Language of document : ECLI:EU:T:2023:845

Processo T330/19

PNB Banka AS

contra Banco Central Europeu

 Acórdão do Tribunal Geral (Quarta Secção alargada) de 7 de dezembro de 2022

«Política económica e monetária — Supervisão prudencial das instituições de crédito — Artigo 22.° da Diretiva 2013/36/UE — Oposição do BCE à aquisição de participações qualificadas numa instituição de crédito — Ponto de partida do período de avaliação — Intervenção do BCE na fase inicial do procedimento — Critérios de estabilidade financeira do adquirente potencial e de cumprimento dos requisitos prudenciais — Existência de um motivo razoável de oposição à aquisição com base num único ou em vários critérios de avaliação — Artigo 106.° do Regulamento de Processo — Pedido de audiência desprovido de fundamento»

1.      Processo judicial — Fase oral do processo — Realização de audiência — Requisitos — Falta de pedido de audiência ou pedido de audiência desprovido de fundamento — Faculdade de o juiz decidir sobre o recurso sem fase oral do processo — Admissibilidade

(Regulamento de Processo do Tribunal Geral, artigo 106.°; Disposições práticas de execução do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, n.os 142 e 143)

(cf. n.os 79, 80)

2.      Política económica e monetária — Política económica — Supervisão do setor financeiro da União — Mecanismo Único de Supervisão — Supervisão prudencial das instituições de crédito — Aquisição de uma participação qualificada numa instituição de crédito — Proposta de decisão da autoridade nacional competente — Direito de o Banco Central Europeu intervir no processo antes da transmissão dessa proposta

[Regulamento n.° 1024/2013 do Conselho, artigos 4.°, n.° 1, alínea c), 6.°, n.° 2, e 15.°; Regulamento n.° 468/2014 do Banco Central Europeu, artigos 85.° a 87.°]

(cf. n.os 119‑122)

3.      Política económica e monetária — Política económica — Supervisão do setor financeiro da União — Mecanismo Único de Supervisão — Supervisão prudencial das instituições de crédito — Aquisição de uma participação qualificada numa instituição de crédito — Critérios de avaliação — Solidez financeira do adquirente potencial — Conceito — Motivos de oposição à aquisição — Existência de um efeito negativo significativo da aquisição — Exclusão

(Diretiva 2013/36 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigo 23.°, n.os 1 e 2)

(cf. n.os 147, 148)

4.      Política económica e monetária — Política económica — Supervisão do setor financeiro da União — Mecanismo Único de Supervisão — Supervisão prudencial das instituições de crédito — Aquisição de uma participação qualificada numa instituição de crédito — Avaliação pela autoridade competente — Motivos de oposição à aquisição relativos aos critérios de avaliação — Inexistência de efeito cumulativo destes critérios

[Diretiva 2013/36 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigo 23.°, n.os 1 e 2)]

(cf. n.os 183‑186)

Resumo

A recorrente, a PNB Banka AS, é uma instituição de crédito de direito letão que, à data da decisão impugnada, era considerada uma instituição de crédito «menos significativa» (1) e, por conseguinte, estava sujeita à supervisão prudencial direta da Finanšu un kapitāla tirgus komisija (Comissão dos Mercados Financeiros e de Capitais, Letónia, a seguir «CMFC»). Em 1 de outubro de 2018, a recorrente notificou à CMFC a sua intenção de adquirir diretamente uma participação qualificada noutra instituição de crédito letã (a seguir «operação de aquisição»). Em 1 de março de 2019, a CMFC apresentou ao Banco Central Europeu (BCE) uma proposta de decisão (2) no sentido de uma oposição à proposta de aquisição. Por Decisão notificada em 21 de março de 2019, o BCE opôs‑se à operação de aquisição, uma vez que nem o critério da solidez financeira do adquirente potencial nem o do cumprimento dos requisitos prudenciais estavam preenchidos (a seguir «decisão impugnada»).

Chamado a conhecer de um recurso de anulação dessa decisão, o Tribunal pronuncia‑se sobre várias questões inéditas. Começa por analisar o direito de o BCE intervir no procedimento de autorização da aquisição de uma participação qualificada numa instituição de crédito desde o início desse procedimento. Em seguida, especifica as condições em que o BCE se pode opor à operação de aquisição com base no critério da solidez financeira do adquirente potencial. Por último, determina as condições em que a autoridade competente se pode opor à aquisição de uma instituição de crédito. O Tribunal conclui pela negação integral de provimento ao recurso.

Apreciação do Tribunal Geral

Em primeiro lugar, o Tribunal declara que, tendo em conta o mecanismo especial de colaboração que o legislador da União pretendeu estabelecer entre o BCE e a autoridade nacional competente para a análise dos pedidos de autorização prévia a qualquer aquisição ou aumento de participações qualificadas nas instituições de crédito, o BCE pode intervir no procedimento antes da transmissão da proposta de decisão (3) por esta última autoridade, mesmo logo no início do procedimento.

Com efeito, recorda que, quando o legislador opta por um procedimento administrativo que prevê a adoção pelas autoridades nacionais de atos preparatórios a uma decisão final de uma instituição da União que produza efeitos jurídicos e suscetível de causar prejuízo, pretende estabelecer, entre essa instituição e essas autoridades nacionais, um mecanismo especial que assenta na competência decisória exclusiva da instituição da União. Ora, por força da legislação aplicável (4), o BCE tem competência exclusiva para decidir autorizar ou não a proposta de aquisição, no termo do procedimento em causa. O Tribunal acrescenta que, no âmbito das relações regidas pelo princípio da cooperação leal (5), o papel das autoridades nacionais consiste em registar os pedidos de autorização, prestar assistência ao BCE, único titular do poder de decisão, nomeadamente comunicando‑lhe todas as informações necessárias ao desempenho das suas tarefas, instruindo os referidos pedidos e, em seguida, transmitindo ao BCE uma proposta de decisão que não vincula este último e que, aliás, não está previsto no direito da União ser notificada ao requerente.

Em segundo lugar, no que respeita às condições em que o BCE se pode opor à operação de aquisição com base no critério da solidez financeira do adquirente potencial, o Tribunal declara que, para esse efeito, à luz da regulamentação em vigor (6), o BCE não é obrigado, por um lado, a demonstrar a existência de um efeito negativo significativo da proposta de aquisição por comparação com a situação em que essa aquisição não seja realizada nem, por outro, a proceder à análise contrafactual da situação em que essa aquisição não teria lugar.

No caso em apreço, observa que, pelo contrário, a regulamentação relevante define a solidez financeira do adquirente potencial como a capacidade deste para financiar a proposta de aquisição e manter, num futuro previsível, uma estrutura financeira sólida para si próprio e para a empresa‑alvo, sem se referir a um motivo de oposição relativo ao efeito negativo significativo da proposta de aquisição nem exigir a análise da situação em que essa aquisição não existisse.

Em terceiro lugar, o Tribunal declara que a autoridade competente se pode opor à aquisição de uma instituição de crédito sem analisar, na sua decisão, todos os critérios de avaliação previstos na Diretiva 2013/36 (7). Com efeito, salienta que, em conformidade com o objetivo, previsto nesta diretiva, de garantir uma gestão sã e prudente da instituição de crédito visada pela proposta de aquisição, basta que haja motivos razoáveis para o fazer com base em um ou mais desses critérios.


1      Na aceção do artigo 6.°, n.° 4, do Regulamento (UE) n.° 1024/2013 do Conselho, de 15 de outubro de 2013, que confere ao BCE atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito (JO 2013, L 287, p. 63, a seguir «Regulamento MUS»).


2      Na aceção do artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento MUS.


3      Prevista no artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento MUS.


4      Nos termos do artigo 4.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento MUS, lido em conjugação com o artigo 15.°, n.° 3, deste mesmo regulamento e com o artigo 87.° do Regulamento (UE) n.° 468/2014 do Banco Central Europeu, de 16 de abril de 2014, que estabelece o quadro de cooperação, no âmbito do Mecanismo Único de Supervisão, entre o Banco Central Europeu e as autoridades nacionais competentes e com as autoridades nacionais designadas (Regulamento‑Quadro do MUS) (JO 2014, L 141, p. 1).


5      Nos termos do artigo 6.°, n.° 2, do Regulamento MUS.


6      Artigo 23.°, n.os 1 e 2, da Diretiva 2013/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e à supervisão prudencial das instituições de crédito e empresas de investimento, que altera a Diretiva 2002/87/CE e revoga as Diretivas 2006/48/CE e 2006/49/CE (JO 2013, L 176, p. 338), e Orientações Comuns da Autoridade Bancária Europeia (ABE), da Autoridade Europeia dos Seguros e Pensões Complementares de Reforma (EIOPA) e da Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados (ESMA), relativas à avaliação prudencial das aquisições e dos aumentos de participações qualificadas em entidades do setor financeiro, publicadas em 20 de dezembro de 2016 (JC/GL/2016/01).


7      Critérios previstos no artigo 23.° da Diretiva 2013/36.