lugar à anulação, é necessário que, não se verificando tal irregularidade, o processo pudesse ter levado a um resultado diferente (acórdãos do Tribunal de Justiça de 11 de Novembro de 1987, França/Comissão, 259/85, Colect., p. 4393, n.os 12 e 13; de 14 de Fevereiro de 1990, Bélgica/Comissão, C‑301/87, Colect., p. I‑307, n.os 29 a 31; de 21 de Março de 1990, Bélgica/Comissão, já referido, n.os 46 a 48, e de 5 de Outubro de 2000, Alemanha/Comissão, já referido, n.os 100 e 101).

202   No caso em apreço, em conformidade com as exigências do artigo 88.°, n.° 2, CE e do artigo 6.°, n.° 2, do Regulamento n.° 659/1999, a República Federal da Alemanha teve a possibilidade de apresentar as suas observações sobre a decisão de dar início ao procedimento e as observações formuladas neste contexto pelos interessados, a saber, a recorrente e a Schott Glas, foram‑lhe notificadas. Pelo contrário, é facto assente que a Comissão não transmitiu à República Federal da Alemanha as respostas da Schott Glas, de 23 de Janeiro de 2001, às questões que aquela lhe tinha colocado após as suas observações iniciais quanto ao início do procedimento.

203   Todavia, esta violação do direito de defesa não assume uma importância tal que a sua inobservância conduza, em si mesma, à anulação do acto recorrido. Esta violação constitui, por conseguinte, um vício de forma que exige que o Estado‑Membro em causa invoque o seu efeito negativo específico sobre os seus direitos subjectivos e que sejam apreciadas as consequências da irregularidade do procedimento sobre o conteúdo do acto controvertido. Isto não se verificou, porém, no caso em apreço.

204   Nestas circunstâncias, o argumento da recorrente baseado na violação do direito de defesa da República Federal da Alemanha não tem fundamento.

205   Em qualquer caso, no que se refere à apresentação do referido plano de reestruturação, já se concluiu anteriormente que as autoridades alemãs não propuseram formalmente à Comissão transmitir‑lhe o plano de reestruturação de 19 de Abril de 2001 e que, por outro lado, tinham considerado que a Comissão podia decidir com base nos elementos de informação de que já dispunha (v. n.° 160 supra). Por conseguinte, a Comissão não cometeu um erro de apreciação manifesto ao não ordenar nem à República Federal da Alemanha nem, a fortiori, à recorrente a apresentação do referido plano.

206   No que se refere ao facto de a Comissão, como é por ela admitido, não ter transmitido às autoridades alemãs as respostas da Schott Glas de 23 de Janeiro de 2001 às suas questões, o Tribunal sublinha que, em qualquer caso, esta circunstância não é, por si só, susceptível de conduzir à anulação da decisão recorrida.

207   Por um lado, importa efectivamente salientar que a Comissão não considerou na decisão recorrida, contrariamente às alegações da Schott Glas nas referidas respostas, a existência de um excedente de capacidade estrutural nalguns segmentos do mercado nos quais a recorrente opera (considerando 101).

208   Por outro lado, no que se refere às alegações da Schott Glas quanto à política de preços alegadamente agressiva praticada pela recorrente, a Comissão, ao examinar a condição relativa à proporcionalidade do auxílio em causa na decisão recorrida, afirma o seguinte (considerando 103):

«Nas suas observações relativas ao início do procedimento, um concorrente da [recorrente] alegou que esta vende os seus produtos sistematicamente abaixo do preço de mercado e mesmo abaixo dos custos de produção. Por outro lado, a [recorrente] teria beneficiado permanentemente de compensações por perdas. Dado que não foi apresentado um plano de reestruturação viável, a Comissão não pode excluir que a empresa tenha utilizado os fundos para actividades susceptíveis de provocar distorções no mercado e não associadas ao processo de reestruturação.»

209   Ora, mesmo supondo que, contrariamente ao que resulta deste considerando, a Comissão tenha fundado o seu raciocínio não apenas nas observações da Schott Glas, mas também nas suas respostas às questões da Comissão de 23 de Janeiro de 2001, para considerar que a condição relativa à proporcionalidade do auxílio não se encontrava preenchida, esta circunstância não é susceptível de conduzir à anulação da decisão recorrida. Com efeito, como foi acima observado, a Comissão considerou legitimamente que a restauração da viabilidade da recorrente não podia esperar‑se se não existisse um plano de reestruturação adequado. Esta conclusão podia, só por si, justificar a apreciação da incompatibilidade do auxílio em causa.

210   Face ao exposto, mesmo que a República Federal da Alemanha dispusesse das respostas da Schott Glas de 23 de Fevereiro de 2001, a decisão não poderia ter tido um conteúdo diferente.

211   Tendo em conta quanto precede, o presente fundamento deve ser julgado infundado.

 Quanto ao quarto fundamento, baseado na insuficiência da fundamentação

 Argumentos das partes

212   Além da fundamentação insuficiente que invoca em relação a outros fundamentos, a recorrente acusa a Comissão de não ter fundamentado suficientemente a decisão recorrida no que se refere, por um lado, à afectação das trocas comerciais entre os Estados‑Membros na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE, e, por outro, à alteração das condições das trocas comerciais de modo que contrarie o interesse comum, na acepção do artigo 87.°, n.° 3, alínea c), CE. A Comissão limitou‑se a reconhecer a existência de concorrentes e de trocas comerciais no mercado do produto relevante (considerando 51). No entanto, incumbia‑lhe definir este mercado pelo menos nas suas grandes linhas, designar os principais concorrentes da recorrente noutros Estados‑Membros e caracterizar os principais fluxos de trocas comerciais na Comunidade, bem como precisar as consequências do desaparecimento da recorrente do mercado, visto que o grupo Schott Glas era o seu único concorrente em determinados sectores (acórdão British Airways e o./Comissão, já referido, n.° 273).

213   Por outro lado, alega que a fundamentação da decisão recorrida não tem em consideração o contexto da medida em causa (acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Maio de 1997, TWD/Comissão, C‑355/95 P, Colect., p. I‑2549, n.° 26). Com efeito, ao aplicar o critério do investidor privado, a Comissão devia examinar as medidas em causa no contexto dos auxílios anteriores, sujeitos a um procedimento de fiscalização distinto (considerandos 37, 42, 63, 65, 85 e 110).

214   A Comissão e a interveniente contestam os argumentos invocados pela recorrente no quadro do presente fundamento.

 Apreciação do Tribunal

215   Importa recordar que, embora seja pacífico que a Comissão é obrigada a referir, na fundamentação da sua decisão, pelo menos as circunstâncias em que um auxílio foi concedido, quando estas permitem demonstrar que o auxílio é susceptível de afectar as trocas comerciais entre os Estados‑Membros, não é obrigada a fazer a demonstração do efeito real de auxílios já concedidos. Com efeito, se tal fosse o caso, esta exigência levaria a favorecer os Estados‑Membros que pagam auxílios ilegais em detrimento daqueles que notificam os auxílios na fase de projecto (v., neste sentido, acórdão de 19 de Setembro de 2002, Espanha/Comissão, C‑113/00, já referido, n.° 54, e a jurisprudência referida).

216   Não resulta desta jurisprudência que a Comissão tenha incumprido, no caso concreto, a obrigação que lhe incumbe de fundamentar de modo suficiente a decisão recorrida.

217   Com efeito, nos considerandos 35 e 36 da decisão recorrida, a Comissão definiu o mercado do produto relevante, a saber, o vidro especial, e concluiu que a recorrente era uma das dez empresas da Comunidade que operam neste mercado. Acresce que o considerando 51 da decisão recorrida contém uma exposição adequada e suficiente dos factos e das considerações jurídicas tidos em conta na apreciação da condição relativa à afectação das trocas comerciais entre Estados‑Membros, a saber, que no mercado do produto relevante operavam empresas concorrentes da recorrente estabelecidas na Comunidade, que eram efectuadas trocas comerciais neste mercado e que estes concorrentes não beneficiaram de uma vantagem financeira como aquela de que a recorrente beneficiou.

218   Face ao exposto, este fundamento deve igualmente ser julgado improcedente.

 Quanto ao quinto fundamento, baseado na violação do artigo 20.°, n.° 1, segundo período, do Regulamento n.° 659/1999

219   A recorrente sustenta que a Comissão desrespeitou uma regra essencial de procedimento, pelo facto de não lhe ter transmitido oficiosamente uma cópia da decisão recorrida, em conformidade com o artigo 20.°, n.° 1, segundo período, do Regulamento n.° 659/1999. O objectivo desta disposição consiste em conceder ao beneficiário do auxílio, para o qual as implicações são claramente mais importantes do que para os restantes interessados, a certeza absoluta de que possui o texto adoptado pelo colégio dos comissários. O princípio da segurança jurídica impõe à Comissão o cumprimento desta obrigação num prazo de dois meses a contar da data da decisão.

220   Quanto a este aspecto, o Tribunal considera que a Comissão alega legitimamente que o artigo 20.°, n.° 1, segundo período, do referido regulamento apenas gera, na sua perspectiva, uma obrigação de transmissão da decisão que põe termo ao procedimento de fiscalização após a sua adopção e à sua notificação ao Estado‑Membro em questão. Ora, uma vez que a legalidade de um acto deve ser apreciada em função dos elementos de facto e de direito existentes na data da sua adopção, a violação da decisão acima referida não permite concluir no sentido da ilegalidade da decisão recorrida e, portanto, da sua anulação.

221   Pelos motivos expostos, julga‑se improcedente o quinto fundamento e nega‑se provimento ao presente recurso na sua totalidade.

 Quanto às despesas

222   Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas suas próprias despesas e nas da Comissão, incluindo as relativas ao processo de medidas provisórias, conforme foi requerido por esta última.

223   A recorrente suportará também as despesas da interveniente, como foi requerido por esta.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção Alargada)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A recorrente suportará as suas próprias despesas bem como as da Comissão e da interveniente no processo principal e no processo de medidas provisórias.

García‑Valdecasas

Lindh

Cooke

Legal

 

      Martins Ribeiro

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 8 de Julho de 2004.

O secretário

 

      O presidente

H. Jung

 

      R. García‑Valdecasas


* Língua do processo: alemão.