Language of document : ECLI:EU:C:2024:365

Edição provisória

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

NICHOLAS EMILIOU

apresentadas em 25 de abril de 2024 (1)

Processo C239/23

Karl und Georg Anwander GbR Güterverwaltung

contra

Land BadenWürttemberg,

sendo interveniente

Freistaat Bayern

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Verwaltungsgericht Sigmaringen (Tribunal Administrativo de Sigmaringen, Alemanha)]

«Reenvio prejudicial — Agricultura — Financiamento pelo Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER) — Pagamentos a favor de zonas sujeitas a condicionantes naturais ou a outras condicionantes específicas — Zonas de montanha — Subsídio compensatório — Exclusão do pagamento de áreas situadas na região contígua pertencente a outra zona administrativa»






I.      Introdução

1.        O início do ano de 2024 ficou marcado por manifestações e barricadas organizadas por agricultores em vários Estados‑Membros da União Europeia (2). Embora reclamassem condições de concorrência leal entre os agricultores da União e uma melhoria das suas condições remuneratórias, denunciavam igualmente toda a lentidão administrativa que não lhes permite aceder, em tempo suficientemente útil, aos auxílios prometidos, designadamente no âmbito da política agrícola comum.

2.        O presente processo é mais um exemplo das dificuldades práticas com que os agricultores se veem confrontados.

3.        O Regulamento (UE) n.° 1305/2013 (3) institui um regime de auxílios ao desenvolvimento rural e prevê que os Estados‑Membros possam optar por compensar os agricultores cujas terras se situam em zonas sujeitas a condicionantes naturais. Foi esta a opção da Alemanha que, no entanto, remeteu para os Länder a determinação das condições de elegibilidade e a verificação do respetivo cumprimento. Embora nenhum destes Länder tenha competência para conceder um apoio para uma terra que não esteja situada dentro dos limites do seu território, cada Land decide sobre o pagamento para as terras no âmbito da sua competência territorial.

4.        A situação revela‑se um pouco kafkiana porque, como no processo principal, apesar de todas as terras da exploração de um agricultor serem elegíveis para o pagamento dessa compensação por preencherem as condições materiais definidas respetivamente por cada um dos dois Länder em causa, esse agricultor encontra‑se impedido de aceder a uma compensação relativa à parte dessas terras não situada no Land do local da sede da sua exploração, dado só ser possível apresentar um pedido de apoio no Land onde se situa esta sede.

II.    Quadro jurídico

A.      Direito da União

1.      Regulamento n.° 1305/2013

5.        Os considerandos 7, 9 e 26 do Regulamento n.° 1305/2013 têm a seguinte redação:

«(7)      A fim de assegurar o arranque imediato e a execução eficiente dos programas de desenvolvimento rural, o apoio do FEADER deverá assentar na existência de condições de enquadramento administrativo que sejam adequadas. Por conseguinte, os Estados‑Membros deverão avaliar a aplicabilidade e o cumprimento de certas condicionalidades ex ante. Cada Estado‑Membro deverá preparar, quer um programa nacional de desenvolvimento rural para todo o seu território, quer um conjunto de programas regionais, quer um programa nacional e um conjunto de programas regionais. Cada programa deverá definir uma estratégia para atingir os objetivos ligados às prioridades da União em matéria de desenvolvimento rural e uma seleção de medidas. A programação deverá respeitar as prioridades da União no domínio do desenvolvimento rural, adaptando‑se simultaneamente aos contextos nacionais e complementando as outras políticas da União, nomeadamente a política de mercados agrícolas, a política de coesão e a política comum das pescas. Os Estados‑Membros que optem por preparar um conjunto de programas regionais deverão poder elaborar também um quadro nacional, sem dotação orçamental distinta, para facilitar a coordenação entre as regiões na resposta aos desafios à escala nacional.

[...]

(9)      Os programas de desenvolvimento rural deverão identificar as necessidades da zona abrangida e descrever uma estratégia coerente para lhes dar resposta, à luz das prioridades da União em matéria de desenvolvimento rural. Essa estratégia deverá basear‑se na fixação de objetivos. Deverão ser estabelecidas relações entre as necessidades identificadas, os objetivos fixados e a escolha das medidas selecionadas para os concretizar. Os programas de desenvolvimento rural deverão conter igualmente todas as informações necessárias para avaliar a sua conformidade com os requisitos do presente regulamento.

[...]

(26)      A fim de assegurar uma utilização eficaz dos fundos da União e a igualdade de tratamento dos agricultores da União, as zonas de montanha e as zonas sujeitas a condicionantes naturais ou a outras condicionantes específicas deverão ser definidas segundo critérios objetivos. No caso das zonas sujeitas a condicionantes naturais, esses critérios deverão ser biofísicos e corroborados por provas científicas sólidas. Deverão ser adotadas disposições transitórias que permitam uma eliminação progressiva dos pagamentos em zonas que, em resultado da aplicação destes critérios, deixam de ser consideradas como zonas sujeitas a condicionantes naturais.»

6.        O artigo 1.°, n.° 1, deste regulamento dispõe:

«O presente regulamento estabelece as regras gerais que regulam o apoio da União ao desenvolvimento rural financiado pelo [FEADER] e criado pelo Regulamento (UE) n.° 1306/2013 [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro de 2013 relativo ao financiamento, à gestão e ao acompanhamento da Política Agrícola Comum e que revoga os Regulamentos (CEE) n.° 352/78, (CE) n.° 165/94, (CE) n.° 2799/98, (CE) n.° 814/2000, (CE) n.° 1200/2005 e n.° 485/2008 do Conselho (JO 2013, L 347, p. 549)]. O presente regulamento define os objetivos para os quais a política de desenvolvimento rural deve contribuir e as prioridades específicas da União em matéria de desenvolvimento rural. O presente regulamento descreve o contexto estratégico no qual se inscreve a política de desenvolvimento rural e define as medidas a tomar para aplicar a política de desenvolvimento rural. Além disso, o presente regulamento estabelece as regras relativas à programação, à ligação em rede, à gestão, ao acompanhamento e à avaliação, com base em responsabilidades partilhadas entre os Estados‑Membros e a Comissão e as regras que garantem a coordenação do FEADER com outros instrumentos da União.»

7.        O artigo 5.°, primeiro parágrafo, ponto 4, alínea a), do referido regulamento prevê:

«Os objetivos do desenvolvimento rural, que contribuem para a consecução da estratégia Europa 2020 para um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo, são realizados através das seguintes seis prioridades da União em matéria de desenvolvimento rural, que refletem os objetivos temáticos pertinentes do [Quadro Estratégico Comum (QEC)]:

[...]

4)      Restaurar, preservar e melhorar os ecossistemas ligados à agricultura e à silvicultura, com especial incidência nos seguintes domínios:

a)      restauração, preservação e reforço da biodiversidade, inclusivamente nas zonas Natura 2000, e nas zonas sujeitas a condicionantes naturais ou outras condicionantes específicas, e nos sistemas agrários de elevado valor natural, bem como do estado das paisagens europeias».

8.        O artigo 6.°, n.° 2, do mesmo regulamento enuncia:

«Os Estados‑Membros podem apresentar um programa único para todo o seu território, um conjunto de programas regionais. Em alternativa, em casos devidamente justificados, podem apresentar um programa nacional e um conjunto de programas regionais. Se um Estado‑Membro apresentar um programa nacional e um conjunto de programas regionais, as medidas e/ou os tipos de operações serão programados a nível nacional ou a nível regional, sendo assegurada a coerência entre as estratégias dos programas nacionais e regionais.»

9.        O artigo 31.°, n.os 1 e 2, do Regulamento n.° 1305/2013 prevê:

«1.      Os pagamentos aos agricultores de zonas de montanha ou outras zonas sujeitas a condicionantes naturais ou outras condicionantes específicas são concedidos anualmente, por hectare de superfície agrícola, para os compensar pela totalidade ou parte dos custos adicionais e pela perda de rendimentos resultantes das limitações à produção agrícola na zona em causa.

[...]

2.      São concedidos pagamentos aos agricultores que se comprometam a prosseguir a sua atividade agrícola em zonas designadas nos termos do artigo 32.° e sejam agricultores ativos na aceção do artigo 9.° do Regulamento [(UE) n.° 1307/2013 (4)], tal como aplicável no Estado‑Membro em causa.»

10.      O artigo 32.° do Regulamento n.° 1305/2013 tem a seguinte redação:

«1.      Os Estados‑Membros, com base no disposto nos n.os 2 a 4, designam as zonas elegíveis para os pagamentos previstos no artigo 31.°, nas categorias seguintes:

a)      Zonas de montanha;

b)      Zonas, que não as zonas de montanha, sujeitas a condicionantes naturais significativas; e

c)      Outras zonas afetadas por condicionantes específicas[.]

2.       Para serem elegíveis para os pagamentos previstos no artigo 31.°, as zonas de montanha devem caracterizar‑se por uma limitação considerável das possibilidades de utilização das terras e por um aumento apreciável dos custos de produção devido a:

a)      Condições climáticas muito difíceis, decorrentes da altitude, que se traduzam por um encurtamento sensível do período vegetativo;

b)      Em altitudes inferiores, presença na maior parte da zona em questão de fortes declives que impeçam o uso de máquinas ou exijam o uso de equipamento específico muito oneroso, ou uma combinação destes dois fatores, quando as condicionantes resultantes de cada um deles considerado separadamente sejam menos severas, mas a sua combinação dê lugar a uma condicionante equivalente.

[…]

3.      Para efeitos de elegibilidade para os pagamentos previstos no artigo 31.°, zonas, que não as zonas de montanha, são consideradas sujeitas a condicionantes naturais significativas se, pelo menos, 60 % da superfície agrícola satisfizer, no mínimo, um dos critérios enumerados no anexo III, no valor‑limiar indicado.

O cumprimento destas condições é assegurado ao nível das unidades administrativas locais (nível UAL 2) ou ao nível de uma unidade local claramente delineada que abranja uma única zona geográfica contígua inequívoca com uma identidade económica e administrativa definível.

[...]»

2.      Regulamento n.° 1307/2013

11.      O artigo 9.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1307/2013 dispõe:

«Não são concedidos pagamentos diretos a pessoas singulares ou coletivas, ou a grupos de pessoas singulares ou coletivas, cujas superfícies agrícolas são sobretudo superfícies naturalmente mantidas num estado adequado para pastoreio ou cultivo e que não exercem nessas superfícies a atividade mínima definida pelos Estados‑Membros nos termos do artigo 4, n.° 2, alínea b).»

B.      Direito alemão

1.      Direito federal

12.      O § 2.° da Verordnung über die Durchführung von Stützungsregelungen und des Integrierten Verwaltungs‑ und Kontrollsystems (Regulamento do Ministério Federal da Alimentação e da Agricultura, adotado em concertação com o Ministério Federal das Finanças e com o da Economia e da Energia, de Execução de Regimes de Apoio e do Sistema Integrado de Gestão e Controlo), de 24 de fevereiro de 2015 (5), prevê:

«1.      Salvo disposição em contrário prevista no presente regulamento ou no § 1, n.° 1, pontos 4 a 6, os órgãos competentes do Land, de acordo com a lei deste (órgãos competentes do Land), no qual o agricultor tem a sede da sua exploração, são territorialmente competentes para efeitos da execução do presente regulamento e das disposições previstas no § 1, n.° 1.

2.      A sede da exploração pertinente para efeitos da determinação do órgão do Land competente é, sob reserva de uma devolução de competência nos termos do n.° 3, o local situado na área do serviço de finanças competente para a liquidação do imposto sobre o rendimento do agricultor. Para as pessoas coletivas, grupos de pessoas coletivas ou singulares e patrimónios, o órgão competente é o órgão do Land no qual se encontra o órgão de direção dos mesmos.

3.      Se o agricultor tiver um único estabelecimento e este se situar num Land diferente daquele onde está localizada a sede da exploração, ao órgão do Land da área do estabelecimento pode ser devolvida a competência no âmbito de aplicação do presente regulamento, em concertação com o órgão do Land territorialmente competente por força do n.° 2 e com o consentimento do agricultor; a sede da exploração será, assim, o local do estabelecimento.

[…]»

2.      Direito do Land de BadenWurttemberg

13.      O ponto 1.1 da Verwaltungsvorschrift des Ministeriums Ländlicher Raum zur Förderung landwirtschaftlicher Betriebe in Berggebieten und in bestimmten benachteiligten Gebieten (VwV Ausgleichszulage Landwirtschaft) (Regulamento administrativo do Ministério do Espaço Rural para o apoio das explorações agrícolas em zonas de montanha e em certas zonas sujeitas a condicionantes), de 6 de novembro de 2019 (6), conforme alterado pela Verwaltungsvorschrift (Regulamento administrativo) de 15 de novembro de 2021 (a seguir «VwV AZL») (7) prevê:

«Este apoio tem por objetivo assegurar, em zonas sujeitas a condicionantes [zonas de montanha, zonas sujeitas a condicionantes por razões naturais significativas, zonas sujeitas a condicionantes por outras razões específicas, exceto zonas de montanha segundo a lista das zonas em vigor (v. ponto 4 [da VwV AZL])], a utilização sustentável das superfícies agrícolas através da sua exploração e contribuir, assim, para a conservação da paisagem, bem como para a manutenção e fomento de medidas de exploração sustentável.»

14.      O ponto 2.1 da VwV AZL dispõe:

«O apoio é destinado unicamente às agricultoras e aos agricultores ativos na aceção do artigo 9.° do Regulamento [n.° 1307/2013] que explorem eles próprios áreas situadas em zonas sujeitas a condicionantes, delimitadas ex novo, do Baden‑Württemberg. Só pode ser concedido apoio às agricultoras e aos agricultores cuja sede da exploração, na aceção do § 2 do InVeKoSV, se situe no Baden‑Württemberg e cuja empresa tenha a sua sede social num Estado‑Membro da União.»

15.      Nos termos do ponto 3.2.1 da VwV AZL:

«É concedida uma compensação apenas para as áreas situadas nas zonas elegíveis delimitadas ex novo do Baden‑Württemberg (v. ponto 4.2).»

16.      O ponto 4.2 da VwV AZL prevê:

«Devem ser inscritas no registo das zonas [...] e são pertinentes as seguintes categorias de zonas (zonas sujeitas a condicionantes):

zonas de montanha,

zonas, que não as zonas de montanha, sujeitas a condicionantes naturais significativas,

outras zonas afetadas por condicionantes específicas.»

3.      Direito do Land da Baviera

17.      A Richtlinie des Bayerischen Staatsministeriums für Ernährung, Landwirtschaft und Forsten zur Gewährung der Ausgleichszulage in benachteiligten Gebieten (AGZ) gemäß Verordnung (EU) Nr. 1305/2013 (Diretiva do Ministério do Estado da Baviera para Alimentação, Agricultura e Florestas, de 1 de março de 2019, relativa à Concessão de Subsídios Compensatórios para Zonas Sujeitas a Condicionantes, nos termos do Regulamento n.° 1305/2013), de 1 de março de 2019 (a seguir «AGZ») (8), prevê que pode ser concedido um subsídio compensatório às superfícies agrícolas situadas em zonas de Baviera sujeitas a condicionantes. Para beneficiar do apoio, o agricultor deve explorar uma superfície agrícola sujeita a condicionantes na Baviera, com uma área mínima de três hectares, e ter neste Land a sede da sua exploração.

III. Factos na origem do litígio, processo principal e questões prejudiciais

18.      Karl und Georg Anwander Güterverwaltung, a recorrente no processo principal, é uma exploração leiteira na região fronteiriça entre o Land de Baden‑Württemberg e o Land da Baviera, na Alemanha. Tem a sua sede social no Land de Baden‑Württemberg. Dispõe de aproximadamente 100 hectares neste Land e aproximadamente 27 hectares da sua exploração situam‑se na Baviera. Todas estas áreas se situam numa zona de montanha.

19.      As autoridades do Land de Baden‑Württemberg classificaram os 100 hectares da exploração da recorrente no processo principal situados no território deste Land como superfície elegível para o pagamento de um subsídio compensatório devido às condicionantes naturais a que estão sujeitas essas terras. As autoridades do Land da Baviera procederam do mesmo modo quanto aos 27 hectares dessa exploração situados em território bávaro.

20.      Até 2018, a recorrente no processo principal obteve da autoridade competente do Land de Baden‑Württemberg o pagamento do subsídio compensatório para a totalidade da área de que dispõe, incluindo, assim, a situada na Baviera.

21.      Em 8 de maio de 2019, a recorrente no processo principal apresentou, junto da mesma autoridade, um pedido de subsídio compensatório referente ao ano de 2019 para todas as suas superfícies elegíveis.

22.      Em 5 de dezembro de 2019, os serviços administrativos do Land de Baden‑Württemberg concederam à recorrente no processo principal um subsídio compensatório de 4 095,66 euros para as superfícies elegíveis situadas neste Land e indeferiram o pedido quanto às superfícies situadas na Baviera pelo facto de não se situarem em Baden‑Württemberg.

23.      Por decisão de 11 de maio de 2021, o Regierungspräsidium Tübingen (Governo da região de Tübingen, Alemanha) indeferiu a reclamação apresentada pela recorrente no processo principal contra a decisão de 5 de dezembro de 2019.

24.      Em 17 de junho de 2021, a recorrente no processo principal interpôs recurso no órgão jurisdicional de reenvio pedindo, por um lado, a anulação da decisão de 5 de dezembro de 2019, confirmada pela decisão de 11 de maio de 2021, e, por outro, a concessão de um subsídio compensatório no montante de 1 371,26 euros para as superfícies elegíveis situadas na Baviera. A título subsidiário, pede que seja declarado que o indeferimento do seu pedido relativo a estas superfícies e os respetivos fundamentos jurídicos (9) são contrários aos artigos 31.° e 32.° do Regulamento n.° 1305/2013.

25.      O órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas quanto à interpretação destes dois artigos e quanto ao âmbito da margem de discricionariedade dos Estados‑Membros no que diz respeito às condições de concessão de subsídios compensatórios como os solicitados pela recorrente no processo principal.

26.      O órgão jurisdicional de reenvio indica, antes de mais, que muitas subvenções são concedidas por diferentes subdivisões da República Federal da Alemanha ou por outros detentores do poder público na Alemanha através de «disposições administrativas», cujos destinatários são os funcionários e os colaboradores da entidade administrativa em causa, que definem as modalidades de exercício do poder de apreciação dessa entidade. Os particulares não podem, ao abrigo da legislação nacional, invocar diretamente contra o Estado as regras contidas nestas disposições administrativas, uma vez que não se considera que as mesmas produzam efeitos externos em relação aos cidadãos (10).

27.      O órgão jurisdicional de reenvio precisa em seguida que as condições substantivas e adjetivas que regem a concessão dos pagamentos para todas as zonas sujeitas às condicionantes naturais previstas no artigo 31.° do Regulamento n.° 1305/2013 são reguladas pelas disposições administrativas do Ministério do Espaço Rural e da Proteção dos Consumidores do Land de Baden‑Württemberg. Daí resulta que, para que um requerente possa beneficiar desses pagamentos, deve ter a sede da sua exploração (11) no Baden‑Württemberg, onde deve situar‑se a superfície para a qual o subsídio compensatório é pedido e ser designada por este Land como uma zona sujeita a condicionantes. A apresentação de um pedido de apoio só é possível no Land em que se situa a sede da exploração do requerente. Uma vez que as autoridades administrativas alemãs efetuam uma comparação de dados em diversas aplicações utilizadas pelos Länder para verificar se o requerente não apresentou já, noutro sítio, um pedido de subsídio compensatório, não é possível apresentar vários pedidos de apoio em vários Länder. Esse pedido só pode ser apresentado no Land em que se situa a sede da exploração.

28.      O órgão jurisdicional de reenvio indica ainda que decorre da prática administrativa do Land da Baviera, no que se refere às decisões de concessão de um subsídio compensatório, que, para beneficiar desse subsídio, o requerente deve ter a sede da sua exploração neste Land e a área para a qual ele é pedido, que deve ter sido reconhecida pelo referido Land como sujeita a condicionantes naturais, também deve estar situada na Baviera. Por conseguinte, um requerente cujas terras se situem no território de dois Länder só pode apresentar um pedido no Land em que tem a sua sede da exploração. Os órgãos jurisdicionais administrativos bávaros já declararam que essa situação não é contrária ao direito da União uma vez que não decorreria do Regulamento n.° 1305/2013 nenhum direito direto à concessão de um subsídio compensatório pelo órgão competente do Land e que esse órgão podia, portanto, determinar as modalidades de concessão desse subsídio e excluir do apoio as superfícies situadas fora da Baviera (12).

29.      Assim, a recorrente no processo principal encontra‑se na seguinte situação. Embora possua terras situadas em dois Länder e cada um destes Länder tenha designado essas terras zonas elegíveis para a concessão de um subsídio compensatório, a recorrente no processo principal só pode requerer a concessão desse subsídio 1) no Land em que se situa a sede da sua exploração e 2) apenas para as superfícies situadas neste último. No estado atual da regulamentação e das práticas administrativas, a recorrente não pode receber subsídios compensatórios do Land de Baden‑Württemberg para as suas superfícies situadas na Baviera e não pode apresentar um pedido relativamente a estas superfícies na Baviera.

30.      O órgão jurisdicional de reenvio, primeiro, pretende ser esclarecido sobre a dimensão da margem de manobra que o direito da União reconhece aos Estados‑Membros na determinação das regras de concessão das medidas de apoio aos agricultores, em especial numa situação como a que está em causa no processo principal, que se refere a superfícies elegíveis situadas em duas zonas da competência de autoridades administrativas locais diferentes. Segundo, o órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas quanto à questão de saber se, prevendo o Estado‑Membro ou a sua região a possibilidade de conceder um subsídio compensatório, daí decorre, ao abrigo do artigo 31.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1305/2013, um direito ao pagamento que pode ser invocado pelo particular em causa. Terceiro, o órgão jurisdicional de reenvio refere que as disposições administrativas em que se baseia a política de apoio de cada Land não poderiam ser invocadas diretamente pelos particulares e que só a prática das autoridades administrativas seria vinculativa em relação a estes últimos. A impugnação dessa prática seria, todavia, limitada à mera invocação do princípio constitucionalmente garantido da igualdade de tratamento. Na hipótese de o Regulamento n.° 1305/2013 não consagrar um direito ao pagamento, este órgão jurisdicional pergunta se o artigo 31.°, n.° 1, deste regulamento determina a «natureza jurídica», nas suas palavras, que devem revestir os atos adotados pelo Estado‑Membro ou pela região que deliberou conceder um subsídio compensatório para o qual fixam as condições de elegibilidade.

31.      Neste contexto, o Verwaltungsgericht Sigmaringen (Tribunal Administrativo de Sigmaringen, Alemanha) decidiu suspender a instância e, por decisão que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 17 de abril de 2023, submeter ao Tribunal de Justiça as questões prejudiciais seguintes:

«1)      São compatíveis com o artigo 31.°, n.os 1, primeiro parágrafo, e 2, bem como com o artigo 32.°, n.os 1, alínea a), 2, primeiro parágrafo, e 3, segundo e terceiro parágrafos, do Regulamento [n.° 1305/2013], a disposição administrativa e a prática em matéria de apoios que, a nível nacional, excluem o pagamento de subsídio compensatório para áreas em zonas de montanha e em certas zonas sujeitas a condicionantes, pelo mero facto de a área a apoiar através do referido subsídio compensatório se situar fora da região do Estado‑Membro, na aceção do artigo 2.°, n.° 1, segundo parágrafo, alínea b), do Regulamento [n.° 1305/2013], que concede o subsídio compensatório? O local da sede da exploração do agricultor que opera a área em causa constitui um critério diferenciador admissível para este efeito?

2)      Deve o artigo 31.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do Regulamento [n.° 1305/2013] ser interpretado no sentido de o regime jurídico dos Estados‑Membros ou das regiões dos Estados‑Membros que tenham optado por proceder a pagamentos aos agricultores de zonas de montanha ou outra zonas sujeitas a condicionantes, na aceção do artigo 31.°, n.° 1, do Regulamento [n.° 1305/2013], ter de encontrar‑se configurado em termos tais que o pagamento também tenha de ser concedido relativamente a áreas que tenham sido classificadas como zonas de montanha ou como outras zonas sujeitas a condicionantes, na aceção do artigo 32.°, n.° 1, do Regulamento [n.° 1305/2013], por outro Estado‑Membro ou por outra região do Estado‑Membro em causa, que tenha igualmente optado por proceder a pagamentos aos agricultores de zonas de montanha ou outras zonas sujeitas a condicionantes, na aceção do artigo 31.°, n.° 1, do Regulamento [n.° 1305/2013]?

3)      Deve o artigo 31.°, n.os 1, primeiro parágrafo, e 2, do Regulamento [n.° 1305/2013] ser interpretado no sentido de que, em princípio, deste artigo decorre diretamente um direito do agricultor previsto pelo direito da União, à concessão de apoio (subsídio compensatório) pelo Estado‑Membro ou pela região do Estado‑Membro em causa, sempre que o agricultor seja agricultor ativo e explore áreas que tenham sido classificadas pelo Estado‑Membro ou pela região do Estado‑Membro em causa como zonas de montanha ou outras zonas sujeitas a condicionantes, na aceção do artigo 32.°, n.° 1, do Regulamento [n.° 1305/2013] e o Estado‑Membro em causa ou a sua região tenha optado por disponibilizar apoios (subsídios compensatórios), na aceção do artigo 31.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do Regulamento [n.° 1305/2013]?

Em caso de resposta afirmativa a esta questão:

a)      Contra quem deve ser exercido o direito, previsto pelo direito da União nos termos do artigo 31.°, n.° 1, do Regulamento [n.° 1305/2013]? É exercido, em qualquer circunstância, contra o próprio Estado‑Membro, ou é exercido contra a região [artigo 2.°, n.° 1, segundo parágrafo, alínea b), do Regulamento (n.° 1305/2013)] sempre que esta tenha optado, independentemente do Estado‑Membro, por conceder subsídios compensatórios a agricultores, nos termos do artigo 31.° do Regulamento [n.° 1305/2013]?

b)      Este direito previsto pelo direito da União pressupõe, em princípio, o cumprimento, pelo agricultor, de outros requisitos, para além dos que se encontram previstos no artigo 31, n.os 1, primeiro parágrafo, e 2, do Regulamento [n.° 1305/2013], previstos em regras nacionais de execução adotadas pelo Estado‑Membro que concede o subsídio compensatório ou pela respetiva região?

4)      Em caso de resposta negativa à terceira questão:

Deve o artigo 31.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do Regulamento [n.° 1305/2013] ser interpretado no sentido de o regime jurídico de um certo Estado‑Membro ou de uma sua região, que contenha os pressupostos da concessão de apoio (subsídio compensatório) na aceção do artigo 31.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do Regulamento [n.° 1305/2013] ter de apresentar uma natureza jurídica conducente a que os agricultores tenham direito à concessão do apoio (subsídio compensatório) sempre que cumpram os pressupostos dessa concessão, tal como estabelecidos pelo Estado‑Membro respetivo ou pela sua região, independentemente da prática em matéria de apoios de facto seguida pelo Estado‑Membro ou pela sua região?»

32.      Foram apresentadas observações escritas pela recorrente no processo principal, pelo Land de Baden‑Württemberg, pelo Land da Baviera e pela Comissão Europeia.

IV.    Análise

33.      Antes de responder às questões prejudiciais, deter‑me‑ei sobre o regime instituído pelo Regulamento n.° 1305/2013 a favor das zonas sujeitas a condicionantes naturais como as zonas de montanha (A). Em seguida, responderei conjuntamente às duas primeiras questões prejudiciais (B). Terminarei a análise pela minha proposta de resposta à terceira questão (C), antes de expor as razões pelas quais a quarta questão não necessita, na minha opinião, de resposta (D).

A.      Quanto ao regime instituído pelo Regulamento n.° 1305/2013 a favor das zonas sujeitas a condicionantes naturais

34.      O Regulamento n.° 1305/2013 estabelece as regras gerais que regulam o apoio da União ao desenvolvimento rural, financiado pelo FEADER e define os objetivos para os quais a política de desenvolvimento rural deve contribuir e as prioridades específicas da União para o desenvolvimento rural (13).

35.      Este regulamento estabelece igualmente as regras relativas à programação (14) «com base em responsabilidades partilhadas entre os Estados‑Membros e a Comissão» (15). O apoio do FEADER deve ser solicitado com vista à realização dos objetivos de desenvolvimento rural prosseguidos no âmbito destas prioridades (16) através de programas de apoio ao desenvolvimento rural definidos pelos Estados‑Membros (17) que executam uma estratégia destinada a dar resposta às prioridades da União tal como definidas no Regulamento n.° 1305/2013 com base num conjunto de medidas definidas no título III deste regulamento.

36.      Ao abrigo destas medidas encontram‑se os pagamentos a favor de zonas sujeitas a condicionantes naturais ou a outras condicionantes específicas (18). Estes pagamentos contribuem para a realização da prioridade da União para o desenvolvimento sustentável que consiste na «restauração, preservação e reforço da biodiversidade» (19). O Regulamento n.° 1305/2013 prevê que estes pagamentos são concedidos aos agricultores dessas zonas anualmente, por hectare de superfície agrícola, para os «compensar pela totalidade ou parte dos custos adicionais e pela perda de rendimentos resultantes das limitações à produção agrícola na zona em causa» (20). Os pagamentos são concedidos aos agricultores «ativos» (21) e que se comprometam a prosseguir a sua atividade agrícola em zonas designadas nos termos do artigo 32.° desse regulamento (22). O referido regulamento fixa, em seguida, os montantes mínimo e máximo dos pagamentos (23) e prevê a possibilidade de os Estados‑Membros os aumentarem em determinados casos (24) ou preverem que os mesmos sejam degressivos (25). Em princípio, a elegibilidade da despesa é determinada de acordo com as regras nacionais (26).

37.      No que respeita à designação pelos Estados‑Membros de terras situadas em zonas sujeitas a condicionantes naturais e a outras condicionantes específicas, a mesma observa os princípios fixados no artigo 32.° do Regulamento n.° 1305/2013. Deste resulta, em substância, que as zonas de montanha designadas devem caracterizar‑se por «uma limitação considerável das possibilidades de utilização das terras e por um aumento apreciável dos custos de produção» (27). A fim de assegurar uma utilização eficaz dos fundos da União destinados a apoiar as ações dos Estados‑Membros, bem como a igualdade de tratamento, essas zonas deveriam ser definidas segundo critérios objetivos de natureza biofísica e corroborados por provas científicas sólidas (28).

38.      Assim, o Regulamento n.° 1305/2013 deixa inegavelmente uma ampla margem de apreciação aos Estados‑Membros quanto à questão de saber se pretendem incluir nos respetivos programas um mecanismo de compensação dos agricultores (29) cujas terras se situem em zonas sujeitas a condicionantes naturais e quanto às modalidades de execução dos auxílios que preveem (30), se se tratar, por exemplo, da execução concreta das prescrições desse regulamento (como a dimensão das explorações elegíveis ou a respetiva localização), do montante dos auxílios ou ainda de exigências documentais (31).

39.      No entanto, esta ampla margem de apreciação está sujeita a um enquadramento, como exporei nas secções seguintes.

B.      Quanto à primeira e segunda questões prejudiciais

40.      O órgão jurisdicional de reenvio questiona o Tribunal de Justiça, em substância, a respeito da compatibilidade com os artigos 31.° e 32.° do Regulamento n.° 1305/2013 de uma situação em que uma autoridade regional pode limitar o direito a um subsídio compensatório apenas às áreas elegíveis da exploração de um agricultor que se situem no território da região onde se situa a sede dessa exploração (primeira questão). O órgão jurisdicional de reenvio pergunta igualmente se os artigos 31.° e 32.° desse regulamento obrigam as autoridades de uma região a conceder o pagamento para as áreas desta mesma exploração a apoiar através do pagamento do subsídio compensatório pelas autoridades de outra região no território da qual se situem essas áreas (segunda questão).

41.      Assim, as duas primeiras questões prejudiciais, que proponho abordar conjuntamente, suscitam, nas entrelinhas, a questão de saber se a ampla margem de apreciação que acabei de descrever pode justificar uma situação na qual, considerando que um Estado‑Membro e as suas regiões previram, nos respetivos programas para o desenvolvimento rural, a possibilidade de conceder pagamentos nos termos do artigo 31.° do Regulamento n.° 1305/2013 e considerando que a execução deste plano é, pelo menos parcialmente, delegada a nível regional à autoridade dos Länder, um agricultor ativo só pode pedir uma compensação para terras elegíveis situadas no território do Land no qual tem a sede da sua exploração, excluindo assim qualquer possibilidade de compensação para as terras que este agricultor tenha no território de outro Land que, não obstante, este último considera elegíveis para os referidos pagamentos.

42.      Do pedido de decisão prejudicial decorre que o Land Baden‑Württemberg (32) descreveu pormenorizadamente os programas de apoio que tencionava adotar, nomeadamente no que se refere aos subsídios compensatórios, no âmbito de um plano de medidas e de desenvolvimento do espaço rural do Baden‑Württemberg para o período de 2014‑2020, que foi aprovado pela Comissão (33). O Land de Baden‑Württemberg explica que o montante do pagamento seria específico para o Land e, sem outra modificação, não poderia ser transferido para superfícies de outros Länder que tivessem idêntica classificação. Essa abordagem impor‑se‑ia igualmente no contexto da estrutura federal da Alemanha, devendo os Länder responsáveis pela elaboração do plano‑quadro nacional poder assegurar que o procedimento de auxílio é devidamente tramitado no âmbito das suas respetivas competências. A competência do Land de Baden‑Württemberg seria, assim, limitada ao território deste Land. A organização prática do apoio através da concessão de subsídios compensatórios insere‑se na margem de apreciação dos Estados‑Membros.

43.      Analisarei, em primeiro lugar, a questão da competência das autoridades do Land de Baden‑Württemberg para conceder o subsídio compensatório para as superfícies agrícolas da recorrente no processo principal situadas na Baviera.

44.      Começo por constatar que o facto de um Estado‑Membro, pela sua organização e estrutura internas, delegar em entidades regionais a competência para decidir a atribuição de um subsídio compensatório nas condições fixadas pelo Regulamento n.° 1305/2013 não é, evidentemente, censurável dado que a estrutura federal do Estado‑Membro em causa é uma componente da sua identidade nacional que a União tem de respeitar nos termos do artigo 4.°, n.° 2, TUE (34). Por outro lado, o Regulamento n.° 1305/2013 atribui expressamente a responsabilidade de assegurar o cumprimento das condições previstas pelo artigo 32.°, n.° 3, primeiro parágrafo, do mesmo regulamento às «unidades administrativas locais» (35) ou a unidades locais claramente delineadas que abranjam uma única zona geográfica contígua inequívoca com uma identidade económica e administrativa definível (36). Assim, o legislador da União incentiva a que o nível de execução do plano e de tomada de decisão quanto à concessão dos pagamentos previstos no artigo 31.° do referido regulamento seja o mais próximo possível dos agricultores em causa.

45.      Acrescento que a designação das zonas elegíveis para os pagamentos previstos pelo artigo 31.° do referido regulamento não se baseia apenas numa classificação puramente geográfica ou topográfica, mas pode exigir uma apreciação concreta de circunstâncias regionais específicas.

46.      Com efeito, os Estados‑Membros devem ajustar esta classificação excluindo, por exemplo, as zonas que, geograficamente, estão sujeitas a condicionantes naturais significativas, mas em relação às quais estas condicionantes puderam ser ultrapassadas «graças a investimentos ou a atividades económicas ou a uma produtividade comprovadamente normal das terras ou a métodos de produção ou a sistemas agrícolas que compensem a perda de rendimentos ou os custos adicionais» (37). Por conseguinte, é muito provável que essa apreciação possa ser levada a cabo com maior eficácia a um nível regulamentar e administrativo mais próximo da zona em causa.

47.      Como é explicado pelo Land de Baden‑Württemberg nas suas observações, do princípio da autonomia regulamentar reconhecido às entidades federadas decorre que os critérios de classificação das áreas em zonas elegíveis para os pagamentos previstos pelo artigo 31.° do Regulamento n.° 1305/2013 podem ser apreciados de forma diferente consoante o Land em causa e que uma área classificada «zona de montanha» pelo Land da Baviera pode não preencher os critérios adotados pelo Land de Baden‑Württemberg (38).

48.      Cada um dos Länder, por um lado, avalia a oportunidade de prever, ou não, subsídios compensatórios ao abrigo do artigo 31.° do Regulamento n.° 1305/2013, por outro, define as condições de elegibilidade aplicáveis no seu território, bem como o montante dos pagamentos para um hectare de zona de montanha, que pode, assim, variar de um Land para outro, e, por fim, designa as zonas em causa. Assim, cada um deles exerce, dentro dos limites da sua soberania territorial e da sua autonomia financeira, o poder de apreciação que os artigos 31.° e 32.° desse regulamento reconhecem para a respetiva execução.

49.      Atendendo a essa configuração, obrigar as autoridades do Baden‑Württemberg a pagar o subsídio compensatório à recorrente no processo principal para as superfícies agrícolas que esta possui na Baviera suscitaria, nomeadamente, o problema da determinação do montante desse subsídio e violaria o princípio da repartição de competências na ordem jurídica alemã.

50.      Em face do exposto, da minha leitura do Regulamento n.° 1305/2013 e, designadamente, do papel que este reconhece às autoridades regionais no planeamento do desenvolvimento rural e da execução e acompanhamento das medidas constantes dos planos, seja a que nível for, decorre que o artigo 31.°, n.os 1, primeiro parágrafo, e 2, assim como o artigo 32.°, n.° 1, alínea a), o n.° 2, primeiro parágrafo, e o n.° 3, segundo e terceiro parágrafos, desse regulamento devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a uma regulamentação que restrinja a competência da autoridade regional nacionalmente designada para decidir da concessão dos pagamentos previstos por essas disposições apenas às superfícies agrícolas abrangidas pela sua competência normativa.

51.      Há que analisar, em segundo lugar, a questão do critério do local da sede da exploração enquanto fator limitativo do âmbito territorial do direito ao pagamento do subsídio compensatório.

52.      Embora, como acima recordei, o legislador da União tenha feito questão de respeitar a competência plena dos Estados‑Membros para designarem as entidades competentes para a concessão dos pagamentos previstos pelo artigo 31.° do Regulamento n.° 1305/2013, também prescreveu claramente que um agricultor ativo deve poder solicitar o subsídio compensatório previsto para qualquer zona designada elegível.

53.      Com efeito, por um lado, resulta da redação do artigo 31.° do Regulamento n.° 1305/2013 que «os pagamentos aos agricultores […] são concedidos anualmente, por hectare de superfície agrícola» (39) (n.° 1) e que «são concedidos pagamentos aos agricultores que se comprometam a prosseguir a sua atividade agrícola […] e sejam agricultores ativos» (n.° 2) (40). Assim, nada indica que o legislador da União tenha considerado a possibilidade de certas áreas que preenchem as condições definidas neste regulamento não receberem o pagamento correspondente se o mesmo se encontrar previsto. Por outro lado, limitar o pagamento apenas às áreas abrangidas pela competência do Land em cuja área se situa a sede da exploração prejudica o objetivo prosseguido pelo Regulamento n.° 1305/2013, uma vez que o apoio às zonas sujeitas a condicionantes naturais responde a uma prioridade identificada pela União em matéria de desenvolvimento rural (41). Por último, o facto de a exploração de superfícies elegíveis não poder dar lugar a um subsídio compensatório em condições idênticas às do litígio no processo principal tende igualmente a pôr em causa a coerência entre as estratégias dos programas nacionais e regionais a que apela o Regulamento n.° 1305/2013 (42).

54.      Por conseguinte, seria contrário à vontade do legislador da União e ao objetivo prosseguido pelo Regulamento n.° 1305/2013 considerar que este último não se opõe a uma fixação a nível nacional das condições de concessão dos subsídios compensatórios previstos no artigo 31.° desse regulamento que resulte na exclusão de uma parte das terras, por outro lado perfeitamente elegíveis para esses subsídios, pelo simples facto de não se situarem exclusivamente numa zona geográfica contígua da competência de uma única autoridade administrativa regional. Ora, como indica o órgão jurisdicional de reenvio, a recorrente no processo principal está impossibilitada de apresentar um pedido de apoio para as suas superfícies situadas na Baviera (43), uma vez que esse pedido só pode ser apresentado às autoridades do Land da sede da exploração, e estas autoridades não são competentes quanto às terras situadas fora desse Land. O direito ao pagamento só se encontra garantido parcialmente. Tal contrasta com a letra e o espírito do Regulamento n.° 1305/2013.

55.      Por conseguinte, uma coisa é considerar que as autoridades do Land de Baden‑Württemberg só podem ser obrigadas a conceder um pagamento ao abrigo do artigo 31.° do Regulamento n.° 1305/2013, sem prejuízo do cumprimento das condições que este regulamento define para esse efeito, às terras situadas no território desse Land e, portanto, relevam da sua competência.

56.      Uma outra coisa seria declarar compatível com o Regulamento n.° 1305/2013 uma situação em que a localização da sede da exploração determine, por si só, o âmbito de aplicação territorial do direito ao pagamento e em que esse direito é excluído para as terras desta mesma exploração que não se situam no território da mesma autoridade administrativa regional que a da sede, mesmo que estas terras preencham todas as condições exigidas por esse regulamento para serem elegíveis para esse pagamento.

57.      Com efeito, uma vez que um Estado‑Membro, eventualmente através das suas regiões, opta, no seu programa para o desenvolvimento rural, por apoiar este último, nomeadamente pela atribuição de pagamentos a favor de zonas sujeitas a condicionantes naturais, não pode ignorar, no exercício da ampla margem de apreciação que, por outro lado, lhe é reconhecida (44), as condições taxativamente enumeradas pelo Regulamento n.° 1305/2013 e que consistem, por um lado, em designar elegível a zona em causa devido à sua configuração natural e às limitações à produção agrícola decorrentes dessa configuração (artigo 31.°, n.° 1, do mesmo regulamento, conforme especificado no artigo 32.°) e, por outro, ao estatuto de agricultor ativo (45) (artigo 31.°, n.° 2, do referido regulamento). Limitar o direito ao pagamento às superfícies agrícolas situadas no território do Land da sede da exploração adita, assim, uma condição não prevista pelo Regulamento n.° 1305/2013. Esta nova condição, sem nenhuma relação com os critérios biofísicos corroborados por provas científicas preconizados pelo legislador da União (46), ameaça diretamente, como referiu a Comissão, a efetividade dos subsídios compensatórios previstos por esse regulamento a favor das zonas sujeitas a condicionantes (47), as quais — devo recordar — servem um objetivo identificado a favor do desenvolvimento rural e que é uma das prioridades da União (48). A aplicação dessa condição significa que, como no caso do litígio no processo principal, áreas que preencham todas as condições previstas pelo Regulamento n.° 1305/2013 — em relação às quais, por conseguinte, uma autoridade regional verificou que reuniam todas as características exigidas para beneficiarem do mecanismo de compensação — se encontrem, pura e simplesmente, excluídas do direito ao pagamento.

58.      Uma vez que, na situação em causa no processo principal, é facto assente que as terras da recorrente no processo principal situadas na Baviera cumprem as condições definidas por este Land para serem elegíveis para um subsídio compensatório ao abrigo dos artigos 31.° e 32.° do Regulamento n.° 1305/2013, deve ser declarado que estas disposições se opõem a que o critério da sede da exploração seja utilizado como um fator limitativo do direito ao pagamento do subsídio compensatório às superfícies localizadas no Land da sede da exploração.

59.      Atendendo às considerações acima expostas, proponho ao Tribunal de Justiça que responda às duas primeiras questões prejudiciais que os artigos 31.° e 32.° do Regulamento n.° 1305/2013 devem ser interpretados no sentido de que 1) não se opõem a uma regulamentação que restrinja a competência da autoridade regional designada a nível nacional para decidir a concessão dos pagamentos previstos pelas mesmas disposições apenas às superfícies agrícolas da sua competência normativa, e 2) opõem‑se a uma regulamentação nacional que, ao prever que só as superfícies designadas elegíveis pelo Land da sede da exploração do agricultor ativo em causa é que podem dar origem ao pagamento de um subsídio compensatório, exclui qualquer possibilidade de pagamento às superfícies desta mesma exploração que foram declaradas elegíveis por outro Land.

C.      Quanto à terceira questão prejudicial

60.      No fundo, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta ao Tribunal de Justiça se os artigos 31.° e 32.° do Regulamento n.° 1305/2013 consagram um direito ao pagamento a favor do agricultor ativo que explore terras situadas em zonas sujeitas a condicionantes naturais, na aceção destas disposições, caso o Estado‑Membro ou a região em causa tenha optado por disponibilizar esse pagamento no seu plano de desenvolvimento rural e designado essas terras elegíveis para o mesmo pagamento. Caso exista esse direito, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta ainda, em primeiro lugar, qual a instância perante a qual o agricultor pode invocar o seu direito e, em segundo lugar, se este direito pode ser sujeito a condições adicionais além das já previstas pelo Regulamento n.° 1305/2013.

61.      A resposta a esta questão pode já ser deduzida, pelo menos parcialmente, dos raciocínios levados a cabo no âmbito da análise das duas primeiras questões prejudiciais. Há que completar estes elementos de resposta através de um retorno à natureza do Regulamento n.° 1305/2013.

62.      Recorde‑se que decorre do artigo 288.° TFUE que um regulamento é diretamente aplicável em todos os Estados‑Membros e obrigatório em todos os seus elementos. Embora, devido à sua natureza e à sua função no sistema das fontes do direito da União, as disposições dos regulamentos produzam, regra geral, efeito imediato nos ordenamentos jurídicos nacionais, sem que seja necessário que as autoridades nacionais adotem medidas de aplicação, algumas das suas disposições podem necessitar, para serem implementadas, da adoção de medidas de aplicação por parte dos Estados‑Membros (49). Os Estados‑Membros podem adotar medidas de execução, com uma tripla reserva: 1) não criar obstáculos à aplicabilidade direta do regulamento — que, assim, permanece ‑, 2) não dissimular a natureza de ato de direito da União e 3) limitar‑se a precisar o exercício da margem de apreciação que lhes é conferida pelo regulamento em questão não deixando de respeitar os limites das suas disposições (50).

63.      Há que se basear nas disposições aplicáveis do regulamento em causa, conforme interpretadas à luz dos objetivos que o mesmo prossegue, para determinar se estas disposições proíbem, impõem ou permitem que os Estados‑Membros adotem certas medidas de aplicação e, se for esse o caso, se a medida em causa se inscreve no quadro da margem de apreciação reconhecida a cada Estado‑Membro (51). Além disso, embora certas medidas de aplicação possam ser aplicadas pelos Estados‑Membros, esta execução do direito da União está sujeita à garantia, nos termos do artigo 51.°, n.° 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, do respeito das disposições dessa carta. Do mesmo modo, os Estados‑Membros são obrigados a garantir o respeito dos princípios gerais do direito da União (52).

64.      Considero, porém, que não deve ser necessário aprofundar tanto a análise das modalidade de exercício da margem de apreciação reconhecidas às autoridades federais alemãs, uma vez que o regime aplicável aos pagamentos a favor das zonas sujeitas a condicionantes naturais não permite aos Estados‑Membros que adotem uma medida de aplicação, como a que está em causa no processo principal, cujo resultado limita o direito ao pagamento apenas às superfícies elegíveis de um agricultor ativo que se situam no território do Land da sede da exploração.

65.      No que se refere aos artigos 31.° e 32.° do Regulamento n.° 1305/2013, já tive oportunidade de concluir, a respeito do primeiro destes artigos, que os pagamentos aos agricultores «são concedidos» aos agricultores ativos, que se comprometam a prosseguir a sua atividade agrícola em zonas designadas, para os compensar pela totalidade ou parte dos custos adicionais e pela perda de rendimentos resultantes das limitações à produção. O facto de os pagamentos serem concedidos aos agricultores que se comprometam a prosseguir a sua atividade agrícola em zonas designadas nos termos do artigo 32.° desse regulamento e que sejam ativos decorre de maneira inequívoca do artigo 31.°, n.° 2, do referido regulamento.

66.      A margem de apreciação dos Estados‑Membros pode ser exercida, antes de mais, optando por incluir, ou não, nos respetivos programas nacionais uma ajuda específica destinada a zonas sujeitas a condicionantes naturais. Seguidamente, feita esta opção, os Estados‑Membros podem ainda exercer a respetiva margem de apreciação e, portanto, adotar medidas de aplicação na aceção da jurisprudência recordada nos n.os 62 e 63 das presentes conclusões, no que respeita ao cálculo dos custos adicionais e das perdas de rendimentos (artigo 31.°, n.° 1, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1305/2013), que os Estados‑Membros, por outro lado, podem diferenciar (artigo 31.°, n.° 1, terceiro parágrafo, desse regulamento). Do mesmo modo, o legislador da União previu que o montante dos pagamentos seja deixado à apreciação dos Estados‑Membros entre os montantes mínimo e máximo que fixou e que podem aplicar uma degressividade desses pagamentos (artigo 31.°, n.os 3 e 4 desse regulamento). No que se refere à designação das zonas, os Estados‑Membros devem verificar a limitação considerável das possibilidades de utilização das terras e o aumento apreciável dos custos de produção e determinar que esta limitação e este aumento são o resultado de condições climáticas difíceis decorrentes da altitude que se traduzam por um encurtamento do período vegetativo ou de fortes declives que impeçam ou tornem mais oneroso o uso de máquinas (artigo 32.°, n.° 2 do mesmo regulamento).

67.      Assim, embora a opção pelos pagamentos a favor de zonas sujeitas a condicionantes naturais se insira na margem de apreciação dos Estados‑Membros, considero que, uma vez feita esta opção, se deduz claramente que o direito ao pagamento se constitui sempre que se encontrem reunidas as condições do artigo 31.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1305/2013.

68.      Ora, uma medida de aplicação como a adotada a nível federal (53) e a nível regional excede a margem de apreciação reconhecida aos Estados‑Membros pelo Regulamento n.° 1305/2013 por não assegurar um direito ao pagamento para todas as terras elegíveis (54) de um agricultor ativo e parece‑me frontalmente contrária à vontade expressa pelo legislador da União através desta disposição (55).

69.      Por último, não concebo, como é sublinhado pela Comissão e exceto no caso de se admitir que seja desrespeitado o princípio da igualdade de tratamento, que o poder de apreciação de que os Estados‑Membros ou as respetivas regiões dispõem na elaboração de um programa possa conferir‑lhes igualmente o poder de não conceder um pagamento aos agricultores ativos que o solicitem, se esse pagamento estiver previsto no seu programa de desenvolvimento rural a favor das zonas que esses mesmos Estados ou regiões designaram áreas elegíveis.

70.      Quanto à questão de saber contra quem deve ser invocado o direito decorrente dos artigos 31.° e 32.° do Regulamento n.° 1305/2013, considero que o órgão jurisdicional de reenvio, responsável pela apreciação da decisão em causa no processo principal que indeferiu o pedido de pagamento respeitante às terras elegíveis da recorrente situadas na Baviera, pretende confirmação do facto de que o direito da União não impõe às autoridades competentes do Land de Baden‑Württemberg a concessão desse pagamento. Esta temática coincide parcialmente com a anteriormente analisada, pelo que remeto para os n.os 43 e seguintes das presentes conclusões.

71.      Devo acrescentar que o Regulamento n.° 1305/2013 não prevê regras que determinem a autoridade junto da qual um agricultor pode invocar o seu direito ao pagamento. Ora, dado que este regulamento não rege o procedimento de concessão de um pagamento ao abrigo do seu artigo 31.°, incumbe aos Estados‑Membros organizá‑lo em conformidade com o princípio da autonomia processual, desde que, no entanto, não seja menos favorável do que o que rege situações semelhantes de natureza interna (princípio da equivalência) e não torne impossível, na prática, ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União (princípio da efetividade) (56).

72.      Cabe, portanto, ao direito nacional determinar a entidade junto da qual um agricultor ativo pode invocar o seu direito ao pagamento para cada uma das suas terras que tenham sido designadas elegíveis para esse pagamento.

73.      O princípio da efetividade não obriga a que o direito ao pagamento possa ser reclamado a uma autoridade pública que não incluiu no seu programa esse auxílio a favor das zonas sujeitas a condicionantes naturais ou que, tendo incluído esse auxílio, não designou as terras elegíveis para o pagamento, devido, por exemplo, à apreciação que efetuou quanto aos critérios exigidos pelo Regulamento n.° 1305/2013 ou, como no presente caso, porque não tem competência territorial.

74.      No entanto, uma vez que o direito é constituído, na esfera jurídica dos agricultores ativos, a partir do momento em que a autoridade localmente competente decidiu, no quadro dos programas a favor do desenvolvimento rural, executar as medidas previstas pelos artigos 31.° e 32.° do Regulamento n.° 1305/2013 e designou as zonas em causa, as vias do direito nacional devem ser organizadas, respeitando as prescrições referidas no n.° 71 das presentes conclusões, de modo que permitam a esses agricultores invocar de maneira efetiva o respetivo direito ao pagamento para todas as superfícies elegíveis (57). Além disso, partilho do parecer da Comissão segundo o qual o pedido de pagamento pode ser sujeito a outras condições, desde que sejam objetivas e não discriminatórias e não ponham em risco a efetividade do direito ao pagamento (58).

D.      Quanto à quarta questão prejudicial

75.      Por último, o órgão jurisdicional de reenvio pretende ser esclarecido quanto à questão de saber se o artigo 31.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.° 1305/2013 deve ser interpretado no sentido de que uma normativa nacional ou regional de um Estado‑Membro, que estabelece os pressupostos da concessão de apoio, deva apresentar uma «natureza jurídica» tal que permita que os agricultores que cumpram esses pressupostos possam obter o pagamento de um subsídio compensatório, independentemente da prática efetiva seguida pelo Estado‑Membro ou pela sua região em matéria de apoios.

76.      O sentido desta questão é, em parte, esclarecido pelas explicações do órgão jurisdicional de reenvio que refere que as disposições administrativas em que se baseia a política de apoio de cada Land não poderiam ser invocadas diretamente pelos particulares e que só a prática das autoridades administrativas seria vinculativa em relação a estes últimos. A impugnação dessa prática seria, todavia, limitada à mera invocação do princípio constitucionalmente garantido da igualdade de tratamento. Na hipótese de o Regulamento n.° 1305/2013 não consagrar um direito ao pagamento, este órgão jurisdicional pergunta se o artigo 31.°, n.° 1, deste regulamento determina a «natureza jurídica», nas suas palavras, que devem revestir os atos adotados pelo Estado‑Membro ou pela região que deliberou conceder um subsídio compensatório para o qual fixam as condições de elegibilidade. Resulta do pedido de decisão prejudicial que esta questão só é submetida ao Tribunal de Justiça para a eventualidade de o órgão jurisdicional de reenvio julgar procedente o pedido da recorrente no processo principal quanto às suas terras situadas na Baviera (59).

77.      Tendo em conta a resposta que proponho que seja dada à terceira questão e dado que esta quarta questão é formulada na hipótese de inexistência de direito ao pagamento decorrente dos artigos 31.° e 32.° do Regulamento n.° 1305/2013, o Tribunal de Justiça não tem de responder a esta quarta questão.

78.      Mesmo que o Tribunal de Justiça responda negativamente à terceira questão, uma resposta a esta quarta questão prejudicial não se me afigura útil para a decisão do litígio no processo principal. Com efeito, o órgão jurisdicional de reenvio parte aqui do princípio de que a prática atual em matéria de apoio das autoridades do Land Baden‑Württemberg é ilegal devido à disposição administrativa do Ministério e ao modo como os critérios de elegibilidade aí são estabelecidos, os quais excluem qualquer possibilidade de pagamento para as terras situadas na Baviera. Ora, uma vez que decorre da minha análise das duas primeiras questões prejudiciais que o direito da União não pode impor às autoridades do Land de Baden‑Württemberg a concessão do pagamento para as terras situadas na Baviera e designadas elegíveis pelas autoridades bávaras, a resposta que o Tribunal de Justiça poderia dar ao órgão jurisdicional de reenvio no âmbito desta quarta questão não é útil para a solução do litígio nele pendente. Por conseguinte, não há que responder a esta quarta questão (60).

V.      Conclusão

79.      Atendendo a todas as considerações expostas, proponho que o Tribunal de Justiça responda às questões prejudiciais submetidas pelo Verwaltungsgericht Sigmarigen (Tribunal Administrativo de Sigmaringen, Alemanha) nos seguintes termos:

Os artigos 31.° e 32.° do Regulamento (UE) n.° 1305/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro de 2013, relativo ao apoio ao desenvolvimento rural pelo Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER) e que revoga o Regulamento (CE) n.° 1698/2005 do Conselho, conforme alterado pelo Regulamento (UE) 2017/2393 do Parlamento Europeu e do Conselho de 13 de dezembro de 2017,

devem ser interpretados no sentido de que:

–        não se opõem a uma regulamentação que restrinja a competência da autoridade regional designada a nível nacional para decidir a concessão dos pagamentos previstos pelas mesmas disposições apenas às superfícies agrícolas no âmbito da sua competência normativa;

–        opõem‑se a uma regulamentação nacional que, ao prever que só as superfícies designadas como elegíveis pelo Land da sede da exploração do agricultor ativo em causa é que podem dar origem ao pagamento de um subsídio compensatório, exclui qualquer possibilidade de pagamento às superfícies desta mesma exploração que foram declaradas elegíveis por outro Land;

–        é constituído um direito ao pagamento, na esfera jurídica dos agricultores ativos, a partir do momento em que a autoridade competente decidiu, no quadro dos programas a favor do desenvolvimento rural, executar as medidas previstas pelos artigos 31.° e 32.° do Regulamento n.° 1305/2013, conforme alterado pelo Regulamento 2017/2393, e designou as zonas em causa como elegíveis. As vias do direito nacional devem ser organizadas, respeitando a autonomia processual dos Estados‑Membros, de modo que permitam a esses agricultores invocar de maneira efetiva o respetivo direito ao pagamento para todas as superfícies elegíveis. Um pedido de pagamento pode ser sujeito a outras condições, desde que sejam objetivas e não discriminatórias e não ponham em risco a efetividade do direito ao pagamento para todas as superfícies elegíveis.


1      Língua original: francês.


2      V., por exemplo, https://cyprus‑mail.com/2024/02/01/angry‑farmers‑take‑protest‑to‑eu‑summit‑with‑tractors‑and‑fires/.


3      Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro de 2013, relativo ao apoio ao desenvolvimento rural pelo Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER) e que revoga o Regulamento (CE) n.° 1698/2005 (JO 2013 L 347, p. 487; retificação no JO 2016, L 130, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (UE) 2017/2393 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de 2017 (JO 2017 L 350, p. 15) (a seguir, «Regulamento n.° 1305/2013»).


4      Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho de 17 de dezembro de 2013, que estabelece regras para os pagamentos diretos aos agricultores ao abrigo de regimes de apoio no âmbito da política agrícola comum e que revoga o Regulamento (CE) n.° 637/2008 do Conselho e o Regulamento (CE) n.° 73/2009 do Conselho (JO 2013, L 347, p. 608).


5      BGBl. 2015 I, p. 166, a seguir «InVeKoSV».


6      GABl. 2019, p. 389.


7      GABl. 2021, p. 532.


8      BayMBl. 2019, n.° 143.


9      Ou seja, os pontos 2.1 e 3.2.1 da VwV AZL.


10      Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, o efeito vinculativo destas disposições só pode ser indireto, pelo facto de se considerar que a Administração trata de igual forma situações factuais idênticas. No caso de tratamento desigual de uma situação idêntica, o particular interessado pode exigir que a situação seja sanada invocando o princípio constitucionalmente garantido da igualdade de tratamento. Apenas a prática da autoridade administrativa é vinculativa em relação ao particular e não o conteúdo da disposição administrativa em que a mesma se baseia. Uma prática administrativa vincula apenas a autoridade administrativa em causa e uma prática administrativa instituída pode ser alterada para o futuro.


11      Na aceção do § 2 do InVeKoSV. Do pedido de decisão prejudicial decorre que a cada agricultor é atribuído um número de empresa em função do domicílio fiscal. Para a Administração é o domicílio fiscal que determina a localização da sede da exploração. A uma exploração agrícola cujas terras se encontram em dois Länder é atribuído apenas um número de empresa e a sua sede está situada num único Land. O órgão jurisdicional de reenvio explica ainda que às explorações estrangeiras (por exemplo, austríacas) que também disponham de superfícies no Baden‑Württemberg pode ser atribuído um número de empresa neste Land e, assim, podem ser consideradas como tendo ali a respetiva sede da exploração.


12      V. jurisprudência mencionada no ponto III.2 da parte B do pedido de decisão prejudicial.


13      V. artigo 1.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1305/2013. V., também, Acórdãos de 8 de julho de 2021, Région wallonne (Apoio aos jovens agricultores) (C‑830/19, EU:C:2021:552, n.° 34). Quanto aos objetivos e prioridades específicas prosseguidas, v., respetivamente, artigos 4.° e 5.° desse regulamento.


14      Esta é definida como «o processo de organização, de tomada de decisão e de atribuição dos recursos financeiros em várias etapas, com o envolvimento de parceiros, com vista a executar, numa base plurianual, a ação conjunta da União e dos Estados‑Membros para a consecução das prioridades da União em matéria de desenvolvimento rural» [artigo 2.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento n.° 1305/2013].


15      Artigo 1.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1305/2013.


16      V. artigo 6.° do Regulamento n.° 1305/2013.


17      Os Estados‑Membros decidem livremente a que nível será definido e executado o programa: v. artigo 6.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1305/2013. V., também, Acórdão de 1 de dezembro de 2022, DELID (C‑409/21, EU:C:2022:946, n.° 26 e jurisprudência aí referida).


18      Artigo 31.° do Regulamento n.° 1305/2013.


19      V. artigo 5.°, primeiro parágrafo, ponto 4), alínea a), do Regulamento n.° 1305/2013.


20      Artigo 31.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1305/2013.


21      Na aceção do artigo 9.° do Regulamento n.° 1307/2013, v. artigo 31.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1305/2013.


22      Artigo 31.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1305/2013.


23      V., também, o anexo II do Regulamento n.° 1305/2013.


24      V. artigo 31.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1305/2013.


25      V. artigo 31.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1305/2013.


26      Como refere o artigo 65.°, n.° 1, do Regulamento (UE) n.° 1303/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro de 2013, que estabelece disposições comuns relativas ao Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, ao Fundo Social Europeu, ao Fundo de Coesão, ao Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural e ao Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas, que estabelece disposições gerais relativas ao Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, ao Fundo Social Europeu, ao Fundo de Coesão e ao Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas, e que revoga o Regulamento (CE) n.° 1083/2006 do Conselho (JO 2013, L 347, p. 320; retificação no JO 2016, L 200, p. 140).


27      Artigo 32.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1305/2013. Zonas, que não as zonas de montanha, são consideradas sujeitas a condicionantes naturais significativas nas condições previstas pelo artigo 32.°, n.° 3, e pelo anexo III desse regulamento. Zonas, que não as zonas de montanha, e as sujeitas a condicionantes naturais significativas (ou seja, as zonas sujeitas a condicionantes específicas) são elegíveis para os pagamentos a título do artigo 31.° do referido regulamento nas condições determinadas pelo artigo 32.°, n.° 4, do mesmo regulamento.


28      V. considerando 26 do Regulamento n.° 1305/2013.


29      Essa inclusão nos programas nacionais de desenvolvimento rural não se afigura, concluída a leitura do Regulamento n.° 1305/2013, obrigatória, ao contrário das medidas agroambientais e climáticas previstas no artigo 28.° deste regulamento.


30      V. Acórdão de 1 de dezembro de 2022, DELID (C 409/21, EU:C:2022:946, n.° 27 e jurisprudência aí referida). V., também, Acórdão de 7 de dezembro de 2023, Zamestnik izpalnitelen direktor na Darzhaven fond « Zemedelie» (Apicultura biológica) (C‑329/22, EU:C:2023:968, n.° 44).


31      V., por analogia, Acórdão de 1 de dezembro de 2022, DELID (C‑409/21, EU:C:2022:946, n.os 28 a 30).


32      Este Land é uma região de «nível 1 da NUTS» [v. artigo 2.°, n.° 1, segundo parágrafo, alínea b), do Regulamento n.° 1305/2013. V., também, Regulamento (CE) n.° 1059/2003 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de maio de 2003, relativo à instituição de uma Nomenclatura Comum das Unidades Territoriais Estatísticas (NUTS) (JO 2003, L 154, p. 1, especialmente, pp. 6 e segs.)].


33      V. pp. 4 e 5 do pedido de decisão prejudicial.


34      Recorde‑se que, segundo este artigo, a identidade nacional de um Estado‑Membro reflete‑se nas suas estruturas políticas e constitucionais fundamentais «no que se refere à autonomia local e regional».


35      V. artigo 32.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1305/2013.


36      Artigo 32.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1305/2013.


37      Artigo 32.°, n.° 3, terceiro parágrafo, do Regulamento n.° 1305/2013.


38      V. ponto 1.5 das observações do Land de Baden‑Württemberg.


39      O sublinhado é meu.


40      O sublinhado é meu.


41      V. artigo 5.°, primeiro parágrafo, ponto 4), alínea a), do Regulamento n.° 1305/2013. V., também, artigo 4.° deste regulamento. V., por último, Acórdão de 6 de outubro de 2021, Lauku atbalsta dienests (Ajuda ao arranque da atividade agrícola) (C‑119/20, EU:C:2021:817, n.° 60).


42      V. artigo 6.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1305/2013.


43      V. p. 14 do pedido de decisão prejudicial.


44      V. Acórdão de 1 de dezembro de 2022, DELID (C‑409/21, EU:C:2022:946, n.° 27 e jurisprudência referida).


45      Na aceção do artigo 9.° do Regulamento n.° 1307/2013.


46      V. considerando 26 do Regulamento n.° 1305/2013.


47      Que cabe aos Estados‑Membros em causa designar.


48      V. n.os 34 e segs. das presentes conclusões.


49      V. Acórdão de 7 de julho de 2016, Občina Gorje (C‑111/15, EU:C:2016:532, n.° 34 e jurisprudência aí referida).


50      Acórdão de 7 de julho de 2016, Občina Gorje (C‑111/15, EU:C:2016:532, n.° 35).


51      V., por analogia, Acórdão de 7 de julho de 2016, Občina Gorje (C‑111/15, EU:C:2016:532, n.° 36).


52      V. Acórdão de 15 de maio de 2014, Szatmári Malom (C‑135/13, EU:C:2014:327, n.° 65 e jurisprudência aí referida).


53      V. n.° 15 das presentes conclusões.


54      V. n.° 52 das presentes conclusões.


55      Embora o Tribunal de Justiça possa ter declarado, num contexto próximo, que era possível estabelecer condições complementares ou mais restritivas desde que fossem coerentes com os objetivos e requisitos fixados no regulamento então em causa [v. Acórdão de 4 de junho de 2009, JK Otsa Talu (C‑241/07, EU:C:2009:337, n.° 39)], essa solução era ditada pela própria redação desse regulamento, o que não acontece no âmbito do Regulamento n.° 1305/2013.


56      V., por analogia, Acórdão de 14 de novembro de 2019, Vaselife International e Chrysal International (C‑445/18, EU:C:2019:968, n.° 39 e jurisprudência aí referida). V., também, em matéria de contratos públicos, Acórdão de 17 de maio de 2018, Specializuotas transportas (C‑531/16, EU:C:2018:324, n.° 36 e jurisprudência aí referida).


57      Em circunstâncias como as do litígio no processo principal, afigura‑se‑me razoável pensar que a recorrente no processo principal deveria poder apresentar um pedido de pagamento, respeitante às terras da sua exploração situadas na Baviera, junto das autoridades que designaram estas terras elegíveis para o pagamento de um subsídio compensatório.


58      Sendo a formulação da terceira questão, alínea b), particularmente vaga e não sendo a função do Tribunal de Justiça no âmbito do processo de reenvio prejudicial a de formular opiniões consultivas sobre questões gerais ou hipotéticas [v., por exemplo, Acórdão de 27 de abril de 2023, Viagogo (C‑70/22, EU:C:2023:350, n.° 44)], considero ser difícil aprofundar a análise.


59      V., designadamente, o ponto II da parte D. do pedido de decisão prejudicial.


60      Como indiquei, a efetividade do direito ao pagamento previsto nos artigos 31.° e 32.° do Regulamento n.° 1305/2013 exige, todavia, que a recorrente no processo principal possa apresentar um pedido de pagamento às autoridades competentes para este efeito no que se refere às superfícies elegíveis da sua exploração situadas na Baviera.