Language of document : ECLI:EU:C:2024:154

Edição provisória

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

MANUEL CAMPOS SÁNCHEZ‑BORDONA

apresentadas em 22 de fevereiro de 2024 (1)

Processo C76/22

QI

contra

Santander Bank Polska S.A.

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Sąd Rejonowy dla Warszawy‑Woli w Warszawie (Tribunal de Primeira Instância de Varsóvia‑Wola, Polónia)]

«Reenvio prejudicial — Proteção dos consumidores — Diretiva 2014/17/UE — Contratos de crédito aos consumidores para imóveis de habitação — Artigo 25.°, n.° 1 — Reembolso antecipado do crédito — Redução do custo total do crédito — Conceito de “custo total do crédito para o consumidor” — Método de cálculo da redução»






1.        O artigo 25.°, n.° 1, da Diretiva 2014/17/UE (2) prevê o direito de o consumidor, mutuário de um crédito para imóveis de habitação, reembolsar o crédito, total ou parcialmente, antes do termo do contrato (com redução dos juros e dos custos relativos ao período remanescente do contrato).

2.        O Tribunal de Justiça já se pronunciou sobre a redução do custo total do crédito a favor do consumidor, na sequência do reembolso antecipado neste tipo de contratos (3). Deverá também fazê‑lo num futuro próximo no que diz respeito à outra parte da equação: a (eventual) indemnização ao mutuante pelos custos associados diretamente a esse reembolso (4).

3.        O órgão jurisdicional que apresentou o presente pedido de decisão prejudicial pede que lhe sejam prestados alguns esclarecimentos sobre o referido direito do consumidor. Pretende saber, em especial, qual é o método utilizado para calcular a redução dos custos que constituem o custo total do crédito, quando ocorre o reembolso antecipado.

I.      Quadro jurídico. Diretiva 2014/17

4.        O considerando 66 tem a seguinte redação:

«A capacidade de um consumidor para reembolsar o crédito antes do termo do contrato de crédito pode desempenhar um importante papel para promover a concorrência no mercado interno e a livre circulação dos cidadãos da União, bem como para ajudar a proporcionar durante a vigência do contrato de crédito a flexibilidade necessária para promover a estabilidade financeira de harmonia com as recomendações do Conselho de Estabilidade Financeira. No entanto, existem diferenças substanciais entre os princípios e condições em que os consumidores podem proceder ao reembolso dos seus créditos ao nível nacional e as condições em que esse reembolso antecipado pode ter lugar. Reconhecendo embora a diversidade dos mecanismos de financiamento do crédito hipotecário e da gama de produtos disponíveis, é essencial estabelecer determinadas normas em matéria de reembolso antecipado do crédito a nível da União a fim de garantir que os consumidores tenham a possibilidade de cumprir as suas obrigações antes da data estipulada no contrato de crédito, bem como a confiança necessária para compararem ofertas a fim de encontrarem os produtos que melhor satisfaçam as suas necessidades. Os Estados‑Membros deverão, por conseguinte, assegurar, através de legislação ou de outros meios, como cláusulas contratuais, o direito de os consumidores efetuarem o reembolso antecipado. No entanto, os Estados‑Membros deverão ter a possibilidade de definir as condições de exercício desse direito. Essas condições poderão incluir limitações temporais ao exercício do direito, tratamentos diferenciados em função do tipo de taxa devedora ou restrições quanto às circunstâncias em que o direito pode ser exercido. Se o reembolso antecipado ocorrer durante um período em que a taxa devedora é fixa, o exercício desse direito poderá ser condicionado à existência de um interesse legítimo por parte do consumidor, especificado pelo Estado‑Membro. Esse interesse legítimo poderá verificar‑se, por exemplo, em caso de divórcio ou de situação de desemprego. As condições estabelecidas pelos Estados‑Membros também podem prever que o mutuante deva ter direito a uma indemnização justa e objetivamente justificada pelos eventuais custos diretamente relacionados com o reembolso antecipado do crédito. Nos casos em que os Estados‑Membros disponham que o mutuante tem o direito a uma indemnização, esta deverá ser justa e objetivamente justificada pelos eventuais custos diretamente relacionados com o reembolso antecipado do crédito, de acordo com as regras nacionais aplicáveis à indemnização, que não poderá exceder a perda financeira do mutuante.»

5.        Em conformidade com o artigo 25.°:

«1.      Os Estados‑Membros asseguram que o consumidor tem o direito de cumprir total ou parcialmente as suas obrigações decorrentes de um contrato de crédito antes do termo desse contrato. Nesses casos, o consumidor tem direito a uma redução do custo total do crédito ao consumidor, correspondente aos juros e aos custos relativos ao período remanescente do contrato.

2.      Os Estados‑Membros podem dispor que o exercício do direito a que se refere o n.° 1 está sujeito a determinadas condições. Essas condições podem incluir limitações temporais ao exercício do direito, um tratamento diferenciado em função do tipo de taxa devedora ou do momento em que o consumidor exerce o direito, ou restrições quanto às circunstâncias em que o direito pode ser exercido.

3.      Os Estados‑Membros podem dispor que o mutuante tem direito a uma indemnização justa e objetiva, caso tal se justifique, dos eventuais custos diretamente associados ao reembolso antecipado, mas não pode impor outras indemnizações ao consumidor. Neste contexto, a indemnização não pode exceder o prejuízo financeiro do mutuante. Nestas condições, os Estados‑Membros podem prever que a indemnização não pode exceder um determinado nível ou que seja autorizada apenas durante um determinado período.

4.      Se um consumidor pretender cumprir as suas obrigações decorrentes de um contrato de crédito antes do termo do contrato, o mutuante deve prestar‑lhe sem demora após receção do pedido, em papel ou noutro suporte duradouro, as informações necessárias para estudar essa opção. Essas informações devem pelo menos quantificar as implicações para o consumidor do cumprimento das suas obrigações antes do termo do contrato de crédito e descrever claramente os pressupostos utilizados. Os referidos pressupostos devem ser razoáveis e justificáveis.

5.      Se o reembolso antecipado ocorrer durante um período em que a taxa de juro é fixa, os Estados‑Membros podem dispor que o exercício do direito a que se refere o n.° 1 está condicionado à existência de um interesse legítimo por parte do consumidor.»

II.    Matéria de facto, litígio e questões prejudiciais

6.        Em 15 de setembro de 2017, QI celebrou, como consumidora, um contrato de crédito à habitação com o antecessor jurídico do Santander Bank Polska S.A. (a seguir «Santander Bank»), no montante de 106 600 zlótis polacos (PLN).

7.        O contrato previa um prazo de reembolso do crédito de 360 meses e incluía uma «comissão pela concessão do crédito» de 2,50 % da quantia emprestada (5). A comissão era indicada como parte do custo total do crédito.

8.        Em 4 de abril de 2019 (ou seja, 19 meses após a celebração do contrato), QI reembolsou antecipadamente a totalidade do crédito.

9.        Segundo QI, o Santander Bank devia restituir‑lhe uma parte da comissão pela concessão do crédito, correspondente a um período de 341 meses. QI calculou esse montante em 2 462,78 PLN, que reclamou ao Santander Bank.

10.      Em 20 de julho de 2020, o Santander Bank indeferiu o pedido de QI. O Santander Bank alegou que a comissão pela concessão do crédito era de natureza única, estando excluída da obrigação de restituição proporcional.

11.      A título de precaução, o Santander Bank indicou que, se a comissão pela concessão do crédito fosse parcialmente reembolsada, a parte a restituir não seria proporcional à relação entre os períodos, mas proporcional à remuneração esperada pelo mutuante pela utilização do financiamento pelo consumidor.

12.      É neste contexto que o Sąd Rejonowy dla Warszawy‑Woli w Warszawie (Tribunal de Primeira Instância de Varsóvia‑Wola, Polónia), chamado a decidir o litígio, submete ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Deve o artigo 25.°, n.° 1, da Diretiva 2014/17/UE ser interpretado do mesmo modo que o artigo 16.°, n.° 1, da Diretiva 2008/48/CE, ou seja, no sentido de que o direito do consumidor de reduzir o custo total do crédito hipotecário em caso de reembolso antecipado desse crédito inclui todos os custos impostos ao consumidor, incluindo a comissão pela concessão do crédito?

2)      Deve a obrigação prevista no artigo 25.°, n.° 1, da Diretiva 2014/17/UE de reduzir o custo total do crédito hipotecário em caso de reembolso antecipado desse crédito ser interpretada no sentido de que o custo total do mesmo deve ser reduzido na proporção da relação entre a duração do período compreendido entre a data do reembolso antecipado do crédito e a data inicialmente acordada para o seu reembolso e a duração do período inicialmente acordado entre a data do desembolso do crédito e o prazo de reembolso antecipado do crédito, ou a redução do custo total do crédito hipotecário deve ser proporcional à perda das vantagens esperadas pelo mutuante, ou seja, à relação entre os juros restantes a pagar após o reembolso antecipado do crédito (devidos pelo período compreendido entre a data do reembolso total efetivo e a data de reembolso total inicialmente acordada) e os juros devidos pela duração total do contrato de crédito inicialmente acordada (desde a data do desembolso do crédito até à data do reembolso total acordado do crédito)?»

III. Tramitação processual no Tribunal de Justiça

13.      O pedido de decisão prejudicial foi registado no Tribunal de Justiça em 5 de fevereiro de 2022.

14.      O processo no Tribunal de Justiça foi suspenso até à prolação do acórdão no processo C‑555/21, UniCredit Bank Austria.

15.      Na sequência da prolação deste Acórdão em 9 de fevereiro de 2023, o Tribunal de Justiça notificou‑o ao órgão jurisdicional de reenvio, perguntando‑lhe se, tendo em conta o seu conteúdo, mantinha o pedido de decisão prejudicial.

16.      Em 22 de março de 2023, o órgão jurisdicional de reenvio respondeu ao Tribunal de Justiça que mantinha o seu pedido de decisão prejudicial.

17.      Foram apresentadas observações escritas por QI, pelo Santander Bank, pelos Governos Checo, Italiano, Polaco e Português, bem como pela Comissão Europeia.

18.      Não foi considerada necessária a realização de audiência.

IV.    Análise

A.      Métodos de cálculo da redução do custo total do crédito, no caso de o montante da comissão pela concessão do crédito constituir parte integrante da obrigação de restituição

19.      Por indicação do Tribunal de Justiça, estas conclusões centrar‑se‑ão na segunda questão prejudicial.

20.      Logicamente, o Tribunal de Justiça só deverá responder a esta questão se considerar que a comissão pela concessão do crédito é um custo abrangido pela redução prevista no artigo 25.°, n.° 1, da Diretiva 2014/17, que é objeto da primeira questão prejudicial.

21.      Por conseguinte, tomarei como hipótese de trabalho a resposta afirmativa à primeira questão. Em caso de resposta negativa, as minhas reflexões tornar‑se‑ão supérfluas.

22.      O órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se o artigo 25.°, n.° 1, da Diretiva 2014/17 deve ser interpretado no sentido de que prevê um método de cálculo da redução (6) do custo total do crédito (ou de parte integrante desse custo total), quando o consumidor reembolsa antecipadamente a sua dívida ao mutuante.

23.      Em especial, interroga‑se sobre a conformidade com a Diretiva 2014/17 de dois critérios, ou métodos, para determinar em que valor seria a comissão pela concessão do crédito proporcionalmente reduzida na eventualidade de um reembolso antecipado (7).

24.      De acordo com o primeiro critério, o rácio da redução é o quociente que se obtém dividindo:

–        a duração (em dias) do período compreendido entre o dia seguinte à data do reembolso antecipado e a data prevista no contrato para o reembolso total do crédito,

–        pela duração (em dias) do período compreendido entre a data do desembolso do crédito e a data inicialmente acordada para o seu reembolso total (8).

25.      De acordo com o segundo critério, a redução é proporcional à relação (quociente) entre:

–        os juros perdidos pelo mutuante (os do período compreendido entre o dia do reembolso antecipado até à data do reembolso total inicialmente acordada); e

–        o total dos juros (para o período compreendido entre a data de desembolso do crédito até à data acordada para o reembolso total) (9).

26.      QI defende o primeiro método enunciado, alegando que o segundo não é exequível. Salienta que, no mercado polaco, os empréstimos hipotecários têm taxas de juro variáveis. Por conseguinte, não é possível determinar com certeza os juros que o mutuante esperava obter após a data em que ocorreu o reembolso antecipado do empréstimo (10).

27.      A Comissão, que é defensora do mesmo método, baseia a sua opinião no facto de a Diretiva 2014/17 não conter nenhuma referência a um método específico. Desta omissão, deduz que, «no espírito do legislador da União, a redução é concebida como uma simples consequência do reembolso antecipado, pelo que o seu cálculo não apresenta dificuldades» (11).

28.      Para os Governos Italiano, Polaco e Português, a Diretiva 2014/17 não pretendeu regular esta questão que é, assim, da competência de cada Estado‑Membro (12). Com base nesta observação comum:

–        O Governo Polaco privilegia a proporcionalidade linear, que, enquanto método «mais compreensível e transparente para os consumidores, fácil de aplicar e previsível», responde efetivamente ao objetivo de proporcionar ao consumidor um nível de proteção elevado (13).

–        O Governo Italiano não se pronuncia, exceto para excluir a possibilidade de o critério de cálculo ser único para todos os custos abrangidos pela redução ao abrigo do artigo 25.° da Diretiva 2014/17; também exclui que este critério único hipotético deva corresponder à proporcionalidade linear (14).

–        O Governo Português deixa a questão em aberto (15).

29.      O Santander Bank defende a utilização do segundo método, uma vez que é proporcional à perda de lucros do mutuante (16).

30.      Pelas razões que explicarei, considero que a Diretiva 2014/17 não opta por nenhum dos dois critérios propostos. Na realidade, não regula a metodologia de cálculo da parte do custo total do crédito a reduzir (ou a reembolsar, se for caso disso) ao consumidor, quando este cumpre antecipadamente as suas obrigações.

31.      De certa forma, esta posição está em consonância com a posição expressa pelo órgão jurisdicional de reenvio ao manter o seu pedido de decisão prejudicial, no que respeita à segunda questão. Na sua resposta de 22 de março de 2023, o órgão jurisdicional de reenvio afirma que o faz «porque as duas opções apresentadas quanto à redução dos custos podem ser consideradas válidas», embora acrescente que «prefere a opção de uma redução proporcional».

B.      Interpretação da Diretiva 2014/17

1.      Argumento literal

32.      Textualmente, a Diretiva 2014/17 não contém nenhuma instrução sobre a forma como é calculada a redução do custo total de um crédito que é reembolsado antes do termo do prazo acordado.

33.      O artigo 25.°, n.° 1, da Diretiva 2014/17 indica apenas o objeto da redução (o custo total do crédito); os conceitos sobre os quais a redução opera (juros e outros custos); e a delimitação temporal destes conceitos (período remanescente do contrato).

34.      O mesmo artigo 25.°, no n.° 4, ordena que se preste ao consumidor que pretende proceder ao reembolso antecipado «as informações necessárias para estudar essa opção». Em seguida, especifica o conteúdo mínimo destas informações, sem fazer referência a um critério de cálculo.

35.      O artigo 13.° da Diretiva 2014/17, relativo às informações gerais de base que o mutuante deve disponibilizar relativamente ao contrato de crédito, enuncia, no n.° 1, alínea k), que inclui «uma descrição das condições diretamente relacionadas com o reembolso antecipado», sem especificar quais são.

36.      Também não há expressão de um método específico de cálculo na Ficha de Informação Normalizada Europeia (FINE) (17), cujo n.° 9 estabelece o direito ao reembolso antecipado e obriga a definir, se for caso disso, as condições do seu exercício (18).

2.      Trabalhos preparatórios

37.      A legislação europeia geral em matéria de crédito ao consumo começou pela Diretiva 87/102/CEE (19), seguida da Diretiva 2008/48/CE (20). No entanto, foi apenas com a Diretiva 2014/17 que se estabeleceu um quadro regulamentar comum para os contratos de crédito aos consumidores garantido por hipoteca ou outro direito comparável para imóveis de habitação.

38.       As três diretivas acima referidas preveem o direito do consumidor ao reembolso antecipado do empréstimo (21). A este respeito, os respetivos trabalhos preparatórios concordam que:

–        a questão de saber se um instrumento europeu deveria consagrar um tal direito foi objeto de controvérsia, tendo em conta, por um lado, as diferentes soluções existentes nos Estados‑Membros e, por outro, a dificuldade de encontrar um equilíbrio entre todos os interesses em presença (22).

–        a redução do custo total do crédito associada ao seu reembolso antecipado não foi posta em causa. Esta redução, que deve ser «equitativa» nos termos da Diretiva 87/102, aplica‑se, nos termos das duas outras diretivas, aos juros e aos custos, segundo as modalidades exatas fixadas pelo Tribunal de Justiça para cada uma delas (23).

39.      A proposta de adoção de um critério uniforme para o cálculo da referida redução é feita apenas em relação à Diretiva 87/102, tendo em vista a sua eventual revogação (24). Salvo erro da minha parte, esta proposta não foi retomada nas negociações da Diretiva 2008/48, nem da Diretiva 2024/17, relativa aos contratos de crédito para imóveis de habitação (25).

3.      Contexto

40.      A interpretação sistemática também não leva a identificar um critério específico para quantificar a redução do custo total do crédito no artigo 25.°, n.° 1, da Diretiva 2014/17.

41.      Por outro lado, expliquei que a Diretiva 2014/17 contém uma regulamentação incompleta dos contratos de crédito para imóveis de habitação e que procede, salvo exceções, a uma harmonização mínima (26).

42.      No que diz respeito ao reembolso antecipado do crédito, o legislador da União reconhece o direito do consumidor a fazê‑lo e a que seja acompanhado de uma redução do custo total devido. Em contrapartida, confia aos Estados‑Membros os meios para garantir esse direito (27) e permite‑lhes condicionar o seu exercício, reconhecendo‑lhes uma ampla margem de ação a este respeito (28).

43.      Embora o método de cálculo do ajustamento do custo total do crédito não figure expressamente entre as matérias da competência de cada legislador nacional, considero que se trata de uma dessas matérias:

–        por um lado, porque estas matérias são enumeradas a título exemplificativo (29);

–        por outro, porque a ausência de uma referência a esse cálculo contrasta com o nível de detalhe com que a própria Diretiva 2014/17 regula o modo de determinação de outros valores (30).

44.      A leitura do artigo 25.° da Diretiva 2014/17, no seu conjunto, também não permite estabelecer um método específico de cálculo da redução controvertida.

45.      Não me parece adequado inferir a consagração do critério da «curva de juros» a partir da alusão, no artigo 25.°, n.° 3, da Diretiva 2014/17 (31), a um direito à indemnização do mutuante (32). Esta disposição permite a cada legislador nacional decidir quanto à existência ou não deste direito.

46.      Considero que a preferência pelo outro método, ou seja, pela proporcionalidade linear, com base no facto de ser (alegadamente) simples (33), ou mesmo o «mais simples» para o consumidor (34), deve ser excluída à luz do artigo 25.°, n.° 4, da Diretiva 2014/17.

47.      Por força desta disposição, o mutuante é obrigado a informar o consumidor que manifesta a sua intenção de liquidar antecipadamente o crédito. Cabe, nomeadamente, ao profissional, pelo menos «quantificar as implicações para o consumidor do cumprimento das suas obrigações antes do termo do contrato de crédito e descrever claramente os pressupostos utilizados».

48.      Ao impor esta obrigação ao mutuante, o legislador da União reconhece a dificuldade intrínseca dos cálculos relacionados com o reembolso antecipado do crédito. Ao mesmo tempo, exclui o facto de ser o consumidor a efetuar estes cálculos (35), o que, na minha opinião, contradiz uma preferência exclusiva por um determinado critério de cálculo apenas por ser considerado simples ou o mais simples.

49.      Por último, numa perspetiva contextual mais ampla, recordo que nem a Diretiva 2008/48 opta por um método de cálculo específico, nem o Tribunal de Justiça, ao interpretá‑la, se pronunciou a este respeito (36).

4.      Objetivo

50.      A Diretiva 2014/17 harmoniza os aspetos dos contratos de crédito para imóveis de habitação para «facilitar a criação de um mercado interno que funcione corretamente, com um nível elevado de proteção dos consumidores» no que respeita a estes contratos. Visa também «assegurar que os consumidores que procuram [esses] contratos possam fazê‑lo com a certeza de que as instituições que irão contactar agem de forma profissional e responsável» (37).

51.      Do mesmo modo, procura «desenvolver um mercado interno mais transparente, eficiente e competitivo, através de contratos de crédito para bens imóveis que sejam coerentes, flexíveis e equitativos, promovendo simultaneamente a concessão e contração de empréstimos de forma sustentável e a inclusão financeira, e proporcionando assim um nível elevado de proteção dos consumidores» (38).

52.      Neste contexto, admitir o reembolso de um crédito antes do termo do contrato favorecerá «a concorrência no mercado interno e a livre circulação dos cidadãos da União» e proporcionará «a flexibilidade necessária para promover a estabilidade financeira de harmonia com as recomendações do Conselho de Estabilidade Financeira». Para alcançar estes objetivos, os consumidores devem procurar produtos que satisfaçam as suas necessidades também durante a vigência do contrato (39).

53.      Não considero que se possa deduzir, direta ou indiretamente, destes objetivos um método específico para o cálculo da redução do custo total do crédito. Tanto mais que a própria Diretiva 2014/17 reconhece diferenças substanciais entre os Estados‑Membros «entre os princípios e condições em que os consumidores podem proceder ao reembolso dos seus créditos», e assinala expressamente a intenção de as respeitar (40).

54.      Em especial, não encontro no objetivo de alcançar «um nível elevado de proteção dos consumidores» um apoio suficiente para optar por um método em detrimento do outro. Não vejo necessidade de inferir deste objetivo, de entre todos os critérios admissíveis para o cálculo da redução, a preferência do legislador da União por um determinado critério (em teoria, mais compreensível e mais fácil de aplicar pelo consumidor).

55.      O facto de as circunstâncias relativas a esta redução, como o seu método de cálculo, não poderem conduzir, nem de iure nem de facto, à anulação do próprio direito ao reembolso ou à dissuasão do seu exercício, é uma questão distinta (41).

56.      A Diretiva 2014/17 reconhece a pouca formação financeira dos consumidores que contraem crédito para imóveis de habitação (42). Deste ponto de vista, a qualidade da informação prestada pelo profissional passa a ser o centro de gravidade da proteção do consumidor (43).

57.      Em especial, a Diretiva 2014/17 dispensa o consumidor de efetuar os cálculos relativos ao reembolso antecipado de um crédito e baseia a sua proteção, nesta matéria, nas regras que estabelecem a obrigação de lhe explicar, de forma transparente (44), como será estabelecida a redução do custo total do crédito.

58.      A Diretiva 2014/17 prevê expressamente que, quando o consumidor pede para exercer o seu direito ao reembolso antecipado do crédito, o mutuante deve facultar‑lhe sem demora, em papel ou noutro suporte duradouro, as informações necessárias para estudar a opção. Estas incluem, pelo menos, a expressão das implicações financeiras do reembolso, explicando claramente a sua origem (45).

59.      No cumprimento desta obrigação, como de qualquer outra obrigação relacionada com a execução do contrato, o profissional está sujeito às regras de conduta prescritas pelo artigo 7.°, n.° 1, da Diretiva 2014/17 (46). Além disso, o consumidor beneficia da proteção que lhe confere outras diretivas (47).

C.      Necessidade de especificar o método de cálculo da redução no contrato de crédito

60.      A Diretiva 2014/17 não visa que o consumidor seja responsável pelo cálculo da redução ligada ao reembolso antecipado do crédito. Em todo o caso, considero que o mutuário tem o direito de saber antecipadamente como será realizada a operação e, uma vez efetuada, de verificar como foi realizada.

61.      A obrigação de informação prevista no artigo 25.°, n.° 4, da Diretiva 2014/17 não garante, por si só, esse direito, uma vez que só é acionada quando o consumidor pede o reembolso antecipado do crédito. Em sentido literal, a FINE não inclui a descrição do critério de cálculo a aplicar à redução no momento em causa (48).

62.      Em domínios relacionados com o objeto do presente processo, como o regulado pela Diretiva 2008/48, o Tribunal de Justiça:

–        Declarou que o mutuante devia transmitir ao consumidor «uma cópia do contrato de crédito, bem como todas as informações relativas ao reembolso do crédito que não constam do próprio contrato mas que são necessárias para, por um lado, verificar o cálculo do montante correspondente à redução do custo total do crédito a que este consumidor pode ter direito na sequência do seu reembolso antecipado e, por outro, lhe permitir intentar uma eventual ação de cobrança deste montante» (49).

–        Indicou, a propósito da indemnização ligada ao reembolso antecipado do crédito, que o contrato «deve [...] indicar o método de cálculo dessa indemnização de uma forma concreta e facilmente compreensível para um consumidor médio, de maneira a que este possa determinar o montante da indemnização devida em caso de reembolso antecipado com base nas informações fornecidas nesse contrato» (50).

63.      Considero que esta jurisprudência é transponível para a redução do custo total do crédito prevista no artigo 25.°, n.° 1, da Diretiva 2014/17. Assim, a partir do momento em que celebra o contrato, o consumidor saberá com certeza: a) que tem o direito de reembolsar antecipadamente o empréstimo; e b) a forma como o custo total do crédito será reajustado, ou seja, os parâmetros de reajustamento do custo total do crédito se, no futuro, decidir cumprir antecipadamente as suas obrigações.

D.      Projeção destas considerações no caso em apreço

64.      Se o Tribunal de Justiça aceitar a abordagem que defendo, poderá declarar que a Diretiva 2014/17 não opta (nem impõe ou proíbe) por um dos critérios descritos pelo órgão jurisdicional de reenvio na sua segunda questão prejudicial. Por conseguinte, a decisão desse órgão jurisdicional deve basear‑se em argumentos de outra natureza.

65.      Nas suas decisões de reenvio e de confirmação do pedido de decisão prejudicial, o órgão jurisdicional a quo pronuncia‑se a favor de uma redução que seja «proporcional à relação entre o período durante o qual o contrato não será executado (mediante reembolso antecipado) e o período inicialmente acordado, durante o qual o contrato devia ser aplicado» (51).

66.      O Governo Polaco indica que é esta a fórmula seguida por outros órgãos jurisdicionais deste Estado‑Membro; afirma ainda que o direito nacional não contém nenhuma previsão para o cálculo do ajustamento do custo total do crédito (52).

67.      O facto de esta fórmula ser, das duas enumeradas, a mais simples ou mesmo a mais compreensível para o consumidor médio (53) não a torna a única autorizada pela Diretiva 2014/17. Sublinho que esta diretiva não impõe uma solução em detrimento da outra, mas também não proíbe a aplicação «por defeito» daquela que o órgão jurisdicional de reenvio parece preferir.

E.      Limitação no tempo dos efeitos dos acórdãos do Tribunal de Justiça

68.      Segundo o Governo Italiano, uma decisão do Tribunal de Justiça a favor de uma interpretação segundo a qual o artigo 25.° da Diretiva 2014/17 prescreve um ou vários critérios específicos para calcular o montante da redução do custo total do crédito poderia, no futuro imediato, conduzir à nulidade ou ineficácia das cláusulas, estipuladas em contratos de crédito imobiliário, que prevejam outros critérios.

69.      Segundo este Governo, uma declaração do Tribunal de Justiça nesse sentido daria origem a uma nova corrente de litígios, tanto judiciais como extrajudiciais. Por conseguinte, pede ao Tribunal de Justiça que limite no tempo os efeitos de tal acórdão, de modo que este produza efeitos ex nunc (54).

70.      Se o Tribunal de Justiça concordar com a minha proposta, o pedido do Governo Italiano ficará desprovido de objeto. Em todo o caso, considero que a limitação temporal que este Governo defende não é adequada, uma vez que, como no processo C‑555/21, UniCredit Bank Austria (55), não foi demonstrado que estão reunidos os requisitos exigidos a este respeito pela jurisprudência do Tribunal de Justiça (56).

V.      Conclusão

71.      Tendo em conta as considerações precedentes, proponho que se responda à segunda questão prejudicial submetida pelo Sąd Rejonowy dla Warszawy‑Woli w Warszawie (Tribunal de Primeira Instância de Varsóvia‑Wola, Polónia) do seguinte modo:

«O artigo 25.°, n.° 1, da Diretiva 2014/17/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de fevereiro de 2014, relativa aos contratos de crédito aos consumidores para imóveis de habitação e que altera as Diretivas 2008/48/CE e 2013/36/UE e o Regulamento (UE) n.° 1093/2010,

deve ser interpretado no sentido de que

quando o consumidor exerce o direito de cumprir, integral ou parcialmente, as obrigações decorrentes do contrato de crédito antes do termo desse contrato, não prevê um método específico para o cálculo da redução do custo total do crédito, no que diz respeito aos custos relativos ao período remanescente do contrato».


1      Língua original: espanhol.


2      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de fevereiro de 2014, relativa aos contratos de crédito aos consumidores para imóveis de habitação e que altera as Diretivas 2008/48/CE e 2013/36/UE e o Regulamento (UE) n.° 1093/2010 (JO 2014, L 60, p. 34).


3      Acórdão de 9 de fevereiro de 2023, UniCredit Bank Austria (C‑555/21, EU:C:2023:78; a seguir «Acórdão UniCredit Bank Austria»), sobre a interpretação do artigo 25.°, n.° 1, da Diretiva 2014/17.


4      Processo VR Bank Ravensburg‑Weingarten, pendente, no qual apresentei as minhas Conclusões em 28 de setembro de 2023 (C‑536/22, EU:C:2023:721).


5      A comissão ascendia a 2 600 PLN.


6      Ou de cálculo do reembolso, se este já tiver sido pago.


7      Trata‑se de encontrar o rácio da redução que, multiplicado pelo valor da comissão, conduzirá, em consequência, ao valor a deduzir do custo total do crédito.


8      Neste método, a proporcionalidade é «pura» ou «linear».


9      O método parece corresponder ao critério da «curva dos juros». Em conformidade com este critério, como explica de forma simplificada o Governo Italiano no n.° 26 das suas observações, «a proporção dos custos a reembolsar é calculada comparando os juros remuneratórios a pagar no momento do reembolso antecipado com o juro total previsto no plano de amortização do empréstimo». A doutrina relaciona este método com o critério do «custo amortizado» utilizado para a avaliação contabilística dos instrumentos financeiros.


10      Observações de QI, n.° 11. Além disso, por analogia com o que foi declarado no Acórdão de 18 de novembro de 2021, A. S.A. (C‑212/20, EU:C:2021:934), relativo à determinação da taxa de compra e venda de uma moeda estrangeira num crédito com hipoteca indexado a essa moeda, o consumidor que celebra um contrato de crédito relativo a imóveis de habitação deve poder calcular por si próprio o montante da redução do custo total do crédito quando exerce o seu direito ao reembolso antecipado.


11      Observações da Comissão, n.° 39.


12      Considero que esta também é a posição do Governo Checo, embora não o declare explicitamente.


13      Observações do Governo Polaco, n.os 34 e 35. No n.° 38, indica, como QI, a inexistência, no mercado polaco dos créditos hipotecários, de propostas de empréstimos a taxa de juro fixa para toda a duração do contrato.


14      Observações do Governo Italiano, n.os 37 a 42. Do mesmo modo, ao propor uma resposta à segunda questão prejudicial, o Governo Checo indica que o cálculo da redução deve ter em conta «a natureza do custo em questão, a natureza do serviço relacionado com este custo e o modo de reembolso deste custo relativamente à prestação do serviço».


15      Observações escritas do Governo Português, n.os 37 e 38.


16      Observações do Santander Bank, n.os 27 e seguintes. A argumentação é essencialmente de natureza económica. No plano jurídico, o Santander Bank baseia‑se nas referências do considerando 66 e do artigo 25.°, n.° 3, da Diretiva 2014/17 à indemnização concedida ao mutuante. Não é claro que, em seu entender, a questão seja decidida no próprio texto da diretiva.


17      Anexo II da Diretiva 2014/17. O considerando 40 explica que, por intermédio da FINE, é fornecida informação, de forma personalizada a cada consumidor, sobre o contrato de crédito que é proposto. Acrescenta que a FINE, no modelo previsto pela diretiva, foi revista para «garantir que a mesma é clara e inteligível e contém todas as informações consideradas relevantes para os consumidores».


18      O n.° 9 da parte A da FINE não contém referências textuais à redução do custo do crédito. A exigência de indicar, se for caso disso, um método de cálculo diz respeito aos «custos do reembolso antecipado». Na parte B da FINE, que especifica as instruções para o seu preenchimento, a secção 9 identifica estes custos com a indemnização eventualmente prevista a favor do mutuante. Como já expliquei nos n.os 60 e seguintes, a forma como será tida em conta a eventual redução pelo reembolso antecipado também deve ser comunicada ao consumidor que pretende celebrar um contrato de crédito.


19      Diretiva do Conselho, de 22 de dezembro de 1986, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados‑Membros relativas ao crédito ao consumo (JO 1987, L 42, p. 48).


20      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2008, relativa a contratos de crédito aos consumidores e que revoga a Diretiva 87/102/CEE do Conselho (JO 2008, L 133, p. 66). A Diretiva 2008/48 será, por sua vez, revogada com efeitos a partir de 26 de novembro de 2026 pelo artigo 47.° da Diretiva (UE) 2023/2225 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de outubro de 2023, sobre os contratos de crédito aos consumidores e que revoga a Diretiva 2008/48/CE (JO L, 2023/2225, 30.10.2023).


21      Artigo 8.°, da Diretiva 87/102; artigo 16.°, n.° 1, da Diretiva 2008/48 e artigo 25.°, n.° 1, da Diretiva 2014/17. A (nova) Diretiva 2023/2225 integra a interpretação dada pelo Tribunal de Justiça no Acórdão de 11 de setembro de 2019, Lexitor (C‑383/18, EU:C:2019:702), no que diz respeito aos custos aos quais se aplica a redução do custo total do crédito: v. considerando 70 e artigo 29.°, n.° 1.


22      A discussão sobre o direito do consumidor de cumprir as suas obrigações antes do termo do prazo acordado está intimamente ligada ao direito do mutuante a uma indemnização, que está longe de ser consensual. Além disso, o reembolso antecipado pode ter repercussões para além das partes no contrato: v. segundo relatório do Parlamento sobre uma proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à harmonização das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados‑Membros em matéria de crédito aos consumidores [COM(2002) 0443 — C5‑0420/2002 — 2002/0222(COD)], documento A5‑0224/2004, alterações 96 a 100. Este relatório alerta para as potenciais consequências negativas de um reembolso antecipado e gratuito, em relação aos consumidores «cumpridores», entendidos como aqueles que cumprem o contrato até ao termo do prazo acordado. No domínio do crédito hipotecário, a avaliação de impacto que acompanha o Livro Branco sobre a integração dos mercados de crédito hipotecário da UE, SEC(2007) 1683, anexo III, pp. 60 e 61, pronuncia‑se sobre as consequências sistémicas associadas a indemnizações demasiado baixas para o mutuante.


23       V. Acórdãos de 11 de setembro de 2019, Lexitor (C‑383/18, EU:C:2019:702), para a Diretiva 2008/48; e UniCredit Bank Austria para a Diretiva 2014/17. Segundo esta jurisprudência, no caso do crédito hipotecário, o direito à redução não inclui os custos que, independentemente da duração do contrato, são imputados ao consumidor a favor do mutuante ou de terceiros a título de prestações já executadas integralmente no momento do reembolso antecipado. Em contrapartida, no âmbito do crédito ao consumo, a redução incide sobre todos os custos imputados ao consumidor. O considerando 70 da Diretiva 2023/2225 precisa a exclusão de determinadas taxas e encargos pagos diretamente a terceiros.


24      Na vigência da Diretiva 87/102, cada Estado‑Membro era livre para determinar o montante da redução. O primeiro relatório da Comissão, de 1995, sobre a aplicação do instrumento menciona a sugestão de um Estado‑Membro definir a redução equitativa «either by setting a percentage or a formula for its calculation»: COM(95) 117 final, n.° 192. O relatório de 1996 limita‑se a recordar que a diretiva não afeta os critérios de cálculo já em vigor nos Estados‑Membros: COM(96) 79 final, n.° 55.


25      Embora os trabalhos preparatórios da Diretiva 2023/2225 não sejam discutidos a este respeito, o seu considerando 70 indica que «[a] redução do custo total do crédito para o consumidor deverá ser proporcional ao período remanescente do contrato de crédito [...]» (sublinhado nosso). Este esclarecimento, que, na minha opinião, aponta para a intenção de consagrar no futuro o método de proporcionalidade linear em matéria de crédito ao consumo, não consta dos textos que precederam a reunião informal interinstitucional que teve lugar em 1 de dezembro de 2022.


26      Conclusões no processo VR Bank Ravensburg‑Weingarten (C‑536/22, EU:C:2023:721), n.° 19.


27      Através de disposições legais ou de outros meios, como as cláusulas contratuais (considerando 66 da Diretiva 2014/17).


28      Em determinadas circunstâncias, podem ser impostas restrições a ponto de excluir o exercício do direito. V. restrições enumeradas no considerando 66 da Diretiva 2014/17: «[...] os Estados‑Membros deverão ter a possibilidade de definir as condições de exercício desse direito [ao reembolso antecipado]. Essas condições poderão incluir limitações temporais ao exercício do direito, tratamentos diferenciados em função do tipo de taxa devedora ou restrições quanto às circunstâncias em que o direito pode ser exercido. Se o reembolso antecipado ocorrer durante um período em que a taxa devedora é fixa, o exercício desse direito poderá ser condicionado à existência de um interesse legítimo por parte do consumidor, especificado pelo Estado‑Membro. Esse interesse legítimo poderá verificar‑se, por exemplo, em caso de divórcio ou de situação de desemprego [...]».


29       Não me parece que o considerando 66 da Diretiva 2014/17, que utiliza fórmulas abertas mesmo quando se refere a limites do exercício pelos Estados‑Membros do direito ao reembolso antecipado do crédito, possa ser entendido de outra forma.


30      Em especial, a taxa anual de encargos efetiva global estabelecida no anexo I.


31      E segunda parte do considerando 66.


32      V., neste sentido, decisão de reenvio, n.° 74; e as observações do Santander Bank, n.os 28 e 29.


33      Observações da Comissão, n.° 39.


34      Observações do Governo Polaco, n.os 34 e 35.


35      A verificação destes cálculos pelo consumidor é uma questão diferente: n.os 60 e seguintes, infra.


36      O Acórdão de 11 de setembro de 2019, Lexitor (C‑383/18, EU:C:2019:702), n.° 24, expõe as duas interpretações do artigo 16.°, n.° 1, da Diretiva 2008/48 propostas pelo órgão jurisdicional de reenvio, pelas recorridas e outras partes interessadas. Enquanto a primeira interpretação destaca o tipo de custos abrangidos pela redução do custo total do crédito, a segunda também indica o método de cálculo para efeitos da redução, que consistia em «ter em conta a totalidade dos custos suportados pelo consumidor e depois reduzir o seu montante proporcionalmente ao período remanescente do contrato». O acórdão admite uma redução que inclua todos os custos imputados ao consumidor, mas omite a referência à proporcionalidade. V nota de rodapé n.° 25, supra, sobre a alteração da situação na sequência da adoção da Diretiva 2023/2225.


37      Considerando 5.


38      Considerando 6.


39      Considerando 66.


40      Loc. ult. cit.


41      O relatório final do estudo de avaliação sobre a Diretiva 2014/17, realizado pela Direção‑Geral da Estabilidade Financeira, dos Serviços Financeiros e da União dos Mercados de Capitais (Comissão Europeia), Risk & Policy Analysts (RPA), de novembro de 2020, indica que não é invulgar que os consumidores não tenham conhecimento de quanto poupariam com o reembolso antecipado do crédito (p. 9). No entanto, reconhece posteriormente a dificuldade em associar o exercício ainda limitado do direito ao reembolso na prática a um fator específico. Em nenhum caso se refere como problemático o método de cálculo da redução do custo total do crédito: v. n.° 5.2.7 desse relatório. Salienta, por outro lado, que a razão habitual para os consumidores não efetuarem um reembolso antecipado é o facto de não o poderem suportar: v. p. 170 desse relatório,.


42      Qualifica esta falta de conhecimentos como um dos problemas do mercado de crédito hipotecário da União (considerando 4). O capítulo 2 da Diretiva 2014/17, intitulado «Formação financeira», contém disposições que obrigam os Estados‑Membros a promoverem medidas de apoio à formação dos consumidores, no que diz respeito às responsabilidades inerentes à celebração de um crédito hipotecário.


43      Em resultado da Diretiva 2014/17, o consumidor é destinatário de informações em várias fases do processo de celebração do crédito, desde a publicidade até à execução do contrato. A importância de informar o consumidor (mutuário) nesta última etapa é corroborada, além do seu artigo 25.°, pelo artigo 27.°, que impõe ao mutuante um dever de informação relativo às alterações da taxa devedora e às suas consequências sobre os pagamentos futuros. Estas duas disposições estão abrangidas pelo mesmo capítulo da Diretiva 2014/17, intitulado «Boa execução dos contratos de crédito e direitos associados».


44      O Tribunal de Justiça interpretou a exigência de transparência, por exemplo, no Acórdão de 18 de novembro de 2021, A. S.A. (C‑212/20, EU:C:2021:934), n.os 38 e seguintes, no que respeita ao artigo 5.° da Diretiva 93/13/CEE do Conselho, de 5 de abril de 1993, relativa às cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores (JO 1993, L 95, p. 29). Tratava‑se, no caso em apreço, de uma cláusula contratual relativa à taxa de compra e venda de uma moeda estrangeira, num contrato de crédito hipotecário indexado a esta moeda. V., também, os acórdãos referidos no n.° 62.


45      Artigo 25.°, n.° 4, da Diretiva 2014/17. Considero que a obrigação de comunicar o modo de determinação da redução prevista no n.° 1 deste artigo existe antes mesmo de o mutuário solicitar o exercício do seu direito ao reembolso antecipado, ainda que a diretiva não o preveja textualmente: n.os 60 e seguintes, infra.


46      Deve agir «de forma honesta, leal, transparente e profissional, tendo em consideração os direitos e interesses do consumidor».


47      Refiro‑me, em especial, à Diretiva 93/13/CEE; e à Diretiva 2005/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de maio de 2005, relativa às práticas comerciais desleais das empresas face aos consumidores no mercado interno e que altera a Diretiva 84/450/CEE do Conselho, as Diretivas 97/7/CE, 98/27/CE e 2002/65/CE e o Regulamento (CE) n.° 2006/2004 (a seguir «Diretiva relativa às Práticas Comerciais Desleais») (JO 2005, L 149, p. 22).


48      V. nota de rodapé n.° 18, supra.


49      Acórdão de 12 de outubro de 2023, Z. (Direito a uma cópia do contrato de crédito), (C‑326/22, EU:C:2023:775), n.° 30. Este processo tinha por objeto a interpretação do artigo 16.°, n.° 1, da Diretiva 2008/48.


50      Acórdão de 9 de setembro de 2021, UK e o. (C‑33/20, C‑155/20 e C‑187/20, EU:C:2021:736), relativo ao artigo 10.°, n.° 2, alínea r), da Diretiva 2008/48.


51      Decisão de reenvio, n.° 72.


52      Observações do Governo Polaco, n.° 34.


53      A Diretiva 2014/17 não define o conceito de consumidor. Não tenho razões para considerar que a definição se afasta da habitualmente adotada pela jurisprudência em matéria de proteção do consumidor médio, que o define como «normalmente informado e razoavelmente atento e avisado». As obrigações do mutuante em matéria de informação que mencionei anteriormente são, evidentemente, aplicáveis.


54      Observações do Governo Italiano, n.os 43 e 44.


55      Neste processo, o Governo Italiano apresentou um pedido análogo. No n.º 92 das minhas Conclusões (EU:C:2022:742), indiquei que «[s]e o Tribunal de Justiça seguir a tese que defendo, seria desnecessário deferir o pedido do Governo Italiano quanto à eventual limitação dos efeitos do acórdão no tempo. De resto, entendo que tal limitação não seria admissível, uma vez que não se demonstrou que estejam preenchidos os requisitos (em especial, as repercussões económicas graves) exigidos pela jurisprudência do Tribunal de Justiça a este respeito».


56      V., entre outros, Acórdãos de 17 de março de 2021, Academia de Studii Economice din Bucureşti (C‑585/19, EU:C:2021:210), n.os 78 a 81; de 22 de junho de 2021, Latvijas Republikas Saeima (Pontos de penalização) (C‑439/19, EU:C:2021:504), n.° 132; ou de 26 de outubro de 2021, PL Holdings (C‑109/20, EU:C:2021:875), n.° 60.