Language of document : ECLI:EU:T:2018:563

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção)

19 de setembro de 2018 (*)

«Auxílios de Estado — Auxílio a favor da ligação fixa rodoferroviária do Sund — Financiamento público concedido pelos Estados sueco e dinamarquês ao projeto de infraestrutura de ligação fixa através do Sund — Garantias estatais — Auxílios fiscais — Decisão de não levantar objeções — Decisão que declara a inexistência de auxílio de Estado — Recurso de anulação — Ato impugnável — Admissibilidade — Não abertura do procedimento formal de investigação — Dificuldades sérias — Conceito de regime de auxílios — Auxílios destinados a promover a realização de um projeto importante de interesse europeu comum — Apreciação do elemento de auxílio incluído numa garantia — Caráter limitado do auxílio incluído numa garantia — Proporcionalidade — Confiança legítima»

No processo T‑68/15,

HH Ferries I/S, anteriormente Scandlines Øresund I/S, com sede em Elseneur (Dinamarca),

HH Ferries Helsingor ApS, com sede em Elseneur,

HH Ferries Helsingborg AB, anteriormenteHH‑Ferries Helsingborg AB, com sede em Helsingborg (Suécia),

representadas por M. Johansson, R. Azelius, P. Remnelid e L. Sandberg‑Mørch, advogados,

recorrentes,

contra

Comissão Europeia, representada por L. Flynn, S. Noë, R. Sauer e L. Armati, na qualidade de agentes,

recorrida,

apoiada por:

Reino da Dinamarca, representado inicialmente por C. Thorning e em seguida por J. Nymann‑Lindegren, na qualidade de agentes, assistidos por R. Holdgaard, advogado,

e por:

Reino da Suécia, representado inicialmente por E. Karlsson, L. Swedenborg, A. Falk, C. Meyer‑Seitz, U. Persson e N. Otte Widgren e em seguida por A. Falk, C. Meyer‑Seitz, L. Zettergren e H. Shev, na qualidade de agentes,

intervenientes,

que tem por objeto um pedido apresentado ao abrigo do artigo 263.o TFUE, de anulação da Decisão C(2014) 7358 final da Comissão, de 15 de outubro de 2014, de não qualificar determinadas medidas de auxílios ou de não levantar objeções, na sequência do procedimento preliminar de exame previsto no artigo 108.o, n.o 3, TFUE, aos auxílios de Estado SA.36558 (2014/NN) e SA.38371 (2014/NN) — Dinamarca, bem como SA.36662 (2014/NN) — Suécia, respeitante ao financiamento público do projeto de infraestrutura de ligação fixa rodoferroviária do Sund (JO 2014, C 418, p. 1 e JO 2014, C 437, p. 1),

O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção),

composto por: G. Berardis, presidente, D. Spielmann e Z. Csehi (relator), juízes,

secretário: S. Spyropoulos, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 4 de outubro de 2017,

profere o presente

Acórdão (1)

I.      Antecedentes do litígio

A.      Recorrentes

1        A HH Ferries I/S, anteriormente Scandlines Øresund I/S, é uma empresa comum detida a 50% por duas sociedades privadas, a sociedade dinamarquesa HH Ferries Helsingor ApS e a sociedade sueca HH Ferries Helsingborg AB, anteriormente HH — Ferries Helsingborg AB (a seguir, conjuntamente, «recorrentes»). Desde final do mês de janeiro de 2015, o First State European Diversified Infrastructure Fund FCP‑SIF é o único proprietário da HH Ferries Helsingor e da HH Ferries Helsingborg e, por conseguinte, o único proprietário da HH Ferries.

2        As recorrentes asseguram há mais de cem anos a ligação de transporte que atravessa o Sund entre Elseneur, na Dinamarca, e Helsingborg, na Suécia, e utilizam ferryboats de curta distância para o transporte de veículos pesados, autocarros, veículos particulares e peões.

B.      Beneficiário

3        O Øresundsbro Konsortiet (a seguir «Consórcio») é detido a 50% por duas sociedades de responsabilidade limitada: a A/S Øresundsforbindelse (a seguir «A/S Øresund»), ela própria integralmente detida pela Sund & Bælt Holding A/S (a seguir «Sund & Bælt»), sendo esta última detida a 100% pelo Estado dinamarquês, e a Svensk‑Danska Broförbindelsen AB (a seguir «SVEDAB»), que é integralmente detida pelo Estado sueco (a seguir, em conjunto, «sociedades‑mãe do Consórcio»).

4        O Consórcio detém, planeia, financia, constrói e explora os 16 km da ligação rodoferroviária que atravessa o Sund entre Kastrup (Dinamarca) e Limhamn (Suécia).

C.      Ligação fixa, ligações internas ao interior e medidas em causa

5        A ligação fixa do Sund é composta por uma ponte com portagem com 16 km de comprimento, pela ilha artificial de Peberholm (Dinamarca) e por um túnel parcialmente imerso para o tráfego rodoviário e ferroviário entre a costa sueca e a ilha dinamarquesa de Amager (a seguir «ligação fixa»). Trata‑se da ponte rodoferroviária mais longa da Europa. Foi construída entre 1995 e 2000 e é explorada desde 1 de julho de 2000. Este projeto era um dos projetos prioritários das redes transeuropeias de transportes (RTE‑T) aprovados pelo Conselho Europeu em 1994.

6        Os aspetos jurídicos e operacionais da construção e da exploração da ligação fixa regem‑se:

–        pelo Tratado de 23 de março de 1991 entre o Governo da Dinamarca e o Governo da Suécia, relativo a uma ligação fixa que atravessa o Sund (a seguir «Acordo Intergovernamental»), ratificado pelo Reino da Suécia, em 8 de agosto de 1991, e pelo Reino da Dinamarca, em 24 de agosto de 1994; e

–        pelo Acordo de 27 de janeiro de 1992, que cria o Consórcio entre as sociedades‑mãe do Consórcio (a seguir «Acordo de Consórcio»).

7        O artigo 10.o do Acordo Intergovernamental prevê a constituição do Consórcio, «que deterá e será responsável, em nome conjunto [das sociedades‑mãe] e como entidade única, pela conceção do projeto e por qualquer outra preparação da ligação fixa, bem como pelo seu financiamento, construção e exploração».

8        Os artigos 14.o e 15.o do Acordo Intergovernamental, o n.o 4 do Protocolo Adicional ao Acordo Intergovernamental e o ponto 4, n.o 6, do Acordo de Consórcio preveem, em substância, que as portagens cobradas aos utentes da ligação fixa e a contribuição ferroviária anual pela utilização da via‑férrea situada na ligação fixa se destinam a cobrir os custos de conceção, planeamento, construção, exploração e manutenção da ligação fixa e os custos de construção das ligações internas, rodoviárias e ferroviárias, ao interior do país. O Consórcio determina e cobra as portagens, em conformidade com os princípios acordados entre os Governos sueco e dinamarquês.

9        O artigo 12.o do Acordo Intergovernamental prevê que «o [Reino da] Dinamarca e [o Reino da] Suécia comprometem‑se a garantir, conjunta e solidariamente, as obrigações decorrentes dos empréstimos contraídos pelo Consórcio e de outros instrumentos financeiros utilizados para o financiamento [e que] os dois Estados serão igualmente responsáveis em qualquer atividade comum». A este respeito, o ponto 4, n.o 3, do Acordo de Consórcio precisa que «[a]s necessidades de capital do Consórcio para o planeamento, a conceção do projeto e a construção da ligação do Sund, incluindo os custos do serviço de empréstimos contraídos, e para a cobertura das necessidades de capital decorrentes das perdas contabilísticas previstas por um determinado número de anos após a abertura da ligação fixa ao tráfego devem, nos termos acordados no Acordo Intergovernamental, ser satisfeitas mediante a obtenção de empréstimos ou a emissão de instrumentos financeiros no mercado aberto, com garantias prestadas pelos Governos sueco e dinamarquês».

10      De acordo com o disposto no n.o 1 do Protocolo Adicional ao Acordo Intergovernamental, nenhuma taxa será cobrada pelos Estados dinamarquês ou sueco em contrapartida das «responsabilidades de garantia por eles assumidas em relação aos empréstimos contraídos pelo Consórcio e a outros instrumentos financeiros utilizados para o financiamento».

11      Para além da ligação fixa em si, o projeto inclui também instalações terrestres rodoviárias e ferroviárias que unem as extremidades da ligação fixa às infraestruturas rodoviárias e ferroviárias do interior da Dinamarca e da Suécia (a seguir «ligações internas»). Nos termos do artigo 8.o do Acordo Intergovernamental, a construção das ligações internas é da responsabilidade de cada Estado no seu próprio território. Os Estados delegaram nas respetivas sociedades‑mãe do Consórcio as missões relativas à conceção, financiamentos, construção e exploração das ligações internas (v. considerando 25 da decisão impugnada). Nos termos do artigo 17.o do Acordo Intergovernamental e do ponto 2, n.o 5, do Acordo de Consórcio, o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia decidiram que não seriam exigidas portagens como contrapartida da utilização das ligações rodoviárias internas pelos veículos no caso de utilizarem a ligação fixa.

D.      Procedimento administrativo

12      Por carta de 1 de agosto de 1995, o Consórcio informou a Comissão Europeia de que beneficiava de uma garantia, conjunta e solidária, dos Governos dinamarquês e sueco que cobre os empréstimos e demais instrumentos financeiros contraídos para financiar a ligação fixa (a seguir «garantias estatais») e solicitou à Comissão a confirmação de que essas garantias não constituíam auxílios de Estado. A Comissão respondeu por duas cartas idênticas de 27 de outubro de 1995 enviadas ao Estado dinamarquês e ao Estado sueco, respetivamente, e especificou que as garantias estatais estavam vinculadas a um projeto de infraestrutura de interesse público, que devia ser considerado um bem público de melhoria das infraestruturas dos serviços de transporte nacionais e que, em princípio, a garantia dos investimentos em bens públicos não deve ser considerada uma concessão de um auxílio de Estado na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. Daí concluiu que as garantias estatais não lhe deviam ser notificadas.

13      O Estado dinamarquês e o Estado sueco nunca notificaram formalmente à Comissão o modelo de financiamento da ligação fixa.

14      Em 17 de abril de 2013, a HH Ferries apresentou uma denúncia à Comissão, alegando que as garantias estatais constituíam auxílios de Estado ilegais na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE e incompatíveis com o mercado interno (processos registados sob os números SA.36558, para a Dinamarca, e SA.36662, para a Suécia).

[Omissis]

18      Em 15 de setembro de 2014, o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia apresentaram à Comissão uma declaração comum (a seguir «compromissos»), que clarificam os seguintes pontos:

–        as garantias estatais são limitadas à cobertura da dívida real acumulada do Consórcio em qualquer momento;

–        as garantias estatais e demais vantagens económicas, nomeadamente fiscais, que o Consórcio possa receber são limitadas ao período de reembolso efetivo da dívida; assim, o Consórcio não receberá qualquer vantagem após o integral reembolso da sua dívida;

–        no caso de ser necessário o Consórcio contrair novos empréstimos cobertos pelas garantias estatais ou o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia concederem ao Consórcio novas vantagens económicas findo o ano de 2040, estes comprometem‑se a notificar tais medidas à Comissão, em conformidade com o artigo 108.o, n.o 3, TFUE;

–        o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia comprometem‑se a informar anualmente a Comissão sobre a evolução do reembolso da dívida do Consórcio.

E.      Decisão impugnada

19      Em 15 de outubro de 2014, a Comissão adotou a Decisão C(2014) 7358 final, relativa aos auxílios de Estado SA.36558 (2014/NN) e SA.38371 (2014/NN) — Dinamarca, e SA.36662 (2014/NN) — Suécia, respeitante ao financiamento público do projeto de infraestrutura de ligação fixa rodoferroviária do Sund (JO 2014, C 418, p. 1, e JO 2014, C 437, p. 1) (a seguir «decisão impugnada»). A Comissão limitou a sua análise às seguintes medidas (considerandos 50 a 55 da decisão impugnada):

–        as garantias estatais concedidas ao Consórcio pelos empréstimos contraídos para o financiamento da construção e da exploração do projeto de infraestrutura de ligação fixa do Sund;

–        as seguintes medidas fiscais dinamarquesas:

–        o reporte de perdas aplicável ao Consórcio;

–        a depreciação dos ativos aplicável ao Consórcio;

–        o regime de tributação conjunta.

–        as medidas de apoio financeiro concedidas às sociedades‑mãe do Consórcio para o financiamento do planeamento, da construção e da exploração das ligações rodoviárias e ferroviárias internas.

20      A Comissão referiu que a sua decisão não abarcava eventuais outras medidas concedidas pelo Reino da Dinamarca ou pelo Reino da Suécia ao Consórcio, à A/S Øresund, à SVEDAB, à Sund & Bælt ou a qualquer sociedade associada (considerando 56 da decisão impugnada).

1.      Existência de auxílios na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE

[Omissis]

23      No que se refere às garantias estatais e às medidas fiscais dinamarquesas relativas à depreciação dos ativos e ao reporte das perdas (a seguir «auxílios fiscais dinamarqueses») concedidas ao Consórcio para o financiamento da construção e exploração da ligação fixa, a Comissão concluiu que constituíam auxílios de Estado na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE (considerando 107 da decisão impugnada). A Comissão considerou assim que tinham sido prestadas duas garantias estatais, incondicionalmente, em 27 de janeiro de 1992, dia da constituição do Consórcio (considerando 52 da decisão impugnada). As medidas dinamarquesas de reporte das perdas foram consideradas seletivas relativamente ao período compreendido entre 1991 e final de 2001 e ao período iniciado em 2013. As medidas dinamarquesas de depreciação dos ativos foram consideradas seletivas a partir de 1999 (considerandos 92 a 97 e 99 a 103 da decisão impugnada).

2.      Qualificação de auxílio novo ou existente

24      A Comissão considerou que a garantia dinamarquesa fornecida ao Consórcio pelos seus empréstimos, bem como os auxílios fiscais dinamarqueses concedidos ao Consórcio, constituíam novos auxílios na aceção do artigo 1.o, alínea c), do Regulamento (CE) n.o 659/1999 do Conselho, de 22 de março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo [108.o TFUE] (JO 1999, L 83, p. 1) (considerando 109 da decisão impugnada).

25      Quanto à garantia sueca fornecida ao Consórcio, que, segundo a Comissão, foi prestada antes da adesão do Reino da Suécia à União Europeia e antes da entrada em vigor do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (EEE) (JO 1994, L 1, p. 3), em 1 de janeiro de 1994, a mesma foi considerada um auxílio existente na aceção do artigo 1.o, alínea b), i), do Regulamento (CE) n.o 659/1999 (considerando 110 da decisão impugnada).

3.      Apreciação da compatibilidade dos auxílios de Estado à luz do artigo 107.o, n.o 3, TFUE

26      A Comissão apreciou a compatibilidade das garantias estatais e dos auxílios fiscais dinamarqueses à luz do artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE, segundo o qual podem ser declarados compatíveis com o mercado interno os auxílios destinados a fomentar a realização de um projeto importante de interesse europeu comum (a seguir «PIIEC).

27      A Comissão considerou, em substância, que, apreciadas em conjunto, as garantias estatais e os auxílios fiscais dinamarqueses concedidos ao Consórcio eram necessários e proporcionais à realização do objetivo de interesse geral prosseguido, nomeadamente face aos compromissos assumidos pelo Reino da Dinamarca e pelo Reino da Suécia no procedimento administrativo, nos termos dos quais, em particular, caso fosse necessário o Consórcio contrair novos empréstimos cobertos pelas garantias estatais ou conceder ao Consórcio qualquer outra vantagem económica após 2040, o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia informariam a Comissão desse facto, em conformidade com o artigo 108.o, n.o 3, TFUE (considerandos 122 a 137 da decisão impugnada). Quanto aos auxílios fiscais dinamarqueses, a Comissão também precisou que se destinavam a contribuir para a viabilidade do projeto, reduzindo o período de reembolso dos empréstimos do consórcio e o risco a eles associado. Considerou que os auxílios fiscais dinamarqueses reduziam o risco associado às garantias estatais e, por conseguinte, a vantagem daí decorrente e que a vantagem das garantias estatais e a vantagem dos auxílios fiscais dinamarqueses se revelam interdependentes (considerando 133 da decisão impugnada).

28      A Comissão concluiu que as garantias estatais concedidas pelo Reino da Dinamarca e pelo Reino da Suécia, bem como os auxílios fiscais dinamarqueses, eram compatíveis com base no artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE, e que não precisava de fazer propostas de medidas úteis ao Reino da Suécia (considerandos 138 e 139 da decisão impugnada).

4.      Confiança legítima

29      A Comissão entendeu, nos considerandos 138 e 140 a 153 da decisão impugnada, que, de qualquer modo, mesmo na hipótese de as medidas de auxílio em causa deverem ser consideradas incompatíveis com o mercado interno, não poderiam ser objeto de recuperação pelo Reino da Dinamarca nem pelo Reino da Suécia, visto que a recuperação seria contrária a um princípio geral do direito da União, nos termos do artigo 14.o, n.o 1, do Regulamento n.o 659/1999. Considerou, em substância, que, no caso em apreço, se verificavam circunstâncias excecionais que justificavam que o Consórcio, bem como o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia, pudessem criar expectativas legítimas no facto de as garantias estatais e os auxílios fiscais dinamarqueses concedidos ao Consórcio não serem postos em causa. Assim, recordou que a sua posição era, em 1992, que a construção e exploração de projetos de infraestruturas não constituíam uma atividade económica. No entanto, tanto a sua prática decisória como a jurisprudência da União relativas ao conceito de «atividade económica», no que diz respeito ao financiamento da construção e exploração de projetos de infraestruturas, tinham evoluído desde os Acórdãos de 12 de dezembro de 2000, Aéroports de Paris/Comissão (T‑128/98, EU:T:2000:290), de 17 de dezembro de 2008, Ryanair/Comissão (T‑196/04, EU:T:2008:585), e de 24 de março de 2011, Freistaat Sachsen e Land Sachsen‑Anhalt/Comissão (T‑443/08 e T‑455/08, EU:T:2011:117), que foi confirmado pelo Acórdão de 19 de dezembro de 2012, Mitteldeutsche Flughafen e Flughafen Leipzig/Comissão (C‑288/11 P, EU:C:2012:821) (considerandos 61 a 66 da decisão impugnada). Além disso, em 1995, os serviços da Comissão informaram o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia de que as garantias estatais não constituíam um auxílio de Estado na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. A Comissão considerou que esta última conclusão constante das suas cartas de 27 de outubro de 1995, dirigidas ao Reino da Dinamarca e ao Reino da Suécia, abrangia os auxílios fiscais dinamarqueses, visto que tratavam de um projeto de infraestrutura que, na altura, não era considerado uma atividade económica. Segundo a Comissão, não era necessário determinar se a confiança legítima ia além do Acórdão de 12 de dezembro de 2000, Aéroports de Paris/Comissão (T‑128/98, EU:T:2000:290), dado que, de toda a maneira, as medidas em causa eram compatíveis com o mercado interno (considerando 153 da decisão impugnada).

5.      Conclusão

30      A Comissão decidiu:

–        com base na apreciação da compatibilidade das medidas em causa, e tendo em conta, em especial, os compromissos assumidos pelo Reino da Dinamarca e pelo Reino da Suécia, não levantar objeções aos auxílios fiscais dinamarqueses nem às garantias prestadas pelo Reino da Dinamarca ao Consórcio, com o fundamento de que estes auxílios de Estado deviam ser considerados compatíveis com o mercado interno nos termos do artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE;

–        que a garantia prestada ao Consórcio pelo Reino da Suécia era um auxílio existente e que, tendo em conta, nomeadamente, os compromissos assumidos pelo Reino da Dinamarca e pelo Reino da Suécia, não era necessário dar início ao procedimento sobre os regimes de auxílios existentes;

–        que o regime dinamarquês de tributação conjunta e as medidas concedidas às sociedades‑mãe do Consórcio para o financiamento das ligações internas rodoviárias e ferroviárias na Suécia e na Dinamarca não constituíam auxílios de Estado na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

II.    Tramitação processual e pedidos das partes

31      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 12 de fevereiro de 2015, as recorrentes interpuseram o presente recurso.

32      Por articulado apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 5 de junho de 2015, o Reino da Suécia pediu para intervir no presente processo em apoio dos pedidos da Comissão.

33      Por articulado apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 17 de junho de 2015, o Reino da Dinamarca pediu para intervir no presente processo em apoio dos pedidos da Comissão.

34      Por decisões de 13 de julho de 2015, o presidente da Nona Secção do Tribunal Geral admitiu as intervenções. O Reino da Suécia e o Reino da Dinamarca apresentaram os seus articulados de intervenção em 28 de setembro de 2015.

35      Tendo a composição das secções do Tribunal Geral sido alterada, o juiz‑relator foi afetado à Sexta Secção, à qual o presente processo foi, consequentemente, distribuído em 26 de setembro de 2016.

36      As recorrentes concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão impugnada;

–        condenar a Comissão nas despesas.

37      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar as recorrentes nas despesas.

38      O Reino da Suécia e o Reino da Dinamarca concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne negar provimento ao recurso.

III. Questão de direito

[Omissis]

B.      Quanto ao mérito

55      Em apoio do pedido de anulação apresentado, as recorrentes invocam, em substância, cinco fundamentos. O primeiro fundamento é relativo a erros de direito e a erros manifestos de apreciação, tendo em conta o disposto no artigo 107.o, n.o 1, TFUE, no que respeita, em primeiro lugar, às medidas concedidas às sociedades‑mãe do Consórcio para o financiamento das ligações ferroviárias internas e, em segundo lugar, às garantias estatais prestadas ao Consórcio para o financiamento da ligação fixa. O segundo fundamento é relativo a erros de direito e a erros de apreciação da compatibilidade das garantias estatais e dos auxílios fiscais dinamarqueses concedidos ao Consórcio, tendo em conta o disposto no artigo 107.o, n.o 3, TFUE, e a um erro relativo à não qualificação de auxílio de Estado do regime dinamarquês de tributação conjunta. O terceiro fundamento é relativo a erros de direito cometidos pela Comissão quando concluiu, na hipótese de as garantias estatais e os auxílios fiscais dinamarqueses ao Consórcio deverem ser, não obstante, considerados incompatíveis com o mercado interno, pela existência de expectativas legítimas do Consórcio, bem como do Reino da Dinamarca e do Reino da Suécia, criadas no facto de tais auxílios não virem a ser postos em causa com base nas regras sobre os auxílios de Estado e pela desnecessidade de determinar se essas expectativas legítimas vão além do decidido no Acórdão de 12 de dezembro de 2000, Aéroports de Paris/Comissão (T‑128/98, EU:T:2000:290). O quarto fundamento é relativo à violação da obrigação de dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE. O quinto fundamento é relativo à violação do dever de fundamentação.

56      O Tribunal Geral considera que há que apreciar estes fundamentos, na medida em que visem, em primeiro lugar, as medidas que foram consideradas auxílios de Estado compatíveis com o mercado interno, ou seja, as garantias estatais e os auxílios fiscais dinamarqueses concedidos ao Consórcio para a construção e exploração da ligação fixa, e, em segundo lugar, as medidas que não foram consideradas auxílios de Estado, ou seja, as medidas de apoio financeiro às sociedades‑mãe do Consórcio para a construção e exploração das ligações ferroviárias internas e o regime dinamarquês de tributação conjunta. Em terceiro lugar, estes fundamentos serão apreciados na medida em que critiquem a Comissão por não ter fundamentado nem ter tido em consideração o efeito cumulativo de todas medidas de auxílio concedidas ao projeto de ligação fixa. Em quarto lugar, estes fundamentos serão apreciados na medida em que critiquem a constatação, efetuada na hipótese de as medidas de auxílio concedidas ao Consórcio deverem, não obstante, ser consideradas incompatíveis com o mercado interno, da existência de expectativas legítimas do Reino da Dinamarca e do Reino da Suécia, bem como do Consórcio, criadas no facto de as medidas de auxílio ao Consórcio não virem a ser postas em causa, tendo em conta as regras sobre os auxílios de Estado.

57      Em primeiro lugar, quanto às medidas de auxílio de Estado consideradas compatíveis após análise preliminar, o Tribunal Geral considera que há que começar por apreciar o quarto fundamento, que visa demonstrar que a Comissão teve dificuldades sérias, que a deviam ter obrigado a dar início ao procedimento formal de investigação.

1.      Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação dos direitos processuais das partes interessadas, na parte em que visa as medidas qualificadas de auxílios de Estado concedidos ao Consórcio

58      No âmbito do quarto fundamento, as recorrentes remetem expressamente para os argumentos por elas invocados no âmbito dos dois primeiros fundamentos, argumentos que revelam incoerências e inexatidões na análise da Comissão das garantias estatais e dos auxílios fiscais dinamarqueses ao Consórcio. Segundo as recorrentes, a Comissão cometeu erros, em primeiro lugar, na qualificação das garantias estatais face ao disposto no artigo 107.o, n.o 1, TFUE e, em segundo lugar, na análise da compatibilidade das garantias estatais e dos auxílios fiscais dinamarqueses com o mercado interno. A insuficiência e incompletude da análise da Comissão constituem um indício da existência de dificuldades sérias encontradas no exame preliminar e das «dúvidas» da Comissão em última instância sobre a qualificação e a compatibilidade das medidas contestadas.

59      A Comissão, apoiada pelo Reino da Dinamarca, contesta esta argumentação, remetendo, nomeadamente, para os seus próprios argumentos desenvolvidos no âmbito da apreciação do primeiro e segundo fundamentos.

60      Segundo jurisprudência, quando a Comissão não puder adquirir a convicção, no termo de uma primeira análise no âmbito do procedimento previsto no artigo 108.o, n.o 3, TFUE, de que a medida de auxílio estatal, ou não constitui um «auxílio» na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, ou, se for qualificada de auxílio, é compatível com o Tratado FUE, ou quando este procedimento não lhe tiver permitido ultrapassar todas as dificuldades levantadas pela apreciação da compatibilidade da medida em causa, essa instituição tem a obrigação de dar início ao procedimento previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE, sem dispor, nesta matéria, de margem de apreciação (v. Acórdão de 22 de dezembro de 2008, British Aggregates/Comissão, C‑487/06 P, EU:C:2008:757, n.o 113 e jurisprudência referida; v., igualmente, neste sentido, Acórdão de 10 de maio de 2005, Itália/Comissão, C‑400/99, EU:C:2005:275, n.o 48). Esta obrigação é, aliás, expressamente confirmada pelas disposições conjugadas do artigo 4.o, n.o 4, e do artigo 13.o, n.o 1, do Regulamento n.o 659/1999 (Acórdão de 22 de dezembro de 2008, British Aggregates/Comissão, C‑487/06 P, EU:C:2008:757, n.o 113).

61      O conceito de dificuldades sérias reveste caráter objetivo. A existência de tais dificuldades deve ser apreciada tanto em função das circunstâncias da adoção do ato impugnado como do seu conteúdo, de modo objetivo, relacionando as razões da decisão com os elementos de que a Comissão dispunha quando se pronunciou sobre a compatibilidade dos auxílios controvertidos com o mercado interno (v. Acórdão de 28 de março de 2012, Ryanair/Comissão, T‑123/09, EU:T:2012:164, n.o 77 e jurisprudência referida). Daqui resulta que a fiscalização da legalidade efetuada pelo Tribunal Geral no que toca à existência de dificuldades sérias não pode, por natureza, limitar‑se à verificação de um erro manifesto de apreciação (v. Acórdãos de 27 de setembro de 2011, 3F/Comissão, T‑30/03 RENV, EU:T:2011:534, n.o 55 e jurisprudência referida, e de 10 de julho de 2012, Smurfit Kappa Group/Comissão, T‑304/08, EU:T:2012:351, n.o 80 e jurisprudência referida). Com efeito, a decisão adotada pela Comissão sem abertura da fase formal de investigação pode ser anulada unicamente por esse motivo, por ter sido omitida a análise contraditória e aprofundada prevista pelo Tratado FUE, mesmo que não esteja demonstrado que as apreciações materiais da Comissão eram jurídica ou factualmente erradas (v., neste sentido, Acórdão de 9 de setembro de 2010, British Aggregates e o./Comissão, T‑359/04, EU:T:2010:366, n.o 58).

62      Resulta igualmente da jurisprudência que a insuficiência ou incompletude da análise feita pela Comissão na fase preliminar de análise constitui um indício da existência de dificuldades sérias (v. Acórdão de 9 de dezembro de 2014, Netherlands Maritime Technology Association/Comissão, T‑140/13, não publicado, EU:T:2014:1029, n.o 49 e jurisprudência referida).

63      Cabe às recorrentes provar a existência de dificuldades sérias, prova essa que podem fazer a partir de uma série de indícios concordantes (v., neste sentido, Acórdão de 17 de março de 2015, Pollmeier Massivholz/Comissão, T‑89/09, EU:T:2015:153, n.o 51 e jurisprudência referida).

64      É à luz desta jurisprudência que há que apreciar a argumentação, invocada no âmbito do quarto fundamento, relativa às medidas de auxílio de Estado concedidas ao Consórcio e declaradas compatíveis com o mercado interno. A referida argumentação divide‑se em duas partes, relativas, em primeiro lugar, à análise insuficiente e incompleta da qualificação das garantias estatais concedidas ao Consórcio à luz do artigo 107.o, n.o 1, TFUE e, em segundo lugar, à análise insuficiente e incompleta da compatibilidade das garantias estatais e dos auxílios fiscais dinamarqueses concedidos ao Consórcio à luz do artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE.

a)      Quanto à primeira parte, relativa à análise insuficiente e incompleta da qualificação das garantias estatais concedidas ao Consórcio à luz do artigo 107.o, n.o 1, TFUE

65      No âmbito da primeira parte do quarto fundamento, a argumentação das recorrentes divide‑se, em substância, em quatro acusações, relativas a uma avaliação insuficiente e incompleta, primeiro, do caráter incondicional da concessão das garantias estatais à data da constituição do Consórcio, do direito judicialmente invocável do Consórcio de obter financiamento garantido pelo Reino da Dinamarca e pelo Reino da Suécia nessa data, da possibilidade de terceiros invocarem esse direito quando o Consórcio age no âmbito das suas competências e do número de garantias; segundo, da questão de saber se as garantias estatais constituíam auxílios individuais ou regimes de auxílio; terceiro, da questão de saber se as garantias suecas constituíam um auxílio novo ou existente; e, quarto, da questão de saber se as garantias estatais se limitavam ao financiamento da ligação fixa.

66      É à luz da jurisprudência referida nos n.os 60 a 63, supra, que esta argumentação deve ser apreciada.

67      O Tribunal Geral considera que deve começar‑se por analisar a segunda acusação, que visa a conclusão de que as garantias estatais são regimes de auxílio.

68      No caso de um regime de auxílios, a Comissão pode limitar‑se a estudar as características gerais do regime em causa, sem ser obrigada a examinar cada caso de aplicação específico, para verificar se esse regime contém elementos de auxílio (Acórdão de 15 de novembro de 2011, Comissão e Espanha/Government of Gibraltar e Reino Unido, C‑106/09 P e C‑107/09 P, EU:C:2011:732, n.o 122). Além disso, como alegam as recorrentes, aplicam‑se regras diferentes aos auxílios individuais e aos regimes de auxílio, nos termos das várias comunicações da Comissão sobre as garantias, por exemplo, no modo como o elemento de auxílio deve ser calculado.

69      Com esta acusação, as recorrentes visam, primeiro, contradições na redação da decisão impugnada; segundo, a falta de análise das garantias estatais face ao conceito de «regime» de auxílio; e, terceiro, um erro de direito, visto que as garantias estatais não cabem em nenhuma das duas definições de um regime de auxílios previstas no artigo 1.o, alínea d), do Regulamento n.o 659/1999. Tais insuficiências e contradições são reveladoras de uma apreciação insuficiente e incompleta, e constitui um indício de que a Comissão teve dificuldades sérias em qualificar as garantias estatais de «regimes» de auxílio. Em substância, as recorrentes consideram que as garantias estatais deviam ter sido analisadas como tantas garantias individuais ad hoc quantos os empréstimos e instrumentos financeiros contraídos pelo Consórcio para a construção e exploração da ligação fixa e cobertos por tais garantias.

70      A Comissão contesta esta apreciação e considera, em primeiro lugar, que resulta claramente da fundamentação da decisão impugnada que as garantias estatais foram analisadas como um regime de auxílios e que qualquer garantia específica de empréstimo que aplique o regime de garantias definitivamente concedido em 1992 constituía um auxílio individual concedido ao abrigo desse regime, e não um auxílio individual ad hoc. Em segundo lugar, a Comissão alega que as garantias estatais correspondem à definição de regimes de auxílio dada pelo artigo 1.o, alínea d), segunda frase, do Regulamento n.o 659/1999 por se tratar de auxílios «não ligados a um projeto específico», dado que cobrem simultaneamente a construção e a exploração da ligação fixa e foram concedidos por duração e montante indeterminados, mesmo que limitados ao período necessário ao reembolso da dívida do Consórcio.A este respeito, a Comissão explica que, na altura em que foram concedidos, o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia ignoravam o tempo que seria necessário para o reembolso da dívida e sua dimensão e que, se as garantias estatais devessem ser interpretadas como ligadas a um «projeto específico», nunca poderia pôr em causa eventuais medidas de auxílio concedidas para fins gerais, o que comprometeria o efeito útil das regras sobre os auxílios de Estado.

71      Por sua vez, o Reino da Dinamarca alega que as garantias estatais devem ser consideradas um ou dois auxílios individuais na aceção do artigo 1.o, alínea e), do Regulamento n.o 659/1999, concedidos incondicionalmente em 1992, e não um ou dois regimes de auxílio, uma vez que a totalidade da vantagem económica decorrente das garantias foi conferida ao Consórcio no momento da concessão. A este respeito, salienta que as garantias estatais estão efetivamente ligadas, do ponto de vista do seu montante e do tempo, ao projeto específico de ligação fixa. Em resposta a uma questão do Tribunal Geral, o Reino da Suécia expressou uma visão semelhante à do Reino da Dinamarca e dúvidas acerca da qualificação das garantias estatais de «regime» de auxílios na aceção da definição prevista no artigo 1.o, alínea d), segunda frase, do Regulamento n.o 659/1999 por visarem apenas um projeto determinado.

72      As recorrentes consideram que a tese do Reino da Dinamarca, mencionada no n.o 71, supra, deve ser julgada inadmissível, na medida em que esta tese é contrária à posição da Comissão e em que os intervenientes se devem limitar a apoiar, no todo ou em parte, os pedidos da Comissão e a aceitar o processo no seu estado e não podem invocar fundamentos autónomos.

73      Em primeiro lugar, quanto às contradições de redação invocadas, há que observar, à semelhança das recorrentes, que a decisão impugnada menciona ou «a garantia concedida pelo Estado dinamarquês», «a garantia concedida [pelo] Estado sueco» (considerandos 109 e 110), «as garantias estatais» (considerandos 33, 51, 88, 114, 123, 124, 130, 131, 134 e 135), «as garantias» (considerandos 85 e 137), as «duas garantias» (considerandos 34, 50, 52 e 129), «as garantias concedidas pela Dinamarca» (conclusões, primeiro parágrafo) ou ainda «a garantia concedida ao Consórcio pela Suécia» (conclusão, segundo parágrafo). No entanto, no considerando 52 da decisão impugnada, a Comissão considerou que duas das garantias tinham sido concedidas incondicionalmente em 27 de janeiro de 1992, dia da constituição do Consórcio e em que obteve um direito legal de financiamento através de garantias de Estado. No considerando 53 da decisão impugnada, a Comissão considerou que, apesar de as garantias individuais terem sido confirmadas e emitidas por cada mutuante pelo Reino da Dinamarca e pelo Reino da Suécia, tal não altera em nada o facto de estes se terem definitivamente comprometido a garantir as obrigações do Consórcio relativas aos empréstimos e demais instrumentos financeiros para o financiamento da ligação fixa. A Comissão concluiu igualmente, no dispositivo da decisão impugnada, que, tendo especialmente em conta os compromissos assumidos pelo Reino da Dinamarca e pelo Reino da Suécia, não era necessário dar início ao procedimento relativo aos «regimes» de auxílio existentes, em relação à garantia concedida pelo Reino da Suécia (conclusões, segundo parágrafo). Além disso, resulta dos considerandos 111 a 138 da decisão impugnada que a apreciação da compatibilidade das garantias estatais com o mercado interno foi efetivamente efetuada pela Comissão como se estivesse perante um ou mais «regimes» de auxílio, uma vez que se limitou a apreciar as características e a compatibilidade das garantias previstas no Acordo Intergovernamental e no Acordo de Consórcio, sem apreciar casuisticamente as garantias por cada empréstimo específico do Consórcio.

74      Consequentemente, embora a redação da decisão impugnada não seja totalmente clara e coerente a este respeito, resulta do raciocínio geral da Comissão e do dispositivo da decisão impugnada que esta considerou efetivamente as garantias estatais como um ou dois regimes de auxílio adotados definitivamente em 1992 e considerou ver as garantias emitidas posteriormente para cada empréstimo contraído pelo Consórcio como auxílios individuais decorrentes dos referidos regimes de auxílio.

75      Em segundo lugar, no que respeita à inexistência de análise das garantias estatais face ao conceito de «regime» de auxílios, é forçoso constatar que a decisão impugnada não fornece qualquer explicação sobre as razões pelas quais as garantias estatais devem ser consideradas regimes de auxílio, o que é um elemento que permite demonstrar a existência de uma análise insuficiente e incompleta.

76      Em terceiro lugar, mesmo admitindo, como alega a Comissão, que da decisão impugnada se possa deduzir que as garantias estatais correspondem à definição dos regimes de auxílio dada pelo artigo 1.o, alínea d), segunda frase, do Regulamento n.o 659/1999, a saber, «qualquer diploma com base no qual pode ser concedido a uma ou mais empresas um auxílio não ligado a um projeto específico, por um período de tempo indefinido e/ou com um montante indefinido», basta observar que, in casu, a decisão impugnada nada diz sobre como os auxílios incluídos nas garantias estatais preenchem o requisito de que o auxílio não deve estar ligado a um projeto específico.

77      Com efeito, o Acordo Intergovernamental, que prevê no seu artigo 12.o que o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia devem «garantir, conjunta e solidariamente, as obrigações decorrentes dos empréstimos contraídos pelo Consórcio e de outros instrumentos financeiros utilizados para o financiamento», intitula‑se «Tratado […] relativo a uma ligação fixa que atravessa o Sund». Além disso, o ponto 4, n.o 3, do Acordo de Consórcio precisa que as garantias estatais cobrem «[a]s necessidades de capital do Consórcio para o planeamento, a conceção do projeto e a construção da ligação do Sund, incluindo os custos do serviço de empréstimos contraídos, e para a cobertura das necessidades de capital decorrentes das perdas contabilísticas previstas por um determinado número de anos após a abertura da ligação fixa ao tráfego». Por outro lado, os artigos 1.o e 2.o do Acordo Intergovernamental e o anexo 1 do referido acordo preveem precisamente a localização geográfica da ligação fixa, bem como as suas especificidades técnicas. Consequentemente, não poderá tratar‑se de garantias concedidas a uma ponte qualquer.

78      Como sublinham as recorrentes, no âmbito da apreciação da compatibilidade com o mercado interno efetuada ao abrigo do artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE, a Comissão entendeu, nos considerandos 115 e 116 da decisão impugnada, que a ligação fixa do Sund era um projeto «específico, preciso e claramente definido». A Comissão remeteu aí para o artigo 2.o e para o anexo 1 do Acordo Intergovernamental, que demonstravam que se tratava de um projeto definido de forma muito específica e clara no que se referia à localização geográfica e à conceção técnica.

79      Por um lado, o facto de afirmar, na fase da qualificação das garantias estatais, que se trata de um ou de dois regimes de auxílio porque o auxílio resultante dessas garantias não está ligado a um projeto específico, e, por outro, o facto de afirmar, na fase da apreciação da compatibilidade das medidas com o mercado interno, que as garantias estatais respeitam a um projeto que é «específico, preciso e claramente definido» parecem contradizer‑se de forma irresolúvel. Contrariamente ao que a Comissão adianta, não se trata aqui de conceitos jurídicos diferentes, mas de um elemento de facto, estabelecido nos considerandos 115 e 116 da decisão impugnada, que não pode variar de apreciação jurídica para apreciação jurídica.

80      A este respeito, é também incorretamente que a Comissão sustenta que as garantias estatais não devem ser consideradas ligadas a um projeto «específico» porque os auxílios incluídos nessas garantias estatais cobrem tanto a fase de construção como a fase de exploração da ligação fixa. Com efeito, dado que o adjetivo «específico» significa «que é próprio de algo», há que considerar os auxílios relativos às garantias estatais ligados a um projeto específico por cobrirem os empréstimos do Consórcio relativos apenas ao projeto da ligação fixa, incluindo na fase de exploração, com exclusão de outros projetos ou atividades. Em bom rigor o caráter «indefinido» da fase de exploração, sublinhado pela Comissão, não diz respeito à especificidade do projeto, mas sim à apreciação do caráter limitado, ou não, das garantias estatais, no âmbito da sua avaliação de compatibilidade. Quanto a si, o argumento da Comissão de que, em substância, as medidas de auxílio, no caso em apreço, foram concedidas «para fins gerais» é igualmente contraditório com os considerandos 51 e 131 da decisão impugnada, segundo os quais as garantias estatais são limitadas ao planeamento, à construção e à exploração da ligação fixa através do Sund, com exclusão de qualquer outra atividade.

81      Resulta do exposto que, no procedimento preliminar de análise, a Comissão foi confrontada com dificuldades sérias na qualificação das garantias estatais de «regimes» de auxílio.

82      Ora, as questões suscitadas no presente processo, que são as de saber se as garantias constituem um ou regimes de auxílio adotados em 1992, um ou dois auxílios individuais ad hoc incondicionalmente concedidos em 1992 ou tantos auxílios individuais ad hoc quantos empréstimos do Consórcio cobertos pelas garantias estatais, são indissociáveis da análise da segunda acusação da primeira parte, mas também da primeira acusação, respeitante à determinação da data de concessão incondicional das garantias estatais ao Consórcio e da quantidade de garantias. Além disso, como a própria Comissão reconhece, as questões suscitadas nas duas primeiras acusações da primeira parte do quarto fundamento tem igualmente consequências na qualificação das garantias estatais, tendo em conta o conceito de auxílio «existente», definido no artigo 1.o, alínea b), i) e iv), do Regulamento n.o 659/1999, que diz respeito à terceira acusação.

83      Assim, há que acolher a segunda acusação da primeira parte do quarto fundamento e, por conseguinte, a primeira parte desse fundamento na totalidade, sem que seja necessário pronunciar‑se sobre a primeira e terceira acusações, nem sobre a argumentação do Reino da Dinamarca, mencionada no n.o 71, supra. Consequentemente, há que anular a decisão impugnada na parte em que qualificou as garantias estatais de «regimes» de auxílio sem dar início ao procedimento formal de investigação e devolver à Comissão toda a análise relativa à data de concessão das garantias estatais, à sua quantidade e qualidade de auxílio novo ou existente.

[Omissis]

b)      Quanto à primeira parte, relativa à análise insuficiente e incompleta da compatibilidade dos auxílios de Estado concedidos ao Consórcio à luz do artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE

85      No âmbito da segunda parte do quarto fundamento, as recorrentes alegam a análise insuficiente e incompleta da compatibilidade das garantias estatais e dos auxílios fiscais dinamarquesas com o mercado interno. Adiantam, em substância, sete acusações. Em primeiro lugar, a Comissão não quantificou o elemento de auxílio incluído nas garantias estatais. Em segundo lugar, não procurou saber se existiam condições de execução das garantias estatais. Em terceiro lugar, procedeu a uma análise insuficiente e incompleta da distinção entre as fases de construção e de exploração da ligação fixa e não analisou a compatibilidade das garantias estatais à luz apenas da fase de exploração. Em quarto lugar, procedeu a uma análise insuficiente e incompleta da questão de saber se as garantias estatais e os auxílios fiscais dinamarqueses eram limitados em termos de montante e no tempo. Em quinto lugar, procedeu a uma análise insuficiente e incompleta da necessidade e da proporcionalidade das garantias estatais e dos auxílios fiscais dinamarqueses. Em sexto lugar, não analisou o efeito negativo dos auxílios na concorrência e nas trocas comerciais nem aplicou o critério dito «da ponderação». Em sétimo lugar, procedeu a uma análise insuficiente e incompleta, em substância, da ligação entre as vantagens fiscais e as garantias estatais.

86      A título preliminar, a Comissão considera que a argumentação geral das recorrentes consiste num convite ao Tribunal Geral para fiscalizar a legalidade da decisão impugnada à luz das práticas e orientações existentes à data de adoção da decisão impugnada, em vez das que existiam à data de concessão dos auxílios de Estado, o que é juridicamente errado. Recorda, apoiada pelo Reino da Dinamarca, que, em conformidade com a sua comunicação relativa à determinação das regras aplicáveis à apreciação dos auxílios estatais concedidos ilegalmente, de 22 de maio de 2002 (JO 2002, C 119, p. 22), há que apreciar a compatibilidade dos auxílios de acordo com os critérios materiais fixados em instrumentos vigentes à data da sua concessão. Ora, segundo a Comissão, as garantias estatais foram definitivamente prestadas em janeiro de 1992, quando foi constituído o Consórcio.

[Omissis]

90      O Tribunal Geral considera que deve começar‑se por analisar a segunda, terceira e quarta acusações, depois analisar conjuntamente a primeira, quinta e sexta acusações e, finalmente, a sétima acusação.

1)      Quanto à segunda acusação, relativa à não verificação da existência de condições de execução das garantias

91      As recorrentes referem‑se, em substância, aos argumentos invocados no âmbito do fundamento relativo a um erro de direito constituído pela falta de verificação da existência de condições de execução das garantias estatais, em conformidade com o ponto 5.3 da comunicação da Comissão relativa à aplicação dos artigos [107.o] e [108.o TFUE] aos auxílios estatais sob forma de garantias (JO 2008, C 155, p. 10; a seguir «comunicação sobre as garantias de 2008»).

92      A Comissão não contesta o facto de não ter verificado a existência dessas condições de execução. Contudo, considera que não eram necessárias, uma vez que a comunicação sobre as garantias de 2008 não era aplicável ratione temporis a um regime de auxílio concedido em 1992. Além disso, entende que se tratava, no caso vertente, de um caso muito específico, concretamente de uma parceria de empresas públicas constituída com o objetivo preciso de construir e explorar a ligação fixa, e não de uma pessoa coletiva de direito dinamarquês ou sueco, cuja insolvência possa ser judicialmente declarada nesses Estados‑Membros. Sublinha que o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia exercem sobre o Consórcio uma fiscalização completa, estratégica e operacional, faculdade de que habitualmente os Estados‑Membros não dispõem sobre um operador privado independente beneficiário de garantias. A Comissão assinala também que, de qualquer modo, tais condições de execução seriam provavelmente incompatíveis com o Acordo Intergovernamental.

93      A título preliminar, o Tribunal Geral observa que não é necessário verificar se o ponto 5.3 da comunicação sobre as garantias de 2008 era aplicável no caso em apreço, na medida em que, como reconheceu a própria Comissão, a exigência dessas condições de execução já existia em 1992, data que foi tida em conta na decisão impugnada como data de concessão das garantias. Com efeito, a carta da Comissão aos Estados‑Membros SG(89) D/4328, de 5 de abril de 1989, já mencionava que «[a] Comissão só [aceitaria] as garantias se a respetiva execução [estivesse] subordinada por via contratual a condições específicas que poderão incluir a declaração obrigatória de falência da empresa beneficiária ou outro procedimento análogo [e que e]stas condições [deviam] ser acordadas aquando da análise inicial e única das garantias de Estado previstas no âmbito dos procedimentos normais do n.o 3 do artigo [108.o TFUE], na fase de concessão».

94      No domínio específico dos auxílios de Estado, o juiz da União já teve oportunidade de sublinhar que a Comissão se podia dotar de linhas diretrizes para o exercício dos seus poderes de apreciação e que, desde que não se afastem das regras do Tratado FUE, as regras indicativas que essas diretrizes continham impunham‑se à instituição (v. Acórdão de 13 de junho de 2002, Países Baixos/Comissão, C‑382/99, EU:C:2002:363, n.o 24 e jurisprudência referida). Importa também realçar que, ao adotar regras de conduta e ao anunciar, através da sua publicação, que as aplicará no futuro aos casos a que essas regras dizem respeito, a Comissão autolimita‑se no exercício do seu poder de apreciação e não pode desrespeitar essas regras sob pena de vir a ser sancionada, eventualmente, por violação de princípios gerais do direito, como a igualdade de tratamento ou a proteção da confiança legítima, a não ser que apresente razões que justifiquem, à luz desses mesmos princípios, que se afaste das suas próprias regras (v., neste sentido, Acórdãos de 28 de junho de 2005, Dansk Rørindustri e o./Comissão, C‑189/02 P, C‑202/02 P, C‑205/02 P a C‑208/02 P e C‑213/02 P, EU:C:2005:408, n.o 211, e de 11 de setembro de 2008, Alemanha e o./Kronofrance, C‑75/05 P e C‑80/05 P, EU:C:2008:482, n.o 60).

95      No caso em apreço, é pacífico que a decisão impugnada é omissa quanto à existência de condições de execução das garantias estatais. Consequentemente, tendo em conta os n.os 93 e 94, supra, foi sem razão que a Comissão não verificou a existência de condições de execução das garantias estatais. Daqui resulta que a análise da compatibilidade das garantias estatais foi insuficiente e incompleta, o que constitui um indício da existência de dificuldades sérias, em conformidade com a jurisprudência referida no n.o 62, supra.

96      Relativamente às justificações da Comissão, mencionadas no n.o 92, supra, cabe salientar que a Comissão não explica em que medida o facto de o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia exercerem uma fiscalização completa, estratégica e operacional, sobre o Consórcio constitui uma garantia de que, na hipótese de as garantias estatais deverem ser executadas, o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia chegariam a prosseguir com a sua liquidação. A Comissão não menciona nenhuma disposição que as obrigue a exercer tal ação. Pelo contrário, até sugere que a liquidação do Consórcio é impossível juridicamente à luz do Acordo Intergovernamental.

97      De qualquer forma, não se pode deixar de observar que estas considerações não permitem suprir a falta de análise das condições de execução das garantias estatais por parte da Comissão.

98      Consequentemente, há que acolher a segunda acusação, relativa à análise insuficiente e incompleta da existência de condições de execução das garantias estatais.

2)      Quanto à terceira acusação, relativa à apreciação insuficiente e incompleta da distinção entre a construção e a exploração da ligação fixa e à falta de apreciação da compatibilidade das garantias estatais no que respeita à exploração da ligação fixa, e quanto à quarta acusação da primeira parte, relativa à apreciação insuficiente e incompleta da questão de saber se as garantias estatais eram limitadas ao financiamento da ligação fixa

99      No âmbito da terceira acusação, as recorrentes alegam que, erradamente, não foi feita nenhuma distinção entre as fases de construção e de exploração da ligação fixa no âmbito da análise da compatibilidade das garantias estatais. Na opinião das recorrentes, a Comissão devia ter analisado em que medida as garantias estatais que cobrem a fase de exploração deviam ser consideradas compatíveis com o mercado interno, quando, na realidade, constituem auxílios ao funcionamento, por natureza incompatíveis com o mercado interno.

[Omissis]

101    A Comissão contesta esta interpretação e considera que resulta da decisão impugnada que as garantias estatais e os auxílios fiscais dinamarqueses diziam efetivamente respeito à construção e exploração da ligação fixa e que a sua análise da compatibilidade abrangeu efetivamente as duas fases. Considera que é «lógico» que a decisão impugnada esteja mais centrada no apoio à construção da ligação fixa e, por conseguinte, no auxílio ao investimento, já que os custos de construção representam a parte mais significativa dos custos. A Comissão contesta, porém, quaisquer acusações de auxílio ao funcionamento, pelo facto de o Consórcio reembolsar as suas dívidas, o que pressupõe que as receitas sejam suficientes para cobrir os custos de exploração, por um lado, e que o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia se tenham comprometido a notificar qualquer novo empréstimo garantido e qualquer nova vantagem concedida após 2040 (estando o prazo de reembolso da dívida previsto entre 30 e 43 anos após a abertura da ligação fixa em 2000), por outro. Por último, alega que a sua prática decisória no que toca os PIIEC não distingue entre a construção e a exploração das infraestruturas.

[Omissis]

103    Segundo a jurisprudência, devem ser qualificados de auxílios ao funcionamento os auxílios que visam libertar uma empresa dos custos que devia normalmente suportar no âmbito da sua gestão corrente ou das suas atividades normais (v., neste sentido, Acórdão de 19 de setembro de 2000, Alemanha/Comissão, C‑156/98, EU:C:2000:467, n.o 30 e jurisprudência referida).

104    Decorre da jurisprudência que os auxílios ao funcionamento não integram, em princípio, o âmbito de aplicação do artigo 107.o, n.o 3, TFUE. Com efeito, segundo a jurisprudência, estes auxílios, em princípio, falseiam as condições de concorrência nos setores em que são concedidos, sem, apesar disso, serem capazes, pela sua própria natureza, de atingir um dos objetivos fixados pelas disposições derrogatórias já referidas (v., neste sentido, Acórdãos de 14 de fevereiro de 1990, França/Comissão, C‑301/87, EU:C:1990:67, n.o 50; de 6 de novembro de 1990, Itália/Comissão, C‑86/89, EU:C:1990:373, n.o 18; e de 8 de junho de 1995, Siemens/Comissão, T‑459/93, EU:T:1995:100, n.o 48). Existe, portanto, uma presunção decorrente da jurisprudência de que os auxílios ao funcionamento falseiam, pela sua própria natureza, a concorrência (Acórdão de 5 de outubro de 2000, Alemanha/Comissão, C‑288/96, EU:C:2000:537, n.o 77) e afetam as condições das trocas comerciais em medida contrária ao interesse comum (Acórdão de 6 de novembro de 1990, Itália/Comissão, C‑86/89, EU:C:1990:373, n.o 18). Tais auxílios são, em princípio, proibidos (v., neste sentido, Acórdãos de 19 de setembro de 2002, Espanha/Comissão, C‑113/00, EU:C:2002:507, n.os 69 a 71, e de 20 de outubro de 2011, Eridania Sadam/Comissão, T‑579/08, não publicado, EU:T:2011:608, n.o 41).

105    Nos considerandos 32 e 33 da decisão impugnada, refere‑se que as garantias estatais cobrem «todos os empréstimos e demais instrumentos financeiros utilizados pelo Consórcio para o financiamento da [ligação fixa]». Tal também decorre do artigo 12.o do Acordo Intergovernamental, nos termos do qual «[o Reino da] Dinamarca e [o Reino da] Suécia comprometem‑se a garantir, conjunta e solidariamente, as obrigações decorrentes dos empréstimos do Consórcio e de outros instrumentos financeiros utilizados para o financiamento [da ligação fixa]». Na parte dedicada à análise da necessidade e da proporcionalidade do auxílio, refere‑se, muito genericamente, o «financiamento» da ligação fixa (considerandos 123, 124, 129 e 131).

106    No considerando 126 da decisão impugnada, a Comissão indica apenas as estimativas em números do orçamento inicial relativo ao planeamento e à construção da linha fixa, sem evocar de todo o montante que o Consórcio teve e ainda terá de pedir emprestado para cobrir os custos de exploração. No considerando 130 da decisão impugnada, a Comissão explicou que «o principal objetivo das garantias estatais era garantir o financiamento da construção da ligação fixa e assegurar que o Consórcio não p[ossa] obter empréstimos cobertos pelas garantias com o objetivo de alargar as suas atividades para além deste objetivo».

107    Ora, o artigo 10.o do Acordo Intergovernamental, que enumera taxativamente as funções do Consórcio, menciona igualmente a exploração da ligação fixa. O ponto 4, n.o 3, do Acordo de Consórcio também prevê que as garantias estatais cobrirão as necessidades de capital do Consórcio «decorrentes das perdas contabilísticas previstas por um determinado número de anos após a abertura da ligação fixa ao tráfego». A este respeito, nem a Comissão nem o Reino da Dinamarca ou o Reino da Suécia contestam que as garantias estatais também cobrem os empréstimos contraídos para fazer face aos custos de exploração do Consórcio, o que também é recordado no considerando 50 da decisão impugnada. Ora, os custos de exploração são custos que o Consórcio devia normalmente ter suportado no âmbito da sua gestão corrente ou das suas atividades normais.

108    Consequentemente, embora seja certo que as garantias estatais cobrem os custos de construção e os custos de exploração da ligação fixa, a análise da compatibilidade do auxílio relacionado com as garantias estatais e, em especial, sua necessidade e proporcionalidade, não distingue, ou não distingue suficientemente, o auxílio à construção e o auxílio à exploração da ligação fixa e é inexistente no que se refere à fase de exploração em si mesma. Assim, a ajuda que cobre os custos de exploração da ligação fixa não foi objeto de uma análise específica da compatibilidade, embora seja suscetível de constituir um auxílio ao funcionamento.

109    Nenhum dos argumentos da Comissão, mesmo considerados na perspetiva do quarto fundamento, relativo à existência de dificuldades sérias, invalida esta conclusão.

[Omissis]

111    Em segundo lugar, quanto ao argumento de que a qualificação de auxílio ao funcionamento está excluída, uma vez que o Consórcio reembolsa regularmente as suas dívidas, há que concluir que o reembolso regular dos seus empréstimos não exclui que o Consórcio beneficie de uma vantagem em relação aos seus concorrentes, assente no facto de que dispõe, sem contrapartida, de garantias que cobrem 100% dos seus empréstimos, nomeadamente os empréstimos para fazer face a custos que teria normalmente de suportar sozinho, no âmbito da gestão corrente das suas atividades normais, ou seja, os custos de exploração. Assim, as garantias estatais permitem‑lhe ter acesso a condições de empréstimo muito vantajosas. Além disso, importa sublinhar que, da leitura da decisão impugnada, não se pode excluir que o reembolso regular dos empréstimos pelo Consórcio possa ser alimentado por novos empréstimos cobertos pelas referidas garantias, na medida em que, no considerando 131 da decisão impugnada, se refere que as garantias estatais cobrem as necessidades de financiamento ou refinanciamento da dívida do Consórcio e que outros empréstimos garantidos podem ser contraídos sem notificação prévia à Comissão até ao final de 2040.

112    Em terceiro lugar, há que rejeitar o argumento de que, em qualquer caso, a qualificação de auxílio ao funcionamento está excluída, na medida em que o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia se comprometeram a notificar qualquer novo empréstimo garantido após o final de 2040 e qualquer nova vantagem concedida após essa data. Com efeito, a Comissão não explica, nem na decisão impugnada, nem no âmbito do presente processo, em que medida a qualificação de auxílio ao funcionamento está excluída no que respeita às garantias dadas aos empréstimos contraídos para cobrir os custos de exploração até ao final de 2040.

[Omissis]

114    Consequentemente, há que acolher a terceira acusação relativa a uma análise insuficiente e incompleta no que se refere à distinção, aquando da análise da compatibilidade das garantias estatais, entre a fase de construção e a fase de exploração da ligação fixa e à falta de análise da compatibilidade específica das garantias relacionadas com a exploração da ligação fixa.

[Omissis]

3)      Quanto à quarta acusação, relativa à análise insuficiente e incompleta do caráter limitado, no tempo e quanto ao montante, das garantias estatais e dos auxílios fiscais dinamarqueses concedidos ao Consórcio

118    No âmbito da quarta acusação da segunda parte, as recorrentes alegam a insuficiência e incompletude da análise, no considerando 131 da decisão impugnada, da limitação no tempo e no montante das garantias estatais. As recorrentes recordam que os auxílios ilimitados constituem, em princípio, auxílios estatais incompatíveis com o mercado interno. Alegam igualmente a insuficiência da apreciação da limitação dos auxílios fiscais dinamarqueses concedidos ao Consórcio.

119    A Comissão contesta esta argumentação e explica que o facto de a dívida acumulada do Consórcio variar ao longo do tempo não afeta minimamente a afirmação de que as garantias estatais são, na prática, limitadas à dívida acumulada do Consórcio em qualquer momento, dívida que, na realidade, deve diminuir constantemente. O mero facto de ainda desconhecer o momento em que a dívida será totalmente reembolsada não afeta o facto de as garantias estatais se limitarem ao tempo necessário para o reembolso da dívida. Além disso, a Comissão sublinha que os compromissos a que o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia se propuseram são um elemento significativo da sua apreciação do caráter limitado dos auxílios, uma vez que lhe permitem agir contra outros empréstimos cobertos pelas garantias estatais eventualmente contraídos após o final de 2040 e contra outras vantagens económicas eventualmente concedidas após a referida data.

120    Segundo a jurisprudência, há que considerar que a concessão de uma garantia em condições que não correspondem às do mercado, como seja uma garantia ilimitada concedida sem contrapartida, é, de modo geral, suscetível de conferir uma vantagem à pessoa que dela beneficia, no sentido de que tem por consequência uma melhoria da posição financeira do beneficiário mediante uma diminuição dos encargos que, normalmente, oneram o seu orçamento. Ora, as garantias estatais ilimitadas permitem nomeadamente ao seu beneficiário obter condições de crédito mais favoráveis do que as que obteria apenas pelos seus méritos e, portanto, permite reduzir a pressão sobre o seu orçamento (Acórdão de 20 de setembro de 2012, França/Comissão, T‑154/10, EU:T:2012:452, n.os 106 e 108).

121    No caso em apreço, resulta do considerando 127 da decisão impugnada que, no final de 2000, a dívida líquida do Consórcio, incluindo os juros vencidos, era de 19,4 mil milhões de coroas dinamarquesas (DKK), que, no final de 2003, tinha aumentado para 20,1 mil milhões DKK, mas que, no final de 2013, tinha diminuído para 16,6 mil milhões DKK, e que o Consórcio previa que não aumentaria para um nível superior ao de 2013. No considerando 128 da decisão impugnada, a Comissão sublinhou que o período de reembolso do investimento realizado pelo Consórcio tinha sido estimado, em 1991, em 30 anos, a partir de 2000, mas que esta estimativa flutuou entre 30 e 36 anos, visto que o período estimado de reembolso pelo Consórcio era calculado numa base anual e publicado nos relatórios anuais do Consórcio. No relatório anual de 2013 previu‑se que a dívida seria paga até 2034. O cálculo da duração de reembolso da dívida do Consórcio era baseado numa série de previsões, relativas, nomeadamente, ao desenvolvimento das receitas resultantes do tráfego, aos custos de exploração, aos custos de reinvestimento, aos custos de financiamento e ao pagamento de dividendos às sociedades‑mãe do Consórcio. Entre elas, a mais importante foi a previsão das receitas geradas pelo tráfego rodoviário, que representavam 75% do total das receitas e que tinham variado consideravelmente ao longo do tempo. A Comissão também referiu que, dadas as incertezas em relação à evolução futura do tráfego, o Consórcio tinha equacionado três cenários possíveis: um cenário de base com um período de reembolso de 34 anos, num cenário de crescimento com um período de reembolso de 30 anos e um cenário de estagnação com um período de reembolso de 43 anos

122    No considerando 129 da decisão impugnada, a Comissão referiu que as garantias estatais cobriam 100% da dívida do Consórcio. A Comissão referiu em seguida, no considerando 130 da decisão impugnada, que o objetivo principal das garantias estatais era permitir ao Consórcio financiar a construção da ligação fixa, com exclusão de eventuais extensões das suas atividades. Daqui deduziu, no considerando 131 da decisão impugnada, que as garantias estatais se limitavam ao que era necessário para que o Consórcio financiasse ou refinanciasse a sua dívida acumulada em virtude das suas funções de financiamento da ligação fixa. Esclareceu igualmente que, uma vez que não podiam ser utilizadas para objetivos diferentes do do financiamento da ligação fixa, as garantias estatais limitavam‑se efetivamente a cobrir «o montante total da dívida acumulada do Consórcio em qualquer momento». Por outro lado, considerou, remetendo para os considerandos 128 e 129 da decisão impugnada, que as garantias estatais eram, em princípio, limitadas no tempo, tendo em conta que o Consórcio deixaria de poder beneficiar dessas garantias, uma vez a dívida integralmente paga.

123    A Comissão considerou igualmente, nos considerandos 132 e 133 da decisão impugnada, que a vantagem resultante das garantias estatais e a resultante dos auxílios fiscais dinamarqueses eram interdependentes.

124    Nos considerandos 134 a 136 da decisão impugnada, a Comissão concluiu que as garantias estatais e demais vantagens económicas, incluindo vantagens fiscais, que o Consórcio poderia receber, se limitavam ao «período de reembolso da dívida real» e que o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia se tinham comprometido a que o Consórcio não recebesse tais vantagens após «ter totalmente reembolsado a sua dívida». A Comissão tomou ainda em conta, no considerando 135 da decisão impugnada, os compromissos assumidos pelo Reino da Dinamarca e pelo Reino da Suécia de lhe notificarem eventuais novos empréstimos cobertos pelas garantias estatais, contraídos após o final de 2040 ou eventuais novas vantagens económicas concedidas após essa data e de lhe apresentarem um relatório anual relativo ao estado do reembolso da dívida do Consórcio.

125    Em primeiro lugar, não se contesta que as garantias estatais cobrem 100% do montante dos empréstimos do Consórcio necessários à construção da ligação fixa e à sua exploração. Também não é contestado que o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia não fixaram limites a nível do montante ou da duração das garantias estatais nos textos que os regem, mencionados na decisão impugnada.

126    Isto é, aliás, confirmado pelo considerando 51 da decisão impugnada, segundo o qual «resulta da redação do Acordo Intergovernamental que as garantias estatais não estão limitadas no tempo». Ainda que o ponto 4, n.o 3, do Acordo de Consórcio indique que as garantias estatais cobrirão as necessidades de capital do Consórcio «decorrentes das perdas contabilísticas previstas por um determinado número de anos após a abertura da ligação [fixa] ao tráfego», importa observar que a expressão «durante um determinado número de anos» é muito vaga e não fixa um verdadeiro limite temporal ou relativo ao montante da cobertura da fase de exploração pelas garantias estatais.

127    Certamente, importa sublinhar que os empréstimos garantidos já contraídos pelo Consórcio à data da decisão impugnada estão, quanto a si, seguramente delimitados pelos termos de cada contrato de mútuo, que fixa um montante a reembolsar, bem como um prazo de reembolso. Mas a decisão impugnada não contém nenhuma precisão sobre eventuais limites ao montante total de empréstimos que as garantias estatais podem teoricamente cobrir. Em resposta a uma questão escrita do Tribunal Geral, a Comissão também esclareceu que ignorava inclusive quais eram os prazos de reembolso e os montantes dos empréstimos contraídos pelo Consórcio desde o início do projeto e que não tinha pedido, nem analisado, os contratos de mútuo existentes do Consórcio.

128    Em segundo lugar, sendo certo que, no considerando 128 da decisão impugnada, a Comissão refere o prazo provável do reembolso da dívida global do Consórcio, tal como avaliado em 2013, a Comissão refere também que esse prazo já variou entre 30 e 36 anos e pode ainda evoluir no futuro, tendo sido previstos vários cenários de reembolso, que dependem de numerosos fatores económicos. A Comissão confirmou igualmente, no n.o 93 da contestação, que não era possível saber exatamente quando a referida dívida seria reembolsada.

129    Em terceiro lugar, como alegam as recorrentes, a falta de limitação dos montantes garantidos ou do prazo de reembolso, conjugada com a possibilidade de contrair novos empréstimos cobertos a 100% pelas garantias estatais, pelo menos até final de 2040, pode implicar numerosas prorrogações do prazo de reembolso dos empréstimos do Consórcio, bem como um aumento do montante global da dívida coberta pelas garantias estatais. A este respeito, resulta da decisão impugnada, em especial dos considerandos 131 e 135, que o Consórcio pode contrair novos empréstimos garantidos e refinanciar‑se regularmente até ao final de 2040, sem ter de notificar os referidos empréstimos garantidos à Comissão. A este propósito, há que salientar que a incerteza principal, no caso em apreço, reside na falta de fixação de um montante máximo da dívida do consórcio suscetível de ser coberta pelas garantias estatais até ao final de 2040. Assim, não resulta suficientemente da decisão impugnada que a dívida do Consórcio esteja limitada no tempo e a nível do montante.

130    Resulta do exposto que a afirmação, no considerando 131 da decisão impugnada, de que «as garantias [estão] limitadas ao que [é] necessário para que o Consórcio (re)financie a sua dívida acumulada em virtude das suas funções de financiamento da ligação fixa» não demonstra suficientemente que existe um limite no tempo e do montante coberto pelas garantias, na medida em que, nomeadamente, o financiamento da ligação fixa cobre a sua exploração. Assim, as afirmações de que «[u]ma vez que as garantias estatais só podem ser utilizadas para as missões relativas ao financiamento da ligação fixa [do Sund] e não para outros objetivos, estas limitam‑se de facto a cobrir o montante total da dívida acumulada do Consórcio em qualquer momento» ou de que «as garantias estão de facto limitadas no tempo, uma vez que o Consórcio não poderá beneficiar das garantias após o reembolso completo da dívida» assentam num raciocínio circular e são insuficientes para determinar com precisão o limite de duração e de montante das garantias estatais, quando a própria dívida do Consórcio não parece estar limitada.

131    Nenhum dos argumentos adiantados da Comissão invalida esta conclusão.

[Omissis]

134    Em terceiro lugar, relativamente ao compromisso assumido pelo Reino da Dinamarca e pelo Reino da Suécia, apresentado na fase de análise preliminar, de notificar à Comissão, em conformidade com o artigo 108.o, n.o 3, TFUE, eventuais novos empréstimos cobertos pelas garantias estatais contraídos pelo Consórcio após 2040, a Comissão reconheceu, em resposta a uma questão do Tribunal Geral, que não limitava a duração das garantias estatais em si no final de 2040, dado que só se aplicava à concessão de novos empréstimos cobertos por essas garantias.Esta data representa, assim, apenas a data‑limite de concessão de novas garantias de empréstimo pelo Reino da Dinamarca e pelo Reino da Suécia, sem notificação à Comissão. Essa data não dá qualquer indicação quanto à duração dessas garantias, que está correlacionada com o prazo de reembolso dos empréstimos por elas cobertos. Ora, o prazo de reembolso dos referidos empréstimos também não é limitado pelos compromissos assumidos. Por outro lado, a Comissão reconheceu não dispor de informações sobre a duração dos empréstimos já contraídos pelo Consórcio. Consequentemente, há que declarar que o compromisso assumido pelo Reino da Dinamarca e pelo Reino da Suécia, mencionado no considerando 13 da decisão impugnada, não obsta a que as garantias estatais que cobrem os empréstimos já contraídos ou novos empréstimos contraídos até ao final de 2040 se prolonguem para além de 2040.

135    Além disso, como já foi recordado no n.o 125, supra, os compromissos não estabelecem limites de montante dos empréstimos ou das próprias garantias. Assim, os eventuais novos empréstimos contraídos até ao final de 2040, garantidos a 100%, sem limite de montante, podem aumentar a dívida real do Consórcio e, por conseguinte, o montante de auxílio associado às garantias estatais.

136    Se, com a sua argumentação, a Comissão pretende mostrar que o «compromisso» em questão limita teoricamente as garantias estatais, na medida em que, naturalmente, os contratos de mútuo celebrados até final de 2040 indicarão, esses sim, um montante e um prazo de reembolso e acabarão por ser reembolsados um dia, basta observar que a duração efetiva das garantias estatais poderia, assim, estender‑se muito para além de 2040 e por um montante máximo desconhecido, potencialmente superior à atual dívida do Consórcio, sem que a decisão impugnada dê informações sobre estas questões. Consequentemente, a Comissão não dispunha de dados precisos sobre a duração e o montante máximo dos auxílios incluídos nas garantias estatais.

137    Assim, há que concluir que a análise da Comissão do caráter limitado, no tempo e no montante, das garantias estatais e, por conseguinte, do auxílio incluído nessas garantias é insuficiente e incompleta.

138    Na medida em que, no considerando 134 da decisão impugnada, a Comissão considerou que as garantias estatais e demais vantagens económicas, incluindo vantagens fiscais, que o consórcio pudesse vir a receber estariam limitadas ao prazo efetivo de reembolso da dívida, as insuficiências da análise feita pela Comissão, declaradas nomeadamente no n.o 129, supra, são também extensivas aos auxílios fiscais dinamarqueses.

139    Estas insuficiências constituem um indício suplementar de que a Comissão teve dificuldades sérias na análise da compatibilidade das garantias estatais com o mercado interno, que a deviam ter obrigado a dar início ao procedimento formal de investigação. Por conseguinte, há que acolher a quarta acusação.

4)      Quanto à primeira, quinta e sexta acusações, relativas à análise insuficiente e incompleta da quantificação do elemento de auxílio incluído nas garantias estatais, à necessidade e à proporcionalidade das medidas de auxílio e, finalmente, ao critério dito de «ponderação», respetivamente

140    A primeira acusação da segunda parte é relativa ao facto de a Comissão não ter, ou não ter suficientemente, quantificado o auxílio incluído nas garantias estatais, quando essa quantificação é indispensável à apreciação da necessidade e da proporcionalidade do auxílio. A quinta acusação é relativa ao facto de a Comissão não ter examinado suficientemente a necessidade e a proporcionalidade das garantias estatais e das vantagens fiscais. A sexta acusação é relativa, nomeadamente, ao facto de a Comissão não ter procedido à «ponderação» dos efeitos positivos dos auxílios em causa em termos de contribuição para a realização do objetivo de interesse comum visado com os efeitos negativos na concorrência e nas trocas comerciais. Esses erros dizem respeito tanto às garantias estatais como aos auxílios fiscais dinamarqueses.

141    Segundo o artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE, «podem ser considerados compatíveis com o mercado interno os auxílios destinados a fomentar a realização de um projeto importante de interesse europeu comum».

142    Cabe recordar que, tratando‑se de uma derrogação ao princípio geral da incompatibilidade dos auxílios de Estado com o mercado interno, enunciado no artigo 107.o, n.o 1, TFUE, o artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE deve ser objeto de interpretação estrita (v. Acórdão de 9 de abril de 2014, Grécia/Comissão, T‑150/12, não publicado, EU:T:2014:191, n.o 146 e jurisprudência referida).

143    Resulta da jurisprudência que a Comissão só pode declarar um auxílio compatível com o artigo 107.o, n.o 3, TFUE se puder concluir que esse auxílio contribui para a realização de um dos objetivos referidos, objetivos que a empresa beneficiária, em condições normais de mercado, não poderia alcançar pelos seus próprios meios. Por outras palavras, não deve ser permitido aos Estados‑Membros procederem a pagamentos que representem uma melhoria da situação financeira da empresa beneficiária, sem que sejam necessários para atingir os objetivos previstos no artigo 107.o, n.o 3, TFUE (v. Acórdão de 14 de janeiro de 2009, Kronoply/Comissão, T‑162/06, EU:T:2009:2, n.o 65 e jurisprudência referida).

144    O princípio da proporcionalidade exige que as medidas impostas pelos atos das instituições da União sejam aptas a realizar o objetivo visado e não ultrapassem os limites do que é necessário para o efeito (Acórdão de 18 de setembro de 1986, Comissão/Alemanha, 116/82, EU:C:1986:322, n.o 21). Enquanto princípio geral da União, o princípio da proporcionalidade é um critério da legalidade de todos os atos das instituições da União, incluindo as decisões que a Comissão adota na sua qualidade de autoridade da concorrência (v. Acórdão de 8 de abril de 2014, ABN Amro Group/Comissão, T‑319/11, EU:T:2014:186, n.o 75 e jurisprudência referida). Segundo a jurisprudência, não se pode aceitar que um auxílio seja concedido em condições, em especial quanto ao seu montante, cujos efeitos restritivos ultrapassem o necessário para que o auxílio atinja os objetivos admitidos pelo Tratado FUE (v., Acórdão de 14 de janeiro de 2009, Kronoply/Comissão, T‑162/06, EU:T:2009:2, n.o 66 e jurisprudência referida).

i)      Quanto à primeira acusação, relativa à determinação do elemento de auxílio incluído nas garantias estatais

145    No âmbito da sua primeira acusação, as recorrentes alegam que a Comissão devia ter quantificado o elemento de auxílio resultante das garantias estatais, em conformidade com os pontos 4.1 e 4.2 da comunicação sobre as garantias de 2008. Consideram que a quantificação do elemento de auxílio das garantias estatais era uma condição prévia indispensável à apreciação da necessidade e da proporcionalidade de tais garantias.

146    A Comissão recorda que a comunicação sobre as garantias de 2008 não era aplicável ratione temporis aos auxílios de Estado em causa no caso em apreço, uma vez que considera que foram concedidos em 1992. Considera que a quantificação do auxílio não é uma condição prévia da análise da necessidade e da proporcionalidade e que, visto que tinha concluído que o auxílio era necessário e proporcional à realização do objetivo de terminar o financiamento do projeto no contexto existente na altura, não era necessário quantificar o montante do auxílio para evitar a sobrecompensação. Além disso, alega que, nos termos da própria comunicação sobre as garantias de 2008, o elemento de auxílio deve ser quantificado para se poder verificar se o auxílio deve ser considerado compatível por causa unicamente de uma isenção específica.

147    A título preliminar, há que observar que, com a primeira acusação, as recorrentes não acusam a Comissão da falta de quantificação final e precisa do montante total do auxílio resultante das garantias estatais, mas da falta ou insuficiência de determinação do elemento de auxílio resultante das garantias estatais, ou seja, do método a seguir para calcular o auxílio incluído numa garantia. Importa, assim, verificar se a quantificação do auxílio incluído nas garantias estatais, isto é, a determinação do elemento de auxílio relacionado com as garantias, era necessária para efeitos da apreciação da compatibilidade do auxílio e, em caso afirmativo, verificar se a Comissão quantificou suficientemente este elemento de auxílio na decisão impugnada.

148    Importa também relembrar que, na medida em que, nomeadamente, o artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE deve ser interpretado restritivamente, cabia à Comissão verificar se os auxílios incluídos nas garantias estatais e nos auxílios fiscais dinamarqueses eram necessários e proporcionais ao objetivo prosseguido, neste caso, a realização do PIIEC que constituía a ligação fixa. Tal não é, de resto, contestado pela Comissão.

149    Em primeiro lugar, há que salientar que, independentemente das regras materiais aplicáveis ratione temporis ao presente caso, o facto de saber como determinar o elemento de auxílio incluído numa garantia, ou seja, conhecer o método de determinação do elemento de auxílio, sem necessariamente exigir uma quantificação final precisa, constitui uma condição prévia indispensável para apreciar se o referido auxílio é necessário e proporcionado, contrariamente ao que a Comissão alega.

150    Com efeito, em conformidade com a jurisprudência referida no n.o 144, supra, a avaliação da proporcionalidade de um auxílio implica verificar se este está limitado ao mínimo necessário à realização dos objetivos das diferentes derrogações previstas no artigo 107.o, n.o 3, TFUE, o que implica saber em que medida o auxílio é necessário para alcançar o objetivo visado e, por conseguinte, saber como calcular o elemento de auxílio ex ante.

151    Cabe salientar que esta conclusão é conforme à jurisprudência segundo a qual nenhuma disposição do direito da União exige que a Comissão, quando ordena a restituição de um auxílio declarado incompatível com o mercado interno, fixe o montante exato do auxílio a restituir e segundo a qual basta, a esse respeito, que a decisão da Comissão contenha indicações que permitam ao seu destinatário determinar por si próprio, sem dificuldades excessivas, esse montante (Acórdãos de 12 de maio de 2005, Comissão/Grécia, C‑415/03, EU:C:2005:287, n.o 39, e de 18 de outubro de 2007, Comissão/França, C‑441/06, EU:C:2007:616, n.o 29).

152    A este respeito, o argumento da Comissão de que, mesmo nos termos do ponto 4.1 da comunicação sobre as garantias de 2008, relativo aos «aspetos gerais» das «garantias que incluem um elemento de auxílio», a quantificação só é útil para verificar se o auxílio é compatível ao abrigo de uma «isenção específica», mas não nos termos do artigo 107.o, n.o 3, TFUE, deve ser rejeitado, na medida em que, neste contexto, a expressão «isenção específica» se refere às isenções previstas no artigo 107.o, n.o 3, alíneas a) a e), TFUE.

[Omissis]

ii)    Quanto à quinta acusação, relativa à necessidade e à proporcionalidade dos auxílios de Estado

[Omissis]

184    Em terceiro lugar, as recorrentes alegam, em substância, que a Comissão não examinou se o montante do auxílio prestado ao Consórcio excedia o que era necessário para realizar o objetivo prosseguido. A este respeito, a afirmação, no considerando 129 da decisão impugnada, de que o auxílio relacionado com as garantias estatais que cobrem 100% da dívida do Consórcio e com as vantagens fiscais é proporcionado e limitado ao mínimo necessário, tendo em conta a natureza e a dimensão do projeto de ligação fixa, não é fundamentada. Alegam igualmente, em substância, a violação do n.o 30 da comunicação sobre os PIIEC.

185    A Comissão contesta a insuficiência da sua análise e considera que esta argumentação não é fundamentada. Relembra, desde logo, que a quantificação do elemento de auxílio não é uma fase indispensável à apreciação da necessidade e da proporcionalidade do auxílio. Em seguida, alega que as recorrentes não demonstram que era possível que uma empresa construísse um projeto de infraestrutura como o visado no presente caso sem auxílio de Estado. Além disso, nenhum elemento demonstra que o projeto podia ter sido realizado com menos apoio. A opção por uma garantia estatal permitiu justamente assegurar que o auxílio fosse muito menos elevado do que se o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia tivessem concedido ao Consórcio subvenções ou empréstimos. Além disso, os compromissos assumidos pelos Governos dinamarquês e sueco permitem evitar uma situação em que as garantias se tornariam inúteis e desproporcionadas. Por último, quanto à pretensa violação do n.o 30 da comunicação sobre os PIIEC, a Comissão sublinha que, mesmo que esta disposição tivesse sido aplicável, o que de resto contesta, não impõe que se calcule a taxa de rendimento interno em todos os casos. No presente caso, as incertezas eram tais que mesmo cálculos pormenorizados não teriam dado uma perspetiva diferente à sua apreciação.

186    No caso em apreço, o considerando 129 da decisão impugnada refere que, tendo em conta a natureza e a dimensão da ligação fixa, o auxílio incluído na estrutura de financiamento escolhida, com duas garantias estatais que cobrem 100% da dívida do Consórcio, bem como as vantagens fiscais, deve ser considerado proporcionado e limitado ao mínimo necessário. A Comissão também sublinhou, ainda no considerando 129, que «qualquer outra forma de financiar a ligação fixa teria resultado no mesmo projeto, mas com um risco significativo de custos de financiamento mais elevado para [o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia]» e que, «por exemplo, [se estes últimos] tivessem injetado capital ou concedido empréstimos ao Consórcio, haveria um risco de sobrecarga sobre os [respetivos] orçamentos e, consequentemente, os custos totais do projeto teriam aumentado». A Comissão salientou igualmente que, até então, nenhuma garantia tinha sido acionada e que não havia nenhum elemento que demonstrasse que o Consórcio não estava em condições de cumprir as suas obrigações no futuro.

187    Desde logo, decorre nomeadamente dos n.os 167, 114 e 137, supra, que a falta de quantificação do auxílio associado às garantias estatais, a falta de distinção entre as fases de construção e de exploração e a falta de limitação suficientemente precisa do auxílio associado às garantias estatais no tempo e no montante demonstram já que a análise da compatibilidade das garantias estatais com o mercado interno foi insuficiente.

188    Em seguida, as recorrentes alegam, com razão, que a Comissão também não examinou se se poderia obter o mesmo resultado com menos apoio, por exemplo, introduzindo uma forma de prémio de garantia limitado, limitando as garantias de forma a cobrir menos de 100% do montante de cada empréstimo coberto, limitando a duração das garantias estatais ou verificando se a intensidade do auxílio estava limitada ao mínimo necessário.Nenhuma análise deste tipo foi efetuada na decisão impugnada.

189    A afirmação, no considerando 129 da decisão impugnada, de que o auxílio associado às garantias estatais que cobrem 100% da dívida do Consórcio e às vantagens fiscais é proporcionado e limitado ao mínimo necessário, tendo só em conta a natureza e a dimensão do projeto de ligação fixa, é insuficiente e não fundamentada. Ora, cabe recordar que, tratando‑se de uma derrogação ao princípio geral da incompatibilidade dos auxílios de Estado com o mercado interno, enunciado no artigo 107.o, n.o 1, TFUE, o artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE deve ser objeto de interpretação estrita (v. Acórdão de 9 de abril de 2014, Grécia/Comissão, T‑150/12, não publicado, EU:T:2014:191, n.o 146 e jurisprudência referida).

190    A Comissão afirma, certamente com razão, que a exigência, que figura no n.o 30 da comunicação sobre os PIIEC, de calcular uma taxa de rendimento interno quando não exista uma posição contrafactual a fim de verificar se o montante do auxílio não excede o mínimo necessário para que o projeto objeto de auxílio seja suficientemente rentável, é referida meramente a título de «exemplo». Todavia, a obrigação de «verificar se o montante do auxílio não excede o mínimo necessário para que o projeto objeto de auxílio seja suficientemente rentável» mais não é do que uma expressão do princípio geral da proporcionalidade, aplicável ao caso em apreço. Ora, cabe observar que a Comissão não procedeu a uma análise suficiente para verificar se o auxílio associado às garantias estatais estava limitado ao mínimo necessário.

191    Por último, as justificações, adiantadas no considerando 129 da decisão impugnada, segundo as quais o recurso a formas mais diretas de auxílio teria aumentado os encargos suportados pelo orçamento do Reino da Dinamarca e do Reino da Suécia e, por conseguinte, o custo total do projeto, e segundo as quais não foi, até agora, acionada nenhuma garantia, não dissipam as dúvidas sobre o facto de o elemento de auxílio associado às garantias estatais ter sido, quanto a si, limitado ao mínimo necessário. Primeiro, os «encargos suportados pelo orçamento» do Reino da Dinamarca e do Reino da Suécia e o «custo total do projeto» não são necessariamente equivalentes ao elemento de auxílio das garantias. Segundo, a decisão impugnada não indica de forma suficientemente clara como calcular o elemento de auxílio associado às garantias e resulta do exposto que os auxílios concedidos ao Consórcio não estão suficientemente limitados em termos de montante e de duração, mesmo tendo em conta os compromissos. Consequentemente, mesmo que outras formas mais diretas de auxílio pudessem eventualmente constituir auxílios significativos do que garantias, não resulta da decisão impugnada que o auxílio relacionado com as garantias estatais tenha sido, quanto a si, limitado ao mínimo necessário para a consecução do objetivo de realização do projeto de interesse europeu comum de ligação fixa. Terceiro, importa relembrar que o auxílio é concedido aquando da atribuição da garantia, e não aquando da sua execução ou da realização de pagamentos ao abrigo da garantia. Consequentemente, o facto de, até à data, não ter sido acionada nenhuma garantia é irrelevante para a avaliação do caráter limitado ao mínimo possível do auxílio incluído nas garantias. Além disso, as garantias podem, não obstante, ser acionadas e provocar perdas de receitas efetivas para o Estado, tanto mais que as garantias, no caso em apreço, cobrem 100% de um montante de empréstimos cujo limite se desconhece.

[Omissis]

196    Resulta do exposto que as recorrentes demonstraram a existência de uma análise insuficiente e incompleta da necessidade e da proporcionalidade dos auxílios em causa, reveladora de dificuldades sérias, que deviam ter levado a Comissão a dar início ao procedimento formal de investigação.

197    Assim, há que acolher a quinta acusação da segunda parte.

[Omissis]

iii) Quanto à sexta acusação, relativa à falta de análise dos efeitos negativos dos auxílios concedidos ao Consórcio na distorção da concorrência e de afetação das trocas comerciais entre EstadosMembros e à falta de ponderação dos efeitos positivos e negativos dos referidos auxílios

200    No âmbito da sexta acusação, as recorrentes invocam, em substância, dois argumentos. Primeiro, invocam a total falta de análise dos efeitos negativos dos auxílios de Estado concedidos ao Consórcio na concorrência e nas trocas comerciais entre Estados‑Membros. Segundo, alegam mais especificamente a falta de ponderação dos efeitos positivos dos referidos auxílios em termos de realização do objetivo de interesse comum visado com os seus efeitos negativos na concorrência e nas trocas comerciais entre Estados‑Membros.

201    Segundo as recorrentes, a Comissão, incorretamente, no considerando 129 da decisão impugnada, concentrou‑se nos efeitos que teria o recurso a outras formas de auxílio no orçamento do Reino da Dinamarca e do Reino da Suécia, em vez de analisar os efeitos dos auxílios em causa na concorrência e nas trocas comerciais entre Estados‑Membros. Sublinham que o critério dito da «ponderação» dos efeitos positivos do auxílio na realização do PIIEC com os efeitos negativos na concorrência e nas trocas comerciais entre Estados‑Membros era, porém, aplicável no caso em apreço por ter sido enunciado pelo Tribunal Geral no Acórdão de 25 de junho de 1998, British Airways e o./Comissão (T‑371/94 e T‑394/94, EU:T:1998:140, n.o 283), e integrado em quase todas as orientações desde então, incluindo nos n.os 26 e 40 a 44 da comunicação sobre os PIIEC.

202    A Comissão contesta esta argumentação e alega, em substância, que o critério da ponderação tem origem na redação do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, relativo aos auxílios destinados a facilitar o desenvolvimento de determinadas atividades económicas ou de determinadas regiões económicas, mas não faz parte dos critérios comuns de análise da compatibilidade à luz do artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE. Embora a comunicação sobre os PIIEC mencione o critério da ponderação, a Comissão considera que não era aplicável ratione temporis ao caso sub judice.

203    Em primeiro lugar, com a argumentação exposta, as recorrentes criticam a Comissão por não ter analisado, no âmbito do exame da compatibilidade, os efeitos dos auxílios em causa em termos de distorção da concorrência e de afetação das trocas comerciais na União.

204    Resulta da jurisprudência que as apreciações económicas no quadro da aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, relativamente às quais a Comissão goza de um largo poder discricionário, devem ser efetuadas a nível da União, o que significa que a Comissão tem a obrigação de examinar o impacto de um auxílio sobre a concorrência e o comércio na União (v. Acórdão de 25 de junho de 1998, British Airways e o./Comissão, T‑371/94 e T‑394/94, EU:T:1998:140, n.o 282 e jurisprudência referida).

205    Importa recordar que, nos termos do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, «salvo disposição em contrário dos Tratados, são incompatíveis com o mercado interno, na medida em que afetem as trocas comerciais entre os Estados‑Membros, os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções». Tratando‑se de uma derrogação ao princípio geral da incompatibilidade dos auxílios de Estado com o mercado interno, enunciado no artigo 107.o, n.o 1, TFUE, o artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE deve ser objeto de interpretação estrita (v. Acórdão de 9 de abril de 2014, Grécia/Comissão, T‑150/12, não publicado, EU:T:2014:191, n.o 146 e jurisprudência referida).

206    Ora, também foi declarado que a Comissão goza, na aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE, de um amplo poder de apreciação, cujo exercício implica avaliações de ordem económica e social, que devem ser efetuadas a nível da União (Acórdão de 12 de dezembro de 2014, Banco Privado Português e Massa Insolvente do Banco Privado Português/Comissão, T‑487/11, EU:T:2014:1077, n.o 83).

207    Consequentemente, a Comissão tem também a obrigação de examinar o impacto de um auxílio sobre a concorrência e o comércio na União nas apreciações económicas que faça no quadro da aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE. Isto é, aliás, conforme com jurisprudência constante (v. Acórdão de 6 de julho de 1995, AITEC e o./Comissão, T‑447/93 à T‑449/93, EU:T:1995:130, n.os 136, 137, 141 e 142 e jurisprudência referida).

208    No caso em apreço, é pacífico que a Comissão não efetuou essa análise. No considerando 129 da decisão impugnada, a Comissão avaliou os efeitos potenciais de outras formas de auxílio (injeções de capital, empréstimos estatais) no custo total do projeto e nos orçamentos do Reino da Dinamarca e do Reino da Suécia, mas, em momento algum, equacionou os efeitos dos auxílios em causa na concorrência ou nas trocas comerciais na União, no âmbito da análise da compatibilidade. Contudo, as recorrentes parecem ter‑se queixado em especial do facto de os auxílios em causa permitirem ao Consórcio fixar a portagem da ligação fixa de forma artificialmente baixa.

209    Consequentemente, há que acolher a sexta acusação, na medida em que visa a falta de análise dos efeitos dos auxílios concedidos ao Consórcio na distorção da concorrência e na afetação das trocas comerciais entre Estados‑Membros.

210    Em segundo lugar, mais precisamente quanto à falta de ponderação dos efeitos positivos de um auxílio com os efeitos negativos, no Acórdão de 25 de junho de 1970, França/Comissão (47/69, EU:C:1970:60, n.o 7), o Tribunal de Justiça decidiu que, para avaliar se um auxílio afeta as condições das trocas comerciais em medida contrária ao interesse comum, é necessário verificar, nomeadamente, se não existe um desequilíbrio entre, por um lado, os encargos a suportar pelas empresas interessadas e, por outro, as vantagens que resultam da atribuição do auxílio em causa. O Tribunal Geral concluiu que incumbe à Comissão, no quadro do seu exame do impacto de um auxílio de Estado, como a própria Comissão aliás referiu no seu Décimo Quarto Relatório sobre a Política de Concorrência (1984, p. 143, n.o 202), ponderar os efeitos benéficos do auxílio com os seus efeitos negativos nas trocas comerciais e na manutenção de uma concorrência não falseada (Acórdão de 25 de junho de 1998, British Airways e o./Comissão, T‑371/94 e T‑394/94, EU:T:1998:140,n.os 282 e 283).

211    Embora expressa no âmbito de um processo relativo ao artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, importa constatar que a necessidade dessa «ponderação» dos efeitos positivos esperados em termos de prossecução dos objetivos referidos no artigo 107.o, n.o 3, alíneas a) a e), TFUE com os efeitos negativos de um auxílio em termos de distorção da concorrência e de afetação das trocas comerciais entre Estados‑Membros mais não é do que a expressão do princípio da proporcionalidade e do princípio da interpretação estrita das tais isenções referidas no artigo 107.o, n.o 3, TFUE.

212    Além disso, se, como sugere a Comissão, se permitisse que essa ponderação fosse efetuada em relação a determinadas isenções previstas no artigo 107.o, n.o 3, TFUE, mas não em relação a outras, tal equivaleria a reconhecer que, relativamente a alguns dos objetivos visados no artigo 107.o, n.o 3, TFUE, um auxílio pode ser declarado compatível, apesar de os efeitos positivos em termos de realização dos objetivos visados serem inferiores aos efeitos negativos em termos de distorção da concorrência e de afetação das trocas comerciais. Uma tal interpretação seria de molde a criar uma assimetria na apreciação das diversas isenções referidas no artigo 107.o, n.o 3, TFUE, o que contraria o efeito útil das regras sobre os auxílios de Estado.

213    A título exaustivo, importa observar que o facto de a comunicação sobre os PIIEC mencionar este critério, no n.o 26 e no ponto 4.2, intitulado «Prevenção de distorções indevidas da concorrência e teste do equilíbrio», demonstra claramente que a própria Comissão o considera aplicável na apreciação da compatibilidade à luz do artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE. Contrariamente ao que a Comissão alega, a possibilidade de a comunicação sobre os PIIEC não ser aplicável ratione temporis não invalida a ideia de que o critério da ponderação é aplicável ratione materiae aos auxílios destinados à realização de um PIIEC, em conformidade com o artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE.

214    Há, assim, que rejeitar o argumento da Comissão de que o critério da ponderação não é aplicável às análises efetuadas ao abrigo do artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE.

215    No caso em apreço, a Comissão alega que é manifesto que os efeitos negativos do auxílio em termos de concorrência se limitam à criação de um serviço que substitui os serviços de ferry que tradicionalmente asseguravam a travessia do Sund, mas que o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia consideraram que era do interesse comum da União ter uma melhor ligação e que, por conseguinte, os efeitos positivos do auxílio contrabalançavam claramente os efeitos negativos. Contudo, importa observar que esse raciocínio não resulta de modo algum da decisão impugnada, o que reflete a falta de análise da Comissão a este respeito.

216    Assim, há também que acolher a sexta acusação da segunda parte, na medida em que visa a falta de ponderação dos efeitos positivos e negativos dos auxílios em causa, sendo tal insuficiência reveladora de dificuldades sérias.

217    Em conclusão, sem que sequer seja necessário se pronunciar sobre a aplicabilidade ratione temporis da comunicação sobre as garantias de 2008 e da comunicação sobre os PIIEC, resulta da segunda parte do quarto fundamento que a análise da compatibilidade dos auxílios de Estado concedidos ao Consórcio foi insuficiente e incompleta, na medida em que a Comissão, primeiro, não verificou a existência de condições de execução das garantias estatais; segundo, não foi capaz, no termo da sua análise preliminar, de determinar o elemento de auxílio incluído nas garantias estatais; terceiro, não verificou a eventualidade de um auxílio ao funcionamento destinado a cobrir custos de exploração; quarto, não conhecia o limite de montante, nem o limite de duração exata dos auxílios em causa; quinto, não dispunha de elementos suficientes para demonstrar que o auxílio associado às garantias estatais e o auxílio associado aos auxílios fiscais dinamarqueses se limitavam ao mínimo necessário para a realização de PIIEC; e, sexto, não analisou os efeitos dos auxílios em causa na concorrência e nas trocas comerciais entre Estados‑Membros, nem procedeu a uma ponderação entre efeitos positivos e efeitos negativos. Consequentemente, há que concluir que a Comissão teve dificuldades sérias em declarar a compatibilidade dos auxílios de Estado em causa, o que a devia ter obrigado a dar início ao procedimento formal de investigação.

c)      Conclusão sobre o quarto fundamento, relativo aos auxílios de Estado concedidos ao Consórcio

218    Tendo em conta o exposto, e nomeadamente os n.os 81 a 83 e 217, supra, há que concluir que existe um conjunto de indícios objetivos e concordantes que demonstram que, à data da adoção da decisão impugnada, a Comissão não estava em condições de superar todas as dificuldades sérias identificadas no presente caso (v., neste sentido, Acórdão de 25 de novembro de 2014, Ryanair/Comissão, T‑512/11, não publicado, EU:T:2014:989, n.o 106).

219    Nestas circunstâncias, cabe à Comissão dar início ao procedimento formal de investigação para recolher os elementos relevantes para a verificação dos aspetos contestados e permitir às recorrentes e às outras partes interessadas apresentar observações no âmbito do referido procedimento.

220    Assim, há que anular, com base no quarto fundamento, relativo à violação dos direitos processuais das partes interessadas, a decisão impugnada, na medida em que não levanta objeções às garantias estatais prestadas ao Consórcio pelo Reino da Dinamarca e pelo Reino da Suécia e aos auxílios fiscais dinamarqueses concedidos ao Consórcio.

[Omissis]

 Quanto às despesas

329    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão sido vencida no essencial dos seus pedidos, há que condená‑la a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pelas recorrentes.

330    Além disso, nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, os Estados‑Membros que tenham intervindo no processo suportam as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção)

decide:

1)      A Decisão C(2014) 7358 final da Comissão Europeia, de 15 de outubro de 2014, é anulada na parte em que decide não levantar objeções aos auxílios fiscais relativos à depreciação dos ativos e ao reporte das perdas concedidos ao Øresundsbro Konsortiet pelo Reino da Dinamarca e às garantias prestadas ao Øresundsbro Konsortiet pelo Reino da Dinamarca e pelo Reino da Suécia.

2)      É negado provimento ao recurso quanto ao restante.

3)      A Comissão suportará, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pela HH Ferries I/S, pela HH Ferries Helsingor ApS e pela HH Ferries Helsingborg AB.

4)      O Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia suportarão as suas próprias despesas.

Berardis

Spielmann

Csehi

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 19 de setembro de 2018.

Assinaturas


[Omissis]


*      Língua do processo: inglês.


1      Apenas são reproduzidos os números do presente acórdão cuja publicação o Tribunal considera útil.