Language of document : ECLI:EU:C:2011:175

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

24 de Março de 2011 (*)

«Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância – Auxílios de Estado – Decisão da Comissão – Verificação de incompatibilidade de um auxílio com um mercado comum – Ordem de recuperação do auxílio – Princípios da segurança jurídica e da não retroactividade – Princípio da protecção da confiança legítima – Determinação do carácter ‘adequado’ da taxa de juro aplicável à recuperação dos auxílios»

No processo C‑369/09 P,

que tem por objecto um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância, interposto ao abrigo do artigo 56.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, entrado em 14 de Setembro de 2009,

ISD Polska sp. z o.o., com sede em Varsóvia (Polónia),

Industrial Union of Donbass Corp., com sede em Donetsk (Ucrânia),

e

ISD Polska sp. z o.o. anteriormente Majątek Hutniczy sp. z o.o., com sede em Varsóvia,

representadas por C. Rapin e E. Van den Haute, advogados,

recorrentes,

sendo a outra parte no processo:

Comissão Europeia, representada por E. Gippini Fournier e A. Stobiecka‑Kuik, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: A. Tizzano, presidente de secção, J.‑J. Kasel, E. Levits, M. Safjan e M. Berger (relator), juízes,

advogado‑geral: Y. Bot,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1        Pelo seu recurso, ISD Polska sp. z o.o., a Industrial Union of Donbass Corp. e a ISD Polska sp. z o.o., anteriormente Majątek Hutniczy sp. z o.o., requerem ao Tribunal de Justiça a anulação do acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias de 1 de Julho de 2009, ISD Polska e o./Comissão, (T‑273/06 e T‑297/06, Colect., p. I‑2185, a seguir «acórdão recorrido»), que negou provimento ao recurso de anulação interposto pelas recorrentes da Decisão 2006/937/CE da Comissão, de 5 de Julho de 2005, relativa ao auxílio estatal C 20/04 (ex NN 25/04) em favor da Huta Częstochowa SA (JO 2006, L 366, p. 1, a seguir «decisão controvertida»).

 Quadro jurídico

2        O Acordo europeu, assinado em Bruxelas em 16 de Dezembro de 1991, que cria uma associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados‑Membros, por um lado, e a República da Polónia, por outro (JO 1993, L 348, p. 2; a seguir «acordo europeu»),entrou em vigor em 1 de Fevereiro de 1994. Determina um sistema de concorrência baseado nos critérios do Tratado CE.

3        O Protocolo n.° 2 relativo aos produtos CECA do acordo europeu (a seguir «protocolo n.° 2») prevê a proibição de princípio dos auxílios públicos.

4        O artigo 8.° do protocolo n.° 2 refere:

«1.      São incompatíveis com o correcto funcionamento do acordo, na medida em que afectem as trocas comerciais entre a Comunidade e a Polónia:

[…]

iii)      Auxílios públicos, independentemente da forma que assumam, excepto no caso das derrogações previstas no Tratado CECA.

[…]

4.      As partes reconhecem que, durante os primeiros cinco anos após a entrada em vigor do acordo e em derrogação do n.° 1, alínea iii), a [República da] Polónia pode, excepcionalmente, no que se refere aos produtos siderúrgicos CECA, conceder auxílios públicos para efeitos de reestruturação, desde que:

–        o programa de reestruturação esteja associado a uma racionalização global e uma redução das capacidades da Polónia,

–        permitam a viabilidade das empresas beneficiárias em condições normais de mercado no termo do período de reestruturação,

–        o montante e intensidade desses auxílios se limitem ao estritamente necessário para restabelecer a viabilidade e esses auxílios sejam progressivamente reduzidos.

O conselho de associação decidirá, em função da situação económica da [República da] Polónia, se o período de cinco anos poderá ser prorrogado.

[…]»

5        A Decisão n.° 3/2002 do Conselho de Associação UE‑Polónia, de 23 de Outubro de 2002, que prorroga o prazo fixado no n.° 4 do artigo 8.° do Protocolo n.° 2 (JO 2003, L 186, p. 38, a seguir «decisão do Conselho de Associação»), prorrogou por um período adicional de oito anos, a contar de 1 de Janeiro de 1997 ou até à data da adesão da República da Polónia à União Europeia, o prazo durante o qual a Polónia podia, a título excepcional, no que se refere aos produtos siderúrgicos, conceder auxílios públicos para efeitos de reestruturação nas condições enumeradas no n.° 4 do artigo 8.° do Protocolo n.° 2.

6        O artigo 2.° da decisão do Conselho de Associação prevê:

«A [República da] Polónia apresentará à Comissão […] um programa de reestruturação e planos empresariais que satisfaçam os requisitos constantes do n.° 4 do artigo 8.° do Protocolo n.° 2 e que tenham sido avaliados e aprovados pela autoridade nacional de controlo dos auxílios estatais (Departamento da Concorrência e da Protecção do Consumidor).»

7        O Protocolo n.° 8 relativo à reestruturação da Indústria Siderúrgica Polaca anexo ao Acto relativo às condições de adesão da República Checa, da República da Estónia, da República de Chipre, da República da Letónia, da República da Lituânia, da República da Hungria, da República de Malta, da República da Polónia, da República da Eslovénia e da República Eslovaca e às adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia (JO 2003, L 236, p. 948; a seguir «protocolo n.° 8») autorizou a República da Polónia, por derrogação às regras gerais relativas aos auxílios de Estado, a conceder auxílios à reestruturação do seu sector siderúrgico com base nos termos do plano de reestruturação e nas condições estabelecidas no referido protocolo. O mesmo prevê designadamente:

«1.      Sem prejuízo dos artigos 87.° [CE] e 88.° [CE], os auxílios estatais concedidos pela [República da] Polónia para efeitos de reestruturação a determinadas áreas da indústria siderúrgica polaca são considerados compatíveis com o mercado comum desde que:

–        o período previsto no n.° 4 do artigo 8.° do Protocolo n.° 2 […], tenha sido prorrogado até à data da adesão,

–        os termos do plano de reestruturação em cuja base foi prorrogado o Protocolo referido supra, sejam respeitados durante o período de 2002 a 2006,

–        sejam respeitadas as condições estabelecidas no presente Protocolo,

–        não seja pago à indústria siderúrgica polaca qualquer auxílio estatal à reestruturação depois da data da adesão.

[…]

3.      Apenas as empresas enumeradas no Anexo I (a seguir designadas por ‘empresas beneficiárias’) são elegíveis para a concessão de auxílios estatais no âmbito do programa de reestruturação da siderurgia polaca.

4.      Uma empresa beneficiária não pode:

a)      Em caso de fusão com uma empresa não incluída no Anexo I, transmitir o benefício do auxílio que lhe foi concedido;

b)      Retomar os activos de empresas não incluídas no Anexo I que declarem falência no período até 31 de Dezembro de 2006.

[…]

6.      Os auxílios de reestruturação concedidos às empresas beneficiárias devem ser determinados pelas justificações constantes do plano aprovado de reestruturação do sector siderúrgico polaco e de planos empresariais individuais aprovados pelo Conselho. De qualquer modo, o montante total do auxílio pago no período de 1997‑2003 não pode exceder 3 387 070 000 PLN.

[…]

A [República da] Polónia não pode conceder quaisquer outros auxílios estatais à sua indústria siderúrgica para efeitos de reestruturação.

[…]

10.      Quaisquer alterações subsequentes dos planos globais de reestruturação e dos planos individuais devem ser aprovadas pela Comissão e, se necessário, pelo Conselho

[…]

18.      Se o acompanhamento demonstrar que:

[…]

c)      Durante o período de reestruturação, a [República da] Polónia concedeu à indústria siderúrgica e especialmente às empresas beneficiárias auxílios estatais adicionais incompatíveis,

as medidas transitórias constantes do presente Protocolo ficarão sem efeito.

A Comissão tomará as medidas necessárias para exigir que as empresas em questão reembolsem quaisquer auxílios concedidos em desrespeito das condições estabelecidas no presente Protocolo.»

8        A Decisão 2003/588/CE do Conselho, de 21 de Julho de 2003, relativa ao cumprimento das condições previstas no artigo 3.° da Decisão n.° 3/2002 (JO L 199, p. 17; a seguir «Decisão do Conselho 2003/588») prevê no seu artigo único:

«O programa de reestruturação e os planos empresariais apresentados à Comissão pela [República da] Polónia, em 4 de Abril de 2003, nos termos do artigo 2.° da Decisão n.° 3/2002 […] cumprem os requisitos do n.° 4 do artigo 8.° do […] referido protocolo [n.°] 2.»

9        O Regulamento (CE) n.° 659/1999 do Conselho, de 22 de Março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo [88.° ]CE (JO L 83, p. 1) enuncia no seu artigo 6.°, n.° 1:

«A decisão de dar início a um procedimento formal de investigação resumirá os elementos pertinentes em matéria de facto e de direito, incluirá uma apreciação preliminar da Comissão quanto à natureza de auxílio da medida proposta e indicará os elementos que suscitam dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado comum. A decisão incluirá um convite ao Estado‑Membro em causa e a outras partes interessadas para apresentarem as suas observações num prazo fixado, normalmente não superior a um mês. A Comissão pode prorrogar esse prazo em casos devidamente justificados.»

10      O artigo 7.°, n.° 5, deste regulamento prevê:

«Quando a Comissão considerar que o auxílio notificado é incompatível com o mercado comum, decidirá que o mesmo não pode ser executado (adiante designada ‘decisão negativa’).»

11      O artigo 14.° do Regulamento n.° 659/1999 estabelece:

«1.      Nas decisões negativas relativas a auxílios ilegais, a Comissão decidirá que o Estado‑Membro em causa deve tomar todas as medidas necessárias para recuperar o auxílio do beneficiário, (adiante designada ‘decisão de recuperação’). A Comissão não deve exigir a recuperação do auxílio se tal for contrário a um princípio geral de direito comunitário.

2.      O auxílio a recuperar mediante uma decisão de recuperação incluirá juros a uma taxa adequada fixada pela Comissão. Os juros são devidos a partir da data em que o auxílio ilegal foi colocado à disposição do beneficiário e até ao momento da sua recuperação.

[…]»

12      Segundo o artigo 20.°, n.° 1, deste regulamento:

«Qualquer parte interessada pode apresentar observações nos termos do artigo 6.° na sequência da decisão da Comissão de iniciar o procedimento formal de investigação. Todas as partes interessadas que tenham apresentado observações e todos os beneficiários de um auxílio individual receberão cópia da decisão da Comissão nos termos do artigo 7.°»

13      O Regulamento (CE) n.° 794/2004 da Comissão, de 21 de Abril de 2004, relativo à aplicação do Regulamento (CE) n.° 659/1999 (JO L 140, p. 1), dispõe no seu artigo 9.°:

«1.      Salvo decisão específica em contrário, a taxa de juro aplicável na recuperação dos auxílios estatais concedidos com violação do n.° 3 do artigo 88.° [CE] é uma taxa em percentagem anual fixada para cada ano civil.

Será calculada com base na média das taxas ‘swap’ interbancárias a 5 anos dos meses de Setembro, Outubro e Novembro do ano anterior, majorada de 75 pontos de base. Em casos devidamente fundamentados, a Comissão pode aumentar a taxa em mais de 75 pontos de base relativamente a um ou mais Estados‑Membros.

[…]

4.      Na falta de dados fiáveis ou equivalentes ou em circunstâncias excepcionais, a Comissão pode fixar, em estreita colaboração com os Estados‑Membros em causa, uma taxa de juro na recuperação de auxílios estatais, para um ou mais Estados‑Membros, com base em método diferente e nas informações disponíveis.»

14      No que diz respeito às regras de aplicação das taxas de juro, o artigo 11.°, n.° 2, do referido regulamento precisa:

«A taxa de juro será aplicada numa base composta até à data da recuperação do auxílio. Os juros resultantes do ano anterior produzirão juros em cada ano subsequente.»

 Antecedentes do litígio

15      Entre 2002 e 2005, teve lugar uma operação de reestruturação do produtor de aço polaco Huta Częstochowa S.A. (a seguir «HCz»). Para este efeito, os activos da HCz foram transferidos para novas sociedades.

16      Assim, em 2002, a Huta Stali Częstochowa sp. z o.o. (a seguir «HSCz»), cuja sociedade‑mãe era a Towarzystwo Finansowe SILESIA sp. z o.o. (a seguir «TFS»), sociedade detida em 100% pelo Tesouro polaco, foi constituída para prosseguir a produção siderúrgica da HCz. A HSCz tomou de arrendamento ao administrador judicial as instalações de produção da HCz e assumiu a seu cargo a maior parte dos trabalhadores.

17      Em 2004, foram constituídas as sociedades Majątek Hutniczy sp. z o.o. (a seguir «MH») e Majątek Hutniczy Plus sp. z o.o. (a seguir «MH Plus»). As suas participações sociais eram detidas em 100% pela HCz. A MH recebeu os activos siderúrgicos da HCz e a MH Plus recebeu determinados outros activos necessários à produção;

18      Por outro lado, os activos não ligados à produção (designados «activos não siderúrgicos») e o estabelecimento eletroenergético Elsen foram transferidos para a sociedade Operator ARP sp. z o.o., uma sociedade na dependência na Agencja Rozwoju Przemysłu S.A., a agência para o desenvolvimento industrial detida pelo Tesouro polaco, a fim de reembolsar os créditos de direito público sujeitos à reestruturação (impostos e contribuições para a segurança social).

19      Por carta de 19 de Maio de 2004, a Comissão informou a República da Polónia da sua decisão de dar início a um processo formal de investigação relativamente ao auxílio à reestruturação concedido à HCz., publicada no Jornal Oficial da União Europeia em 12 de Agosto de 2004 (JO C 204, p. 6), e convidou todas as partes interessadas a apresentarem as suas observações relativamente aos factos e à análise jurídica ali exposta. Recebeu observações da República da Polónia e de quatro partes interessadas.

20      Num documento intitulado «Declaração relativa aos auxílios de Estado potencialmente concedidos à [HCz] e/ou [à HSCz]», de 3 de Fevereiro de 2005, a ISD Polska sp. z o.o. agindo então sob a denominação social ZPD Steel sp. z o.o.; (a seguir «ISD»), filial a 100% da Industrial Union of Donbass Corp. (a seguir «IUD»), emitiu, no âmbito das negociações que antecederam a sua aquisição da HSCz, da MH, da MH Plus e de dez outras filiais da HCz, a declaração seguinte:

«No caso de a Comissão adoptar uma decisão que imponha à [HCz], [à HSCz] ou à pessoa que retomou os activos da [HCz] o reembolso de um auxílio público ilegal que se insere no âmbito do auxílio relativo ao Plano de reestruturação e de um montante total que não exceda 20 milhões de [PLN], declaramos que essa decisão não teria de modo nenhum por efeito exonerar‑nos das obrigações resultantes da Oferta, e comprometemo‑nos a não apresentar nem a fazer valer nenhum tipo de pedido de indemnização dirigido contra a) a administração fiscal da República da Polónia, b) a [Agencja Rozwoju Przemysłu S.A.], c) a [TFS], d) a [HCz] […] e ligada à necessidade de reembolsar o auxílio ou a qualquer procedimento na matéria perante a Comissão na sequência da concessão de auxílios públicos à [HCz]. Comprometemo‑nos, num tal caso, a velar para que a [MH], a [MH Plus] e a [HSCz], ou outras sociedades, e os seus sucessores legais (independentemente do título ou do sucessor), reembolsem o montante do auxílio público ilegal fixado na decisão da Comissão, mesmo que esta decisão respeite exclusivamente à [HCz].»

21      No termo do procedimento, a Comissão chegou à conclusão de que, contrariamente às suas dúvidas iniciais, as medidas que visavam a reestruturação da HCz em conformidade com as disposições da lei sobre os auxílios públicos às empresas de importância significativa para o mercado de trabalho de 30 de Outubro de 2002 (Dz. U. n.° 213, posição 1800), conforme alterada, não constituíam um «auxílio de Estado» na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE.

22      Em contrapartida, a Comissão considerou que a HCz tinha beneficiado a diversos títulos de um auxílio de Estado para o período de 1997 à 2002 que era em parte compatível com o mercado comum. No que respeita à parte que considerou incompatível com o mercado comum, ou seja o montante de 19 699 452 PLN (a seguir «auxílio controvertido»), a Comissão exigiu o respectivo reembolso.

23      Em 5 de Julho de 2005, a Comissão adoptou a decisão controvertida. O seu artigo 3.° refere:

«1.      O auxílio estatal concedido pela [República da] Polónia à [HCz] entre 1997 e Maio de 2002, sob a forma de auxílio ao funcionamento e auxílio à reestruturação do emprego, no montante de 19 699 452 PLN, é incompatível com o mercado comum.

2.      A [República da] Polónia adoptará todas as medidas necessárias para recuperar da [HCz], [do] Regionalny Fundusz Gospodarczy, [da MH] e do [Operator ARP sp. z o.o.] o auxílio referido no n.° 1 e ilegalmente disponibilizado à [HCz]. Todas estas empresas serão solidariamente responsáveis.

A recuperação será efectuada sem demora e segundo as formalidades do direito nacional, por forma a permitir a execução imediata e efectiva da presente decisão. O auxílio a recuperar incluirá os juros a partir da data em que foi colocado à disposição da [HCz] e até à data da sua recuperação. Os juros serão calculados em conformidade com o disposto no Capítulo V do Regulamento […] n.° 794/2004.

[…]»

24      No artigo 4.° da decisão controvertida, a Comissão aprova a alteração proposta ao plano nacional de reestruturação polaco de acordo com o ponto 10 do protocolo n.° 8, na medida em que permita a reestruturação da HCz sem auxílio estatal e sem um aumento da sua capacidade produtiva.

25      Em conformidade com dois acordos de 30 de Setembro de 2005, entrados em vigor em 7 de Outubro de 2005, a ISD comprou, por um lado, à HCz todas as participações sociais da MH e da MH Plus, bem como dez filiais restantes da HCz, e, por outro, à TFS todas as participações sociais da HSCz, passando assim a ser proprietária da HSCz, da MH, da MH Plus e de dez outras filiais da HCz.

26      Por carta de 17 de Fevereiro de 2006, a Comissão pediu às autoridades polacas para lhe indicarem as taxas de juro para o reembolso do auxílio controvertido pelos devedores solidários mencionados no artigo 3.°, n.° 2, da decisão controvertida. Na sua resposta de 13 de Março de 2006, as autoridades polacas propuseram taxas de juro aplicáveis à recuperação e uma metodologia para calcular os juros. Estas autoridades propuseram, designadamente, tomar como base, para o período entre 1997 e 1999, a taxa das obrigações do Tesouro polaco a taxa fixa, denominadas em zlotys polacos, a cinco anos, e para o período de 2000 até à adesão da República da Polónia à União, a taxa destas mesmas obrigações a dez anos. Além disso, tendo em conta a situação dos mercados de capitais na Polónia à época, que se caracterizava por taxas muito elevadas, mas que baixavam rapidamente, solicitaram que fosse levada a cabo uma actualização anual destas taxas e que os juros não fossem calculados numa base composta.

27      Na sua resposta de 7 de Junho de 2006, a Comissão declarou que a taxa de juro aplicável à recuperação do auxílio controvertido devia ser, para todo o período em causa, a taxa das obrigações do Tesouro polaco a taxa fixa, denominadas em zlotys polacos, a cinco anos, e que, por força do artigo 11.°, n.° 2, do Regulamento n.° 794/2004, esta taxa de juro devia ser aplicada numa base composta.

28      Por cartas de 7 de Julho e de 16 de Agosto de 2006, a Comissão comunicou a decisão controvertida à IUD e à MH. Em 21 de Dezembro de 2006, esta decisão foi publicada no Jornal Oficial da União Europeia.

29      Em 15 de Novembro de 2006, teve lugar a fusão da ISD com a MH, tendo a ISD assumido todos os direitos e obrigações da MH.

 Recurso para o Tribunal de Primeira Instância e acórdão recorrido

30      Nos seus recursos para o tribunal de Primeira Instância, as recorrentes ISD e IUD requereram no processo T‑273/06, designadamente, que o Tribunal anulasse o artigo 3.° da decisão controvertida invocando seis fundamentos em apoio dos seus pedidos.

31      O primeiro fundamento respeitava à violação do protocolo n.° 8. O quarto fundamento assentava na violação do princípio da protecção da confiança legítima e o sexto fundamento na violação do Regulamento n.° 794/2004. O segundo, o terceiro e o quinto fundamentos não foram invocados em apoio do presente recurso e não serão por isso a seguir analisados.

32      No processo T‑297/06, a ISD formulou pedidos idênticos invocando quatro fundamentos no essencial idênticos aos suscitados no processo T‑273/06, mas requereu, por outro lado, a anulação do artigo 4.° da decisão controvertida.

33      No primeiro fundamento, as recorrentes contestavam, no essencial, a aplicabilidade ratione temporis e ratione personae das regras comunitárias em matéria de auxílios de Estado e a competência da Comissão para fiscalizar a sua observância durante o período que antecedeu a adesão da República da Polónia à União.

34      A este respeito, o Tribunal de Primeira Instância confirmou que os artigos 87.° CE e 88.° CE não são aplicáveis, em princípio, a um auxílio concedido antes da adesão de um Estado‑Membro que deixou de ser atribuído após a adesão e que, por isso, a Comissão se apoia no protocolo n.° 8 como lex specialis a fim de justificar a sua competência.

35      Observando que este regime difere sobre vários aspectos do regime geral previsto pelo Tratado CE e pelo anexo IV do Acto relativo às condições de adesão da República Checa, da República da Estónia, da República de Chipre, da República da Letónia, da República da Lituânia, da República da Hungria, da República de Malta, da República da Polónia, da República da Eslovénia e da República Eslovaca e às adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia (JO 2003, L 236, p. 797; a seguir «anexo IV do Acto de Adesão»), o Tribunal de Primeira Instância concluiu, no n.°93 do acórdão recorrido, que o protocolo n.° 8 faz referência aos auxílios concedidos durante o período que vai de 1997 a 2003, que autoriza um montante limitado de auxílios à reestruturação, concedido relativamente a esse período a determinadas empresas enumeradas no seu anexo 1 e que proíbe, em contrapartida, qualquer outro auxílio de Estado à reestruturação da indústria siderúrgica.

36      Concluindo, no n.° 94 do acórdão recorrido, que a aplicação retroactiva do protocolo n.° 8 foi assim consagrada no seu ponto 6, que visa o período de 1997 a 2003, o Tribunal de Primeira Instância rejeitou, nos n.os 95 e 96 do acórdão recorrido, o argumento das recorrentes segundo o qual, dado que, no momento da publicação do protocolo n.° 8 em Setembro de 2003, esse período já tinha quase decorrido, esta referência ao referido período tem como único significado que o cálculo dos auxílios futuros devia ser feito tendo em conta retrospectivamente os montantes de auxílios já concedidos. No entender do Tribunal de Primeira Instância, o objectivo do protocolo n.° 8 era, pelo contrário, «instituir um regime compreensivo para a autorização dos auxílios destinados à reestruturação da indústria siderúrgica polaca e não apenas evitar o cúmulo de auxílios pelas empresas beneficiárias».

37      O Tribunal de Primeira Instância concluiu, por isso, no n.° 97 do acórdão recorrido que, em relação ao anexo IV do Acto de Adesão e aos artigos 87.° CE e 88.° CE, o protocolo n.° 8 representa uma lex specialis que alarga o controlo dos auxílios de Estado efectuado pela Comissão ao abrigo do Tratado aos auxílios concedidos à reorganização da indústria siderúrgica polaca durante o período de 1997 a 2003.

38      No que diz respeito ao argumento relativo à aplicabilidade ratione personae do protocolo n.° 8, segundo o qual este não visa as empresas não incluídas no seu anexo 1, O Tribunal observou, no n.° 99 do acórdão recorrido que o ponto 3 do referido protocolo dispõe expressamente que apenas as empresas enumeradas nesse anexo 1 podem beneficiar de auxílios de Estado no âmbito do programa de reestruturação da indústria siderúrgica polaca. Se se admitisse que uma empresa não incluída no referido anexo 1 pudesse conservar montantes ilimitados de auxílio à reestruturação recebidos antes da adesão sem reduzir em contrapartida as capacidades de produção, o protocolo n.° 8 perderia todo o seu sentido útil.

39      Quanto ao argumento baseado no ponto 4, alínea b), do protocolo n.° 8, segundo o qual apenas as empresas beneficiárias não podem retomar os activos de empresas não incluídas no anexo 1 do protocolo n.° 8 que declarem falência, o Tribunal refere que as recorrentes partem de uma interpretação errada desta disposição. Mesmo supondo que esta disposição prevê a possibilidade de um terceiro retomar os activos de empresas não incluídas no anexo 1 do protocolo n.° 8 que declarem falência, tal não implica de modo algum que este terceiro não seja obrigado a restituir um auxílio ilegal recebido pelas referidas empresas. Dado que a situação da HCz não pode, por isso, ser comparada à de uma empresa não incluída no anexo 1 do protocolo n.° 8 que tenha declarado falência, foi igualmente julgada improcedente pelo Tribunal de Primeira Instância a alegada violação do princípio da igualdade de tratamento na aplicação do referido protocolo.

40      Consequentemente, considerar procedente o fundamento assente na violação do princípio da igualdade de tratamento representaria, no essencial, pôr em causa o protocolo n.° 8, o qual, enquanto fonte de direito primário, faz parte do Tratado (v. n.os 100 e 101 do acórdão recorrido).

41      Quanto ao argumento segundo o qual a Comissão ultrapassou a sua própria competência, o Tribunal de Primeira Instância lembrou no n.° 102 do acórdão recorrido que o protocolo n.° 8 prevê que a Comissão adopte as medidas adequadas para exigir o reembolso de quaisquer auxílios concedidos em desrespeito das condições estabelecidas neste protocolo, incluindo medidas de controlo em aplicação do artigo 88.° CE, pelo que a Comissão era competente para fiscalizar o respeito das disposições do protocolo n.° 8.

42      Consequentemente, o Tribunal de Primeira Instância julgou improcedentes todos os argumentos que invocam a violação do protocolo n.° 8.

43      No seu quarto fundamento, as recorrentes alegam que a Comissão, na decisão de dar início ao procedimento formal de investigação sobre o auxílio à reestruturação concedido à HCz, se absteve de indicar com precisão os auxílios de Estado cuja a supressão exige na decisão controvertida, o que teve também por consequência ferir esta decisão de ilegalidade resultante da violação do princípio da protecção da confiança legítima. A sua confiança legítima residia no facto de a IUD esperar que o auxílio controvertido fosse considerado reembolsado e de o auxílio concedido antes de 2003 ter sido devidamente dado a conhecer à Comissão.

44      As recorrentes alegam a este respeito que a Comissão lhes tinha dado motivos para estarem seguras de que os auxílios recebidos pela HCz não seriam suprimidos. Com efeito, podiam legitimamente acreditar que a Comissão não exigiria a recuperação dos auxílios recebidos pela HCz e salientam que, embora o auxílio controvertido não tivesse sido notificado na acepção dos artigos 87.° CE e 88.° CE, o mesmo foi «devidamente anunciado» nos termos dos processos pertinentes previstos no protocolo n.° 2.

45      A este respeito, no n.° 134 do acórdão recorrido, o Tribunal observa que essa confiança não era susceptível de ser protegida ao abrigo do princípio da protecção da confiança legítima. Com efeito, as recorrentes não foram incentivadas por um acto da Comunidade a tomar uma decisão que, posteriormente, originou consequências negativas para as mesmas, nem foram beneficiárias de um acto administrativo favorável de uma instituição comunitária revogado retroactivamente por esta última. Remetendo para o acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de Março de 1997, Alcan Deutschland (C‑24/95, Colect., p. I‑1591), o Tribunal de Primeira Instância lembrou, no n.° 135 do acórdão recorrido, que as empresas beneficiárias de um auxílio só podem, em princípio, ter confiança legítima na regularidade do auxílio se este tiver sido concedido no respeito pelo processo previsto no artigo 88.° CE e que um operador económico diligente deve, normalmente, estar em condições de se certificar de que esse processo foi respeitado.

46      Por outro lado, no n.° 136 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância declarou que, no caso concreto, não foi efectuada qualquer notificação do auxílio controvertido, dado que o mesmo foi concedido numa época em que a República da Polónia não era ainda membro da União Europeia e que, por isso, não era possível a notificação nos termos do artigo 88.° CE.

47      Nos n.os 137 e 138 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância rejeitou igualmente o argumento das recorrentes segundo o qual o auxílio controvertido tinha sido «devidamente anunciado» segundo os procedimentos pertinentes do protocolo n.° 2. Com efeito, na medida em que as recorrentes se referiam à Decisão do Conselho 2003/588, na qual este constatou que o programa de reestruturação e os planos empresariais apresentados à Comissão pela República da Polónia, em 4 de Abril de 2003 cumpriam os requisitos do artigo 8.°, n.° 4, do protocolo n.° 2, é forçoso concluir que o plano empresarial relativo à HCz não foi apresentado à Comissão e, consequentemente, não estava abrangido pela aprovação contida na Decisão do Conselho 2003/588.

48      Quanto à exposição de motivos da proposta da Comissão, segundo a qual a prorrogação da derrogação prevista no artigo 8.°, n.° 4, do protocolo n.° 2 teria o efeito de legalizar retroactivamente todos os auxílios que tivessem sido concedidos ilegalmente desde a entrada em vigor do Acordo Europeu, o Tribunal assinalou, no n.° 139 do acórdão recorrido, que estes termos não estão contidos na Decisão do Conselho 2003/588. Ora, uma simples proposta da Comissão sujeita a uma decisão do Conselho não era susceptível de criar uma confiança legítima por parte das recorrentes.

49      O Tribunal rejeitou assim a totalidade dos argumentos baseados na violação do princípio da protecção da confiança legítima.

50      No seu sexto fundamento, que visava designadamente a fixação das taxas de juro aplicáveis à recuperação dos auxílios controvertidos, as recorrentes invocavam a violação do Regulamento n.° 794/2004 contestando que a Comissão tenha fixado uma taxa de juro adequada e afirmando que esta ignorou o objectivo dos artigos 9.° e 11.° do referido regulamento, ou seja, o restabelecimento da situação tal como existia antes da concessão do auxílio ilegal, ao exigir juros sobre restituições de juros e ao escolher uma taxa de referência totalmente estranha à realidade do mercado polaco entre 1997 e 2004.

51      A este respeito, as recorrentes alegam que, em direito polaco, os juros só são devidos sobre o capital dos impostos atrasados e que as leis fiscais não prevêem a capitalização dos juros devidos sobre estes atrasos. Por outro lado, referem que era muito raro, entre 1997 e 2004, as empresas obterem capitais externos a longo prazo utilizando obrigações e empréstimos bancários denominados em zlotys polacos. Ao pretender aplicar a taxa de juro das obrigações do Tesouro polaco, a Comissão não utilizou a taxa que reflecte correctamente a vantagem de que a HCz beneficiou, o que tem por efeito sobreavaliar essa vantagem. A restituição dos juros coloca assim as empresas beneficiárias numa situação menos favorável em relação ao statu quo ante.

52      No que respeita à decisão controvertida, o Tribunal de Primeira Instância referiu, no n.° 157 no acórdão recorrido, que os juros são calculados em conformidade com as disposições do capítulo V do Regulamento n.° 794/2004 e que , uma vez que a taxa de juro não está fixada no dispositivo nem nos considerandos da referida decisão, o fundamento das recorrentes carece de objecto.

53      No que se refere ao método de cálculo dos juros, o Tribunal entendeu que as considerações constantes da decisão controvertida a este respeito revestem um carácter puramente declaratório, dado que o método para o cálculo dos juros resulta do próprio Regulamento n.° 794/2004. Ora, as recorrentes não suscitam uma excepção de ilegalidade em relação a este regulamento (v. n.° 159 do acórdão recorrido).

54      Quanto à carta de 7 de Junho de 2006, na qual a Comissão fixou a taxa de juro a aplicar à recuperação do auxílio controvertido, o Tribunal lembrou que o artigo 9.°, n.° 4, do Regulamento n.° 794/2004 prevê que a fixação da taxa de juro aplicável à recuperação deve ser efectuada em «estreita colaboração» com o Estado‑Membro em causa.

55      Ora, a correspondência trocada entre a Comissão e as autoridades polacas revela que a fixação da taxa foi realizada em «estreita colaboração» com a República da Polónia a qual, efectivamente, propôs a aplicação das taxas das obrigações do Tesouro a respectivamente cinco e dez anos e solicitou que fosse levada a cabo uma actualização anual destas taxas e que os juros não fossem calculados numa base composta (n.° 163 do acórdão recorrido).

56      A Comissão, tendo aceite o essencial destas propostas, considerou que apenas devia ser aplicada a taxa das obrigações a cinco anos durante todo o período de 1997 a 2004. A Comissão dispunha a este respeito de uma certa margem de apreciação (n.° 164 do acórdão recorrido).

57      Quanto ao método de aplicação dos juros, e, em particular do cálculo dos juros numa base composta, o Tribunal referiu, no n.° 165 do acórdão recorrido, que o artigo 11.°, n.° 2, do Regulamento n.° 794/2004 10 precisa explicitamente que a taxa de juro é aplicada numa base composta até à data da recuperação do auxílio e que os juros resultantes do ano anterior produzirão juros em cada ano subsequente. Além disso, o artigo 13.° do Regulamento n.° 794/2004 prevê que os seus artigos 9.° e 11.° são aplicáveis a todas as decisões de recuperação notificadas após a data de entrada em vigor deste regulamento. Dado que o Regulamento n.° 794/2004 era aplicável à data da adopção da decisão controvertida, a Comissão era assim obrigada a exigir que o juro fosse calculado numa base composta.

58      Consequentemente, o Tribunal de Primeira Instância julgou improcedente a totalidade dos fundamentos assentes na violação do Regulamento n.° 794/2004.

59      Tendo julgado improcedentes todos fundamentos apresentados pelas recorrentes em apoio do seu recurso, o Tribunal de Primeira Instância negou provimento ao recurso na globalidade.

 Pedidos das partes no Tribunal de Justiça

60      As recorrentes pedem que Tribunal de Justiça se digne:

–        anular o acórdão recorrido;

–        julgar procedentes na totalidade, ou subsidiariamente em parte, os pedidos formulados no Tribunal de Primeira Instância nos processos apensos T‑273/06 e T‑297/06;

–        condenar a Comissão na totalidade das despesas;

–        no caso do Tribunal da Justiça decidir não se pronunciar sobre o mérito da causa, condenar a Comissão nas despesas nos termos das disposições conjugadas do artigo 69.°, n.° 6, e do artigo 72.°, alínea a), do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça.

61      A Comissão pede que o Tribunal de Justiça negue provimento ao recurso e condene as recorrentes nas despesas.

 Quanto ao presente recurso

62      As recorrentes invocam em apoio do presente recurso três fundamentos assentes na violação, respectivamente, do protocolo n.° 8, do princípio da protecção da confiança legítima e do Regulamento n.° 659/1999, designadamente do seu artigo 14.°, n.° 2, e do Regulamento n.° 794/2004.

63      A Comissão contesta por um lado, a admissibilidade do recurso na íntegra e, por outro, especificamente a admissibilidade dos primeiro e do terceiro fundamentos e a procedência dos três fundamentos invocados pelas recorrentes.

 Quanto à admissibilidade do recurso na íntegra

 Argumentos das partes

64      A título preliminar, a Comissão alega a inadmissibilidade do recurso pelo facto de as recorrentes, no que respeita à forma do presente recurso, confundirem dois níveis de recurso na medida em que a petição se limita no essencial a reiterar argumentos contra a decisão controvertida conforme foram expostos na primeira instância. As recorrentes não esclarecem quais as passagens do raciocínio do Tribunal de Primeira Instância que são visadas em especial nem quais os erros que o Tribunal da Primeira Instância cometeu na análise destes argumentos na primeira instância.

65      A este respeito, a Comissão afirma que resulta dos artigos 225.° CE, 58.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça e 112.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo que um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância deve indicar de forma precisa os elementos que critica no acórdão cuja anulação pede, bem como os argumentos jurídicos que suportam especificamente esse pedido. Não preenche esse requisito o recurso das recorrentes que, sem sequer conter uma argumentação especificamente destinada a identificar o erro de direito de que está ferido o acórdão recorrido, se limita a reproduzir os fundamentos e os argumentos já apresentados no Tribunal de Primeira Instância. Com efeito, este recurso constitui, na realidade, um pedido de simples reexame da petição apresentada no Tribunal de Primeira Instância, o que não é da competência do Tribunal de Justiça.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

66      Segundo jurisprudência assente, resulta dos artigos 225.° CE, 58.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça e 112.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça que um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância deve indicar de modo preciso os elementos impugnados do acórdão cuja anulação é pedida, bem como os argumentos jurídicos em que se apoia especificamente esse pedido (v., designadamente, acórdãos de 4 de Julho de 2000, Bergaderm e Goupil/Comissão, C‑352/98 P, Colect., p. I‑5291, n.° 34; de 8 de Janeiro de 2002, França/Monsanto e Comissão, C‑248/99 P, Colect., p. I‑1, n.° 68, e de 14 de Outubro de 2010, Nuova Agricast e Cofra/Comissão, C‑67/09 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 48).

67      A este respeito, basta constatar que, embora determinadas passagens da argumentação desenvolvida pelas recorrentes no contexto dos seus fundamentos careçam de rigor, essa argumentação é, no entanto, no seu conjunto, suficientemente clara para poder identificar com a precisão exigida os elementos criticados do acórdão recorrido, bem como os elementos jurídicos invocados em apoio desta crítica, e permite, por conseguinte, que o Tribunal de Justiça proceda à fiscalização da legalidade.

68      Consequentemente, há que considerar improcedente a excepção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão na medida em que se refere ao presente recurso na sua totalidade.

 Quanto ao primeiro fundamento

 Argumentos das partes

69      No seu primeiro fundamento, as recorrentes afirmam que o Tribunal de Primeira Instância violou o protocolo n.° 8 ao considerar que este consagra no ponto 6 a aplicação retroactiva das suas disposições. Não resulta claramente da redacção, da finalidade nem da sistemática do referido protocolo que lhe deva ser atribuído alcance retroactivo.

70      A este respeito, as recorrentes afirmam que, na realidade, o protocolo n.° 8 tem por objecto que as empresas enumeradas no seu anexo 1 possam beneficiar de auxílios de Estado dentro de certos limites entre o momento da sua assinatura em 16 de Abril de 2003 e o final do ano de 2003. O único elemento de retroactividade identificável no referido protocolo é a referência ao período entre 1997 e 2003, que diz respeito quer ao montante total do auxílio de Estado que pode ser concedido (ponto 6 do protocolo n.° 8), quer à redução da capacidade líquida a alcançar pela República da Polónia (ponto 7 do protocolo n.° 8). Tal significa que o cálculo dos auxílios futuros que serão atribuídos às empresas beneficiárias até o final de 2003 deve ser feito não tendo em conta retroactivamente os auxílios passados como sendo eventualmente ilegais, mas tendo retrospectivamente em conta os montantes de auxílio já concedidos.

71      As recorrentes alegam a este aspecto que, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça (acórdãos de 25 de Janeiro de 1979, Racke, 98/78, Colect., p. 53; Weingut Decker, 99/78, Colect., p. 77; de 19 de Maio de 1982, Staple Dairy Products, 84/81, Recueil, p. 1763, e de 24 de Setembro de 2002, Falck e Acciaierie di Bolzano/Comissão, C‑74/00 P e C‑75/00 P, Colect., p. I‑7869), em regra geral, o princípio da segurança das situações jurídicas opõe‑se a que os efeitos de um acto comunitário no tempo tenham início numa data anterior à sua publicação. Pode suceder diferentemente, a título excepcional, quando o objectivo a atingir o exija e a confiança legítima dos interessados seja devidamente respeitada. Isto significa que, na falta de indicação em contrário, se presume que um texto de direito comunitário não tem efeito retroactivo.

72      Ora, no presente caso, segundo as recorrentes, é pacífico que o Conselho de Associação UE‑Polónia adoptou, em 23 de Outubro de 2002, uma decisão que prorroga por oito anos suplementares a partir de 1 de Janeiro de 1997 o período de isenção previsto no protocolo n.° 2. Esta decisão fazia depender a prorrogação de duas condições. Por um lado, a apresentação à Comissão pela República da Polónia de um programa de reestruturação e de planos empresariais e, por outro, a sua avaliação final pela Comissão (artigos 2.° e 3.° da decisão do Conselho de Associação). O artigo 3.° desta decisão previa, além disso, que a Comissão fiscalizaria regularmente a aplicação dos planos empresariais em nome da Comunidade, enquanto o Departamento da Concorrência e da Protecção dos Consumidor polaco procederia da mesma forma no que se refere à República da Polónia.

73      A Comissão concluiu que o programa de reestruturação e os planos empresariais apresentados pela República da Polónia satisfaziam os requisitos do artigo 8.°, n.° 4, do protocolo n.° 2 e as condições fixadas no protocolo n.° 8 e, por proposta sua, aprovou a sua avaliação final e o respeito do compromisso assumido pela República da Polónia no protocolo n.° 8. A Decisão do Conselho 2003/588 foi finalmente adoptada neste sentido. Segundo as recorrentes, a Comissão, na decisão controvertida, alterou a sua decisão sobre os auxílios de Estado concedidos entre 1997 e 2002 ao abrigo do regime de isenção que tinha sido prorrogado pela Decisão do Conselho 2003/588 posterior à assinatura do protocolo n.° 8 e que lhe fazia referência.

74      Por outro lado, o ponto 6 do protocolo n.° 8 refere‑se unicamente aos auxílios à reestruturação futuros que podem ser pagos às empresas beneficiárias e não contém qualquer referência expressa a um eventual efeito retroactivo. Não resulta claramente do seu conteúdo, da sua finalidade nem da sua sistemática que lhe deva ser atribuído efeito retroactivo.

75      Por outro lado, as recorrentes alegam que é pacífico que as autoridades polacas tinham previsto incluir a HCz na lista das empresas beneficiárias enumeradas no anexo 1 do protocolo n.° 8 que podiam beneficiar de auxílios de Estado no âmbito do programa de reestruturação da indústria siderúrgica polaca. Tinham desistido desta medida no último minuto, dado que a HCz entrou em falência e a sua viabilidade passou a ser considerada pouco provável mesmo com novos auxílios. A viabilidade da HCz no momento em que foi aprovado o conteúdo do protocolo n.° 8 constituiu, assim, o único aspecto que a distinguia das oito empresas beneficiárias.

76      Ora, a partir de Abril de 2003, as autoridades polacas projectaram reestruturar a HCz por outra via que não a falência. A Comissão não teve isso em conta na sua decisão controvertida, apesar de esses factos serem do seu conhecimento, e tratou por isso duas categorias de pessoas cujas situações jurídicas e factuais não apresentavam diferenças essenciais – as empresas constantes do anexo 1 do protocolo n.° 8, por um lado, e a entidade económica que sucedeu à HCz, por outro – de modo radicalmente diferente. Este tratamento diferenciado de duas situações essencialmente semelhantes constitui por isso uma violação adicional do protocolo n.° 8.

77      Nestas condições, a interpretação do protocolo n.° 8 feita pela Comissão na decisão controvertida constitui uma violação manifesta deste texto comunitário. O Tribunal, ao não condenar esta violação, violou, por sua vez, o direito comunitário.

78      A Comissão afirma desde logo que o primeiro fundamento é, em parte, inadmissível por dois motivos. Por um lado, as recorrentes invocaram a proposta da Comissão e a Decisão do Conselho 2003/588 no contexto do referido fundamento quando esse aspecto foi analisado pelo Tribunal de Primeira Instância no âmbito do fundamento assente na violação do princípio da protecção da confiança legítima. Consequentemente, as recorrentes suscitam pela primeira vez no Tribunal de Justiça um fundamento e argumentos que não suscitaram no Tribunal de Primeira Instância, pelo que esta parte do fundamento deve ser julgada inadmissível.

79      Por outro lado, no que respeita ao argumento da diferença de tratamento de duas situações essencialmente semelhantes e que dão lugar, por isso, a uma violação do protocolo n.° 8, trata‑se de um argumento novo na medida em que não foi invocado pela recorrente no processo T‑297/06, no âmbito do fundamento assente na alegada violação do protocolo n.° 8. Apenas as recorrentes no processo T‑273/06 invocaram uma pretensa violação do princípio da igualdade de tratamento na aplicação do protocolo n.° 8. Consequentemente, esta parte do primeiro fundamento deve também ser julgada inadmissível.

80      No que respeita ao mérito, a Comissão afirma ainda que subscreve a leitura feita pelo Tribunal de Primeira Instância segundo a qual o objectivo do protocolo n.° 8 era instituir um regime compreensivo para o controlo dos auxílios destinados à reestruturação da indústria siderúrgica polaca. Em seu entender, a própria redacção do ponto 6 do referido protocolo aponta para um efeito retroactivo na medida em que a totalidade do período considerado, ou seja, os anos de 1997 a 2003, se situa antes da data da adesão República da Polónia à União.

81      Além disso, a Comissão contesta o argumento das recorrentes segundo o qual a referência a este período significa na realidade que o controlo dos auxílios antes da adesão se limitaria aos concedidos entre os meses de Setembro e Dezembro de 2003. A Comissão é por isso de opinião de que o raciocínio do Tribunal de Primeira Instância nos n.os 93 a 97 do acórdão recorrido tomou correctamente em conta a redacção, a finalidade e a sistemática do protocolo n.° 8, baseando correctamente nas mesmas a sua conclusão quanto ao efeito retroactivo.

82      Por último, a Comissão considera que os argumentos apresentados pelas recorrentes são improcedentes em qualquer caso, na medida em que estes argumentos parecem contestar na realidade a exclusão da HCz da lista das empresas beneficiárias enumeradas no anexo 1 do protocolo n.° 8 e não qualquer violação do referido protocolo. Ora, é manifesto que o âmbito do recurso de anulação de que o Tribunal de Primeira Instância tinha de conhecer se limitava à fiscalização da legalidade da decisão da Comissão e não permitia pôr em causa a legalidade de disposições de direito primário como as do protocolo n.° 8.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

–       Quanto à admissibilidade

83      No que se refere à inadmissibilidade alegada pela Comissão e baseada do fundamento novo invocado, é de observar que resulta, com efeito, de jurisprudência assente que, permitir a uma parte invocar no Tribunal de Justiça, pela primeira vez, fundamentos que não invocou no Tribunal de Primeira Instância equivaleria a permitir‑lhe apresentar ao Tribunal de Justiça, cuja competência para julgar recursos em segunda instância é limitada, um litígio com um objecto mais lato do que o submetido ao Tribunal de Primeira Instância. No âmbito de um recurso da decisão do Tribunal de Primeira Instância, a competência do Tribunal de Justiça encontra‑se, pois, limitada à apreciação da solução legal dada aos fundamentos debatidos em primeira instância (v., designadamente, acórdãos de 11 de Novembro de 2004, Ramondín e o./Comissão, C‑186/02 P e C‑188/02 P, Colect., p. I‑10653, n.° 60, e de 26 de Outubro de 2006, Koninklijke Coöperatie Cosun/Comissão, C‑68/05 P, Colect., p. I‑10367, n.° 96).

84      A este respeito, é, contudo, de observar que as recorrentes, ao contrário do que alega a Comissão, não suscitam um fundamento novo no Tribunal de Justiça, mas um simples argumento que se insere no fundamento assente na violação do protocolo n.° 8 e já debatido no Tribunal de Primeira Instância. Com efeito, fazem referência aos documentos citados pela Comissão com o objectivo de fundamentar a violação do protocolo n.° 8, mas não formulam qualquer nova crítica do ponto de vista jurídico. Consequentemente, não é de aceitar a excepção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão, baseada no carácter novo do fundamento invocado pelas recorrentes.

85      No que respeita à inadmissibilidade suscitada pela Comissão baseada no facto de o argumento relativo à diferença de tratamento de duas situações essencialmente semelhantes, invocado pela recorrente no processo T‑297/06, ser novo no sentido de que não foi invocado por esta na primeira instância, mas apenas pelas recorrentes no processo T‑273/06, basta observar que, uma vez que uma parte deve poder contestar todos os fundamentos de um acórdão que a afectam, quando o Tribunal de Primeira Instância apensa dois processos e profere um acórdão único que responde à totalidade dos fundamentos apresentados pelas partes no processo que ali correu termos, cada uma destas pode criticar os raciocínios relativos aos fundamentos que, perante o Tribunal, foram suscitados apenas pela recorrente no outro processo apenso (v. acórdãos de 29 de Novembro de 2007, Stadtwerke Schwäbisch Hall e o./Comissão, C‑176/06 P, n.° 17, e, por analogia, de 21 de Fevereiro de 2008, Comissão/Girardot, C‑348/06 P, Colect., p. I‑833, n.° 50).

86      Consequentemente, não pode ser aceite a excepção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão baseada no carácter novo do fundamento invocado pelas recorrentes.

87      Resulta do que antecede que o primeiro fundamento de recurso é admissível.

–       Quanto ao mérito

88      No que respeita à procedência deste fundamento, há que examinar se o Tribunal violou o protocolo n.° 8 ao considerar no acórdão recorrido que a competência da Comissão para fiscalizar o respeito das regras comunitárias em matéria de auxílios de Estado durante o período que antecedeu a adesão da República da Polónia à União se baseia neste protocolo e incide sobre os auxílios concedidos durante a totalidade do período previsto no ponto 6 do referido protocolo, ou seja, de 1997 a 2003 e não, como alegam as recorrentes, exclusivamente entre o momento da sua publicação, em 23 de Setembro de 2003, e 31 de Dezembro de 2003 uma vez que põem em causa o efeito retroactivo do protocolo n.° 8.

89      É de lembrar, a este respeito, que o Tribunal de Primeira Instância chegou a esta conclusão após ter examinado, nos n.os 89 a 97 do acórdão recorrido, o alcance do protocolo n.° 8.

90      No quadro desta análise, o Tribunal de Primeira Instância sublinhou desde logo, no n.° 90 do acórdão recorrido, que, no que respeita à aplicabilidade ratione temporis das regras comunitárias em matéria de auxílios de Estado, é pacífico que, em princípio, os artigos 87.° CE e 88.° CE não se aplicam aos auxílios concedidos antes da adesão que já não são aplicáveis após esta.

91      Além disso, Tribunal declara, no n.° 91 do acórdão recorrido, que o regime previsto pelo protocolo n.° 8 difere sobre vários aspectos do regime geral previsto pelo Tratado e pelo anexo IV do Acto de Adesão. O Tribunal considerou a este respeito que, em conformidade com o ponto 1 do protocolo n.° 8, determinados auxílios estatais concedidos pela República da Polónia para a reestruturação de sectores específicos da indústria siderúrgica polaca, que não seriam normalmente admissíveis segundo os artigos 87.° CE e 88.° CE, são reconhecidos compatíveis com o mercado comum. Por outro lado, o Tribunal de Primeira Instância salienta que o mecanismo de transição constante do anexo IV do Tratado de Adesão respeita apenas aos auxílios de Estado concedidos antes da adesão que continuam a ser aplicáveis após a data da adesão.

92      O Tribunal lembra também, nos n.os 93 e 94 do acórdão recorrido, que o protocolo n.° 8 faz referência aos auxílios concedidos durante o período de 1997 a 2003, e, consequentemente, para um período que se situa antes da adesão da República da Polónia à União. Este protocolo autoriza um montante limitado de auxílios à reestruturação (3 387 070 000 PLN), concedido para o referido período a determinadas empresas enumeradas no anexo 1, e prevê que nenhum outro auxílio deve ser concedido pela República da Polónia para a reestruturação da indústria siderúrgica polaca. Daqui decorre, segundo o Tribunal de Primeira Instância, que a aplicação retroactiva do protocolo n.° 8 está consagrada no seu ponto 6, que visa o período de 1997 a 2003.

93      Por último, o Tribunal de Primeira Instância, no n.° 95 do acórdão recorrido, rejeita o argumento das recorrentes segundo o qual, uma vez que, no momento da publicação do protocolo n.° 8, em Setembro de 2003, este período estava praticamente terminado, dado que a referência do protocolo n.° 8 ao período de 1997 e 2003 tem como único significado que o cálculo dos auxílios futuros deve ser feito tendo em conta retrospectivamente os montantes de auxílios já concedidos, mas não considerando retroactivamente ilegais os auxílios passados.

94      Salienta ainda que, pelo contrário, o objectivo do protocolo n.° 8 era instituir um regime compreensivo para a autorização de auxílios destinados à reestruturação da indústria siderúrgica polaca e não apenas evitar o cúmulo de auxílios pelas empresas beneficiárias (v. n.° 96 do acórdão recorrido).

95      À luz destas conclusões, o Tribunal de Primeira Instância, nos n.os 97 e 104 do acórdão recorrido, pôs de parte qualquer violação do protocolo n.° 8, decidindo que este representava uma lex specialis relativamente ao anexo IV do Acto de Adesão e aos artigos 87.° CE e 88.° CE, que alarga o controlo dos auxílios de Estado efectuado pela Comissão nos termos do Tratado aos auxílios concedidos em favor da reorganização da indústria siderúrgica polaca durante o período entre 1997 e 2003, e julgou por isso improcedente este fundamento.

96      Contrariamente ao que as recorrentes afirmam, o Tribunal não violou o referido protocolo ao chegar a essa conclusão.

97      Com efeito, é forçoso concluir que o Tribunal de Primeira Instância salientou correctamente, nos n.os 93 e 94 do acórdão recorrido, que o próprio protocolo n.° 8 previa no seu ponto 6 que o mesmo se aplicava ao período que abrangia os anos 1997 a 2003, período esse anterior à data da adesão.

98      Efectivamente, resulta de jurisprudência assente que, para garantir o respeito dos princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança legítima, as regras substantivas do direito da União devem ser interpretadas no sentido de que apenas têm em vista as situações constituídas antes da sua entrada em vigor, se resultar claramente dos seus termos, da sua finalidade ou da sua sistemática que lhes deve ser atribuído esse efeito (v., designadamente, acórdãos de 10 Fevereiro de 1982, Bout, 21/81, Recueil, p. 381, n.° 13; de 15 de Julho de 1993, GruSa Fleisch, C‑34/92, Colect., p. I‑4147, n.° 22; de 29 de Janeiro de 2002, Pokrzeptowicz‑Meyer, C‑162/00, Colect., p. I‑1049, n.° 49, e de 12 de Novembro de 2009, Elektrownia Pątnów II, C‑441/08, Colect., p. I‑10799, n.° 33).

99      Ora, dado que o protocolo n.° 8 entrou em vigor em 1 de Maio de 2004, contrariamente ao enquadramento factual e jurídico nos processos citados em apoio do argumento invocado pelas recorrentes, é forçoso concluir que resulta claramente dos termos do protocolo n.° 8 que este prevê um efeito retroactivo ao visar expressamente um período de tempo que estaria totalmente terminado no momento da sua entrada em vigor.

100    No que se refere à finalidade e à sistemática do protocolo n.° 8, ao contrário do que alegam as recorrentes, há que observar que, uma vez que os artigos 87.° CE e 88.° CE não se aplicam aos auxílios concedidos antes da adesão que não sejam aplicáveis após esta e a fim de prosseguir o objectivo de uma proibição de princípio de qualquer auxílio estatal com excepção das derrogações expressamente previstas, objectivo esse que já estava definido no protocolo n.° 2, a instituição de um regime que habilite a Comissão a exercer a fiscalização dos auxílios de Estado nos termos do Tratado sobre qualquer auxílio concedido à reestruturação da siderurgia polaca nos anos 1997 a 2006 era a consequência lógica da continuidade material entre o Acordo Europeu e o Tratado no que se refere aos auxílios estatais, expressando, por outro lado, o objectivo da aplicação de um único regime de controlo antes e após a adesão da República da Polónia à União.

101    O objectivo do protocolo n.° 8 era, por isso, como o Tribunal concluiu correctamente, instituir um regime compreensivo para a autorização de auxílios destinados à reestruturação da indústria siderúrgica polaca e não apenas evitar o cúmulo de auxílios pelas empresas beneficiárias.

102    Consequentemente, o Tribunal de Primeira Instância rejeitou correctamente o argumento das recorrentes segundo o qual o protocolo n.° 8 deve ser interpretado no sentido de que visa apenas o período situado entre a data da sua publicação, em Setembro de 2003 e o final de 2003 e que, por isso, o cálculo dos auxílios futuros a atribuir às empresas beneficiárias até ao final de 2003 deve ser feito não tomando em consideração retroactivamente os auxílios passados como sendo ilegais, mas tendo em conta retrospectivamente os montantes de auxílios já concedidos.

103    Daqui resulta, como o Tribunal observou correctamente, que o protocolo n.° 8 representa uma lex specialis que alargou a competência da Comissão para controlar os auxílios concedidos a favor da reestruturação da indústria siderúrgica polaca durante o período de 1997 a 2003.

104    No que se refere ao argumento das recorrentes segundo o qual resulta tanto da proposta da Comissão como da Decisão do Conselho 2003/588 que, no entender destas instituições, os compromissos assumidos no protocolo n.° 8 tinham sido respeitados, basta verificar que um acto de direito da União derivado não pode derrogar ou alterar um acto de direito primário, mesmo que tenha sido adoptado posteriormente.

105    Por último, no que respeita ao argumento das recorrentes baseado numa diferença de tratamento na medida em que estas afirmam que a HCz deveria ter sido inscrita na lista das empresas beneficiárias enumeradas anexo 1 do protocolo n.° 8, basta observar que as recorrentes, ao contestarem na realidade a exclusão da HCz desta lista, põem em causa o protocolo n.° 8 que faz parte integrante do Tratado e que, consequentemente, tem a qualidade de direito primário. Ora, no quadro do recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância, o Tribunal de Justiça limita‑se a controlar a legalidade do acórdão proferido pelo Tribunal de Primeira Instância, o que não permite que seja posta em causa a legalidade de uma disposição de direito primário.

106    Tendo em conta as considerações que antecedem, o Tribunal de Primeira Instância considerou correctamente que não houve violação do protocolo n.° 8, devendo por isso o primeiro fundamento ser julgado improcedente.

 Quanto ao segundo fundamento

 Argumentos das partes

107    Neste fundamento, as recorrentes afirmam que os procedimentos previstos no protocolo n.° 2, através dos quais o auxílio controvertido foi levado ao conhecimento tanto da Comissão como do Conselho, deram lugar a uma confiança legítima por parte das recorrentes.

108    A este respeito, as recorrentes lembram que é pacífico que a Comissão tomou conhecimento de que a HCz tinha recebido auxílios de Estado quando apreciou as sucessivas versões do programa de reestruturação polaco. A proposta da Comissão foi publicada em 26 de Maio de 2003. Mesmo admitindo que a exposição de motivos desta proposta não seja susceptível de criar uma confiança legítima da parte das recorrentes, estas sublinham que a Comissão foi, não obstante, informada dos auxílios controvertidos.

109    Por outro lado, as recorrentes afirmam que, uma vez que a Decisão do Conselho 2003/588 foi adoptada com base na proposta da Comissão e que esta decisão declara que os auxílios em questão satisfazem os requisitos de isenção previstos no artigo 8.°, n.° 4, do protocolo n.° 2, e na ausência dos procedimentos formais enunciados no artigo 88.° CE inaplicáveis à República da Polónia nessa época, o procedimento prosseguido pela Comissão e pelo Conselho no presente caso cumpre as condições impostas pela jurisprudência em matéria da protecção da confiança legítima.

110    As recorrentes invocam a este respeito os acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Março de 1990, Chomel/Comissão (T‑123/89, Colect., p. II‑131), e de 31 de Março de 1998, Preussag Stahl/Comissão (T‑129/96, Colect., p. II‑609), e sublinham que a protecção da confiança legítima se estende a qualquer particular que se encontre numa situação da qual resulte que a administração comunitária fez nascer fundadas esperanças da sua parte.

111    Além disso, as recorrentes lembram que o direito de reclamar a protecção da confiança legítima pressupõe a reunião de três condições, ou seja, garantias precisas dadas ao interessado pela administração comunitária susceptíveis de dar lugar a uma expectativa legítima por parte daquele a quem são dirigidas e conformes às normas aplicáveis.

112    O Tribunal esclareceu que constituem garantias precisas, qualquer que seja a forma sob a qual são comunicadas, informações precisas, incondicionais e concordantes, que emanem de fontes autorizadas e fiáveis (acórdãos de 6 de Julho de 1999, Forvass/Comissão, T‑203/97, ColectFP, pp. I‑A‑129 e II‑705, n.os 70 e 71, e de 19 de Março de 2003, Innova Privat‑Akademie/Comissão, T‑273/01, Colect., p. II‑1093, n.os 26, 28, 29 e 32).

113    Aplicando esta jurisprudência à proposta da Comissão, as recorrentes concluem que o ponto 6 da exposição de motivos da proposta lhes deu garantias precisas, que essas garantias eram susceptíveis de dar lugar a uma expectativa legítima da sua parte e eram conformes com as normas aplicáveis. As três condições exigidas para que as recorrentes invocassem a confiança legítima, na medida em que os auxílios recebidos não eram ilícitos nem estavam, por isso, sujeitos a restituição, estavam consequentemente preenchidas. Acresce que o artigo único da Decisão do Conselho 2003/588 foi susceptível de fazer nascer no espírito das recorrentes a convicção segura de que o problema de reestruturação era conforme ao acordo europeu e, consequentemente, que os auxílios incluídos no referido programa eram lícitos.

114    A Comissão, remetendo para o acórdão Alcan Deutschland, já referido, sublinha que, efectivamente, a sua proposta, tal como a Decisão do Conselho 2003/588, toma como ponto de partida o programa de reestruturação e os planos empresariais apresentados pela República da Polónia. A liquidação da HCz estava prevista, ali não figurando qualquer plano empresarial para a mesma. Consequentemente, nem a Comissão nem o Conselho puderam dar garantias precisas no que respeita especificamente aos auxílios pagos à HCz uma vez que esta empresa não era visada.

115    Por outro lado, a Comissão afirma que as recorrentes não contestam as conclusões a que chegou o Tribunal de Primeira Instância no n.° 138 do acórdão recorrido, segundo as quais o plano empresarial relativo à HCz não tinha sido submetido à Comissão e não podia por isso, ser abrangido pela aprovação contida na Decisão do Conselho 2003/588. Ora, o Tribunal baseou‑se nesta conclusão. Trata‑se de uma conclusão de facto que as recorrentes não contestam, e que também não podem contestar em sede de recurso.

116    Assim, segundo a Comissão, o fundamento baseado na violação do princípio da protecção da confiança legítima deve ser julgado improcedente. Nem o dispositivo da proposta da Comissão, nem o da Decisão do Conselho 2003/588, nem o décimo terceiro considerando da exposição de motivos da proposta da Comissão podem fundamentar qualquer confiança legítima na conformidade com o protocolo n.° 8 de planos empresariais que não foram apresentados à Comissão e que não podiam, por isso, ser visados por esses diplomas.

117    Por último, a Comissão lembra que o Tribunal considerou no n.° 139 do acórdão recorrido que, uma vez que a Decisão do Conselho 2003/588 não retoma as considerações feitas pela Comissão na sua proposta, segundo as quais a prorrogação da derrogação prevista no artigo 8.°, n.° 4, do protocolo n.° 2 teria por efeito regularizar retroactivamente todos os auxílios que tivessem sido concedidos ilegalmente desde a entrada em vigor do Acordo Europeu, é forçoso assinalar que estes termos não estão contidos no acto adoptado a final pelo Conselho. Ora, uma simples proposta da Comissão não é susceptível de criar uma confiança legítima da parte das recorrentes.

118    Acresce que a Comissão sublinha que, por outro lado, a questão se afigura de todo modo meramente académica, uma vez que as recorrentes não formulam qualquer crítica ao n.°139 do acórdão recorrido.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

119    No seu segundo fundamento, as recorrentes afirmam, no essencial, que o Tribunal de Primeira Instância violou o princípio da protecção da confiança legítima na medida em que não concluiu que o auxílio controvertido tinha sido levado ao conhecimento, no quadro dos procedimentos do protocolo n.° 2, tanto da Comissão como do Conselho, o que deu lugar a uma confiança legítima da parte das recorrentes. Além disso, a exposição de motivos da proposta da Comissão para a Decisão do Conselho 2003/588 e o artigo único desta decisão eram susceptíveis de dar lugar, no espírito das recorrentes, à expectativa legítima de que o auxílio em causa estivesse regularizado e de que o programa de reestruturação era lícito.

120    A este respeito, é de referir que o Tribunal chegou à sua conclusão após ter mencionado, nos n.os 135 a 139 do acórdão recorrido, a génese dos diversos actos que visam directa ou indirectamente os auxílios controvertidos. O Tribunal de Primeira Instância referiu a seguir que, por um lado, o plano empresarial relativo à HCz não foi submetido à Comissão e não é por isso visado pela Decisão do Conselho 2003/588 e que, por outro, esta decisão, contrariamente à exposição de motivos da proposta da Comissão, não dispõe que a prorrogação da derrogação prevista no artigo 8.°, n.° 4, do protocolo n.° 2 teria por feito regularizar retroactivamente todos os auxílios que tinham sido concedidos ilegalmente depois da entrada em vigor do acordo europeu.

121    A este respeito, em primeiro lugar, é de salientar que o argumento das recorrentes de que a Comissão foi informada da existência dos auxílios controvertidos carece de qualquer relevância. Dado que o plano empresarial relativo à HCz não foi submetido à Comissão no quadro dos procedimentos expressamente previstos para esse efeito, a saber, o programa de reestruturação da indústria siderúrgica polaca, conclusão esta do Tribunal que não foi, aliás, contestada pelas recorrentes, e, pelo facto de a liquidação da HCz aí estar expressamente prevista, a HCz não podia legalmente ser abrangida pela Decisão do Conselho 2003/588.

122    Em segundo lugar, há que lembrar que, segundo jurisprudência assente, o princípio da protecção da confiança legítima se inscreve entre os princípios fundamentais da União (v., designadamente, acórdão de 5 de Maio de 1981, Dürbeck, 112/80, Recueil, p. 1095, n.° 48).

123    Decorre ainda da jurisprudência que qualquer particular pode invocar o princípio da protecção da confiança legítima quando se encontre numa situação da qual resulte que a administração comunitária, ao dar‑lhe garantias precisas, gerou nele esperanças fundadas (acórdãos de 16 de Dezembro de 1987, Delauche/Comissão, 111/86, Colect., p. 5345, n.° 24; de 25 de Maio de 2000, Kögler/Tribunal de Justiça, C‑82/98 P, Colect., p. I‑3855, n.° 33; e de 22 de Junho de 2006, Bélgica e Forum 187/Comissão, C‑182/03 e C‑217/03, Colect., p. I‑5479, n.° 147). As garantias dadas devem, além disso, respeitar as normas aplicáveis (v., neste sentido, acórdãos de 20 de Junho de 1985, Pauvert/Tribunal de Contas, 228/84, Recueil, p. 1969, n.os 14 e 15, e de 6 de Fevereiro de 1986, Vlachou/Tribunal de Contas, 162/84, Colect., p. 481, n.° 6).

124    Ora, basta verificar que, em no que respeita à condição das garantias precisas, contrariamente ao que alegam as recorrentes, uma proposta de decisão da Comissão submetida ao Conselho não pode servir de base a qualquer confiança legítima na conformidade dos auxílios controvertidos com as regras do direito da União.

125    Com efeito, ao não retomar os termos da exposição de motivos da proposta da Comissão, a Decisão do Conselho 2003/588 não pode dar lugar a uma confiança legítima no que respeita à regularidade dos auxílios a favor de uma sociedade cujo plano empresarial não tinha sido submetido à Comissão e não podia por isso ser visado na referida decisão. Assim, o abandono dos referidos termos deveria ter revelado às recorrentes a alteração de posição do legislador da União face a essa regularização dos auxílios.

126    Daí resulta que, no caso em apreço, não está preenchida a condição das garantias precisas para se concluir por uma violação do princípio da protecção da confiança legítima. Consequentemente, não há que verificar as restantes condições, uma vez que estas são cumulativas.

127    Consequentemente, o Tribunal não cometeu um erro de direito ao considerar que a decisão controvertida não violou a confiança legítima das recorrentes.

128    Tendo em conta todas as considerações que antecedem, o segundo fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao terceiro fundamento

 Argumentos das partes

129    Com este fundamento, as recorrentes contestam a aprovação pelo Tribunal de Primeira Instância da taxa de juro aplicável no momento da recuperação.

130    As recorrentes afirmam que o Tribunal de Primeira Instância se limitou a verificar que a Comissão tinha seguido o procedimento estabelecido no artigo 9.°, n.° 4, do Regulamento n.° 794/2004. Ora, o Tribunal deveria ter examinado se a Comissão tinha fixado uma taxa «adequada», nos termos do artigo 14.°, n.° 2, do Regulamento n.° 659/1999, uma vez que a apreciação do carácter adequado da taxa não se esgota na verificação de que esta foi fixada em cooperação com o Estado‑Membro em causa.

131    As recorrentes consideram que o carácter «adequado» é um conceito material, independente do procedimento que a Comissão deve seguir nos casos excepcionais em que fixa a taxa de juro em estreita cooperação com um Estado‑Membro. Este conceito autónomo – que está estreitamente ligado ao facto de a Comissão dispor de uma margem de manobra e de, no final, ser esta quem fixa a taxa determinante – deve ser interpretado, o que o Tribunal não fez.

132    As recorrentes lembram que, na interpretação do referido conceito, há que ter em conta o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Junho de 1995, Siemens/Comissão (T‑459/93, Colect., p. II‑1675), que prevê que a recuperação visa restabelecer a situação tal como esta existia antes da concessão do auxílio ilegal. Para assegurar a igualdade de tratamento, há que calcular objectivamente o benefício resultante do auxílio a partir do momento em que este foi colocado à disposição da empresa beneficiária.

133    Dado que a Comissão é obrigada a restabelecer a situação que existia antes da concessão ilegal do auxílio, a cobrança de juros só pode fazer‑se para compensar as vantagens financeiras que decorram efectivamente da colocação à disposição do beneficiário dos auxílios e deve ser proporcional a estes.

134    Ao violar o princípio do restabelecimento da situação anterior e ao escolher uma taxa de referência totalmente alheia à a realidade do mercado polaco entre 1997 e 2004, a Comissão e o Tribunal de Primeira Instância, que considerou que o alcance do artigo 14.°, n.° 2, do Regulamento n.° 659/1999 se esgotava no do artigo 9.°, n.° 4 do Regulamento n.° 794/2004 quanto a este aspecto, violaram por isso estas duas disposições comunitárias.

135    No entender da Comissão, este fundamento é inadmissível. Com efeito, as recorrentes pedem ao juiz do recurso que examine um fundamento que não foi submetido ao Tribunal de Primeira Instância. O terceiro fundamento, baseado essencialmente na alegada violação do artigo 14, n.° 2, do Regulamento n.° 659/1999, não foi submetido ao Tribunal de Primeira Instância, dado que o único fundamento invocado na primeira instância no que respeita à taxa de juro era o que se referia à violação do Regulamento n.° 794/2004. Por conseguinte, as recorrentes não podem afirmar que o acórdão recorrido interpretou incorrectamente o conceito de «taxa de juro adequada», quando os fundamentos de anulação invocados não requeriam que o Tribunal de Primeira Instância interpretasse este conceito.

136    Subsidiariamente, a Comissão salienta que as recorrentes partem de uma premissa errada ao pretenderem que o Tribunal considerou que o alcance do artigo 14.°, n.° 2, do Regulamento n.° 659/1999 se esgota no do artigo 9.°, n.° 4, do Regulamento n.° 794/2004, ou seja, que o Tribunal decidiu que a taxa de juro fixada pela Comissão era adequada pela simples razão de ter sido fixada «em estreita cooperação com o Estado‑Membro».

137    Contudo, ao contrário de que as recorrentes afirmam, o Tribunal de Primeira Instância não se limitou a verificar que a Comissão tinha seguido o procedimento em vigor, uma estreita cooperação com o Estado‑Membro, mas pronunciou‑se sobre a justeza da taxa adoptada lembrando a margem de apreciação da Comissão e examinando as razões pelas quais esta pôs de parte determinadas propostas. Por outro lado, o Tribunal de Primeira Instância concluiu daí que não estava demonstrado um «erro manifesto de apreciação» e que o cálculo dos juros numa base composta decorria obrigatoriamente do Regulamento n.° 794/2004 (n.os 159 a 167 do acórdão recorrido).

138    Dado que o presente recurso não apresenta qualquer argumento susceptível de por em causa o raciocínio do Tribunal de Primeira Instância, e que não contém qualquer crítica válida ao mesmo, a Comissão é de opinião que o Tribunal analisou correctamente os argumentos das recorrentes, mantendo‑se dentro dos limites do fundamento de anulação conforme foi suscitado na primeira instância e que não submetia ao Tribunal a questão do carácter «adequado» da taxa de juro à luz do artigo 14.°, n.° 2, do Regulamento n.° 659/1999.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

–       Quanto à admissibilidade

139    No que respeita à excepção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão baseada no facto de o terceiro fundamento, assente essencialmente na alegada violação do artigo 14.°, n.° 2, do Regulamento n.° 659/1999, não ter sido invocado no processo no Tribunal de Primeira Instância, é de recordar que resulta da jurisprudência referida no n.° 83 do presente acórdão que, com efeito, um fundamento apresentado pela primeira vez no recurso interposto para o Tribunal de Justiça deve, em princípio, ser julgado inadmissível.

140    Assim, há que concluir que as recorrentes pedem que o Tribunal de Justiça examine a legalidade da taxa de juro fixada pela Comissão por referência ao seu carácter adequado à luz do artigo 14.°, n.° 2, do Regulamento n.° 659/1999. Contudo, este fundamento não foi submetido ao Tribunal de Primeira Instância, tendo o único fundamento invocado neste Tribunal a respeito da taxa de juro sido o que se refere à violação do Regulamento n.° 794/2004. Consequentemente, é procedente a excepção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão baseada no carácter novo do fundamento adiantado pelas recorrentes.

141    Daqui resulta que o terceiro fundamento, na medida em que assenta na alegada violação do artigo 14.°, n.° 2, do Regulamento n.° 659/1999, deve ser julgado inadmissível. Em contrapartida, no que respeita ao Regulamento n.° 794/2004, o terceiro fundamento é admissível.

–       Quanto ao mérito

142    No que se refere ao mérito deste fundamento, basta referir que, uma vez que é inadmissível o terceiro fundamento na medida em que assenta numa alegada violação do artigo 14.°, n.° 2, do Regulamento n.° 659/1999, o terceiro fundamento baseado na alegada violação do artigo 9.°, n.° 4, do Regulamento n.° 794/2004 relativo à fixação de uma taxa adequada se afigura destituído de conteúdo, como afirmou correctamente a Comissão. Com efeito, é impossível distinguir, na argumentação das recorrentes, uma crítica formulada ao Tribunal de Primeira Instância que se baseie exclusivamente numa alegada violação do artigo 9.°, n.° 4, do Regulamento n.° 794/2004 e não no conceito de «taxa adequada» na acepção do artigo 14.°, n.° 2, do Regulamento n.° 659/1999.

143    Por conseguinte, o presente fundamento deve ser julgado improcedente.

144    Dado que nenhum dos fundamentos é procedente, deve ser negado provimento ao recurso na totalidade.

 Quanto às despesas

145    Nos termos do artigo 122.°, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, se o recurso for julgado improcedente, o Tribunal de Justiça decidirá sobre as despesas. Nos termos do artigo 69.°, n.° 2, do mesmo regulamento, aplicável ao processo de recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância por força do artigo 118.° do mesmo regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação das recorrentes e tendo estas sido vencidas, há que condená‑las nas despesas.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A ISD Polska sp. z o.o. e a Industrial Union of Donbass Corp. são condenadas nas despesas.

Assinaturas


* Língua do processo: francês.